terça-feira, dezembro 17, 2024

Estes tempos de demasiadas realidades...


Se a primeira frase foi boa, «Gostei bastante de ler o livro», as restantes, deixaram no ar algumas pontas soltas...

Ele tinha razão quando disse, «A história está cheia de omissões...»

Foi por isso que durante alguns minutos, quando caminhava pelas ruas com cheiro a Natal, fui perseguido por esta frase. Por ser verdadeira e de alguma forma, tocar-me, ainda que indirectamente.

Claro que ele depois tentou amenizar "a coisa". «Não precisas de ficar preocupado, não é nada de grave. São apenas maneiras diferentes de olhar a realidade.»

E são mesmo. E acho que esse é o problema do nosso tempo, há demasiadas realidades, quase uma para cada um de nós...

É por estas razões que as autobiografias, os diários e as memórias, quando são transformados em livros, são quase sempre lidos de formas diferentes...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


segunda-feira, dezembro 16, 2024

Egoísmos, oportunismos e fingimentos...


O maior problema dos políticos é a sua capacidade de "fingimento", de fazerem de conta que está tudo bem, ao mesmo tempo que vão passando ao lado dos problemas, sem se preocuparem com as "bolas de neve", que deixam crescer, aqui e ali.

É desta forma que coisas aparentemente simples, que poderiam ter respostas quase imediatas, se tornam com o tempo, autênticos flagelos sociais...

Quando olhamos e escutamos as notícias sobre a gente (quase sempre de pele mais escura...) que ocupa lugares abandonados e os transforma em "bairros", e que depois de ter andado a escapar à lei, quando são confrontados com as ilegalidades, querem que o Estado lhes resolva o problema, a primeira coisa que pensamos é na mentalidade destas pessoas, que querem ter um "estatuto especial" de cidadãos. Acham que têm de ser os poderes, locais e nacionais, a arranjarem-lhes uma casa, quanto a maior parte de nós, comprou ou alugou a casa onde vive.

Ninguém escapa a este "egoísmo" humano, até por muitas vezes sermos confrontados com situações de mero oportunismo, de gente que já tem casa e vai para estes locais, apenas para que lhes "ofereçam uma outra casa"...

Continuo a pensar que se as autoridades actuassem de imediato (em vez de assobiarem para o ar...), colocando fim a estas "ocupações", mal as pessoas se começam a instalar nestes espaços abandonados, degradados e perigosos, se evitavam muitos destes problemas, que crescem quase como cogumelos.

Claro que o problema central continua a não ser este. Nem é apenas a falta de casas. É sim, um outro "oportunismo" de todos aqueles que têm casas para alugar ou vender, e que o tentam fazer pelo maior valor possível...

Eu sei que é a "lei da oferta e da procura" a funcionar, mas...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


domingo, dezembro 15, 2024

Ministras com patas de elefante e voz de peixeiras


Este governo apostou, praticamente desde início, em ter políticos (neste caso particular, políticas...) com comportamentos pouco habituais, apontando o dedo de uma forma incisiva, e até ofensiva, aos anteriores detentores dos cargos.

A ministra do Trabalho enxovalhou na praça pública a Provedora da Santa Casa da Misericórdia, demitindo-a do cargo, deixando atrás de si uma série de acusações, a maioria das quais ainda não foram provadas.

A ministra da Saúde, já com um passado de confrontos com o director-geral do sector, preparou o terreno para que este se sentisse desconfortável e fosse embora. O que acabou por acontecer, com danos graves para todos nós...

A ministra da Cultura esteve à espera do último dia (em que se pode demitir sem indemnizar...), para demitir a administradora do CCB, acusando ao mesmo tempo o anterior responsável da pasta de compadrio e de partidarização da cultura. 

Não me lembro de existirem este tipo de acusações, de ministro para ministro, mesmo quando aconteceram vários casos, mais polémicos e prejudiciais ao país (alguns até de polícia e com o recurso aos tribunais), ao longo dos últimos quarenta anos de democracia.

Mas o mais curioso, é não se notar nada de novo, de verdadeiramente reformador, nestes sectores. Especialmente no da saúde, onde os problemas se têm multiplicado neste último ano...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, dezembro 14, 2024

«As revoluções são campos de pasto, do melhor, para os oportunistas.»

 


Todos sabíamos que ele estava certo.

«As revoluções são campos de pasto, do melhor, para os oportunistas.»

A publicidade dera-lhe ginástica mental para dizer muito em poucas palavras. Sem falar do poeta, escondido, apenas de gaveta...

A maioria de nós tinha exemplos na família de gente que até ao dia 25, eram "perigosos comunistas", e que a partir de 26, passaram a ser "burgueses" ( e algumas vezes, em surdina, "fascistas"...).

A Síria não vai ser diferente das outras revoluções, por muito que inventem os  "leitores de cartas" e de "mãos"...

(Fotografia de Luis Eme - Lisboa)


sexta-feira, dezembro 13, 2024

Cada vez se olha mais para o outro, de lado, ou por baixo...


Cada vez se olha menos de frente, para a gente anónima com quem nos cruzamos, nas ruas do mundo.

Prefere-se olhar de lado, por baixo, ou simplesmente não olhar.

Claro que eu continuo a andar por aí, contra a corrente, olho para o mundo de frente. Continuo teimoso.

Os olhos podem enganar, mas têm de ter muito treino, para conseguirem dizer uma coisa e serem outra...

Pior que isso, só mesmo a desconfiança pelas bons intenções dos outros. 

Não, ainda não somos todos uns "filhos da puta", mesmo fora da época natalícia...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, dezembro 12, 2024

Direitos adquiridos com prazos de validade...


Não tenho grande opinião sobre a Síria, por desconhecer a história do país e do seu povo. A única coisa que sei é que era dominada por um ditador, que deixa atrás de si um rasto de sangue e muitos mortos, uns conhecidos e outros noticiados como "desaparecidos"...

Foi por isso que me limitei a escutar a história de vida de uma mulher que viveu por lá e que não pensa em voltar. Além de gostar de ser europeia, tem um marido e um novo país, ambos portugueses.

