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domingo, 24 de novembro de 2024

Selecção do Peyroteo e Sacristão -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda       

Circula na internet um texto sobre a faceta de distraído, do Destruidor Implacável. A coisa não tem importância nenhuma. João Lourenço disse aos jovens do MPLA, no encerramento do congresso, que para comemorar os 50 anos da Independência Nacional, vai realizar-se uma partida de futebol entre as selecções nacionais de Angola e da Argentina. Eu gostava de fazer a cobertura com uma reportagem ao estilo o Jinongonongo. 

O nosso deus na terra disse que vem aí a selecção de Maradona e Messi. Logo um escriba gozou com o dislate do chefe. Maradona está morto e arrefece há muito tempo! Um assessor da Cidade Alta logo veio justificar o deslize dizendo que o infalível presidente de todos os distraídos continua a ser deus. O argumento é pobre e ridículo. 

O desgraçado defensor do Destruidor Implacável diz que é normal associar o nome da selecção nacional da Argentina a Maradona. Tal como é normal associar o nome de Pelé à selecção nacional do Brasil. Se o deslize no congresso da JMLPA foi inócuo e não merecia a escrita do prolixo escriba, a emenda sim, mostra kaxikismo em último grau e estupidez natural incomensurável.

A selecção nacional de futebol angolana não é a selecção de Peyroteo, Sacristão, Jacinto João, José Maria, Dinis, Flávio, André, Figueiredo ou Mantorras. Palancas Negras! Angola! No jogo da bola não há o culto da personalidade.

quarta-feira, 25 de setembro de 2024

Argentina: O desastre do Plano Motosserra

Um balanço do governo Milei: desmonte da indústria, investimento estancado, explosão da pobreza – e, ainda assim, inflação de quase 100% até agosto. O plano: reprimarização radical do país. E ele ainda não desistiu do projeto de dolarização

José Álvaro de Lima Cardoso* | em Outras Palavras | # Publicado em português do Brasil

O PIB (Produto Interno Bruto) da Argentina caiu 1,7% no 2º trimestre de 2024 em relação ao mesmo período de 2023, segundo relatório do Instituto de Censos e Estatísticas (Indec), divulgado na semana passada. A queda foi puxada principalmente pelos setores de Construção (-22,2%), Indústria de Transformação (-17,4%) e Comércio Atacadista, Varejista e Reparos (-15,7%). O setor de Agricultura, Pecuária, Caça e Silvicultura apresentou a maior alta: 81,2%. Na comparação com o 1º trimestre deste ano, o PIB recuou1,7%.

Do ponto de vista da demanda, o recuo mais avassalador foi o da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, parcela do PIB que é reinvestido na produção), que caiu 29,4% no segundo trimestre de 2024, em relação ao mesmo período do ano passado. A queda se deveu ao recuo de 30,7% nos investimentos do setor de Construção, recuo de 3,3% de Outras Construções, diminuição de 30,2% no setor de Máquinas e Equipamentos e pela queda de 39,6% em Equipamentos de Transporte.

O PIB da Argentina vem de três trimestres seguidos de queda. Formalmente, uma economia entra em recessão quando completa dois trimestres seguidos de queda no PIB. Normalmente, quando se provoca uma recessão na economia, como no caso da Argentina, a inflação recua. Mas no acumulado de 12 meses a inflação alcançou 236,4%. Somente em agosto os preços subiram 4,2%, que é a inflação anual do Brasil. Em 2024, até agosto a inflação no país soma alta de 94,8%. Ou seja, mesmo com a brutal recessão, provocada pela queda dramática do poder aquisitivo de trabalhadores e aposentados, e da quebradeira de empresas mais ligadas ao mercado interno, a inflação na Argentina não cedeu significativamente. O que mostra que o diagnóstico do governo Milei, de uma suposta centralidade da inflação de demanda na economia, é totalmente furado.

quinta-feira, 25 de abril de 2024

As relações complexas de Israel com o Irão

Thierry Meyssan*

Se a retórica dos mullahs é claramente anti-israelita, as relações entre os dois países são muito mais complexas do que se crê. Existem, com efeito, dois grupos opostos no Irão. Um entende fazer negócios por todos os meios com o resto do mundo, enquanto o outro ambiciona apenas libertar os povos da colonização. O primeiro não parou de fazer negócios com Israel, enquanto o segundo o combate, ao mesmo nível da luta contra o imperialismo do Reino Unido e dos Estados Unidos.

O conflito entre Israel e o Irão é distinto daquele que opõe a população árabe da Palestina aos imigrantes judaicos. Contrariamente a uma ideia feita, os Persas nunca foram inimigos dos judeus. Aliás, durante a Antiguidade foi Ciro o Grande que permitiu aos judeus sair da Babilónia onde estavam presos como escravos.

Após a Segunda Guerra mundial, quando os Estados Unidos se apoderam dos restos do Império britânico, o Presidente norte-americano Dwight Eisenhower reorganizou o Médio-Oriente. A fim de o dominar, ele designou duas potências regionais para o representar, o Irão e Israel. Desde então, os dois países foram simultaneamente amigos e rivais.

Eisenhower, enviou o seu Secretário de Estado, John Foster Dulles (o irmão do Director da CIA, Alan Dulles), à Síria para organizar uma aliança irano-síria a fim de conter as ambições israelitas. Um tratado de defesa mútua foi assinado entre Damasco e Teerão, em 24 de Maio de 1953. À época, o Presidente sírio, o General Adil Chicakli, era pró-britânico e anti-francês. Este Tratado perdura até hoje [1].

