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quinta-feira, novembro 14, 2024

Quando se "mostra (quase) tudo", fica sempre pouca coisa para esconder...


Basta andar na rua, para ver que um dos usos do smartphone é o "auto-retrato", é normal vermos as miúdas passarem o tempo a olharem-se ao "espelho", através das câmaras deste pequeno rectângulo, que tem sido ainda mais revolucionário, que a televisão quando apareceu, no final dos anos cinquenta.

Provavelmente, depois, enviam os seus "retratos" por esse mundo fora...

Foi esta imagem que me fez pensar, neste tempo em que se "mostra tudo", mas que também dá espaço para todo o género de "ficções". Sim, oferece a possibilidade de se jogar vezes demais às escondidas, mentir (aliás fugir da realidade, talvez seja mais certo...), é mais normal que nos tempos da minha adolescência.

Claro que é um tempo de riscos, destapa-se de um lado e tapa-se de outro. Claro que ao "tapar", há sempre algo que fica à vista, que fica de fora...

São os riscos da exposição excessiva, algo que antes só acontecia com as figuras públicas quer gostavam de ser capa das revistas "cor de rosa". Agora está a banalizar-se. 

E tudo indica que todas estas "ficções" irão piorar, com as inúmeras possibilidades oferecidas pela "inteligência artificial"...

(Fotografia de Luís Eme - Alcochete)


sábado, setembro 14, 2024

As mulheres que gostam de mulheres e os livros...


Estava a caracterizar uma personagem no meu "caderno de ficções"  e de repente comecei a dar-lhe rostos, por ser diferente de outras. 

Escrevi: A "aparição" da Leonor recordou-me que gosto de mulheres que gostam de mulheres, tal como eu. O que pareceu uma coisa estranha, foi-se tornando normal, à medida que iam aparecendo outros rostos femininos a quererem colar-se ao papel.

Não, não tinha nada de estranho, muito menos tinha qualquer relação com preferências sexuais. Olhava para elas sobretudo como pessoas. E as mulheres que se iam soltando da minha cabeça, eram "gente boa"...

O mais curioso, foi, ter recuado no tempo enquanto escrevia. Lembrei-me da Carla, por quem tive uma ligeira paixoneta (talvez por ela me dar para trás). Demorei algum tempo a perceber que ela gostava de uma amiga comum, que era muito menos feminina que ela (os seus traços físicos dominantes eram o cabelo curto, as roupas largas e um andar sem curvas na rua). Além de eu ser distraído, nessa altura - nos finais dos anos 80 -, a sociedade obrigava-as a serem discretas...

Depois lembrei-me do Francisco (José Viegas), que foi o principal responsável por o Pedro Gama (personagem principal do meu primeiro e único romance...) ter sido trocado por uma mulher, depois da sua separação. Além de bom conversador, o Francisco era um bom conselheiro. Tivemos conversas memoráveis no seu gabinete de trabalho, em Benfica, sobre livros, cinema e futebol...

Voltei ao "caderno das ficções" e pensei que tinha ido longe demais ao escrever: Claro que não falo das mulheres que têm um homem dentro delas, que cortam o cabelo à escovinha, escondem as curvas do corpo com roupas de homem e andam de forma desengonçada. 

Não, nada disso. A ficção pode, e deve ser, pura e dura. E cada personagem pode esconder dentro de si, várias pessoas que conhecemos...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, setembro 05, 2024

Não sei se é uma provocação, se é apenas um desejo...


Sei que este titulo é bastante enganador, porque apenas se refere a um livro, que me foi oferecido há dois dias...

Mas é a melhor forma para expressar o que sinto. Não é um livro qualquer, é da autoria de alguém que não aprecio particularmente como escritor (não é apenas preconceito, li um livro da sua autoria para perceber a razão dos seus livros terem quase sempre mais de quinhentas páginas, é como a avó dizia "muita palha para a burra" e de não ser "muito amado" pelos críticos ...).