Quando regressava a casa pensei em algumas coisas que escutei e percebi que o que aconteceu no Afeganistão, persegue muitas destas mulheres, que de um momento para o outro podem deixar de ser pessoas e passarem a ser "objectos" telecomandados pelos homens...

Tinha nas mãos um livro que desconhecia, de José Gomes Ferreira, "O Sabor das Trevas". Um romance escrito com a fina ironia do poeta, que nos dava o retrato do portagalito dos anos sessenta, que se debatia com uma coisa que hoje até nos pode fazer rir: o uso de calças por parte das mulheres.

As mulheres conseguiram fintar a questão estética (mesmo as mulheres com mais de noventa quilos que andam pelas ruas de calças de licra e se tornam "mostrengas" aos nossos olhos, não abdicam da liberdade de usarem o que lhes apetece...) em favor do conforto. E ainda bem.

É por isso que transcrevo um curto parágrafo do livro: «Pois eu não me ralo - explodia a gorducha com aquele ênfase vingativo das mulheres feias - Os homens que se encham de paciência e não olhem para mim. Não lhes faltam miúdas giras por essas ruas. Mas lá frio nas pernas é que eu não apanho.»

Quando somos educados num mundo quase normal, custa-nos mais perceber as Alyssas ou o Mohamedes...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, dezembro 10, 2024

Prometer o que não se pode ( e não se quer dar) nas culturas...

A cultura continua a ser o parente pobre das políticas do nosso país.

A maior parte das queixas, que se ouvem aqui e ali, têm razão de ser,  e ainda aumentam quando se trata de governos que apostam mais na propaganda que na acção. Isso aconteceu com António Costa e continua a acontecer com Luís Montenegro. Tanto um como o outro fingem pensar que as pessoas são todas estúpidas, que gostam de comer "gato por lebre" e ainda são capazes de dizer no fim do "repasto: "está tudo muito bom"... 

Sei que eles sabem que as pessoas das culturas pensam pelas suas cabeças. São pessoas que gostam de ler, de conversar e de estarem bem informadas. O seu grande problema é fazerem parte de áreas onde não se produz lucro (felizmente graças ao turismo o património - museus e monumentos - tem sido bastante lucrativo, quase de uma forma natural, sem que tivesse existido uma aposta séria no sector...), porque não existe uma "indústria cultural", nunca houve uma política de desenvolvimento séria.

Os políticos continuam a olhar para a cultura e para os seus agentes, como pessoas que fazem umas coisas giras, boas para usar nas campanhas eleitorais, que entretem outras pessoas e precisam de umas "esmolas". Mas que não podem, nem devem, ser levados muito a sério, até porque podem tornar-se "perigosos". É por isso que também dá jeito tratá-los como "tontinhos"...

É por isso que se aposta muito mais (como em quase tudo que não é lucrativo na sociedade mas pode "dar votos"...) na subsidiodependência que na autosuficiência. Os políticos gostam de "controlar" as pessoas e os grupos que fazem teatro, cinema, dança, pintura, música, etc., dando depois uns "doces" aos que consideram "seus" e uns "coices" a todos outros...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, dezembro 09, 2024

A arte de "roubar" rostos e corpos de pessoas dentro das fotografias...


Um amigo chamou-me a atenção para o "excessivo" cuidado que eu tive com a publicação da imagem de ontem.

Disse-lhe que não houve nada de excessivo. Embora o "direito à imagem" proteja as crianças (cortei o bebé que estava no carrinho...) e as pessoas que estejam no espaço público em situações de fragilidade (e muito bem), que não era o caso. 

Tirei três fotografias a este grupo de mães e filhos. Esta era a mais discreta, mas também a que se via bem, as senhoras com a cana de pesca na mão. Achei este o aspecto mais curioso, elas estarem à pesca mesmo junto ao cais dos cacilheiros (que até é um dos lugares mais poluídos de Cacilhas à beira rio...), onde existem tainhas aos magotes.

Há muita gente que não gosta de ser fotografado, mas é impossível que isso não aconteça, nos dias de hoje. Quando estamos a querer tirar uma fotografia a qualquer monumento ou lugar especial, há sempre alguém que nos diz que os humanos também fazem parte da paisagem... 

Acho que foi "esta realidade" que me fez perder qualquer pudor, em relação ao tirar fotografias a pessoas no espaço público, mesmo que as tente apanhar de lado ou detrás, para que possam ser uma pessoa qualquer...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


domingo, dezembro 08, 2024

A Europa não é o Oriente...


Há uma questão da qual nunca se fala, quando nos referimos às diferenças sociais, atribuídas às crenças e credos religiosos.

Estava a ver duas mães rodeadas dos filhos, a pescarem, rente ao Tejo, ainda em Cacilhas, no começo do Ginjal, com o rosto tapado com as suas "burkas" e fiquei a pensar nas crianças que as rodeavam.

Por muito que os pais insistam em "viver numa ilha", eles com toda a certeza, andam na escola, até porque é decisivo que aprendam português, para serem cidadãos como nós, para conhecerem melhor este mundo diferente que os cerca.

Será que eles acham graça a este "baile de máscaras" protagonizado diariamente pelas suas mães (sei que ainda há uma pergunta a fazer antes desta, é se estas mulheres se sentem confortáveis, quando circulam de rosto escondido, nas nossas ruas...)?

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


sábado, dezembro 07, 2024

Mário Soares: um político de corpo inteiro


Mário Soares nunca foi um dos meus políticos preferidos. Sempre achei que ele era capaz de fazer tudo pelo poder. E de certa forma era...

Mas com o tempo fui percebendo que ele tinha uma intuição política única, o que fazia com que tivesse muitas vezes razão,  antes do tempo.

Embora fosse amigo do seu amigo, não evitava desafios, nem desistia daquilo que achava ser melhor para todos (mesmo que estivesse errado...). Isso explica, em parte, as "zangas" com Salgado Zenha e com Manuel Alegre, que lhe eram muito próximos. O mais curioso foi ambas terem sido provocadas por duas eleições presidenciais, distintas, em que experimentou o sabor da vitória e o sabor da derrota.

