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domingo, 23 de junho de 2024

Milhares de pessoas marcham em Londres pela proteção da natureza e do clima


Londres, 22 jun 2024 (Lusa) - Milhares de pessoas participaram hoje numa manifestação em Londres, promovida por organizações como a Extinction Rebellion (XR) e o World Wide Fund for Nature (WWF), para apelar aos políticos para que atuem pela natureza e pelo clima.

Esta manifestação acontece a menos de duas semanas das eleições legislativas de 04 de julho no Reino Unido. Segundo as recentes sondagens, os trabalhistas estão amplamente em vantagem, prevendo-se, assim, uma pesada derrota para os conservadores, no poder há 14 anos.

A atriz britânica Emma Thompson e o naturalista e apresentador britânico Chris Packham ocuparam os lugares da frente na marcha realizada em Londres, pedindo para se “restaurar a natureza agora”.

Chris Packham explicou que esta é a primeira vez que organizações tão diferentes se unem para uma manifestação, dando como exemplo o National Trust (Fundo Nacional para Locais de Interesse Histórico ou Beleza Natural), que defende a herança britânica, e o grupo ativista ambiental Just Stop Oil, representado por ecologistas que são muito controversos pelas ações contundentes que realizam.

Fazendo-se notar de forma muito colorida, a manifestação decorreu num ambiente de boa disposição, num percurso desde Hyde Park até ao parlamento, em Westminster.

Entre a multidão de manifestantes, que vieram de várias zonas do Reino Unido, havia muitos fantasiados de animais, incluindo girafas e ursos.

“Não há vida sem vida selvagem” e “Não há botão para começar do zero” eram algumas das mensagens dos cartazes erguidos na manifestação.

Em declarações à agência de notícias France-Presse (APF), a atriz britânica Emma Thompson dirigiu-se aos políticos: “Parem de ser tão profundamente irresponsáveis”.
“Não acredito na falta de compromisso deles” com o clima durante a campanha eleitoral, criticou a atriz, que é ativista ambiental, alertando que o planeta está “no meio da tempestade”, manifestando “surpresa ao ver quanta negação ainda existe”.

Emma Thompson disse que apoia o grupo Just Stop Oil, do qual dois ativistas pulverizaram, na quarta-feira, tinta nos monólitos do famoso sítio pré-histórico inglês de Stonehenge.

O Just Stop Oil reclama o fim da exploração de combustíveis fósseis até 2030.

“Penso que apoio todos os que estão a liderar este combate extraordinário”, disse Emma Thompson, defendendo que não se pode mais extrair petróleo do solo.

O naturalista e apresentador britânico Chris Packham disse não estar muito impressionado com o conteúdo dos programas dos vários partidos políticos britânicos.

“Quando se trata de enfrentar os verdadeiros grandes problemas, não há substância, compromisso ou determinação para enfrentá-los, e isso é realmente dececionante”, criticou Chris Packham

quarta-feira, 1 de maio de 2024

I Have a Dream, Benjamin Netanyahu

Eu Tenho um Sonho” é uma frase famosa proferida por Martin Luther King Jr. durante seu discurso icônico, intitulado “I Have a Dream”.

Este discurso foi proferido em 28 de agosto de 1963, durante a Marcha em Washington por Empregos e Liberdade.

"I say to you today, my friends, so even though we face the difficulties of today and tomorrow, I still have a dream. It is a dream deeply rooted in the American dream.…I have a dream that my four little children will one day live in a nation where they will not be judged by the color of their skin but by the content of their character. I have a dream that…one day right there in Alabama, little Black boys and Black girls will be able to join hands with little white boys and white girls as sisters and brothers." [Fonte: Britannica]

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

O estado de Israel usa a lavagem rosa para demonizar a Palestina. Mas há quem o denuncie


A propaganda de Israel usa o pinkwashing para minimizar a homofobia no país e maximizá-la na Palestina. Quer criar uma oposição binária que, quando justaposta, demonstra a sua suposta superioridade civilizacional para ganhar apoio para levar a cabo o extermínio do povo palestiniano.

Multiplicam-se os crimes de guerra hediondos cometidos pelo Estado de Israel na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. Já se cumpriram mais de 100 dias desde o início da fase mais recente e mortífera deste outrora chamado “conflito”, cuja dimensão genocida e colonialista se tornou difícil de ocultar aos olhos do mundo.

Entretanto, aguarda-se, da parte do Tribunal Internacional de Justiça, a decisão sobre a acusação de genocídio do povo palestiniano defendida pela África do Sul e apoiada por várias nações do Sul global. O desenlace será decisivo: ora dará carta branca a outras potências imperialistas para aniquilar populações a seu livre desígnio, ora criará mais uma condenação que Israel não tem incentivo para respeitar, erodindo ainda mais a autoridade dos órgãos internacionais.

Para largos setores da sociedade civil, é incompreensível que um genocídio possa ser levado a cabo com o conhecimento do mundo e o apoio tácito dos dirigentes políticos do Norte global, incluindo dos de Portugal. Para aqueles já próximos da causa palestiniana - que se distingue de outras lutas pela libertação precisamente pela sua relativa visibilidade há largas décadas -, esta incompreensão, mais do que frustrante, deve ser encarada como potente. A indizibilidade do terror a que assistimos força-nos a novos balanços que expliquem como aqui chegámos.

Como pode a “única democracia do Médio Oriente” revelar-se, afinal, o agente terrorista por excelência com o apoio das outras “democracias” que garantem o cumprir do direito e da ordem internacional?

Décadas de pinkwashing israelita
Será talvez surpreendente que no seio de alguns ativismos queer e LGBTQIA+ se tenha encontrado, em especial mas não exclusivamente nas últimas duas décadas, uma das resistências mais consistentes e combativas à propaganda imperialista. Pessoas e coletivos à margem da cisheteronormatividade denunciam, um pouco por todo o mundo, o pinkwashing (“lavagem a rosa”) do Estado de Israel tanto no seu próprio território como nas suas atividades no estrangeiro. Mas o que têm, concretamente, as questões de sexualidade e de género a ver com a ocupação israelita dos Territórios Palestinianos Ocupados (TPO)? Afinal, não é Tel Aviv um oásis de liberdade?

Recuemos no tempo. Israel partilha, na verdade, uma cronologia muito semelhante à de Portugal. O sexo entre adultos do mesmo género foi despenalizado em Portugal em 1982, enquanto em Israel aconteceu seis anos depois, em 1988. Em ambos os casos tratou-se de um ajuste nominal a leis que já não eram exercidas, mas abriu caminho para que os esforços de um novo movimento associativo dessem frutos.

Este ativismo, capaz de dialogar com as instituições e com a sociedade civil, despontou na década de 1990 e celebrou uma série de feitos: interditou a discriminação com base na orientação (1992), promoveu a total participação de soldados homossexuais nas forças armadas (1998), defendeu a adoção por casais homoparentais (2008) e a mudança de género legal sem requerimento de cirurgia de redesignação sexual (2015). Ambos os países superaram a sua imagem retrógrada e desajustada - no caso de Israel, particularmente veiculada ao fundamentalismo religioso - para serem vistas como inquestionavelmente integradas no Norte global, ícones do cosmopolitismo e da tolerância, destinos turísticos com o carimbo LGBT-friendly.

A Marcha do Orgulho de Jerusalém, que tem lugar desde 1997, foi palco de dois esfaqueamentos pela mão do mesmo atacante ultra-ortodoxo, dos quais resultaram vários feridos e a morte de uma adolescente. Em 2019 foram detidos outros 49 possíveis atacantes.

