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terça-feira, 10 de dezembro de 2024

Diversidade: o segredo da resiliência humana e natural


Tal como na natureza, onde ecossistemas biodiversos são mais produtivos e resilientes, os grupos humanos prosperam na diversidade. Cada indivíduo contribui com competências, perspetivas e talentos únicos, que, combinados, criam uma "rede de interações" mais forte e funcional. 
Tal como espécies diferentes num ecossistema contribuem para o seu funcionamento e estabilidade, os contributos humanos complementares ajudam a superar desafios e a promover avanços em áreas diversas da ciência, cultura, arte e tecnologia.
Quando pessoas com diferentes formações e experiências se reúnem para resolver problemas complexos, as suas perspetivas variadas permitem explorar abordagens mais criativas e abrangentes - reflete o conceito ecológico de "nicho complementar", onde diferentes espécies ocupam papéis únicos e, juntas, tornam o sistema mais eficiente e equilibrado.
Além disso, a diversidade humana também atua como uma barreira natural contra a disseminação de ideias ou comportamentos prejudiciais, como no caso de ecossistemas ricos que resistem melhor a espécies invasoras. Num ambiente humano inclusivo, a multiplicidade de pontos de vista e experiências impede que preconceitos ou práticas destrutivas ganhem espaço de maneira descontrolada.
A ideia de resiliência também é crucial. Tal como os ecossistemas com elevada biodiversidade respondem melhor a perturbações, uma sociedade diversificada adapta-se melhor a mudanças e crises. Essa resiliência vem da capacidade de aprender com os erros, de absorver influências externas e de encontrar soluções inovadoras. 
Num contexto humano, isso poderia significar enfrentar crises económicas desafios ambientais ou adaptação às novas tecnologias. Os ecossistemas biodiversos cativam-nos pela sua beleza e complexidade. Da mesma forma, a diversidade humana enriquece a nossa convivência, fomentando a criatividade e a resiliência.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

Os bilionários



Dou por mim, muitas vezes  pensar que quem manda nisto tudo é o poder do dinheiro e que os governos, eles próprios, são dominados por esse poder. Já aqui escrevi que o poder do feiticeiro reside na ignorância dos seus irmãos tribais. 
O texto atribuído ao grande divulgador Cal Sagan que se transcreve acima diz, por palavras sábias, esta minha convicção.

quinta-feira, 11 de julho de 2024

Há cada vez mais conselhos de administração a procurar CEO com esta competência


Actualmente, os conselhos de administração procuram CEOs com elevados níveis de inteligência emocional, ou seja, a capacidade de ler e interpretar os sentimentos dos outros e reagir em conformidade na tomada de decisões, de acordo com o Insider.

Especialistas em diversidade e inclusão afirmam que a pressão sobre os CEOs para implementarem mudanças sociais nas empresas significa que cada vez mais líderes serão julgados pela sua inteligência emocional.

Para muitos conselhos de administração, contratar executivos de topo já não se trata de priorizar capacidades “úteis na obtenção de lucro”. Um estudo da Harvard revela que uma nova competência se sobrepõe às demais: inteligência emocional/social skills.

Investigadores analisaram cerca de cinco mil descrições de cargos executivos da Russell Reynolds, empresa de consultoria em liderança, entre 2000 a 2019 e descobriram que as palavras-chave mais mencionadas andam à volta de inteligência emocional, autoconsciência e a capacidade de trabalhar bem com os outros.

Este estudo junta-se a outros, reforçando a crescente importância desta competência. Um inquérito da plataforma Capterra, publicado em Janeiro, mostrava que líderes com elevada inteligência emocional eram 11% mais bem sucedidos na concretização de projectos, comparativamente aos que afirmaram ter menor inteligência emocional. Um estudo de 2009, divulgado no Leadership & Organization Development Journal, indicava que os executivos com níveis mais altos de empatia e auto-estima eram mais propensos a gerar altos lucros para as empresas.

«É uma competência de liderança que não pode faltar e será cada vez mais falada no futuro», revela Arquella Hargrove, consultora de Diversidade e Inclusão e Leadership coach, à Insider.

Entre os temas da igualdade, diversidade e inclusão, os consultores esperam que a procura por competências de inteligência emocional aumente nos próximos anos. «Estamos a lidar com pessoas e queremos humanizar estes temas. As emoções estão incluídas», acrescenta a consultora.

«Se estamos a tentar focar-nos na humanidade e aceitar as pessoas como são, competências de compreensão e empatia são fundamentais», declara Doris Quintanilla, directora executiva e cofundadora da consultora The Melanin Collective.

Qualquer líder (e gestores no geral) pode trabalhar para desenvolver a sua inteligência emocional. Uma das vertentes é a consciência social, ou seja, a capacidade de se colocar no lugar de outra pessoa. É ter empatia, escrevem Daniel Goleman, autor de “Emotional Intelligence 2.0”, e Richard E. Boyatzis, professor de Psicologia na Case Western Reserve University, na Harvard Business Review.

Para trabalhar o tema da empatia, Arquella Hargrove e Doris Quintanilla recomendam que os líderes passem mais tempo com os seus colaboradores de backgrounds mais sub-representados, convidando-os a partilhar as suas histórias e experiências. «Quando os líderes ouvem os seus colaboradores de diferentes origens, começam a valorizar essas diferenças e fazem as pessoas sentir-se incluídas na equipa», disse Arquella Hargrove.

Outro lado importante da inteligência emocional é a forma como se gerem relações ou a capacidade de comunicar eficazmente e trabalhar com os outros. «Ter inteligência emocional é também pedir feedback e ser capaz de o aceitar, seja positivo ou negativo. Esta capacidade torna-nos melhores líderes e gestores», acrescenta.

domingo, 28 de abril de 2024

Música do BioTerra: Vince Clarke - White Rabbit (poderoso teledisco- vejam-no!)


Primeiro teledisco que eu vejo criado pela Inteligência Artificial (IA) e com uma mensagem poderosa- vejam-no!
Vincent John Martin, mais conhecido pelo nome artístico de Vince Clarke, é um músico e compositor inglês. Ele se envolveu com vários grupos musicais de sucesso tais como Depeche Mode, Yazoo, The Assembly e Erasure. E actualmente produz música através da IA.

Vídeo realizado por Daniele Arcuri

Saber mais 

2. Site oficial de Vince Clarke

3.Site oficial dos Erasure

sábado, 16 de março de 2024

Bauman e a dificuldade de amar


Zygmunt Bauman é autor de inúmeras obras com a palavra líquido em seu título. A noção de liquidez proposta pelo filósofo e sociólogo polaco, falecido no começo desse mês, é aplicada aos mais variados temas como a modernidade, o amor, o medo, a vida e o tempo, expressando a fluidez, isto é, a imensa facilidade com que estes elementos escorrem pelas mãos do homem moderno. A ideia, extraída de “O Manifesto Comunista” de Marx e Engels, vem da célebre afirmação de que tudo que é sólido se desmancha no ar e de que tudo que é sagrado é profanado: assim é a modernidade e sua essência que se alastra pela vida do homem moderno transformando-o não só como indivíduo, mas também como ser relacional.
O primeiro livro do Bauman que li foi “Amor Líquido” o qual, carinhosamente, valendo-me das palavras de Caetano, defino como “um sopapo na cara do fraco”, que me fez e faz, já que essa sorte de questionamento é constante, pensar na forma como nos relacionamos hoje em dia. Um ponto alto do livro, aos meus olhos, é o capítulo no qual Bauman fala sobre a dificuldade de amar o próximo destacando o modo como lidamos com os estranhos. Penso que nessa dificuldade é que se encontra a raiz de tantos dos nossos problemas seja na esfera pessoal ou pública. E é sobre isso que eu gostaria de refletir conjuntamente hoje.
Vivemos em uma sociedade fortemente marcada pelo conflito ser x ter na qual o homem passa a se expressar pelas suas posses, elementos definidores de sua própria identidade, o que reflete na busca por certa conformidade que ceifa a pluralidade de existências e segrega o que é diferente, estranho. O modo como as cidades se dividem é exemplo disso, os nichos considerados seguros são aqueles onde todos se parecem, exacerbando a nossa dificuldade em lidar com os estranhos que passam a ser evitados através de sistemas de segurança, muros, priorização de espaços que assegurem a conformidade de seus freqüentadores como os shoppings e etc. Evitar a todo custo o incômodo de estar na presença de estranhos, começar a enxergar naquele que sequer se sabe o nome um inimigo em potencial e desconfiar de tudo e de todos só é possível graças ao desengajamento e ruptura de laços para o sociólogo polaco.
Se levarmos em conta que amar outra pessoa não é amar o que projetamos nela e sim a sua humanidade e singularidades, não será difícil compreender que o amor é um desafio nos tempos de modernidade líquida. A busca pela felicidade individual nos transforma em tribunais individuais e, na disputa pela sentença a ser proferida, não raro, o que se vê é sair vencedor aquele que se recusa a ouvir o outro. Facilmente, pois, livramo-nos dos compromissos e de tudo aquilo que nos pareça incômodo. Ainda que tão agarrados a nós mesmos, paradoxalmente, é bastante comum que a solidão seja companhia (e problema) constante de quem vive a descartar.
Os muros que construímos ao nosso redor, físicos ou emocionais, têm mesmo esse condão de isolar e criar dois mundos em cada um de seus dois lados: o de dentro e o de fora. O último, espaço cativo dos que nos incomodam- aqui incluídos tanto quem nos relacionamos de forma íntima, quanto aqueles que preferimos distantes, inviabilizados de estar perto, enfim, aniquilados ao prender, matar, limitar a circulação, fixar em zonas periféricas e etc. É que Narciso acha feio tudo que não é espelho, já diria, mais uma vez, o sempre genial Caetano Veloso.
Dessas reflexões que vão (muito) longe e que, por ora, encerro aqui fica sempre uma mensagem muito clara para mim: amar (mesmo) é um ato revolucionário e só ama quem tem coragem o bastante para lidar com esse desafio porque sabe que, por mais que nem tudo sejam flores, esse amor “sólido” é que nos impulsiona a querermos ser melhores seja como pessoa ou sociedade. Parece distante e utópico, mas está dentro de nós: ame profunda e verdadeiramente. Até quem você não conhece.