Com um olhar quase de historiador, não tenho qualquer dúvida, de que Mário Soares foi a grande figura política do nosso país dos últimos cinquenta anos. 

Os dois pontos pela qual é mais criticado pelos extremistas, são aqueles é que teve um papel decisivo para a nossa democracia (só não foi para a democracia dos outros, porque eles não quiseram...). 

Refiro-me ao processo da descolonização, que nas circunstâncias em que se realizou, dificilmente poderia ter outro resultado. As guerras pelo poder, protagonizadas entre o MPLA e a UNITA em Angola e pela FRELINO e RENAMO em Moçambique, ultrapassaram as nossas fronteiras e acabaram por dar razão aos nossos políticos, por muito que isso faça doer a todos aqueles que viveram por lá e tiveram de partir de um dia para o outro, abandonando os seus lares e os seus bens.

Sobre o 25 de Novembro já se disse praticamente tudo. Foi ele quem enfrentou os extremismos, da esquerda e da direita, foi ele quem se uniu aos militares democratas e devolveu o rumo certo ao nosso país.

Não tenho qualquer dúvida de que, sem a influência de Mário Soares, seríamos um país pior, em todos os sentidos.

Na actualidade, faz-nos muita falta um político com a sua intuição, para combater o populismo e a mentira, crescentes, desta extrema direita, cada vez mais difícil de classificar.

(Óleo de Júlio Pomar)


sexta-feira, dezembro 06, 2024

O olhar e as palavras dos outros...


Por vezes não temos assunto, não sabemos como começar, outras andamos com duas ou três coisas na cabeça, sobre a qual podíamos escrever.

Podia começar pela beleza feminina, que não é sempre igual (deve acontecer o mesmo com a masculina...). Não digo isto apenas pelo encontro de sexta feira, em que encontrei uma amiga que não via há uma porção de dias, que me sorriu, de uma forma radiosa. O dia (ou até a semana...) devia estar a correr-lhe bem,  senti que transportava dentro si mais luz que a habitual. 

Luz essa que conseguia passava para os outros...

Quase no mesmo lugar, encontrei dois amigos, sentados em mesas diferentes, que me levaram a viajar de um lado para o outro do restaurante, para lhes dar um olá. Tinham ambos a mesma novidade, nada agradável, um amigo comum que se tinha sentido mal dias antes,  foi às urgências do hospital e acabou internado. Fiquei com o "relatório médico" completo, as informações de um e de outro, complementaram-se...

Quando voltava a casa, fiquei a pensar que sou mesmo mais de ouvir que de falar. Nos casos de doenças (e se calhar de tudo...) dou sempre o mínimo de informação possível, para não estar armado em médico, muito menos a desafiar o futuro.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, dezembro 04, 2024

Eles não sabem, mas o teatro é o exagero da realidade...


A maior parte da gente que o conhece, não percebe nem olha com bons olhos para a sua paixão pelo palco.

As conversas quase de ouvido, têm quase sempre apenas um sentido, a sua vaidade pessoal, o querer exibir-se, o querer mostrar-se, em qualquer palco.

Esquecem a sua vontade de ajudar, o querer estar, o querer fazer, a aceitação de qualquer papel mesmo que seja de um simples figurante, como o de um actor amador menor, que ficou no "anedotário local", por causa da mulher. Falo do Tó da Mutela, que também gostava de tudo aquilo, de estar ali ao lado de todos aqueles homens e mulheres com muito mais jeito que ele para a arte de talma.

Quando me contaram a história da "queda em palco", sorri e lembrei-me logo do Tó...

Sim, é histórica a frase da sua mulher após a estreia. Depois de lhe fazer o jantar mais cedo, vê-lo sair de casa e passar os serões a ensaiar a nova peça do grupo cénico, meses seguidos, disse: «Tanta merda para isto? Para atravessares o palco, três vezes, de um lado ao outro, e dizeres apenas boa noite?», insistindo, irritada, «para dizeres uma merda de um boa noite, não era preciso ensaio nenhum.»

Claro que era preciso ensaio. Mas eles não sabem, nem sonham... 

O Tó tinha de conhecer a deixa, tinha de saber o caminho que iria percorrer, de um lado para o outro, no palco. Bastava um precalço para tornar o drama numa comédia...

O que ela nunca percebeu, foi a paixão do seu homem pelo palco, o querer estar ali, participar, nem que fosse apenas para ver os outros. 

Talvez preferisse que ele passasse os serões na taberna (lá não havia mulheres) e não no ensaio...

Foi por isso que percebi a frase do encenador, quando dois ou três elementos do grupo, o criticavam: «Dêem-lhe espaço, deixem-no ter o seu momento, deixem-no cair, sozinho...» 

O papel que fazia, era de um amante, que acabava assassinado em palco. Achavam que ele não caia com naturalidade, fazia um espectáculo dentro de um espectáculo. 

Eles fingiam não perceber que o teatro é isso, é o exagero da realidade...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


terça-feira, dezembro 03, 2024

As tertúlias de café, das certezas e das dúvidas...


Estava sozinho a beber café, mesmo ao lado de um grupo de tertulianos, que passam a manhã, por ali, a pôr as "certezas" em dia.

Pensei nas minhas tertúlias, que são tão diferentes daquela. Normalmente são povoadas de gente cheia de dúvidas, que se senta para ver se aprende alguma coisa, e se diverte, claro.

Percebi à légua que um deles, ainda tinha mais certezas, que todos os outros. Ouvi-o dizer pelo menos três vezes: «Não é nada disso.» Antes de tentar vender o seu "charrouco" aos companheiros.

Ao contrário daqueles senhores, temos algumas dúvidas de que o Sporting vá ser campeão ou que o Almirante possa ser Presidente da República...

E o melhor disto tudo, é não fazermos apostas, não termos medo de errar ou de estar errados. 

O pior que nos pode acontecer, no dia seguinte, é sermos alvo de "chacota" durante um ou dois minutos.