É por isso que esta "quarta oferta" de um livro de Rodrigues dos Santos, além de ser uma provocação, pode ser um desejo do meu irmão, para que me concilie com o escritor que vende mais livros no nosso país.

Falo de "Um Milionário em Lisboa", sobre a vida de Calouste Gulbenkian (uma das coisas que me faz embirrar com o escritor é o mau gosto de algumas expressões. Logo no início do livro - que estou a ler e vou sublinhar muitas vezes, coisa que normalmente não faço aos livros... - descubro a personagem Azevedo Passarão, a forma escolhida para identificar Azeredo Perdigão. Só mesmo ele, para oferecer este nome ao "padrinho" da Fundação Calouste Gulbenkian...).

E só mesmo o meu irmão, para me "obrigar" a voltar a ler o Rodrigues dos Santos...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, agosto 28, 2024

Uma "Casa Assombrada" e "Pimenta na Língua"...


Já o disse aqui, mais que uma vez, gosto do Benfica.

Claro que não sou fanático (a culpa é do meu pai...), porque as primeiras vezes que fui ao futebol, via o meu pai a assistir aos jogos do Caldas, como realmente eram, simples jogos, quase em silêncio. Não me lembro de ele chamar algum nome ao árbitro ou aos jogadores (pode e deve ter acontecido, mas nunca de forma ofensiva, como era comum à nossa volta).

Posso dizer que foi no Campo da Mata que ouvi pela primeira vez tantos impropérios, tantas ofensas, tantos insultos, e claro as chamadas "asneiras", ainda piores que as que escutávamos na rua, e não podíamos reproduzir, graças à ameaça caseira da "pimenta na língua"...

Onde eu já vou. Só queria dizer que o Benfica por esta altura, parece uma "casa assombrada", quase toda a gente quer sair do clube, apesar de ser o que melhor "recompensa" financeiramente os seus jogadores...

Apesar da grande pressão - e também de alguma ficção, como o "atirar" o nome de Sérgio Conceição para a "fogueira da luz", onde não é de todo, bem vindo - da comunicação social, algo se passa de estranho no "reino da luz"...

(Fotografia de Luís Eme - Caldas da Rainha)


sexta-feira, agosto 09, 2024

"Modernices literárias" que não entram na minha cabeça...


Depois de ler Rumor Branco, resolvi dar uma "segunda oportunidade" a Almeida Faria e comecei a ler A Paixão.

Definitivamente, sou um leitor conservador. Se não achei muita piada ao primeiro livro, nem sei que diga deste segundo... A sensação que tive, até quase ao fim do livro, é que estava a ler "listas de coisas", que nos vão acontecendo. Umas com mais outras com menos poesia; umas mais grotescas, outras mais normais. Mas nunca me convenceu como romance (aliás, olho para este livro, como "outra coisa" e não como um romance...).

Se antes já estava do lado de Alexandre Pinheiro Torres (na polémica que travou com Vergílio Ferreira a propósito do Rumor Branco...), agora ainda fiquei mais convencido.

Há modernices literárias - mesmo que sejam do século passado - que não entram na minha cabeça. Sei que o problema pode ser meu. Paciência. 

Já passei dos sessenta, e sei que há coisas que não vou mudar. Uma delas é o meu gosto literário.

(Fotografia de Luís Eme - Fonte da Pipa)


quarta-feira, julho 31, 2024

Temos é de fechar bem os olhos...


Estava a ouvi-lo e a ver-me ao espelho. 

Lá estava eu a enredar-me na "teia de contradições", que é a nossa vida... 

Ambos gostamos de escrever ficção. Adoramos ouvir histórias de e com pessoas, E depois, não consegumos acreditar em "estórias da carochinha"...

Quando ele disse, «sei que o meu forte nunca foi ter uma mente muito aberta», sorri. Continuou a baralhar-me ao acrescentar que, «nunca consegui acreditar em milagres, com ou sem santinhos.» E depois concluiu, «provavelmente o problema é meu...»

Claro que sim. O problema é nosso. 

Se fecharmos bem os olhos, até é possível termos direito a uma dessas visões milagreiras, temos é de fechar bem os olhos...