domingo, 21 de janeiro de 2024

João Ribeiro-Bidaoui - Anatomia da Cunha Portuguesa


Uma abordagem social da cunha, a sua controvérsia, a percepção pelo outro, a sua justificação e os juízos sobre acções de favorecimento. É este o resultado de uma exaustiva investigação que o jurista, sociólogo e diplomata internacional João Ribeiro-Bidaoui levou a cabo nos últimos oito anos e que agora é publicado no livro Anatomia da Cunha Portuguesa.

Saber mais: 
Tese Doutoramento sobre a "cunha" em Portugal - João Ribeiro-Bidaoui

sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

Música do BioTerra: The Jesus And Mary Chain - I Hate Rock 'N' Roll


Quando tens uma nova música e ela não sai da tua cabeça? Este tema dos JMC foi lançada há apenas 3 dias e entrou em repeat. Aditiva. Neste tema mordaz, a banda critica o mainstream da indústria discográfica e defende o movimento independente como força criativa e desprezam a música sempre bonitinha  chamada Rock 'n' Roll, só para aparecer no Top of the Tops.

I love rock 'n' roll
And all these people with nowhere to go
I love rock 'n' roll
And all these people with nothing to show

I love the BBC
I love it when they're pissing on me
And I love MTV
I love it when they're shitting on me

I hate rock 'n' roll
And all these people with nothing to show
I hate rock 'n' roll
I hate it 'cause it fucks with my soul

Rock 'n' roll hates me
Rock 'n' roll hates me
Rock 'n' roll hates me
I hate you, rock 'n' roll

I hate (rock 'n' roll hates me)

Página Oficial

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

O dever de rejeitar o ódio. Artigo de Edgar Morin


Os monstruosos massacres cometidos pelo Hamas contra os judeus israelenses em 7 de outubro causam-me profundo horror. Nada justifica esses ataques fanáticos, muito menos a questão do povo palestino, cuja justa causa é dissimulada por esses atos bárbaros. O terrorismo do Hamas ocultou e está ocultando para muitos o terror de um Estado que respondeu a esses impiedosos fanáticos de forma impiedosa contra dois milhões de habitantes de Gaza, causando já três mil mortes. E como Netanyahu anunciou, isso é apenas o começo.

O ódio não é novo. Mas agora está vindo de ambos os lados. Gera o delírio da culpa coletiva do povo inimigo, que conduz às piores crueldades e aos massacres, atingindo também mulheres, idosos e crianças.

A contextualização dos horrores do 7 de outubro, indispensável para qualquer entendimento, coloca-os, em primeiro lugar, na longa história do povo israelense, vítima milenar do antijudaísmo cristão, depois do antissemitismo racial que visava o seu extermínio, e cuja pátria israelense viu-se por muito tempo ameaçada por Estados hostis. Israel não foi um oásis de refúgio, mas uma cidadela em guerra.

Essa história trágica criou a tragédia do povo palestino. Depois da Guerra da Independência de Israel (1948), o povo palestino foi parcialmente expulso de suas terras e acabou em campos de refugiados no Líbano, na Jordânia e na Cisjordânia, onde ainda está estacionado. Depois da Guerra dos Seis Dias de 1967, toda a Cisjordânia, chamada por Israel de Judeia-Samaria, viu-se ocupada e colonizada não apenas por um Estado, mas ainda hoje por centenas de milhares de colonos israelenses.

A consequência do Holocausto, palavra que significa catástrofe, foi a Naqba, palavra palestina com o mesmo significado, que foi de fato a catástrofe da Palestina árabe.

Assim como é necessário manter viva a memória dos milhões de vítimas do nazismo, também é necessário o respeito por essa memória que não pode justificar o domínio de Israel sobre o povo palestino, que é inocente em relação aos crimes de Auschwitz.

A maldição de Auschwitz deve ser o privilégio que justifica toda repressão israelense?

A colonização da Cisjordânia, que começou precisamente no século da descolonização em África e na Ásia, assemelha-se em muitos aspectos àquelas em que as revoltas e as repressões multiplicaram sangrentos assassinatos de civis entre os opressores e os oprimidos. A diferença não é apenas no agravamento da colonização, mas também no conflito originário entre duas sacralizações antagônicas em relação a Jerusalém e à Palestina.

Séculos de antijudaísmo cristão, depois antissemitismo racista e três anos de extermínio nazista alimentaram o mito sionista do retorno à pátria original.

De fato, Israel mudou a condição judaica. A humilhação secular do judeu sem terra, submisso e medroso, deu lugar ao orgulho judaico pelas façanhas militares do povo judaico e pelos empreendimentos agrícolas dos kibutzim. Os intelectuais judeus universalistas diminuíram a favor de intelectuais essencialmente sensíveis ao destino de Israel, e para alguns deles a Torá substituiu o Manifesto Comunista.

A noção de "confissão israelita", uma pertença puramente religiosa, foi substituída pela noção de povo judeu, presente tanto na França como em Israel.

Esse apego radical, que deve ser compreendido, levou à justificação incondicional de todas as ações de Israel, incluindo a opressão dos palestinos. Os ocidentais, principalmente os europeus, sentindo-se culpados pelas devastações genocidas do antissemitismo, mostraram-se favorável à nação judaica.

Israel, filho do antissemitismo europeu e ocidental, tornou-se o posto avançado privilegiado da presença ocidental num perigoso mundo árabe. O recente pró-judaísmo (que reduziu, mas não eliminou o antigo antissemitismo) favorece Israel, enquanto ao mesmo tempo a existência de Israel despertou um imenso antijudaísmo no mundo árabe-muçulmano. A isso se somaram, a partir de 1948, considerações estratégicas e militares. Israel obteve a independência graças à vitória sobre os estados árabes que tentavam aniquilá-lo pela raiz e desenvolveu uma força militar superior àquela dos estados vizinhos que há tempo se mantinham hostis. Impôs-se um Israel imperioso, que ignora inúmeras resoluções da ONU para a criação de um Estado palestino. Houve um momento privilegiado em que Arafat e Rabin apertaram as mãos e foram assinados os acordos de Oslo, que previam os dois estados. Mas o assassinato de Rabin por um fanático judeu é o desaparecimento da esquerda israelense levaram ao domínio de uma coalizão nacionalista-religiosa que visa a anexação de toda a Cisjordânia e segue por seu caminho.

Nessas condições, é difícil ver a possibilidade de um Estado palestino com centenas de milhares de colonos israelenses que lhe são radicalmente hostis e é difícil imaginar que Israel retire seus assentamentos. As perspectivas são sombrias; as violências tendem a se intensificar de ambos os lados, com ataques indiscriminados e repressões em massa igualmente indiscriminadas. As verdades unilaterais triunfam, mascarando as verdades contrárias. Ódios e medos dominam os espíritos.

Não é impossível, mas é duvidoso, que uma ação conjunta das Nações Unidas e dos Estados Ocidentais e árabes possa levar a um resultado decisivo.

Não é impossível que o conflito se alastre, abrangendo e incendiando uma nação após outra. Há que se temer o pior.

Que pelo menos as nossas mentes possam resistir aos delírios. A nossa missão não é apenas rejeitar o ódio, mas fazer todo o possível para chegar a um início de compreensão mútua, não só entre Israel e Palestina, mas também entre os apoiadores franceses de ambos os povos, sem abandonar ao esquecimento uma causa justa.

"Não é impossível que o conflito se alastre, abrangendo e incendiando uma nação após outra. Há que se temer o pior", escreve o filósofo e sociólogo francês Edgar Morin, em artigo publicado por La Repubblica, 20-10-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.

sábado, 7 de outubro de 2023

Música do BioTerra: Motörhead - God Was Never on Your Side e Filme: O resgate de uma vida ("Cardboard Boxer" - 2016)


Video: scenes from the movie "Cardboard Boxer" (2016)
Album: Kiss of Death (2006)

Lyrics:
If the stars fall down on me
And the sun refused to shine
Then may the shackles be undone
May all the old words cease to rhyme
If the sky turned into stone
It will matter not at all
For there is no heaven in the sky
Hell does not wait for our downfall

Let the voice of reason chime
Let the pious vanish for all time
God's face is hidden, all unseen
You can't ask Him what it all means

He was never on your side
God was never on your side
Let right or wrong alone decide
God was never on your side

See ten thousand ministries
See the holy, righteous dogs
They claim to heal but all they do is steal
Abuse your faith, cheat and rob
If God is wise, why is He still
When these false prophets 
call Him friend?
Why is He silent? Is He blind?
Are we abandoned in the end?

