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Na
minha experiência pessoal sempre me mostrei disponível, mas também o fiz porque
o então Pároco de Monte Real, me chamou, me pediu que colaborasse em várias
actividades da paróquia.
Isso,
sem dúvida, fez-me sentir Igreja, fez-me sentir útil à Igreja, apesar da minha
situação irregular, apesar de toda a minha vida passada.
Devemos
lembrar-nos que quem vive estas situações, para além de estar emocionalmente
ferido por causa do divórcio, (como vimos na primeira reflexão), é também
muitas vezes confrontado com todos aqueles que de fora da Igreja a atacam, a
criticam, por causa da Doutrina do Matrimónio.
Ora
se estas pessoas só recebem críticas, indiferenças ou respostas negativas da
Igreja, vão acabar por engrossar as críticas infundadas, porque não
conhecedoras da realidade da Igreja, ou melhor, de como a Igreja devia acolher
e amar estes verdadeiramente necessitados espirituais.
Ouvimos
muitas vezes estas críticas servirem-se por exemplo do episódio da mulher
adúltera a quem Jesus perdoa, para dizerem que a Igreja não faz o que Jesus
fez.
Então,
Jesus ergueu-se e perguntou-lhe: «Mulher, onde estão eles? Ninguém te
condenou?» Ela respondeu: «Ninguém, Senhor.» Disse-lhe Jesus: «Também Eu não te
condeno.» Jo 8, 10-11
Então
é preciso explicar-lhes, com o amor de Jesus, que se esqueceram de uma parte
muito importante, e que é a parte final do discurso de Jesus: «Vai e de agora
em diante não tornes a pecar.»
Porque
a verdade é que há muita desconhecimento sobre a Palavra de Deus, sobre a
Doutrina da Igreja, sobre aquilo que a Igreja realmente diz sobre estas
situações, e por isso mesmo é preciso explicar com muita paciência e amor, não
só àqueles que vivem estas situações mas também àqueles que vivem em Igreja e
são a parte que deve acolher aqueles primeiros, e que só o poderá fazer bem, se
souber bem o que a Igreja propõe.
E
devemos fazê-lo sem tabus, sem reservas, mas com toda a franqueza, e aceitando
as possíveis perguntas incómodas, o possível mal-estar, nunca deixando de
responder com clareza fundamentada.
Recentemente
propus ao Padre Armindo Ferreira, pároco da Marinha Grande, minha paróquia
agora, a criação de um grupo de divorciados e re-casados, com o fim de os
acolher, de os fazer sentir-se Igreja e também de os fazer perceber as suas
especiais situações.
A
ideia era de uma pequena palestra no início da reunião focando alguns aspectos
específicos da situação dos divorciados e re-casados, de 10/15 minutos, seguida
de um testemunho de alguém que esteja a viver essa situação, 10/15 minutos
também. Seguir-se-ia um debate em que as pessoas poderiam colocar as suas
dúvidas, as suas questões, as suas indignações, as suas revoltas, com toda a
liberdade.
A
reunião terminaria com adoração ao Santíssimo Sacramento, comunitária e
participada.
O
Padre Armindo aceitou de imediato a ideia e assim a primeira reunião teve lugar
no mês de Fevereiro.
Foi
uma muito boa reunião, em que as pessoas ao princípio “desconfiadas”, no correr
do tempo se sentiram à vontade e partilharam as suas dúvidas e desacordos,
tendo tido como muito bom que, vivendo alguns desses casais já a sua fé em
Igreja dentro da Doutrina, puderam testemunhar isso mesmo, e assim, foi de
dentro do próprio grupo que saíram algumas respostas.
Percebemos
no entanto aquilo que atrás afirmei, ou seja, o muito desconhecimento, não só
da Doutrina da Igreja, mas também do que é verdadeiramente seguir Jesus Cristo,
ser Igreja.
Percebemos
por exemplo que algumas pessoas vêem este estar na Igreja, este viver Jesus,
como um quase “negócio”, ou seja, eu dou e Tu dás, dizendo coisas como: Eu fui
tantos anos catequista e agora negam-me a comunhão? Os meus pais deram tanto
para a Igreja e eu agora não tenho direito a comungar? Etc.