(Fotografia de Luís Eme - Tejo)


quarta-feira, julho 10, 2024

"Era como se as pessoas não tivessem crescido ou como se o tempo se tivesse esquecido delas"


Nestas férias voltei a Maria Judite de Carvalho e às suas "Palavras Poupadas" (prémio Camilo Castelo Branco).

Como de costume foi um prazer. É por isso que transcrevo um bocado de um parágrafo do conto "Uma História de Amor":

«Descia do eléctrico e tinha de fazer um pedaço de caminho a pé. Encurtava-o passando pela minha antiga rua. Divertia-me, mas a maior parte das vezes, perturbava-me ver à mesma porta, à mesma janela ou a sair da mesma loja as pessoas que há dez anos eu ali havia deixado. Dir-se-ia que só tinha corrido dentro do tempo, e que ele era para outras pessoas uma entidade estática. Um dia entrei por simples curiosidade, a fim de me documentar, na tabacaria da esquina e vi que o dono da loja conversava com o mesmo homem de um dia qualquer dos meus verdes anos, sobre um desafio de futebol que talvez não fosse o mesmo da outra vez, mas que não era com certeza muito diferente. Era como se as pessoas não tivessem crescido ou como se o tempo se tivesse esquecido delas.»

Acho que isto só não aconteceu (ou algo parecido), a quem nunca mudou de casa e de rua...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, junho 03, 2024

«Tenta escrever. Tens a história toda na tua cabeça.»


Já me tinham feito algumas propostas estranhas, mas nenhuma como esta.

A senhora cruzou-se comigo e com mais três amigos na rua, depois do almoço. Cumprimentou mais efusivamente um dos nós, de quem era amiga, depois virou-se para mim e disse que precisava de falar comigo.

Fiquei meio surpreso, mas disse que sim, sem saber o que viria dali, até porque apenas nos conhecíamos de vista e trocávamos bom dia e boa tarde. Perguntou se podia ser na segunda-feira, na esplanada de um dos cafés da Praça Gil Vicente, às 14.30 horas.

E hoje lá nos encontrámos, com a companhia de dois cafés.

Ela começou por perguntou se nos podíamos tratar por tu. Disse que sim. Depois começou-me a contar uma história que achava que poderia dar uma boa peça de teatro. Durante dez minutos escutei-a sem qualquer interrupção. Depois, com alguma lata, ela disse que estava ali para me convidar para escrever aquela peça.

Eu sorri, e, também com a lata possível, disse que ela não precisava de ninguém para escrever a peça. O drama estava toda na sua cabeça, era só colocá-lo no papel.

Fez uma careta e disse que não sabia escrever. Eu insisti e disse que só precisava de ir falando alto, como o tinha feito ali, e escrever, escrever... 

Continuou reticente. Foi então que lhe ofereci apoio, dizendo que não me importava de fazer uma leitura crítica, mas insisti: «Tenta escrever. Tens a história toda na tua cabeça.»

Vamos ver o que irá acontecer. Era bom que acontecesse teatro...

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


domingo, junho 02, 2024

"um rio chamado tempo, uma casa chamada terra"


É quase parvo dizer-se que se gosta muito da escrita de um autor, mas que não se têm lido tantos livros quantos se deviam da sua autoria.

O problema é que isso não se passa apenas com Mia Couto. Há pelo menos uma dúzia de escritores a quem faço o mesmo. Nem é muito difícil arranjar desculpas. Além de ser humanamente impossível ler todos os livros que desejamos, também é normal aparecer mais que um livro, capaz de fazer ultrapassagens, tanto pela esquerda como pela direita, fazendo com que as "filas de espera" continuem a crescer nas estantes da casa.

Mas foi um prazer imenso ler "um rio chamado tempo, uma casa chamada terra", e viajar por dentro de uma família especial (como são todas as inventadas pelo Mia Couto...), que abraça as tradições, usa os dialectos locais e reinventa o misticismo e a magia, que fazem parte do dia a dia do continente africano.

