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2024/03/12

Uma outra leitura urgente das eleições de 10 de Março


Ontem, num dos directos das intervenções finais dos líderes partidários, o cavalheiro, que aqui não vou nomear, que parece ter-se atribuído o  papel de capo do “bom povo português” afirmou, com pose estudada e perante o aplauso dos seus pares, que o seu partido reduziu “a extrema esquerda à sua insignificância.” Mas acrescentou, logo a seguir, que conquistou “eleitorado de direita e do centro-direita no centro e no norte do país.” Para ele, a eleição de domingo foi “um ajuste de contas com um país silencioso (…), de muitos que viram a esquerda dominar todas as nossas instituições, sem que houvesse qualquer pensamento crítico ou contraditório.” Disse ainda que “este país cujas instituições foram sequestradas, começará agora a ser libertado, pouco a pouco, em todas as instituições (sic)” E, rematou, “começaremos já amanhã a libertar Portugal da esquerda e da extrema esquerda.” 

É preciso ver estas afirmações pelo significado que, efectivamente, têm. Não se trata de conversa fiada. O tom e a pose revelam, sem margem para dúvida, ao que vem.

Não é preciso ser particularmente inteligente para perceber o alcance de tudo isto, o quanto esta conversa cai fora do funcionamento legal dos princípios da República, quem está ameaçado por este posicionamento terrorista e quais as consequências que, a qualquer momento, este palavreado pode ter para a nossa Democracia e para a vida das nossas comunidades. O fundo sonoro da bota cardada ouve-se distintamente. As afirmações do führer de Algueirão, feitas assim, às escâncaras, perante a escandalosa passividade de todos os partidos e instituições democráticas, não podem ficar impunes. E que triste exemplo de modelo nos estamos a permitir a dar à juventude, quando deixamos que uma figura deste calibre se dê ao luxo de se exibir desta forma!

Só há um responsável por termos batido tão baixo na nossa Democracia. Está na foto oficial. Só há um responsável pela total perda de controlo sobre todo este processo. Só há um responsável por termos visto um governo, legitimamente eleito, com maioria absoluta, tombar a meio do seu mandato. Só há um responsável por toda a confusão que está neste momento gerada, que dá azo a intervenções como aquelas que cito no início. E se tudo isto foi, como se diz por aí, instigado por esse responsável, essa manobra inqualificável, no vocabulário político, só tem um significado possível. 

A figura, politicamente já toda esfarelada, que habita transitoriamente o Palácio de Belém, tem contas a prestar aos Portugueses. Sem metáforas, sem jogos florais ou malabarismos de linguagem, cumprindo tão somente a Lei. É bom que o faça, e já. 

2020/10/25

Cultura, pandemia, gangrena e drinks de fim da tarde



Haverá dúvidas de que a “cultura” é mansa? 

Mesmo depois de tantas “flight cases” plantadas no Terreiro do Paço e na CM do Porto, projecções coloridas em edifícios, e outros protestos murchos, a "cultura" continua em processo de gangrena. As restrições às actividades culturais trazem consequências dramáticas, mas em Portimão parece que estamos noutro planeta. Que diferença para as salas fechadas ou a meia haste que por aí vamos vendo.



Não pretendo aqui fazer uma análise do sector da cultura em Portugal nem estou habilitado para o fazer. Pretendo apenas chamar a atenção para umas tantas incoerências e, sobretudo, para a passividade inacreditável com que o sector da cultura, certamente inebriado pelos drinks de fim de tarde, assiste à crise que se instalou. Com olhar bovino, como o de quem aguarda a vez para entrar no matadouro. 

O sector cultural, face ao valor previsto para a cultura, limita-se a largar, com ar enfadado, uns bitaites e umas queixinhas avulsas nas redes sociais e em entrevistas mais ou menos folclóricas. Não há qualquer organização, não se ouviu uma palavra  dos agentes culturais quanto a um projecto de recuperação deste sector, nem uma ideia para aplicações dos fundos estruturais que aí vêm. Nada. Os portugueses, por seu lado — povo que saca também, sem perceber o que está a fazer, o revólver quando ouve falar em cultura —  aceitam, sem problema de maior, que fechem salas de espectáculo, acabem festivais, produtoras, editoras, que continuem a sair dezenas e dezenas de jovens das escolas de artes, músicos, actores, técnicos, sem que exista perspectiva de trabalho no imediato e sem que existam possibilidades de exercerem as profissões que escolheram no futuro. Não há maneira de os acolher e, no futuro, vai ser pior. Mas eles continuam a sair das escolas. Imagino que, por este andar, os únicos locais onde poderão encontrar trabalho daqui a uns tempos seja nas igrejas... 

É que, aposto, os portugueses serão sensíveis a um outro tipo de reivindicações e o nível da gestão pública que temos não dá para mais. Há dias, a propósito da "crise" em Fátima, o líder parlamentar do PSD, um deputado chamado Adão Silva, e os deputados "sociais-democratas" eleitos por Santarém, vieram reivindicar "apoios sociais e fiscais," chamando a atenção para o facto de a região ter sido atingida pelas consequências económicas da pandemia e exigindo medidas “no âmbito dos impostos, nos apoios vários às empresas e do ponto de vista social”. Em causa está o OE 2021 e mesmo os fundos estruturais. O que os deputados em questão estão a reivindicar é um subsídio a uma crença religiosa, pago, directa ou indirectamente, por todos os contribuintes, acreditem ou não nessa crença. E estamos com sorte por não terem sugerido a obrigação de cada português ir passar o fim de semana a um hotel em Fátima. O que está em causa aqui não é a reivindicação em si. Fazem pela vida. O que aqui parece bizarro é que os deputados se sintam legitimados a fazê-la, enquanto outros sectores, de importância vital e muito mais abrangente para o país o não façam. Como o sector da cultura, por exemplo.

