sexta-feira, 29 de junho de 2018

Simpósio comemorativo dos 10 anos da Pró-Inclusão


13 de julho de 2018  |  8h30/18h00
Lisboa | Fundação Calouste Gulbenkian | Auditório 2
Ação Certificada como Ação de Curta Duração

PROGRAMA

08h30 | Abertura do secretariado

09h00 | Sessão de abertura
Guilherme Oliveira Martins - Administrador da Fundação Calouste Gulbenkian
Maria Emília Brederode - Presidente do Conselho Nacional de Educação
David Rodrigues - Presidente da Pró-Inclusão


09h30 | Conferência I - Todos para a escola, a escola para todos
António Nóvoa - Embaixador de Portugal na UNESCO

10h00 | Mesa Redonda 1​ - Currículo e Inclusão
Maria do Céu Roldão - Universidade Católica Portuguesa
Comentador: José Morgado - ISPA-IU

11h15 | Pausa para café

11h45 | Mesa Redonda 2 - Organização da Escola para a Inclusão
Adelino Calado - Diretor do Agrupamento de Escolas de Carcavelos
​Filinto Lima - Presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas 
Comentadora: Isabel Alçada - Casa Civil da Presidência da República

​1
3h00 | Almoço livre

​14h30 | Conferência II - Inclusão como um Direito Humano
Laborinho Lúcio - Juiz Conselheiro

15h00 | Mesa Redonda 3 - Políticas para a Educação Inclusiva
João Costa​ - Secretário de Estado da Educação
Comentadores: Alexandre Quintanilha - Presidente da Comissão de Educação e Ciência e Deputadas do Grupo de Trabalho da Educação Especial

16h15 | Olhar para o Futuro - Outros atores
Voz dos alunos | Tânia Sofia Mahomed Escola Secundária de Odivelas

Voz dos pais | Jorge Manuel Ascenção - Presidente da CONFAP
​A Voz dos professores | José Jorge Teixeira Global Teacher Prize Portugal
Moderação: Sofia Barciela - Jornalista da TVI

17h15 | Sessão de encerramento

17h30 | Brinde e bolo comemorativo / Momento Cultural 

Inscrições em https://cfpinandee.weebly.com/simposioaniversarioprograma.html

LEMA: plataforma online auxilia crianças com autismo

Chama-se LEMA e é o primeiro site português nascido para ajudar na Matemática as crianças com perturbação do espectro do autismo (PEA). Criado por Isabel Santos durante o Doutoramento em Multimédia em Educação na Universidade de Aveiro (UA), o LEMA, para além do desenvolvimento do raciocínio matemático destas crianças, quer ainda auxiliá-las nas áreas da linguagem, da leitura, do planeamento ou da gestão de emoções. 

“Os resultados obtidos nas sessões de aferição com crianças e com professores e educadores da Educação Especial permitem assumir o LEMA [das iniciais em inglês de Learning Environment on Mathematics for Autistic children] como um importante instrumento de apoio à promoção do desenvolvimento do raciocínio matemático em crianças com PEA”, congratula-se Isabel Santos a autora da plataforma facilmente acessível a partir do link http://lema.cidma-ua.org

Para além da Matemática, “o LEMA é também um auxiliar aos desenvolvimentos da linguagem e leitura, do planeamento, da memorização, da gestão de emoções, da atenção e concentração e da interação entre pares”. Assim, aponta Isabel Santos, o ambiente digital “poderá constituir-se como um instrumento pedagógico relevante para a premissa de uma escola inclusiva, garantindo o acesso e equidade de crianças com PEA ao processo de ensino e de aprendizagem, preparando a sua transição para uma vida ativa em sociedade”. 

Destinado a crianças entre os 6 e os 12 anos diagnosticadas com PEA, o LEMA contém dois perfis de utilizadores – um para o educador e outro para a criança - e integra 32 classes de atividades de matemática, cada uma delas subdividida em cinco subclasses, de acordo com níveis de dificuldade. 

A plataforma permite não só a seleção personalizada de uma até dez classes e subclasses de atividades tendo em conta o perfil funcional do utilizador-aluno, como ainda a visualização do registo de desempenho de cada aluno na realização das atividades propostas por parte do utilizador-educador. 

Número de crianças com PEA em crescimento 

“O layout das atividades/desafios satisfaz os requisitos identificados por vários investigadores da área das tecnologias digitais para crianças com PEA, nomeadamente a presença de poucos itens no ecrã, a utilização de linguagem visual e textual simples e direta e a integração de informações em múltiplas representações, como texto, vídeo, áudio e imagem, fornecendo instruções e orientações claras”, explica Isabel Santos. 

O número de alunos diagnosticados com PEA tem aumentado nas últimas décadas em Portugal. O estudo mais recente realizado em Portugal pela Federação Portuguesa de Autismo, referente a 2011 e 2012, apontou uma prevalência de 15,3 crianças/jovens diagnosticadas com PEA em cada 10 mil. 

“Apesar das tecnologias digitais terem sido identificadas, pela comunidade científica, como um recurso de grande interesse para indivíduos com esta perturbação”, aponta Isabel Santos, “são escassas as pesquisas que exploram a sua efetiva utilização no sentido do desenvolvimento de capacidades matemáticas” de crianças com autismo. Por isso, o LEMA de Isabel Santos quer também chamar a atenção para a necessidade de se desenvolverem mais ambientes digitais promotores do desenvolvimento de capacidades em crianças com PEA. 

Preparado para ser utilizado pelos mais variados dispositivos tecnológicos (computador, tablet, smartphone, etc) e nos mais variados contextos (sala de aula, casa, gabinetes psicoeducativos, etc), o trabalho de Isabel Santos foi orientado pelas professoras Ana Breda, do Departamento de Matemática, e Ana Margarida Almeida, do Departamento de Comunicação e Arte. 

O LEMA foi desenvolvido pela Linha Temática Geometrix, do Centro de Investigação e Desenvolvimento em Matemática e Aplicações (CIDMA), emergindo de uma colaboração frutífera entre esta unidade de investigação e a Digital Media and Interaction (DigiMedia) da UA.

Fonte: Recebido por mail

quinta-feira, 28 de junho de 2018

Escolas artísticas que tenham alunos com necessidades especiais vão ser beneficiadas

O financiamento do Estado às escolas particulares do ensino artístico especializado vai passar a valorizar as que têm crianças e jovens com necessidades educativas especiais ou as que que têm alunos beneficiários da Ação Social Escolar (atribuída a agregados que têm um rendimento mensal igual ou inferior ao salário mínimo nacional).

Este será um dos critérios de análise e ponderação das candidaturas aos chamados contratos de patrocínio, que são destinados ao ensino artístico. A novidade consta do aviso de abertura do concurso para a celebração daqueles contratos, que foi publicado nesta quarta-feira no site da Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares. As candidaturas decorrem até 11 de julho.

O outro critério que é valorizado na selecção das candidaturas já tinha sido utilizado no último concurso, realizado em 2015, e diz respeito à estabilidade e à experiência do corpo docente.

Nos contratos de patrocínio o financiamento é calculado por aluno e não por turma, como sucede com os contratos de associação (que enquadram o financiamento do Estado a colégios privados não especializados). O número máximo de alunos a financiar nos cursos de música, dança, artes visuais e audiovisuais é de 25.749 o que, segundo o Ministério da Educação (ME), é semelhante ao número de alunos que foram abrangidos pelo contratos celebrados em 2015/2016 e cujo prazo de vigência terminou agora.

Mas em vez dos três anos de duração estipulados em 2015, os novos contratos serão celebrados por cinco anos lectivos, perdurando assim até 2022/2023 no caso dos que forem assinados para se iniciarem em Setembro próximo. O concurso aberto nesta quarta-feira também se destina a contratos com início em 2019/2020 e que terminarão em 2023/2024. Durante todo este período, o número máximo de alunos a financiar (25.749) não poderá sofrer alterações.

O custo por aluno, que varia entre 350 e 5400 euros por ano, mantêm-se igual ao que foi determinado em 2015, mas o montante total de financiamento disponível para o período de 2018/2019 a 2023/2024 sobe para 237 milhões de euros. Em 2015 tinham sido disponibilizados 177 milhões para um período de três anos lectivos, menor do que aquele que agora passará a estar a vigor.

