Ontem, num dos directos das intervenções finais dos líderes partidários, o cavalheiro, que aqui não vou nomear, que parece ter-se atribuído o papel de capo do “bom povo português” afirmou, com pose estudada e perante o aplauso dos seus pares, que o seu partido reduziu “a extrema esquerda à sua insignificância.” Mas acrescentou, logo a seguir, que conquistou “eleitorado de direita e do centro-direita no centro e no norte do país.” Para ele, a eleição de domingo foi “um ajuste de contas com um país silencioso (…), de muitos que viram a esquerda dominar todas as nossas instituições, sem que houvesse qualquer pensamento crítico ou contraditório.” Disse ainda que “este país cujas instituições foram sequestradas, começará agora a ser libertado, pouco a pouco, em todas as instituições (sic)” E, rematou, “começaremos já amanhã a libertar Portugal da esquerda e da extrema esquerda.”
É preciso ver estas afirmações pelo significado que, efectivamente, têm. Não se trata de conversa fiada. O tom e a pose revelam, sem margem para dúvida, ao que vem.
Não é preciso ser particularmente inteligente para perceber o alcance de tudo isto, o quanto esta conversa cai fora do funcionamento legal dos princípios da República, quem está ameaçado por este posicionamento terrorista e quais as consequências que, a qualquer momento, este palavreado pode ter para a nossa Democracia e para a vida das nossas comunidades. O fundo sonoro da bota cardada ouve-se distintamente. As afirmações do führer de Algueirão, feitas assim, às escâncaras, perante a escandalosa passividade de todos os partidos e instituições democráticas, não podem ficar impunes. E que triste exemplo de modelo nos estamos a permitir a dar à juventude, quando deixamos que uma figura deste calibre se dê ao luxo de se exibir desta forma!
Só há um responsável por termos batido tão baixo na nossa Democracia. Está na foto oficial. Só há um responsável pela total perda de controlo sobre todo este processo. Só há um responsável por termos visto um governo, legitimamente eleito, com maioria absoluta, tombar a meio do seu mandato. Só há um responsável por toda a confusão que está neste momento gerada, que dá azo a intervenções como aquelas que cito no início. E se tudo isto foi, como se diz por aí, instigado por esse responsável, essa manobra inqualificável, no vocabulário político, só tem um significado possível.
A figura, politicamente já toda esfarelada, que habita transitoriamente o Palácio de Belém, tem contas a prestar aos Portugueses. Sem metáforas, sem jogos florais ou malabarismos de linguagem, cumprindo tão somente a Lei. É bom que o faça, e já.