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segunda-feira, 7 de abril de 2014

INACREDITÁVEL RESPOSTA DO DIRECTOR DE INFORMAÇÃO DA RTP SOBRE OCULTISMO NO TELEJORNAL


Da Acta do Conselho de Redacção da RTP de 2 de Abril: 
"CONJUNTO DE REPORTAGENS “ACREDITAR”
O Conselho de Redação questionou o Director de Informação (DI) acerca do conjunto de reportagens transmitidas no Telejornal sob o título “ACREDITAR”, que abordaram estórias vulgarmente designadas como esotéricas, sublinhando a necessidade de existir contraditório em relação às realidades retratadas nas peças. O DI considerou não existirem nem poderem existir  “temas tabu” na RTP e transmitiu ser seu entendimento que as reportagens “ACREDITAR” não careciam de contraditório. O DI reconheceu no entanto, que nalguns casos poderá ter “faltado algum enquadramento” nos pivot’s de lançamento das peças.
A iniciativa do Conselho de Redacção é louvável e mostra que a classe jornalística se importa, e tem que importar, com a qualidade do jornalismo. No dia em que deixar de o fazer, os jornalistas tornar-se-ão dispensáveis. A resposta do Director de Informação é inacreditável. Mais do que necessidade de contraditório, as peças tinham a obrigação de esclarecer os "temas tabu", coisa que não fizeram, antes pelo contrário.

Preocupante também é ausência de resposta do Provedor do Telespectador, às inúmeras queixas que recebeu a propósito deste assunto, nomeadamente à minha.

Francamente não me importa nada que a Direcção de Informação da RTP vá aos fins de semana à noite para a Serra de Sintra esventrar galinhas pretas. Mas que use o meu dinheiro, pago através da minha conta da electricidade, para promover o ocultismo, não posso concordar.

sexta-feira, 28 de março de 2014

Jornalismo oculto no Telejornal da RTP

Meu artigo de opinião, no PÚBLICO de hoje:

Segundo o relatório Ciência no Ecrã, da autoria da Entidade Reguladora da Comunicação e do Instituto Gulbenkian de Ciência, apenas 0,8% do tempo dos telejornais em horário nobre é dedicado à ciência, a duração média das peças de ciência no Telejornal da RTP é de três minutos e vinte e quatro segundos e 92% destas têm menos de cinco minutos. No entanto, a televisão pública achou por bem criar um espaço cativo para a pseudociência em horário nobre, a que chamou Acreditar.

No dia 17 de Março, a RTP usou sete minutos do Telejornal para fazer publicidade a um especialista em "medicina popular" que afirma fazer diagnósticos médicos medindo, aos palmos, a roupa dos pacientes. No dia 18, concedeu mais sete minutos de tempo de antena a um "endireita" que diz ter um "dom" que "herdou do pai", que trata "males dos ossos e dos nervos de uma forma que não tem explicação", mas que terá demonstrado, com um galo, a validade do seu tratamento em tribunal. No dia 19, mais seis minutos e 15 segundos no horário mais nobre da televisão pública foram dedicados a uma cartomante que diz acertar em 90% das vezes. No dia 20, mais sete minutos e 24 segundos de publicidade a uma fitoterapeuta que afirma fazer diagnósticos de doenças graves através da leitura da íris, diz tratar o cancro de uma paciente com uma raiz que "tem a forma do corpo humano" e conclui dizendo que "a quântica pode determinar a data da morte do ser humano". No dia 21 de Março, mais sete minutos de horário nobre para promover um médium que afirma "incorporar" os espíritos "de quem partiu, geralmente santos". Em cinco dias, a televisão pública usou 34 minutos e 39 segundos do Telejornal para fazer publicidade a produtos e serviços milagrosos. Isto não é serviço público. Serviço público seria contribuir para desmistificar estas crenças.