Apesar do escritor moçambicano nos levar de viagem pelo presente e pelo passado, gostar de usar metáforas, ditos populares, e até enigmas, dá-nos sempre espaço para a reflexão, para pensarmos sobre o que andamos por cá a fazer (ou a não fazer...). 

Para tornar as coisas mais enigmáticas, Mia Couto fez aparecer "cartas" ao longo dos capítulos (que aparecem e desaparecem...), trocadas entre os Marianos, cheias de pequenas e grandes curiosidades, que vão adensando a ficção. 

Foi por isso que resolvi retirar uma frase da última "epistola": «Há um rio que nasce dentro de nós, corre por dentro da casa e desagua não no mar, mas na terra.»

(Fotografia de Luís Eme - Sobreda)


quarta-feira, abril 17, 2024

Crimes (quase) perfeitos e polícias demasiado humanos...


A televisão alimenta muitas conversas, penso mesmo que falo mais de séries policiais que de "livros pretos". Entre outras coisas, porque se vê mais televisão e se lêem menos livros. Mas há trinta anos já era assim, não fale a pena falarmos da mudança de hábitos provocada pelos ventos da modernidade.

Por causa de uma série, a conversa avançou e fixou-se em quase uma dúzia de crimes que nunca foram resolvidos (andámos desde o padre Max até à jovem grávida da Murtosa, sem esquecer a menina inglesa que estava de férias no Algarve...).

Claro que as causas da não resolução dos crimes nem sempre tinham pontos comuns (a excepção era a falta do corpo da vítima em vários casos...). Foi por isso que acabámos por focar a conversa nos "crimes perfeitos" e nos "polícias incompetentes", por fazerem mais parte da ficção que da realidade, ou seja, serem normalmente mais explorados nos livros, nos filmes e nas séries. 

Nos livros então, há quase sempre um detective particular (que funciona em paralelo com as polícias...), que é mais aberto e mais claro na exploração das pistas, descobrindo a maior parte dos assassinos, antes das autoridades policiais, que também têm como papel fazer "figura de parvo" nas histórias. 

As conversas são mesmo como as cerejas. Continuámos de viagem, ao lado de autores, que tal como nós, dispensavam a arrogância e as "certezas" das polícias, tão fáceis de caricaturar na ficção...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


domingo, março 24, 2024

A importância (ou não) dos títulos


Nem sempre percebemos o porquê dos títulos dos livros e dos filmes, porque nem toda a gente tem jeito para essas coisas, nem escreve primeiro o nome e depois a obra, como fazia o nosso José Saramago.

A prosa é quase sempre mais simples de apelidar, porque normalmente não se mete em bicos de pés a ver se toca na lua. Também não costumamos questioná-los, mesmo que nos pareçam estranhos.

Nem nos nos lembramos que há pessoas capazes de escolher títulos esquisitos, só para nos verem a torcer o pescoço ou a pegar no livro de várias formas, para ver se sim, faz sentido. Sim, o mundo das artes e letras está infestado de provocadores, gente que ama a diferença, mesmo que ela seja a negação de tudo o que faz sentido.

Pensei nisto ao ler um conto, "A Galinha que não dava ovos", que não tinha lá dentro nenhuma galinha, nem sequer falava dos campos ou de aviários. Havia ali muito surrealismo. Embora não tenha encontrado a "galinha", sei que ela podia ser tantas coisas, até a televisão avariada, que continuava no mesmo lugar, onde antes falava e fazia companhia à avó.

Claro que quando estiver com a Carolina, vou perguntar-lhe duas ou três coisas, sem falar logo da galinha, que pode estar ali apenas para nos baralhar as ideias...

(Fotografia de Luís Eme - Beira Baixa)


terça-feira, março 12, 2024

O primeiro episódio das "conversas que se dizem quase ao ouvido"


Talvez por eu não o tratar como um maluquinho, muito menos me preocupar muito onde começava e acabava a ficção que se misturava com as suas memórias, ele não parou de me contar as suas inquietações.

