Mostrar mensagens com a etiqueta SIDA. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta SIDA. Mostrar todas as mensagens

sábado, 1 de junho de 2024

Livro: O Fim da Pobreza


Um livro essencial, publicado originalmente em 2005. Tem cerca de 550 páginas, por isso demora um pouco a lê-lo. Mas o fim da pobreza é possível. Para quem não conhece Jeffrey Sachs foi considerado pela revista Time uma das cem pessoas mais influentes do mundo. Jeffrey D. Sachs foi director do Instituto da Terra (Earth Institute), é professor de Desenvolvimento Sustentável, de Políticas de Saúde e de Gestão na Universidade de Colúmbia, foi conselheiro especial do secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan e director do Projecto Milénio da ONU, sendo internacionalmente reconhecido pelo seu trabalho como conselheiro económico de governos da América Latina, Europa de Leste, Ásia e África.

Sachs visitou mais de cem países e conviveu com todos os graus de pobreza, especialmente a miséria extrema das aldeias africanas assoladas pela fome, pela malária e pela SIDA.

Unindo a narração de histórias emocionantes (passadas principalmente na Bolívia, Polónia, Rússia, Índia, China e África) com análise rigorosa, Sachs explica como, nos últimos duzentos anos, a riqueza se tornou desigual no planeta e expõe os motivos que impedem as nações mais pobres de melhorar sua sorte. Ele também ensina a fazer um diagnóstico detalhado dos desafios económicos a serem enfrentados por um país e a descobrir as possíveis saídas, propondo soluções a curto prazo. Ao mesmo tempo, dirige duras críticas aos países ricos - em especial os Estados Unidos - e aos organismos financeiros internacionais.

Oito milhões de pessoas morrem todos os anos porque são demasiadamente pobres para sobreviver. "O Fim da Pobreza" traça um plano alternativo da forma como as podemos salvar.

Nesta obra, Sachs explica como a pobreza tem sido combatida e como, por meio de passos exequíveis, é possível fazer progressos reais junto daquela enorme fatia da Humanidade que continua a viver na miséria. De referir, como exemplo, a forma de estabelecer parcerias com os mais ricos, o pouco que isso custa e o modo como toda a gente pode ajudar.

sexta-feira, 22 de março de 2024

A Revolution in American Foreign Policy


A sad fact about the politics of Washington is that some of the most important issues facing the United States and the world are rarely debated in a serious manner. Nowhere is that more true than in the area of foreign policy. For many decades, there has been a “bipartisan consensus” on foreign affairs. Tragically, that consensus has almost always been wrong. Whether it has been the wars in Vietnam, Afghanistan, and Iraq, the overthrow of democratic governments throughout the world, or disastrous moves on trade, such as entering the North American Free Trade Agreement and establishing permanent normal trade relations with China, the results have often damaged the United States’ standing in the world, undermined the country’s professed values, and been disastrous for the American working class.

This pattern continues today. After spending billions of dollars to support the Israeli military, the United States, virtually alone in the world, is defending Prime Minister Benjamin Netanyahu’s right-wing extremist government, which is waging a campaign of total war and destruction against the Palestinian people, resulting in the deaths of tens of thousands—including thousands of children—and the starvation of hundreds of thousands more in the Gaza Strip. Meanwhile, in fear-mongering around the threat posed by China and in the continued growth of the military industrial complex, it’s easy to see that the rhetoric and decisions of leaders in both major parties are frequently guided not by respect for democracy or human rights but militarism, groupthink, and the greed and power of corporate interests. As a result, the United States is increasingly isolated not just from poorer countries in the developing world but from many of its long-standing allies in the industrialized world, as well.

Given these failures, it is long past time to fundamentally reorient American foreign policy. Doing so starts with acknowledging the failures of the post–World War II bipartisan consensus and charting a new vision that centers human rights, multilateralism, and global solidarity.

A shameful track record 
Dating back to the Cold War, politicians in both major parties have used fear and outright lies to entangle the United States in disastrous and unwinnable foreign military conflicts. Presidents Johnson and Nixon sent nearly three million Americans to Vietnam to prop up an anticommunist dictator in a Vietnamese civil war under the so-called domino theory—the idea that if one country fell to communism the surrounding countries would fall as well. The theory was wrong, and the war was an abject failure. Up to three million Vietnamese were killed, as were 58,000 American troops.