A RTP poderia fazer reportagens sobre estes assuntos. Poderia ouvir os curandeiros e recolher testemunhos de clientes satisfeitos. Mas teria que apresentar também um contraponto racional, referindo o conhecimento científico acerca do assunto, recolher também testemunhos de clientes insatisfeitos (ou será que não os há?). A televisão pública portuguesa não poderia simplesmente assumir-se como um magafone acrítico dos curandeiros e cartomantes. Porque isso não é jornalismo. É publicidade enganosa. Seria grave em qualquer contexto. Mas na RTP, que recebe dinheiro de todos os consumidores de electricidade em Portugal, incluindo dos cegos, para fazer serviço público, é inadmissível. É extraordinário que, não tendo a ciência uma presença regular no Telejornal, esse espaço seja dado à pseudociência. Não sei o que se passa pela cabeça dos responsáveis pela informação na RTP. Nem que concepção delirante de serviço público justifica esta opção. Mas isto é uma iniciativa (deliberada ou inadvertida) que contribui para acabar com a ideia de serviço público de televisão.

sexta-feira, 21 de março de 2014

ACREDITAR EM ALDRABICES NA RTP

Aparentemente a RTP resolveu usar o dinheiro que os contribuintes lhe pagam através da contribuição audiovisual e das transferências do Orçamento de Estado, para criar uma secção regular de aldrabices no telejornal das oito, a que chamou "acreditar". 

É extraordinário que, não tendo a ciência um espaço cativo no telejornal, essa espaço tenha sido dado à pseudociência.

- No dia 17 de Março a estação pública de televisão resolveu usar 7 minutos do telejornal (a partir do minutos 12) para fazer publicidade a um especialista em "medicina popular", que afirma fazer diagnósticos médicos medindo, aos palmos, a roupa dos pacientes.

- No dia 19 de Março, foram dados 6 minutos e 15 segundos no horário mais nobre da televisão pública a uma cartomante, que diz acertar em 90% das vezes.

- Ainda o espectador não estava recomposto de tantos disparates, quando no dia seguinte a televisão pública resolve dar mais 7 minutos e 24 segundos de publicidade a uma fitoterapêuta que afirma fazer diagnósticos de doenças graves através da leitura da íris, dizendo que "os olhos são o espelho da alma", lugar comum que não significa absolutamente nada. Mais grave ainda, afirmou tratar o cancro de uma paciente com a raiz de uma planta de origem coreana, cuja raiz "tem a forma do corpo humano". E conclui dizendo que "a quântica pode determinar a data da morte do ser humano".


A ciência ocupa 0,8% do tempo dos telejornais em horário nobre, a duração média das peças de ciência no telejornal da RTP é de três minutos e vinte e quatro segundos e 92% delas têm menos de 5 minutos. Mas, em quatro dias, a televisão pública gastou 20 minutos e 39 segundos a fazer publicidade enganosa a produtos e serviços milagrosos. 

Segundo o  Decreto-Lei n.º 57/2008 de 26 de Março de 2008 que regula o Regime das Práticas Comerciais Desleais, é considerada uma acção enganosa:

Artigo 7.º – Acções enganosas
1 – É enganosa a prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria tomado de outro modo:
(...)
b) As características principais do bem ou serviço, tais como a sua disponibilidade, as suas vantagens, os riscos que apresenta, a sua execução, a sua composição, os seus acessórios, a prestação de assistência pós-venda e o tratamento das reclamações, o modo e a data de fabrico ou de fornecimento, a entrega, a adequação ao fim a que se destina e as garantias de conformidade, as utilizações, a quantidade, as especificações, a origem geográfica ou comercial ou os resultados que podem ser esperados da sua utilização, ou os resultados e as características substanciais dos testes ou controlos efectuados ao bem ou serviço;
(...)
Os bens ou serviços publicitados em todas estas peças da RTP constituem acções enganosas. E a televisão pública acha por bem publicitá-los gratuitamente em horário nobre. Isto não é serviço público. Serviço público seria contribuir para desmistificar estes enganos. Poderia fazer reportagens sobre o assunto. Poderia ouvir os curandeiros. Mas teria que ter sempre um contraponto racional, apresentar o conhecimento científico acerca desta assunto, e não ser um magafone acrítico dos curandeiros e cartomantes. Assim, não é jornalismo. É publicidade enganosa paga com o dinheiro dos consumidores de electricidade portugueses.

Não sei que que se passa pela cabeça da RTP. Nem que concepção delirante de serviço público o justifica. Isto é uma acção (deliberada ou inadvertida) que contribui para acabar com o serviço público de televisão.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

NOVA SÉRIE "COSMOS"


Já é conhecida a data da estreia, nos Estados Unidos da América, da nova série televisiva "Cosmos": 9 de Março de 2014. Estação: Fox (e National Geographic ?).