Não sei porquê, mas fixei-me nessa palavra bonita que é a liberdade, enquanto ele me falava das suas duas "casas" na Capital:

«Sei que devo estar a sonhar ou a imaginar coisas, mas penso muitas vezes que a barraca que construi e fui viver depois de casar, e onde nasceu o meu primeiro filho, era melhor que esta casa de cimento.

Esqueço-me do frio, do calor, da falta de luz eléctrica e de água canalizada, e de tantas outras coisas, que eram tão más e feias, que apaguei-as mesmo da minha cabeça.

A única coisa que me ficou foi a sensação de liberdade que existia. Acho que por não ser uma casa a sério, tornava tudo mais fácil. E também sabia que era difícil viver pior. E sorria com isso... É por isso que às vezes penso que devo estar a amalucar.»

Expliquei-me que não. Provavelmente ele foi feliz naquela barraca, mesmo que fosse tudo demasiado pobre e miserável. E só se lembrava dessa sensação, que há distância de 40 e muitos anos, lhe parecia uma outra coisa...

Nota: Vou chamar a estas conversas, "Coisas que se dizem quase ao ouvido", que nascem do diálogo que tenho com algumas pessoas que gostam de falar sem "travões" e nos contam toda a história da sua vida, mesmo sem lhe pedirmos...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, novembro 24, 2023

A Marinha entre a realidade e a ficção...


Quando finalmente foram feitas reportagens sérias sobre os efectivos existentes nas nossas forças armadas e se diz o que se calculava há bastante tempo, que a pirâmide estava invertida, que existiam mais oficiais e sargentos que praças, eis que surge hoje o CEMA, radiante, com o futuro nas suas mãos.

Quando ele disse ao "D. Notícias" «Estamos a construir uma nova Marinha. Uma Marinha que assegura a defesa do país, o exercício da soberania e da jurisdição nacional, a preservação dos nossos recursos e a proteção do ambiental.» E não satisfeito, comunica que: «Também modernizaremos os laboratórios da Escola Naval, que vão permitir uma formação de excelência dos nossos oficiais, preparando-os para a era digital e um novo paradigma de atuação.»

Talvez esteja aqui a "chave do futuro", a nova marinha seja só com oficiais, os tais da formação de excelência... Que ao mesmo tempo, também são incapazes de fazer o que alguns sargentos e praças fizeram nas ilhas, por um navio não estar em condições de navegar... (abanando ligeiramente o sonho do CEMA de um dia "ser presidente da república", com mais ou menos bananas).

Pois é, talvez os navios do futuro só tenham oficiais nas suas guarnições. Talvez... 

Nessa altura já devem existir "robots" para fazer o trabalho mais duro e chato dos navios, normalmente destinado às praças...

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


segunda-feira, outubro 09, 2023

Uma boa série e um livro com "falta de sal"...


Estou a ver o segundo episódio da série "Codex 632".

Provavelmente por ter algum preconceito com o "escritor-apresentador de telejornais", fico com a sensação de que a série é mais interessante que o livro. 

Isso também de deve à interpretação de Paulo Pires e ao facto de as coisas no cinema e nas séries serem sempre mais resumidas que nos livros. E também me parece uma série bem realizada, por Sérgio Graciano.

O mais curioso é que o "Codex 632" foi o único livro que li do José Rodrigues dos Santos. 

Foi suficiente para perceber o tipo de escritor que ele é, distante da "minha praia", onde o mar além de ser bastante vivo, tem voz e alma...

(Fotografia de Luís Eme - Costa de Caparica)


segunda-feira, agosto 07, 2023

«O segredo é a capa. Quase que abre a porta à ficção.»


Estávamos ali os dois, quase perdidos, a ver este calor de Agosto chegar, mesmo que ainda fossem nove da manhã.

Pouca gente à nossa volta na esplanada do café, muito cerimoniosa ou ainda sonolenta. Éramos os únicos que falavam, os outros viam e liam as novidades através do pequeno rectângulo que lhes enchia as mãos e os olhos. Só um homem lia o jornal (esse mesmo, o do costume...) e parecia deliciado.