Ao mesmo tempo, o Reino Unido entrou em conflito com o Primeiro-Ministro do Xá Reza Pahlevi, Mohammad Mossadegh, que entendia nacionalizar a exploração do petróleo. Com a ajuda dos Estados Unidos, Londres organizou uma Revolução colorida («Operação Ajax») [2] . Milhares de pessoas foram pagas pelo MI6 e pela CIA para protestar nas ruas e derrubar Mossadegh. Respondendo ao « apelo » do seu povo, o soberano mudou o seu Primeiro-Ministro designando em seu lugar o General nazi Fazlollah Zahedi [3].

quinta-feira, 11 de abril de 2024

Argentina: Milei busca a recolonização total

Achatamento dos salários e pensões. Tarifaço. Desmonte dos serviços públicos. População se precariza, mas ganham os exportadores de matérias-primas e fundos especulativos. País é o novo laboratório ultraliberal. As ruas frearão a catástrofe?

Eduardo Giordano, no El Salto | Outras Palavras | Tradução: Rôney Rodrigues

Depois de quase quatro meses de governo de Javier Milei, a economia argentina continua em queda livre. Quase todos os indicadores de atividade e de consumo mostram sinais de forte depressão, com a única exceção das exportações de bens primários. Enquanto isso, os planos autoritários do presidente fracassaram pela segunda vez no Congresso. Depois de ter retirado a Lei Ómnibus por falta de apoio dos legisladores, o Decreto de Necessidade e Urgência (DNU) promulgado em dezembro foi rejeitado por ampla maioria no Senado (42 votos contra e 25 a favor). Contudo, os mais de 300 artigos do DNU que não foram suspensos pela Justiça permanecem em vigor desde o momento de sua promulgação, até que o decreto seja debatido na Câmara dos Deputados para sua rejeição ou aprovação definitiva.

Com estes dois instrumentos jurídicos, que totalizavam mais de mil artigos, o governo Milei esperava reconfigurar as “bases” da sociedade argentina. O fracasso político do presidente alimenta o conflito declarado pelo Executivo contra outros poderes do Estado: o Legislativo e os governadores das províncias, a quem acusa de boicotar a mudança que propõe, por interesses supostamente mesquinhos.

sexta-feira, 5 de abril de 2024

Portugal | Os 12 trabalhos de Montenegro

Marco Grieco, diretor de arte | Expresso (curto)

Bom dia, caro leitor/utilizador/amigo/espectador.

O mitológico herói grego Hércules – ou Héracles – é a personagem histórica de uma série de episódios arcaicos ligados entre si por uma narrativa contínua, relativa a uma penitência que teria de cumprir.

Talvez com uma empreitada um pouco menos penosa, mas nem por isso leve, o Governo de Montenegro assume os lemes de Portugal numa altura em que são precisos esforços hercúleos para voltar a por o país nos trilhos.

Há mais de 2500 anos, foi preciso estrangular o Leão da Nemeia, capturar a Corça de Cerineia ou limpar em apenas um dia os imundos currais do rei Augias, entre outras barbaridades. Em perspetiva, os desafios políticos, sociais e económicos que se avizinham até podem parecer insignificantes.

Mas se Hércules teve pouca ou nenhuma ajuda na sua empreitada, Luís Montenegro vai precisar escolher muito bem os seus parceiros para esta jornada minoritária, que promete ser épica.

XXIV Governo Constitucional de Portugal

. Grandes medidas do Governo serão apresentadas em cima das europeias

. Centeno não é opção para o Banco de Portugal

. Tribunal de Contas, PGR, Lusa e RTP na lista de nomeações

. Marcelo quer rever estatutos dos militares e afasta SMO

. Autor do antigo ‘logo’ do Governo alvo de ameaças de morte

Esquerda teme pela eutanásia e pelas barrigas de aluguer

Em nome do pai

No relatório final sobre o caso das gémeas luso-brasileiras tratadas no SNS com caríssimo medicamento inovador, a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde revela que a relutância de Belém em enviar a documentação sobre o caso “condicionou a direção da instrução”. Nuno Rebelo de Sousa, filho de Marcelo, terá pressionado a equipa do Presidente e o ex-secretário de Estado, Lacerda Sales.

Da morte faz-se vida

Sete mulheres foram já submetidas a um total de 19 tratamentos de fertilidade utilizando esperma de dadores mortos. Segundo o que o Expresso apurou, só duas destas mulheres estão a ser tratadas no Serviço Nacional de Saúde, encontrando-se as restantes a fazer os seus tratamentos no sector privado.

E ainda…

Operação Maestro. MP travou buscas da PJ a secretário de Estado

. Genocídio no Ruanda, uma ferida ainda aberta, 30 anos depois

. Sporting-Benfica: os números que marcam o – eventual – dérbi do título

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Hiperimperialismo

O Ocidente é incapaz de aceitar o seu lento desaparecimento como bloco dominante no mundo, escreve Vijay Prashad. 

Vijay Prashad Tricontinental:Instituto de Pesquisa Social

“O Ocidente está em perigo”, alertou o novo presidente da Argentina, Javier Milei, na reunião deste ano do Fórum Económico Mundial (WEF) em Davos, na Suíça. 

No seu estilo perigosamente atraente , Milei culpou o “coletivismo” – isto é, o bem-estar social, os impostos e o Estado – como a “causa raiz” dos problemas do mundo, levando ao empobrecimento generalizado. 

O único caminho a seguir, declarou Milei, é através da “livre empresa, do capitalismo e da liberdade económica”. O discurso de Milei marcou um regresso à ortodoxia de Milton Friedman e dos Chicago Boys, que promoveram uma ideologia de canibalismo social como base para a sua agenda neoliberal. 