Segundo o Ministério da Educação, a alteração ao modelo de financiamento agora posta em prática visa garantir que as verbas disponibilizadas acompanhem a duração de todo o ciclo do ensino do aluno. Deste modo, refere o ministério, sempre que se abrirem novos ciclos “vai ser possível olhar para a rede existente a partir do zero”, o que não sucede agora porque com contratos de três anos há muitos alunos que, no final destes, ainda não completaram o seu nível de ensino e a quem o Estado tem obrigação de continuar a financiar até que tal aconteça.

Pouca oferta pública

Estes terão de ser abrangidos pelos novos contratos plurianuais o que limita, diz o ME, a “entrada de novos operadores no sistema” e reduz também a “equidade geográfica” na distribuição das verbas, uma vez que esta operação tem de ter em conta os alunos que já estavam financiados.

Os contratos de patrocínio abrangem três níveis de ensino: iniciações (1.º ciclo), básico (2.º e 3.º ciclos) e secundário. Dos 25.749 alunos que poderão receber verbas do Estado, 20.736 estão no básico. A grande maioria daqueles contratos destina-se ao financiamento de cursos de música, num total de 23.743 alunos. Nos cursos de dança, artes visuais e audiovisuais este número desce para 2006.

À semelhança do que acontece com os contratos de associação, com os colégios a serem financiados para garantirem ensino gratuito aos alunos, também os de patrocínio se destinam a assegurar que os jovens não são prejudicados por não existir oferta pública na sua área de residência. O Ministério da Educação já reconheceu que, no caso do ensino artístico, esta “é altamente deficitária”. Existem nove escolas públicas de ensino artístico especializado, a que se juntará no próximo ano lectivo o novo Conservatório de Loulé, no Algarve. Já no ensino particular, e só no que diz respeito a escolas financiadas pelo Estado, existem mais de 130.

Fonte: Público por indicação de Livresco

terça-feira, 26 de junho de 2018

"Não se pode aprisionar as crianças em férias. É preciso libertá-las para que possam viver tudo"

“Não podemos aprisionar as crianças e os adolescentes em casa em tempo de férias”. O conselho é de Carlos Neto, professor na Faculdade de Motricidade Humana que há mais de 30 anos se dedica à área da educação física e motora e ao papel do jogo no desenvolvimento das crianças. Com mais um período de férias grandes à porta, o investigador acredita que tentar cultivar um pouco mais de autonomia e liberdade na relação com os mais novos será benéfico para eles mas também para os pais. O objetivo é que as férias sejam um momento de prazer e descoberta e não uma “batalha campal”, a realidade de muitas famílias, lamenta. As dicas são práticas: mais contacto com a natureza e deixá-los experimentar e até fazer coisas um pouco mais arriscadas do que o costume, seja trepar às árvores, andar de skate, correr na praia com um papagaio... ou porque não acampar todos juntos este ano? A saúde física e mental de todos agradece.

É há muito tempo uma pessoa preocupada com o espaço que as crianças não têm para brincar ao longo do ano e o impacto que isso tem no seu desenvolvimento motor e psicológico. Este tempo das férias grandes pode ser usado pelos pais para as estimular?

De facto os pais deveriam encontrar soluções para reinventar o tempo de férias para os filhos. Não pode continuar a acontecer as férias serem um tormento quer para os filhos quer para os pais, que é o que muitas vezes acontece. Muitas vezes os pais até têm quase medo que chegue este tempo - durante o ano as crianças passam muito tempo nas escolas, os pais no trabalho e passam muito pouco tempo juntos e depois, quando chegam as férias, é um verdadeiro drama. Há soluções como pôr as crianças em colónias de férias que de certa forma os liberta de estarem com os filhos, mas fazer só isso por sistema não é bom. 

E nem todas as famílias têm posses para isso.

Claro que isto dependerá sempre do nível sociocultural e há muitos tipos de famílias e de crianças, por isso as oportunidades serão sempre diferentes. O ponto de partida é que as crianças que agora terminam o ano escolar têm a expectativa que o tempo de férias seja agradável, prazeroso e que seja diferente do ano escolar. Sobretudo que consigam finalmente ter um tempo sem regras muito rígidas e usufruir da possibilidade de fazer coisas novas.

Tem a perceção de que hoje os miúdos chegam ao fim do ano letivo mais sedentos de férias?

Não tenho dúvidas disso. Há 30 ou 40 anos, e falo até da minha geração, temos boas memórias das férias mas o período escolar não tinha nada a ver: havia liberdade, andávamos na rua. Isto hoje não acontece, o que faz com que as crianças tenham uma expectativa maior de que o período de férias seja diferente, desafiante, misterioso. Mas também que traga um contacto mais afetivo e emocional com os pais, que haja uma vinculação afetiva emocional maior. E por isso era bom que os pais pudessem partir para férias com essa consciência e tentar corresponder a essas expectativas. 

Pais cada vez mais absorvidos pelo trabalho. 

Esse é o grande problema, a falta de harmonização entre o tempo passado no trabalho e em família. As férias devem ser uma oportunidade para tentar dar um pouco mais de qualidade a esta relação.

Mas há um desfasamento prático: as férias escolares duram dois meses e meio e o período normal de férias por ano de um trabalhador são 22 dias úteis.

Claro, pressupõe uma organização diferente das famílias e certamente que haverá muitas coisas em jogo até de natureza política mas, antes de irmos aí, penso que importa perceber também que é preciso respeitar a necessidade que as crianças têm de ter um tempo de intervalo da rotina para brincarem mais livremente. Diria que deve haver quatro ou cinco preocupações dos pais em tempo de férias: proporcionar situações de liberdade que sejam uma alternativa ao tempo organizado. O segundo conselho que daria aos pais é tentarem proporcionar tempos mais ativos, de relação com a natureza, e por outro lado que não seja algo muito previsível e estruturado. Os pais tentarem levar as crianças a sítios novos, conhecer o interior do país. Por exemplo acampar: o contacto com a natureza é essencial.

O campismo no passado era um clássico do verão de muitas famílias.

Sim, se calhar hoje nem tanto mas é uma forma de as crianças estarem fora do seu contexto habitual e da identidade do espaço onde vivem e basta isso para se libertarem. Também diria que há necessidade de haver atividades desafiantes e isto tanto pode ser ir a um parque aquático, uma ida à serra. Ser mais desafiante significa permitir às crianças correrem mais riscos.

Fala-se por vezes dos “pais-helicóptero”, que tentam controlar e gerir todas as experiências para que as crianças não tenham de enfrentar obstáculos. Um estudo publicado há dias concluía que este estilo de parentalidade acabava por ter um impacto negativo no rendimento escolar e nas relações sociais. É contrariar essa tendência?

Sim e isso de certa forma implica que os pais consigam reconhecer que os filhos podem ter mais autonomia do que aquela que eles pensam que têm.

Os pais tendem a menosprezar as capacidades dos filhos?

Penso que tendem a ter uma perceção diferente e o desafio está em perceber como é que as férias podem ajudar a desconstruir os medos que os pais têm em relação aos filhos. Estou a falar sobretudo nas idades mais baixas, dos 3 aos 5 e dos 5 aos oito.

Que medos são mais comuns?

Coisas tão simples como deixá-los nadar, subir às árvores, trepar.

Há pais com medo que os filhos subam às árvores?

É uma força de expressão mas é um bom exemplo daquilo que é necessário para as crianças melhorarem a sua literacia motora e as férias devem ser uma oportunidade para que isso aconteça, promovendo jogos e brincadeiras ativas. Isto pode acontecer dentro de casa mas devem poder ter uma atividade física mais intensa e ao ar livre e com a participação dos próprios pais, porque isso é importante. Neste sentido, os filhos deviam ajudar os pais a libertarem-se do peso que foi o ano de trabalho. A sociedade portuguesa anda a viver muito à pressa, há uma excitação no quotidiano que está a criar gravíssimos problemas de saúde mental e física nos adultos e nas crianças.

A neurologista Teresa Paiva, especialista em problemas de sono, já tem alertado, por exemplo, para a tendência de ter debates e programas televisivos muito acesos noite dentro, como se o dia não acabasse. É um sintoma dessa excitação?