O que se vai vendo no que respeita a este sector é um escândalo. Sem resposta. Os milhões chovem só para um lado, sem que ninguém se indigne com o assunto. As televisões, por exemplo, receberam balúrdios à pala da pandemia. Deveriam ter sido obrigadas a reprogramar as suas grelhas com música, teatro, dança, circo, etc., português. Mas que raio de ideia de cultura tem o Governo? O que é que o PM e o PR vêem para além do namoro aos "artistas" que lhe trazem votos? Conseguirão ter uma ideia de cultura para além do barulho das luzes e dos vapores dos drinks? Se têm, não se vê.

No que diz respeito à cultura, estamos em plena era da pedra lascada. Agora disfarçada com eventos e entretenimento. Anda tudo a dormir. Estou em crer que é a própria “cultura“ que não se leva a sério e não acredita em si. Venham mais umas corridinhas de carrinhos e motinhas!!

2015/10/23

Lições

Aparentemente as instituições democráticas estão a funcionar. O Povo Português pronunciou-se nas eleições, os partidos negoceiam alternativas no quadro dos resultados eleitorais, o PR atribui, em cumprimento do seu papel constitucional, a incumbência de formar governo a quem, no seu entender, melhor poderá cumprir essa função. Se o entendimento das suas funções poderia ser outro, se o comportamento do PR se afigura mais ou menos distante do que imaginamos ser um comportamento digno e correcto, se a sua decisão poderia recair noutra figura, são questões cuja discussão deve ser feita, mas que não têm qualquer relevância para o funcionamento das instituições democráticas. Estas instituições têm rostos e foram sufragadas por sucessivas eleições. 
Cabe agora à AR pronunciar-se sobre a decisão presidencial, dando continuidade aos mecanismos democráticos consagrados na Constituição. É ela a bitola. 
E assim se completa o ciclo.
As lições que interessa verdadeiramente reter no rescaldo de todo este processo são, sobretudo, duas.
Em primeiro lugar, o que esperar para a Democracia portuguesa quando observamos o comportamento inqualificável dos sectores políticos, a quem foi justamente atribuída a missão de formar governo? Ouvindo-os, somos subitamente levados numa viagem ao passado, em que os donos do poder de então não se coibiam de amesquinhar, caluniar, denegrir, violentar e até matar quem a eles se opusesse. Só falta largar os cães e os canhões de água ou reconverter as salas da Rua António Maria Cardoso ou da Rua do Heroismo novamente em locais de tortura e morte. Deveria envergonhar qualquer democrata, de esquerda ou de direita, o tipo de argumentos que foi utilizado nestes últimos dias contra uma solução de esquerda para o Parlamento. Enquanto se comemorava alegremente a data simbólica do filme Back to the Future, em Portugal foi tempo de Back to the Past. 
A Democracia anda distraída. As velhas forças obscuras estão, imagine-se, bem vivas e prontas a atacar a qualquer momento. Parecem aguardar um pretexto apenas. O que o comportamento da direita nestes últimos dias nos vem provar é que, para ela, a Democracia não é um valor. Daí a soltar os jagunços vai um passo.
Em segundo lugar, pela mesma ordem de razões, nenhum verdadeiro democrata se poderá sentir isento de culpas por termos chegado a este ponto, após mais de 40 anos de regime democrático. Há diálogos que estão a falhar ou nem sequer foram encetados, mitos que estão por desmascarar, forças poderosas que estão por aniqulilar, a esquerda esqueceu as gerações que nasceram após o 25 de abril. 
A esquerda tem uma notória incapacidade de diálogo, colabora activamente na perpetuação de mitos inventados e perpetuados pela direita, esqueceu-se tragicamente de denunciar, sem medos nem ambiguidades, os crimes do fascismo aos mais novos, de lhes ensinar o que é a Democracia, e serve-se das mesmas forças que a manipulam e condicionam, seguindo porventura a velha ideia do "se não podes vencê-los". Um caso particularmente grave, que merece destaque, é o da imprensa. 
Não há uma imprensa de esquerda em Portugal. A esquerda, agentes políticos activos e sectores de da população que a dizem seguir, estão totalmente comprometidos com uma imprensa de que são vítimas. Fazem-na e consomem-na sem pudor. Portugal é hoje uma gigantesca realidade virtual, construída com a acção diligente de uns, que a fazem, e a complacência estúpida e criminosa de outros, que a consomem.
As "máscaras caíram", como li por aí. A isso deve seguir-se uma implacável limpeza de balneário. Há gente absolutamente indigna alapada na esquerda que, é o momento, tem que ser desmascarada sem piedade. Mas, mais importante, a alternativa de esquerda tem de ser vivida sem ambiguidades e sem alienação de responsabilidades. 
É um futuro diferente aquele pelo qual devemos lutar, não um passado maquilhado. 

2015/01/31

Democracia



Seja qual for a justificação, nunca aceitarei que em Democracia se abuse da Democracia. As razões pelas quais a actual maioria chumbou a audição do PR sobre o caso BES são ditadas por uma de duas coisas. Ou a maioria é conduzida por um espírito totalitário ou tenta esconder algo.
Em Democracia não há, ou não deveria haver, tabus. Os agentes políticos são votados e são pagos pelos que neles votaram para exercer o seu cargo. Têm de prestar contas!
Se a maioria tem alguma coisa a esconder ou pretende esconder alguma coisa que o PR tenha feito é porque alguma fez...