Estas vitórias são-no em ambos os casos porque não foram dadas de mão beijada. No caso israelita, a sua cooptação ofusca as tendências sociais mais reacionárias, bem como as suas próprias contradições enquanto Estado teocrático por definição.

Estas contradições não são menores, mas fundamentais à génese do projeto de Estado desde o seu início, entre forças democráticas e ultra-nacionalistas cuja influência é minimizada mas cujo domínio sobre a legislatura e a sociedade civil são reais. As tensões estão presentes mesmo nos momentos mais simbólicos da tolerância LGBTQIA+. A Marcha do Orgulho de Jerusalém, que tem lugar desde 1997, foi palco de dois esfaqueamentos (em 2005 e em 2015) pela mão do mesmo atacante ultra-ortodoxo, dos quais resultaram vários feridos e a morte de uma adolescente. E, na Marcha de 2019, foram detidos outros 49 possíveis atacantes.

Não nos esqueçamos da celebração do festival WorldPride em Jerusalém, também em 2005, que foi forçosamente adiado para o ano seguinte por causa da acérrima oposição de representantes das três religiões monoteístas e do próprio parlamento israelita. E, em 2009, duas pessoas foram mortas num ataque armado ao centro LGBT de Tel Aviv. São certamente exemplos extremos, mas ilustram um terreno mais complexo do que o de uma meca harmoniosa e isolada contraposta tanto ao fundamentalismo religioso como à violência do “restante” Médio Oriente.

A questão do casamento entre pessoas do mesmo género também é ilustrativa. A 11 de dezembro de 2023, a conta X (antigo Twitter) oficial do Estado de Israel publicou a foto de um casal de dois homens, um pedindo o outro, um soldado em uniforme, em casamento. O tweet congratulou “o lindo casal”, entre um emoji de coração, a bandeira arco-íris e a bandeira israelita. O post omitiu convenientemente que o casamento não poderá ser celebrado no país. É que projetos-lei foram rejeitados no Knesset (assembleia legislativa) cinco vezes e o desafio cultural, bem como o legislativo, que o casamento representa revela o tipo de complexidade que o pinkwashing nos tenta esconder: não existe simplesmente casamento civil num país que não separa a religião do Estado.

O pinkwashing é isto: uma lavagem a cor-de-rosa das realidades complexas em ambos os lados da ocupação. Em Queer Palestine and the Empire of Critique, o antropólogo Sa’ed Atshan sistematiza da seguinte forma os pilares desta retórica: minimizar a homofobia em Israel e maximizar a homofobia na Palestina, para dessa forma criar uma oposição binária que, quando justaposta, demonstra a superioridade civilizacional da primeira face à segunda para ganhar apoio para levar a cabo o seu extermínio. Ou, como o próprio primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, o colocou: “o povo da luz contra o povo das trevas”, o “mal” contra a “liberdade e o progresso”.

sábado, 28 de outubro de 2023

Isto não é uma Floresta - This is not a Forest


O que era esperado continua a acontecer. A destruição de áreas rurais, comunidades e territórios persiste após décadas de advertências, opiniões, discussões, traições e desrespeito. O estado de degradação da floresta portuguesa continua a ser uma condição fundamental para a catástrofe: abandono, monoculturas industriais, espécies invasoras, degradação dos serviços de protecção e vigilância, desinvestimento no interior. Além disso, a seca assola o país devido à crise climática e o calor torna tudo mais frágil. Os incêndios ocorridos este ano em Odemira, Proença-a-Nova, Monchique, Cadaval, entre outros, são a manifestação disso mesmo. Em ciclos cada vez mais curtos, o nosso país está exposto a incêndios catastróficos pelos quais existem responsáveis.

Olhamos para o futuro e não podemos ignorar que o que está a acontecer é exactamente o que os governos e as indústrias de pasta de papel impuseram: mais eucalipto, mais incêndios, mais abandono, despovoamento, alterações climáticas, desertificação e perda de biodiversidade. Mais monoculturas de eucalipto, invasoras e espécies de rápido crescimento e propensão ao fogo substituem a floresta nativa, acelerando esse ciclo. E o clima muda, tornando-se mais quente, mais seco, com secas mais prolongadas e menos dias chuvosos. O deserto está a ganhar terreno. Este é também o plano dos governos e das indústrias de celulose. Eles não têm outro plano e rejeitam qualquer alternativa.

Medidas que não revertem este ciclo aceleram-no. Precisamos da floresta como primeira barreira contra a seca e a desertificação. Para isso, temos que mudar o cenário. Não em décadas, mas agora. Temos de responsabilizar as indústrias da pasta que nos trouxeram até aqui, a The Navigator Company e a Altri Florestal, e os dirigentes que lhes estenderam o tapete vermelho - de todos os partidos. Eles não os impediram e entregaram o futuro do nosso país. Não podemos mais aceitar isso. As indústrias de celulose devem pagar pela destruição do passado e do presente.

Também responsabilizamos as empresas portuguesas que continuam a agravar a crise climática, como a Galp e a EDP, que planeiam continuar as suas atividades destrutivas e extrativas durante décadas, lucrando como nunca antes e rejeitando os cortes de emissões necessários para travar o caos climático. É urgente garantir as necessidades das pessoas, o equilíbrio ambiental e a saúde pública, e não os mesmos velhos negócios.

Precisamos de menos ignições e menos área queimada. Isso significa ter um cadastro florestal completo do território nacional, e o que estiver abandonado deve ser assumido pelo Estado. As áreas abandonadas precisam de ser geridas, não pelas actuais estruturas ineficazes, mas por uma instituição criada para o efeito. O caminho seguido durante décadas no Portugal rural tem sido de oposição aos pequenos proprietários e à diversificação rural, agrícola e florestal, mantendo deliberadamente os preços baixos e a pobreza persistente. A floresta do futuro deve ser construída com intervenção estatal direta, mas a partir de um Estado que rejeita estar nas mãos de uma indústria devastadora para o país, como a indústria da celulose.

Precisamos de “deseucaliptizar” Portugal. Precisamos de remover 700 mil hectares de plantações de eucalipto no país nesta década e transformar essas áreas em florestas e bosques resilientes que possam resistir ao futuro mais quente e seco que a crise climática produziu. Precisamos fazer com que isso aconteça para deter o deserto.

No dia 3 de setembro saímos à rua: “Protesto pela Floresta do Futuro” - um protesto em Lisboa, Porto, Coimbra, Odemira, Figueira da Foz, Viseu, Pedrógão Grande, Ourém, Oliveira do Hospital, Arganil, Sertã, Cartaxo , Proença-a-Nova, Vila Nova de Poiares, e outros territórios porque as promessas e os remendos dos últimos anos nunca furaram a lógica que nos trouxe até aqui e que nos levará, se não nos rebelarmos, a entregar o território em que vivemos para nos tornarmos numa área incapaz de sustentar populações, incapaz de defender vidas. Saímos às ruas por um futuro muito além da simples lógica dos ciclos económicos e políticos. Basta!

What was expected continues to happen. The destruction of rural areas, communities, and territories persists after decades of warnings, opinions, discussions, betrayals, and disregard. The state of degradation of the Portuguese forest remains a fundamental condition for catastrophe: abandonment, industrial monocultures, invasive species, degradation of protection and surveillance services, disinvestment in the interior. On top of this, drought engulfs the country due to the climate crisis, and the heat makes everything more fragile. The fires that occurred this year in Odemira, Proença-a-Nova, Monchique, Cadaval, among others, are the manifestation of this. In increasingly shorter cycles, our country is exposed to catastrophic fires for which there are responsible parties.