Sim, é um bombardeamento completo e, no geral, temos uma organização do tempo cada vez mais stressante. E, portanto, o tempo de férias é uma oportunidade para proporcionar novas atividades aos mais novos mas também deve ser uma oportunidade para as pessoas aprenderem a viver mais devagar, a aproveitar o silêncio do corpo, fazerem mais reflexão e contemplação do que é a família. Este conceito de aprender a viver mais devagar é dar mais tempo para a interiorização de cada um e de consciência do que é a vinculação afetiva entre filhos e pais. 

É investigador no campo do desenvolvimento infantil, sobretudo motor. Recentemente os resultados nacionais das provas de aferição revelaram que as crianças de sete anos têm dificuldades em saltar à corda e dar cambalhotas. Quão preocupantes são estes indicadores?

São preocupantes mas não podemos dramatizar. Quer o saltar à corda quer a cambalhota [provas em que muitos alunos falharam] são duas habilidades motoras complexas que só atingem o seu nível maduro por volta dos oito/nove anos. Creio que não devemos ter uma visão sensacionalista sobre os resultados porque uma criança de sete anos não terá ainda as condições para ter um êxito absoluto nestas atividades, sobretudo quando se pede algo muito estandardizado como acontece nessas provas. Disto isto, os indicadores de fundo dados pelas provas de aferição é que podem ser considerados mais preocupantes: temos um sedentarismo implantado nas nossas crianças, principalmente nas primeiras idades. Digo-o há mais de 20 anos: temos tido um progressivo declínio do jogo e da atividade física.

Em Portugal em particular?

É um problema dos países mais desenvolvidos. E, ao mesmo tempo, o que vimos nas últimas décadas foi um aumento das desordens do foro mental: ansiedade, depressão, hiperatividade, défice de atenção e até da taxa de suicídio na passagem da adolescência para a idade adulta. Estas transições de ciclo de vida são sempre difíceis, mas a cultura do tudo dado e tudo pronto na hora para as crianças não favorece a sua capacidade de adaptação motora, cognitiva, social e emocional.

Acaba por ser um ciclo vicioso.

Sim. Temos uma superproteção patológica que não cria condições para que as crianças possam ter uma capacidade criativa e de adaptação, que leva os pais a protegerem-nas mais. E isso é o grande problema da sociedade atual em relação às culturas de infância. Só há uma solução: no período escolar e sobretudo nos períodos de férias, proporcionarem-lhes atividades para que essas competências motoras, sociais e emocionais possam ser valorizadas. É dar mais tempo de informalidade e imprevisibilidade e deixar que as crianças possam encontrar o seu caminho. Deixe-me usar este termo: é deixar as crianças fazerem coisas ‘malucas’, deixar os miúdos ter o skate, os patins, a bola, o papagaio, e deixá-los enriquecer o seu vocabulário motor e social à vontade.

Em Portugal há uma percentagem elevada de criança em risco de pobreza e exclusão social, mais de um quarto. Estão particularmente vulneráveis?

Sim, mas às vezes as crianças que vivem em meios empobrecidos têm mais oportunidades de brincar de forma livre do que as que vivem em meios socioeconómicas mais elevados mas estão sujeitos a uma superproteção inaceitável. E aos medos dos pais. Temos de desconstruir os medos dos pais, é algo absolutamente urgente na sociedade portuguesa, as famílias andam cheias de medos e isso leva a que as crianças não tenham autonomia, mobilidade e, por fim, participação.

Como é que os pais devem gerir as tecnologias nesta altura do ano? Mais liberdade também pode significar mais tempo para usar tablets e afins...

Penso que deve haver um decréscimo durante o tempo de férias de tudo o que sejam equipamentos digitais, telemóveis, tablets, televisão. Não diria impor: se dizemos que é um tempo de liberdade, não podemos impor, mas podemos negociar. Vamos negociar com os filhos reduzir o tempo dedicado a estes aparelhos, passar de ter o tempo todo ativo na ponta dos dedos para o tempo ativo nos pés.

Mas há algum limite adequado?

Diria que até aos cinco, seis anos não devem usar mas a partir dos sete já todos os miúdos têm telemóvel. A questão dos limites tem sobretudo a ver com o exemplo dos pais. 

Se passarem os tempos livres agarrados aos telemóveis, os miúdos vão copiar. 

Sim. É toda a gente perceber que as férias saudáveis incluem menos tempo só agarrado aos equipamentos digitais. Não quer dizer que não se usem: um GPS pode ajudar a criar um desafio na natureza.

Há professores que partilham que, por vezes, há pais que não querem que a escola feche num feriado ou numa ponte, insistem em ter onde deixar as crianças mesmo que até estejam de folga.

Sim, querem ter os filhos ocupados.

Imagina que, continuando assim, vamos chegar a uma altura em que se tornará incontornável reduzir a duração das férias grandes?

Penso que tudo vai depender da evolução da lei laboral. Hoje existe uma assimetria muito grande entre os países do norte da Europa e os do sul em relação à organização do tempo de trabalho e já seria tempo de Portugal alinhar pelas políticas públicas que dão valor à qualidade de tempo familiar, sobretudo às famílias que têm filhos. Não iria por mais tempo de férias, o que é preciso mudar é o tempo que os pais têm disponível para os filhos e isso passa sobretudo por uma flexibilização dos horários de trabalho, poder sair-se às 16h, 16h30. Nos países do norte da Europa os pais saem do trabalho para ir buscar os miúdos à escola com toda a naturalidade. Aqui agora até se está a pensar na escola a tempo inteiro para o 2.º ciclo, o que para mim é um escândalo. Ter crianças dos 10 aos 12 anos na escola todo o dia não faz sentido.

O que diz é que mesmo estando a trabalhar, se os pais saíssem mais cedo podiam dar outro acompanhamento aos filhos no período de férias.

Sim, mesmo que pudesse haver mais ou menos dias de férias, seriam um fardo menor. Tenho a sensação de que hoje em dia as crianças chegam ao fim de férias com uma certa frustração: não fizeram o que estava nas suas expectativas. E era bom que quando chegassem ao novo período escolar em setembro pudessem ir com a sensação de que viveram um período de férias de forma tão intensa que então vale a pena voltar à escola para aprender. Isso não acontece na maior parte dos casos. As férias devem ser uma oportunidade para os pais conhecerem melhor os seus filhos, aprender a controlar o medo, incentivando as brincadeiras mais arriscadas fora de casa, percursos de autonomia fora de casa, não têm de os acompanhar sempre, mas estar presentes. Não estou a dizer coisas extraordinárias, às vezes é simplesmente passear. Há crianças que nunca saíram de casa à noite com os pais para dar uma volta, descobrir a cidade, a aldeia, a vila. Deve ser um tempo também para os pais gostarem mais de serem pais.

Essas experiências de brincadeira e autonomia vão refletir-se mais tarde no desempenho escolar?

E não só. Hoje não há dúvidas sobre isto: quase todos os indivíduos que tiveram sucesso, foram felizes e empreendedores, tiveram infâncias felizes.

Há aquela ideia de que, por vezes, depois das férias até há mais separações: as pessoas não estão habituadas a tanto tempo juntos.

Não tenho dúvidas: há pais e crianças que vêm das férias completamente exaustos e temos de conseguir inverter isto. Mas isso tem a ver com os pais não estarem habituados por um lado mas também não conseguirem perceber que as férias podem ser tempo de liberdade, de autonomia, de descoberta.

E os primeiros excessos? Nas festas da aldeia, por exemplo, começa-se a beber muito cedo, aos 13, 14 anos

É uma outra realidade, mas hoje muitas dessas diferenças que existiam entre a infância no meio rural e no meio urbano estão esbatidas. Hoje os jovens fazem exatamente a mesma coisa e até há estudos que indicam que as crianças de meios rurais têm maior exposição à televisão do que nos meios urbanos. 

Os namoros de verão são outro clássico. É outro campo em que os pais não devem coartar demasiado a liberdade dos jovens?

