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terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Portugal no seu melhor: campeões europeus da desigualdade

por Daniel Oliveira

segunda-feira, 21 de março de 2011

Saúde e riqueza: 200 países, 3 séculos, 120 mil números

Ora aqui está um video muito didáctico da BBC4, que exibe em velozes 4 mins. uma excelente visualização gráfica da evolução macroeconómica mundial relativamente à esperança média de vida e à riqueza desde 1810 a 2009. É o médico Hans Rosling que nos conta e mostra esta história do desenvolvimento do globo, acabando num tom porventura demasiado optimista: a de que todos os países estarão, brevemente, lá no topo de ambos os indicadores. Duvido. Apesar disso, a evolução registada acaba por ser bem mais positiva do que poderíamos supor a priori. E o mais surpreendente é que todos partimos bem lá debaixo. Não deixam de ser médias, claro. Nb: legendado em português.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Como salvar a democracia? Fechar as televisões e ir para o café debater

Reflexões críticas sobre o modelo de desenvolvimento e a sustentabilidade a nível planetário. Alguns bons exemplos:
1) Eurobarómetro refere que 64% dos europeus inquiridos não crêem que a tecnologia consiga travar as alterações climáticas e o aquecimento global, impôndo-se repensar o respectivo modo de vida
2) relatório britânico «Prosperidade sem crescimento?» (2008) e criação do índice de felicidade
3) artigo na revista Nature do economista Peter Victor (Univ. Toronto), «Questionando o crescimento económico» (é também autor do livro Managing without growth: slower by design, not disaster, 2008)
4) entrevista ao jornalista francês Hervé Kempf, do diário Le Monde, autor dos livros Como os ricos destroem o planeta (2007) e Para salvar o planeta livrem-se do capitalismo (2009)
5) a opinião do filósofo Viriato Soromenho Marques.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Uma sociedade mais decente?

Quando acabar o frenesi do combate à desigualdade, à homofobia e a todas as outras fobias e ismos, o que sobrará?
(Helena Matos, «Os caixões com armas»)

quinta-feira, 1 de abril de 2010

A vantagem de dirigir empresas monopolistas num Estado para alguns

ADENDA para reacções de vip's que ainda têm vergonha na cara: «António José Seguro considera “obscenos” valores pagos ao presidente da EDP em 2009».

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Estado e cultura: uma relação que já teve melhores dias

Essa é uma das conclusões que se pode retirar das Estatísticas culturais do Ministério da Cultura português para o presente decénio, recentemente disponibilizadas pelo OAC. É que, entretanto, a proporção da despesa com a cultura no orçamento estatal decaíu mais de 100%, passando dos 0,5% de 1995 pare 0,3% em 2009, depois de já ter estado em 0,7%, nos tempos de Carrilho, ainda assim um valor modesto, se comparado com outros países europeus. À excepção de 2005 (ano eleitoral...), a tendência é de queda gradual... O que nos devia preocupar, se aceitarmos que uma dimensão relevante duma política de desenvolvimento sustentável passa pelo reforço da criação, participação, divulgação e recepção culturais.
Outro ponto negativo é o acentuar das assimetrias territoriais, com o sul do país (Alentejo e Algarve) a perder investimento estatal na cultura, a favor da regiões lisboeta e nortenha.
Do lado positivo, o destaque tem que ir para o reforço de equipamentos colectivos essenciais e que vão no sentido da descentralização cultural, como as bibliotecas públicas municipais e os teatros, coliseus e auditórios.
Uma chamada de atenção veio na notícia «Nos museus e teatros há cada vez mais acessos gratuitos». Aí se alerta para um alegado excesso de borlas, mas não se averigua a que se deve essa tendência: se a uma política premeditada de atracção de novos públicos (o que seria legítimo); se à costumeiras borlas aos domingos de manhã e certos dias especiais (o Dia dos Museus, etc.).
Mas a mesma notícia destaca, e bem, a ida ao cinema como hábito cultural esmagador dos portugueses, liderando o cinema norte-americano. Seguem-se-lhe as visitas a monumentos, museus e palácios (enfim, antes deverá figurar a ida a espectáculos musicais, cujos dados não são revelados). E cá mais para baixo, figura a frequência de teatro, dança e ópera.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Capitalismo, uma história mal contada

É caixa-de-óculos, gordalhufo, usa jeans xxl e tem um andar desajeitado. Além disso, fala sobre coisas chatas como trabalho, dignidade, justiça social, desigualdades, etc.. Um cromo destes só pode ser um incómodo, claro.