We look to the future and cannot ignore that what is happening is exactly what governments and pulp industries imposed: more eucalyptus, more fires, more abandonment, depopulation, climate changes, desertification, and loss of biodiversity. More monocultures of eucalyptus, invasives, and fast-growing species with a propensity for fire replace the native forest, accelerating this cycle. And the climate changes, becoming hotter, drier, with longer droughts and fewer rainy days. The desert is gaining ground. This is also the plan of governments and pulp industries. They have no other plan and reject any alternative.

Measures that don't reverse this cycle accelerate it. We need the forest as the first barrier against drought and desertification. For that, we have to change the landscape. Not in decades, but now. We must hold the pulp industries that brought us here accountable, The Navigator Company and Altri Florestal, and the leaders who rolled out the red carpet for them - from all parties. They didn't stop them and handed over the future of our country. We can no longer accept this. The pulp industries must pay for the destruction of the past and the present.

We also hold accountable the Portuguese companies that continue to worsen the climate crisis, like Galp and EDP, planning to continue their destructive and extractive activities for decades, profiting like never before and rejecting the necessary emissions cuts to stop climate chaos. It's urgent to ensure the needs of the people, environmental balance, and public health, not the same old businesses.

We need fewer ignitions and less burned area. That means having a complete forest registry of the national territory, and what's abandoned must be taken over by the State. The abandoned areas need to be managed, not by the current ineffective structures, but by an institution created for this purpose. The path followed for decades in rural Portugal has been in opposition to small landowners and rural, agricultural, and forest diversification, deliberately maintaining low prices and persistent poverty. A forest of the future must be built with direct state intervention, but from a state that rejects being in the hands of a industry devastating to the country, such as the pulp industry.

We need to "de-eucalyptize" Portugal. We need to remove 700 thousand hectares of eucalyptus plantations in the country this decade and transform these areas into resilient forests and woodlands that can withstand the hotter and drier future that the climate crisis has produced. We need to make this happen to halt the desert.

September 3nd, we took to the streets: "Protest for the Forest of the Future" -a protest in Lisbon, Porto, Coimbra, Odemira, Figueira da Foz, Viseu, Pedrógão Grande, Ourém, Oliveira do Hospital, Arganil, Sertã, Cartaxo, Proença-a-Nova, Vila Nova de Poiares, and other territories because the promises and patches of recent years have never cut through the logic that brought us here and that will lead us, if we don't rebel, to surrender the territory we live in to become an area incapable of sustaining populations, incapable of defending lives. We take to the streets for a future far beyond the simple logic of economic and political cycles. Enough!

sábado, 21 de outubro de 2023

Ansiedade climática: o síndrome das novas gerações

As alterações climáticas são cada vez mais uma questão de saúde mental, e a população mais afectada atualmente é a de faixa etária mais jovem.


É comum dizer-se que os jovens estão a ficar preocupados com o futuro do planeta e que isso lhes está a prejudicar o equilíbrio emocional e mental, mas na verdade este sintoma é comum a várias idades, com a diferença que os jovens se sentem mais inseguros e com menos poder de decisão.

Um estudo da revista Lancet, publicado em Dezembro 2021, revelou a primeira investigação com mais amplitude neste âmbito: foram entrevistadas 10 mil jovens (com idades entre 16 e 25 anos) em dez países (Austrália, Brasil, Finlândia, França, Índia, Nigéria, Filipinas, Portugal, Reino Unido e EUA). Mil participantes por país. Os jovens portugueses estavam entre aqueles que demonstravam mais ansiedade.

Nas conclusões do estudo face às alterações climáticas, 59% dos inquiridos “estavam muito ou extremamente preocupados e 84% estavam pelo menos moderadamente preocupados. Mais de 50% relataram cada uma das seguintes emoções: tristeza, ansiedade, raiva, impotência e culpa.

Mais de 45% dos entrevistados disseram que os seus sentimentos sobre as alterações climáticas afetaram negativamente a sua vida quotidiana e funcionamento, e muitos relataram um elevado número de pensamentos negativos sobre as alterações climáticas (por exemplo, 75% disseram que pensam que o futuro é assustador e 83% disseram que eles acham que as pessoas falharam em cuidar do planeta)”.

Perante uma amostra bastante representativa do que pensam os jovens sobre o impacto das alterações climáticas, uma das conclusões do estudo é que “essa angústia estava associada a crenças sobre resposta governamental inadequada e sentimentos de traição”, e que para eles “o futuro é assustador, a humanidade está condenada”, pois “não terão acesso às mesmas oportunidades que os seus pais tiveram”. Além disso, “consideram que tudo o que valorizam será destruído, a segurança está ameaçada e estão hesitantes em ter filhos”.

A pesquisa mostrou como a ansiedade climática pode ser uma experiência coletiva, mesmo que vivida com maior ou menor intensidade. Estamos quase em Dezembro de 2023 – dois anos depois do estudo referido – e as notícias sobre a crescente ansiedade e sentimento de impotência dos jovens continuam a dar sinais de alerta, como é referido nesta notícia da CBS do Canadá, publicada em agosto, na altura em que os fogos devastaram parte do país.

No dia 10 de Outubro – o Dia Mundial da Saúde Mental – a publicação Euro News sugeriu algumas ideias para evitar estados de eco-ansiedade. Uma delas referia-se à inércia causada pela quantidade de informação científica: “Não demore a fazer mudanças na sua vida ou a tornar-se um ativista enquanto lê o relatório do IPCC. Afinal, tem 1.800 páginas. Pode demorar um pouco.”

As alterações climáticas são assim e cada vez mais, também uma questão de saúde mental, e a população mais afectada atualmente é a de faixa etária mais jovem – porque se por um lado sentem que as decisões governamentais não são suficientes, por outro sentem uma grande pressão com a sua responsabilidade para com o futuro.

quarta-feira, 11 de outubro de 2023

Esgotamento de oxigénio. Um cisne negro?


1. Nos últimos 20 anos, a quantidade de oxigénio na atmosfera da Terra tem diminuído. Embora a queda possa parecer pequena agora, não temos a certeza de como esta tendência poderá evoluir no futuro.

2. A investigação sugere que este declínio no oxigénio pode acelerar ao longo do tempo. 

3. Se esta tendência continuar, os humanos poderão sobreviver na atmosfera atual por mais cerca de 3.600 anos.

4. A redução do oxigénio é apenas uma das muitas mudanças ambientais. Também estamos a ver mais dióxido de carbono no ar, aumento das temperaturas, padrões climáticos imprevisíveis e degelo das calotas polares. Todas estas mudanças estão interligadas e podem ter consequências graves para o nosso futuro.

5. As alterações na nossa atmosfera, incluindo a diminuição dos níveis de oxigénio, são sinais de que precisamos de estar mais conscientes das nossas ações.

Segundo o estudo, conclui que se nada fizermos, o futuro dos humanos na Terra poderá estar em risco.

quinta-feira, 24 de agosto de 2023

Marcha: "Vamos Salvar os Sobreiros"


Marcha "Vamos Salvar os Sobreiros", a realizar no próximo sábado, 26 de agosto, com início pelas 12:00 horas, no Parque Eduardo VII, em Lisboa, dirigindo-se depois para o Ministério do Ambiente e Ação Climática e a terminar no jardim do Príncipe Real.

Em causa está a salvaguarda de um bosque de sobreiros, adultos, saudáveis, a extrair cortiça, localizado em Sines. Embora seja uma espécie protegida, o Governo autorizou o abate de mais de 1800 sobreiros, classificada pelo Parlamento como “Árvore Nacional de Portugal”, para a instalação de um parque eólico pela EDP Renováveis.

O objetivo desta marcha é exigir aos governantes a revogação do Despacho n.º 7879/2023, de 1 de agosto 2023, que autoriza a EDP a proceder ao abate.