Deve haver com certeza responsabilidade e regras, mas deve haver oportunidade para isso. Costuma-se dizer que a adolescência é a idade esquecida. Hoje temos políticas para a infância, até para os idosos mas não há nada para os adolescentes, que é uma fase central no desenvolvimento. Os adolescentes precisam de experimentar desafios que não são só físicos mas também de natureza emocional. Ninguém esquece os seus amores de verão e os pais também não os devem esquecer e é natural dar mais liberdade aos adolescentes nas ferias. Deve haver algum controlo mas nada de muito sofrido ou patológico: não se pode aprisionar as crianças e os adolescentes em férias, é preciso libertá-los para que possam viver tudo, inclusive o seu corpo.

Os mais cautelosos argumentarão que o mundo mudou nas últimas décadas, que está mais perigoso.

Sim, mas por vezes há uma perceção errada dessa mudança. Portugal é um dos países mais seguros do mundo. Basta ver o turismo que temos, a forma como o país é amado por quem chega cá. Muitas vezes há uma perceção errónea na cultura portuguesa e nas famílias no geral de que somos um país com problemas de segurança quando, pelo contrario, somos um dos países mais seguros.

Não há mais perversidade?

São os tais medos que se instalaram na cabeça dos pais e, seja como for, as crianças e os jovens têm de saber como reagir às situações.

Que conselhos práticos se pode dar às famílias que agora começam a estruturar as férias? Faz sentido planear as semanas para incluir diferentes atividades, fazer um programa do verão em família?

Acho que pode ser interessante, mas com uma condição: com a participação dos filhos. Deixar que os filhos sugiram as atividades que querem fazer, dar-lhes ouvidos. É uma excelente ideia. Era o que se devia fazer mais nas escolas e não se faz, porque os professores impõem quase tudo. Temos de passar de uma cultura de imposição para uma cultura de participação. Mas, essencialmente, é tentar fazer tudo para inverter os indicadores que mais nos preocupam: cada vez há mais obesidade, mais diabetes. Temos de dedicar mais tempo ao exercício físico, comer melhor, guardar tempo para o descanso.

Guarda boas memórias das suas férias grandes?

Sim, ainda hoje. Acabávamos a escola e havia um período em que os pais ainda estavam a trabalhar, por isso passávamos a maior parte tempo na rua.

Em Lisboa?

Cresci em Leiria, uma cidade maravilhosa, com castelo, rio, tudo o que precisávamos. Mal acabava a escola era uma libertação enorme. Depois vinha a altura de ir para a praia, conhecer novos amigos. Andávamos 15 dias a um mês na praia, com dias muito intensos. Nadávamos, jogávamos à bola. Jogar à bola na praia ou mesmo andar é um desafio fabuloso em termos de educação motora, é um desafio em termos de equilíbrio e adaptação e isto para as crianças pequenas é um estímulo muito bom. Isto além do iodo e do próprio contacto com a água do mar, que é revigorante e ao mesmo tempo uma forma de acalmar. Precisamos urgentemente de estratégias para que os corpos acalmem. Mas as minhas memórias são isto: a liberdade que tínhamos, a autonomia e alegria. A melhor recordação que tenho era não gostar que chegasse a noite porque sabíamos que íamos ter de ir dormir. E ter de ir dormir era improdutivo.

Mas adormecia num instante, não?

[Risos] Verdade, quanto mais cansados melhor é para adormecer. Mas a sensação de que ir dormir é uma chatice, uma perda de tempo, significa que tivemos um dia feliz. E é uma sensação que acho que hoje as crianças não têm. Às vezes veem-se famílias em férias que mais parece uma batalha campal. Torna-se cansativo porque já ninguém está adaptado a ninguém e ao mesmo tempo há cada vez mais uma cultura egocêntrica que faz com que os pais já não tenham o hábito de estar com os filhos a tempo pleno. Costuma-se dizer que cada um de nós tem uma criança dentro de si. Não iria tão longe, mas certamente cada um de nós tem memórias da sua infância. Era preciso retomá-las para descobrir a forma como devemos passar as férias com os filhos.

Fonte: I online por indicação de Livresco

domingo, 24 de junho de 2018

Ensinar a falar mesmo quem não têm doenças

Isabel Guimarães é terapeuta da fala e professora de futuros profissionais da área na Escola de Alcoitão. Destaca-se na área por apoiar profissionais que usam a voz no dia a dia, como jornalistas, atores ou controladores do tráfego aéreo. Confessa-se mais apaixonada por este trabalho do que a clínica, já que sempre se sentiu frustrada por não conseguir curar todas as pessoas e sublinha o vasto leque de ação de um terapeuta da fala

Terapia da fala é sinónimo de problemas ou doenças. Mas também é sinónimo de profissionais que querem ou precisam de ser mais claros no que dizem. E foi este segundo campo que fascinou Isabel Guimarães, professora coordenadora na Escola Superior de Saúde do Alcoitão (ESSASCML). Por isso, exerce também a função de consultora vocal num canal de televisão nacional (a SIC) e do seu currículo constam atividades como coach vocal da atriz Sandra Barata Belo ou formadora de controladores do tráfego aéreo.

Aliás, a doutorada em fonética experimental até passou por momentos em que duvidou da carreira que escolheu. "Comecei a trabalhar na área da deficiência, com crianças com Trissomia 21, e ficava muito frustrada porque queria pôr as pessoas boas. Tem a ver com o perfil. Mas depois fui trabalhar para um colégio com crianças sem problemas e aí já achei graça."

Esta primeira desilusão e posterior encontro com a sua vocação aconteceu já depois de ter chegado ao curso por acaso. "Não fazia a menor ideia que existia terapia da fala. E sou daqueles casos de miúdas que gostava de fazer tudo e não sabia o que queria. Era atleta de alta competição, era da música, fazia campos de férias com crianças, ou seja, tudo o que fosse novidade, eu fazia." Na hora de escolher um curso, o feliz contemplado foi o de veterinária, mas Isabel acabou por ficar à porta por umas décimas. Zangada, decidiu não continuar os estudos, mas o pai colocou-a a trabalhar "numa escola onde fazia os piores trabalhos, como ter de ficar à espera dos pais que se atrasavam". A má experiência de um ano letivo levou a terapeuta a voltar a considerar os estudos e foi aí que uma amiga lhe falou na terapia da fala na escola de Alcoitão. "Inscrevemo-nos. Eu entrei e ela não. Foi muito aborrecido", recorda.

Início indeciso dá carreira de sucesso

Isabel Guimarães até pode não ter sonhado com uma carreira como terapeuta da fala desde tenra idade, mas a área acabou por conquistá-la definitivamente e construiu uma carreira invejável. Entre a formação de futuros terapeutas até ao treino e aconselhamento que dá a vários profissionais que têm na voz o principal instrumento de trabalho.

O encantamento pela profissão começou justamente quando chegou à Escola Superior de Saúde de Alcoitão (que pertence à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa), e percebeu que a possibilidade de ensinar se juntava à de "todos os anos poder estar um tempo no hospital" como o Dona Estefânia ou a Faculdade de Medicina Dentária, por onde passou.

Não passaria muito tempo a ser convidada para dar formação a jornalistas - uma ligação que ainda hoje mantém -, e a outros profissionais como atores, cantores e controladores do tráfego aéreo. Sim, leu bem. Quando foi contactada para essa formação, a própria Isabel Guimarães achou estranho, mas a verdade é que a forma como falam é fundamental para quem comunica com os aviões via rádio. É uma questão de "prosódia", ou seja, "a sonoridade da forma como falamos". No caso do controlo do tráfego aéreo a missão do terapeuta da fala é evitar que hajam muitas variações nessa sonoridade. "Quando estamos a enviar mensagens via rádio para uma pessoa que não nos está a ver é preciso que não haja dificuldade de compreensão e uma das coisas que percebi é que a mínima variação pode causar problemas", explica.

No cinema a tarefa foi bastante diferente, mas igualmente desafiante. Ajudou Sandra Barata Belo a imitar a fadista Amália Rodrigues no filme homónimo. Era preciso que a atriz conseguisse fazer a voz falada (a cantada era playback) da fadista nas diferentes fases da sua vida, da juventude à velhice. O que obrigou Isabel a procurar registos de voz em que Amália dizia as palavras que estão no guião. "Como a maior parte dos registos são de Amália a cantar, foi muito difícil encontrar gravações em que ela fala", admite.