Capitalism: a love story é o seu último filme. A recepção foi desigual, indiferente à adesão nos cinemas, urbi et orbi. Por mim, considero-o o melhor filme que vi em 2009, mais, um dos melhores de sempre.

Vou tentar explicar porquê. Um dos pontos mais fortes do documentário (sim, porque é um documentário, se virmos o género sem espartilhos tecnicisto-formais) é o ponto onde começa: Flint, berço do cineasta e satélite da todo-poderosa General Motors, que se torna cidade-fantasma mal esta sai de lá, por razões meramente economicistas. Foi por aí que Michael Moore começou a sua carreira, com Roger & me (sendo Roger o presidente da GM a quem ele nunca consegue chegar à fala), um documentário cru sobre a devastação da sua cidade-natal, assim qualquer coisa como uma cidade do tamanho de Aveiro. No presente Capitalism, vemos o pai de Moore a confessar-nos que, enquanto operário dessa multinacional nos idos de 50-70, o ambiente de trabalho era bom, tinha férias pagas, automóvel, casa, qualidade de vida, etc.. Hoje, tudo isso está em risco para esse e outros grupos sociais...

Para Moore, criado no ideal norte-americano, de terra de oportunidades para todos, de prosperidade (ainda que desigual), a actual situação de descalabro financeiro-económico, de engodo, de desigualdades extremas, é um autêntico pesadelo. É esta a tese central do filme: também ele, um tipo de esquerda, acreditou que a América era uma terra de esperança, e agora apercebe-se de que tinha acreditado numa mera encenação, numa grande ilusão. A crise financeira e económico-social recente é apenas um apropriado locus do dia: o problema é bem mais fundo. Wall Street e os seus interesses comandam as vidas de todos nós, prejudicando-nos; pior, eles manobram os próprios representantes do povo para beneficiar interesses privados, em detrimento do interesse público.

Além disso, o filme tem momentos inesperadamente dolorosos, mesmo para o mais impedernido dos cépticos, como o caso dos seguros sobre a morte de empregados de empresas (sim, o dinheiro do seguro de morte apenas revertia para essas empresas, @s viúv@s ficavam a ver navios).

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

A soberba das elites

Associações de produtores de produtos tradicionais voltam a acusar o governo português de não defender o sector em apreço, isto após o mesmo não ter exercido o direito de derrogação (vulgo, cláusulas de salvaguarda) face a normas comunitárias específicas (vd. reportagem detalhada aqui).

Portugal é um dos países da UE que tem mais produtos tradicionais: em 2006, estava em 3.º lugar no reconhecimento destes. Assim sendo, a atitude do governo luso devia indignar-nos e ser motivo de pressão para uma mudança de atitude. Como desmistifica Ana Soeiro, perita do sector, ao Público de hoje: «É, por vezes, dito [...] que é a UE que tem a culpa das dificuldades dos pequenos produtores, que muitas vezes gerem uma pequena economia à escala familiar, mas que é socialmente muito importante. Mas isso não é verdade» (cf. aqui). Embora haja regulamentos comunitários impondo um rol de regras e directivas, os governos nacionais têm a possibilidade de adequar a sua efectivação nos respectivos países. Como adita a ex-dirigente do Instituto de Desenvolvimento Rural e Hidráulico do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: «É para isso que existem as derrogações e Portugal é, de entre os países que mais produtos regionais têm reconhecidos, como a França, Itália, Grécia, Espanha e diversos outros, o único que não aplica cláusulas de salvaguarda para protecção dos seus pequenos produtores».

Além do efeito de homogeneização incaracterística, o perigo principal é o encerramento de muitas destas produções, e com elas, dos respectivos produtos tradicionais e do acentuar dos bloqueamento do mundo rural. Estamos a falar de parte do universo de 700 produtos já reconhecidos, como p.e. alheiras, azeitonas, carnes e presuntos, mel, buchos, folares, maranhos, cavacos e outros doces tradicionais, cherovias (ou xerovias), vinhos, etc.

