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Tantas vezes já tinha tentado falar com os seus pais para lhes pedir perdão por tantas coisas erradas que tinha feito e que o tinham levado a sair de casa.
Tantos problemas que tinha causado e tinham entristecido os seus pais que, no entanto, sempre lhe respondiam com todo o amor que tinham por ele.
Lembrava-se de ter saído intempestivamente de casa, dizendo que se ia embora para sempre, deixando-os mergulhados numa profunda tristeza e desalento.
Agora via tudo isso, mas naquele tempo, um qualquer mal que ele não entendia, tinha-o levado a quase odiá-los por não quererem entender, julgava ele, as suas “verdades”.
O que seria feito deles?
Sabia que viviam na mesma casa de sempre, que os anos tinham passado por eles, e alguém lhe tinha dito que viviam sem alegria.
Também ele agora, passados aqueles anos loucos em que se tinha deixado consumir pelos maus caminhos, pela droga, pela sua mania de tudo pensar saber, sentia uma enorme tristeza dentro de si que, quando reflectia conscientemente, percebia que não era só pela vida que tinha levado, mas sobretudo por aquilo que tinha feito a seus pais e por este afastamento deles que agora vivia.
De repente percebeu algo tão nítido que ficou surpreso com ele mesmo.
“Aquilo que tinha feito a seus pais”! “Tinha feito”!
Então se “tinha feito”, pensou ele, era passado e estava muito a tempo de ir ter com eles, pedir perdão e deixar que o amor que ele sabia eles lhe tinham, fazer o resto.
Mas dentro dele ainda vivia um orgulho quase incontrolado.
Ir ter com eles e pedir perdão era reconhecer que tinha errado e, se ele queria sentir a paz do perdão dentro de si, a realidade é que teria de reconhecer que afinal não era dono da verdade e tinha errado, e isso parecia-lhe uma barreira quase intransponível.
Mas ele agora estava tão bem!
Tinha vencido o vício, tinha um bom emprego, um bom apartamento, enfim, uma boa vida e, no entanto, percebia, mais uma vez, que aquela situação não o deixava ser feliz e viver em paz.
Era véspera de Natal, e ele lembrou-se de que nesse mês e nesse dia, algo de bom, de sensível, se vivia sempre em casa dos seus pais, com os preparativos e a chegada do Natal, com uma alegria calma e aconchegante.
Já não rezava há tanto tempo, pensou ele.
Tudo isso tinha afastado da sua vida e já nem se lembrava das orações que faziam em casa de seus pais.
De qualquer modo fechou os olhos, baixou a cabeça, e quase num murmúrio disse: Menino Jesus, se me amas, ajuda-me a nascer de novo.
Veio ao seu coração uma certeza inabalável: Tinha que ir a casa dos seus pais nessa noite pedir-lhes perdão e que o deixassem passar com eles a noite de Natal.
Num instante colocou algumas coisas num saco e partiu de viagem, porque já era tarde e ainda tinha muito quilómetros para fazer.
Longe, na terra de seus pais, já se celebrava a Missa do Galo e eles lá estavam, como sempre na igreja, tentando viver com alguma alegria a noite de Natal.
Mas era quase impossível, porque o seu filho longe e sem saberem onde, gerava uma tristeza muito profunda nos seus corações.
Deram as mãos no Pai Nosso e mesmo sem dizerem nada um ao outro, sabiam que nessa oração pediam ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo por aquele filho a quem tanto amavam.
Acabada a Missa saíram da igreja e caminharam apressadamente, por causa do frio, para sua casa que era ali bem perto.
Quando chegaram perto de casa, perceberam que junto à porta de entrada estava um vulto de homem, e ficaram um pouco receosos.
À medida que se aproximavam parecia-lhes que o ar se tornava mais leve, que uma qualquer melodia enchia aquela rua, que uma expectativa alegre tomava conta dos seus corações.
Foi então que reconheceram o seu filho junto à porta e, sem pensarem nem um pouco, correram para ele enquanto ele corria para eles, também.
Abraçaram-se chorando de alegria e quando ele tentava pedir-lhes perdão, eles só lhe diziam: Obrigado, obrigado por teres vindo ter connosco. Vem, entremos em casa e vivamos o Natal que fez renascer o nosso menino.
No presépio, podiam jurar que o Menino Jesus, Maria e José, sorriam embevecidos com os abraços intermináveis daquela família.
Marinha Grande, 10 de Dezembro de 2024
Joaquim Mexia Alves
Com este Conto de Natal desejo a todas as pessoas que visitarem este espaço um Santo Natal, vivido no amor e na alegria de Deus que se fez Homem para nós.