terça-feira, setembro 30, 2014

O Cinema é Mesmo uma Paixão


Embora Outubro seja o mês da música, aqui no "Largo", vai ser o mês do cinema, mas sem exclusividades.

Ou seja, haverá outras portas abertas para além do "grande ecran" (é tão diferente ver um filme no cinema e em casa na televisão...), de mãos dadas a outras artes, e claro, sempre com uma perspectiva pessoal.

Sei que num mês não cabem todos os filmes e actores que gosto... mas isso até pode ser um bom pronúncio, talvez não me falte assunto pelo Outubro fora...

segunda-feira, setembro 29, 2014

«Sim, sou mais Almadense que Caldense»


Querias saber se eu era mais Almadense que Caldense (não é a primeira vez que me fazem essa pergunta...). Embora te respondesse apenas com um sorriso e com os braços abertos ao Tejo, penso que percebeste. Claro que sou mais almadense.

Mesmo sabendo que a Almada que considero minha não é a Almada de toda a gente. Digo isto porque a minha Almada  é demasiado livre e simples para estarmos a perder tempo com lengalengas sobre diferenças sociais ou outras miudezas.

Deve ser por isso que do meu núcleo de amigos não conheço ninguém que tenha comprado um carro ou uma casa, em função do irmão, primo ou vizinho. Ou seja, não adquiriu algo para mostrar, mas sim para usufruir.

Já das Caldas da Rainha, não posso dizer o mesmo. São muitos os exemplos de quem passa a vida a olhar para o "quintal do vizinho", ignorando a sua própria vidinha e vontade.

Esta é apenas uma das muitas diferenças que existem entre uma cidade de esquerda e uma cidade de direita.

É também por isso que me sinto mais almadense que caldense.

Nem sequer tenho medo de ser confundido com qualquer comunista (dos verdadeiros, não dos interesseiros...), por acreditar que num mundo mais justo era mais fácil sermos todos felizes...

Esta minha fotografia retrata o Outono em Almada, com folhas caídas mas solidário.

domingo, setembro 28, 2014

80 Anos, Nem Sempre Belos


Brigitte Bardot faz hoje 80 anos e merece ser recordada aqui no "Largo", por várias razões.

A primeira, pela beleza e sensualidade que transportou para as salas de cinema, ainda por cima numa época que teve de competir com as "deusas" de Hollywood e também com algumas italianas (Sophia Loren, acabou de fazer a mesma idade...), quando o cinema da bela Itália era respeitado (e adorado...) em quase todo o mundo.

Talvez BB - como se tornou mundialmente conhecida - tenha beneficiado da herança iniciada por Marilyn Monroe, que tanto valorizou as louras, pelo menos no mundo dos homens. Talvez... 

Claro que Brigitte não morreu cedo para alimentar o mito, mas deixou de fazer filmes muito antes do seu prazo de validade expirar (com apenas 39 anos), o que também a ajudou a permanecer "viva" no mundo das estrelas. 

A partir do seu adeus ao cinema começou a ser notícia pelas suas declarações polémicas (algumas racistas e homofóbicas) também e pelo seu papel na defesa dos animais.

Quando tentam menorizar a inteligência das "louras", não podem dar o exemplo de BB. Ainda esta semana num documentário francês (Canal France 2) disse: «Representei a liberdade, a juventude e a felicidade. Hoje não sou assim.» Provavelmente, quando abandonou a Sétima Arte, sabia que não poderia representar por muito mais tempo estas três boas variações humanas, nem se quereria sujeitar a outros papeis, que não o seu.

Não sei até que ponto ela foi importante para as mulheres portuguesas (nós homens nunca sabemos muito bem...), mas penso que lhes transmitiu um ar fresco e permitiu que se usassem roupas mais leves e garridas, num país que primava por manter as janelas e portas quase fechadas para o exterior.

sexta-feira, setembro 26, 2014

Desarranjos & Estragos


Hoje foi um dia daqueles que acabou tarde, sem me dar qualquer hipótese de passar por aqui. Nem mesmo ao almoço.

O curioso foi apanhar uma daquelas frases estranhas que se soltam nas ruas, e que não se apanham todos os dias e ficam coladas aos nossos ouvidos, ainda antes do almoço. A meio da tarde lembrei-me que provavelmente à noite, se quisesse escrever sobre ela, já não devia prestar, tinha perdido a piada.