2013/07/02

Até quando?

Ontem o Daniel Oliveira fez aqui uma das mais lúcidas análises que tenho lido sobre a situação da esquerda portuguesa desde há muito tempo.
Não vejo, infelizmente, maneira de ultrapassar os problemas que o D.O. aponta neste artigo.
Hoje o PR avisa que só a AR determina se há ou não há crises políticas, votando ou não moções de censura. Sorridente (de que sorri ele?) e consciente da total impunidade de que goza, goza connosco e sacode a água do capote.
Até quando vamos continuar a ter estes trastes a dominar o país? Até quando vamos estar neste impasse? Até onde vamos deixar chegar isto?!
Quanto tempo mais vai ser preciso para a esquerda compreender que está a dar um tiro fatal no pé e que vai pagar duramente o impasse em que fez colocar a actual situação política portuguesa?

PS- Acabo de saber que Paulo Portas apresentou a demissão. Os acontecimentos correm mais de forma mais veloz que o baudrate da minha ligação à internet... Afinal o PR não pode continuar a sorrir. A esquerda ultrapassada pela direita. O meu post durou pouco mais tempo do que vai durar o mandato da nova ministra das finanças!

2013/05/02

De morrer a rir


Há dias, alguém (certamente com sensibilidade delicada e digestões difíceis) me chamava a atenção para o tom "sério" deste blog. É tudo muito reactivo, muito "militante", muito grave, muito solene. A solução, segundo este sujeito, seria o humor. Temos de rir, rematava assertivo.
Pois bem, queres (querem) rir? Aqui vão então umas piadolas e outros tantos motivos para umas gargalhadas fartas.
O actual primeiro ministro submeteu-se ao veredicto popular com um programa que preconizava o contrário do que depois veio a ser executado? Ahahahahahah, é de partir o coco! O primeiro ministro comprometeu-se a nunca invocar as escorregadelas do governo anterior para justificar as suas incapacidades e não fez outra coisa desde que tomou posse? Ahahahahahah, estás a gozar! As metas que o primeiro ministro traçou —mesmo indo contra o seu próprio programa eleitoral— não foram cumpridas? Ahahahahahah, é demais, pára, pára! Passaram mesmo a metas volantes?! Ahahahahahah, assim não! Todos os índices que permitem avaliar a acção governativa demonstram o agravamento da situação que o próprio primeiro ministro considerava grave quando tomou posse? Ahahahahahah, eh pá estou quase a mijar-me a rir! Aqui há anos, uma taxa de desemprego de cerca de um terço da actual provocava a ira dos partidos, o cataclismo social e era motivo para queda imediata do governo? Ahahahahahah, por favor, mais não! E o governo prevê que essa taxa aumente para o ano, com mais 200 000 desempregados a invadir os centros de desemprego? Ahahahahahah, caraças, pára!! E a forma de combater este flagelo, mais os problemas "estruturais" da economia portuguesa, é aquilo que o Álvaro apresentou?! Ahahahahahah, nem me consigo conter! Ou "reestruturar a economia" é diminuir os encargos com a segurança social, despedir à vontade e diminuir o tempo de atribuição do subsídio de desemprego, ou mesmo acabar com ele? Ahahahahahah, ai que não aguento!! E, já agora, deixa-se morrer os velhos, termina-se mais cedo o fim dos doentes terminais, tira-se os remédios aos doentes sem remédio, não vão eles viver demais e locupletar-se com o xanax uma eternidade, e deixa-se os miúdos a cair de fome nas escolas, ou, melhor ainda, fecham-se as escolas, porque assim eles têm fome em casa e fica-lhes (e fica-nos!) mais barato?! Ahahahahahah, essa não!, é de partir o caroço!
Entretanto, a criatura de Belém limpa os cantos da boca, cospe um resto de bolo rei ainda escondido na dentadura, faz um ar de mestre escola e apela ao consenso para que se concebam mais medidas que prolonguem a enrabadela geral e funda de que os portugueses estão a ser vítimas? Ahahahahahah, não, não, não, pronto, já rebentei uma veia a rir!!
É oficial: doravante, aqui, por mim, é só rir!

2012/10/20

Arqueologia, ideologia ou marketing?


O "Laço Branco" é um filme de Michael Haneke. Uma alegoria, segundo o seu autor, à "origem de qualquer forma de terrorismo, seja ele de natureza política ou religiosa." Jardim Gonçalves, esse símbolo de probidade, essa figura exemplar da sociedade portuguesa, podia ser um personagem deste filme.
Aconselho quem não viu o filme —a quem porventura escapará assim o sentido da metáfora— que o veja urgentemente. Aconselho também, aviso já!, a que se muna previamente de um saco de vómito, desses que se distribuem nos aviões...
O mesmo deverá fazer se ouvir esta entrevista dada por Gonçalves à TSF. Nela o (a)fundador do BCP confessa-se adepto dos partidos, contra os "independentes", partidário da solução do centrão (particularmente interessante é a sua justificação para a participação do PS numa possível coligação de centro... atenção João Galamba, isto fica sem resposta!!?) e da não intervenção do Presidente da República. A entrevista é escuta obrigatória para qualquer patriota que ame verdadeiramente Portugal. É escuta obrigatória também porque permite perceber as causas do presente e os contornos do passado recente do País. Está lá tudo, no que é dito e no que não é dito.
Entendo perfeitamente as ideias do senhor J. Gonçalves. Ele é cristalino. Só não percebo por que raio se foi desenterrar esta múmia...