Mas o aconselhamento profissional que continua a fazer é com os jornalistas televisivos. Nesse caso, Isabel fica na redação, dá conselhos aos pivôs, mas também ajuda os repórteres a manter um tom de voz adequado à reportagem que vão emitir. Depois apoia também os professores que são alvo de um desgaste vocal muito grande com o passar dos anos e lhe batem à porta da clínica. Ou ajuda profissionais que precisam de fazer apresentações em público e com os quais tem de trabalhar "a voz, a comunicação e a presença".

Uma variedade de situações profissionais que mesmo assim são classificadas por Isabel Guimarães como "uma gota de água no oceano de um terapeuta da fala". Porque "um terapeuta trabalha em áreas tão diferentes como a da deglutição, até com bebés na neonatologia para amamentação ou idosos com Alzheimer".

Importância da voz e competitividade

O trabalho de Isabel foi-se afastando do que é feito com pessoas com doenças à medida que a própria sociedade se foi tornando mais competitiva. "As pessoas querem ser cada vez mais especialistas e, portanto, também querem dominar a ferramenta que têm de usar. Se tenho de usar a voz no meu trabalho quero saber como não ficar sem voz. Mas o momento de viragem tem a ver com o início das campanhas de prevenção, como as do Dia Mundial da Voz [que se assinala a 16 de abril], que já têm alguns anos."

Não querendo ficar sem voz, recebem de terapeutas como Isabel alguns conselhos. O que acontece normalmente é que quando começam a ficar com a voz cansada, "as pessoas pensam "tenho que me calar para que a minha voz não se gaste mais"". Ora, "o que está acontecer é que nós temos dois músculos que estão a funcionar e eles estão cansados". "É óbvio que o repouso ajuda, mas não significa que eles no dia a seguir já estejam a funcionar novamente bem."

Então para evitar este problema a solução é adotar a mesma estratégia de que quando se faz desporto, já que estamos a falar de músculos: "Primeiro fazer o aquecimento, depois faço o uso e no fim a descontração ou alongamentos."

Antes do momento em que se vai usar muito a voz - por exemplo no caminho para o trabalho -, deve então fazer-se sons agudos, para que as cordas vocais se aproximem uma da outra ou vibrar a língua, para que se faça uma massagem às cordas vocais, que assim "ficam ativas. É como o cafezinho da manhã". No final, o objetivo é evitar usar a voz, logo o conselho é engolir, ou fazer um bocejo para que as cordas descansem. Outra solução é fazer massagens na garganta.

Truques que Isabel ensina aos seus doentes, mas também aos seus alunos que mais tarde poderão aplicar aos seus doentes. E é este trabalho multifacetado que continua fascinar Isabel Guimarães, mais de 30 anos depois de ter começado a carreira.

Fonte: DN

sábado, 23 de junho de 2018

Esta Escola que não descola

A minha relação com a Escola é esquizofrénica. Julgo que quase me convenceu que eu era doente mental, e nunca percebi a razão para querer diagnosticar algo que era óbvio. Foi essa dicotomia que me confundiu. A bem da verdade, tem sido um belo combate de boxe. Não que eu perceba de boxe, não vos quero surpreender. Gosto das luvas, é só. E hei-de manter-me de pé. Até porque dentro do ringue estamos empatados no que se refere a knockouts. Recentemente, a Escola baixou a guarda e eu enfiei-lhe uma direita incrível mesmo no queixo, quase que caiu, balançou, balançou, mas agarrou-se a tempo às cordas. O combate continua.

A Escola tem sempre razão. Quem se atreve a dizer que a Escola não tem razão? Tem sempre! Afinal, é a Escola. E "ela", essa figura aristocrática tão próxima da altivez da estátua da liberdade — ou daquela bela lusa, de formas arredondadas, no fim da ponte 25 de Abril — é uma senhora imponente.

A lição, a primeira lição, é que a vida é um conjunto de eventos racionais. A Escola tentou ensinar-me a suprimir as emoções e a afastar-me da herança dos macacos, desses jagunços ancestrais que são como uma maldição, ou uma espécie de Amor de Perdição impregnado nos meus genes. A segunda lição foi que a vida é passível de ser vivida folheando um livro e seguindo todas as regras elementares, desde aquelas que estão escritas pelos doutos senhores das leis às outras — as convenções sociais —, que até no mais banal e aparentemente inocente comentário do vizinho constituem a cartilha do comportamento adequado em sociedade. A terceira lição é que a vida sem memória não existe e, espantai-vos, é talvez a lição mais inteligente. O problema é quando perante discursos ocos, sem conteúdo e desinteressantes a partir do quadro negro, eu adormecia acordado, e de repente do outro lado era despertado por uma espécie de zumbido — enquanto viajava com O Principezinho pelas estrelas e curtia um momento zen — ò Hélder, responda lá à pergunta, por favor! — e eu a acordar lentamente e a pensar — estou desgraçado que não ouvi um caraças, vamos lá ver como me safo desta! —, mas agarrava na espada, assumia a posição do D. Quixote e dizia convicto — desculpe, professora, pode repetir a pergunta? E vocês, boquiabertos, pensam — Brilhante! — como, a bem da verdade, só descobri esta estratégia quase na minha adolescência, até lá “levei nas trombas como gente grande”.

Depois, havia o tormento dos testes. Ficava impressionado, verdadeiramente impressionado. Há pessoal que decora tão avidamente e reproduz tão fielmente que é como colar selos com a língua (e há pessoal incrível a decorar páginas dos livros escolares). No meu caso, se for um bom poema curto ainda se dá, ou o nome de jogadores de futebol, ou curiosidades. Sim, sou muito bom com curiosidades. Sei de cor que Miguel Torga é o pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha, por exemplo.

Voltando ao que interessa. A minha estratégia nos testes era ler a pergunta com atenção e agarrado ao sentido, dissertava. Não há nada como ler com atenção e escrever umas linhas porreiras, criativas, bem adjectivadas. Claro que, a bem da verdade, era para divertir os professores. Imagino que estarem a corrigir testes com respostas idênticas, umas atrás das outras, deve ser muito, muito aborrecido, por isso, e como normalmente pela ordem alfabética eu aparecia lá pelo meio, os professores encontravam o meu teste, começavam a ler e percebiam que quem tinha respondido àquilo havia sido um marciano.

A minha professora da primária costumava usar uma expressão furiosa comigo — eu pergunto alhos, tu respondes bogalhos! —, nunca tive coragem para lhe responder. Apetecia-me dizer "Ò professora, não leve essas coisas tão a peito, fazem-lhe mal ao coração!", mas era capaz de em vez de levar um estalo ou duas reguadas a coisa ser a duplicar. No meio desta algazarra tive sorte, como a hiperactividade e o défice de atenção ainda não tinham chegado à aldeia, não “doparam” a minha alegria, e acreditem que ser criança é trabalhoso. Infelizmente é um trabalho muito pouco reconhecido e considerado. Mais tarde, já na secundária, o meu professor de Filosofia não deixou de qualificar a minha qualidade na escrita e o meu poder criativo. Deixou-me um recado num teste que dizia assim: “Muita parra, pouca uva.” Abandonei a escrita criativa para sempre, nem a posso ver.

A Escola esforçou-se, acreditem que se esforçou. E eu guardo bem vivos momentos incríveis; do recreio aos momentos atrás do pavilhão C, passando pelos grandes desafios nos campos de futebol de alcatrão, guardo tudo na memória. Portanto, nem tudo se perdeu. Entretanto, já na faculdade, apresentaram-me o Pierre Bourdieu, um francês catita e inteligente que escreveu uma curiosidade ainda antes de eu nascer, e é algo do género: toda a imposição cultural é uma violência simbólica e a imposição da cultura escolar não é excepção. Muito bem, não acham? E não foi o único, Basil Bernstein, Ivan Illich escreveram coisas idênticas, e Paulo Freire reforçou, todos usando as suas próprias palavras, como devem compreender senti-me mais aconchegado. Antes de eu nascer já andavam por aí a escrever estas coisas. Senti-me compreendido. Eu que já coleccionava um conjunto de nódoas negras e feridas abertas, juntei mais este ponto fraco da Escola para, se se proporcionar, arrear-lhe com a esquerda.