Não a perdeu na totalidade, mas...

Mesmo assim eu conto.

Vinham três mulheres de gerações diferentes a conversarem sobre alguém ausente, também mulher, provavelmente caída em desgraça no "bairro do amor".

Dizia a mais nova: «ela tem muita culpa do que aconteceu, deixou de se arranjar e começou a ficar estragada.»

O que me chamou a atenção foi o uso de palavras vulgares numa frase quase invulgar...

Não sabia que as mulheres ao deixarem de se arranjar ficavam estragadas, como se fossem  "objectos" ou "brinquedos". Mas o que achei  mais estranho foi esta conversa desenrolar-se entre mulheres, que talvez achassem que a sua missão era andarem "arranjadas", para agradarem aos seus homens...

O óleo é de Shirin Donia.

quarta-feira, setembro 24, 2014

A Noite Pode Ser Outra Vida


Não sei qual é a maior virtude da noite, sei apenas que dá muito mais oportunidades à criatividade, e até ao sonho, que o "dia solar", que decorre de uma forma geral entre as nove da manhã e as cinco da tarde.

Embora esteja a uma distância mais que segura da noite - nem  sequer me lembro da última vez que assisti ao amanhecer -, às vezes sinto saudades de levar uma daquelas cantadas, que nos tentam virar do avesso, de uma ave nocturna.

Até por saber que é sempre bom não nos preocuparmos com o facto de as pessoas misteriosas e aparentemente interessantes, serem metade lenda metade realidade. 

O óleo é de Keita Morimoto.

terça-feira, setembro 23, 2014

A Natureza e a Estupidez Humana


A sabedoria popular gosta de nos dar lições, que recebemos com um sorriso, mas raramente as levamos a sério.

É por isso que só nos lembramos de Santa Bárbara quando chove...

A natureza continua a lançar-nos avisos e nós teimamos em navegar no erro...

Continuamos maia preocupados com o nosso conforto e bem estar que com o equilíbrio ambiental (é cada vez mais notória a seu quase "tonteria"...).

Não é por acaso que em vez de quatro, caminhamos para um tempo de apenas duas estações...

Mal chegámos ao Outono e as chuvas já transformam as ruas em rios de lama. Foi só um sinal...

O óleo é de Diane Garcez de Marcilla.

segunda-feira, setembro 22, 2014

Um Mundo de Cedências...


Tenho evitado falar aqui de futebol, mas hoje Fernando Cabrita deixou-nos, um antigo avançado centro algarvio, internacional, que mais tarde foi também treinador de futebol, com algum sucesso (ainda que tenha sido durante muitos anos adjunto no Benfica).

O seu momento de ouro coincidiu com a época em que o conheci, a sua passagem como seleccionador nacional (era ele que dava a cara, embora fizesse parte de uma equipa técnica com José Augusto, Tony e António Morais), da "equipa de todos nós" que brilhou no Europeu de 1984, que se realizou em França, atingindo as meias finais.
Esta participação tinha tudo para correr mal, porque a rivalidade entre o Benfica e Porto foi levada ao extremo (ao ponto dos então adjuntos destes clubes - Tony e Morais - terem sido incluídos na equipa técnica).
A bonomia e a honestidade de Fernando Cabrita, a par da classe dos jogadores, claro (estavam lá alguns dos futuros campeões europeus do FC Porto, um super Chalana - que seria contratado pelo Bordéus - e um Jordão e Nené, a despedirem-se da melhor forma da selecção...), foram decisivas para este êxito.
Penso que ele não foi mais longe no futebol por ser boa pessoa (aconteceu o mesmo a outros como o Tony, o Damas, o Manuel Fernandes, etc), por não terem feitio para andar sistematicamente com as mãos sujas e a olharem para o outro lado da bola.

Infelizmente o mundo transformou-se de tal forma, que só se consegue chegar ao topo de uma empresa, de um país, entrando em jogos obscuros, fazendo as tais cedências (o caso mais extraordinário nestes "jogos" foi Portugal conseguir ter um Presidente da União Europeia...) a um conjunto de pessoas que alimentam o "sistema"...