2012/10/05

De pernas para o ar



Eduardo Galeano escreveu um livro chamado "De Pernas para o Ar". O livro relata um mundo onde o vício é virtude e a virtude é algo a abater. Exemplos que podiam ilustrar adequadamente este livro de Galeano abundam em Portugal. Este aconteceu ainda hoje de manhã.
A imagem de Natacha Cardoso é brutal. Alguns dizem que é o retrato do País. Não é, é o retrato de Cavaco Silva. "Muitos portugueses vêem-se em situações de grande dificuldade. Situações que os seus pais nunca conheceram e que eles próprios nunca julgaram que viriam a atravessar," disse Cavaco no discurso do 5 de Outubro que decorreu hoje em cerimónia clandestina. O discurso é impróprio de um Presidente da República.
De um Presidente da República esperar-se-ia uma posição activa, preventiva, crítica, viril, contundente. Cavaco é passivo, reactivo, acrítico, piegas e balofo. Cavaco é o primeiro responsável por este estado de coisas, mas dele se esperaria agora —esperaríamos nós todos, os Portugueses de quem ele é Presidente— contributo decisivo e eficaz para não deixar arrastar este processo de apodrecimento que ele iniciou, de que se queixa, mas que teima em manter activo.
Já estamos há muito habituados à falta de sentido de Estado e de verdadeira dimensão política dos agentes políticos portugueses, ao rasteirismo da sua postura, ao oportunismo ou à falta de estamina da sua actuação. Mas, também nessa medida, é preciso dizer basta!
"Nestas alturas, há o risco de nos deixarmos abater pelo desânimo e pelo pessimismo. De sermos assaltados por sentimentos de medo e de frustração. De incerteza quanto ao nosso futuro e quanto ao futuro dos nossos filhos," acrescentou distraído o presidente, pouco depois de, ao som do Hino Nacional, ter erguido a bandeira de Portugal ao contrário. Um presidente de pernas para o ar.

2012/09/16

Point of no return?

Foi bonita a festa (pá), ouvia-se dizer ontem na praça de Espanha.
Foi, mas não chega.
Da mesma forma que a democracia não se esgota na representatividade parlamentar, também a democracia participativa não se esgota em manifestações, por muita gente e palavras de ordem que estas tenham.
Sim, é preciso correr com estes vendilhões do templo, que não olham a meios para atingir os seus fins, ainda que no fim só venham a restar zombies incapazes de resistir seja ao que for.  Para correr com eles (porque são muitos e usam diversas máscaras) todos os meios legais  são lícitos, pois os últimos 38 anos mostraram que não aprendemos nada. A prova é que continuamos a votar nos partidos que, alternadamente, vão espoliando o pais e empobrecendo a população, enquanto defendem os interesses (nacionais e estrangeiros) daqueles que sempre viveram à custa do estado e da exploração sistemática de quem trabalha e quem desconta para os sustentar.
A manifestação de ontem, como aquela que reuniu centenas de milhares de manifestantes no dia 12 de Março de 2011, foi boa (muito boa), na medida em que as pessoas ousaram descer á rua e dizer “basta!”. Podem não saber o que querem, mas começam a saber o que não querem. É um princípio. Por algum lado temos de começar.
Mas, não devemos ter ilusões. Não é por gritar “que se lixe a troika!” que esta se vai embora. Veja-se a Grécia, onde a população desce às ruas todas as semanas sem que as medidas de austeridade diminuam. Qual é o limite? Das medidas e da resistência. Estas são as questões.
Cavaco Silva já percebeu a mensagem e, impedido como está de se pronunciar devido à imagem negativa que o persegue, mandou Manuela Ferreira Leite avisar o governo. Esta, que nunca escondeu o desprezo pelo jovem Passos, encarregou-se na perfeição da mensagem, Fê-lo tão bem que conseguiu unir toda a gente (da esquerda à direita) contra o jovem turco. E o resultado está à vista: 40 cidades portuguesas vieram à rua manifestar-se contra este governo. É obra!
Segue-se o segundo acto. Perante o descrédito do regime, Cavaco convocou o “Conselho de Estado”. Basta olhar para a sua constituição (ex-presidentes na reforma, comentadores de televisão, economistas da moda e neurocirurgiões da ribalta) para não ter ilusões. Para dar um ar de democracia (e fazer o contraditório) convidou o Gaspar.
A estratégia é clara: é preciso que alguma coisa mude para que tudo fique na mesma.
Até é possível que perante a derrocada da receita da Troika, o governo tenda a inflectir de estratégia. Talvez até saia o Relvas, ou mesmo o Gaspar...
Mas, será que mudará alguma coisa na forma como os peões internos da Troika vão abordar a crise portuguesa, eles que apenas estão interessados em que paguemos aos credores e em desregular o mercado de trabalho interno para dessa forma nos tornar mais submissos? Não. Não vai mudar nada de essencial. É por isso que a manifestação de ontem não nos deve iludir.
A manifestação foi um acto de cidadania e, nesse sentido, um ponto de não-retorno. Nada será como dantes, a partir de agora. Mas, os representantes do “centrão” continuarão lá e a defender os seus interesses. Ora os seus interesses, não são necessariamente os nossos. E é nesta dialéctica de contradições que nos devemos fixar, com o risco de nos fixarmos demasiado na árvore e perdermos a floresta de vista.