O meu companheiro falou da estranheza de já não se verem pessoas a lerem jornais desportivos. Eu, meio a brincar meio a sério, disse-lhe que talvez prefiram ser informadas pelos programas onde se comenta aos gritos, quase num teatro televisivo. Mas depois lembrei-me do meu vizinho do rés de chão que compra todos os dias a "bíblia", que se tornou um jornal comunitário. Expliquei o seu percurso, tal como ele me contou. Compra o jornal às oito, juntamente com o pão para o pequeno almoço, às dez volta a sair de casa e deixa-o no restaurante do Carlos, onde passa por várias mãos, até ser levado por outras mãos amigas, depois do almoço, para voltar a ser lido por vários olhos.

Voltámos ao "jornal-rei", que além da capa sugestiva, tem sempre um manancial de informação. Fala-se dos bombardeamentos da guerra, dos incêndios que voltaram (quem terá acordado os malditos incendiários?), dos homens que batem em mulheres, das corajosas que fartas envenenam trastes que também eram maridos, do jogador que foi vendido pro milhões... e sim, também dão relevo a uma qualquer odalisca, meio vestida, que trocou de marido, como se troca de automóvel. E poderia continuar. É de facto um jornal com notícias.

E sim, quando o Carlos disse: «O segredo é a capa. Quase que abre a porta à ficção.» Estava quase certo. Só é pena que os seus leitores não fiquem famintos de ficção e se voltem para os livros das boas e grandes histórias...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, junho 05, 2023

A Mulher que sorri e "passa por dentro dos filmes"...


Ela sempre que me vê oferece-me um sorriso, de mão dada com um olá. Eu retribuo.

Às vezes fico a pensar que devia ir atrás dela e convidá-la para beber café, para saber se ela ainda continua a fazer a mesma coisa, a "passar por dentro dos filmes".

Só falámos uma vez, num daqueles acasos, que quase que nos empurram uns contra os outros. Aquela não era a nossa onda e foi por isso que começámos a fugir para o miradouro que num dos cantos olhava para uma nesga do Tejo.

Não foi por acaso que escolhemos aquele canto. O Tejo pertencia-nos, tanto do lado de cá como do lado de lá. E só podia ser ele a soltar-nos a língua... Quis saber o que fazia e eu disse-lhe que escrevia coisas. Ela ofereceu-me o seu sorriso luminoso e disse que não escrevia mas fazia várias coisas.

Quem diria, éramos os dois especialistas em "coisas"...

Depois disse-me que entrava em filmes, mas não era actriz. Foi quando exclamou: "Passo por dentro dos filmes."

Fiquei sem perceber se ela estava a brincar ou a falar a sério. Foi quando me ofereceu três títulos de filmes, acrescentando que estavam disponíveis no "YouTube".

E depois olhou o relógio disse que tinha de se ir embora e deixou-me por ali, quase abandonado.

Quando cheguei a casa fui directo ao computador, para ver um dos filmes e perceber alguma coisa, daquela conversa quase estranha. Quando a vi, na primeira das duas cenas em que entrava, percebi que não havia nenhum enigma. Ela estava certa, entrava no filme mas não participava. Caminhava mas não falava. Estava só lá, a passar.

Era mesmo verdade, aquela moça de que ainda não descobri o nome, "passava mesmo por dentro dos filmes".

Como devem calcular, trata-se de uma ficção. Se fosse verdade, já a tinha convencido a beber um café e a contar-me mais coisas da sua vida.

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


sábado, maio 13, 2023

Coisas Estranhas (ou nem por isso)


Parece que ninguém se anima (nem acredita...) com os bons resultados da nossa economia.

Mas não é assim tão estranho. Já todos percebemos que além de se mentir muito, também se inventa outro tanto.

E talvez até possa ser assim, à nossa custa. Quando a realidade  nos mostra o preço dos legumes, da fruta, da carne ou do peixe (até já publicitam o valor de cem gramas disto e daquilo), sabemos que uma fatia do que pagamos vai para o "estadão". 