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


segunda-feira, dezembro 02, 2024

A fronteira entre o que se pode e o que se deve fazer...


Não deixa de ser curioso, que sejam quase sempre os "moralistas de pacotilha", quem mais entra em jogos proibidos, de formas pouco inocentes. Muitas vezes basta olhar para a nossa roda de amigos ou conhecidos...

Sim, nem é preciso ir à América, aos políticos que são contra a prostituição e frequentam bordéis. Ou pior ainda, aos que são contra o aborto, mas pagam interrupções da gravidez às suas amantes.

Passa-se o mesmo com a droga. O mais comum é assistir a consumidores quase "clandestinos", ligados aos poderes, serem contra a sua legalização. E nem falo das preferências sexuais, com tanta gente "presa dentro no armário", que finge ser contra coisas tão simples como o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Provavelmente nunca existiram tantos políticos a seguir a cartilha: "faz o que eu digo, não faças o que eu faço", como nos nossos dias...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, dezembro 01, 2024

«Toda a gente quer receber e ninguém quer dar»


«Toda a gente quer receber e ninguém quer dar.»

Esta é uma das frase que não devem ser ditas, pelo menos nesta época do Natal.

Ligas a televisão, vês as notícias sobre toda a gente que doou toneladas alimentos ao Banco Alimentar, e pensas de imediato que quem diz uma frase destas, anda "a brincar com a malta".

Talvez seja necessário colocar os "pobrezinhos" de lado, e olhar para a sociedade com alguma frieza. E até para a nossa casa...

Perceber a indiferença crescente em relação ao outro. Pior que este esquecimento do outro, é o egoísmo, também crescente. Talvez ele até se note mais nas famílias, como me disse a Rita, com quem não me encontrava à meses.

Falou-me das dificuldades que tem em compreender a filha, de dezoito anos. Sabe que o problema é da miúda sempre ter tido tudo, não sonha sequer o que é viver com dificuldades. Se soubesse o que é querer comprar uma peça de roupa, um creme ou um perfume (só para falar dos "pequenos luxos"), e não ter dinheiro para isso... Talvez pensasse duas vezes em vez de dizer coisas parvas.

Por muito que se ande por aí a tentar fugir da realidade (os governos de propaganda, tanto do Costa como de Montenegro, ajudam mais do que parece...), não consigo deixar de dar razão à Rita...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, novembro 30, 2024

A necessidade de antecipar o Natal...


Percebo que o comércio queira antecipar o Natal, que sejamos massacrados diariamente com as suas "black friday" (que podiam perder o "friday", embora também perdesse a graça...) e que nem mesmo assim se verifiquem as enchentes tão desejadas, no chamado comércio tradicional (fora dos centros comerciais)...

Talvez seja esse mesmo comércio que faça pressão junto das Autarquias, para que se comecem a iluminar as ruas cada vez mais cedo e a instalar as árvores de Natal, quase gigantes, nos seus lugares mais centrais.

Talvez sejam essas árvores gigantes que fazem com que muitas casas já tenham as árvores de Natal montadas e se preparem as iluminações particulares neste último dia de Novembro, mesmo que não se faça qualquer "black friday" no preço da eletricidade...

(Fotografia de Luís Eme - Algarve)


sexta-feira, novembro 29, 2024

«Deixamos de ser umas coisas e passamos a ser outras, quase sempre piores. É isto, a velhice.»


Eu sabia que esta coisa de irmos para velhos, não se resumia a uma frase, tal como aquele homem, que apenas conhecia de vista, queria dar a entender.

Mas, talvez até fosse um bom resumo. Sim, «deixamos de ser umas coisas e passamos a ser outras quase sempre piores. É isso, a velhice.»

Não é preciso chegarmos aos oitenta anos, para sabermos que se perde mais do que se ganha, pelo menos em termos físicos. Mas nem tudo é mau. 

Talvez o que seja mau, seja o facto da sociedade ocidental não achar grande piada, não ter a capacidade de aproveitar as coisas boas de quem viveu mais tempo. O olhar mais vivido e tranquilo, o ser capaz de se adiantar ao futuro próximo, são tudo coisas cada vez mais banalizadas, por quem está habituado a "comprar o novo e a deitar fora o velho"...

Não sou chinês nem indiano, mas uma boa parte da sua cultura social, baseia-se no conhecimento daqueles que já viveram mais tempo, já passaram por mais coisas. E, curiosamente, são as sociedades emergentes deste tempo, que parece não ter tempo...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, novembro 28, 2024

Segurança & propaganda política


Não consigo perceber onde é que o primeiro-ministro, quis chegar, com as afirmações que fez sobre a segurança e sobre crimes no nosso país, durante a semana.

Além de revelar a sua já habitual "esperteza saloia" na interpretação de números, conseguiu ser infeliz (e até ofensivo), especialmente em relação aos crimes e às vítimas de violência doméstica, na sua primeira intervenção.

Em relação à sua segunda intervenção, sei que não se devem criar alarmismos, nem dar a importância, que o "canal do crime" português não tem, por mais audiências que sonhe ter. Mas também não se pode enfiar a "cabeça na areia" e fingir que está tudo bem (não está, os incidentes nos subúrbios de Lisboa, provam isso...).

Até porque Montenegro não é uma daquelas pessoas que falam muito bem de boca fechada (como é o caso da sua ministra da Administração Interna ou como foi o caso do ministro Cabrita no governo de António Costa...). Ele sabe muito bem o que diz e o que quer dizer.

Talvez ande mesmo em busca do eleitorado perdido para o Chega. Há uma grande probabilidade de o líder do PS estar certo.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, novembro 27, 2024

A importância do atendimento público...


Há uma tendência estúpida para olhar para os locais de atendimento público, com alguma ligeireza, e até condescendência, principalmente os ligados ao Estado.

É a explicação que encontro para a colocação nestes lugares de pessoas com algum tipo de deficiência, física ou mental. Quando os problemas são motores, não existe qualquer problema, agora quando as pessoas têm dificuldade em expressar-se ou em responder com ligeireza e acerto, às perguntas que lhes são feitas, é um erro.