2012/09/08

V de verme

foto Valter Abrucez
Não vou perder tempo com o conteúdo do anúncio feito ontem pelo PM. Não vou manifestar a minha incredulidade face à cronologia e ao horário e a esta tentativa patética de fazer de todos nós parvos. Não vou referir os comentários prévios do PR, nem especular sobre a sua reacção, que perante eles se espera, quando se tratar de aprovar o OE2013. Não vou falar das contradições recorrentes, dos atropelos, da incompetência, da mentira, do carácter rasteiro, nojento e classista de toda esta governação. Não vou alongar-me sobre o exemplo de experiências passadas que remeteram outros personagens, bem mais ingénuas afinal, para a mais pura marginalidade política. Não vou sequer lembrar a questão central: esta imperdoável desonestidade que consiste em propor ao eleitorado um determinado programa, ganhar com ele as eleições e depois executar um programa totalmente do avesso, como ontem ficou mais uma vez demonstrado.
Não, o que me intrigou foi ouvir aquele "meus caros portugueses" (ora leia aqui), com que pontuou a sua homilia de ontem. Quando o ouvi dizer aquilo pensei: "meu?" Eu sou "dele"? "Caro?" Como poderei ser "dele," como poderei eu ser-lhe "caro" e, ao mesmo tempo, como pode ele fazer-me, fazer-nos, uma desfeita destas? Aquilo soava-me estranho.
Depois percebi. Momentos antes, em tom de "tem que ser, sou eu que mando" o doutor Coelho tinha feito uma dessas pontuações com um formal, autoritário e assertivo "Portugueses." Momentos mais tarde, muda o registo, hesita e parece tentar amenizar o discurso, introduzindo nele um tom mais tu-cá-tu-lá. Caros, meus!?
Uma interpretação possível é a do português Coelho se comportar como um qualquer dignitário estrangeiro, de visita, a tentar defender os seus interesses. O premier chinês ou o presidente angolano, de visita a Portugal para inspeccionar a colónia, usariam porventura a fórmula "meus caros portugueses"... Do PM português  perceberia "meus caros concidadãos," admito o institucional "Portugueses," mas, "meus caros portugueses"? Por que se permite este safardana tais familiaridades?
Seja como for, nem quando pretende soar assertivo e institucional nem quando pretende fazer o número do buddy-buddy, Coelho convence. O que me intriga em tudo isto é ouvir, como ouvimos ontem, no meio de muita gente irada, é certo, gente que ainda defende esta política e culpa o anterior governo pela situação actual.
Esta gente esquece que o primeiro ministro disse, ele próprio, que não se iria escudar nesses argumentos. Esquece que o problema a resolver é a situação do país, não as culpas do actual anterior governo. Esquece que a situação do país está pior do que estava antes.
São eles o sustentáculo destes miseráveis, é a esses vermes, que cada vez mais me incomodam, que devemos, nesta altura, pedir contas.

2012/07/20

Espanhóis e portugueses: diferenças óbvias

De facto, há diferenças entre portugueses e espanhóis. Enquanto em Portugal se espera pelo "parecer" do "opinioneiro" de serviço para ter opinião própria, e se exulta com os comentários dos "especialistas" que propõem o afrouxamento das medidas de austeridade, enquanto aqui se substitui a acção pela conversa mole (*), em Espanha, mal foram anunciadas as medidas de austeridade, centenas de milhar de pessoas vieram para as ruas em mais de 80 cidades, afrontando a polícia e os seus mastins.  Em Espanha não é preciso que a corda comece a apertar fatalmente a garganta para agir.
Enquanto a corda aperta, em Portugal, o PR e o deputado Ribeiro e Castro, tentando apequenar a contestação, descobrem que as manifestações de repúdio dos portugueses pelo esbulho a que estão a ser sujeitos (**) são "preparadas" (as medidas de austeridade não foram preparadas, são espontâneas...) e este insulto não gera uma onda de enorme indignação. Em Espanha a resposta à tentativa de esbulho não se fez tardar e acontece neste momento nas ruas, de forma intensa, de olhos nos olhos, com um saldo até agora de dezenas de feridos e detidos.
Enquanto a corda aperta, em Portugal, no primeiro semestre deste ano, foram à falência 24 empresas por dia, e a taxa efectiva de desemprego está, segundo o MSE, acima de 23%!
Mais uma diferença que também não deixa de ser curiosa: toda esta informação, sobre o que se passa em Espanha, pode ser recolhida num portal preparado pelo governo espanhol.

(*) Exemplos de conversa mole são os analistas de café ou de mesa de dominó e bisca, espalhados por esses parques públicos, os blogs, os programas sobre blogs e, claro está, os "foruns" e programas de "debate" na rádio e na tv, e a imprensa. Todos eles fervilham, todos os dias, de re-opiniões sobre as opiniões dos "especialistas". Veja aqui, um desses casos.

(**) O pouco que se tem feito, certamente muito aquém do que seria necessário, é obra de gente corajosa que teima em acreditar no país, e não passa, apesar de tudo, de umas meras assobiadelas e  umas palavras de ordem gritadas com o vocalizo mais ou menos estridente. Imaginem, tendo em conta a infinita lábia do artista, o efeito que terá, perante a ignomínia praticada pelo Relvas, uma simples vaia .


2012/06/16

Tranquilidade

O PCP anunciou a apresentação de uma moção de censura ao governo. O BE mete o ponto morto e diz que tem de ver o texto primeiro. O Seguro do PS proclama, em estranho dueto com o PR, deus nos livre!, uma crise política agora, esquecendo-se que é, ele próprio, a crise política! O mesmo PC que apresenta esta moção —que estaria sempre derrotada à partida—, invocando a favor dela, com toda a justiça, o seu carácter simbólico e a necessidade de marcar uma posição face ao bombardeamento em curso contra o povo português, não se coibiu, ele próprio, no passado de criticar iniciativas de índole semelhante com o argumento que... estavam  derrotadas à partida.
Fragilizada, atomizada, incoerente, oportunista, preconceituosa e pífia, assim vai a esquerda portuguesa, certamente para grande gáudio da direita, desta direita reles e nauseabunda que governa e atrofia o grande País que é Portugal.
A direita não resolve os problemas do país com as suas soluções. Vê-se, sente-se. É fácil provar. Mas também a esquerda, que tem nela própria as armas para o fazer, reage desta forma patética e rasteira perante a necessidade de se mobilizar e de constituir uma frente unida. Num País a necessitar de uma solução de esquerda e de pão para a boca!
Não admira pois que o primeiro primeiro ministro estagiário que tivemos desde o 25 de Abril declare que está tranquilo...