Como diz o Carlos, é o que acontece quando se vive num país com um passado duvidoso, um presente incerto e um futuro inexistente...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


quinta-feira, fevereiro 16, 2023

"Uma Sereia Chamada Ermelinda"


Nos anos em que ando mais envolvido com projectos literários, leio menos.

O mais curioso, é esta quase pausa, começar logo em Janeiro, mesmo que no começo do ano ainda tenha bastante disponibilidade para ler.

Este mês pensei que talvez seja possível "fintar" esta quase paragem com a escolha de livros mais pequenos e interessantes... A minha primeira escolha foi a peça de teatro "Uma Sereia Chamada Ermelinda", da autoria de Alexandre Castanheira (lida em dois "actos"...). O mais curioso, foi ter assistido à peça em 2011 (ano da edição do livrinho que me foi oferecido pelo autor...), que se baseava no romance autobiográfico, "Cais do Ginjal", de Romeu Correia, encenada pela Associação Manuel da Fonseca, e nunca a ter lido.

Gostei de ler a peça, porque Alexandre Castanheira não se cinge ao "Cais do Ginjal" (pelo menos foi o que senti...), há por ali pequenas coisas dos "Tanoeiros", do "Tritão" e até de obras biográficas, como a história de vida de Armando Arrobas, que Romeu quase imortalizou.

E tem também uma forte componente de resistência e consciencialização política, através da Ermelinda, que é muito mais que uma "sereia"...

Foi bom reviver lugares e personagens (dentro e fora dos livros), numa obra que tem uma dedicatória muito singular e pessoal...


segunda-feira, outubro 03, 2022

É mais comum do que parece, dar voz dentro dos livros, ao "Ressentimento", que existe dentro de nós...


O último romance que li foi "Dentro de Ti Ver o Mar", de Inês Pedrosa. Não gostei da história, nem da caracterização das personagens pela autora. Achei tudo muito "telenovelesco"...

Além de sentir que o livro era demasiado explicativo (gosto de ter espaço para pensar e imaginar dentro das histórias...), também me pareceu ter sido  escrito quase como um "ajuste de contas", para com os homens. Homens esses, que no que toca ao amor e ao sexo, segundo a Inês, são quase todos uns "canalhas"...

A única coisa boa desta leitura foi ter-me feito pensar bastante, nesta coisa "complexa", que são as relações (de todo o género) entre homens e mulheres. Acho mesmo que nunca nos conseguimos perceber, totalmente. E é algum do mistério que permanece entre nós, que faz com que não desistamos uns dos outros.

Como sempre me relacionei profissionalmente com mulheres, sem que existissem interferências amorosas e sexuais (às vezes a custo, porque existem sempre jogos de sedução, de parte a parte...), tenho alguma dificuldade em compreender a autora. Eu sei que sempre tive uma "desvantagem", nunca exerci qualquer tipo de poder sobre mulheres (ou homens...), sempre tivemos uma relação de igual para igual. Nunca fui chefe de nada, quanto muito fui coordenador de várias actividades, com mais trabalho que poder.

Claro que não é a primeira vez que sinto que existe "ressentimento" dentro de um livro. É até mais comum do que o que possa parecer. 

A escrita também serve para exorcizar os nossos fantasmas...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, setembro 15, 2022

Talvez seja Solidariedade (espero que sim)


Em duas das telenovelas portuguesas da noite fico com a sensação de que a solidariedade anda de mão dada com a banalidade. Não sei se isso acontece propositadamente, mas espero que sim.

Reparo que as telenovelas "Pôr do Sol" (RTP) e "Lua de Mel " (SIC), dão trabalho a mais de uma centena de actores. Embora os textos sejam repetitivos e banais (e se use e abuse do humor directo, para não lhe chamar outra coisa...), gostava que isso acontecesse porque há a vontade de se criarem mais empregos - numa das áreas mais atingidas pela pandemia: a cultura.

Se for isso que está a acontecer, finjo que esqueço a sua má qualidade e deixo aqui o meu aplauso, por se voltar a dar importância às pessoas.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)