Sei que toda a gente tem direito ao trabalho, mas também sei que devem ser protegidas, em relação aos problemas que têm, sejam eles de dificuldade de expressão, de raciocínio ou até de sociabilidade.

O caso real com que me debati, passou-se numa autarquia. A pessoa em causa, foi incapaz de me responder ao que pretendia. Enrolava a conversa e não conseguiu responder com objectividade a nenhuma das questões que lhe coloquei. E quando acabei por lhe perguntar quem é que me poderia ajudar, com aquele assunto, disse-me para enviar um e-mail para o presidente da Câmara. Ainda lhe disse que o presidente devia ter coisas mais importantes para fazer, que receber e responder aos meus e-mails (o que estava em causa era apenas uma actividade cultural...).

E depois agradeci a atenção e virei costas. 

Claro que fiquei a pensar no assunto...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


terça-feira, novembro 26, 2024

Continuar o vinte cinco no dia vinte seis...


Por tudo o que tenho lido e ouvido (as conferências a que assisti na sede da Associação 25 de Abril, com alguns dos protagonistas, convidado pelo meu saudoso amigo, Carlos Guilherme, foram muito importantes...), existiu mesmo a possibilidade de se desencadear uma "guerra civil", no dia 25 de Novembro de 1975, de consequências imprevisíveis, até porque existiam demasiadas armas na posse de civis (distribuídas pelo exército)...

Há três factores, decisivos, para que só existissem três mortes, e de militares, nesta operação.

Aquilo que nos nossos dias, ainda pode ser entendido como um "acto de cobardia", também pode, e deve, ser olhado numa outra perspectiva, completamente oposta. 

Foi preciso ter muita coragem, para colocar os interesses do país acima de todos os outros (militares, partidários e pessoais). Refiro-me às "ausências" responsáveis de Otelo Saraiva de Carvalho, de Álvaro Cunhal e dos Fuzileiros (que não saíram da sua unidade, para "desempatar" a batalha entre Comandos e Paraquedistas...), decisivas que que este golpe militar fosse controlado por todos aqueles que defendiam a democracia.

Isto só foi possível, porque o Presidente da República era o general Costa Gomes, uma das pessoas mais ponderadas e inteligentes, do "Verão Quente". Foi ele que conseguiu que o Otelo, o Cunhal e os Fuzileiros, ficassem em casa...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, novembro 25, 2024

O 25 de Novembro foi apenas um Golpe Militar Democrático, e não uma Revolução!


É preciso recordar que esta direita e extrema-direita, que nunca gostou de Abril (pudera, uma boa parte deles perderam uma série de regalias, perceberam que afinal eram pessoas como as outras, apesar dos privilégios que os rodeavam...), não esteve directamente ligada ao golpe militar, de 25 de Novembro de 1975.

Nesses tempos conturbados os fascistas - disfarçados de democratas conservadores -, andavam mais entretidos a incendiar sedes do PCP  e a serem protagonistas de ataques bombistas, em toda a região Norte (alguns dos quais mortais), que em preparar golpes militares democráticos.

Claro que, dia após dia, iam sonhando com a possibilidade de voltar ao poder, apostando em dividir o território português ao meio, ficando com todo o Norte do Tejo (como se a democracia não tivesse atravessado o rio...), porque o presente fazia-lhes doer. Gostavam era do país dos pobrezinhos e coitadinhos, a quem davam esmolas, para onde caminhamos, há mais de uma década...

Voltando ao 25 de Novembro, foi um golpe militar democrático, protagonizado pelo "Grupo dos Nove" (liderado por Vasco Lourenço e Melo Antunes) e pelo Presidente da República, Costa Gomes, com o apoio efectivo do PS, por intermédio de Mário Soares, que esteve sempre na primeira linha deste combate pela democracia (ao contrário dos representantes do PSD e do CDS, que hoje querem ser protagonistas...). Este golpe pretendia acabar com os excessos esquerdistas, que estavam a tornar o país ingovernável e a dividir cada vez mais os militares. 

Felizmente foi uma acção militar bem sucedida, quase sem sangue derramado, que teve Ramalho Eanes como o seu comandante operacional.

É preciso dizer que, esta comemoração, não passa de mais uma farsa, de uma direita que tenta alterar a história, como se isso fosse possível. 

E claro, também quer voltar ao "passado". Mas isso depende de todos nós e não apenas deles...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, novembro 24, 2024

Está tudo nos livros...


Poderia começar pelo "Ensaio sobre a Cegueira", de Saramago, para explicar o que parece não ter grande explicação, por caminhar a passos largos para o absurdo...

Mas o poeta e jornalista, Eduardo Guerra Carneiro, ao escolher a verdade "lapaliciana", de que "Isto Anda Tudo Ligado", diz quase tudo.

Sim, a manifestação provocatória da extrema-direita de hoje, no Porto, só pretendeu antecipar mais uma mentira das suas. Não o 24 de Novembro de 1975, não foi nada disso (fica para a amanhã a lição de história), muito menos o 25...

Felizmente Ricardo Araújo Pereira continua a ter o seu espaço televisivo e a apresentar-nos pessoas, que existem mesmo. Alguns até são deputados, como o senhor com cara de "et", que representa o PSD e atropelou uma criança em Viseu, quando esta atravessava a passadeira. Mas como todos nós sabemos, o ridículo não tem limites. É a única explicação para esse senhor ter a lata de divulgar um comunicado, surreal, em que quase culpa a criança de se ter atirado para cima do carro... E em vez de se "enfiar num buraco", ainda diz que estava completamente consciente, com os seus um vírgula tal se álcool no sangue... Provavelmente tem razão. O seu problema não deve ser a bebida, mas todos sabemos que este é o tempo do "Elogio da Loucura", escrito a mais de quinhentos anos por Erasmo de Roterdão...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, novembro 23, 2024

«Queremos ser animais e não seres humanos»


«Queremos ser animais e não seres humanos.»