Let the sword of reason shine
Let us be free of prayer and shrine
God's face is hidden, turned away
He never has a word to say

He was never on your side
God was never on your side
Let right or wrong alone decide
God was never on your side
No, no, no

He was never on your side
God was never on your side
Never, never, never, never
Never on your side
Never on your side

sexta-feira, 25 de agosto de 2023

Quantum Computer Terrifies Scientists After Something Weird Is Happening


A era da Inteligência Artificial já começou, suscitando preocupações entre os cientistas que acreditam que a IA deve ser controlada. Porém, há algo ainda mais preocupante: o desenvolvimento dos Computadores Quânticos. Os cientistas prevêem que os computadores quânticos em breve se tornarão acessíveis a todos. A questão que se coloca é: o que acontecerá quando a IA e os computadores quânticos unirem forças?

quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Documentário: Byung-Chul Han - Sociedade do Cansaço


Este ensaio-filme envolve o fenómeno do cansaço nas nossas sociedades capitalistas e os seus sintomas como depressão, esgotamento e burnout. A artista visual Isabella Gresser tece as observações cinematográficas, fotográficas e desenhadas que fez na Coreia do Sul e Berlim, com textos falados e trechos de palestras de Byung-Chul Han. 

Neste documentário o filósofo traz discussões sobre sociedade disciplinar, sociedade do controle, sociedade do cansaço e sociedade da transparência. Além disso comenta sobre Hegel, Peter Handke, Wim Wenders, conversa com o diretor de cinema Park Chan-wook, fala da sua juventude e visão atual sobre Berlim e Seul. Por fim, cabe destacar também as reflexões que Han faz acerca dos suicídios na Coreia do Sul.

Há uns meses, encontrei um livro de um filósofo coreano, Byung-Chul Han, que me deu luzes em relação a uma característica da nossa sociedade: a livre autoexploração dos indivíduos por eles mesmos.

A quantidade assustadora de burnouts e depressões leves a que assistimos ou da qual até nós mesmos já fomos vítimas, faz-nos pensar no que possa ser a causa destes fenómenos. O trabalho parece ser sempre mais exigente do ponto de vista físico, intelectual e psíquico e muitas pessoas saudáveis acabam por se ver afetadas por episódios depressivos.

É comum pensar que são os empregadores e as lideranças que exigem que as pessoas trabalhem acima de níveis considerados razoáveis. Embora possa ser verdade que um ou outro gestor exige demasiado dos seus trabalhadores, corresponde muito mais à minha experiência o facto de os líderes estarem preocupadas com estes fenómenos, mas não conseguirem mudar os seus comportamentos e os das equipas que coordenam. E qual seria a causa? A interpretação de Byung-Chul Han é que estamos num momento em que os próprios indivíduos se constituíram em exploradores de si próprios: “se posso mais, devo mais!” As motivações podem ser muitas: a incerteza de um mundo em constante mudança, o contacto permanente com todos os países que nos faz querer pertencer ao grupo dos melhores ou que nos faz sentir responsáveis por todos os desastres do planeta, o prazer de nos sentirmos reconhecidos.

É difícil encontrar uma só motivação, são muitas e subtis, de tal modo que o indivíduo continua a explorar-se e a sentir-se livre. Explica Byung-Chul Han “o excesso de trabalho e de produção conduz, a um nível mais elevado, à autoexploração. Esta é mais eficaz do que a exploração por terceiros, uma vez que vem associada a um sentimento de liberdade. O ser explorado é simultaneamente o que explora – agente e vítima já não se distinguem entre si. Esta autorreferencialidade gera uma liberdade paradoxal que, em virtude das estruturas coercivas que lhe são intrínsecas, se converte em violência. As doenças psíquicas da sociedade da produção nada mais são do que manifestações patológicas desta liberdade paradoxal.”[fonte]

Se a hipótese de Byung-Chul Han é verdadeira, só será possível devolver à sociedade e a cada indivíduo um estilo de vida que promova uma liberdade autêntica, através de um esforço concertado por mudar hábitos, formas específicas de educação e características culturais. As organizações poderão e deverão alertar para este facto, aumentando o nível de awareness, e criando políticas promotoras do equilíbrio dos indivíduos e da sua saúde mental, mas apenas isto não será suficiente.

É desconcertante e paradoxal que vivendo num mundo com muito mais possibilidades do que as gerações e sociedades anteriores, vivamos mais infelizes e mais débeis. Convido a todos a tomar uma atitude resoluta e audaz: não podemos dar-nos ao luxo de assumir que as pessoas são mais fracas do que noutras épocas. Parece-me importante iniciar uma plataforma de reflexão e debate que seja capaz de chegar a perceber o modo mais humano e equilibrado de gerir a informação e as possibilidades a que temos acesso.

Byung- Chul Han diz que a nossa sociedade tem “excesso de positividade” – que pode ser excesso de possibilidades, excesso de estímulos, excesso de responsabilidade – e que o perigo do excesso de positividade em relação ao excesso de negatividade é não termos anticorpos ou mecanismos de defesa que reajam a um elemento agressor. É mais difícil combater um inimigo sem rosto, mas eu diria que é urgente, sob pena de perecermos no âmbito de tanta positividade.

sábado, 29 de julho de 2023

Capitalismo e Pulsão de Morte


Sinopse

Aquilo a que hoje chamamos crescimento é na verdade uma excrescência, uma proliferação cancerosa que destrói o organismo social. Essas excrescências metastizam-se com uma vitalidade inexplicável. A certa altura, esse crescimento já não é produtivo, mas destrutivo. Há muito que o capitalismo ultrapassou este ponto crítico. As suas forças destrutivas produzem não apenas catástrofes ecológicas ou sociais, mas também mentais. Os efeitos devastadores do capitalismo sugerem a existência de um instinto de morte.
Depois de inicialmente Sigmund Freud ter introduzido o conceito de instinto de morte de forma hesitante, confessou que «não poderia pensar de outra forma», porque a ideia ganhara poder sobre ele.
Pensar hoje no capitalismo é impossível sem considerar o instinto de morte.

" Aquilo a que hoje chamamos crescimento é, na realidade, uma proliferação carcinomatosa, desprovida de objectivo. Atualmente assistimos a uma euforia de produção e de crescimento que faz lembrar um delírio de morte. Simula uma vitalidade que oculta a aproximação de uma catástrofe mortal. A produção assemelha-se cada vez mais a uma destruição. É possível que a autoalienação da humanidade tenha atingido aquele grau que lhe permite experimentar o seu próprio aniquilamento como uma fruição estética. O que Walter Benjamim disse outrora sobre o fascismo pode hoje aplicar-se ao capitalismo."

terça-feira, 13 de junho de 2023

Música do BioTerra: Iggy Pop - “Lust For Life”


Here comes Johnny Yen again
With the liquor and drugs
And the flesh machine
He's gonna do another strip tease.
Hey man, where'd ya get that lotion?
I've been hurting since I've bought the gimmick
about something called love
Yeah, something called love.
Well, that's like hypnotizing chickens.

Well, I'm just a modern guy
Of course, I've had it in the ear before.
I have a lust for life
'Cause of a lust for life.

I'm worth a million in prizes
With my torture film
Drive a GTO
Wear a uniform
all on a government loan.
I'm worth a million in prizes
Yeah, I'm through with sleeping on the sidewalk
No more beating my brains
With liquor and drugs

Well, I'm just a modern guy
Of course, I've had it in my ear before
Well, I've a lust for life (lust for life)
'Cause of a lust for life (lust for life, oooo)
I got a lust for life (oooo)
Got a lust for life (oooo)

Well, I'm just a modern guy
Of course, I've had it in my ear before
Well, I've a lust for life
'Cause I've a lust for life.

Here comes Johnny Yen again
With the liquor and drugs
And the flesh machine
He's gonna do another strip tease
Hey man, where'd ya get that lotion?
Your skin starts itching once you buy the gimmick
about something called love
Love, love, love
Well, that's like hypnotizing chickens.