Porquê proteger os sobreiros?
- Árvores resistentes ao fogo, importantes para o ciclo hidrológico, retenção de água nos solos, limpeza e arrefecimento do ar, silvopastorícia, apicultura, colheita de cogumelos, turismo rural e casa de inúmeros animais - crucial para a biodiversidade!
- Exportação de cortiça gera cerca de 900 milhões de euros anuais. Um sobreiro pode dar cortiça até aos 200 anos de idade!
- Produzem muito oxigénio e retêm muito dióxido de carbono: Um montado de sobreiros pode anualmente absorver até 14,7 toneladas de dióxido de carbono (CO2) por hectare - aqui estamos a falar de 32 hectares 

Num momento em que as alterações climáticas são cada vez mais sentidas, é imprescindível proteger as nossas florestas. Os sobreiros são das árvores mais importantes a nível ecológico e económico que temos em Portugal. 

A EDP promete repovoar uma área de 50 hectares, contudo os sobreiros demoram cerca de 20-25 anos até atingir idade adulta, e não sabemos quantas destas árvores plantadas poderão sobreviver (com o aumento da seca, as percentagens de sobrevivência são baixas) 

A energia eólica pode ser produzida em muitos lugares: zonas sem floresta ou onde os incêndios passaram, ou zonas de monoculturas ou com espécies invasoras como acácias ou eucaliptos que são altamente inflamáveis e são um problema grave em Portugal. 

Sobre o Projeto e porque é que desaprovamos:
- 16 km de linhas elétricas associados ao empreendimento junto ao Parque Natural do Sudoeste Alentejano e da Costa Vicentina.
- coincide com o corredor de migração de aves selvagens protegidas, nos concelhos de Sines e Santiago do Cacém.
- o projeto de compensação do abate de sobreiros a realizar em Tavira, deveria ser proposto para a Área Florestal de Sines, ou outra próxima, no Alentejo.
- o Plano de Acompanhamento Ambiental da Obra omite o plano para a compensação do abate de sobreiros, assim como o Plano de Gestão Florestal e a sua monitorização.
- a constituição de nova faixa de gestão de combustível sobre as linhas elétricas aumenta impacto do projeto.
- este projeto localiza-se próximo de 1 dos 2 únicos ninhos de Águia-pesqueira existentes em Portugal e pode contribuir para o desaparecimento da população reprodutora desta espécie em perigo critico de extinção.
- o projeto também está localizado numa área muito crítica identificada pelo ICNF para as aves aquáticas que interdita este tipo de projetos. 

domingo, 4 de junho de 2023

Dunja Mijatović denuncia aumento da “repressão, criminalização e estigmatização” de protestos ambientalistas na Europa


Numa altura em que a agudeza das crises planetárias – alterações climáticas, poluição e perda de biodiversidade – está a levar muitos na Europa às ruas em protestos que exigem mudança e responsabilização, aumentam os casos de “repressão, criminalização e estigmatização” dessas demonstrações em defesa do planeta.

Quem o diz é Dunja Mijatović, comissária do Conselho da Europa para os Direitos Humanos. Num texto publicado esta sexta-feira no portal online dessa organização multilateral com 46 Estados-membros, incluindo países da União Europeia (mas não só), como Portugal.

Lembrando que “a Europa tem um rico historial de ativismo ambiental e de ação climática” sob várias formas, como greves estudantis, marchas, petições públicas e litigação, Mijatović afirma que, ao longo dos últimos anos, sentimentos de impotência e a perceção de que os governos não estão a fazer o que deviam para responder à “iminente catástrofe climática” têm mobilizado as populações, ou parte delas, para ações de protesto, sobretudo os mais jovens, que reivindicam os espaços públicos para dar voz à Terra.

Do reportório de protesto constam, entre muitas outras táticas, o bloqueio de rodovias, a interrupção de eventos públicos, destruição de obras de Arte e a ocupação de locais culturais, como museus e galerias. Descrevendo essas práticas como sendo, na sua maioria, formas de “ação direta ambientalista não-violenta”, a comissária diz que “o número, a escala e a variedade de formas de protesto público por defensores e ativistas ambientais” tem crescido. E com isso, as reações violentas por parte das autoridades.

“Em muitos locais na Europa, [os protestos] enfrentam ação repressiva”, alerta Mijatović, como violência física, detenções “por vezes, preventivas”, e “a criminalização dos manifestantes”. E lembra que, recentemente, “manifestantes ambientais pacíficos” foram atingidos com gás-pimenta na Áustria, agredidos pela polícia de intervenção em França e dispersados pelas autoridades policiais na Geórgia. Além disso, acrescenta, ativistas e manifestantes foram detidos na Finlândia, nos Países Baixos e na Sérvia, entre vários outros casos.

E deixou críticas ao Reino Unido por querer restringir os direitos aos protestos públicos, conferindo maiores poderes às autoridades policiais para dispersarem os manifestantes.

No artigo, Dunja Mijatović confessa “preocupação” com “a diminuição do espaço para a liberdade de associação pacífica” e com “as ameaças enfrentadas pelo ativismo ambiental na Europa”, alertando que “esta tendência de repressão parece continuar a intensificar-se”.

A comissária argumenta que “a violência contra participantes pacíficos de protestos ambientais (…) não pode ser tolerada” e que “as autoridades públicas têm a obrigação legal de proteger os manifestantes ambientais pacíficos”.

“Criminalizar, silenciar ou afastar os manifestantes ambientais não apenas viola o seu direito humano à associação pacífica”, explica, como também é “contraprodutivo”, uma vez que “a repressão apenas alimentará a sua frustração e fortalecerá a sua determinação”, e poderá pôr em causa a credibilidade das próprias instituições democráticas.

Por isso, ao invés de abordagens de confronto e repressão, Mijatović apela “urgentemente” a um “diálogo social mais genuíno e de qualidade sobre questões ambientais, incluindo formas de responder às alterações climáticas”, defendendo uma maior abertura e participação nos processos de tomada de decisão e em projetos relacionados com o ambiente.

E deixou uma mensagem contundente: os protestos pacíficos em prol do planeta “nunca devem ser classificados como atividades ilegais”, ou como terrorismo, sentenciando que essas pessoas fazem parte de uma “longa e inspiradora tradição” de defensores dos direitos humanos e liberdades que hoje gozamos.

Aqueles que dão voz às preocupações ambientais “merecem a nossa simpatia e apoio – não repressão ou ressentimento”, frisou.

quarta-feira, 8 de março de 2023

Estas são outras crises e quase não há tempo: políticas da morte e aberturas para outra política


O que tradicionalmente se qualifica como “a política” está imersa em múltiplas crises. Em suas dimensões sociais, como exemplo, é possível lembrar que a América Latina continua sendo a região mais violenta do mundo, tanto no número total de homicídios quanto em sua proporção em relação à população. Brasil, Colômbia, México e Jamaica estão entre os países que mais sofrem essa situação. No campo ambiental, há décadas se repetem alertas sobre o desmatamento, a perda de biodiversidade e a poluição.

A pandemia de coronavírus tornou mais claras as circunstâncias dramáticas vividas, já que ao menos 1,5 milhão de pessoas morreram, enquanto eram aplicados todos os tipos de quarentenas, controles e punições. Por uma razão ou outra, é possível dizer que em muitos lugares esses exemplos de morte e destruição lembram aos de uma guerra. É uma situação que afeta particularmente as comunidades camponesas e indígenas, e que chega a extremos como a lenta, mas persistente destruição dos ambientes amazônicos e dos meios de vida que sustentam os povos originários.