2012/04/27

A arte da dissimulação

Logo após ouvir o discurso do Presidente da República do passado 25 de Abril invadiu-me um enorme sentimento de raiva e senti uma necessidade quase irreprimível de partilhar com os leitores do Face essa sensação.
Queria assinalar a minha total perplexidade pela tom de desresponsabilização que parecia inundar todo o discurso. "Temos todos o dever de mostrar que somos um país credível e com potencialidades que tantas vezes são ignoradas," disse Sua Excelência, num plural abusivo e manchado de tons levemente acusatórios. Queria manifestar a minha total revolta por esta tentativa de deitar para cima dos cidadãos comuns tarefas que incubem aos órgãos do Estado, por este driblar de competências. "Mostrar" o verdadeiro país é "uma tarefa para a qual são convocados todos os cidadãos," sentenciou Sua Excelência chutando a bola para fora. Queria enfim gritar alto que os feitos da Pátria que Sua Excelência reivindica para, pelo seu lado, "mostrar o País" foram cometidos apesar de haver a "pátria" e, frequentemente, com a "pátria" a exercer uma intolerável acção de boicote. Não é de hoje, certamente, mas a modernidade não passou ainda por aqui. Não será nunca a presença no Twitter que nos levará ao pódio. Mensagens ocas no Twitter, serão sempre ocas, em Português ou em Mandarim. Um provinciano no Facebook é sempre um provinciano.
A pouco e pouco fui percebendo, porém, que muitos outros portugueses tinham afinal ficado com uma igual sensação de revolta perante o discurso provocador, anestesiante, mas sempre sem asa do PR. E esse é o facto digno de nota.
Com um, aparentemente inócuo, discurso de circunstância o PR pretende fazer-nos acreditar que não tem nada a ver com esta realidade. Estamos todos convocados até para contribuir para o apagão. Mas, parece que a enorme tolerância de que o PR tem beneficiado ao longo dos anos (ele foi de facto eleito por um número significativo de portugueses (a)pagantes...) se estará a começar a esboroar. Mesmo os indefectíveis começam a dar sinal de cansaço. E isso é bom.
O Portugal que temos (todos, de facto) de mostrar ao exterior é um Portugal sem Cavaco e todos os outros responsáveis pela necessidade de termos agora, ao fim de 38 anos, que colmatar a nossa actual falta de "credibilidade [e] dignidade" e de desvendar "inúmeros aspetos positivos e imensas potencialidades," que gente como o actual PR foram paulatinamente destruindo ou, deliberada e convenientemente, escondendo ou boicotando ao longo de todos estes anos de acção política.
Não seríamos, nem eu nem o leitor, nunca nós os responsáveis por estas falhas, mesmo que nele tivéssemos votado.

2012/04/03

Amêndoas amargas...

Segundo o Comité de Protecção de Jornalistas, morreram desde 1992 em todo o mundo 908 jornalistas. Iraque, Síria, Argélia, Paquistão, Somália, Afeganistão, etc, são alguns dos países onde mais jornalistas foram mortos. Morreram no decorrer de missões perigosas, apanhados em fogo cruzado ou, na esmagadora maioria dos casos, assassinados.

Ao divulgar estas mortes, ninguém, incluindo este tipo de associações como o CPJ, as confunde com os conflitos no âmbito dos quais elas ocorreram. Tão pouco que ninguém, certamente, com um mínimo de senso, teria a lata de atribuir as causas dos conflitos à morte de um jornalista. Por mais heróica que seja a sua acção, os jornalistas são vítimas acidentais, mas conscientes, de acontecimentos que os transcendem. São espectadores indesejados que entram pelos bastidores do teatro de operações.

Hoje ficou-se a saber que os agentes que causaram os distúrbios do passado dia 22 vão ser objecto de procedimentos disciplinares. Em causa, pelo que se percebe, parecem contudo estar apenas as agressões de que foram vítimas os repórteres fotográficos da Lusa e da AFP. Os manifestantes e, em particular, os transeuntes vítimas da actuação indigna da polícia pouco parecem preocupar os responsáveis.

O que os génios da propaganda governamental (com o PR a fazer coro) parecem querer fazer é criar um "acontecimento" à volta das agressões aos repórteres para ofuscar os motivos e o debate em torno dos problemas que estão a levar as pessoas a vir reclamar para a rua. Os jornalistas da Lusa e da AFP deram um jeitão à agenda do governo. Só não vê, a partir de agora, quem não quiser mesmo ver: a origem de toda a crise que atravessamos reside no facto de a polícia ter batido nos jornalistas no passado dia 22...