Voltando ao Fernando Cabrita, recordo sobretudo o seu sorriso fraterno, e a forma aberta como se relacionava com os jovens, como foi o meu caso. Para ele o futebol não tinha segredos. E ainda bem.

domingo, setembro 21, 2014

O Quase Falso Cantor...


Leonard Cohen fez hoje oitenta anos. Era para não escrever nada, por ser uma "não notícia", ou seja, por ser festejada naturalmente em milhares de blogues.

Mas há sempre algo de pessoal que podemos acrescentar à volta de Cohen, como as discussões que tinha com um amigo no final da adolescência, que não achava qualquer piada ao homem da voz rouca que não sabia cantar e então falava em cima da música...

Só que eu gostava da forma como ele (não) cantava, era um daqueles casos raros, que não precisava de grandes dotes vocais como cantor para nos prender às suas palavras. Nós também temos um caso parecido, o Pedro Abrunhosa, que está longe de ter uma grande voz, mesmo assim consegue escrever e cantar coisas que ficam, especialmente algumas baladas...

sábado, setembro 20, 2014

A Nostalgia de Ver o Verão a Fugir


É difícil não sentir alguma nostalgia, ao ver o Verão a escapar-nos assim, quase por entre os dedos, ainda em Setembro.

Pelo menos a temperatura continua agradável e ainda tenho conseguido ir de calções à fisioterapia, mas sei que deve ser por pouco tempo... 

Acho que ainda não nos adaptámos a estes dias que conseguem ser visitados pelas quatro estações em apenas meia dúzia de horas. Além de ser estranho (podemos estar vestidos para o frio e sentirmos o Sol a queimar, ou estarmos vestidos para a calor e levarmos com vários baldes de água, no corpo, quase sem aviso prévio) é estúpido, mas parece que só temos o que merecemos.

O óleo é de Thengis Rioni.

sexta-feira, setembro 19, 2014

Os Candeeiros e as Muletas do Seixal


O meu fascínio pelos candeeiros, fez com que não deixasse escapar uma das imagens de marca do Seixal, na minha passagem por esta Terra tão especial.

Para quem não consegue identificar as antigas embarcações de pesca (de arrasto), informo que se trata de Muletas, que surgem na parte superior dos candeeiros do chamado centro histórico - tal como os Corvos da Capital - e os tornam ainda mais especiais...

quarta-feira, setembro 17, 2014

As Mentiras Necessárias e as Outras


Todos mentimos, uns mais que outros, claro. Quem não faz da mentira um "acto de fé", utiliza-a quase sempre para evitar chatices, entre outros males maiores (o que nem sempre se consegue...).

Claro que depois existem os outros, uns fulanos quase profissionais, que sabem que podem mentir à vontade, porque não lhes vai cair dente nenhum. Falámos deles hoje durante o almoço.

Tudo porque um acontecimento histórico saltou para a mesa, cansado de ser deturpado pela acção de dois ou três mentirosos. Senti que era o menos preocupado com o caso, por saber da existência de vários documentos credíveis que desmontavam facilmente a mentira em questão. 

Mas a grande questão, era o porquê desta insistência, sem pés nem cabeça. A única explicação que encontrámos era a tese (falível) de que uma mentira muitas vezes repetida, mais tarde ou mais cedo, pode acabar por se sobrepor à verdade, num país quase "quadrado", como o nosso. 

Já nem nos espanta o silêncio de quem conhece os factos e vai deixando a mentira crescer, muitas vezes apenas para não comprar uma discussão.

Só agora é que reparei que isto poderá parecer conversa de tontos. Perguntarão vocês: «Porque razão não chama os 'bois' pelos nomes?».

Porque isso é o menos importante. O que ganha importância, neste e noutros casos, é a sanha dos mentirosos. A forma decidida como se entregam a mentira. E claro, num outro plano, a cobardia da gente que parece ter medo da verdade...

A ilustração é de Loui Jover.

terça-feira, setembro 16, 2014

Transcrições Sobre a Nossa Justiça...


«Quero que a justiça se faça, no caso da Casa Pia, doa a quem doer, mas para que possa ser implacável é preciso que seja leal, correcta. Disso depende a confiança dos cidadãos no sistema. Eu não falo em cabala, nem o PS usou essa palavra. Mas falo no que o advogado de Paulo Pedroso falou: urdidura ou maquinação. E temo que o objectivo seja, não atacar o PS, mas a justiça. E salvar os criminosos, da pedofilia ou outros.»