Relembre-se que esta nova série, homónima daquela primeira e mítica apresetanda por Carl Sagan no incício da década de 80 do século passado, será apresentada pelo divulgador de ciência e astrofísico Neil deGrasse Tyson.

Ficamos a aguardar, com elevada expectativa, sobre onde e quando será transmitida em Portugal. A RTP prestaria um grande serviço público se a pusesse no ar em horário nobre logo a seguir ao telejornal, por exemplo. Aliás, isso aconteceu com a primeira série e então só existia um outro canal, também ele público, a RTP 2.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Uma estranha conversa


Numa das últimas edições do programa da Antena 2 da Rádio Televisão Portuguesa Câmara Clara (também este programa de artes e literatura vai acabar no final deste mês), uma conversa sobre Carlos Drummond de Andrade com Arnaldo Saraiva, professor da Universidade do Porto, que  conviveu com o escritor brasileiro.

Uma estranha conversa, marginal até, no quadro desta lógica social, política e económica inenarrável que insiste em se impor por todos os meios: o "evitamento diplomático" de Arnaldo Saraiva para dissertar sobre a suposta "vida dupla" de Drummond de Andrade; a recordação da recusa do poeta em aceitar a candidatura ao Nobel que estava em adiantada preparação e da reposição que fez duma injustiça na atribuição da autoria dum livro...

Quando mais precisamos destas conversas, mais os canais de difusão se fecham.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Um malandro é um malandro!

Por estes dias de Agosto, ligando a televisão no canal Odisseia, apanhei, por duas vezes, já a meio, um programa com marca da BBC que tem por título Mulheres na Tribo. Tanto quanto pude perceber, a ideia é a seguinte: diversas mulheres ocidentais, talvez inglesas, foram, com uma equipa técnica, passar uma temporada a sociedades mais ou menos isoladas da dita civilização.

Percebe-se que a abordagem tende a ser o que vulgarmente se designa por "cultural", distanciando-se de um certo tipo de reality show, que já conta com versão portuguesa. Mas sendo "cultural" tem algo de muito comum, tornado senso-comum: cada uma das mulheres começa por estranhar os costumes do povo que a acolhe e fazer comparações com os "nossos" costumes, mas acaba por tudo compreender e acolher com base no princípio de que nada há que possa ser classificado indubitavelmente como "certo ou errado", "bom ou mau", porquanto "tudo depende..."

A mulher ocidental do primeiro episódio que vi (na fotografia ao lado) mostrava-se muitíssimo constrangida com a cena dum casamento de duas crianças africanas (na nossa classificação de idades) que havia sido determinado pelo ancião. À medida que a miúda era literalmente arrastada pelas mulheres da tribo para cumprir o compromisso, o choro e a contestação da mulher ocidental aumentavam e, num certo momento, não aguentando mais, refugiou-se algures. As mulheres da tribo explicaram-lhe que o mesmo tinha acontecido com elas; ao fim de uns dias a miúda recuperou o sorriso; o chefe teve algumas amabilidades que lhe fizeram relativizar o facto de "os homens mandarem e as mulheres trabalharem".

A mulher ocidental do segundo episódio que vi ia em busca de si própria, procurava a essência da vida, que só poderia estar na proximidade da natureza. A tribo da América do Sul que a acolheu mostrou-lhe isso mesmo, apesar da sua maior aproximação à cultura ocidental.

Ambas saíram das "suas" tribos com muita pena porque, diziam, deixavam o paraíso para trás.

Não vou entrar na discussão etnográfica clássica, esgrimindo argumentos sobre o tipo de sociedade - "natural" ou "tecnológica" - que mais contribui para a bondade e para a felicidade, apenas gostaria de destacar que, já entrados na segunda década do século XXI, ainda recorremos à estafadíssima grelha de leitura rousseauneana, recuperada e para tudo usada a partir de finais do século XIX. Tal grelha, embora nada original, marcou, nomeadamente, os trabalhos de Margaret Mead.