Well, I'm just a modern guy
Of course, I've had it in the ear before
And I've a lust for life (lust for life)
'Cause I've a lust for life (lust for life)
Got a lust for life
Yeah, a lust for life
I got a lust for life
A lust for life
Got a lust for life
Yeah a lust for life
I got a lust for life
Lust for life

Biografia:
Iggy Pop (James Newell Osterberg)

Banda The Stooges
The Stooges

Página Oficial
Iggy Pop
The Stooges

Youtube
Iggy Pop
The Stooges

segunda-feira, 29 de maio de 2023

Restaurantes Não São Santuários

por João Pereira Coutinho

Este texto é dedicado ao "Chef" Avilez, que estragou dois magníficos restaurantes, o Tavares e, principalmente, o Belcanto. E como esta praga não é nacional apenas, dedicado também ao Alain Ducasse, que assassinou em tempos o magnífico Louis XV, o restaurante (emblemático) do Hotel de Paris, em Monte Carlo. Felizmente, neste caso, pelo menos continua a magnífica garrafeira.
Restaurantes não são santuários...
Estou cansado da religião dos chefs: restaurantes não são santuários...
O melhor restaurante do mundo?
Ora, ora: é o Eleven Madison Park, em Nova York.
Parabéns, gente.
A sério.
Espero nunca vos visitar.
Entendam: não é nada de pessoal.
Acredito na vossa excelência.
Acredito, como dizem os críticos, que a vossa mistura de "cozinha francesa moderna" com "um toque nova-iorquino" é perfeitamente comparável às 72 virgens que existem no paraíso corânico.
Mas eu estou cansado da religião dos chefs.
Vocês sabem: a elevação da culinária a um reino metafísico, transcendental, celestial.
Todas as semanas, lá aparece mais um chef, com a sua igreja, apresentando o cardápio como se fossem as sagradas escrituras.
Os ingredientes não são ingredientes.
São "elementos".
Uma refeição não é uma refeição.
É uma "experiência".
E a comida, em rigor, não é comida.
É uma "composição".
Já estive em vários desses santuários.
Quando a comida chegava, eu nunca sabia se deveria provar ou rezar.
Os meus receios sacrílegos eram acentuados pelo próprio garçom, que depositava o prato na mesa e, em voz baixa, confidenciava o milagre que eu tinha à minha frente:
– Pato defumado com pétalas de tomate e essências de jasmim.
Escutava tudo com reverência, dizia um "obrigado" que soava a "amém" e depois aproximava o garfo trêmulo, com mil receios, para não perturbar o frágil equilíbrio entre as "pétalas" e as "essências".
Em raros casos, sua santidade, o chef, aparecia no final.
Para abençoar os comensais.
No dia em que beijei a mão de um deles, entendi que deveria apostatar.
E, quando não são santos, são artistas.
Um pedaço de carne não é um pedaço de carne.
É um "desafio".
É o teto da Capela Sistina aguardando pelo seu Michelangelo.
Nem de propósito: espreitei o site do Eleven Madison Park.
Tenho uma novidade para dar ao leitor: a partir de 11 de abril, o Eleven vai fazer uma "retrospectiva" (juro, juro) com os 11 melhores pratos dos últimos 11 anos.
"Retrospectiva."
Eis a evolução da história da arte ocidental: a pintura rupestre de Lascaux; as esculturas gregas de Fídias; os vitrais da catedral gótica de Chartres; os quadros barrocos de Caravaggio; a tortinha de quiche de ovo do chef Daniel Humm.
Gosto de comer.
Gosto de comida.
Essas duas frases são ridículas porque, afinal de contas, sou português.
E é precisamente por ser português que me tornei um ateu dos "elementos", das "composições" e das "essências".
A religião dos chefs, com seu charme diabólico, tem arrasado os restaurantes da minha cidade.
Um deles, que fica aqui no bairro, servia uns "filetes de polvo com arroz do mesmo" que chegou a ser o barômetro das minhas relações amorosas: sempre que estava com uma namorada e começava a pensar no polvo, isso significava que a paixão tinha chegado ao fim.
Duas semanas atrás, voltei ao espaço que reabriu depois das obras.
Estranhei: havia música ambiente e a iluminação reduzida imitava as casas de massagens da Tailândia (aviso: querida, se estiveres a ler esta crônica, juro que nunca estive na Tailândia).
Sentei-me.
Quando o polvo chegou, olhei para o prato e perguntei ao dono se ele não tinha esquecido alguma coisa.
"O quê?", respondeu o insolente.
"O microscópio", respondi eu.
Ele soltou uma gargalhada e explicou: "São coisas do chef, doutor."
"Qual chef?", insisti.
Ele, encolhendo os ombros, respondeu com vergonha: "O Agostinho".
O cozinheiro virou chef e o meu polvo virou calamares.
Infelizmente, essa corrupção disseminou-se pela pátria amada.
Já escrevi sobre o crime na imprensa lusa.
Ninguém acompanhou o meu pranto.
É a música ambiente que substituiu o natural rumor das conversas.
É a iluminação de bordel que impede a distinção entre uma azeitona e uma barata.
É o hábito chique de nunca deixar as garrafas na mesa, o que significa que o garçom só se apercebe da nossa sede "in extremis" quando existem tremores alcoólicos e outros sinais de abstinência.
Meu Deus, onde vamos parar?
Não sei.
Mas sei que já tomei providências: no próximo outono, tenciono aprender a caçar.
Tudo serve: perdiz, lebre, javali.
Depois, com uma fogueira e um espeto, cozinho o bicho como um homem pré-histórico.
O pináculo da civilização é tortinha de quiche de ovo do chef Daniel Humm?
Então chegou a hora de regressar às cavernas de Lascaux..."
Viva a Lampreia‼️
Viva o cozido à Portuguesa‼️
O pudim de Abade dos Priscos‼️
O tinto‼️
O branco‼️
E... poupem na água que faz muita falta na lavoura🥴

quarta-feira, 17 de maio de 2023

António Barreto é mesmo facho


Olha, olha. Logo António Barreto a dizer uma alarvidade, quando no período em que fala exilou-se na Suíça, para fugir à Guerra Colonial e tirar lá o seu Doutoramento em "Sociologia".

Fonte: aqui

quinta-feira, 13 de abril de 2023

Geração QI inferior ao dos pais

Pela primeira vez na História, filhos têm quociente de inteligência menor. A culpa também é das telas.



A Fábrica de Cretinos Digitais. Este é o título do último livro do neurocientista francês Michel Desmurget, diretor de pesquisa do Instituto Nacional de Saúde da França, em que apresenta, com dados concretos e de forma conclusiva, como os dispositivos digitais estão afetando seriamente — e para o mal — o desenvolvimento neural de crianças e jovens.

"Simplesmente não há desculpa para o que estamos fazendo com nossos filhos e como estamos colocando em risco seu futuro e desenvolvimento", alerta o especialista em entrevista à BBC News Mundo, o serviço de notícias em espanhol da BBC.

As evidências são palpáveis: já há um tempo que testes de QI (Quociente de Inteligência) têm apontado que as novas gerações são menos inteligentes que anteriores.

Desmurget acumula vasta publicação científica e já passou por centros de pesquisa renomados como o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e a Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos.

Seu livro se tornou um best-seller gigantesco na França. Veja abaixo trechos da entrevista com ele.

BBC News Mundo: Os jovens de hoje são a primeira geração da história com um QI (Quociente de Inteligência) mais baixo do que a última?
Michel Desmurget: Sim. O QI é medido por um teste padrão. No entanto, não é um teste "estático", sendo frequentemente revisado. Meus pais não fizeram o mesmo teste que eu, por exemplo, mas um grupo de pessoas pode ser submetido a uma versão antiga do teste.


Neurocientista Michel Desmurget acredita que infância de hoje está exposta a uma "orgia digital"

E, ao fazer isso, os pesquisadores observaram em muitas partes do mundo que o QI aumentou de geração em geração. Isso foi chamado de 'efeito Flynn', em referência ao psicólogo americano que descreveu esse fenômeno. Mas recentemente, essa tendência começou a se reverter em vários países.

É verdade que o QI é fortemente afetado por fatores como o sistema de saúde, o sistema escolar, a nutrição, etc. Mas se considerarmos os países onde os fatores socioeconômicos têm sido bastante estáveis por décadas, o 'efeito Flynn' começa a diminuir.

Nesses países, os "nativos digitais" são os primeiros filhos a ter QI inferior ao dos pais. É uma tendência que foi documentada na Noruega, Dinamarca, Finlândia, Holanda, França, etc.

BBC News Mundo: E o que está causando essa diminuição no QI?
Desmurget: Infelizmente, ainda não é possível determinar o papel específico de cada fator, incluindo por exemplo a poluição (especialmente a exposição precoce a pesticidas) ou a exposição a telas. O que sabemos com certeza é que, mesmo que o tempo de tela de uma criança não seja o único culpado, isso tem um efeito significativo em seu QI. Vários estudos têm mostrado que quando o uso de televisão ou videogame aumenta, o QI e o desenvolvimento cognitivo diminuem.

Os principais alicerces da nossa inteligência são afetados: linguagem, concentração, memória, cultura (definida como um corpo de conhecimento que nos ajuda a organizar e compreender o mundo). Em última análise, esses impactos levam a uma queda significativa no desempenho acadêmico.

BBC News Mundo: E por que o uso de dispositivos digitais causa tudo isso?
Desmurget: As causas também são claramente identificadas: diminuição da qualidade e quantidade das interações intrafamiliares, essenciais para o desenvolvimento da linguagem e do emocional; diminuição do tempo dedicado a outras atividades mais enriquecedoras (lição de casa, música, arte, leitura, etc.); perturbação do sono, que é quantitativamente reduzido e qualitativamente degradado; superestimulação da atenção, levando a distúrbios de concentração, aprendizagem e impulsividade; subestimulação intelectual, que impede o cérebro de desenvolver todo o seu potencial; e o sedentarismo excessivo que, além do desenvolvimento corporal, influencia a maturação cerebral.

BBC News Mundo: Que dano exatamente as telas causam ao sistema neurológico?
Desmurget: O cérebro não é um órgão "estável". Suas características 'finais' dependem da nossa experiência. O mundo em que vivemos, os desafios que enfrentamos, modificam tanto a estrutura quanto o seu funcionamento, e algumas regiões do cérebro se especializam, algumas redes são criadas e fortalecidas, outras se perdem, algumas se tornam mais densas e outras mais finas.