Desde a década de 1970, esta política de terra arrasada devastou grande parte do Sul Global através dos programas de ajustamento estrutural do Fundo Monetário Internacional. Também criou desertos fabris no Ocidente (o que Donald Trump, no seu discurso de posse em 2017, chamou de carnificina americana). 

É aí que reside a lógica confusa da extrema direita: por um lado, apelar à classe bilionária para dominar a sociedade no seu interesse (o que produz a carnificina social) e depois, por outro lado, inflamar as vítimas dessa carnificina para lutarem contra políticas que os beneficiariam.

Milei está certo na sua avaliação geral: o Ocidente está em perigo, mas não por causa de políticas social-democratas; está em perigo devido à sua incapacidade de aceitar o seu lento desaparecimento como bloco dominante no mundo.

Do Tricontinental: Institute for Social Research and Global South Insights (GSI) vêm dois textos importantes sobre o cenário global em mudança: um estudo marcante, “ Hyper-Imperialism:A Dangerous, Decadent New Stage ”, e nosso 72º dossiê, “ The Churning of a Ordem Mundial ” (o dossiê é um resumo do estudo, então estarei me referindo a eles como se fossem um só texto).

A Tricontinental acredita que esta é a afirmação teórica mais significativa que o nosso instituto fez nos seus oito anos de história.

quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

Portugal | É dia de voltar a estar in. Conhecido hoje o recurso do Ministério Público...*

Ricardo Marques, jornalista | Expresso (curto)

Há muito proclamada, quiçá acertadamente, como um dos grandes temas da campanha eleitoral que se avizinha, e a após breves semanas de retiro natalício, a Operação Influencer regressa hoje ao palco principal que é a vida em Portugal ao quarto dia do ano 2024.

Eis que é conhecido o recurso do Ministério Público.

Longe de mim querer prolongar o suspense… e portanto cá vai o indispensável aperitivo que lhe permitirá seguir com a máxima atenção todos os desenvolvimentos do dia noticioso. É mais ou menos assim o arranque da notícia do Expresso: o documento arrasa as decisões do juiz de instrução e põe em xeque o presidente da câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, que se queixou da contribuição “miserável” de cinco mil euros. João Galamba é considerado o líder do “conluio”, Lacerda Machado pode estar a continuar a cometer crimes e todos os arguidos põem em causa a “paz social”

O recuso do Ministério Público segue-se aos recursos das defesas dos arguidos sobre as medidas de coação aplicadas pelo juiz de instrução, como sucedeu, por exemplo, com Lacerda Machado e com Vítor Escária.

Duas ou três notas mais sobre as cento e poucas páginas do recurso.

O Ministério Público reconhece que foram cometidos alguns erros – um deles foi apontado pelo Expresso neste artigo de novembro - contesta de forma clara a decisão da primeira instância - “As considerações tecidas pelo meritíssimo juiz de instrução criminal não são juridicamente acertadas” – e há muito poucas, e apenas indiretas, referências ao inquérito autónomo que envolve António Costa e que corre no Supremo Tribunal de Justiça.

A campanha eleitoral, com se costuma dizer, ainda não saiu da igreja. E é provável que antes de chegar ao adro assistamos a mais um regresso da procissão de São Influencer. O MP e os arguidos que recorreram têm agora 30 dias para responder aos recursos uns dos outros e o processo segue para o Tribunal da Relação de Lisboa que decidirá quem tem razão nas medidas de coação e nos crimes imputados.

O tempo está a contar.

OUTRAS NOTÍCIAS

Nisso, do tempo estar a contar, os recursos da Infuencer são como recursos disponíveis para lidar com a influenza, Gripe para os amigos. Não é provável que a guerra de horas de espera nas urgências de norte a sul, que há dias ocupa os noticiários, desapareça tão depressa. Depois do Natal e Ano Novo, e com tempo frio previsto para o futuro próximo, os médicos acreditam que haverá mais gente a correr para os hospitais e que o alívio só será sentido no final da próxima semana.

Nota rápida para uma pausa tática na greve dos médicos. São três meses para ouvir os partidos acerca das propostas para a saúde, com a ameaça de novo fecho das urgências em caso de inércia política.

Um caso que envolve o Ministério das Finanças, o Ministério das Infraestruturas, uma empresa com três letras no nome, uma decisão que não se sabe bem quem tomou e Pedro Nuno Santos a garantir que não é nada com ele. Não é a TAP. Mete os CTT e a compra secreta de ações por parte da Parpública. A história parece estar apenas no começo, mas para entrar no enredo (estaremos perante mais um candidato a filme da campanha eleitoral?) não há ponto de partida melhor do que este artigo do Expresso.

Por falar em campanha eleitoral, nenhuma o é verdadeiramente sem o precioso contributo de um comunicador vindo do outro lado do atlântico. Marketeer brasileiro? Check! Chama-se Sérgio Guerra trabalha em marketing político desde os anos 80 e assumiu campanhas no Brasil, Angola, Cabo Verde e Argentina. Vai juntar-se à agência de comunicação Cunha Vaz, já contratada pelo PSD.

É dia de dizer adeus ao IVA Zero e dar as boas vindas aos novos, e mais altos, preços em dezenas de produtos essenciais.