Uma das coisas que mais choca nisto tudo é a ostensiva indiferença das elites e a persistência do centralismo iluminado (que contamina todos os partidos, atenção, uns mais do que outros, concerteza), recentemente reforçada por uma das piores ofensivas estatais contra estes produtos e a produção nacional, a da ASAE (vd. aqui e aqui). Isto apesar dos contínuos alertas feitos por especialistas como a eng.ª agrónoma Ana Soeiro, as associações do sector (p.e., Qualifica) e outros timoratos. Mas o mais grave é mesmo a atitude do governo actual, que se justifica dizendo que muito tem feito pelo sector: na lista das medidas que propagandisticamente elenca, nenhuma respeita à promoção desses produtos. Fui ver o site do Ministério da Agricultura e a pesquisa deu em nada, zero, népias. Os responsáveis têm o descaramento de dizer que as "Certificações não foram mais-valia" pois "a profusão de registos [de certificação] acabou, em muitas situações, por não corresponder a uma alternativa com mais-valias para os produtores e regiões produtoras". Ora, a questão não é essa, mas sim a de saber se o Estado cumpriu a sua parte, isto é, a de certificar e de divulgar e promover. A primeira, sim, mas imersa em burocracias inauditas (detalhes no texto do Público); a segunda e terceiras, nada de nada. Nem mesmo uma simples página onde se divulgassem esses mesmos produtos, ou uma feira específica com os mesmos. Com tantos funcionários não era possível fazer um trabalho tão simples?

Também aqui temos vindo a falar da relevância da protecção e fomento dos produtos tradicionais, seja a fruta, o vinho, etc.. Noutros países da UE como a França, Itália e mesmos países recém-integrados, como a Polónia e Hungria, a luta por cláusulas de salvaguarda é uma questão nacional. Por cá, achamos que não, que são outras coisas: estádios de futebol, turismo de betão, etc..

Sendo esta uma questão tão relevante no desenho de políticas públicas de coesão social e territorial e na salvaguarda de tradições sustentáveis, custa-me a perceber a indiferença à volta desta questão, mesmo por parte daquela direita que se diz defensora das tradições nacionais. É caso para dizer: a retórica fica-se pelo enunciado.

Na imagem, os maravilhosos biscoitos do Fundão.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

O choque tecnológico em perspectiva comparada: paga, Zé, e não bufes

É isso aí: quem vive em Portugal paga 20% mais para aceder à Internet do que na restante UE, e 15% mais pelas chamadas de telemóvel.

Estes dados, relativos a 2008, constam dum estudo divulgado pela Autoridade da Concorrência e é mais um dos grandes feitos do bombástico «choque tecnológico» da era socratista.

Crise? Qual crise! Regulação? Qual regulação, qual quê! O Zé pagante cá está para albardar a vontade ao dono.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Put People First!



Nesta manifestação londrina estiveram c.35 mil cidadãos de todo o mundo (vd. cartaz em cima). Foi um evento alternativo à cimeira do G20, organizado pela Put People First!, plataforma de ONG's internacionais.

O protesto foi pacífico, embora tenha havido incidentes no fim, já amplamente relatados. Morreu uma pessoa, Ian Tomlinson, a polícia diz que por ataque cardíaco, aguarda-se a autópsia. Depois disso, sucederam-se vários outros protestos em Londres, com novos incidentes. Também em Estrasburgo, a cimeira da NATO foi recebida com protestos, parte deles violentos.

A «nova ordem» à la Brown começa com muita pompa, alguns novos rostos (destacando-se Obama, claro), mas também com as multidões na rua. E as vozes vão-se ouvindo (e desvelando) pelos media que ainda descem às ruas para escutar os cidadãos comuns. «0% interest on others» e «We won't pay for their crisis» são outros dos slogans mais comuns. Sobre o lado indefinido duma das principais medidas do G20 ver este cartoon de Steve Bell.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades

Lentamente, eis que o chão vai mudando sob os nossos pés. Algumas breves de política internacional aí estão para o comprovar:

- na Argentina, o governo extingiu o sistema privado de pensões e transferiu-o para o sistema público, atingindo o BBVA com essa medida
- na Bolívia, o Congresso aprovou por mais de 2/3 a lei que permite referendar uma nova Constituição (a 25/I próximo), após inúmeras emendas aceites pelo partido de Morales, incluindo a sua não reeleição (com negociação e concertação dissipou-se a ameaça de desestabilização)
- na Colômbia, uma marcha índigena exortou o governo de Uribe a cumprir uma promessa de repartição de terras agrícolas, promessa essa feita nos anos 90, e denunciou a expulsão de c. 50 mil dos seus das suas terras.
Curiosamente, são todas notícias da América Latina. Por cá, continuamos a passar cheques em branco e, apesar dalgumas medidas avulsas de amparo social (ano de eleições oblige), persistimos como um dos países mais desiguais da OCDE, fosso esse agravado nos últimos 20 anos, como o atesta o último relatório desta organização.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Se isto é a terceira via, venha depressa a quarta...