Nossos pais não passaram no mesmo teste de QI que nós, observa neurocientista

Observou-se que o tempo gasto em frente a uma tela para fins recreativos atrasa a maturação anatômica e funcional do cérebro em várias redes cognitivas relacionadas à linguagem e à atenção.
Deve-se ressaltar que nem todas as atividades alimentam a construção do cérebro com a mesma eficiência.

BBC News Mundo: O que isso quer dizer?
Desmurget: Atividades relacionadas à escola, trabalho intelectual, leitura, música, arte, esportes… todas têm um poder de estruturação e nutrição muito maior para o cérebro do que as telas.
Mas nada dura para sempre. O potencial para a plasticidade cerebral é extremo durante a infância e a adolescência. Depois, ele começa a desaparecer. Ele não vai embora, mas se torna muito menos eficiente.
O cérebro pode ser comparado a uma massa de modelar. No início, é húmida e fácil de esculpir. Mas, com o tempo, fica mais seca e muito mais difícil de modelar. O problema com as telas é que elas alteram o desenvolvimento do cérebro de nossos filhos e o empobrecem.

BBC News Mundo: Todas as telas são igualmente prejudiciais?
Desmurget: Ninguém diz que a "revolução digital" é ruim e deve ser interrompida. Eu próprio passo boa parte do meu dia de trabalho com ferramentas digitais. E quando minha filha entrou na escola primária, comecei a ensiná-la a usar alguns softwares de escritório e a pesquisar informações na internet.
Os alunos devem aprender habilidades e ferramentas básicas de informática? Claro. Da mesma forma, pode a tecnologia digital ser uma ferramenta relevante no arsenal pedagógico dos professores? Claro, se faz parte de um projeto educacional estruturado e se o uso de um determinado software promove efetivamente a transmissão do conhecimento.
Porém, quando uma tela é colocada nas mãos de uma criança ou adolescente, quase sempre prevalecem os usos recreativos mais empobrecedores. Isso inclui, em ordem de importância: televisão, que continua sendo a tela número um de todas as idades (filmes, séries, clipes, etc.); depois os videogames (principalmente de ação e violentos) e, finalmente, na adolescência, um frenesi de autoexposição inútil nas redes sociais.

BBC News Mundo: Quanto tempo as crianças e os jovens costumam passar em frente às telas?
Desmurget: Em média, quase três horas por dia para crianças de 2 anos, cerca de cinco horas para crianças de 8 anos e mais de sete horas para adolescentes.


Uma criança de 2 anos passa quase três horas por dia em frente às telas, em média

Isso significa que antes de completar 18 anos, nossos filhos terão passado o equivalente a 30 anos letivos em frente às telas ou, se preferir, 16 anos trabalhando em tempo integral!
É simplesmente insano e irresponsável.

BBC News Mundo: Quanto tempo as crianças devem passar em frente a telas?
Desmurget: Envolver as crianças é importante. Elas precisam ser informados de que as telas danificam o cérebro, prejudicam o sono, interferem na aquisição da linguagem, enfraquecem o desempenho acadêmico, prejudicam a concentração, aumentam o risco de obesidade, etc.
Alguns estudos mostram que é mais fácil para crianças e adolescentes seguirem as regras sobre telas quando sua razão de ser é explicada e discutida com eles. A partir daí, a ideia geral é simples: em qualquer idade, o mínimo é o melhor.
Além dessa regra geral, diretrizes mais específicas podem ser fornecidas com base na idade da criança. Antes dos seis anos, o ideal é não ter telas (o que não significa que de vez em quando você não possa assistir a desenhos com seus filhos).
Quanto mais cedo forem expostos, maiores serão os impactos negativos e o risco de consumo excessivo subsequente.
A partir dos seis anos, se os conteúdos forem adaptados e o sono preservado, o tempo em frente à tela pode chegar até meia hora ou até uma hora por dia, sem uma influência negativa apreciável.
Outras regras relevantes: sem telas pela manhã antes de ir para a escola, nada à noite antes de ir para a cama ou quando estiver com outras pessoas. E, acima de tudo, sem telas no quarto.
Mas é difícil dizer aos nossos filhos que as telas são um problema quando nós, como pais, estamos constantemente conectados aos nossos smartphones ou consolas de jogos.

BBC News Mundo: Por que muitos pais desconhecem os perigos das telas?
Desmurget: Porque a informação dada aos pais é parcial e tendenciosa. A grande media está repleta de afirmações infundadas, propaganda enganosa e informações imprecisas. A discrepância entre o conteúdo da mídia e a realidade científica costuma ser perturbadora, se não enfurecedora. Não quero dizer que a mídia seja desonesta: separar o joio do trigo não é fácil, mesmo para jornalistas honestos e conscienciosos.
Mas não é surpreendente. A indústria digital gera biliões de dólares em lucros a cada ano. E, obviamente, crianças e adolescentes são um recurso muito lucrativo. E para empresas que valem biliões de dólares, é fácil encontrar cientistas complacentes e lobistas dedicados.


Empresas digitais contratam especialistas para explicar como os jogadores inteligentes são e como é bom jogar videogame

Recentemente, uma psicóloga, supostamente especialista em videogames, explicou em vários meios de comunicação que esses jogos têm efeitos positivos, que não devem ser demonizados, que não jogá-los pode ser até uma desvantagem para o futuro de uma criança, que os jogos mais violentos podem ter ações terapêuticas e ser capaz de aplacar a raiva dos jogadores, etc.
O problema é que nenhum dos jornalistas que entrevistaram essa "especialista" mencionou que ela trabalhava para a indústria de videogames. E este é apenas um exemplo entre muitos descritos em meu livro.
Isso não é algo novo: já aconteceu no passado com o tabaco, aquecimento global, pesticidas, açúcar, etc.
Mas acho que há espaço para esperança. Com o tempo, a realidade se torna cada vez mais difícil de negar.

BBC News Mundo: Há estudos que afirmam, por exemplo, que os videogames ajudam a obter melhores resultados acadêmicos…
Desmurget: Digo com franqueza: isso é um absurdo.
Essa ideia é uma verdadeira obra-prima de propaganda. Baseia-se principalmente em alguns estudos isolados com dados imprecisos, que são publicados em periódicos secundários, pois muitas vezes se contradizem.
Numa interessante pesquisa experimental, consoles de jogos foram dados a crianças que iam bem na escola. Depois de quatro meses, elas passaram mais tempo jogando e menos fazendo o dever de casa. Suas notas caíram cerca de 5% (o que é muito em apenas quatro meses!).
Noutro estudo, as crianças tiveram que aprender uma lista de palavras. Uma hora depois, algumas puderam jogar um jogo de corrida de carros. Duas horas depois, foram para a cama.
Na manhã seguinte, as crianças que não jogaram lembravam cerca de 80% da aula em comparação com 50% das que jogaram.
Os autores descobriram que brincar interferia no sono e na memorização.

BBC News Mundo: Como o Sr. acha que os membros dessa geração digital serão quando se tornarem adultos?
Desmurget: Costumo ouvir que os nativos digitais sabem "de maneira diferente". A ideia é que embora apresentem déficits linguísticos, de atenção e de conhecimento, são muito bons em "outras coisas". A questão está na definição dessas "outras coisas".
Vários estudos indicam que, ao contrário das crenças comuns, eles não são muito bons com computadores. Um relatório da União Europeia explica que a baixa competência digital impede a adoção de tecnologias educacionais nas escolas.


Vários países estão começando a legislar contra o uso das telas

Outros estudos também indicam que eles não são muito eficientes no processamento e entendimento da vasta quantidade de informações disponíveis na internet.
Então, o que resta? Eles são obviamente bons para usar aplicativos digitais básicos, comprar produtos online, baixar músicas e filmes, etc.
Para mim, essas crianças se assemelham às descritas por Aldous Huxley em seu famoso romance distópico Admirável Mundo Novo: atordoadas por entretenimento bobo, privadas de linguagem, incapazes de refletir sobre o mundo, mas felizes com sua sina.

BBC News Mundo: Alguns países estão começando a legislar contra o uso de telas?
Desmurget: Sim, especialmente na Ásia. Taiwan, por exemplo, considera o uso excessivo de telas uma forma de abuso infantil e aprovou uma lei que estabelece multas pesadas para pais que expõem crianças menores de 24 meses a qualquer aplicativo digital e que não limita o tempo de tela de meninos e meninas entre 2 e 18 anos.
Na China, as autoridades tomaram medidas drásticas para regulamentar o consumo de videogames por menores: crianças e adolescentes não podem mais brincar à noite (entre 22h e 8h) ou ultrapassar 90 minutos de exposição diária durante a semana (180 minutos nos finais de semana e férias escolares).

BBC News Mundo: O Sr. acredita que é bom que existam leis que protegem as crianças das telas?
Desmurget: Não gosto de proibições e não quero que ninguém me diga como criar a minha filha. No entanto, é claro que as escolhas educacionais só podem ser exercidas livremente quando as informações fornecidas aos pais são honestas e abrangentes.
Acho que uma campanha de informação justa sobre o impacto das telas no desenvolvimento com diretrizes claras seria um bom começo: nada de telas para crianças de até seis anos de idade e não mais do que 30-60 minutos por dia.