Aquele italiano simpático do quinto andar tem a casa à venda? Saiba tudo sobre a nova vida do seu vizinho neste artigo do Expresso: Arrivederci, Lisboa, foi bom enquanto duraram os 10 anos: preços da habitação e fim do RNH põe os reformados italianos em fuga de Portugal

Um dos temas do dia será seguramente a lista de personalidades ligadas a Jeffrey Epstein que foi ontem tornada pública por um tribunal dos EUA, já noite em Lisboa. A decisão surge no processo contra Ghislaine Maxwell, a antiga namorada de Epstein, o investidor em fundos especulativos, que foi acusado de abuso sexual de menores e tráfico sexual de menores em julho de 2019. Menos de um mês depois, a 10 de agosto de 2019, foi encontrado morto na cela, numa prisão de Nova Iorque.

Enquanto o mundo treme perante a possibilidade do alastrar da guerra entre Israel e o Hamas, a guerra entre Israel e o Hamas vai alastrando. É importante estar atento ao que vai acontecendo, por exemplo, no Irão, num dia trágico quatro anos depois da morte general Qassem Soleimani, e no Líbano, ainda no rescaldo da morte do número dois do Hamas.

O mundo está como está, é verdade, e é por isso que não posso acabar sem lhe falar de uma sanita.

Em setembro de 2019, quatro homens entraram no Palácio Blenheim (onde nasceu um tal de Winston Leonard Spencer Churchill a 30 de novembro de 1874) e roubaram uma sanita de ouro, avaliada em cerca de 5,5 milhões de euros. A peça fazia parte de uma exposição do artista italiano Maurizio Cattelan e a casa de banho dourada, com o título “Améria”, era uma sátira à riqueza excessiva. O julgamento começa hoje em Londres.

quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

E NO ENTANTO, HÁ ESPERANÇA


Num mundo inundado de notícias, mas carente de informação profunda, nossa Retrospectiva propõe quinze temas para compreender 2023. Foi um ano em que a brutalidade afiou as garras – mas a indignação segue viva e combatente

Redação Outras Palavras | # Publicado em português do Brasil

Um Jesus palestino, envolto na kaffiyeh, ocupa o centro de um presépio incomum, montado há poucos dias numa igreja de Belém, na Cisjordânia ocupada. O menino não repousa na manjedoura. Está ladeado por detritos iguais aos que sepultaram cerca de 10 mil crianças em Gaza, sob os bombardeios de Israel – que persistem. Os destroços mantêm afastados os demais personagens tradicionais à cena: Maria e José, os pastores, os reis magos, a vaca e o jumento. À distância, todos miram o recém-nascido. Ele vive.

Poucas metáforas poderiam expressar tão bem o sentimento que marca a entrada de 2024. Além da tragédia em si mesma, o massacre de Gaza significa a naturalização da violência no Ocidente. Repare: as imagens das vítimas já desapareceram das manchetes e noticiários – talvez por terem deflagrado, por semanas, uma onda global de solidariedade aos palestinos. Além disso, o ressurgimento do fascismo ameaça espalhar a brutalidade pelo mundo. Mas a chama da esperança e da indignação está acesa. Ela impulsionou, por exemplo, os milhares de argentinos que colocaram o governo de Javier Milei em crise precoce há dias, quando se atreveram a cercar, de madrugada, o edifício do Congresso, para protestar contra um decretazo de ultracapitalismo.

Esperança requer informação. Ao longo do ano, Outras Palavras empenhou-se por difundir o que o jornalismo comercial e a onda interminável de futilidades e fake-news ocultam – apesar de disputarem nossa atenção permanentemente. A riqueza concentra-se tão rápido – mostramos – que três megafundos de investimento do mundo já possuem, juntos, mais ativos que o PIB dos Estados Unidos. A desigualdade anda de braços dados com a devastação do planeta, mas espalham-se embriões de novas formas de produção e distribuição. A difusão da Inteligência Artificial (que marcou 2023, e acompanhamos em detalhe traz implícitos enormes riscos civilizatórios, mas uma iniciativa latinoamericana já luta para colocá-la sob controle das sociedades. A fragmentação do Trabalho destroi laços de solidariedade e alimenta a formação de uma subjetividade ultraindividualista. No entanto, emergem éticas e estéticas da insubmissão que buscam, nas lógicas do Comum e do Cuidado, caminhos para um possível pós-capitalismo. Diante da crise do eurocentrismo e da ordem internacional imposta pelos EUA, esboça-se no Sul Global, e em particular na China, uma alternativa. No Brasil, o Estado imprime, a partir do nada, R$ 660 bilhões ao ano para os rentistas – mas poderá, em novo cenário político, fazer o mesmo em favor dos serviços públicos, da transformação da infraestrutura e da geração de ocupações dignas.

Outras Palavras encerra 2023 com sua Retrospectiva: uma seleção do que produzimos de melhor ao longo do ano, dividida em 15 temas provocadores. Esperamos alimentar a reflexão os leitores num período de descanso, balanços e busca de novas perspectivas. Lembramos: nosso jornalismo de profundidade é sem catracas – mas existe graças ao apoio ativo dos leitores. Sugerimos que você considere a hipótese de contribuir com Outros Quinhentos, nosso programa de sustentação colaborativa.

Voltaremos em 10 de janeiro de 2024 – esperando manter a lâmina afiada da crítica e a chama acesa da esperança.