                                          Ana Gomes, “D. Notícias”, 12 Out. 03

«No Portugal do século XXI, só um juiz se pode dar ao luxo de convocar dezenas de pessoas para comparecer no mesmo dia, à mesma hora, para um audiência de um julgamento que tem uma grande hipótese de não se realizar.»

                                              Jorge Fiel, “Expresso”, 22 Out. 05

«A verdadeira crise da justiça é esta: a generalizada convicção de que há duas leis penais, uma para os portugueses comuns outra para os influentes e poderosos. Quanto ao mais, porque havia o futebol de ser uma ilha de honestidade no resto da sociedade portuguesa?»

                            Manuel António Pina, “J. Notícias”, 23 Fev. 06


«Esta sociedade é muito hipócrita. Quem roubar até 10 mil contos é ladrão, quem roubar até 100 mil faz um desvio, quem roubar para cima de um milhão faz uma operação de engenharia financeira.»

                          António Coimbra de Matos, “J. Negócios”, 2008

A Justiça falha e muito. Não sei se por corrupção, se por incompetência, se por maldade. Sei é que falha. E sei que não gosto nada de viver num país em que nós, cidadãos comuns, quando comparecemos perante ela, estamos expostos a dois vereditos - condenados ou absolvidos, enquanto os poderosos beneficiam de uma terceira via: a prescrição, uma imoralidade que lembra a carta "Saia da Prisão", do Monopólio, que guardávamos para usar quanto caíssemos nessa casa.»

                                            Jorge Fiel, “J. Notícias”, 24 Mar. 14

«O ‘Face Oculta’ não é um esquena entre gaviões, é um retrato de corrupção no país que a pratica e tolera. Armando Vara ou José Penedos são poderosos e famosos mas o processo está cheio de gente fraca e desconhecida. Não é um polvo, é uma forma de estar, que envolve políticos com acesso a cargos de poder em empresas públicas, um sucateiro com quem fizeram uns contratos em troca de algumas coisas e muita gente nessas empresas que recebia umas luvas para levantar a cancela ou fechar os olhos a uma pesagem mal feita.»

                             Pedro Santos Guerreiro, “Expresso”, 06 Set. 14

O óleo é de Valentino Ciusani.

segunda-feira, setembro 15, 2014

Hoje foi a Brincar...


A escola começa amanhã, hoje foi dia de apresentações.

A Sofia vai para o 5 º ano, toda ela é expectativa e vontade de começar a subir este novo degrau. O Miguel vai para o 11 º ano e como de costume, vai porque tem de ser... claro que deve ter algumas saudades, pelo menos dos intervalos e de algumas miúdas giras. Coisas que não se dizem aos pais.

Fui à reunião com a directora de turma da minha pequena e até simpatizei com a senhora, sem nariz empinado. Mas continuam a espantar-me estes convívios, repletos de perguntas desnecessárias, de pais que parecem não ter autonomia, que querem que os professores lhe expliquem todas as coisas, por mais insignificantes que sejam, com vírgulas e tudo.

O óleo é de Luiz de Souza.

domingo, setembro 14, 2014

O Passo em Frente Feminino


Não sei se o Carlos sabe assim tanto de mulheres como demonstra saber. A única certeza que tenho é que ele é o maior "teórico" e talvez o que mais tem lido sobre elas, da minha roda de amigos.

Nem sequer sei se o facto de nunca ter casado, é uma vantagem, mas acho que não. Claro que ele pensa que sim. O Chico já lhe disse mais que uma vez, para ele casar primeiro e depois então esclarecer-nos sobre o abc das mulheres. Deve ser por isso que fala menos quando o Chico está, até por não achar piada à risota geral que este provoca, quase sempre.

A Rita normalmente limita-se a ouvir, embora diga que se farta de aprender coisas sobre ela própria, com o Carlos. E nós ficamos sempre sem saber onde começa ou acaba a ironia dela...

Desta vez disse-nos que as mulheres sabem sempre mais sobre nós, que nós sobre elas. E não apenas uma questão de sorte, de informação que lhe vai parar às mãos. Elas vão à procura, e como são mais sabidas que nós, são capazes de ir buscar coisas do arco da velha, para obter "informações privilegiadas".