No entanto, os sistemas políticos não conseguem resolver essas problemáticas. Somam-se as denúncias de assassinatos e contaminações, mas raramente há consequências políticas na renúncia de um ministro. A gestão da pandemia foi terrível em quase todos os países, mas não se efetivou um debate político que levasse à imposição de uma reforma do setor de saúde para que isso não se repetisse.

Não se pode esquecer que, no passado, dramas como esses foram vividos na América Latina. Lembremos por um momento as ditaduras militares do século XX que, no caso da Argentina, finalmente desembocou numa rejeição e indignação que ganharam as ruas, levando à queda dos generais. Foi seguida pelo horror diante dos crimes, torturas e desaparecimentos, e é nesse contexto que foi publicado o relatório Nunca más (elaborado pela Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas). Em suas páginas, adverte-se que o país sofreu sua “maior tragédia”, na qual os princípios dos direitos humanos foram pisoteados e ignorados.

Essa lembrança serve para levantar uma inevitável questão: por que não acontece algo semelhante, atualmente? Por que não há reivindicações por um “nunca mais”, por exemplo, frente aos assassinados, aos que dormem nas ruas ou não conseguem se alimentar, ou frente à destruição ambiental? Por que no Brasil, nas grandes cidades, não aconteceram grandes marchas denunciando o genocídio de seus povos indígenas? Todos esses problemas são nossas tragédias atuais e em todos eles os direitos são pisoteados.

Diante desses questionamentos, responde-se com referências à ineficiência nos governos, sua subordinação a interesses econômicos e à corrupção. Ao mesmo tempo, questiona-se os líderes políticos porque embora prometam mudanças e soluções, nos fatos, os problemas se repetem e, pouco a pouco, agravam-se. Tudo isso, por sua vez, leva ao que se descreve como o desencanto com a política e que não parou de se aprofundar. A maior parte dos latino-americanos confia muito mais em sua igreja, nos militares e até em empresas do que em atores políticos. Só 27% dos entrevistados dizem confiar no próprio governo, e apenas 13% nos partidos políticos [1].

Sabemos que a política contemporânea, herdeira de tradições eurocêntricas, foi construída invocando a razão, a liberdade, o bem-estar e a paz. Sabe-se também que esteve infestada de contradições, onde a política também criou mecanismos de controle e disciplinamento, amparou o colonialismo e o racismo, consolidou a desigualdade e a pobreza, legitimou a opressão e os totalitarismos.

Mas essas quedas desencadeavam reações tanto dentro da política quanto entre os cidadãos. Irrompiam protestos contra as violações de direitos, enfrentava-se o colonialismo e o racismo, ocorriam mobilizações pela democracia e em defesa dos trabalhadores, e assim sucessivamente. Eram reações a situações consideradas intoleráveis e ultrajantes, eram respostas alimentadas pelo horror, como aquelas que explicam aquele “nunca mais”.

Essa dinâmica de avanços e retrocessos, com todas as suas contradições, está sendo alterada. O que alguns classificavam como correções próprias da biopolítica, citando M. Foucault [2], agora são mais esporádicas e menos poderosas, e prevalece a aceitação e a resignação. São tantas as denúncias sobre descumprimentos de direitos que deixam de chamar a atenção. Convive-se com violências tão agudas que muitos setores cidadãos as naturalizam. A pandemia acentuou essa situação ao tolerar mortes e controles como nunca.

Vem sendo cruzado um limiar que desemboca na necropolítica. Este termo, cunhado pelo camaronês Achille Mbembe, pode ser ajustado e redefinido à situação atual para descrever uma política que deixa as pessoas e a Natureza morrerem, embora mantenha as economias vivas. Não é um sinônimo de ações violentas específicas, mas é funcional a elas e gera as condições para sua aceitação e reprodução [3].

O governo de Jair Bolsonaro, no Brasil, foi um exemplo da guinada à necropolítica, por suas posições racistas, machistas e violentas. Sua gestão é a responsável direta pela onda de mortes por Covid, pela violência nas cidades, a proliferação de pessoas com armas, a fome e morte em terras indígenas e pela depredação ecológica. Deisy Ventura, professora da Universidade de São Paulo, argumenta que as ações do governo foram atos desumanizadores intencionais, onde os interesses econômicos justificavam a “morte em massa dos mais frágeis”.

O intolerável, como as mortes em massa, especialmente de pobres e indígenas, foi justificado e tolerado por amplos setores da sociedade. Os bolsonaristas não escondiam seus extremismos, e onde havia uma legitimação, não se baseava na moral, mas na economia e no mercado. Ventura conclui com uma avaliação lapidar: o Brasil é um “país humilhado por ter tolerado o intolerável” [4]. Contudo, apesar de tudo isso, Bolsonaro conseguiu um enorme apoio dos cidadãos (obteve mais de 58 milhões de votos, contra pouco mais de 60 milhões da a coligação de Lula, em 2022).

Atualmente, no Peru, ocorre algo semelhante, já que se mantém um governo apesar das dezenas de mortos e mais de mil feridos nas repressões e repetidas mobilizações. Neste país, assim como em outros, estamos diante de situações em que muitas pessoas deixam de ser cidadãs e, inclusive, são despojadas de sua humanidade, para serem inferiorizadas, marginalizadas e excluídas. Se morrem, afinal de contas, não importa muito nem para a política vernácula, nem para os mercados.

Sob a necropolítica, inúmeros setores cidadãos ficam presos ao entendimento de que para eles não há alternativas melhores ou mais corretas, afundando-se na indiferença e na omissão. Não é que as maiorias repentinamente tenham se tornado insensíveis, por exemplo, com o genocídio dos povos amazônicos ou com as matanças, mas, sim, que suas instâncias morais foram arrebatadas. As urgências estão em sobreviver, não têm para onde fugir, não conseguem pesar as consequências de seus atos e também não encontram outra opção para escolher. O que era imoral, intolerável e até horrível, algumas vezes é aceito, e em outras tolerado, ou nem sequer podem fazer uma avaliação moral, porque se consomem em sobreviver. Essas são as condições da necropolítica.

Em boa medida, a disseminação da necropolítica passa despercebida, uma vez que essas crises são interpretadas como expressão de posições conservadoras, neoliberais ou fascistas, ou se entende que problemas como a violência seriam muito antigos e não têm nada de essencialmente novo. Contudo, é imperativo reconhecê-la porque é substancialmente diferente. Também não é um vazio político, nem uma antipolítica, mas produz ativamente narrativas que anulam os sentimentos de indignação, combate as resistências cidadãs focalizadas e legitima prioridades econômicas. Continuamente, justifica a morte de pessoas ou o desaparecimento de ecossistemas.

A necropolítica é resultado do esgotamento dos mecanismos que a política moderna tem para operar contra a morte e, ao mesmo tempo, de uma incapacidade de se envergonhar por esse fracasso. Não só isso, mas como essa mesma modernidade, contém os fatores que levam a essa situação de destruição e violência, não oferece as opções para uma verdadeira reversão. Como a modernidade assume o mundo, por exemplo, em dualidades e hierarquias, cedo ou tarde, desemboca-se na exploração, exclusão e dominação, e a violência se torna inevitável. Ao mesmo tempo, como também sustenta que não há alternativas possíveis a ela mesma, as opções de mudança que a transcendem não são imaginadas, nem concebidas.

Isso faz com que as alternativas devam ser buscadas para além da modernidade ou em suas margens. É necessária uma política concebida, sentida e praticada em outros mundos. O primeiro passo nessa tarefa consiste em aceitar essa possibilidade, o que não é simples porque a modernidade continuamente a bloqueia. Essa mudança de posição corresponde ao que tem sido chamado de aberturas para outras ontologias [5] e, felizmente, dispomos de vários exemplos.