Forte abraço, ótimas festas

A redação de Outras Palavras

sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

A Argentina encara o fascismo-blitzkrieg


Ultradireita ensaia, com Milei, nova tática: ataque em massa aos direitos e à Constituição, para quebrar resistências. População responde, já na madrugada, num sinal de que a disputa será dura. As incógnitas: Justiça, mídia, poderes globais

Antonio Martins* | Outras Palavras | # Publicado em português do Brasil

No tempo acelerado da hipercomunicação, os mitos podem surgir mas também desabar rapidamente – e continua havendo espaço para a luta popular. A indignação e o sangue quente dos argentinos voltaram a aflorar na noite de ontem (20/12), agora contra Javier Milei, empossado em apoteose há apenas onze dias. Às 21h, o presidente anunciou em pronunciamento à nação um Decreto de Necesidad y Urgencia (DNU) inconstitucional, que revoga 300 leis e impõe, por ato de força, o programa máximo dos neoliberais. As medidas destroçam os direitos sociais, instalam a lei do mais forte em todos os âmbitos econômcos e anulam as chances de soberania do país, como se verá adiante.

Armou-se de imediato um panelaço nacional. Em Buenos Aires, cordões de manifestantes rumaram em seguida ao Congresso Nacional, onde milhares de pessoas permaneceram durante a madrugada. Foi ato espontâneo: não havia palanque, caminhão de som, oradores ou balões: apenas gente – em grande maioria jovem — que cantava, dançava e protestava (1 2 3 4). Alguns pediam às centrais sindicais que decretem greve geral. Vinte e dois anos depois, a mobilização instantânea fez lembrar o argentinazo — as jornadas de dezembro de 2003. À época,diante do congelamento dos depósitos bancários (o corralito), as ruas insurreitas forçaram o então presidente a fugir de helicóptero da Casa Rosada, derrubaram mais três chefes de Estado em doze dias e forçaram uma mudança de rumos que terminaria desembocando no governo de Nestor Kirchner, possivelmente o mais à esquerda na história do país.

O cenário é diferente hoje. O paquetazo de Javier Milei sugere que a ultradireita ensaia outra tática – distinta da empregada por Donald Traump ou Bolsonaro – para impor seu projeto. Múltiplos dispositivos da Constituição argentina proíbem que o presidente use o DNU para legislar por decreto, mas ao escolher este instrumento Milei parece ter detectado uma brecha a seu favor. Será importantíssimo verificar como reagem, nos próximos dias, alguns atores-chave: o Judiciário, a mídia, o próprio Congresso e o mundo das grandes finanças globais – inclusive o FMI. A batalha será longa, árdua e terá repercussões internacionais. Por isso, a madrugada de luta em Buenos Aires é, depois de tantos retrocessos na Argentina, um sinal animador.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2023

Argentina | Milei: OS BANQUEIROS PREFEREM A MOTOSSERRA

FMI dá apoio instantâneo a programa econômico do ultradireitista argentino – que devasta serviços públicos e penaliza os mais pobres. Atitude sinaliza opção política do 0,1% e serve de aviso aos que, no governo Lula, cortejam a Faria Lima

Glauco Faria* | Outras Palavras | # Publicado em português do Brasil

Depois de mais de duas horas de atraso no anúncio oficial programado para as 17h desta terça-feira (12), o ministro da Economia do governo de Javier Milei, Luis Caputo, anunciou à noite, via transmissão por streaming, as primeiras medidas econômicas da atual gestão na Argentina. Embora tenha sido o chamado “pacote”, tão comum em países da região nos anos 1980/1990, as linhas gerais podem ser resumidas em duas: maxidesvalorização do peso e cortes em investimentos/despesas do poder público.

Diversas razões para o atraso do anúncio (gravado) de Caputo foram aventadas e uma delas dizia respeito ao ajuste do discurso para justificar politicamente as medidas tomadas. Afinal, como disse o próprio ministro, a situação geral vai piorar nos próximos meses e o próprio Milei já havia falado em um período de estagflação (combinação de quadro recessivo com inflação). Assim, era necessário dizer que a herança do governo anterior era pesada demais e que o momento exigia medidas drásticas para evitar o pior em termos inflacionários.

Não faltou desenhar um futuro sombrio em que haveria uma “inflação plantada de 15.000%”, algo que Milei já havia mencionado no seu discurso de posse. A inflação anual argentina está em torno de 150% e, apesar do cenário grave, nada indica um quadro hiperinflacionário como o vivido em parte dos anos 1980, por exemplo. A argumentação é essencialmente política e nada técnica.

“O problema é que as medidas tomadas não apontam para baixar a inflação, mas sim subir. Então, ele (Milei) não quer que se compare com os 150% de inflação, mas com 15.000% que ele diz que há, ou que poderá haver, ou que poderia ter havido”, aponta o economista Alejandro Bercovich. “Dizem que um litro de leite que vale US$ 1.000 pode chegar a US$ 60.000, então quando chegar a US$ 10.000 você se sente com sorte. Eles estão tomando você por um tolo”, resumiu uma postagem que viralizou nas redes sociais.

Para Caputo, toda culpa da crise argentina é do déficit fiscal, o que obrigaria, segundo ele, a cortes, incluindo a modificação do mecanismo de reajustes de aposentados e pensionistas e eliminação de subsídios em transportes e serviços de energia, o que vai provocar aumento de tarifas. Não faltou também na fala do ministro a surrada e pra lá de equivocada comparação entre o orçamento do Estado e o orçamento doméstico, ignorando-se que o corte de despesas de uma família não induz queda da própria receita, por exemplo.

O homem forte de Milei na economia também falou a respeito do problema do país seguir se endividando, ignorando que ele, no mesmo cargo na gestão Macri, foi o responsável por contrair um empréstimo US$ 57 bilhões, em valores de 2018, junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI), aporte necessário após o fracasso das políticas de austeridade fiscal tomadas pelo governo. Acreditava-se (como sempre reza a cartilha neoliberal), que um ajuste nas contas públicas atrairia investimentos internacionais para o país, o que não aconteceu. A pobreza aumentou e um fardo enorme foi deixado para o governo seguinte, de Alberto Fernández, que tampouco soube lidar com a situação.