Antes
da segunda reunião ter lugar, foi também tomada uma decisão, (pelo secretariado
permanente da paróquia), que aqui desejo relatar.
Na
Sexta Feira Santa a paróquia vai realizar uma Via Sacra pelas ruas da cidade.
As
estações da Via Sacra foram distribuídas pelos diversos movimentos, obras e
serviços da paróquia tendo proposto a esse grupo uma das estações o que foi
prontamente aceite. Esta é sem dúvida uma boa maneira de fazer que estes nossos
irmãos se sintam integrados, acolhidos na Igreja.
Regresso
ao ponto do meu testemunho de atrás em que dizia que a minha mulher e eu vivemos
cerca de oito anos e meio nesta situação.
A
verdade é que todo esse caminho foi uma graça de Deus que nos ultrapassou,
digamos assim. A comunhão espiritual em tantas eucaristias era de uma riqueza extraordinária,
e dava-nos, deu-nos, uma consciência da comunhão eucarística, que posso
afirmá-lo, julgo nunca teríamos se não tivéssemos passado por essa situação.
Era de tal modo intensa e verdadeira essa comunhão espiritual, que a decisão estava tomada, pois mesmo que a decisão do Tribunal Eclesiástico fosse contrária aos nossos desejos, nos manteríamos fiéis àquilo a que ambos nos tínhamos proposto.
Isto
leva a pensar que aqueles que vivem estas situações em Igreja, aceitando o que
a Igreja diz, serão as melhores testemunhas junto dos outros, porque não só
podem falar do que é, mas sobretudo do que vivem, e um testemunho na primeira
pessoa é normalmente um testemunho que toca.
Verdadeiramente,
já o disse na primeira reflexão, não chegam os documentos, não chegam os
pronunciamentos, (chamemos-lhe assim), da Igreja afirmando que os divorciados e
re-casados são Igreja.
É
preciso chamá-los, melhor do que isso, ir buscá-los, demonstrando-lhes na
prática, não que a Igreja está com eles, mas sim que eles são Igreja, com
alguma limitações, mas Igreja sem dúvida.
Para
finalizar gostaria ainda de reflectir sobre todas estas notícias, entre aspas,
que vêm constantemente na comunicação social, e às vezes até, de algumas
pessoas na própria Igreja, quase afirmando que a Doutrina sobre o matrimónio
vai mudar porque o Papa já o afirmou.
A
verdade, julgo eu, é que o Papa nunca tal afirmou e assim estão-se a criar
falsas expectativas que poderão ter um efeito muito doloroso, para não dizer
mais, sobre aqueles que por tal mudança anseiam.
Claro
que não devemos, eliminar radicalmente tais esperanças com radical
negatividade, mas sim dirigi-las para um melhor entendimento da Doutrina da
Igreja, para que cada um possa encontrar na sua própria situação o seu lugar
como pedra viva da Igreja, no caminho de salvação que o Senhor Jesus Cristo a
todos oferece.
O
problema da família é hoje em dia algo que ultrapassa as fronteiras da Igreja,
porque se torna hoje em dia num problema grave da sociedade.
Uma
sociedade que não seja assente no valor da família é uma sociedade que tende a
desagregar-se e até a morrer, porque como muito facilmente constatamos, por
exemplo, a natalidade está a diminuir de modo tão drástico que já se começam a
ouvir vozes pronunciadoras de gravíssimos problemas no futuro.
O
divórcio é, quer queiramos quer não uma realidade dos nossos dias, mas a
verdade é que após muitos divórcios também aparecem novas relações que
constituem famílias estáveis e duradouras.
A
essas famílias faltará o caminho para perceberam e viverem o amor de Deus, (que
nunca lhes falta, porque a todos Deus ama), e faltará esse caminho se não
formos capazes de dar respostas concretas em Igreja àqueles que a procuram a
Igreja para nela sentirem e viverem esse amor infinito de Deus, que é, afinal,
o elemento, (se me é permitido chamá-lo assim), indispensável a uma família,
porque é o elemento unificador e santificador de cada membro da família e da
própria família em si.
Joaquim Mexia Alves
Nota:
Final do texto
da segunda intervenção da recoleção para sacerdotes, no Santuário de Fátima,
que orientei no dia 7 de Abril passado, a convite do Senhor D. António Marto.
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