Com mais de dez anos dos Trabalhistas no poder, as desigualdades e a pobreza no Reino Unido aumentaram.

Desigualdades Socio-Económicas na Saúde (em 22 países europeus)

A revista New England Journal of Medecine (a revista médica internacional mais cotada nos rankings de publicações científicas) acaba de publicar um estudo de saúde pública em que analisa o impacto das desigualdades socio-económicas na saúde. Foram estudados 22 países europeus, e o principal indicador utilizado foi a taxa de mortalidade.
Não é muito surpreendente que o estudo conclua que os grupos mais desfavorecidos tenham maiores taxas de mortalidade. Nunca é demais repeti-lo: a pobreza mata. No entanto o estudo vai mais além, e é isso que é mais interessante, no estudo das causas destas desigualdades. A primeira conclusão é que as desigualdades socio-económicas têm um impacto muito diferente na mortalidade consoante os países. Assim na Suécia e na Grã-Bretanha (i.e. Inglaterra e Gales, a Escócia não faz parte do estudo) são os países onde as desigualdades menos impacto têm na mortalidade. Curiosamente são países onde existe um sistema de saúde público e universal. No polo oposto, é em países do leste da Europa e Báltico que é maior a diferença na mortalidade entre grupos socio-económicos.
Este estudo analisa vários factores que podem contribuir para o impacto das desigualdades nas taxas de mortalidade (e.g. alcoolismo, tabagismo, obesidade). Desses factores a análise feita determina que um dos factores que mais peso tem é o acesso a cuidados de saúde, daí a necessidade de um sistema de saúde universal. O que me parece também bastante relevante, é que a consciência para os problemas de saúde aparece também como um factor determinante. Ou seja capacidade das pessoas diagnosticarem os seus próprios problemas de saúde (o "self-acessement") é menor nos grupos mais desfavorecidos, e isso causa uma maior taxa de mortalidade nestes grupos. Quer isto dizer que é uma questão de educação. As populações mais desfavorecidas parecem não ter consciência dos seus próprios problemas de saúde, e talvez procurem menos os cuidados médicos quando deles precisam. Os outros factores analisados parecem ter pouco peso, no que respeita às desigualdades.
No caso de Portugal, é dos países onde são detectadas maiores desigualdades em termos de educação e de rendimentos. É também dos países onde as desigualdades socio-económicas têm uma maior correlação com a obesidade (especialmente nas mulheres), mas por outro lado é dos raros países onde existe uma correlação negativa com o tabagismo (os mais pobres fumam menos, especialmente as mulheres). Finalmente em Portugal, apesar das desigualdades nos rendimentos e na educação, as desigualdades socio-económicas têm um impacto relativamente reduzido na mortalidade comparado com outros paíes (anda lá pelo meio da tabela). Talvez o sistema de saúde português não seja tão mau quanto isso, e consiga atenuar o impacto das desigualdades socio-económicas na saúde.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

O íman-mor das manifs

Mais de 200 mil pessoas protestaram ontem em Lisboa contra a proposta governamental de revisão do Código do Trabalho (vd. notícias e imagens aqui, e tb. aqui). Segundo a PSP foram 200 mil, segundo a CGTP foram 270 mil os portugueses que desceram a Av. da Liberdade esta 5.ª feira.
O governo actual arrisca-se a ficar na história recente de Portugal como o íman-mor das manifs, tal é a adesão que despoleta. Nem tudo é mau: sempre ganha um troféu!
Nb: imagem da manif. retirada daqui.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