"Rematou" a conversa com um decisivo, «elas estão sempre um passo à nossa frente, em quase tudo. Aposto que a única pessoa aqui na mesa que sabe se amanhã vai chover é a Rita». E mais uma gargalhada geral. 

A Rita chamou-lhe «safado», por a estar a meter ao barulho, embora acabasse por confessar que amanhã ia estar um dia com céu nublado e alguns chuviscos. Aconselhou-nos a não acreditarmos em tudo o que o Carlos diz, e que se as mulheres sabem o tempo que vai estar amanhã, é porque não usam apenas calças e sapatos, também usam saias, vestidos e sandálias...

O óleo é de Edward Cucuel.

sexta-feira, setembro 12, 2014

O Passado é uma Ficção


O mundo tornou-se numa coisa estranha, com formas de comunicação cada vez mais impessoais e solitárias. Pelo menos para quem continua a gostar mais de de falar com pessoas, que com computadores, telemóveis, cães ou gatos.

Claro que é mais fácil falar para uma máquina, para um cão ou um gato.

Pensei seriamente neste assunto, quando ouvi um idoso a dizer a todos os "passageiros" do autocarro, que queria o mundo dele de volta. Olharam para ele como se fosse um maluquinho, ou seja fingiram que não o viram por ali, muito menos o escutaram.

Insistiu mais duas ou três vezes, antes de sair na sua paragem, que queria o seu mundo de volta. Queria voltar a ter apenas dois canais na televisão, jornais de papel e telefones com fios.

Estava farto de ver gente hipnotizada com os telemóveis, presa aos jogos e à internet.

Fiquei a pensar nas palavras daquele pobre homem, que ainda não tinha percebido que o passado é uma ficção...

O retrato a óleo de Jorge Luís Borges é de  Adriana Mufarrege.

quinta-feira, setembro 11, 2014

O Dia de Todas as Distracções


Tal como as pessoas da fotografia (de Thomas Hoepker), estávamos distantes do que estava a acontecer no coração de Nova Iorque, a 11 de Setembro.

Distância que se torna maior se pensarmos na nossa reduzida importância e até na nossa quase invisibilidade, que faz com ainda sejamos olhados como uma das regiões autónomas de Espanha (como era vontade de tantos intelectuais do século XIX, até mesmo Eça, que está sempre na moda nos momentos de crise, agora ainda mais com a adaptação de "Os Maias" por João Botelho...).

Esse distanciamento e a habilidade dos nossos políticos e comentadores - que só falam do que lhes dá jeito ou apetece -, tem feito que percebamos as questões externas de uma forma transversal, como tem acontecido com  o negócio das armas, dos estados "puritanos" que armaram iraquianos, afegãos, sírios, líbios, libaneses, etc, para algum tempo depois de fabricarem "monstros", virem defender a sua destruição...

O aparecimento do tão propagado  Estado Islâmico é lapidar. O importante era destruir mais um ditador, Assad (depois de Saddam e de Kadafi), sem sequer se pensar no que se poderia receber de retorno. Não se aprendeu nada (ou não se quis aprender, as fábricas continuam a produzir armas, o negócio não pára...) com as invasões ao Afeganistão e ao Iraque...

Para quem está de fora do negócio, parece que o feitiço está sempre a virar-se contra o feiticeiro.

Na realidade, não sei se é bem assim...

terça-feira, setembro 09, 2014

Ter um Irmão Diferente


Viajava no interior de uma das carruagens do metro de Almada quando reparei num homem que caminhava sozinho na rua. 

Por não ter nada em que pensar naquele momento, fui durante uma boa parte da viagem a pensar nele. Ou seja, na estupidez que é (no mínimo), não se conseguir aceitar a homossexualidade de um irmão. Olhei-me ao espelho e pensei que se o meu irmão fosse diferente, não viria mal nenhum ao mundo, não deixaria de ser meu irmão. Muito menos me preocupava com o olhar dos outros e com as palavras trocadas nas minhas costas.

Embora nunca tenha falado no assunto (sei que dificilmente terei alguma  hipótese...), penso que o Fausto tem muito mais problemas com o que os outros pensam, que com o que ele pensa... Foi por isso que preferiu apagar o irmão da sua vida, sem qualquer espaço para conversas.