“Conclusão da mensagem de Caputo: Se você é de classe média, você vai ser pobre e se você é pobre, você vai ficar desamparado. Se você for rico, será muito mais rico”, resumiu o jornalista e economista Ezequiel Orlando em sua conta no Twitter.

MILEI ESTÁ A PÔR OS ARGENTINOS A PASSAR AINDA MAIS FOME E PENÚRIA*

Argentina desvaloriza peso em mais de 50%. Milei começa a cumprir promessa de "não há dinheiro"

Krystal Hur | CNN.pt 

Medida é o primeiro de vários passos para conter a hiperinflação, que levou o banco central argentino a aumentar a taxa de juro de referência para 133% em outubro

A Argentina vai desvalorizar o peso em mais de 50% como parte das medidas de emergência para ajudar a economia do país em dificuldades, anunciou o ministro da Economia, Luis Caputo, na terça-feira.

A medida altera a taxa de conversão do dólar de 365 pesos para 800 pesos por dólar e ocorre apenas alguns dias após o início do mandato do presidente Javier Milei.

Milei fez campanha com a promessa de se livrar dos pesos e substituí-los pelo dólar, de modo a colocar a economia no caminho certo. O peso tem sido artificialmente apoiado durante anos por controlos rigorosos de capitais e o seu valor caiu cerca de 52% este ano em relação ao dólar americano.

Nos últimos anos, o banco central da Argentina imprimiu mais pesos para ajudar o governo do país a evitar o incumprimento da dívida. O resultado foi a subida em flecha dos preços.

Vamos ao trabalho - os argentinos votaram em modo de masoquistas

Ramsés, Suíça | Cartoon Movement

O novo presidente argentino, Milei, prometeu “tratamento de choque” para a economia argentina, começando com cortes profundos nos gastos públicos.

sábado, 25 de novembro de 2023

A FALSA BARRELA À POLÍTICA

Carvalho da Silva* | Jornal de Notícias | opinião

Os resultados das eleições presidenciais na Argentina e parlamentares nos Países Baixos são duas vitórias da extrema-direita na sua perigosa cavalgada. A situação política, económica, social e cultural, bem como as localizações geográficas dos dois países, é distinta. E, enquanto nos Países Baixos o vencedor deitou mão do racismo puro e duro e da fobia ao imigrante como elementos centrais do discurso, na Argentina imperou a demagogia sem limites face a uma população muito empobrecida e descrente.

Contudo, as principais ideias inculcadas nas pessoas pelas forças vencedoras foram idênticas: i) a necessidade de “alterar o estado das coisas”; ii) a ideia de que é precisa “uma barrela política” para afastar os atores políticos que têm estado no exercício de funções (menos eles), restringindo o problema da corrupção ao campo da política; iii) a apresentação da extrema-direita como representante de um povo pretensamente puro, que afronta as elites políticas corrompidas e o povo impuro, cavando divisões e ódios.

No plano nacional e no quadro da preparação das eleições do próximo dia 10 de março, o Chega e, em parte, a direção da Iniciativa Liberal (IL) adotam aquelas argumentações e as mesmas formas de atuar. Os portugueses também acumulam fatores de descrédito perante programas políticos e políticas concretas que, em várias áreas, não resolvem os seus problemas. Isso torna-os permeáveis a tais narrativas.

Os sacripantas da nossa extrema-direita conduzem, há muito tempo, um processo de manipulação de informações e de factos políticos, de calúnias, de julgamentos de diverso tipo na praça pública, ou até no seio da Assembleia da República. Falam-nos dos “portugueses de bem” que pretensamente representam, repetem a necessidade de “limpeza” da política (o resto, mesmo que esteja sujo, não é preciso limpar) e sempre acharam, falsamente, que a democracia só nos trouxe atrasos. E, tal como noutros países onde políticos execráveis ascendem ao poder, tentam manobrar na judicialização da política.

O que se passa com o processo que levou ao pedido de demissão do primeiro-ministro é exemplar. O Chega, partido inimigo da Constituição da República, apresenta-se perante a sociedade como grande defensor do Ministério Público (MP). Agora também começou a “defender” o presidente da República. A importância do MP, do seu enquadramento constitucional, das suas funções e, desde logo, da sua independência, impõe aos próprios, mas também a todas as instituições e democratas uma reflexão autocrítica.

Infelizmente, há quem, de forma leviana, alimente a ação da extrema-direita. Carlos Moedas, ao protagonizar a evocação do 25 de novembro de 1975 como data de grande significado na democracia portuguesa, inclusive contra a opinião dos principais atores militares, políticos e civis envolvidos no processo, desencadeia divisões e ódios e, objetivamente, enfraquece o 25 de Abril. O que pretende? Fatiar as comemorações entre os que são a favor do 28 de setembro de 1974, os que preferem o 11 de março de 1975, ou os que optam pelo 25 de novembro?

O 25 de Abril foi único, foi o dia primeiro, “inteiro e limpo”, da esperança partilhada de mais justiça, igualdade e desenvolvimento que se expressou no dia 1. de Maio de 1974.

E as duas datas que confirmam o caminho da democracia são o dia das eleições para a Assembleia Constituinte e a entrada em vigor da Constituição da República.

Precisamos de exercício pleno da democracia, não de barrelas manipuladas pelos seus inimigos.

