Os partidos de esquerda condenam
a autorização dada a um congresso realizado por um grupo supremacista no Fórum
Lisboa. E querem respostas por parte da presidente da Assembleia Municipal,
Rosário Farmhouse
Hugo Franco* | Expresso
O PS, o PCP e o BE exigem
respostas rápidas à presidente da Assembleia Municipal de Lisboa (AML), Rosário
Farmhouse, que autorizou a realização de um congresso de um grupo neonazi, a 2
de novembro, no Fórum Lisboa, a sede da AML.
Carla Madeira, líder da bancada
socialista na AML, diz ao Expresso que o partido vai apresentar em breve um
voto de protesto sobre o que aconteceu bem como formalizar um pedido de
explicações a Rosário Farmhouse numa das próximas terças-feiras, quando houver
debate entre os diferentes partidos que compõem a AML.
Os socialistas pretendem saber
"o que aconteceu a todos os níveis". E dizem que "não podem
permitir uma reunião de um grupo com valores opostos" aos dos partidos que
compõem a AML. "O que levou à autorização do aluguer do Fórum Lisboa?
É esse o principal ponto que queremos ter explicações".
Ao Expresso, Leonor Rosas,
deputada municipal do Bloco de Esquerda (BE) em Lisboa, pretende que a AML
"faça uma nota de repúdio sobre a concretização do congresso do
Reconquista e declare que no Fórum Lisboa não há espaço para organizações
neonazis, supremacistas, misóginas e anti-imigração". A deputada diz ainda
que é necessário que Rosário Farmhose "dê um esclarecimento cabal"
sobre o processo de autorização do evento e se "distancie de forma
firme" do grupo.
Leonor Rosas quer ainda que a AML
aproveite este caso para reforçar a verificação dos pedidos que chegam para a
cedência do Fórum Lisboa. "Devem pedir mais informações às organizações
que os contactam e sobre o conteúdo dos eventos que lá vão decorrer."
Num requerimento enviado pelo
grupo municipal do Bloco a Rosário Farmhouse, o partido diz não poder deixar de
questionar com "veemência" a "disponibilização deste espaço para
estes fins, albergando um congresso que propaga o discurso de ódio, com
todas as consequências políticas e sociais para tantas pessoas no seu dia
a dia".
O BE lembra que o Fórum Lisboa é
a sede da Assembleia Municipal de Lisboa, a Casa da Cidadania da cidade de
Lisboa: "E nesse sentido achamos importante esclarecer a responsabilidade
da decisão ao acolher esta iniciativa, e que tipo de critérios foram tidos em
conta, considerando o cariz abertamente nacionalista e supremacista da
organização chamada de Reconquista."
E exige que a presidência da
AML explique se "teve conhecimento, antes da autorização do evento, dos
princípios que regem a organização denominada Reconquista, em claro
conflito com pilares elementares da defesa do estado de direito e dos
direitos humanos, que dissemina discurso de ódio?". E "se
sim, quais os critérios utilizados para autorizar o acolhimento da iniciativa
desta organização?".
Ao Expresso, os comunistas de
Lisboa afirmam que "o ato realizado em edifício da Assembleia Municipal de
Lisboa, autorizado pela presidente deste órgão, reforça a necessidade de
confirmação das fontes oficiais que requerem a realização de eventos". E
salientam ainda que "o facto de alguém ter ludibriado intencionalmente, e
de forma dolosa, uma entidade pública, requer apuramento de responsabilidades
de quem o fez".
O PCP diz repudiar a realização
de eventos de grupos neonazis, "sejam eles na cidade de Lisboa ou em
qualquer parte do país, uma vez que tal significa uma afronta aos princípios
constitucionais de rejeição do racismo e xenofobia e de estruturas que
perfilhem a ideologia fascista".
CML garante que pedido por email
foi enganoso
Numa resposta escrita ao
Expresso, Rosário Farmhouse garantiu que os serviços municipais analisaram
uma proposta de aluguer daquele espaço que “foi apresentada por uma pessoa
singular — uma senhora cujo nome não suscitou qualquer alerta”. A referida
mulher escreveu, por e-mail, que pretendia a “disponibilidade do Fórum Lisboa
no dia 2 de novembro, sábado”, acrescentando que a “entidade” que procedia ao
aluguer era o “coletivo de jovens (partido Chega)” e que o evento era “uma
conferência sobre a relação entre modernidade e coletivismo e seus efeitos na
sociedade portuguesa”.
Segundo a presidente da AML, os
organizadores referiam ainda que a iniciativa teria o seguinte conteúdo:
“Conjunto de discursos sobre a atualidade, a imprensa e a sociedade e cultura
europeias. Discurso realizado por figuras de relevo do cenário nacional e
internacional.” Ou seja, uma informação suficientemente vaga e aparentemente
inócua.
Por esta razão, com base no teor
daquela apresentação, a AML decidiu autorizar a cedência do espaço, tendo
Farmhouse redigido um despacho, a 24 de outubro, a dar luz verde ao falso
“evento cultural”.
O Expresso perguntou à AML como
vão conseguir ter um controlo mais eficaz para evitar que situações
semelhantes se repitam no futuro. Sem responder diretamente às questões,
Rosário Farmhouse lembra que, segundo a lei, “a responsabilidade pelo que é
dito e feito nos eventos [no Fórum Lisboa] é dos seus promotores”.
Um pouco antes da publicação da
notícia do Expresso na edição impressa, a própria AML escreveu um comunicado
sobre o assunto com o mesmo conteúdo, revelando dezenas de partidos e
organizações culturais que organizaram eventos naquele espaço.
Uma fonte oficial do Chega
garantiu ao Expresso que a Juventude do partido não reservou o Fórum Lisboa.
“Se alguém o fez foi de uma forma abusiva.” Uma informação confirmada mais
tarde por André Ventura, líder daquele partido, que considerou mesmo
"criminoso" o pedido que terá sido feito em nome da Juventude do
Chega.
Nas últimas horas, nas redes
sociais, o movimento neonazi garante que se identificou devidamente no pedido
feito à AML. "Eles entenderam que tinha sido um erro aprovar a realização
do evento e, agora, para se legitimarem aos olhos do público, vêm utilizar a
justificação de que entenderam que nós estávamos diretamente associados, ou que
éramos parte do Chega”, afirmouo presidente do Reconquista, Afonso Gonçalves à
agência Lusa, acrescentando que nunca disseram que eram do Chega.
* Jornalista
Ler/Ver em Expresso sobre Nazis à solta
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