A este propósito, recupero a leitura que fiz da obra Dez livros que estragaram o mundo, de Benjamin Wiker (Aletheia, 2011), que dedica um capítulo a esses trabalhos, mais ideológicos do que científicos mas inequivocamente icónicos, dados à estampa em 1928 sob o título de Corning of Age in Samoa (Crescer em Samoa). A passagem que se segue (páginas 225-226) é muito representativa do espírito da série a que me referi.
"Quando Hobbes, Rousseau e Freud imaginaram o estado pré-civilizado do homem, não o fizeram com base em dados históricos, mas apoiados em pressuposto; subjacentes a esses pressupostos está a convicção de que aquilo que é natural e original é melhor. Esta análise também se aplica a Thomas Hobbes, cujo estado de natureza era um estado de guerra, porque embora a sociedade civil constitua uma fuga a esta terrível situação, nem por isso os homens deixam de desejar fazer tudo o que querem e alcançar tudo o que procuram. Margaret Mead tentou efectivamente encontrar exemplos vivos dos primitivos seres humanos mas o famoso retrato que fez dos libidinosos samoanos não passa, na realidade, de uma ficção moderna – e não deixaria de ser uma ficção mesmo que os samoanos fossem exactamente como ela os descreve em Crescer em Samoa. A investigação de Mead estava condenado à partida, porque mesmo que encontremos um “povo primitivo” libidinoso, não podemos deduzir que, pelo simples facto de nos parecer mais primitivo, esse povo se encontra mais próximo daquilo que é natural e bom, sendo por isso, um bom correctivo para o nosso modo de vida. O referido povo pode muito bem, se mais primitivo também mais perverso; a sociedade deste povo pode muito bem ter declinado, em vez de ter progredido. O ponto essencial é que o desenvolvimento tecnológico é moralmente neutro. Um malandro é um malandro ande ele armado com um pau ou com uma AK 47; há bárbaros primitivos e bárbaros sofisticados. A falácia que consiste em supor que os homens primitivos são superiores a nós porque são, alegadamente, mais naturais é especialmente perniciosa quando é usada como foi por Margaret Mead, a saber como forma de propor uma teoria sofisticada e altamente questionável sobre a natureza humana."

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Passividade, consumismo e ingenuidade crítica

Parece que, recentemente, uma criança de dois anos e pouco estava ao pé da sua mãe que trabalhava num campo agrícola e, de repente, desapareceu. Foi chamada a polícia e certamente comunicado o acontecido a um canal de televisão: uma equipa apareceu muito afadigada, empolgada e pesarosa para dar notícia e “acompanhar o caso”. Vi num telejornal, em directo ou como se fosse em directo, o que se segue.

Passados dois dias após o desaparecimento, a mãe atendeu um telefonema, o microfone da estação foi-lhe posto junto à boca para que tudo o que dissesse ficasse gravado; deduzi que alguém lhe comunicou que o seu filho havia sido achado. Desligado o telefone, a mãe correu na direcção que lhe tinham indicado, jornalista e câmaras acompanham-na. Avistou-se alguém com a criança, que logo a passou à mãe, esta em pranto, primeiro baixinho e depois alto, pegou-lhe ao colo e abraçou-a profundamente… a câmara de filmar girava, girava em volta da mãe e do filho, apanhando todos os ângulos, todas as emoções; o menino, com ar atónito, curioso, seguia o girar da câmara… a jornalista não se calava, especulava sobre o que teria acontecido, inquiria uma vizinha para que ela dissesse se viu alguém estranho, se a criança tinha sido desviada, raptada, molestada mas a vizinha apenas disse saber de alguém que teria visto qualquer coisa. Ainda assim, excelente! Ficou a suspeita que justifica a continuação da "história de vida" em próximos telejornais. Mãe e filho dirigiram-se para um carro, a jornalista correu para eles e apanhou-os a sentarem-se no bando de trás, ficou a saber-se que iam para o hospital, que a mãe é solteira, que veio de África antes do filho nascer, que o pai não o conhece…

Lazar, num livro muito interessante intitulado Escola, comunicação, televisão (publicado entre nós em 1989 pela Rés Editora), interroga este tipo de desvario, no caso (pseudo) jornalístico: porque aceitamos que alguém exponha a nossa privacidade e intimidade? Acrescento: porque aceitamos que isso aconteça, de modo particular, em situações humanas extremas, como suponho que é a que acima contei?