Por fim, deixo-vos um conselho. E vocês perguntam, o que pode um falhado deixar como um conselho? E têm razão. Por isso vou recorrer a outra pessoa para vos deixar um conselho e vai ser… deixem ver… Samuel Beckett… é mesmo isso. Um excerto da peça Worsward Ho, que diz assim: "(…) Ever tried. Ever failed. No matter. Try again. Fail again. Fail better. First the body. No. First the place."

Hélder Ferraz

Fonte: Público

Direitos das Crianças e dos Pais

Certamente estamos de acordo que as crianças têm direito a ser amadas e desejadas; têm direito à felicidade e ao afeto; têm direito ao seu integral desenvolvimento no plano educativo, social e cultural; têm direito à educação, à saúde, à proteção social, à habitação, à cultura e ao desporto, à alimentação de qualidade e ao vestuário, a condições de igualdade, ao respeito pela sua identidade própria, à segurança e à sua integridade física.

A Constituição da República Portuguesa dedicou um artigo à proteção da infância, o artigo 69.º que determina que “as crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições”.

Falar dos direitos das crianças é falar dos direitos dos pais e das famílias. Não é possível isolar as crianças das famílias.

O artigo 68.º da Constituição da República Portuguesa sobre Paternidade e Maternidade estabelece que “os pais e as mães têm direito à proteção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível acção em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país”.

O crescimento e o desenvolvimento harmonioso das crianças são inseparáveis da adoção de medidas que garantam condições aos pais para acompanhar os filhos.

Contudo na realidade, as opções políticas de sucessivos governos negam direitos às crianças e aos pais.

A manutenção de uma política de baixos salários, de discriminações salariais e de incentivo à precariedade, não permite assegurar condições de vida aos trabalhadores e às suas famílias. Cerca de 1/3 dos pobres são trabalhadores, cujo rendimento não lhes permite sair da situação de pobreza e o risco de pobreza aumenta nas famílias com crianças. A pobreza infantil combate-se com a resolução do problema de pobreza da família. A redistribuição da riqueza, a valorização e o aumento dos salários assumem uma enorme centralidade na melhoria das condições de vida e no combate à pobreza.

A desregulação dos horários de trabalho impede a articulação entre a vida profissional e a vida pessoal e familiar e tem consequências profundamente negativas – por um lado as crianças passam mais tempo em equipamentos para a infância, na escola ou em ATL’s e por outro lado o tempo de qualidade em família é bem menor. Não é aceitável querer-se impor aos trabalhadores horários de 12 horas por dia, trabalhar ao fim-de-semana, quando o avanço da ciência e tecnologia permite hoje reduzir o horário de trabalho, garantindo elevados níveis de produtividade.

A violação dos direitos de maternidade e paternidade, a falta de equipamentos públicos para a infância (empurrando as famílias para o privado com custos insuportáveis) e os elevados custos com despesas de educação, saúde, habitação, transportes são parte integrante das opções políticas que negam direitos aos pais e por sua vez às crianças.

O PCP tem vindo a intervir de forma consolidada para defender os direitos das crianças e dos pais. Nesta legislatura apresentámos propostas para a eliminação dos mecanismos de desregulação do horário de trabalho, a introdução do horário de trabalho semanal de 35 horas para todos, o combate à precariedade e que a cada posto de trabalho permanente corresponda um contrato de trabalho efetivo, o reforço dos direitos de maternidade e paternidade, a criação de um programa extraordinário de combate à pobreza infantil (recomendação aprovada na Assembleia da República e ainda não concretizada pelo Governo), a criação da rede pública de creches, o alargamento da rede pública de educação pré-escolar, a criação da comissão nacional de direitos de crianças e jovens, o reforço dos meios das comissões de proteção de crianças e jovens, o reforço da proteção das grávidas, puérperas e lactantes e de trabalhadores no gozo da licença parental e no passado dia 1 de junho, Dia Mundial da Criança, apresentámos iniciativas legislativas para o alargamento do abono de família com vista à sua universalização, o reforço dos direitos dos pais no acompanhamento dos filhos em situação de doença ou acidente, o reforço da saúde infantil ao nível dos cuidados de saúde primários e a avaliação das condições para a introdução da sesta na educação pré-escolar.

Pela intervenção do PCP foi possível nesta fase repor os salários, assegurar a gratuidade dos manuais escolares até ao 2.º ciclo do ensino básico, a implementação do horário de trabalho de 35 horas e brevemente serão abrangidos todos os trabalhadores que desempenham funções na Administração Pública, iniciar um programa de regularização de vínculos precários ainda que com inúmeras insuficiências e atrasos, o aumento das prestações sociais e dos beneficiários por via do aumento do indexante dos apoios sociais, a reintrodução do 4.º escalão do abono de família, e o alargamento da rede de educação pré-escolar.

Houve avanços, mas estão muito aquém das necessidades devido às limitações do PS e das convergências de PS com PSD e CDS que inviabilizaram novos avanços como a implementação do horário de trabalho de 35 horas para todos os trabalhadores ou o fim dos mecanismos que conduzem à desregulação dos horários de trabalho.

É preciso ir mais longe, nomeadamente no aumento geral dos salários, no aumento do salário mínimo nacional para 650 euros, no reforço da rede pública de equipamentos para a infância, na gratuitidade dos manuais escolares para todo o ensino obrigatório, na atribuição de médico e enfermeiros de família para todas as crianças, na garantia do emprego com direitos.

Proteger os direitos das crianças e pais exige a rutura com a política de direita e a adoção de uma política patriótica e de esquerda.

É preciso garantir autonomia económica e social às famílias.

As famílias e as crianças precisam de tempo para viver.

As crianças precisam de tempo para serem crianças, para brincar, para dormir, para conviver com a família, para crescerem num meio que lhes assegure o integral desenvolvimento.

Paula Santos

Fonte. Expresso por indicação de Livresco

sexta-feira, 22 de junho de 2018

O que vale a Educação?

Num tempo em que se vive nas escolas o final do ano letivo e se inicia a época de exames, momentos decisivos para muitos alunos (este ano marcados pela contestação dos sindicatos dos professores com greves às avaliações), julgo que vale a pena pensar sobre o lugar da Educação na nossa sociedade. Trata-se de uma breve reflexão sobre um tema que, na minha perspetiva, é, muitas vezes, encarado de forma paradoxal na medida que é valorizado no discurso como um fator decisivo para o desenvolvimento do país, mas é igualmente objeto de uma menor atenção se comparado com outros temas em termos de investimento e da centralidade que assume no espaço público.

É certo que a Educação constitui um esforço de todos (políticos, professores, pais, alunos, investigadores, etc.) pela sua importância decisiva na transformação da sociedade e no desenvolvimento das gerações futuras, mas importa perguntar qual é o verdadeiro valor da Educação? Até que ponto se lhe atribui, na prática, o lugar de destaque que merece (sobretudo se a compararmos com outros temas)? Atentemos, por exemplo, no modo como ela é encarada no espaço mediático onde se assiste, diariamente, a temas recorrentes e discutidos à exaustão, em horas e horas de debates na televisão e páginas e páginas nos jornais (já para não falar das redes sociais). Por outro lado, para além dos assuntos laborais, que são, sem dúvida importantes, que outros aspetos são discutidos no espaço mediático? Que lugar ocupa o trabalho das escolas, dos professores e dos alunos? De que modo se valoriza (ou não) a Educação como fator crucial para o desenvolvimento da sociedade e para a formação de cidadãos ativos? O que se conhece (ou não) sobre o que se tem vindo a fazer na investigação educacional e até que ponto ela é objeto de interesse e discussão? Qual é o lugar da investigação em educação e de que modo ela informa políticas e práticas?

Neste âmbito há uma constatação óbvia a fazer que se verifica em muitos países e também no nosso. É difícil resistir à tentação da mudança no campo da educação; sempre que há um novo governo há uma nova mudança, muitas vezes sem ter existido uma avaliação aprofundada e consequente das políticas desenvolvidas neste setor. A mudança é necessária, mas ela implica tempo, é um processo (e não um acontecimento) e requer o envolvimento dos agentes educativos, nomeadamente dos professores e dos alunos. Quais são os efeitos reais das medidas políticas na vida das escolas e dos professores e fundamentalmente nas aprendizagens e resultados escolares dos alunos?