BBC News Mundo: Se essa orgia digital, como você a define, não para, o que podemos esperar?
Desmurget: Um aumento das desigualdades sociais e uma divisão progressiva da nossa sociedade entre uma minoria de crianças preservadas desta "orgia digital" — os chamados alfas do livro de Huxley —, que possuirão, através da cultura e da linguagem, todas as ferramentas necessárias pensar e refletir sobre o mundo, e uma maioria de crianças com ferramentas cognitivas e culturais limitadas — os chamados gamas na mesma obra —, incapazes de compreender o mundo e agir como cidadãos cultos.
alOs alfas frequentarão escolas particulares caras com professores humanos "reais". Já os gamas irão para escolas públicas virtuais com suporte humano limitado, onde serão alimentados com uma pseudo-linguagem semelhante à "novilíngua" de (George) Orwell (em 1984) e aprenderão as habilidades básicas de técnicos de médio ou baixo nível (projeções económicas dizem que este tipo de emprego será super-representados na força de trabalho de amanhã).
Um mundo triste em que, como disse o sociólogo Neil Postman, eles vão se divertir até a morte. Um mundo no qual, através do acesso constante e debilitante ao entretenimento, eles aprenderão a amar sua servidão. Desculpe por não ser mais otimista.
Talvez (e espero que sim) eu esteja errado. Mas simplesmente não há desculpa para o que estamos fazendo com nossos filhos e como estamos colocando em risco seu futuro e desenvolvimento.


Saber mais:

quinta-feira, 30 de março de 2023

Pornografia de Armas (Gun Pornography)

Em 2017, os civis dos EUA possuíam uma média de 120,5 armas de fogo por 100 pessoas, a taxa mais alta do mundo. [Fonte]

2023 - Mais do que um tiroteio por dia nos EUA
O tiroteio na escola de Nashville é o 131.º tiroteio em massa nos EUA este ano, de acordo com o Arquivo da Violência Armada. Isso significa que já houve mais tiroteios em massa do que o número de dias no ano, até agora.

As AR-15 são armas semi-automáticas, o que significa que um atirador deve premir o gatilho em cada disparo.

São também as espingardas mais vendidas nos EUA. Um em cada 20 adultos, ou cerca de 16 milhões de pessoas, possuem pelo menos uma arma do tipo AR-15, de acordo com o Washington Post.

Estas armas tornaram-se também um símbolo da epidemia de violência armada do país. Dez dos 17 tiroteios em massa mais mortíferos desde 2012 envolveram AR-15.

No caso do tiroteio de Nashville identificou-se que uma das armas utilizadas pela agressora, uma mulher de 28 anos, foi uma AR-15 tipo Grunt III, fabricada pela empresa Lead Star.

Expositor de revistas sobre armas na livraria Barnes and Noble, Summerlin, Las Vegas [Fonte]

É comum nas revistas de armas norte-americanas, modelos femininos em pose com armas. Sem que na capa haja algum sticker "proibido a maiores de 16 anos".


Colecionador de armas com 99 mil seguidores online acusado de fazer 'pornografia de armas' depois de postar fotos de armas de fogo em dinheiro, camuflagem do exército e até cereais.
Chris, conhecido como @Gun_Collector, realiza competições para seus seguidores
As lojas oferecem prémios para concursos de imagens sobre temas como 'Armas na Cozinha'.
Seguidores da sua página no Instagram aumentaram após o massacre de Sandy Hook (2012)
Diz que não é um 'doido por armas', mas quer ensinar as pessoas a não temer armas de fogo.

A Associação pró-armas National Rifle Association tem perto de 5 milhões de associados, 4 milhões de seguidores no Facebook e  259 mil subscritores no seu canal de Youtube.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Há 175 anos, o industrial alemão Friedrich Engels publicava o Manifesto Comunista


Karl Marx e Friedrich Engels foram dois dos principais teóricos, tanto no âmbito da filosofia, como da sociologia, que influíram grande parte das forças partidárias políticas de esquerda. Ambos germânicos, deram origem a uma série de tratados, ensaios, e obras sobre as forças opressores, e as classes subjugadas pelas mesmas, estando ambas relacionadas através dos meios de produção, e da produção propriamente dita. Em circulação, está o capital, recurso detido por poucos e carecido por muitos. Foi na tentativa de subverter essa situação, pouco depois do estalar da Revolução Industrial, que estes dois teóricos uniram esforços e ideologias, e redigiram algumas obras cruciais na definição daquilo que seria a abolição das classes após a luta destas.

No fim, os teóricos explanavam a solução do comunismo, um estado que se viria a metamorfosear num regime político. Na prática que a História nos apresentou, tornou-se um dos mais polémicos e discutíveis nos fóruns públicos, académicos, e políticos, por esse mundo fora, perdurando, ainda, em alguns deles. No caso de Portugal, este chegou a ver Vasco Gonçalves, membro do Partido Comunista Português, como primeiro-ministro português, em pleno Verão Quente, fase política muito conturbada no pós-25 de abril. Não obstante um mandato titubeante, o partido foi uma das forças desbloqueadoras da situação ditatorial, ao lado das forças do Movimento das Forças Armadas, do Partido Socialista (PS), e do futuro Partido Popular Democrático (depois Partido Social Democrata – PSD), grupos onde convergiram grande parte dos esforços da democratização política. Entre alas mais ou menos liberais, o Partido Comunista Português permanece hoje como um dos núcleos partidários mais conotados da atualidade política, ao lado dos eventualmente criados CDS-PP (estes ainda no efervescer do pós-25 de abril) e Bloco de Esquerda. É com esta, um partido também de esquerda, com quem, em conjunto com o PS, está a causar sensação nos órgãos de comunicação internacionais, com o acordo governativo que motivou a alcunha de “Geringonça“.

Porém, nada descarta a importância das crenças e ideias vertidas por Marx e Engels em obras, como “Manifesto Comunista” (da autoria de ambos, em 1848), ou “O Capital” (de Marx, 1867), tanto no plano teórico, como no prático, dando azo ao desenvolvimento de vários subtipos de socialismo e de comunismo, alguns deles associados ao anarquismo. Várias foram as interpretações, e proporcionais foram as tentativas de lhe dar vida. Porém, por detrás de toda esta exploração, está o que foi apontado e, verdadeiramente, escalpelizado por estas duas figuras proeminentes nos últimos três séculos.

O socialismo científico
Aliando uma tradição académica fortemente sustentada, a uma visão interventiva e assertiva sobre a sociedade, Marx e Engels prepararam uma teorização daquilo que eram as fundações sociais e produtivas do capitalismo. Como objetivo, e para além do utópico objetivo de visualizar o que seria uma sociedade ideal, procuraram perceber como se dava a acumulação do capital em alguns no fluxo da produção capitalista, desvendando os eventuais paradoxos na sua operacionalização. Como crença, partiam de um princípio de que o capitalismo seria desmantelado de dentro para fora, ou seja, a partir das suas lacunas. Detetando uma classe trabalhadora explorada e expropriada, apontaram o caminho para a formação histórica e social das suas consciências, e firmá-la como uma classe revolucionária.

Aquilo que cunharam como socialismo seria, no seu ver, uma charneira entre a abolição capitalista e a afirmação da sociedade comunista, etapa máxima da evolução antropológica e sociológica. Aqui, nas suas previsões, a sociedade estaria isenta de classes, não dando azo à existência da propriedade privada, e os poderes estatais estariam em segundo plano, privilegiando-se a igualdade entre todos os homens. As etapas que o viriam a formalizar foram escrutinadas em “O Manifesto Comunista”, reforçada pelo estudo do capitalismo por parte de Marx em “O Capital”. Teorias, como o materialismo histórico e dialético, a luta de classes, e a mais-valia, seriam as fundações da futura e putativa sociedade comunista. Importa realçar que um dos principais críticos desta estruturação sociopolítica seria o pensador Karl Popper, que a contrapôs com a sua “sociedade aberta“.

O materialismo histórico e dialético
Por detrás de qualquer proposta, tanto ao nível sociológico, como científico, como artístico, está uma análise contextual, contexto no qual aquilo que de novo se apresenta incide. Foi assim com Karl Marx, natural da cidade de Trier, e com Friedrich Engels, da vila de Barmen. Visualizando a sociedade e a economia num ponto de vista histórico, e naquilo que era a realidade do século XIX, o materialismo histórico, termo pelo qual é cunhado, mas que nunca foi usado por ambos, é uma metodologia de estudo. Esta procurou conhecer as causas das mudanças da sociedade humana, a partir dos meios pelos quais as necessidades de vida são construídas em coletivo. Estando a isto associado o trabalho, as diferentes classes sociais e as estruturas políticas existentes são consubstanciadas e explicadas por aquilo que é a atividade económica, e a produção propriamente dita. Esta torna-se no elemento-chave de toda a ordem social, determinando-se a partir de quem produz, de como se produz, e do papel que cada um assume no próprio processo produtivo.

A importância deste estudo se firmar numa toada dialética partiu do grego Heráclito, que influenciou o alemão Georg Friedrich Hegel. Para o helénico, tudo está em transformação constante, havendo dois pendores em cada objeto que se mudam mutuamente, sendo a antítese de uma eventual tese, isto é, de um dado elemento. Desta forma, tanto Marx como Engels acreditam num mundo em que, por força dos mecanismos capitalistas, os operários estão posicionados no lado oprimido, opondo-se aos grandes patrões. Assim como a morte nega a vida, fases, como a feudal, a esclavagista, e a capitalista, contêm em si as sementes do seu fim. Desta feita, as causas materiais que motivam a evolução dialética da história fundem aquilo que é a conceção do materialismo histórico neste discorrer de oposição entre dois elementos sociais contrários, que acabam superados por uma nova etapa da sociedade, em que os baluartes acabam por ser remodelados e reformulados ao serviço desta.