Esta foi a frase que retive de uma jovem de 22 anos, como reacção ao nosso comportamento perante as guerras, mas também à forma como nos relacionamos com os outros, especialmente os que são diferentes de nós.

Era suposto falar-se de teatro. Mas o teatro é a nossa vida, pelo que fez todo o sentido soltar aquela frase no meio de nós.

Como de costume, a resposta que foi dada à miúda atrevida, cheia de ideias próprias e certezas, foi de que não podia generalizar as coisas de uma forma tão simplista.

E eu ali a pensar, "claro que pode, e que ainda bem que ela é assim". 

Sei que é a indiferença que nos vai destruindo como pessoas. 

Não há ditador que não adore a frase de que "quem cala consente". Não há um ditador que não cresça, perante a indiferença das maiorias...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, novembro 22, 2024

As imagens são muito diferentes das vozes...


Sei que parece mais uma "palissada", mas as imagens são mesmo diferentes das vozes, pelo menos quando se compara a televisão com a rádio, mesmo que pareçam incomparáveis.

Reparo também que são mais as vezes que estou de acordo, que em desacordo, com a meia-dúzia de amigos, cuja amizade dura há bem mais de duas décadas. Talvez seja também por isso que continuamos amigos...

Não, não é por isso. Normalmente quando estamos em desacordo, não nos chateamos uns com os outros (claro que existe uma excepção, mas serve apenas para confirmar a regra...).

Mas vamos lá às tais "diferenças", que os donos dos canais de notícias fingem não perceber. A rádio, por emitir 24 horas por dia, sempre teve necessidade de repetir e actualizar as notícias, hora a hora. Como as vozes não trazem imagens coladas, não têm o mesmo efeito dentro de nós que o "pequeno ecrã". O serviços noticiosos televisivos vão muito mais longe (e cada vez mais longe...), estão horas e dias seguidos a transmitir a mesma notícia, a mostrar as mesmas imagens, a repetir os mesmos comentários, ditos por uma lista cada vez mais comprida de "tudólogos". 

A coisa torna-se tão doentia, que só se podem fazer três coisas: mudar de canal, desligar a televisão, ou então, ficar preso aos dramas do mundo, como se estes não passassem de "telenovelas"...

Estivemos todos de acordo - sem excepções para confirmarem regras -, que é esta aposta na transmissão de notícias com o "guião" telenovelesco, que está a banalizar todos estes acontecimentos gravíssimos, que acontecem diariamente, especialmente os mortais na Palestina, no Líbano e na Ucrânia.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quinta-feira, novembro 21, 2024

Quando a esperteza (pouco saloia) consegue virar a justiça de pernas para o ar


Hoje foi dia de "São Sócrates", por passarem dez anos da prisão do antigo primeiro-ministro, transmitida em directo do aeroporto de Lisboa, pela televisão, alíás, pelo canal, que com o tempo se tornaria quase um órgão "oficial", do ministério público.

Hoje também foi dia dos juízes culparem a "defesa" de José Sócrates, por esta utilizar todos os expedientes, para atrasar, descredibilizar e "virar de pernas para o ar", a "Operação Marquês".

Mesmo quem acha que ele cometeu vários crimes durante a sua função governativa (é o meu caso...), sabe que tudo isto nasceu torto, alimentando a hipótese de dificilmente se endireitar, com o avançar do tempo... 

Pensamos que a prisão em directo foi o "primeiro tiro no pé" do ministério público, muito graças à acção de um "juiz justiceiro" (Carlos Alexandre, que ainda devia ter sonhos de ser um "super-herói", ao jeito da Marvel...), que apesar de fingir que se escondia das câmaras de televisão, sempre gostou de ser notícia.

Qualquer pessoa sabe que o "segredo" continua a ser a alma de qualquer negócio. E isso ainda se revela mais importante quando se trata de assuntos ligados ao crime e à justiça. E a grande probabilidade de todo aquele espalhafato, feito em redor da "primeira vez que se prendeu um primeiro-ministro",  com o tempo de revelar pernicioso para a própria justiça, tornou-se mesmo realidade.

E hoje assistimos à publicação de um artigo de jornal (no "Diário de Notícias"), escrito pelo próprio José Sócrates, em que este aproveita todos os deslizes do Ministério Público, para se declarar, mais uma vez, inocente e vítima da justiça.

Em relação ao "apontar do dedo" que a justiça faz à defesa de Sócrates, esta só fez o que lhe deixaram fazer (com  a tal esperteza, pouco saloia)...

Quem falou com sabedoria, foi a Ministra da Justiça. Era bom que todos os agentes da nossa justiça a ouvissem, e percebessem, de uma vez por todas, que são eles os principais responsáveis pelos atrasos nos processos e pela morosidade dos julgamentos.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, novembro 20, 2024

«Sabes? Foi a primeira vez que me senti importante na vida...»


Voltava para casa e pensava na quantidade de pessoas que conhecemos de vista mas que nunca iremos conhecer de verdade, nunca trocaremos mais que um bom dia ou boa tarde...

Tudo por ter o prazer de conversar e conhecer o António, um jovem que daqui a poucos meses será nonagenário, e que tinha tantas histórias para contar. Foi por isso que aos cinco minutos previstos, tiveram de ser somados muitos mais, ultrapassando a hora e obrigando à alteração da agenda. E ainda bem que isso aconteceu, porque foi um tempo ganho (para os dois)...

Vou escrever apenas sobre duas frases das muitas que ele me disse. Embora fosse um "lordesinho", por saber escrever e ler, bem (e como gostava de ler...), aos doze anos foi trabalhar para uma das fábricas de transformação da cortiça do Caramujo, e já era a sua segunda profissão, antes, com apenas dez anos, fora aprendiz de marçano na loja do André, que tinha mais de explorador que de mestre.