*Investigador e professor universitário

sexta-feira, 24 de novembro de 2023

Para entender (e enfrentar) o novo fascismo

Ele tornou-se ameaça persistente, indica vitória de Milei. Odeia o Estado, surfa na crise da democracia e se aproveita do frenesi sem memória das redes sociais – para apelar às ilusões mais passadistas… É preciso examiná-lo em profundidade

Glauco Faria* | Outras Palavras | # Publicado em português do Brasil

A vitória de Javier Milei na Argentina traz algumas pistas sobre como a extrema direita consegue se organizar, política e eleitoralmente, em países, contextos e situações distintas.

Primeiro, é necessário ver que a própria gramática da política mudou com a ascensão dos extremistas, assim como os instrumentos de análise. Se há poucos anos candidatos se esforçavam para dar entrevistas a jornalistas renomados e publicar artigos em jornais impressos mais relevantes, por exemplo, hoje eles dispensam intermediários e dão preferência às redes sociais. Sai a linguagem escrita, e muitas vezes a falada, e ganham relevância a imagem e o meme.

Também era comum que políticos tivessem sua oratória elogiada. Ainda hoje, a memória política de pessoas mais velhas está recheada de discursos antológicos feitos em comícios. Hoje, o palco dá voz a candidatos que são performers, personagens de si. Também por conta disso, o desastroso desempenho de Milei no debate realizado uma semana antes do segundo turno não afetou sua campanha.

Em um artigo publicado em 2022, o filósofo e professor da USP Vladimir Safatle apontava que “em um momento histórico, no qual informação e entretenimento se tornam indistinguíveis, no qual os padrões de comunicação da indústria cultural se tornam ‘naturais’, não há surpresa alguma em encontrar políticos que falam como esse ‘povo’ construído pela cultura de massa, com suas dicotomias, com sua concepção de história saída diretamente de seriados de televisão, com seus heroísmos de filme de ação”.

Nesse aspecto, descrever aspectos caricaturais ou mesmo a ignorância de figuras como Milei, Trump ou Bolsonaro apenas reforça a imagem que querem passar às pessoas. “Ou seja, em uma época na qual a indústria cultural forneceu em definitivo a gramática da política, fica mais fácil a extrema direita passar por aquela que fala a linguagem do povo”, disse ainda Safatle.

quarta-feira, 22 de novembro de 2023

Portugal | INTRIGAS DE ESTADO, BAIXEZAS E PARASITARISMO NACIONAL

Hora de avançar com o Curto do Expresso sobre intrigas e uma panóplia de diz que disse com odores de dejetos recebidos num penico repleto de sarro e... de merda. É assim que os mais valorosos acompanhados por muitos outros na política do bem-bom estão a fornecer a estabilidade para eles e seus apaniguados do costume e a desestabilizar os portugueses que comem todos os dias o pão que o diabo amassou. A instabilidade provocada pelos "mais sábios" e os "mais responsáveis" jorra de Belém, de S. Bento e mais além... É a vida. Esta porca de vida que uns quantos privilegiados nos reservaram escudados por uma pseudo democracia que rola no declive da penúria lusa e no abandalhamento irresponsável... Siga para o Curto e bom dia. A coisa fede. (PG)

Uma “intriga infame”

Vítor Matos, jornalista | Expresso (curto)

Bom dia!

Antes de mais, deixo-lhe o convite para a nossa conversa com os assinantes do Expresso hoje, às 14h00. Sobre "Que cenários para depois das eleições?" com Daniel Oliveira e David Dinis. Pode inscrever-se aqui.

O país ainda tem Governo, apesar de já não o ter, uma Assembleia da República dissolvente em plenas funções, à espera do decreto de dissolução, enquanto se assiste a uma guerra institucional entre um primeiro-ministro à beira do fim, em luta política com o Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa, que tanto fala, remeteu-se ao silêncio - não vai responder a um chefe do Governo “a caminho do matadouro”, como descreveu José Miguel Júdice - mas ontem uma voz autorizada emergiu de Belém para dar respaldo a Marcelo.

É evidente que o Presidente da República errou quando disse que António Costa tinha admitido “em público” ter sido ele a pedir-lhe para chamar a Procuradora-Geral da República a Belém no dia dos fatídicos acontecimentos que levaram à sua demissão. Tinha sido, porém, não em “público”, mas perante outras pessoas, um “público” restrito, no Conselho de Estado a coberto da confidencialidade. A verdade dos factos, no entanto, como o Expresso noticiou por esses dias, é que foi assim que as coisas se passaram. E ontem, numa entrevista à CNN Portugal, o conselheiro de Estado António Lobo Xavier disse que Costa “preferiu adensar um clima de intriga e de ambiguidade, infame contra o Presidente da República”, do que assumir a verdade quanto aos acontecimentos, que, aliás, nunca desmentiu.

Apesar de estar de saída não se sabe por quanto tempo, o primeiro-ministro permanece no combate e acicata o conflito - ontem celebrou os 50 anos do PS na Alemanha -, responsabilizando o Presidente pela dissolução, enquanto no PS os dois candidatos, Pedro Nuno Santos e José Luís Carneiro disputam a herança que mais convém a cada um.