A desigualdade segundo Gilberto Gil

Há algo que me perturba quando os artistas de verdadeiro talento são capazes de emprestar beleza ao que de belo não tem nada. Acho mal! Sou frontalmente contra, e devia ser proibido. Era preciso um Idanov para tratar do assunto. O Gilberto Gil, sendo um grande artista, é useiro e veseiro nestas prevaricções. Veja-se por exemplo o tema "A Novidade" (pode ouvir-se ali em baixo), o poema é dele. Um/a gajo/a ouve isto e fica a pensar: "...lindo!, é lindo!". Ou seja a desigualdade social é linda! A guerra entre ricos e pobres é linda. Repare-se:"Ó, mundo tão desigual / Tudo é tão desigual / Ó, de um lado este carnaval / Do outro a fome total", e depois canta aquilo com guitarrinha em ritmo de samba-reaggae, e arranjo tropicalista, como se falasse da coincidência mais feliz do mundo. E eu pergunto: Onde anda a escola urbano-depressiva? Onde anda o negativismo constitutivo? Onde anda o pessimismo sistémico? Sei lá, não se arranja pelo menos um faduncho? Temos que levar com esta alegria incorrigível? Eu acho mal! Sou contra!
Pode ler-se a letra completa, e umas notas do Gilberto Gil sobre a estória deste poema aqui.


P.S. - Lifelogger rocks! Thanx Shyz!

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Outras ingenuidades

A ideia ingénua do Zèd traz-me outro pensamento ingénuo. A mim uma das coisas que mais me choca no que toca à desigualdade salarial em Portugal é que, ao que parece, os que mais beneficiam dessa desigualdade – os gestores, patrões e as várias "elites" profissionais – não merecem ganhar tanto. Eles não podem dizer como alguns grandes patrões no mundo que merecem o que eles usufruem porque criam riqueza, empregos, etc., etc.
Porque é que eu digo isso. Num dos últimos números do Público de 2007, havia um dadozinho que deve fazer pensar (e isso desde há pelos menos 40 anos). Os trabalhadores portugueses lá fora – e o Público referia-se aos Portugueses no Luxemburgo que são três vezes mais produtivos que os trabalhadores em Portugal – são muito mais produtivos que os que ficam em Portugal. Ao que se deve essa diferença brutal que permite pensar que o problema não está na mão-de-obra?
Pode-se pensar que aqueles que emigram são os mais empreendedores, os mais dinâmicos, os mais produtivos.
Talvez. Mas não me parece explicação suficiente.
É sobretudo porque em Portugal o aparelho produtivo (máquinas, etc.), a organização do trabalho, as relações de confiança (ou sobretudo de desconfiança) criadas nas empresas, os incentivos salariais e o management das carreiras são deficientes. E isso é a culpa de quem? Em grande parte, dos gestores, dos patrões, de todos aqueles que auferem vencimentos chorudos e às vezes são melhores pagos que os seus homólogos europeus.
Por isso, “chapeau” a esses privilegiados.

Mas isso só traz perguntas : o que pode fazer o Estado para atenuar as desigualdades, obrigar as empresas a melhoraram o aparelho produtivo, melhorar os vencimentos, criar confiança nas relações laborais, facilitar a mobilidade social (pelo ensino e pela formação profissional), promover a iniciativa dos trabalhadores (e a justa recompensa dessas iniciativas), incentivar os talentos e a inovação (e não manter o status quo e as posições adquiridas e protegidas pelo Estado), etc., etc.,