Como diz Carlos de Sousa Reis, que em Portugal se tem dedicado a esta questão, trata-se de uma combinação de passividade, consumismo e ingenuidade crítica que afecta a nossa sociedade.

sexta-feira, 9 de março de 2012

BACH NA FLORESTA (UM ANÚNCIO JAPONÊS)



"Impossível não ver, ouvir e desfrutar até o final, o fantástico comercial japonês do celular Touch Wood, cujo case – politicamente correto – é feito de madeira. A agência montou uma espécie de xilofone gigante no meio da floresta, e a ação se desenrola ao som de Jesus bleibet meine Freude da cantata nº 147 (Herz und Mund und Tat und Leben) de Johann Sebastian Bach. O aparelho, fabricado pela Sharp, é parte da Coleção Primavera-Verão 2011 lançada pela NTT DoCoMo - umas das operadoras de celulares no Japão - que apresenta 28 modelos. Além dele, os mais interessantes são: o celular Lynx 3D com tela de 3,8 polegadas, capaz de exibir imagens em três dimensões sem a necessidade de uso de óculos especiais, e o celular SH-04C que imita um biscoito. O Touch Wood SH-08C é feito de madeira, possui câmera de 5 megapixel e tela de 3,4 polegadas sensível ao toque. Detalhe: serão vendidos apenas 15 mil aparelhos para clientes da DoCoMo."

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

A CIÊNCIA DO HOCKEY NO GELO

A NBC, com o apoio da National Science Foundation, iniciou uma série de divulgação científica para o grande público sobre a ciência do hockey sobre o gelo. Participa, entre outros cientistas, a matemática portuguesa Irene Fonseca.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

«A Última Fronteira»


Não foi por esquecimento, mas sim por alguma timidez que não referi nesta nossa bela casa virtual que desde Outubro que mantenho uma pequena rubrica semanal aos sábados no programa da RTP1 Bom Dia Portugal; como não podia deixar de ser, são aproximadamente 10 minutos em que tento, com alguma insistência e enorme prazer, levar toda nossa população para outras paragens onde a palavra crise não entra, ou seja, para o Cosmos!

Na semana passada foi assim (a partir do minuto 43) e amanhã, a partir das 10:40h, começamos e acabamos com música! Pelo caminho, vamos até à Lua, regressamos ao asteróide Vesta e vamos ver o que de misterioso se passou há muito tempo atrás, numa galáxia muito, muito distante de nós!

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

"A vitória dos homens sem alma"

Na sequência de outros textos recentemente publicados no De Rerum Natura sobre certas opções programáticas de alguns canais de televisão generalista, reproduzo abaixo excertos do prefácio dum livro intitulado O triunfo das desigualdades. Note-se que tendo sido publicado em 1989, este livro é anterior a estranhíssimos programas que hoje se apresentam e vamos aceitando como normais.

"Olhem bem à vossa volta. A primeira vista de olhos vai revelar-lhes um povo feliz. Feliz porque livre. Perfeitamente livre de escolher, nas páginas publicitárias dos seus jornais, entre o prestígio de várias marcas de sumptuosos automóveis franceses e estrangeiros; livre de dar a sua preferência quer aos jornais impressos pelo Sr. Hersant quer ao canal de televisão do mesmo; livre de hesitar diante da infinda diversidade dos jogos dinheiro e do subtil talento dos folhetins importados que produzem no pequeno ecrã uma nota de sofisticado requinte; livre de participar nos «núcleos de decisão» das firmas privadas e de influenciar as opções estratégicas das empresas nacionalizadas; livre de mandar os filhos para uma escola pública ou para a instituição privada financiada pelo Estado (…). Livre sobretudo de escolher os seus representantes à Assembleia Nacional ou ao Parlamento Europeu, sem verdadeiramente saber qual a visão, qual a aspiração suprema deles, quais os objectivos pelos quais estão determinados a bater-se.

Olhem bem à vossa volta, e respondam, quantos dos nossos contemporâneos estão prontos a aceitar este retrato odiosamente sarcástico de uma sociedade que, sem indignação, se acomoda a crescentes desigualdades, se habitua à injustiça quotidiana, que parece ter perdido toda a faculdade de revolta? Apesar de todas as suas imperfeições a democracia não sucumbirá por causa dos golpes de uma qualquer subversão interna, não será esmagada pelos blindados de um qualquer Império do Mal. Não, a democracia está a esboroar-se, declina, vai definhando ao resignar-se ao seu contrário: o dualismo social e cultural.