The destruction of Vietnam was not quite enough for Nixon and his Secretary of State Henry Kissinger. They expanded the war into Cambodia with an immense bombing campaign that killed hundreds of thousands more people and fueled the rise of the dictator Pol Pot, whose subsequent genocide killed up to two million Cambodians. In the end, despite suffering enormous casualties and spending huge amounts of money, the United States lost a war that never should have been fought. In the process, the country severely damaged its credibility abroad and at home.

Washington’s record in the rest of the world was not much better during this era. In the name of combating communism and the Soviet Union, the U.S. government supported military coups in Iran, Guatemala, the Democratic Republic of Congo, the Dominican Republic, Brazil, Chile, and other countries. These interventions were often in support of authoritarian regimes that brutally repressed their own people and exacerbated corruption, violence, and poverty. Washington is still dealing with the fallout from such meddling today, confronting deep suspicion and hostility in many of these countries, which complicates U.S. foreign policy and undermines American interests.

A generation later, after the 9/11 terrorist attacks in 2001, Washington repeated many of these same mistakes. President George W. Bush committed nearly two million U.S. troops and over $8 trillion to a “global war on terror” and catastrophic wars in Afghanistan and Iraq. The Iraq war, much like Vietnam, was built on an outright lie. “We cannot wait for the final proof—the smoking gun that could come in the form of a mushroom cloud,” Bush infamously warned. But there was no mushroom cloud and there was no smoking gun, because the Iraqi dictator Saddam Hussein didn’t have any weapons of mass destruction. The war was opposed by many U.S. allies, and the Bush administration’s unilateral, go-it-alone approach in the run-up to the war severely undermined American credibility and eroded trust in Washington around the world. Despite this, supermajorities in both chambers of Congress voted to authorize the 2003 invasion.

The Iraq war was not an aberration. In the name of the global war on terror, the United States carried out torture, illegal detention, and “extraordinary renditions,” snatching suspects around the world and holding them for long periods at the Guantánamo Bay prison in Cuba and CIA “black sites” around the world. The U.S. government implemented the Patriot Act, which resulted in mass surveillance domestically and internationally. The two decades of fighting in Afghanistan left thousands of U.S. troops dead or wounded and caused many hundreds of thousands of Afghan civilian casualties. Today, despite all that suffering and expenditure, the Taliban is back in power.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Encontros Improváveis: Al Berto e Clan of Xymox - There´s No Tomorrow


Este Não-Futuro que a Gente Vive

Será que nos resta muito depois disto tudo, destes dias assim, deste não-futuro que a gente vive? (...) Bom, tudo seria mais fácil se eu tivesse um curso, um motorista a conduzir o meu carro, e usasse gravatas sempre. Às vezes uso, mas é diferente usar uma gravata no pescoço e usá-la na cabeça. Tudo aconteceu a partir do momento em que eu perdi a noção dos valores. Todos os valores se me gastaram, mesmo à minha frente. O dinheiro gasta-se, o corpo gasta-se. A memória. (...) Não me atrai ser banqueiro, ter dinheiro. Há pessoas diferentes. Atrai-me o outro lado da vida, o outro lado do mar, alguma coisa perfeita, um dia que tenha uma manhã com muito orvalho, restos de geada… De resto, não tenho grandes projectos. Acho que o planeta está perdido e que, provavelmente, a hipótese de António José Saraiva está certa: é melhor que isto se estrague mais um bocadinho, para ver se as pessoas têm mais tempo para olhar para os outros.
Al Berto, in "Entrevista à revista Ler (1989)"


Al Berto  Full Movie  (Portuguese; English)

Resenha do Filme Al Berto

O filme AL BERTO, do realizador Vicente Alves do Ó, teve estreia comercial a 5 de Outubro de 2018. Um filme é sempre o resultado de duas coisas, o olhar de quem o filma e as condições de produção que o circunscreveram. Este axioma encerra e contém todos as variáveis, equipas artísticas e técnicas, contextos, estéticas e pensamento cinematográfico, distribuição e mercados. Este AL BERTO é o do Vicente Alves do Ó.