Estávamos na segunda metade dos anos 40 do século passado, a Guerra tinha acabado na Europa e no Mundo, mas a pobreza continuava bem presente na vida da maior parte das pessoas, que recebiam ordenados de miséria. Pobreza bem visível nas casas onde se vivia, na alimentação e até na forma de vestir e calçar... (Lá estou eu a "fugir" ao assunto)

O António era um miúdo vivaço e imaginativo, e depressa descobriram o seu gosto pelos livros (havia uma estante improvisada num dos cantos da fábrica, com meia-dúzia de livros, usados nas leituras, alguns deles lidos várias vezes, tal era o interesse que despertavam junto dos operários de ambos os sexos...).

E foi assim, que vez de escolher rolhas ou andar nas limpezas ou a recolher o desperdício, passou a ser o "leitor" de serviço. E lá vem a frase que ele me contou: «Sabes? Foi a primeira vez que me senti importante na vida...»

Entre as muitas coisas que me contou, houve outra que ficou: «Éramos obrigados a ser adultos à força. Vivemos tantas coisas nos tempos errados. Por gostar de saber coisas novas, sonhei muito tempo com a escola de Lisboa, mas foi apenas um sonho...»

Era esta a triste sina de uma boa parte das crianças da sua geração, que tinham de trabalhar, mal acabavam a instrução primária, para ajudar a equilibrar os orçamentos baixos das famílias (muito maiores que as dos nossos dias, em que ter meia-dúzia de filhos era a coisa mais normal do mundo) e não iam para a escola, muito menos passavam o tempo a brincar com os amigos...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


terça-feira, novembro 19, 2024

Conseguir resistir ao fascínio da televisão...


Conheci duas ou três pessoas que nunca tiveram televisão em casa. E estavam longe de ser aparentados com "marcianos". Era apenas uma questão de opções, de escolhas. Preferiam conversar uns com os outros, ler, ouvir música ou dar uma volta ao quarteirão, que  ficarem presos às notícias ou à telenovela da noite. E também tinham uma apetência especial por ver teatro e cinema.

O curioso era os filhos crescerem (falei com alguns...), sem sentir a falta do "pequeno ecrã", que nos influencia, muito mais do que pensamos.

Mas por alguma razão elas eram tão poucas...

É muito difícil resistir ao fascínio da "caixa mágica". E quem vive sozinho ainda terá mais dificuldade em deixar de fazer esse gesto simples, de carregar no botão e ficar com o "mundo em casa"... 

A não ser que não goste de companhia, de "ouvir outras vozes" à sua volta.

(E mais uma vez, não era bem sobre isto que queria escrever, mas agora já está...)

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


segunda-feira, novembro 18, 2024

«O que é hoje a Arte? O que é hoje um artista plástico?»


Cada vez gosto menos de ser demasiado afirmativo (a idade oferece-nos a dúvida e a incerteza, que nos tornam mais humanos...).

Tantas vezes que me limito a sorrir, por não saber que palavras usar, para responder a isto e aquilo.

Dois amigos tinham visitado uma exposição estranhíssima e tinham muitas dúvidas  de que aquilo fosse arte. Não "embarcavam" nas novas formas de expressão artística, que pelo simples facto de nos surpreenderem, mesmo que fosse pela negativa, já transportavam arte dentro de si...

Quando o Rui nos questionou: «O que é hoje a Arte? O que é hoje um artista plástico?»

Ninguém respondeu. Aliás, houve alguém que soltou uma palavra, mas mais a gozar com tudo aquilo que de que falávamos, que a explicar o que quer que fosse. E sim, ele estava certo muitos artistas são isso mesmo, uns "pantomineiros".

Eu viajei no tempo, fui até às "instalações artísticas" e às pinturas dos portões do nosso casal, criadas pelo meu pai, que mesmo sem ter qualquer formação, tinha dentro de si a alma de artista. Talvez todas aquelas coisas estranhas, que ele montava com o que já não prestava, hoje fossem Arte...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, novembro 17, 2024

"Vinde a mim, pobrezinhos do mundo..."


Os dias disto e daquilo, sobrepõem-se cada vez mais. Hoje era  dia mundial de pelo menos três coisas diferentes. Apenas vou falar de uma delas, por esta continuar a ser um dos nossos maiores flagelos sociais: a pobreza.

Depois dos tristes anos da "troika" (com o nosso Governo a ir ainda mais longe que essa gente...), o fosso entre ricos e pobres, em vez de diminuir, foi aumentando. Haverá várias explicações para isso acontecer, mas hoje nem me quero focar muito no "capitalismo selvagem" ou nas "más políticas sociais" de um partido, que de socialista só tem o nome, muito menos do seu sucedâneo, que nunca escondeu ao que vem.

Quero falar sim de toda uma indústria que tem florescido em volta dos "pobrezinhos" (sem meter no mesmo saco as associações de voluntários que tentam mesmo ajudar as pessoas...), que gosta de "coitadinhos" e se esforça para roubar a dignidade ao ser humano. 

Indústria que tem a seu lado uma igreja quase moribunda, que também sempre fez a sua "luta" em redor dos "pobrezinhos", e claro, as grandes famílias do poder, que sempre gostaram de distribuir esmolas. Com algumas "esposas do regime" a voltarem a ter a sua "corte de pobrezinhos" a quem dão "pão e agasalhos", e claro, a fazerem o respectivo sorteio, para terem um "pobrezinho" na mesa de Natal...

É por estas pequenas grandes coisas, que se percebe que crescemos muito pouco, como seres humanos. Tenho cada vez mais vergonha de viver numa sociedade que se alimenta e alimenta este "mundo dos coitadinhos", que prefere dar esmolas em vez do pagamento justo pelo trabalho.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, novembro 16, 2024

Fingimos que não, mas já anda por aí um mundo diferente...


Penso que é a primeira vez que escolho a resposta a um comentário, como título de um texto por aqui, no "Largo".

Isso aconteceu por estar a pensar em coisas próximas, que acabaram por me levar a comentar desta forma: «Fingimos que não, mas já anda por aí um mundo diferente...»

Muitas vezes, estamos tão próximos das transições, que passamos por elas sem olhar para elas, mesmo quando quase "nos tocam"...