A estabilidade e avaliação das políticas educativas e curriculares constitui um dos aspetos centrais na análise do sucesso dos sistemas educativos, assim como a valorização dos recursos humanos e as condições de realização do ensino e da aprendizagem nas escolas e nas salas de aula. Num estudo que realizámos, os professores admitiram que aumentou a burocracia (95,4%), que se acentuaram as críticas em relação ao seu trabalho (92,2%) e que aumentaram o controlo sobre o seu trabalho (75,6%) e a exigência de prestação pública de contas (74,6%). Além disso, uma larga maioria de professores refere que a informação veiculada pela comunicação social tem diminuído o prestígio da profissão (90,0%). O mesmo estudo aponta para vários temas que emergiram da análise do trabalho das escolas e dos professores: i) a intensificação e a burocratização do trabalho docente – relacionadas com o forte aumento do volume de trabalho, a diversificação de funções e de tarefas, a pressão dos prazos, a ocupação do tempo e o dispêndio de energia em tarefas burocráticas, que os professores consideram inúteis e ineficazes, desviando a atenção do que constitui a essência da sua profissão: ensinar. Esta asfixia burocrática que reina nas escolas acaba por retirar tempo e espaço aos professores para se dedicarem a tarefas didáticas e pedagógicas e diminuir a capacidade de reflexão em relação ao seu trabalho; ii) a precariedade laboral e o empobrecimento dos professores – associados à instabilidade profissional, à fragilidade dos vínculos contratuais, à ausência de perspetivas de progressão na carreira, entre outros fatores de natureza laboral; iii) a degradação da condição docente e da imagem social dos professores – assente, muitas vezes, em “narrativas” redutoras e simplistas sobre as escolas e os professores disseminadas no espaço mediático; iv) a tensão entre o desânimo e a resignação e a energia e a resiliência dos professores que decorre, por um lado, da intensificação do seu trabalho, da desconfiança e questionamento da imagem social dos professores, de perda de estatuto social e económico, da profusão legislativa e da avalanche de tarefas e responsabilidades com que são obrigados a lidar diariamente e, por outro, dos seus valores profissionais e do trabalho diário com os alunos.

Num outro estudo mais recente, quando se perguntou aos professores “se pudessem, abandonariam o ensino?”, 41,0% responderam não, mas 27,0% admitiram que sim e 32,0% optaram pelo talvez. As razões são várias e já conhecidas (que outras investigações também revelaram) mas são recorrentes as referências ao cansaço, à desmotivação, à tristeza, à desilusão e ao desgaste. São notas preocupantes que se prendem com a condição docente e com os fatores a que anteriormente aludimos: a burocracia asfixiante que condiciona o trabalho das escolas e dos professores, o “tsunami” legislativo que invade as escolas, a falta de reconhecimento do seu trabalho, a ineficácia das mudanças políticas na prática, mas também aspetos ligados à cultura e às lideranças escolares. Os professores que se dizem motivados e enérgicos referem-se sobretudo ao seu trabalho com os alunos na sala de aula e à essência da sua profissão e, nalguns casos, ao bom ambiente e às relações profissionais positivas com os colegas. A sala de aula emerge como espaço de autonomia e realização profissional por excelência, apesar de todos os constrangimentos e dificuldades, pois, para muitos professores, é aí que podem exercer o seu profissionalismo e envolver-se na criação de um clima positivo capaz de contribuir para o desenvolvimento de aprendizagens de qualidade com os alunos e de fomentar relações afetivas construtivas.

Num ano em que se comemora o 50º aniversário de uma obra que marcou, de forma indelével, os estudos educacionais, intitulada “A vida nas aulas” (Life in Classrooms), do norte-americano Philip W. Jackson, vale a pena recentrar e valorizar o trabalho diário dos professores. Jackson decidiu entrar na sala de aula e estudá-la a partir de uma nova perspetiva e para além do óbvio. Entre outros aspetos, na sua obra, publicada em 1968, destacam-se as ideias de “currículo oculto”, “afã quotidiano do ensino”, “as consequências não intencionais”, “os processos mentais” e “as conceções implícitas” dos professores chamando a atenção para a complexidade, multidimensionalidade e simultaneidade do ensino e para a necessidade de encontrar “o extraordinário no ordinário”. Ele acreditava que “as crianças têm a capacidade de ver o extraordinário no ordinário” e que as salas de aula eram “lugares especiais”. Jacskon também notou que os alunos gastavam parte do seu tempo à espera que algo acontecesse: à espera que o professor lhes desse os materiais, à espera que os alunos que necessitavam de mais tempo para responder às questões o fizessem; à espera que a campainha tocasse, etc. E hoje? Hoje, na era digital, os desafios são outros e as dificuldades são diversas, mas também existem outras possibilidades. Talvez os alunos ainda continuem à espera que algo aconteça…

Há, sem dúvida, aspetos que melhoraram, de forma significativa, na Educação em Portugal nas últimas décadas, mas há ainda temas que merecem atenção, que não são consensuais mas que são importantes, e eu até diria urgentes. Para além das condições de realização do ensino e da aprendizagem nas escolas e nas salas de aula, onde é necessária “mais pedagogia e menos burocracia” (como referem reiteradamente os professores nos estudos referidos anteriormente), é fundamental questionar e repensar modos de recrutamento e seleção de professores, mas também refletir sobre a sua formação, inicial e contínua, e já agora sobre a sua avaliação, de modo consistente, participado e consequente. É essencial investir na Educação de modo a que ela assuma a centralidade que lhe é atribuída no discurso, o que passa, entre outras vertentes, por uma maior atenção e visibilidade no espaço público.

Assunção Flores

Professora na Universidade do Minho, Investigadora no Centro de Investigação em Estudos da Criança (CIEC) e presidente da International Study Association on Teachers and Teaching (ISATT)

Fonte: Observador

quinta-feira, 21 de junho de 2018

A redução de turma e o ensino secundário: a negação da inclusão

A recente publicação do Despacho Normativo n.º 10-A/2018, que estabelece o regime de constituição de grupos e turmas e o período de funcionamento dos estabelecimentos de educação e ensino no âmbito da escolaridade obrigatória, não deixa de surpreender.

Relativamente à redução de alunos por turma, constata-se que, desde a educação pré-escolar até ao final do ensino básico, o diploma determina a possibilidade das turmas serem constituídas por 20 alunos, sempre que no relatório técnico-pedagógico seja identificada como medida de acesso à aprendizagem e à inclusão a necessidade de integração do aluno em turma reduzida, não podendo esta incluir mais de dois nestas condições. A aplicação desta medida fica, no entanto, dependente do acompanhamento e da permanência destes alunos na turma em pelo menos 60 % do tempo curricular.

Chegados ao ensino secundário, deparamo-nos, surpreendentemente, com dois cenários diferentes e antagónicos quanto ao princípio da equidade e da inclusão. 

Nos cursos científico-humanísticos e nos cursos do ensino artístico especializado, nas áreas das artes visuais e dos audiovisuais, o número mínimo para abertura de uma turma é de 26 alunos e o de uma disciplina de opção é de 20 alunos, sendo o número máximo de 30 alunos, sem prever a possibilidade de redução de turma, mesmo que o relatório técnico-pedagógico assim o determine como medida de acesso à aprendizagem e à inclusão.

No entanto, se os alunos enveredarem por um curso profissional, as turmas podem ser constituídas por 20 alunos, sempre que no relatório técnico-pedagógico seja identificada como medida de acesso à aprendizagem e à inclusão a necessidade de integração do aluno em turma reduzida, não podendo esta incluir mais de dois nestas condições.

Desta análise, resulta claramente uma discriminação dos alunos cujo relatório técnico-pedagógico identifique a necessidade da sua integração em turma reduzida ao transitarem para o ensino secundário. Estes alunos, para poderem beneficiar desta condição essencial no acesso à aprendizagem e à inclusão, têm apenas como opção o prosseguimento de estudos em cursos profissionais. 

Afinal, porque é que um aluno faz todo o seu percurso no ensino básico numa turma reduzida, como medida de acesso à aprendizagem e à inclusão, e não pode prosseguir com a mesma medida no ensino secundário regular? O ensino secundário regular não deve, também, promover o acesso à aprendizagem e à inclusão?