Na nota biográfica que se pode ler na página da Assírio & Alvim, editora da obra poética do AL BERTO, prémio PEN de poesia em 1987, lê-se : “Poeta e editor português, de nome completo Alberto Raposo Pidwell Tavares, nasceu a 11 de Janeiro de 1948, em Coimbra, e faleceu a 13 de Junho de 1997, em Lisboa. Tendo vivido até à adolescência em Sines, exilou-se, entre 1967 e 1975, em Bruxelas, dedicando-se, entre outras atividades, ao estudo de Belas-Artes.

Publicou o primeiro livro dois anos depois de regressar a Portugal.

Em mais de vinte anos de actividade literária, a expressão poética assumida por Al Berto, o pseudónimo do autor, distingue-se de qualquer outra experiência contemporânea pela agressividade (lexical, metafórica, da construção do discurso) com que responde à disforia que cerca todos os passos do homem num universo que lhe é hostil. Trazendo à memória as experiências poéticas de Michaux ou de Rimbaud, é no próprio sofrimento, na sua violenta exaltação, na capacidade de o tornar insuportavelmente presente (nas imagens de uma cidade putrefacta, na obsidiante recorrência da morte e do mal, sob todas as suas formas) que a palavra encontra o seu poder exorcizante, combatendo o mal com o mal. É neste sentido que Ramos Rosa fala de uma “poesia da violência do mundo e da realidade insuportável”: “a opacidade do mal ou a agressividade do mundo é tão intensa que provoca um choque e um desmoronamento geral”, mas “à violência desta destruição responde o poeta com uma violenta negatividade que é uma pulsão de liberdade absoluta, que procura por todos os meios o seu espaço vital.”, sublinhando ainda a forma como esta espécie de “grito de fragilidade extrema e irredutível do ser humano, do seu desamparado infinito, da sua revolta absoluta e sem esperança”, se consubstancia, ao nível do estilo, num ritmo “ofegante, precipitado, como um assalto contínuo feito de palavras tão violentas como instrumentos de guerra” (cf. ROSA, António Ramos – A Parede Azul. Estudos Sobre Poesia e Artes Plásticas, Lisboa, Caminho, 1991, pp. 120-121).”

No filme do Vicente Alves do Ó, conhecemos um Al Berto nos anos de 1975, em Sines, regressado do seu exílio em Bruxelas.

Importa notar que 1975 é o ano quente, o tempo de maior tensão social e cultural vivido na sociedade portuguesa depois dos anos de convulsão do final da regime Monárquico e implantação da República nos anos de fronteira do séc. XIX para o Séc. XX.

O mundo estava ainda dividido em mundo livre, o mundo Ocidental de economia de mercado aberto, e o mundo para lá da “cortina de ferro” , a Europa Oriental e a sua zona de influência , de sistema comunista, mercado planificado e onde o Estado era assumido como um poder de classe, mas naquele caso, a classe dos proletários.

Em Portugal sonhava-se as possibilidades do mundo. Sines avançava nos projetos já anteriormente decididos (Estado Novo) da grande indústria da energia a partir do petróleo. Sines, a vila porto de pesca, vivia novos enxames, gente que chegava das ex-colónias e ali procurava um recomeço de vida, e mão de obra à procura do salário.

A Sines chegava também o poeta. A casa apalaçada da sua família tinha, como tantas outras, sido objecto de expropriação. Desabitada, era o lugar ideal para um Maio de 68, não em Paris, mas em Sines. Este é o contexto.

O filme mostra um AL BERTO em que o seu capital de transgressão pouco mais parece ser do que o desregramento e o amor homossexual . Poderá a muitos não parecer pouco. Para mim é. Pouco se percebe, para quem não o saiba já, do tempo social e histórico em que a narrativa acontece. Pouco se sabe da profunda sensibilidade estética, do homem que na sua vida e já naquele tempo teve como lugar absoluto a sua obra literária.