Um dualismo social que é a principal alavanca, o meio mais eficaz de acção que os neoliberais poderiam ter achado (…) Dualismo cultural que é o inelutável resgate a pagar por um pensamento desvitalizado em sociedades em que os grandes meios de comunicação passaram para a dependência dos comerciantes (…). Comerciantes esses a quem o Conselho Superior do Audiovisual tenta impor, nos programas televisivos, uma determinada «quota» de obras francesas ou europeias. Não seria sobretudo necessário proibir-lhes que ultrapassassem uma certa «quota» de patetice, de imbecilidade, de baixeza (…)? E, para de salvação pública, retirar-lhes um poder de que eles fazem tão mau uso de cada vez que não o põem ao serviço das mais altas criações do espírito humano a fim de as oferecerem, qual magnifico presente, a toda uma multidão que não tem o privilégio de, por outros meios, lhes descobrir os esplendores?

Existe uma aliança, por vezes incómoda mas diabolicamente eficaz, essencialmente baseada na conivência do dinheiro com os grandes cargos estatais, que associa o poder político com «o poder bem mais perigoso dos comerciantes» e com o seu «poderoso e venenoso cúmplice […]: o poder dos “mass-media”, e que tem, no fim de contas, a finalidade de preparar «a vitória dos homens sem alma». Estas fórmulas, tão simples, tão fortes, fomo-las buscar a Ariane Mnouchkine, ao seu magnífico «apelo à resistência» por ela lançado aos «cientistas» e aos «artistas»."

Claude Julien

Referência completa: Julien, C. (1990). Prefácio in O triunfo das desigualdades. Lisboa: Caminho 9-15.

TDT ou... TNT!



O meu caro amigo Luís Miguel Loureiro, jornalista da RTP, apresentou-nos hoje esta estória... e eu sinto-me indignado e envergonhado! Indignado e envergonhado porque vivemos num país com sabedores que ficam contentes por colocarem de parte mais de 10% da população; indignado e envergonhado pelo desplante do senhor da ANACOM em afirmar a alto e bom som que "quer queiram quer não queiram" será assim e paguem lá a digital fortuna em ano de severa crise; indignado e envergonhado por não compreender como é que uma empresa que gere lucros astronómicos como a PT não consegue dar uma resposta tecnológica satisfatória a esta questão. E, finalmente, indignado e envergonhado porque a História do Avanço Científico e Tecnológico é uma história de inclusão, de democratização, de chegada a muito mais pessoas com mais e melhor e esta triste estória conta-nos precisamente o oposto. Parabéns ao Luís por um belo trabalho de serviço público numa altura em que falar de serviço público é algo que dá comichão!

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Patamares que poucos souberam antever

Na continuação dos textos Ninguém os obriga e O argumento do botão para nos determos na falácia que é a ideia comum de que tudo, no caso, programas de televisão, pode ser apresentado, cabendo a cada um decidir se quer ou não ver.

Muitas pessoas simplesmente vêem o que se lhes dá a ver. E são mesmo muitas as que vêem televisão! Os programadores sabem bem isso. Mais: programam em função disso! E sabem também que a fórmula quanto-pior-melhor é infalível. Mais: sem quaisquer valores a balizarem-na, havendo imaginação, é uma fórmula com infinitas possibilidades!

Quando terminam, neste final de ano, na televisão portuguesa, programas em que a ideia de Pessoa está completamente ausente, temos fortes razões para temer o que se seguirá, sobretudo se lermos opiniões de quem sabe bem do que fala. É o caso de Rodrigo Guedes de Carvalho:
"(...) o chamado entretenimento apenas conseguiu o que já se receava: continuar, e ampliar, atentados cerebrais nascidos com o original “Big Brother”. De então para cá, a quantidade e diversidade de palermices que levam os nomes de reality ou talk-shows fez-nos descer a patamares que poucos souberam antever. E é nestes extremos que, no futuro próximo, a televisão mais se aproximará da sua maior virtude e do seu maior perigo: ajudar a educar (pela qualidade de muitas séries e muitos canais temáticos) quem a saiba aproveitar; mas também ajudar a transformar simples medíocres em completos atrasados mentais, pelo tipo de mensagem que veicula, pelo discurso que difunde, pela opacidade e vazio que pode contagiar gerações. No panorama actual, nada é mais sintomático do que aquele vómito chamado “Casa dos Segredos”. Não é o único, não é o primeiro, e não será certamente o último, mas é o que está no ar..."
Maria Helena Damião e João Lacerda

domingo, 4 de dezembro de 2011

O argumento do botão

Na continuação do texto Ninguém os obriga!