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Flexi-exploração

A propósito das polémicas em torno da flexi-segurança, é fundamental recuperarmos um outro conceito na qual se baseia uma determinada perspectiva sobre a constituição das desigualdades sociais no sistema capitalista, refiro-me ao conceito de exploração. Já uma vez discutimos aqui no Peão a pertinência em utilizá-lo para a análise da sociedade contemporânea. Contudo, parece-me que em todo este debate sobre a necessidade de flexibilizar o emprego com mais protecção social, faz todo o sentido questionar se estas medidas não contribuirão para um acréscimo de exploração.
Em termos muito gerais o objectivo da flexi-segurança é, por uma lado, tornar a contratação laboral menos regulamentada e, por outro, aligeirar a possibilidade de poder despedir mais facilmente, ao mesmo tempo que se investe na generalização e facilitação do acesso aos diversos sistemas de protecção social. Contudo, no que concerne à aplicação dos princípios à sociedade portuguesa, o ênfase é posto sobretudo na primeira parte deste neologismo, a flexibilidade, e não tanto na segunda, a segurança.
É certo que o mercado de trabalho em Portugal é muito rígido, e que isso provoca entraves à mobilidade profissional e à renovação dos quadros das empresas. É certo que alguma precarização profissional nas gerações mais jovens deriva, em parte, dessa inflexibilidade do mercado de trabalho. No entanto, também é certo que em Portugal os vários sistemas de protecção social não só deixam muito a desejar como estão a regredir em termos da universalização dos direitos. A ‘taxação’ dos serviços, o encerramento de escolas, das urgências nos centros de saúde e das maternidades. A inexistência de uma rede de pré-escolar digna desse nome. O mau funcionamento dos transportes públicos e das respectivas ligações entre as várias redes, o tempo que se leva entre trabalho e casa. O péssimo funcionamento do sistema de justiça e o nível de desconfiança que este fomenta, etc. Todos estes exemplos e muitos outros levam a que legitimamente o cidadão desconfie da flexi-segurança.
Portugal é dos países mais desiguais da Europa. Devido a este facto, o acesso aos melhores serviços (incluindo os públicos) é muito diferenciador. Esta situação é potencialmente conflitual na medida em que os interesses que dela decorrem não resultam simplesmente daquilo que «os indivíduos têm, mas, também, daquilo que os indivíduos fazem com o que têm». Neste sentido, o conceito de exploração permite evidenciar «que os exploradores não somente têm interesse em limitar as oportunidades de vida dos explorados, mas que deles dependem para a realização dos seus próprios interesses. Esta dependência dos exploradores em relação aos explorados confere a estes últimos uma capacidade inerente de resistir» (Queiroz, 2005: p.41*). Ou seja, ao se tentar aplicar a tal flexibilidade com maior segurança num país fortemente desigual onde os indivíduos das classes menos privilegiadas se sentem discriminados e desconfiam de quase tudo o que deriva dos sistemas públicos, correr-se-á um forte risco de criar um ambiente propício para o incremento das relações de exploração.
Não ponho de lado a importância da flexi-segurança, mas a estratégia política deveria primeiro aprofundar os mecanismos de segurança e garantir que os cidadãos confiem no Estado. Aos dinamarqueses foi-lhes primeiro garantida essa confiança!

*Maria Cidália Queiroz (2005), Classes, Identidades e Transformações Sociais, Porto, Campo das Letras.

quinta-feira, 17 de maio de 2007

Privatização da questão das desigualdades?*

Muito importante o artigo do João Rodrigues hoje no "Público": "A desigualdade salarial é um problema de todos".

Os artigos são pequenos e por isso é sempre difícil seleccionar o que é dito e o que é deixado de fora. Mas talvez valesse o pena o João Rodrigues ter lembrado (fica para outra ocasião) que foi precisamente por a questão das desigualdades ser um problema político e público na Europa pós-1945 que as assimetrias salariais e sociais foram mantidas a níveis historicamente baixos, e que isso em nada colidiu com níveis de crescimento impressionante nos "30 anos gloriosos". Mais: há bons motivos para pensar que eles foram catalizadores do crescimento, e - como o João Rodrigues bem alude, e a citação do Adam Smith no final é deliciosa - não é preciso construir nenhuma teoria muito sofisticada da "motivação no trabalho" para perceber como a questão de quem faz o quê e quanto recebe é central para a forma como os trabalhadores se empenham mais ou menos no que fazem. A produtividade depende em boa medida do consenso laboral e este, por sua vez, depende das percepções de justiça e legitimidade da distribuição de rendimentos e riscos. Os alemães e suecos não são mais produtivos do que os portugueses apenas porque são mais qualificados ou têm mais competências: é porque o ambiente laboral, cujas regras são devidamente definidas de forma partilhada por sindicatos e patronato, é de muito melhor qualidade. Já agora, se correlacionarmos o nível de desigualdades salariais nacionais com as taxas de crescimento mesmo nos últimos 30 anos - já não os "gloriosos", mas os "dolorosos" -, o mais provável é que não obtenhamos nenhuma correlação particular, porque a dispersão de performances nacionais é assinalável e a variação ao longo do tempo também (o modelo americano, elogiado por todos, era dado como defunto há 15 anos, quando era comparado com o Japão, entretanto caído em desgraça; entretanto, a Europa social-democrata - ainda que não tanto a continental nem mediterrânica -, tem-se portado muito bem e mostrado as vantagens comparativas de regimes de produção e bem-estar que permitem um rápido crescimento económico e uma manutenção das desigualdades a níveis baixos, a apesar de estas terem subido um pouco no último quarto de século).