Falando de governo, também parece que se quisermos saber se é verdade ou não que agentes à paisana se meteram no meio dos manifestantes, lançando petardos e provocações e, sobretudo, se é verdade ou não que a polícia recebeu ordens para provocar a desordem no dia 22 (*), o melhor é esperarmos sentados. Nem os jornais parecem preocupados com o assunto. Continuo sem perceber por que razão, quando há "jogos de risco" e possibilidades reais de distúrbios com claques dos clubes de futebol, é mobilizado um dispositivo significativo de agentes —com conferências de imprensa, pisteiros e batedores!— que consegue conter com sucesso uma turba de mentecaptos que não procuram outra coisa que não seja o confronto, e, no caso de uma manifestação cívica, como estas a que temos vindo a assistir, o mesmo dispositivo se revela totalmente incapaz de usar os mesmos procedimentos, a mesma tolerância, paciência e paninhos quentes usados com os mentecaptos para manter a ordem pública. E sem provocações! São mistérios que ninguém consegue entender...

Como estamos em período de celebração da Páscoa, o governo parece já ter encontrado os carneiros para o sacrifício. E a Associação Sindical dos Profissionais da Polícia acha bem...

(*) Os vários responsáveis por este triste espectáculo que foi a actuação da polícia no dia 22 ainda não perceberam que esta ideia do acto individual, para que apontam as "averiguações" em curso, piora a sua imagem e a da corporação. Se houvesse margem para tantos actos individuais é porque não havia comando.

2012/03/11

Cavaco Silva: publicidade enganosa



Os "analistas" dissecaram o tão badalado prefácio de Cavaco Silva, interpretam os seus sinais, exprimiram opiniões e descobriram, pelo caminho, as mais diversas consequências para aquelas 25 páginas que tresandam a maus fígados. O homem é, segundo estes "analistas", ressabiado, mesquinho, mentiroso, cobarde, não tem dimensão para ocupar o lugar que ocupa, apequenou-se com esta acção numa altura em que seria necessário um PR forte, lançou uma iniciativa extemporânea que pode ter efeitos perversos e prejudicar um País fragilizado, etc, por aí fora. As razões parecem ter todas fundamento. De uma modo geral, da direita à esquerda, a acção de Cavaco Silva é condenada com base num convincente conjunto de argumentos que revelam até uma estranhíssima e inusitada concomitância política.
Faltou, no entanto, tanto quanto posso perceber, procurar uma razão plausível para o surgimento deste escrito neste preciso momento. E ela reside num facto a que os "analistas" não deram, nem dão, importância, porque não deram, nem dão, importância à iniciativa que lhe está na origem: é que o "prefácio" surge na semana em que a Petição a pedir a demissão do PR foi apresentada na AR.
O facto de mais de 40 000 cidadãos, daqueles rigorosamente não colunáveis, terem, de uma forma tão naif e espontânea, mas tão categórica, demonstrado que não aprovam a actuação do actual PR e de pedirem, sem papas na língua, rodriguinhos de linguagem, ou malabarismos legalistas, "a sua imediata demissão do cargo de Presidente da República Portuguesa," deve certamente ter criado alguma ansiedade lá para os lados de Belém.
Acontece que o movimento Iniciativa Democrática (criado no Facebook e constituído pelos signatários da Petição) está em plena ascensão, parece ter conquistado aderentes para além daqueles que assinaram a Petição e ameaça tornar-se imparável. Pode causar estragos sérios e profundos na imagem do presidente. Não se sabe até onde tudo isto pode ir. Cavaco defende-se, atacando.
Não concordo com a teoria segundo a qual Cavaco é um simplório, mas probo e imune a influências, personagem político, que ascendeu, em consequência desses seus predicados, ao cargo de PR. Cavaco é tudo menos um simplório. Esta sua imagem foi construída com enorme cuidado e agressividade.
Surtiu efeito. Até agora.
O que um número crescente de cidadãos começa a perceber é que não bate a bota com a perdigota. Os predicados que enfeitam a sua imagem não batem certo com alguns factos, nunca devida e convincentemente explicados, da vida do Presidente da República. Mas, é sobretudo a sua actuação política que se revela um desastre e as incoerências do seu discurso que começam a tornar-se claras para a generalidade dos cidadãos. Cavaco está a revelar-se um exemplo de publicidade enganosa,  incapaz de assegurar o serviço contratado. A pintura começa a esborratar e o edifício habilmente construído apresenta sinais de desmoronamento iminente.
Esqueceram-se dele os "analistas", mas o Movimento criado em torno da Petição ameaça seriamente criar grossa mossa.

2011/10/19

A incógnita (2)


Em junho passado vislumbrei uma incógnita nos céus de Lisboa e dei disso conta aqui. Hoje vejo outra  incógnita, maior, desenhada nos céus aqui da minha terra. Maior e mais nítida. Certezas, certezas, só as pode ter o governo e o seu PR: se é tumulto que receiam, é tumulto que lhes vai cair em cima pela certa. Infelizmente, penso que não nos livramos disso.
Ainda há bocado, no café onde habitualmente vou, passavam imagens na televisão, em directo, dos tumultos desta manhã na Grécia. O dono do café, pessoa bastante conservadora e nada dada a "tumultos", pelo que percebo, dizia-me com ar nada surpreendido: "ah! afinal é na Grécia, pensava que já era aqui!" Será um que não ficou convencido da bondade das palavras do Álvaro ontem quando disse que "há mais vida para além da austeridade," mais um que já só espera o pior.
Nesta equação de tumultos a várias incógnitas, há umas já resolvidas e outras em vias de resolução.