Tenho-me apercebido de outro argumento para justificar programas de televisão em que não encontro qualquer justificação, como sejam os que cabem na categoria de reality shows: “os aparelhos têm botões: quem não os quer ver que use o botão de desligar”.

Ainda que, por suposição, todos ou a maioria dos espectadores usasse esse botão quando percebesse a transposição de certas fronteiras éticas, isto não teria efeitos regressivos: não evitaria, portanto, a transposição de tais fronteiras, apenas evitaria que a transposição fosse vista, integral ou parcialmente.

Logo, em rigor, não poderiam ignorar-se transposições desse teor, dado que, materialmente, elas já aconteceram, e são elas que constituem o primeiro problema. É nele que autores de programas, críticos de televisão, patrões e accionistas, jornalistas e apresentadores, terão, mais dia menos dia, de se centrar: “até onde é legítimo irmos”? Eis o que devem perguntar a si próprios, isto se não se perguntam já.

E que não percam tempo, nem nos iludam, com essa ideia peregrina de que quem tem “o poder do botão” é que deve decidir, porque sabem perfeitamente que a estratégia do quanto-pior-melhor, que ajudaram a criar, funciona entre os espectadores e evolui a cada dia que passa.

Sobretudo não convoquem a escola para ensinar as crianças, os jovens e os adultos a “carregar no botão”, como tenho visto vezes de mais referido.

O nosso homem em estúdio

"(...) Existiram muitos momentos em que nada se disse,
porque os astronautas foram dormir e tive que esperar
que eles acordassem. (...) tinha levado muita literatura,
nomeadamente um artigo fabuloso, do Norman Mailer,
que já falava das perspectivas da chegada do Homem à Lua."
José Mensurado.


De 20 para 21 de Julho de 1969, José Mensurado, o tranquilo jornalista da Rádio e Televisão Portuguesa, que havia acompanhado e noticiado andanças das várias Apollo pelo espaço, foi o nosso homem em estúdio para, via CBS, dar conta da chegada à Lua, da saída de Neil Armstrong da nave e do primeiro passo que deu em solo não terrestre.

Antes de todos os portugueses, foi ele quem, pelos auscultadores, o ouviu dizer, em voz pausada, mas muito segura: “Um pequeno passo para o homem, mas um salto gigantesto para a humanidade”.

Emocionou-se com tudo isso, disse mais tarde, na sua sobriedade. Emocionou-se, sobretudo, quando viu a Terra do espaço. E disse também que “foi uma honra” ter acompanhado tudo isso, e ter “a sensação de que estava a entrar, embora como jornalista, para protagonista da história”.

Dessa emissão em directo, que durou 18 horas, onde a ciência, a tecnologia foi acompanhada de literatura não existe registo em arquivo da Televisão. Resta a memória que José Mensurado nos legou (que se pode ver, por exemplo aqui) e a memória do próprio José Mensurado.

Sítios consultados:
http://www.rtp.pt/web/historiartp/1960/homem_lua.htm
http://www.casadaimprensa.pt/?p=1501#more-1501
http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=33400&op=all

Untraceable

Em comentário a texto anterior, o leitor Fernando Caria enviou-nos um comentário onde destacou o filme Untraceable, do ano de 2008, realizado por Gregory Hoblit.

Assim o resume: "o público de internet acede a um website onde se pode ver a morte atroz de uma pessoa, que morrerá mais depressa, quanto maior fôr o número de acessos ao website. A cada nova vítima, apesar dos apelos da polícia para não se ligarem ao website, o número de acessos salta de dezenas de milhares para milhões."

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Ninguém os obriga!

Tenho tropeçado muito num certo argumento para justificar a exposição que se faz de pessoas até limites inimagináveis em programas de televisão, reduzindo-os a objectos bizarros, que, nessa medida, prendem a atenção. “Ninguém os obriga! São eles que querem!”, é o argumento.