Por essa altura, 1974/75 escreveu “ À procura do vento num Jardim d’ Agosto” , em “atrium” , lê -se:

“ luta de sonâmbulos animais sob a chuva, insectos quentes escavam geometrias de baba pelas paredes do quarto, em agonia, incham, explodem contra a límpida lâmina da noite, são resíduos ensanguentados do ritual.

na cal viva da memória dorme o corpo. vem lamber-lhe as pálpebras um cão ferido. acorda-o para a inútil deambulação da escrita.                                                  abandonado vou pelo caminho de sinuosas cidades, sozinho, procuro o fio de néon que indica a saída.

eis a deriva pela insónia de quem se mantem vivo num túnel de noite, os corpos de Alberto e Al berto vergados à coincidência suicidaria das cidades.

eis a travessia deste coração de múltiplos nomes: vento, fogo, areia, metamorfose, água, fúria, lucidez, cinzas.

ardem cidades, ardem palavras, inocentes chamas que nomeiam amigos, lugares, objectos, arqueologias, arde a paixão no esquecimento de voltar a dialogar com o mundo, arde a língua daquele que perdeu o medo.

germinam fluidos mágicos por dentro da matéria contaminada do corpo, os órgão profundos gemem assustados pelo excesso, nunca mais voltámos a encontrar um paraíso. a pausa para respirar não existe, o tempo dos grandes desertos absorveu a seiva dos adolescentes dias.

a insónia, essa ferida cor de ferrugem, festeja noctívagas alucinações sobre a pele. no ácido écran das pálpebras acendem-se quartos alugados onde pernoitamos. são enfim brancos esses pedaços de memória onde dávamos abrigo e sossego aos corpos.

para sobreviver à noite decidimos perder a memória. cobríamo-nos com musgo seco e amanhecíamos num casulo frio, perdidos no tempo, mas, antes que a memória fosse apenas uma ligeira sensação de dor, registámos inquietantes vozes, caminhámos invisíveis na repetição enigmática das máscaras, dos rostos, dos gestos desfazendo-se em cinza. escutámos o que há de inaudível em nossos corpos.

era quase de manhã no fim do cansaço. despertava em nós o vago e trémulo desejo de escrever.

O filme AL BERTO do Vicente Alves do Ó, acontece, propõe-se acontecer no tempo desta escrita, e tem o mérito de nos permitir regressar a ela, de exigir mesmo esse regresso a todo do corpo da escrita do poeta, porque é aí, e só aí, que sentimos o batimento do sangue, o sal das lágrimas, o espanto e o horror do mundo, neste combate em que raramente se passa o estágio de aprendiz ofuscados na euforia das guitarras eléctricas e esparsos fios de mel.

Vicente Alves do Ó, é um realizador inteligente, sabe o que quer, sabe onde está. Sabe também que cenas como a vandalização da livraria que coloca no filme não aconteceram. Sabe que a homossexualidade e o comportamento transgressivo da norma sexual é um dado permanente e comum, embora sempre um interdito, no quotidiano das comunidades, sejam rurais ou citadinas, agora ou ontem. Mas a associação direta do artista, da sensibilidade inerente à prática e exercício duro, solitário, feroz, radical, da arte, à homossexualidade, coisa muito vista cá no burgo, é uma falácia, como outras. Ser homossexual não é passaporte para ser poeta, ou cineasta, ou pintor, como evidentemente também não é impeditivo, nem barreira.

Hoje, quando passam 20 anos ( o tempo corre veloz) , da morte do Alberto e do Al Berto, SINES vive-o como o seu máximo e justo herói. AL BERTO é património e identidade de SINES, tal como o Festival Músicas do Mundo recentemente distinguido – a 19 de Setembro- pela Plataforma Europeia de Festivais , entre os 715 festivais de todas as áreas artísticas, um dos seis vencedores desse prémio europeu.

Ou a excomunhão farisaica de que nos fala Vicente Alves do Ó, de uma vila a expulsar um dos seus habitantes, não tem uma ligação assim tão direta ao real vivido pela comunidade, ou a mentalidade da comunidade mudou totalmente, e o pecador é agora o santo eleito.

Inocente também não é colocar o partido comunista português como o agente principal da repressão à liberdade de costumes do poeta. É uma visão, a do realizador, e terá sempre o mérito de trazer à discussão o cinema português e o poeta Al Berto.

No filme temos alguns rasgos do imaginário e do real, e em várias sequências estivemos perto de um tratamento com maior profundidade da complexidade do pulsar da realidade social nesse tempo retratado, mas quase sempre, a inquietude e o sonho do mundo, fica reduzida a um registo pop gay.

O poeta AL BERTO resiste, foge, como sempre fez, arde no caminho solitário como cometa, resiste consciente da sua efemeridade, foge da tela para a obra, a palavra escrita, onde permanecerá maior e voz singular.