Esta conceção, fundamentalmente trabalhada por Marx, parte da teoria que apresenta a infraestrutura, – as condições e atores da produção – e a superestrutura – inclui a cultura e a estrutura sociopolítica de um país. A base material parte daquilo que é o resultado da dinâmica produtiva, isto é, daquilo que é o produto, e das suas transações e dos consumos. A materialidade acaba por ser um caminho que permite dar seguimento ao caminho humano, dando um fio coerente e lógico para as várias gerações. Esta fixação pela materialidade de Marx vai ao encontro da filosofia hegeliana, que inverte do idealismo para o materialismo. Para o alemão, as ideias seriam somente o reflexo daquilo que as classes sociais dominantes pretendiam transmitir, dando azo à sua consolidação ideológica. Esta construção é que, por sua vez, apresenta a realidade como um palco de consumo e de exploração produtiva, distante dos prismas religiosos e jurisdicionais, distante da afirmação pela produção cultural e artística, mas podendo, através desta, apresentar o mundo a seu bel prazer.

Desta feita, é tomado em consideração que a evolução histórica se dá, desde os primórdios das organizações sociais, com a exploração por parte de um indivíduo de um outro. Esta premissa acaba por permitir caraterizar as relações entre as diferentes classes sociais, que se foram formalizando e metamorfoseando conforme cada contexto espácio-temporal. Esta mudança dava-se pela mudança de uma das partes, quer ou dos meios produtivos, ou das próprias forças de produção. No feudalismo, os servos seriam oprimidos pelos grandes senhores, enquanto, no capitalismo, e na sua ótica, a classe operária acabava subjugada perante a burguesia. O apelo à luta do protelariado advém, precisamente, desta conclusão, perante as iniquidades e fragilidades do capitalismo, nascido no revés e na própria antítese do feudalismo. Estas preocupações laborais e sociais foram tomadas em conta nas diversas democracias europeias, mas também nos regimes corporativistas e autoritários do Sul da Europa, cambaleando entre interpretações mais ou menos radicais.

Ainda no que concerne ao materialismo dialético, este envolve-se naquilo que é a filosofia, e assinala a relevância do meio ambiente na modelação daquilo que são os seres vivos, e a própria cultura em que se enquadram, negando qualquer interferência divina nessa componente. Assim, e reconhecendo o pensamento como operante naquilo que é a sociedade, é da matéria, dos meios e mecanismos de produção, que se parte para a construção cognitiva, embora Marx negue a síntese hegeliana. No lugar desta, assiste-se à transformação da relação entre os elementos, que Engels não dissocia do que ocorre na Natureza. Tal como na Natureza, sujeito e objeto, os dois intervenientes numa dada ligação, não vivem um sem o outro, existindo a necessidade desta dualidade na prossecução marxista. Na essência, contudo, estão as contradições que a História traz na sua cronologia, que levam a que haja uma constante necessidade de superação, compreendendo a dinâmica sistemática da realidade. Na mudança, todas as áreas do saber, do fazer, e do compreender acabam influenciadas, digladiando perante o institucionalizado na política, na economia, na sociedade, e na cultura.

A mais-valia e o modo de produção
Este conceito é mais um que é estudado por Marx, e que define aquilo que resulta da diferença entre o valor final da mercadoria resultante da produção, e o valor total dos meios de produção e do próprio trabalho. Assumindo-a como a base do lucro capitalista, o germânico convida as óticas dos economistas britânicos Adam Smith e de David Ricardo para a discussão da definição. A do primeiro perspetiva que o lucro é gerado pelo mercado, do binómio oferta-procura, que se afasta do próprio trabalho a partir dos diversos caminhos que a mercadoria final pode levar. De muito vale a própria propriedade privada do capital, pois o rendimento de um empresário não depende assim tanto do trabalho, mas mais dos investimentos efetuados. Já a do segundo, via o lucro como a sobra daquilo que os salários e as rendas totalizavam, que se ia comprimindo consoante a inflação dos valores de ambos.

A influência deste fez-se sentir no princípio do trabalho teórico de Marx, mas a influência sociocultural, e a dependência do lucro da própria produtividade levou-o a estudar uma nova fundamentação para o lucro capitalista. Tendo também em conta a mecanização produtiva, o valor de trabalho que cada um oferece torna-se mais abstrato, não se podendo averiguar tangivelmente aquilo que é o salário de cada trabalhador. Influenciadas pelo mercado, as origens do lucro moram na propriedade do capital, naquilo que cada empresário concentra e gera a partir das suas estruturas. Porém, a questão que levantou a indignação marxista centrou-se na divisão desse mesmo lucro, e naquilo que os operários beneficiavam deste. No final, Marx considerava o lucro como o excedente que resulta de uma relação social num dado contexto histórico e económico.

No que ao conceito de mais-valia concerne, foram destrinçados dois tipos de mais-valia, empreendidos pelos patrões para aumentar a sua taxa de lucro, sendo estes o tipo absoluto, e o relativo. Quanto ao primeiro, passa por aumentar a duração do dia laboral, e manter o salário; já o segundo, visa ampliar a mecanização do processo produtivo. Refutando a visão de Ricardo do que era o lucro, o germânico observa a maior disponibilidade dos patrões capitalistas para influenciar o lucro que auferem, tanto através do recrudescimento da produção, como do ritmo do trabalho. Mecanismos, como a supervisão rígida e apertada do trabalho, tornavam possível o aumento da produção das ditas mercadorias, sem necessitar de desembolsar mais para o pagamento dos vencimentos dos trabalhadores.

É neste prisma que assenta a visão marxista da economia, que, à data, critica o papel do juro como fonte de acumulação de riqueza por parte do patronato. Para Marx, este não é algo que decorre da remuneração normal do capital, mas sim de um pendor social, sendo uma forma pela qual a totalidade das mais-valias dos trabalhadores se vê gerida e redistribuída pelos capitalistas. Dos operários até aos concentradores do capital, as necessidades variam, porque urge a utilização do mesmo por parte dos primeiros para a sua sobrevivência, enquanto os segundos vão acolhendo e recolhendo o lucro, atendendo às necessidades e flutuações de mercado, e distribuindo-o de forma autónoma.

À geração da mais-valia, está associado o modo de produção, i.e. a forma como se organizam as forças produtivas, e as relações de produção entre os trabalhadores e os capitalistas. Exposto às evoluções ambientais, acabam por, em conjunto com toda a sociedade, atravessar por mudanças estruturais e conjunturais, alterando-se, com regularidade, a partir das classes emergentes e dominantes. Todavia, está-lhe inerente a definição dos processos, instituições, e ligações entre as partes envolvidas no desenrolar produtivo. No que toca ao parecer marxista, a estrutura económica da sociedade forma-se a partir dos meios de produção, fulcrais no estabelecimento das conexões entre as forças humanas de produção. Sendo o ser social que determina a consciência, as forças chegam a um ponto de rutura, em que, em tempo de se assistir ao seu desenvolvimento, este se vê obstruído pelas divergências nas relações. Estas constantes desadequações acabam por funcionar como a plataforma onde o antagonismo social se revela, partindo, indiretamente, dos próprios meios de produção. O filósofo, indicando a sociedade burguesa como o exemplo destas evidências, aponta o caminho para a já aludida superação pela luta de classes.

A ideologia, a alienação e o fetichismo
No seio da observação marxista, a ideologia assume um papel importante, atuando como uma espécie de máscara daquilo que a realidade, de facto, é. Trata-se, por isso, de uma consciência falsa, advinda da própria divisão do trabalho manual do intelectual, e conduzida por vários pensadores que distorcem, com êxito, as relações de produção. A ideologia mostra-se como uma ferramente importante para as classes dominantes, convergindo em relação aos seus interesses, e revelando-se a partir das ligações estabelecidas nos recintos produtivos. Importa transportar estes recintos para aquilo que é a sociedade, assente pela própria estratificação nos locais de trabalho, e no auferir do capital. Esta perceção de Marx quanto ao conceito de ideologia, estando muito da sua visão associada à sua associação com Engels, com quem redigiu “A Ideologia Alemã” (1846), a primeira obra do duo, onde explana essa noção à luz da realidade do país. Os pensadores subsequentes viriam a conferir novas e atualizadas posições daquilo que é a ideologia, incluindo a revelação da conceção “latente” de Marx, da autoria do inglês John B. Thompson, que a via como a metodologia na qual as relações de domínio e de subjugação se davam.

A própria ideologia contribui para que, no seio do indivíduo, se assista ao desenvolvimento de uma caraterística, que é a alienação. Esta redunda na submissão inconsciente ao discurso ideológico das classes dominantes, assistindo-se a esta no próprio trabalho, acabando por se propagar até ao quotidiano, e por se entranhar na organização social. Marx refere também a alienação na burguesia, em que os indivíduos passam a idolatrar certos materiais ou posses (fetichismo), prescindindo-se do ser em detrimento do opulento ter. Para que o repertório material se constitua, é, pois, necessário o capital para o adquirir, dando a ideia de que este é capaz de oferecer tudo aquilo que um alguém pretende deter. A alienação acaba por partir da consciência para tudo o resto, alastrando-se até aos próprios modos e métodos quotidianos de produção e de transação.