Se nos situarmos no mundo dos concursos que apelam a “vivências reais” e conversas com “pessoas reais”, o argumento poderá parecer razoável: os concorrentes, os entrevistados sabem ao que vão e recebem contrapartidas. Dão a ver (ou simulam que dão a ver) ao mundo o que lhe é mais íntimo, o seu corpo, os seus pensamentos, os seus afectos, tudo o que se lhes pedir. Por isso são pagos. É um negócio como outro qualquer.

Devo dizer que discordo em absoluto deste argumento.

O conhecimento do passado permite concluir que haverá sempre quem esteja disposto a fazer qualquer coisa, por mais infame que seja, a troco de muito ou de pouco, disto ou daquilo. Imagine-se algo verdadeiramente vil e ter-se-á por certeza que existe quem a execute.

No caso desses programas, o limite a partir do qual não podemos, sob pretexto algum, dispor dos outros, ainda que eles aceitem dispor-se, foi há muito ultrapassado.

A responsabilidade, diz-se, é partilhada e, como tal, de ninguém: patrões, público, clientes, candidatos, profissionais... Os clientes ficam presos ao ecrã, os candidatos não faltam, os patrões vêem oportunidades de negócios, e os profissionais executam.

Nesta cadeia, poderá parecer que estes últimos são os menos comprometidos. Não são. Muitos deles fizeram estudos superiores e, nessa medida, terão consciência que devem pautar o seu desempenho por princípios éticos. São sobretudo eles, e não os candidatos ou o público, quem terá mais consciência informada do que é tolerável e intolerável na relação com o outro.

Mas como uma apresentadora desses programas declarou a uma revista: "quem tem ética passa fome". Talvez.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Os cavalos também se abatem

Parece-me que entendi melhor quando a barbárie se instala numa sociedade. Não, não é quando ela se manifesta: é quando se torna normal, quando ninguém a impede de alastrar, quando se olha para ela e se percebe que será em vão denunciá-la e uma ilusão combatê-la.

Não é preciso esforçarmo-nos muito para encontrarmos nos últimos anos, meses fortes indícios de retorno a esse estado primitivo da civilização. Se alguns são evidentes, outros passam despercebidos.

Um destes indícios são certos programas de televisão onde se manipulam, se expõem até ao tutano certas pessoas, como se fossem coisas, ou menos de que isso. Outras pessoas (muitas, a avaliar pelo horário de transmissão) assistem, envolvem-se, decidem...

Passei por um desses programas tipo big-brother e vi (não sei se verdade se encenação) um rapaz e uma rapariga envolvidos sexualmente. Estranhamente, (já) não estranhei; o que (ainda) estranhei foi o que se passou a seguir. E o que se passou a seguir foi esse momento, guardado em vídeo para a eternidade, ser mostrado, em estúdio, à rapariga e, como se adivinha, dissecado, comentado ao pormenor. De seguida, calhou a vez à mãe da rapariga. Próximo, bem próximo delas, outras pessoas apreciavam, riam, batiam palmas. Ouvi ainda dizer que a rapariga tinha estudos superiores, em direito, queria ser ou já era advogada.

Não pude deixar de me lembrar do filme Os cavalos também se abatem, de Sydney Pollack, baseado no romance They shoot horses, don't they?, da autoria de Horace MacCoy. Nesse filme de 1969, conta-se como na América, nos anos trinta, em plena grande depressão, os concursos de dança, tornados manipulação pura, atraíam. Percebi, ao ver o sofrimento extremo de Jane Fonda (é o sofrimento dela que tenho mais presente), que, com grande facilidade, pessoas podem transformar outras pessoas em não-pessoas. Nesses inícios dos anos oitenta, pensei que aquela barbárie que o filme mostrava, com uma ligação à realidade, era distante de mais para se passar entre nós. Não era, afinal.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

O FÍSICO BRIAN COX NO PROGRAMA DE HARRY HILL



O físico da Universidade de Manchester Brian Cox surge aqui em interacção com o comediante Harry Hill, num dos programas de maior êxito da TV britânica. Para quem não tenha medo de enfrentar as grandes questões do Universo...

O FENÓMENO DA CONSCIÊNCIA É COMO O DA EXISTÊNCIA DO UNIVERSO - DAVID LODGE

Faleceu David Lodge, o polifacetado escritor britânico que manteve na ficção uma ironia finíssima e absolutamente corrosiva. A diversidade h...