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O que ontem assistimos, não foi bonito de ver. Ninguém estava à espera de uma crise institucional, ainda que os sinais da crise estivessem aí há muito tempo. Só não dava por eles quem não queria vê-los. Era por demais evidente o desgaste do governo neste último ano e todos os sintomas de "fim de ciclo", desta governação, apontavam na mesma direcção. Nada que analistas de vários quadrantes não tenham previsto, logo em 2019, quando a constituição de uma segunda "Geringonça" falhou e o PS não conseguiu obter a maioria absoluta. Marcelo Rebelo de Sousa (o analista-mor do reino) chegou a profetizar que, a meio do mandato, por volta das eleições autárquicas, seria o momento de ruptura mais provável...
Bem, a ruptura aconteceu e, agora, não faltarão as acusações do costume, pois ninguém quer ficar mal na fotografia e há que culpar o "outro", ainda que não haja inocentes nesta história.
Relembremos o óbvio: a "Geringonça" só existiu (por acordo escrito imposto por Cavaco Silva) entre 2015 e 2019. Ainda antes das eleições de 2019, o PCP recusou mais acordos escritos e o PS recusou reeditar a "Geringonça" apenas com o BE.
Portanto, formalmente, nunca existiu uma "Geringonça" entre 2019 e 2021. Houve, sim, negociações entre os três partidos (PS, PCP e BE) e acordos pontuais, que resultaram (ou não) durante a legislatura, o que é natural entre partidos que têm ideologias e projectos políticos diferentes.
Ou seja, qualquer dos partidos era (é) livre de defender os seus pontos de vista (leia-se princípios) sem qualquer compromisso à priori. Foi isso que aconteceu durante a negociação do Orçamento e isto é uma coisa natural em democracia. Como diria o outro "é a democracia a funcionar".
Foi mau? Foi. Ninguém queria uma crise "nesta altura do campeonato". Acontece na maioria dos países europeus com democracias e parlamentos consolidados e não vem daí mal ao Mundo. Na Holanda, as últimas eleições foram há 7 meses (sete!) e ainda não conseguiram constituir governo; a Bélgica esteve cerca de 2 anos sem governo (dois!); A Alemanha teve eleições há mais de um mês e os partidos vencedores (3) ainda não conseguiram formar governo. Alguém morreu por isso?
A verdade é que a erosão governamental era visível e era previsível que, mais cedo ou mais tarde, a crise surgisse. Surgiu agora, provavelmente por calculismo político de alguns partidos (governo incluído). É caso para dizer que "vale mais uma boa crise do que uma má solução".
Restam as eleições. Venham as eleições!