O fetichismo tem, como coordenadas, uma inversão de papéis, atuando as coisas como pessoas, e vice-versa. O reflexo disso está, precisamente, nas próprias transações de mercadorias, produzidas por necessiades alheias, e com valores definidos pelo mercado. Desta forma, a figura humana atua com pouca diferenciação, seguindo as orientações mecânicas e económicas, cingindo-se a um papel de agente. Marx apoia a sua ideia de que, no capitalismo, a produção é mais autónoma do que o ser humano a partir deste exemplo, colocando em risco o papel do ser humano na supervisão e controlo das variáveis económicas. É neste contexto que, para o alemão, urgiria transformar a propriedade privada em coletiva, e findar o valor de mercado dos bens, tornando-se crucial o valor de uso. É por isto que acredita que, no seu entender, a economia política não se consegue soltar do fetichismo, sendo a produção algo natural, e que acaba por levar a que muitos economistas contemporâneos se dediquem afincadamente a avaliar as tendências de mercado como proeminentes na atividade económica atual.

A luta de classes
Na superação – ou na tese hegeliana – daquilo que é o status quo do contexto produtivo, apresenta-se a luta de classes, onde, no discutir das condições socioeconómicas, se dá o confronto das classes oprimidas em relação àquelas que detêm o controlo das forças produtivas capitalistas. Este tipo de luta seria aquele que estaria na origem das grandes revolução do percurso histórico até então, dando origem a que o padrão social se modificasse por completo. No caso analisado por Marx, as origens estariam na propriedade privada dos meios de produção, levando a que a sociedade se dividisse em proprietários burgueses e em operários. Os primeiros retinham a mercadoria produzida pelos segundos, que recebiam um salário de acordo com a qualificação que tivessem. Esta conjuntura levaria, no seu parecer, a que a luta de classes se desencadeasse, e desse origem à ditadura do proletariado, onde as classes seriam abolidas, e se assistiria a uma sociedade sem qualquer hierarquização e/ou fragmentação.

Esta luta desemboca naquilo que é o fim do capitalismo, e das próprias classes sociais, assumindo-se o socialismo como fase transitória do capitalismo para o comunismo. A proposta da abolição das classes seria, também, um ponto de partida para o nascimento do anarquismo, que visava findar qualquer tipo de poder estatal central. Para fundamentar a luta de classes até ao fim destas, Marx refere as sociedades indígenas americanas, que se orientavam por figuras simbólicas da sua cultura. Isto propiciava-se pela falta de excedente produtivo, levando a que todos os membros integrassem o processo de produção, e impedindo a formação de qualquer classe. Porém, mal se assiste à separação do homem da mulher, e da subjugação por parte do primeiro a esta, geram-se fundamentos para que essa luta se desenrole. Aliás, Engels discorre, de um ponto de vista antropológico, sobre a necessidade da mulher se emancipar, e se integrar na dinâmica social e produtiva, colocando o tradicional papel doméstico como algo complementar, ao invés de principal (“A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado“, de 1884).

As lutas de classes, por sua vez, sucedem-se quando o excedente justifica que isso aconteça, em que se assiste a jogos das classes dominantes para benefício próprio. Formulando-se e consolidando-se uma ou mais classes dominantes, as que se encontram na base da pirâmide hierárquica sentem a necessidade de se emancipar do jugo que explora o seu trabalho e o proveito financeiro consequente da atividade produtiva. Despoletando o conflito, depõe-se a(s) classe(s) do topo, e assiste-se a uma nova a tomar o seu lugar, de forma mais ou menos pronunciada. É esta dinâmica que Marx denuncia, e que aponta como a matriz de todas as convulsões revolucionárias de vulto no íntimo de uma sociedade.

A ditadura do Proletariado
Esta fase trata-se do derradeiro estádio da proposta de Marx e de Engels antes da afirmação plena do comunismo, em que o próprio proletariado assume o controlo do poder político, derrubando a cimeira figura do Estado, e gorando os princípios e meios capitalistas. Aliás, a própria União Soviética, encimada por figuras como Vladimir Lenine, Leon Trotsky, e Joseph Estaline, instrumentalizou e apresentou a mais próxima adaptação do modelo teorizado pelos alemães, apesar de acabar bastante enviesado em relação àquilo que os preceitos de Marx e de Engels apresentam. Estes serviram, sim, de fundamento a muitos dos estados que se declararam comunistas pelo globo, culminando nos sul-americanos.

Na teoria, apresenta-se como um estado democrático, no qual a autoridade pública é eleita por sufrágio universal, estando ela proliferada pelos trabalhadores. Na prática, os germânicos associam a própria Comuna de Paris do século XIX, que se seguiu à Guerra Franco-Prussiana, como um exemplo daquilo que é a ditadura do proletariado. Esta foi teorizada por Karl Marx, e, depois, complementada por Friedrich Engels. Primeiramente, Marx afirma que qualquer governo é, direta ou indiretamente, uma ditadura de uma classe em relação a outra(s), e que só poderia ser derrubado através da derrocada mais ou menos violenta dos pilares sociais desse figurino.

Assim, a ditadura do proletariado foi-se fundamentando na regulação criteriosa e rotinada dos diferentes indicadores socioeconómicos, incluindo os rendimentos. Aquilo que fosse necessário retirar para garantir a sustentabilidade da produção, e para manter uma fonte estável para eventuais seguros, seria extraido aos vencimentos, sem prejudicar a equidade apregoada. Para este europeu, o Estado tem a obrigação de cobrir as despesas administrativas, de agilizar recursos para a garantia da funcionalidade dos serviços públicos, e de assegurar a sustentabilidade financeira dos fisicamente impossibilitados de trabalhar. Aquilo que sobrasse das despesas internas, seria repartido devidamente pelos trabalhadores, de acordo com o esforço empreendido por cada um. De acordo com esta lógica, aqueles que realizassem lavoros mais complexos, ou se voluntariassem para esforços suplementares, deveriam de receber um valor ajustado a isso mesmo. Neste período, decorreria a cessação de qualquer vestígio capitalista, eclipsando-se no auge das suas contradições.

Por sua vez, Engels destaca a força e a violência como variáveis importantes na transformação revolucionária, uma vez que, só assim, as elites seriam obrigadas a desvincular-se dos seus privilégios. O pensador aproxima-se de Marx na assunção da força impulsionadora que o papel revolucionário traz, funcionando como um mecanismo de renovação e de superação do arcaico e do iníquo, sem nunca esquecer a importância da expressão virulenta e agressiva por parte dos oprimidos. Desta feita, é com mais radicalismo, e anunciando a importância de uma expressão firme e capaz de desarticular as doutrinas existentes, que apela a essa luta de superação e de transcendência material.

O materialismo dialético na ciência
No amadurecer daquilo que é o materialismo histórico e dialético exposto acima, Engels tentou aplicá-lo à ciência, tendo, para isso, redigido, no ano de 1883, “Dialética da Natureza“, obra que não terminou. Abordagem presa àquilo que era a atividade científica, ainda sem as imensas evoluções fisico-químicas que conheceu, o alemão centrou-se naquilo que era o encarar dos dilemas intelectuais de então. Assim, foram várias as espécies de leis apresentadas, e que sumarizariam o trabalho científico até então. Entre elas, estava a da transformação da quantidade em qualidade e vice-versa, onde se assiste a uma transição de fase, possibilitando que a mesma ocorresse no seio estrutural da sociedade – a relação entre os comportamentos da Física com as dinâmicas sociais formou a sociofísica. Na génese da ciência perspetivada por Engels, está a correlação da mão e do cérebro humanos, crescendo inseparavelmente e, ao seu estado de desenvolvimento, correspondendo a adaptação aos tempos. Um dos pontos curiosos que é estudado nesta obra do germânico é a caraterização dos vertebrados, que os vê munidos com um corpo influenciado pelo sistema nervoso, regulado pela crescente auto-consciência.

Karl Marx e Friedrich Engels propuseram, num ponto de vista materialista, historicista, e dialético, uma metodologia sociopolítica a partir da qual superar as iniquidades e as fragilidades do sistema capitalista. À luz da atmosfera social, que se expressou de formas replicáveis, mas com diferentes moldes, o par de pensadores declarou a luta de classes como essencial, tendo em vista a plena afirmação do comunismo. Não obstante as orientações e ideologias dos vários nomes que os sucederam, importa não descartar a repercussão atingida pelos escritos e ensaios de ambos, naquilo que é o estudo sociocultural e político da realidade, mas também no que são os diferentes contextos históricos que o tempo apresenta, e que não esconde os papéis desempenhados por cada um. Marx, mais criativo, e Engels, mais responsivo, foram, desta forma, duas mentes capazes de iluminar uma nova perspetiva, e que, de melhor ou de pior maneira, foram interpretados na prática por diferentes ramificações políticas, sustentadas em diferentes convicções. Mais do que as propostas e respostas, as investigações e as constatações de um mundo sociopolítico que, por mais que gire, suscite mais questões do que conclusões.