Algumas estão na academia do norte (como as contribuições de Isabelle Stengers e Bruno Latour), outras se baseiam em experiências latino-americanas (como as do brasileiro Eduardo Viveiros de Castro e da peruana Marisol de la Cadena). Alguns são de décadas atrás e não receberam a atenção que mereciam (como o Projeto Andino de Tecnologias Camponesas – PRATEC, nas montanhas do Peru, ou as explorações do argentino Rodolfo Kusch). Mas também há aqueles que alcançaram ampla divulgação e impactaram nos debates políticos, como aconteceu com as primeiras versões do Bem Viver na Bolívia, Equador e Peru.

Essas aberturas também são urgentes, porque não há mais tempo para continuar tentando ajustes e retificações dentro da modernidade. O descalabro ecológico é enorme em escala e intensidade, e a cada ano que as conhecidas crises se mantêm, torna-se mais difícil revertê-las e aumentam as restrições que impomos às gerações futuras. Quanto mais demoramos, mais nossas possibilidades de reverter um colapso serão reduzidas e, em caso de ocorrer, entre os primeiros afetados estarão, mais uma vez, as comunidades indígenas e camponesas.

Esta breve explanação permite fundamentar um convite a se juntar à tarefa de evidenciar que a necropolítica está entre nós. Não é uma nova crise, nem uma maior deterioração, ao contrário, estão mudando as formas como se reproduz a política, suas bases de legitimação e seus fundamentos morais. Isso explica que a resignação, a indiferença e a aceitação diante da morte sejam cada vez mais difundidas. É indispensável evidenciar essas mudanças para começar a detê-las.

É também um convite a promover aberturas a outras ontologias, a partir de um compromisso de garantir a vida. É abrir-se a pensar, imaginar e ensaiar uma “outra política” direcionada a mundos políticos organizados de outras formas, com outros participantes e outros devires. São propósitos impulsionados por um sentido de urgência, porque não há muito mais tempo disponível e porque já estamos atolados em crises que são muito diversas.
Notas

1. Informe 2021. Adiós a Macondo. Latinobarómetro, Santiago, 2021.
2. Nacimiento de la biopolítica: curso en el Collège de France (1978-1979), M. Foucault. Fondo Cultura Económica, Buenos Aires, 2021.
3. Necropolítica: la política del dejar morir en tiempos de pandemia, E. Gudynas. Palabra Salvaje 2, p. 100-123, 2021.
4. “O Brasil é hoje um país humilhado por ter tolerado o intolerável”. Entrevista com Deisy Ventura, J. V. Santos, Instituto Humanitas Unisinos – IHU, 26 de janeiro de 2023.
5. The politics of modern politics meets ethnograhies of excess through ontological openings, M. de la Cadena. Filedsights – Theorizing the contemporary, Cultural Anthropology Online, 13 enero 2014.

Observação
O presente artigo é uma versão abreviada de um ensaio mais longo que inaugura a série Cuestiones y Disputas en Otra Política

quinta-feira, 5 de janeiro de 2023

Nick Hunt - Navigating nature loss through fiction


A group of young men climb a mountain in Wales to club a lake monster to death. The monster is called the afanc: part otter, part dog, part seal.

Each man is hoping to gain acclaim, and a kiss from a beautiful maiden, for being the first to cleave its spine, but the beast proves hard to kill.

They club it in shifts for half a day. Snow begins to fall. Most of his friends grow tired and leave, but Aled, the protagonist, cannot drag himself away. He cannot stop the rhythm of his club on the monster’s body.

Bulldozers

By the end of the day he has become an unthinking machine, far beyond pain or tiredness, driven only by the mindless impulse to beat the monster into mush. He no longer knows why he is doing it. I don’t know why either.

I wrote this short story, To the Bone, precisely because I didn’t know why. I didn’t know why St George had to lance the dragon.

I didn’t know, and I still don’t know, why it is that our culture has to keep clubbing everything to death, pounding away with its bulldozers, drills, fracking rigs, deep-sea oil wells, pipelines, poisons and SUVs.

All I know is that the assault is relentless and unending. I could have written about these things directly – I could have written the facts – but I didn’t know where to begin. A story about a brutalised monster made more sense to me.

Catharsis
A journalist takes a seat at a table lined with empty bowls and spoons. At the head of the table, a giant egg-timer quietly spills its sand.

The other diners – the faces of whom are strangely amorphous and hard to make out – take it in turns to intone the names of animals, plants, languages, cultures and antediluvian megafauna that have become extinct, whether recently or long, long ago.

At the end of this ritual they drink a soup that is viscous, greasy, foul-smelling, but ultimately tasteless. There is no sadness or joy to the process, no catharsis or release. They don’t know why they are doing it. Again, neither do I.

According to the UN Environment Programme, between 150 and 200 species are driven extinct – are killed – every day.

What sense can you possibly make of that? The numbers are meaningless. By writing that story, Loss Soup, I suppose I was inventing a ritual that might make sense of such dizzying loss, a holding vessel to contain the numb disbelief I felt.

The monotony of the intonations was more relatable than grief, and certainly easier on the soul. But beyond that, my reasons for writing the story were mysterious to me, as mutable and tricky to grasp as those faces around the table.

Writers are as confused and lost as anyone in this strange weather.


Página Oficial: Nick Hunt

terça-feira, 13 de dezembro de 2022

Let me tell you something- O Estado Global da Democracia

Let me tell you something... The Almost Forgotten Selma March.
Aos países como EUA, Rússia, China, Marrocos, Índia, Qatar, Myanmar, Angola, Irão, regimes autocráticos/teocráticos, regimes que violam os Direitos Humanos e países europeus governados pela extrema-direita tenho um textinho para vós:

"True peace is not merely the absence of tension; it is the presence of justice.
To cure injustices, you must expose them before the light of human conscience." - Martin Luther King, Jr. (Montgomery, Alabama, March 25, 1965)


Martin Luther King, Jr.- Selma March, 1965

História

Relatórios

quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Baloiços no rio!


Uma praga!
O nosso país está a ser alvo de uma campanha sem precedentes de dispêndio de dinheiros públicos em abusos e abastardamentos da paisagem. As paisagens não pertencem aos autarcas nem ao seu apetite: são património colectivo. Em certos lugares e contextos, alguns passadiços fazem todo o sentido (exemplos: protecção de cordões dunares, acessos a praias, acessos pontuais onde se pretende evitar o pisoteio de espécies, onde não existam trilhos ou caminhos...) - mas o que se anda a fazer de forma indiscriminada e sistemática é vilipendiar os recantos mais sagrados da natureza que devia ficar quieta e sossegada. Arouca deu o (mau) exemplo e agora qualquer autarca de seu nome quer ter igual! E a piroseira não tem limites: desde pontes feitas para ligar nenhures a parte alguma a baloiços pintados de lilás para ser "instagramável" vale tudo para sair nas revistas de "evasão" e de "ar livre". Onde o salto alto puder ir ao encontro da lagartixa, a lagartixa, que tem o direito de estar em paz e sossego, foge. Ou desaparece. O desrespeito pelo ambiente é total e prevalece a "onde criacionista": Afinal,  Deus criou o mundo para o Homem usar e dispor! - (um autarca de Arouca já me respondeu assim) -  e isso legitima tudo. Em nome da "Democratização do acesso à Natureza" se fazem "autoestradas" pedonais aos mais recônditos e sagrados recantos, destroem-se alinhamentos de vegetação ripícola, cortam-se cortinas naturais, para o "turismo natural" poder passar, na sua "caminhada". Sem referir casos conhecidos de corrupção que são originados nestas obras, nem as empresas que os promovem, e que são muito fáceis de identificar, mas optando por ficar apenas pelo que é objectivo .