A fuga para a frente e para os lados ainda é a arma escolhida nestes casos, dentro de muitas famílias, de preferência sem explicações e feridas expostas.

O óleo é de Lima Junior.

segunda-feira, setembro 08, 2014

Fora de Moda


Há muito tempo que sei ser um sujeito fora de moda.

E não é por gostar dos anos vinte ou de Paris (a escolha da ilustração de Helena Lam foi quase aleatória, mas não deixou de ser uma boa escolha...).

A Rita foi ao cabeleireiro no fim de semana. Apareceu com o cabelo mais curto e penteado de lado. Não lhe disse nada embora me apetecesse dizer-lhe que tinha gostado da mudança.

Pensei na necessidade que as mulheres têm de mudar e nós menos (muito menos). São só espelhos à sua volta, até nos cartazes de publicidade espalhados pela Cidade, com roupas, perfumes, cremes ou outra coisa quaisquer, sempre com o brilho da beleza feminina a despontar.

Mas um sujeito que fala sem se cansar (a canseira fica sempre para os outros...), disse, «desculpe Rita, o seu marido que me perdoe, mas esse penteado carrega-a com mais dez, vinte anos.» Ela olhou para mim e eu sorri-lhe, quase que a dizer que era mentira e com um gesto acrescentei que o tipo tinha um problema qualquer na cachimónia. E depois ela respondeu-lhe: «foi essa a intenção, ficar mais mulher, deixar de ser a Ritinha.»

Quando ele nos deixou fui capaz de lhe dizer que estava gira. E que eu nem era tipo para gostar de mulheres mais velhas. Ela sorriu-me e disse que pagava o café depois do almoço.

sábado, setembro 06, 2014

O Perfume da Terra Molhada


Hoje está um daqueles dias estranhos, em que chove e faz Sol, deixando no ar aquele cheiro sempre agradável (para mim, claro...), a terra molhada.

Claro que a inalação deste perfume é um privilégio apenas reservado a quem vive no campo ou próximo de uma zona verde, que ainda não esteja completamente "inundada" pelo alcatrão e cimento, os reis e senhores das cidades.

Embora já seja Setembro, como a temperatura está agradável, esta chuva parece ser daquelas episódicas de Agosto, em que os seus pingos estão longe de nos incomodar ou obrigar a abrir o chapéu de chuva.

O óleo é de Federico Pillan.

sexta-feira, setembro 05, 2014

O Cinema Atrás da Popularidade da Televisão


O cinema português está a atravessar uma das suas fases mais dramáticas, graças a toda a indefinição que o tem rodeado nos últimos anos.

A sua qualidade raramente consegue chegar ao nosso público, embora seja aplaudida em vários festivais europeus, onde somos premiados com frequência. 

Alguns realizadores e produtores menos idealistas, como querem obter algum retorno do investimento através das bilheteiras, trilham outros caminhos. Conhecedores do poder da televisão preferem apostar em apresentadores de programas televisivos e em caras lindas, para os papeis principais e secundários, que em actores e actrizes com provas dadas.

Sei que não será desta forma que se melhorará a qualidade do cinema português. O tempo não volta para trás, o êxito das comédias portuguesas dos anos quarenta não se manteve nos anos cinquenta e sessenta do século passado (as repetições nem sempre resultam, e se foram manhosas, ainda pior...).

Um apresentador, por muito popular e descontraído que seja, não é sinónimo de bom actor...

quinta-feira, setembro 04, 2014

O Dinheiro, Sempre o Dinheiro


Fazia-lhe confusão, estar ali a exercitar o corpo, como tantos outros, naquele ginásio de recuperação e assistir quase a uma convenção sobre o dinheiro. As funcionárias falavam sem qualquer pudor das voltas que davam à vida. Não só faziam contas de cabeça como partilhavam as fórmulas mais que necessárias para darem a volta ao fisco.

Desagradava-lhe falar e ouvir falar de dinheiro. Preferia as conversas anteriores sobre as férias... como tinham sido, como iriam ser, de quem ia e de quem vinha.