A careca do presidente

"Há limites para os sacrifícios que podem ser pedidos," diz o PR.
Too little, too late, Mr. President.
Continua o embuste, com os condenados de antanho a fingir agora que são juízes.
Há de facto limites para os sacrifícios que se podem pedir aos portugueses, mas estes limites não estão na sua capacidade de sacrifício —que parece infinita— nem na sua arte para apertar cintos. Os limites estão na sua capacidade para entender as origens desta crise e na qualidade da manha que tem sido usada para disfarçar responsabilidades. Uma manha feita de um ciclo vicioso, de um jogo de empurra o empurrado e volta a empurrar, para voltar tudo à primeira forma e manter o status quo intocável, como é norma desde o início da vigência desta Constituição.
Há quem esteja acima da crise. É só olhar à volta.
A tudo isto é preciso dizer chega! Quando a maioria que elegeu o senhor Presidente finalmente tirar as suas conclusões, ninguém se safa e não fica pedra sobre pedra.
"Mudou o Governo, mas eu não mudei de opinião," acrescenta o PR. Percebemos, mas percebemos também que não é por coerência. É apenas o medo de que a maioria descubra finalmente a careca do presidente e a verdadeira natureza da sua "coerência".

2011/06/22

O medo de falhar

Ouvimos este apelo insistente e patético em todos os discursos da tomada de posse do governo: "Portugal não pode falhar". O glamour destas cerimónias cai: estes gajos estão à rasca.
Mas, que raio de "Portugal" é este? Quem é que não pode falhar?
De quem estão a falar quando falam em "falhar"? Quererão dizer que reconhecem que as vítimas das falhas anteriores sabem hoje claramente quem foram os seus agentes? Quererão os autores da expressão dizer que reconhecem que se falharem irão ser irremediavelmente apeados?
Quem é que pode ter a última chance? É este regime que está em causa. É este regime que tem a última chance.
"Portugal não pode falhar" poderia parecer uma expressão saudavelmente mobilizadora. Eu leio-a antes como um recado para dentro do regime, como um sério aviso dos agentes em risco aos seus pares. No precaver é que está o ganho. O medo de falhar significa a certeza de que o regime está, mais do que nunca, consciente das suas malfeitorias.
"Ninguém está imune à crise," disse, dramático, Cavaco (nesta altura eu ouvi os contrabaixos, graves, e três golpes fulminantes de tímpanos...), sublinhando o ninguém, qual Frei Luís de Sousa. Resta saber quem é quem neste ninguém, e com que graus de imunidade se faz este dégradé...
Não, Portugal não vai seguramente "falhar". Quem pode falhar, quem pode estar com medo de falhar, são aqueles que falharam até agora, aqueles que dominaram, continuam a dominar o regime e que dele abusam. Hoje sabe-se quem falhou e é claro para todos que, a continuarem a ocorrer "falhas", desta vez, não haverá brandura para com este regime e os seus beneficiários. Sabemos quem é que tem a última chance.
Tem o primeiro ministro toda a razão: Portugal não falhará.

2011/06/15

Liberdades

Enquanto na Grécia o fogo alastra (veja aqui, aqui, aqui e aqui) e em Espanha alastra o fogo —com os Indignados e agora com a "Plataforma de Afectados por la Hipoteca"— (veja aqui, aqui, aqui, aqui e aqui), em Portugal sua Excelência o PR acaba de indigitar o dr. Passos Coelho para Primeiro Ministro da  República, enquanto Nuno Gomes termina contrato com o Benfica e anuncia, em comunicado, que é um jogador livre.

2011/04/11

O arco e as flechas

Não percebo, com toda a franqueza, esta admiração em torno da inclusão de Fernando Nobre nas listas do PSD. Creio que só mesmo quem se quis deixar enganar terá votado nele para a presidência da república. A Presidência da República Portuguesa não é uma ONG e Fernando Nobre não demonstra, não tem!, as capacidades para ocupar um lugar destes (*). Se tivesse estofo de político, teria percebido que, no quadro de uma democracia, o que propõe é atributo de actuação de um partido. Para levar o seu desígnio em frente teria de criar um programa e um partido para o levar a sufrágio. Em alternativa, inventou esta coisa bizarra que é propôr um partido... apartidário. Uma espécie de SGPS unipessoal (**). Um disparate, destinado à derrota. Não fosse a mãozinha do clã Soares e Fernando Nobre nem ganhava a Câmara de Vila do Conde. Nobre nunca quis fazer política. Como escrevia ainda hoje o meu amigo Pedro Barroso, tudo não passa de uma "insuperável sede de protagonismo pessoal." Pelo lado de Fernando Nobre a cambalhota não deve, pois, admirar.
Já pelo lado do PSD a coisa não é tão clara. Parece estranho que o PSD, enquanto partido do "arco" se tenha disposto a acolher esta ideia de ter um presidente-partido, como candidato apartidário a presidente do orgão onde os partidos digladiam as suas teses. Confusos? Também eu!
Há nisto tudo uma estratégia suicidária que ainda não consegui perceber e, ou muito me engano, ou as asneiras não vão ficar por aqui. Passo a passo, Coelho dá tiros atrás de tiros nos pés. Em breve se revelará que a perna é mais curta que o Passos. Se alguém tinha esperança de que o PSD pudesse ser alternativa ao regabofe PS e pudesse fazer frente ao seu perturbante e ameaçador cerrar de fileiras demonstrado este fim de semana, o melhor é rever o seu raciocínio.
Com o País entalado como está, com o PCP e o BE a desperdiçarem ingenuamente uma oportunidade de ouro de pressionar o PS e estabelecer uma dinâmica de verdadeira alternativa de poder, estamos de novo entregues ao "arco". Faltam as flechas.

(*) Se o actual inquilino do Palácio de Belém tem capacidade para ocupar o lugar que ocupa é outra conversa...
(**) Verdade seja dita que o vencedor dessa eleição também inventou uma outra coisa bizarra que é a categoria de político... apolítico. E ganhou! Tudo é possível, pois, dentro do rectangulozinho lusitano.