Saber mais:

sábado, 24 de setembro de 2022

Experiência revela o que uma hora na Natureza faz ao cérebro humano


A história humana desenrolou-se, em grande parte, em cenários bucólicos, com savanas espalhadas e vales fluviais florestados que acolheram os nossos antepassados durante milhões de anos.

Em contrapartida, as cidades representam um novo tipo radical de habitat. Um habitat que, apesar das suas muitas regalias, muitas vezes prejudica a nossa saúde mental. Este estudo associou ambientes urbanos a riscos acrescidos de ansiedade, depressão e outros problemas de saúde mental, incluindo a esquizofrenia.

Mas também dá pistas para uma solução: a visita à natureza selvagem, mesmo que breve, está associada a uma série de benefícios para a saúde mental e física, incluindo pressão sanguínea mais baixa, ansiedade e depressão reduzidas, melhor humor, melhor concentração, melhor sono, melhor memória, e cura mais rápida.

Inúmeros estudos têm apoiado esta correlação, mas ainda temos muito a aprender. Será que apenas caminhar numa floresta pode realmente desencadear todas estas mudanças benéficas no cérebro? E, em caso afirmativo, como?

Um bom lugar para procurar pistas é o hipotálamo, uma pequena estrutura no centro do cérebro envolvida no processamento do stress, na aprendizagem emocional, e na resposta de luta ou de voo.

A investigação indica que o hipotálamo é menos ativado durante o stress nos residentes rurais do que nos habitantes das cidades, mas isso não significa necessariamente que a vida rural cause este efeito. Talvez seja o oposto, e as pessoas que naturalmente têm esta característica são mais propensas a viver no campo.

Para abordar esta questão, investigadores do Instituto Max Planck para o Desenvolvimento Humano conceberam um novo estudo, desta vez com a ajuda da imagem de ressonância magnética funcional (fMRI).

Utilizando 63 voluntários adultos saudáveis, os investigadores pediram aos participantes que preenchessem questionários, realizassem uma tarefa de memória de trabalho e se submetessem a exames de fMRI enquanto respondiam a perguntas, algumas das quais foram concebidas para induzir stress social. Os intervenientes foram informados de que o estudo envolvia a ressonância magnética e a realização de um passeio, mas não sabiam o objetivo da investigação.

Assim, foram designados aleatoriamente para dar um passeio de uma hora num ambiente urbano ou natural.

Os investigadores pediram-lhes que fizessem um percurso específico em qualquer dos locais, sem sair desse sítio ou usando os seus telemóveis ao longo do mesmo. Após a caminhada, cada participante fez outro exame fMRI, com uma tarefa adicional indutora de stress, e preencheu um novo questionário.

Segundo os investigadores, os exames mostraram uma atividade reduzida no o hipotálamo após um passeio na floresta, o que sustenta a ideia de que a natureza pode desencadear efeitos benéficos nas regiões cerebrais envolvidas com stress. E aparentemente isso pode acontecer em apenas 60 minutos.

Há uma relação “positiva” entre a natureza e a saúde cerebral
“Os resultados sustentam a relação positiva anteriormente assumida entre a natureza e a saúde cerebral, mas este é o primeiro estudo a provar a relação causal”, disse a neurocientista ambiental Simone Kühn.

Os participantes que fizeram um passeio na floresta também relataram mais prazer no próprio passeio do que aqueles que fizeram passeios urbanos, uma descoberta consistente com os resultados do estudo fMRI, bem como de pesquisas anteriores.

Relativamente aos indivíduos que fizeram caminhadas urbanas, embora a sua atividade no  hipotálamo não tenha diminuído como os que fizeram caminhadas na natureza, também não aumentou, apesar de terem passado uma hora num ambiente urbano movimentado.

O novo estudo oferece algumas das provas mais claras de que a atividade cerebral relacionada com o stress pode ser reduzida através de um passeio por uma floresta próxima, tal como os nossos antepassados poderiam ter feito.

Saber mais:
Cheiro de mato: odores emitidos pela natureza podem evitar stress e cancro

sexta-feira, 23 de setembro de 2022

Energy flows where attention goes


How To Protect Your Energy

Everybody Wants Your Time
Life can be hectic. Between work, school, friends, family, bills, and other obligations, you may feel that the minutes that you have to yourself are few and far between. If you are in a helping field such as social work, nursing, or counseling, you may begin your day early and give so much of yourself in that shift that you may not feel you have any words left by the end of the day. 

Everyone has days where they feel they are being pulled in a thousand directions. Those are the days where it seems that almost everyone you know is in crisis, and the only person in the world they can speak to is you. While it is understandable that you may want to try and hold space for everyone around you in crisis, being there all the time for everyone can be mentally and emotionally draining. 

As humans, it is our nature to want to help ease the pain and worries of those we care about. As a result, we give a lot of ourselves each day to be kind and empathetic to those close to us. We fail to realize that our mental and physical needs are just as important, if not more so than those we are trying to help. 

Your energy may seem endless to others, but beneath the smiles and positivity, you might be exhausted. The more you deny yourself time and space to recover or heal, the more you're likely to overextend yourself and end up with some mental or physical ailments as a result. Whatever you refuse to feel is trapped within the confines of your body, and this trapped energy often manifests in backaches, migraines, and other physical discomforts. Protecting your energy by recharging and spending it carefully is a lesson everyone must learn.

Ways to Protect Your Energy
You don't have to be everyone's superman. Eventually, being available for everyone 24/7 will cause you to hit a wall where you must take time to yourself to recharge, and then you can't help anyone. Instead, follow these guidelines to protect yourself from burnout.

Set clear and firm boundaries: This act of self-preservation is a challenging task. Your friends and family may even get mad at you when you're no longer available to them all the time. That's okay—they'll be back, and when they come back in a calmer state of mind, explain to them that you'll still be there for them, but they need to practice taking care of themselves rather than relying on you to take on emotional, physical, or time burdens for them. This doesn't mean you can't ever help them. Instead, set boundaries regarding time and emotional drainage and stick to them.

Set aside time that is just for you: If someone calls, you do not have to answer the phone. Consider turning off your phone for a few hours. See how it feels to be completely alone: you may like it! Recognize that there is a difference between having alone time and isolating. If you find yourself isolating, reach out for mental health counseling or consider spending time with friends or family.

Recognize your emotions: Helpers are experts at compartmentalizing, even suppressing, emotions. You are aware that any reaction from you as someone tells their story could trigger more intense emotions. You have trained yourself to respond and not react. You are so good at shutting off your feelings that you often forget to turn them back on when dealing with your personal life.

Keeping our emotions trapped in your body has the potential to manifest into physical aches and pains. Your body continues to store those feelings you stuff down and forget about. People often complain about their hips bothering them and are unsure why. Your hips are like the body's junk drawer, which means this is the place where the body stores past hurts, traumas, and negative emotions.

Limit your exposure to negativity: Listen to what your body is telling you. If you don't feel comfortable in any situation or conversation because someone is being negative through gossip, judgment, complaint, or anything else, you do not have to engage. You don't have to make excuses or find a way to leave. Simply excuse yourself and leave the room.

Surrounding yourself with positivity takes practice, and it can be difficult on some days. There will be moments, and when they happen, remind yourself that some things in this world you cannot control. You will also have to remind yourself that, though you can't always control situations or how other people will react to them, you can control how you react.