Pedro Nuno Santos, que é o favorito à sucessão, clarificou ontem algumas ideias. Mesmo sem dizer se viabilizará um Governo minoritário do PSD, deixa nas entrelinhas de uma entrevista à CNN Portugal que não o fará, ao acusar o partido de Luís Montenegro de ser “radical”. Ainda assim, assumiu que o “diálogo à direita e ao centro é fundamental”, admitindo falar com o PSD para “assuntos de regime”, o que não é diferente do que António Costa foi fazendo. Uma posição mais alinhada com a ação de Costa do que a do seu adversário, José Luís Carneiro, que admitiu viabilizar um Governo minoritário do PSD, para o Chega não ter influência. Pedro Nuno tinha resposta: “O Chega não é um problema do PS (...)Se se quer derrotar o Chega só há um voto: é no PS."

quinta-feira, 24 de agosto de 2023

ARGENTINA: O QUE EXPLICA O VOTO POPULAR EM MILEI?

Vencedor das prévias, candidato repete a ladainha de que o Estado, a justiça social e a “classe política” são pesos nas costas do país. Mas por que milhões de argentinos pobres, que serão duramente atingidos por suas políticas, podem vir a elegê-lo?

Antonio Jose Alves Junior e Claudia Henschel de Lima* | Outras Palavras | # Publicado em português do Brasil

Os resultados das primárias, simultâneas e obrigatórias na Argentina, no dia 13 de agosto de 2023, revelam um claro predomínio do voto de direita e indicam a derrota do peronismo, possivelmente, já no primeiro turno, em outubro. O vencedor, Javier Milei, o “Bolsonaro argentino”, do partido La Liberdad Avanza, obteve mais de 30% dos votos, deixando para trás Patrícia Bullrich, da ala direita do partido de direita Juntos por el Cambio, com 17,0% das preferências, e o peronista e atual ministro da Economia, Sergio Massa, do Union por la Patria, com pouco mais de 21% dos votos. Reviravoltas podem acontecer, mas o resultado, que emerge da triagem das Primárias, sugere que a extrema-direita de Milei tem grandes chances ganhar ainda no primeiro turno se puder atrair os votos de Patricia Bullrich e demais candidatos derrotados da direita.

Esse resultado é parcialmente tributário do insucesso do governo de Alberto Fernandez em lidar com a crescente inflação, com a gravidade dos déficits de balança de pagamentos e com as privações materiais cada vez mais agudas que impactam diretamente a vida da população. Seu governo não demonstrou força política ou vontade para promover mudanças radicais, como, por exemplo, a instituição do controle do movimento de capitais para estabilizar o câmbio e conter a inflação. É nessa esteira da crise e impotência do governo que Milei, autointitulado liberal libertário, defensor radical do livre mercado e do amor livre (segundo declaração de 5/10/2017, ao programa do La Nación, Terapia de Noticias), avança a passos largos.

Longe de propor uma correção de rumos, sua campanha é recheada de “propostas radicais”, como o fim do Banco Central e a dolarização da economia argentina, o fechamento de vários ministérios, a instituição do sistema de vouchers para educação e saúde, a liberação da venda de órgãos, a revisão dos direitos humanos para bandidos, a revalorização das polícias e das forças armadas, bem como a retirada da Argentina do Mercosul. Será, como diz, uma virada de 180 graus, uma destruição do status quo do Estado argentino a partir de dentro, ou seja, como presidente eleito. Sua formulação condensa a visão política antissistema e essencialmente contra o Estado.

Milei vê no Estado argentino populista de esquerda (sic), decadente há mais de 100 anos, a origem do problema político e econômico central do país, i.e., o problema fiscal jamais resolvido, grande mal econômico, responsável pela estagnação. Em sua opinião, o erro de todos os programas de estabilização foi transferir o custo do Estado ineficiente e gastador para o setor privado. Por isso, sua proposta de destruição do status quo se materializa por meio de um programa de estabilização em que os custos são pagos pelo Estado, por meio de sua redução radical. A linha de ação será o cortes de gastos, com a extinção de ministérios (Obras Públicas; Trabalho, Emprego e Segurança Social; Educação; Ciência, Tecnologia e Inovação; Saúde; Cultura; Mulheres, Gênero e Diversidade; Ambiente e Desenvolvimento Sustentável) e as Privatizações.

domingo, 12 de março de 2023

Reino Unido | JUÍZES FASCISTAS – Craig Murray

A prisão de três ativistas climáticos do Reino Unido deve servir de alerta para qualquer um que espere que os juízes defendam as liberdades. O atual estabelecimento legal se adaptará a qualquer quadro legal que for ordenado pelos governantes.

Craig Murray* | Craig Murray.org.uk | Consortium News | # Traduzido em português do Brasil

Três ativistas climáticos em dois julgamentos separados foram  enviados para a prisão  pelo juiz Silas Reid usando os poderes totalmente arbitrários de desacato ao tribunal, porque insistiram em dizer ao júri que seus protestos foram motivados pela crise climática e pela “pobreza de combustível”. a incapacidade das pessoas de manter suas casas adequadamente aquecidas.

Os júris são uma salvaguarda essencial contra a injustiça por parte do Estado.

Que pessoas comuns, selecionadas aleatoriamente, decidam sobre culpa ou inocência tem sido fundamental para a lei criminal no Reino Unido por muitos séculos.

A máxima simplista é que o juiz determina a lei enquanto o júri determina os fatos. No entanto, muitas vezes é mais complexo do que isso. Existem várias áreas da lei (o ato de uso indevido de computadores é um exemplo) onde uma defesa de interesse público é permitida, e o júri pode se ver deliberando se uma divulgação foi de interesse público.

Talvez o exemplo mais famoso da minha vida tenha sido o julgamento de Clive Ponting sob a Lei de Segredos Oficiais. Clive era um membro desta comunidade de blog e um comentarista bastante regular aqui. (ver em baixo)

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