Portugal passou a ter uma Estratégia de Saúde para as Demências

O país tem desde hoje em vigor uma Estratégia de Saúde na Área das Demências, sendo a primeira vez que estas doenças do foro cognitivo são objeto de um compromisso público. Passa também a haver uma Coordenação do Plano Nacional da Saúde para as Demências, com a missão de acompanhar a elaboração dos Planos Regionais para as Demências, da responsabilidade das respetivas Administrações Regionais de Saúde.

O diploma que entra hoje em vigor e publicado em Diário da República esta terça-feira – mas que não foi entretanto objeto de divulgação por parte do Ministério da Saúde - lembra que de acordo com algumas estimativas existem em Portugal cerca de 150 000 pessoas com demência, distúrbios que incluem doenças como Alzheimer. Os planos regionais para fazer face a esta realidade devem estar concluídos no prazo de um ano.

Quanto à estratégia propriamente dita, o governo optou por reproduzir na íntegra um documento produzido por um grupo de trabalho criado em 2016 para definir as bases das políticas públicas nesta área.

Os peritos identificam como pontos estratégicos prioritários fazer o levantamento dos recursos de saúde e comunitários em cada área, incluindo as instituições públicas, do setor social e solidário, privadas e académicas e definir os responsáveis, procedimentos, normas de acesso e articulação para os doentes.

Consideram também fundamental conhecer as necessidades biopsicossociais e as preferências das pessoas com demência e dos seus cuidadores.

A consciencialização pública e a formação de profissionais de saúde são outros desafios.

É ainda proposto clarificar o percurso de cuidados das pessoas com demência, começando pela identificação precoce dos casos – um recente relatório da OCDE alertavam que metade dos casos a nível global estará por diagnosticar.

Em comunicado, a Associação Alzheimer Portugal congratulou-se esta tarde pela aprovação da Estratégia da Saúde na Área das Demências por parte do Ministério da Saúde e fala de uma vitória.

Ainda assim, José Carreira, presidente desta associação, avisa que faltam medidas concretas. “Ainda falta a articulação desta estratégia com o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, de modo a que se criem os apoios necessários à melhoria das condições de vida das pessoas com demência, bem como dos seus cuidadores”.

Fonte: Sol por indicação de Livresco

quarta-feira, 20 de junho de 2018

Regime de constituição de grupos e turmas

O Despacho Normativo n.º 10-A/2018, de 29 de junho, estabelece o regime de constituição de grupos e turmas e o período de funcionamento dos estabelecimentos de educação e ensino no âmbito da escolaridade obrigatória.

Do preâmbulo, destaca-se:

"Entre os preditores de sucesso escolar encontram-se as dinâmicas pedagógicas potenciadas não apenas ao nível individual, mas também ao nível da organização da turma em que cada aluno se insere. Entre estas dinâmicas, a diferenciação pedagógica em sala de aula é absolutamente fundamental para que seja possível mais inclusão. Para que a diferenciação seja possível, os grupos constituídos devem ter uma dimensão que a favoreça."

"Aos alunos com necessidades específicas que estejam em efetiva permanência na turma, em dinâmicas de verdadeira inclusão, continua a ser garantido o acesso a turmas com 20 alunos, permitindo uma mais capaz organização para atender, de forma mais intensa, às suas necessidades."


Calendário escolar 2018/2019

O Despacho n.º 6020-A/2018, de 29 de junho, determina a aprovação dos calendários, para o ano letivo de 2018-2019, dos estabelecimentos públicos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, dos estabelecimentos particulares de ensino especial, bem como o calendário de provas e exames dos ensinos básico e secundário.

terça-feira, 19 de junho de 2018

Autorização de realização da despesa destinada ao apoio financeiro do Estado a Centros de Recursos de Apoio à Inclusão

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 83/2018, de 19 de junho, autoriza a realização da despesa destinada ao apoio financeiro do Estado a Centros de Recursos de Apoio à Inclusão que celebrem contratos de cooperação para o ano letivo de 2018-2019.


Assim, o Conselho de Ministros resolve:

1 - Autorizar a realização da despesa relativa aos apoios financeiros aos Centros de Recursos para a Inclusão, decorrentes da celebração de contratos de cooperação para o ano letivo de 2018/2019, até ao montante global de (euro) 10 490 000,00.

2 - Determinar que os encargos resultantes do disposto no número anterior não podem exceder, em cada ano económico, os seguintes montantes:
a) 2018: (euro) 3 496 260,00;
b) 2019: (euro) 6 993 740,00.

3 - Determinar que os encargos financeiros resultantes dos apoios são satisfeitos pelas verbas adequadas inscritas e a inscrever no orçamento da Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares.

4 - Estabelecer que o montante fixado na alínea b) do n.º 2 para o ano económico de 2019 pode ser acrescido do saldo apurado no ano económico de 2018.

Autorização de realização da despesa destinada ao apoio financeiro às associações de ensino especial

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 81/2018, de 19 de junho, autoriza a realização da despesa destinada ao apoio financeiro do Estado a cooperativas e associações de ensino especial e as instituições particulares de solidariedade social que celebrem contratos de cooperação para o ano letivo de 2018-2019.

Assim, o Conselho de Ministros resolve:

1 - Autorizar a realização da despesa relativa aos apoios decorrentes da celebração de contratos de cooperação para o ano letivo de 2018-2019, até ao montante global de (euro) 4 950 000,00.

2 - Determinar que os encargos resultantes do disposto no número anterior não podem exceder, em cada ano económico, os seguintes montantes:

a) 2018: (euro) 1 623 000,00;

b) 2019: (euro) 3 327 000,00.

segunda-feira, 18 de junho de 2018

Marcelo promulga com reparos diploma dos currículos

O Presidente da República promulgou hoje o currículo dos ensinos básico e secundário, apontando, contudo, que "não é bom sinal" a sucessão de reformas, realizadas "sem avaliações prévias" e "vagas quanto aos recursos necessários" à sua execução.

"Não é bom sinal que cada Governo traga consigo uma reforma curricular - e esta já é a sétima - como não é que essas reformas surjam sem avaliações prévias dos regimes alterados e sejam vagas quanto aos recursos necessários para a sua execução, como sublinha o parecer negativo do Conselho das Escolas", lê-se numa nota publicada no sítio da Internet da Presidência da República.

Marcelo Rebelo de Sousa decidiu, contudo, promulgar o decreto "atendendo ao contexto internacional, à coerência com o Programa do Governo, a muitos dos princípios consignados - como os da autonomia e da flexibilidade, da valorização do papel dos alunos e da atenção, que se espera transversal, à Cidadania e ao Desenvolvimento - e ao parecer favorável do Conselho Nacional de Educação".

Em causa está o decreto-lei que estabelece o currículo dos ensinos básico e secundário e os princípios orientadores da avaliação das aprendizagens, aprovado em Conselho de Ministros a 24 de maio.

O diploma reinstitui que a nota de Educação Física conta para a média de acesso ao ensino superior e elimina os requisitos considerados discriminatórios para os alunos do ensino profissional acederem ao superior.

O diploma confere "autonomia curricular às escolas" e reforça a "flexibilidade dos currículos", de acordo com o comunicado emitido no final da reunião do Conselho de Ministros, no qual se destaca a componente de Cidadania e Desenvolvimento e ajustamentos ao regime de avaliação.

Em comunicado, o Ministério da Educação adianta que a flexibilização curricular, actualmente em projecto-piloto que abrange cerca de 200 escolas, será alargada no próximo ano lectivo a todas que o pretendam.

O mesmo comunicado adianta que o decreto-lei do ensino básico e secundário operacionaliza o Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória como a referência para os objectivos a atingir ao fim de 12 anos de escolarização e confirma o fim do ensino vocacional como opção logo no ensino básico, tal como havia sido permitido no mandato do ex-ministro Nuno Crato.

Refere ainda que para os alunos do secundário a flexibilidade vai permitir a alunos de diferentes cursos e vias de ensino "a possibilidade de permutar disciplinas, construindo percursos mais adequados aos seus interesses".

"O decreto-lei prevê a sua própria avaliação ao final de seis anos, conferindo estabilidade e garantia de avaliação da sua eficácia", conclui o documento.

Fonte: Sábado por indicação de Livresco