Só que agora não havia como escapar à vidinha, era tempo de enfrentar o "mundo cão" que já estava ali ao virar da esquina. Ainda conservavam o castanho da pele, mas era tempo de pensar na escola dos filhos, no ATL, na livralhada, nos cadernos, nas mochilas, etc. 

O dinheiro, sempre ele, a apoquentar quem vive do trabalho e sabe que nunca vai chegar a administrador do que quer que seja, que pelos vistos são os únicos, que, segundo os jornais, já estão a recuperar da "crise"...

O óleo é de Anatoly Levitin.

quarta-feira, setembro 03, 2014

A Ficção & a Realidade (1)


Quando escrevemos ficção, escrevemos sobre nós e também sobre os outros (os maus normalmente são parecidos com umas pessoas de quem não gostamos e os bons o contrário..). E às vezes uma personagem são duas e três pessoas juntas.

Na espécie de romance que estou a escrever, falo de jornalismo, com desencanto, claro. Até por saber que muitos dos idealistas de palavras (das crónicas sensíveis...) são uns bons filhos da puta. Ou seja, quem lê as suas palavras, não imagina o que lhes vai verdadeiramente na alma...

Estou a escrever na primeira pessoa e num dos capítulos escrevi:

«Não sei se fui eu que desisti do jornalismo, se foi o jornalismo que desistiu de mim. Talvez tenham sido as duas coisas.
Claro que a história teve dedo humano, como quase tudo o que acontece de bom e de mau nas nossas vidas. As pessoas são como os carroceis, giram à nossa volta, só que nem sempre se movem pelas melhores razões, por muitos sorrisos que distribuam.
Foi um editor de má memória, conhecido pelo “Sem Pescoço”, que me começou a empurrar para fora do jornal. Era gajo para apostar com alguém que me iria derrotar pela impaciência, perante a indiferença ou complacência do chefe de redacção. Mandava-me fazer reportagens e depois resolvia não as publicar, quase sempre à última hora, obrigando-me a fazer uma figura próxima de charlatão junto das pessoas com quem falava e informava naturalmente da data, que em princípio sairia a matéria.»

O óleo é de Angela Bandurka.

terça-feira, setembro 02, 2014

Na Praia com Roupa a Mais


Durante a época balnear é sempre um pouco estranho aparecer rente a uma das praias, apenas por aparecer, sem a indumentária necessária, o fato de banho.

Pois foi, a Rita foi ver o mar em Agosto e arrependeu-se logo de seguida. Ainda lhe falei dos quiosques e barracas ambulantes que vendem toalhas, fatos de banho, baldes, cremes e tudo o mais que se quer para um banhista desprevenido.

Ela sorriu-me e disse que nesses lugares não se vendem os biquínis que ela gosta e usa...

A conversa enrolou-se e ainda falei do uso de lingerie ou boxeurs com uma cor ou modelo que possa passar despercebido, mas ela disse que pelo menos nós sabemos que estamos um pouco fora do contexto. Acrescentando que nesta altura do ano parece ser mais fácil encontrar um camelo que uma praia deserta à beira mar. 

Foi então que lhe recomendei para a próxima vez que lhe apetecer ver o mar, que se limite a olhar as suas ondas, sem precisar de sair do carro, para não ter tentações.

O óleo é de Linda Christensen.

segunda-feira, setembro 01, 2014

O Chamamento de Alguns Livros


Na minha curta passagem pela Beira, li um dos livros do escritor francês de origem belga, Georges Simenon, "Betty".

Ao olhar este livro na pequena estante, peguei-lhe e depois de o começar a ler, já não o larguei mais...

E foi bom voltar a um escritor de policiais, daqueles que escreviam quase como respiravam, com uma linguagem simples mas objectiva.

E ele é mesmo deste clube, escreveu 192 romances e 158 novelas. É mesmo obra!

Ficou mais conhecido graças ao seu comissário Maigret, que foi adaptado como série televisiva e passou na RTP, no começo da minha adolescência.

Em relação ao livro em si, não é nada de especial, a personagem principal, que deu o título à obra, é uma daquelas mulheres que cresceu já quase perdida, e assim se manteve até ao fim dos seus dias, com mais drama menos drama...

Mas valeu a pena ler, pelo ritmo, pela simplicidade, pelas várias personagens dentro e fora da noite. É um "Simenon"...