Música do BioTerra: Ben Mazué - Quand je marche


Oulah, faut que j'envoie ces lettres
Faut que je rappelle mon père, d'abord
Faut que je prévoie cette fête
Que j'ai promis de faire pour le disque d'or
Faut que je pense à l'été
Trouver des colos pour les gamins
Me demander quand est-ce que je les ai
Et puis pour qu'ils voient leurs cousins
Faut que je sache c'que mes sœurs ont prévu
Elles vont dire qu'elles m'l'ont déjà dit
J'vais répondre, oui mais que j'sais plus
Puis faudra qu'je pense à samedi
J'aimerai les emmener à la mer
Loin de ces humeurs grisâtres
Et dimanche, on ira voir mon père
On regardera le match tous les quatre
Pour ça faut qu'j'l'appelle d'abord lui
Puis cette fille à qui j'avais promis
Déjà y'a cinq jours que demain
J'la contacterai, c'est certain
Et que j'lui donnerai mon avis
Sur ce truc là qu'elle a sorti
Un podcast sur les interdits
Que j'ai trouvé d'ailleurs très bien
Et puis faut qu'je poste un beau contenu
J'sais pas un truc nouveau
Et vu le temps qu'je passe dessus
Beaucoup trop peu pour qu'ce soit beau
Ça va être nul et le pire
C'est que j'vais réussir à trouver un autre que moi
À qui en vouloir pour ça

sábado, 17 de setembro de 2022

O que fazer para travar o aquecimento global?

Minha Arte Digital

Muito se tem falado dos novos modelos de organização social, mais sustentáveis ecologicamente, socialmente mais justos e economicamente solidários, necessários para a mudança transformadora que lidar com as alterações climáticas requer. Mas na verdade quase sempre estamos a falar em modelos económicos, quando a mudança tem de ser mais ampla e incluir as estruturas sociais como um todo (com os seus sistemas sociais, económicos, políticos e culturais) e simultaneamente os indivíduos com os seus estilos de vida. É da relação dinâmica e complexa entre estas duas dimensões (estruturas e sujeitos) do problema (aquecimento global) e da necessária ação para com ele lidar que se abre a possibilidade da mudança transformadora que permitirá atingir os níveis de emissões que não ponham em causa as possibilidades de vida futura, tal como hoje a conhecemos. A natureza da mudança que aqui se requer é tanto individual quanto coletiva. Exige por isso mudanças profundas nos sistemas socioeconómicos tanto quanto nas convenções culturais e que são por natureza lentas de fazer.

Neste contexto, as necessárias mudanças nos estilos de vida implicam a ação de reduzir o consumo (e que está na génese de outras ações) para lidar com o aquecimento global. Estas mudanças devem ser sustentadas, isto é, resultar de opções conscientes, voluntárias, ou até serem impostas através de políticas e sistemas de sanções. Na verdade, sabemos que as políticas atuais são insuficientes para atingir o almejado objetivo dos 1,5 graus. No entanto sabemos dos estudos que as pessoas se manifestam favoráveis a uma responsabilização pública maior dos Estados, e, portanto, favoráveis a uma intervenção maior neste domínio. Apesar disso, a participação e cooperação entre os diversos atores (individuais e coletivos, cidadãos, organizações e governo local ou nacional, europeu etc.) é imprescindível para proporcionar os cortes urgentes e necessários nas emissões de carbono e ao mesmo tempo garantir o bem-estar de todos/as.
Porque o tempo não para e os Estados demoram a fazer o que lhes cabe, e nunca é demais repetir, deixo aqui algumas das ações que todos/as nós podemos adotar a nível individual e que requerem mudanças e ajustes nos estilos de vida, para além da necessária redução do consumo em geral, como sejam as seguintes, entre outras, e que falaremos seguramente e com mais detalhe futuramente:
– Poupar energia em casa e mudar para fontes de energia renovável sempre que possível;
– Andar mais a pé, de bicicleta e transportes públicos;
– Comer mais vegetais oriundos de cadeias locais, e menos carne;
– Reutilizar e reparar mais, reciclar;
– Plantar árvores e proteger a natureza;
– Criar espaços verdes acessíveis a todos/as;
– Poupar água;
– Deixar de usar plásticos;
– Viajar menos de avião;
– Fazer ouvir a sua voz.

sábado, 9 de julho de 2022

Livro - Andar a Pé


A classificação, que divide os seres em viventes e não viventes, diferencia os primeiros destes últimos pelas propriedades de nascer, alimentar-se, digerir, crescer, reproduzir-se, morrer e sobretudo movimentar-se. É, portanto, o movimento uma das características principais daqueles que têm vida. Na verdade, jamais alguém viu uma pedra movimentar-se sozinha. Rola de ladeira abaixo ou é carregada pela correnteza, mas nunca se move por si mesma, de moto próprio. Se alguém procurar uma filosofia aos profissionais da educação física, encontrará esta: o movimento é inerente e necessário a todo ser que tem vida; “mover-se é viver”.

A ausência do movimento é um estado mórbido, daquele que está tendente ao falecimento, prestes a perder a vida. Esta talvez seja a maior razão de tanta gente, que não anda, obrigar-se a longas caminhadas a pé, tentando compensar o desuso dessa extremidade do corpo no seu quotidiano. Esse desuso está sempre atrelado ao uso excessivo do automóvel, que, como uma maca, leva o comodista até ao lugar onde possam passar os paralamas dianteiros do seu indispensável veículo, como se fosse sua cativa cadeira de roda. Enfim, não anda; sempre é carregado, como se o natural fosse ter duas rodas e não dois pés. O ser vivente cada vez mais sedentário, parado, inerte, torna-se, mais e mais, não vivente. Ele não se leva, geralmente é levado como a pedra.

Andar a pé é a melhor e mais adequada forma de gastar a energia que adquirimos quando nos alimentamos. Ou seja: queimamos as calorias que ingerimos para sermos capazes do movimento. Por isso, nutrição e movimento são propriedades comuns e indispensáveis aos seres viventes. Os outros animais, quando não se movimentam voando, nadando ou correndo, andam. Não existe modo mais natural de mantermos a forma saudável de vida. Viver é movimentar-se; o contrário é a morte.

“Andar a pé”, de Henry David Thoreau (1817 a 1862), tem sido uma das obras referenciais, que nos fala, de forma poética e extensiva, sobre essa temática. No entanto, jamais poderemos esquecer a beleza do texto, em Émile (1762), “Il faut aller à pied” (é preciso andar a pé), de Jean Jacques Rousseau. Esse filósofo, ao abordar, de modo subliminar, os ideais da Revolução Francesa, adverte-nos que “é preciso andar a pé”. Primeiramente, estaremos sempre livres para parar, onde quisermos: “liberté” (liberdade); depois, ao caminharmos como os outros, seremos iguais a eles: “egalité” (igualdade); finalmente, poderemos saudá-los, cumprimentando-os como irmãos: “fraternité” (fraternidade).

Andar a pé é coisa de andarilho, semelhante a peregrinos, em caminhos sagrados como os de Santiago de Compostela, na Espanha e, também no Brasil, de Aparecida, Juazeiro do Padim Cícero ou nos Passos de Ibiapina. Foi o que fez Iveraldo Lucena, que criou o grupo de caminhantes “Andarilhos pés no chão”, para, através de estradas, praias e matas, reencontrarmos a verdadeira cidade. Enquanto isso não acontecia, éramos caminhantes a respirar o iodo do mar, o ar puro das florestas; a ouvirmos o cantar dos pássaros, o grito dos animais, as cascatas das águas; a sentirmos o aroma virginal da mata, o cheiro da terra, o perfume das flores. Em todos esses momentos, admiramos a beleza que Deus criou, da qual vivemos distanciando-nos, montados em carros e arranha-céus, e à qual somos tão cruelmente indiferentes: a nossa mãe Natureza.

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