Do que não tenho qualquer dúvida, é que, o que vem aí, em vez de nos facilitar a vida, só a irá complicar mais. E não estou apenas a falar da "inteligência artificial" (que será de grande utilidade para quem não gosta de pensar e criar, pela sua própria cabeça...). 

O que é mais incompreensível, para mim, é reparar que há demasiados países na europa a suspirarem por "salazares", "hitleres" e "stalines"...

Será que esta gente anda toda com medo da liberdade (dos outros, claro)? Ou será que estão cansados desta (falsa) democracia?

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, novembro 15, 2024

Conversas com memórias (das curiosas e boas)...


Por motivos profissionais, por vezes cruzamo-nos com figuras públicas, e por razões óbvias, tratamos-as como qualquer outra pessoa. Até somos capazes de fingir que não vemos telenovelas ou programas de "novidades artísticas", apenas porque sim...

Conversámos sobre isso ao jantar, porque a minha filha, que dá os primeiros passos na sua vida profissional, confrontou-se com uma situação destas e disse-nos que se sentiu confortável, por ser capaz de tratar a "vedeta" como qualquer outro paciente.

Acabei por viajar no tempo e ver alguns "filmes" a passarem por mim. 

Primeiro passaram estes artistas da televisão. Nunca esqueci a cena patética de um actor que passou por mim, três ou quatro vezes no corredor de um supermercado, e em vez de ser eu a olhar para ele, era ele que não parava de olhar para mim. Não se tratou de uma cena de "assédio sexual" (duas palavras que andam na moda...), mas sim de busca de reconhecimento. Não só fingi que não o conhecia, como deixei o meu olhar ficar preso nas prateleiras deste espaço comercial.

E depois apareceu-me um outro "filme" e passaram por mim as pessoas que só são conhecidas por uma minoria, os leitores. Claro que falo de escritores. Normalmente preferem observar em vez de ser observados, pelo que têm uma postura antagónica em relação à gente da televisão, que já sai de casa com a preocupação de ser vista. 

Penso que a primeira pessoa do "mundo dos livros" que cruzou o seu olhar comigo, foi o grande José Gomes Ferreira, no Chiado, no começo da década de 80 (tinha acabado de chegar à "cidade grande"...). A sua farta cabeleira branca que o vento levantava, não enganava. Durante uns segundos olhámos um para um outro com espanto e também com vontade sorrir, como se fossemos apanhados em qualquer situação imprevista. Depois perdemo-nos na multidão, sem sequer trocarmos um bom dia ou boa tarde. Fiquei sempre com pena de não lhe dizer: "Olá "Poeta Gigante".

Acabei por recordar outros encontros. O mais curioso aconteceu com a Maria Gabriela Llansol, que estava à porta de uma livraria (também no Chiado...) e me ofereceu um sorriso, daqueles bonitos, também sem palavras. Sem fugir da zona, na escadaria do metro, na estação Baixa-Chiado, cruzei-me, recentemente, com o Mário de Carvalho, ele descia e eu subia. Também ficámos uns segundos a olhar um para o outro, mais uma vez sem dizermos uma palavra, com a tal vontade de sorrir, fruto da cumplicidade que existe entre leitor e autor.

Também podia falar do encontro na Praça Gil Vicente com Luísa Costa Gomes, onde experimentámos o mesmo espanto. Mas tenho uma história ainda mais curiosa e diferente, de todas estas, que teve como protagonista a minha poeta preferida, a Sophia. Nos anos 90 cruzámo-nos na Graça (nessa altura não sabia que ela vivia por ali...), ela vinha com um saco de compras e falava sozinha. Por ter óculos escuros, só a reconheci depois de nos cruzarmos. Desta vez não houve troca de olhares. Ela estava tão entretida a "falar com os seus botões", dentro do seu mundo, que o resto devia ser apenas paisagem. Mas pela elegância e altivez, só podia ser ela, a minha Poeta...

Só por estas "viagens dentro da minha memória", valeu a pena a conversa durante o jantar...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, novembro 14, 2024

Quando se "mostra (quase) tudo", fica sempre pouca coisa para esconder...


Basta andar na rua, para ver que um dos usos do smartphone é o "auto-retrato", é normal vermos as miúdas passarem o tempo a olharem-se ao "espelho", através das câmaras deste pequeno rectângulo, que tem sido ainda mais revolucionário, que a televisão quando apareceu, no final dos anos cinquenta.

Provavelmente, depois, enviam os seus "retratos" por esse mundo fora...

Foi esta imagem que me fez pensar, neste tempo em que se "mostra tudo", mas que também dá espaço para todo o género de "ficções". Sim, oferece a possibilidade de se jogar vezes demais às escondidas, mentir (aliás fugir da realidade, talvez seja mais certo...), é mais normal que nos tempos da minha adolescência.

Claro que é um tempo de riscos, destapa-se de um lado e tapa-se de outro. Claro que ao "tapar", há sempre algo que fica à vista, que fica de fora...

São os riscos da exposição excessiva, algo que antes só acontecia com as figuras públicas quer gostavam de ser capa das revistas "cor de rosa". Agora está a banalizar-se. 

E tudo indica que todas estas "ficções" irão piorar, com as inúmeras possibilidades oferecidas pela "inteligência artificial"...

(Fotografia de Luís Eme - Alcochete)


quarta-feira, novembro 13, 2024

Mulheres bonitas muito distraídas...


Há uma coisa que sempre me fez alguma confusão, as pessoas bonitas (falo de mulheres, os jornalistas só fazem estas perguntas ao "mais belo animal do mundo"...) que dizem nunca terem dado conta do efeito que a sua beleza provocava nos outros (em nós, homens, claro)...

Ainda ontem li uma entrevista, com vinte e alguns anos, em que uma mulher elegante e bonita, de cabelo e olhos claros, disse isso. Nesse tempo ela "parava o trânsito"...

Talvez fosse uma rapariga loura muito distraída. Até porque nessa altura os piropos na rua (daqueles muito ordinários...) e os assobios, eram o "pão nosso de cada dia".

(Fotografia de Luís Eme - Algarve)