Para mais, a questão a que o João Rodrigues alude no iníco do texto e que se prende com as chorudas compensações que está na moda os gestores do sector privado receberem é daquelas que prova que os salários são boa medida fixados por decisões políticas e não simplesmente pela "produtividade" ou pelo "mercado". Em muitos casos, eu pergunto se essas "decisões" - aqui a mão é bem "visível" - não pertencem ao domínio da cleptocracia. É que o mais comum é essas compensações bilionárias não estarem indexadas a nenhum critério de sucesso empresarial; pelo contrário, elas ocorrem muitas vezes no seguimento desses profissionais terem tido péssimos desempenhos e arrastado as empresas com eles para o fundo. Claro, quem paga são os restantes trabalhadores (e, já agora, os accionistas) e, no limite - porque o trabalhador é cidadão, cônjuge, mãe/pai, etc., fora do perímetro da empresa -, todos nós. E se há socialização dos males, então tem de haver socialização dos bens. E socialização significa politização.

*Publicado também aqui.

quarta-feira, 18 de abril de 2007

E quantos Cristianos Ronaldos não ficaram pelo caminho?

Já que há muita gente que só consegue discutir estas questões baseando-se em "casos da vida real", vou pegar no post do João Caetano ali abaixo e virar a questão ao contrário. Dá-se por aí o exemplo do Cristiano Ronaldo que abandonou os estudos* e vai tornar-se em breve num dos jogadores mais bem pagos do mundo, um exemplo de sucesso portanto. Procure-se então o contra-exemplo, quantos rapazes deixaram a escola para se dedicar ao futebol na esperança de ser um profissional bem pago e não conseguiram singrar? Quantos ex-jogadores de futebol juvenil não estarão hoje a trabalhar em bombas de gasolina a respirar octano e a receber pouco mais que o salário mínimo? Ou numa linha de montagem, ou outro qualquer emprego mal pago? E se tivessem continuado os estudos, que empregos teriam hoje esses rapazes? Quanto estariam a receber de ordenado ao fim do mês?

*Em rigor não me parece que o Cristiano Ronaldo tenha realmente abandonado os estudos, a escola oficial sim, mas não os estudos. Dedicou-se (leia-se: especializou-se) desde cedo no estudo de uma actividade profissional para a qual é especialmente dotado, e foi para a Academia de Alvalade. Consta até que continua a empenhar-se obsessivamente no aperfeiçoamento das suas competências, treina compulsivamente.

Persistências

De muito longe (e sem toda a informação indispensável) esse debate sobre as “novas oportunidades” parece-me também surreal mas, infelizmente, representativo dos arcaísmos persistentes da sociedade portuguesa. Parece que sobre o que toca à formação escolar das classes populares, qualquer que seja o regime, a história repete-se. A honra dos sem-estudos que agora alguns defendem assemelha-se aos discursos sobre os analfabetos do tempo do Estado Novo (os pobres honrados na boca dos salazaristas). Na altura, alguns proclamavam que não se devia obrigar os analfabetos a ler e a escrever porque eles, lá no fundo, tinham uma certa inteligência e as campanhas de alfabetização eram “classistas” e hostilizavam os pobres.
A inutilidade da formação profissional dos trabalhadores também assemelha-se à reacção de certos fragmentos da elite quando se iniciou o Instituto de Formação profissional nos anos 60. Mais uma vez dizia-se que essa política não era necessária.
Mas o que sempre houve atrás desses discursos foi uma vontade de fechamento social das elites (que de forma estranha não desdenham mandar os filhos deles à escola e à universidade : porque será?) e uma vontade de manter os salários baixos. Porque essas coisas da formação profissional podem sempre implicar aumentos de salários! E esses trabalhos que todos dizem dever ser respeitados não dão, na maioria das vezes, direito à ordenados “respeitáveis”. Por isso, tal como o Zed, não compreendo que pessoas que vêem da esquerda comungam com ideias reaccionárias defendendo uma hierarquia natural e imutável da sociedade.