ARTIGO 5 - RAM Fitoterápicos 2018
ARTIGO 5 - RAM Fitoterápicos 2018
ARTIGO 5 - RAM Fitoterápicos 2018
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Márcia Lombardo1*
1
Pesquisadora Científica, Centro de Medicamentos,Cosméticos e Saneantes, Instituto Adolfo Lutz, São Paulo, SP .
*Correspondência: [email protected]
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RECEBIMENTO: 11/01/18 - ACEITE: 12/03/18
Resumo
A ideia de que os medicamentos fitoterápicos são produtos que não causam males à saúde ainda é muito difundida. No
entanto, as pesquisas relacionadas com a segurança de plantas medicinais e fitoterápicos são crescentes, bem como os
esforços para aprimorar a regulamentação destes produtos. A fim de destacar os riscos que os medicamentos
fitoterápicos podem oferecer ao paciente, neste trabalho foi realizada uma análise do potencial adverso dos mesmos
segundo os dados da literatura, sendo selecionados aqueles de registro simplificado e venda sob prescrição médica. De
acordo com a ação farmacológica, os medicamentos foram agrupados em sete categorias: infecções (uva-ursi,
equinácea), distúrbios intestinais (plantago, hortelã-pimenta), distúrbios circulatórios (ginkgo), enxaqueca (tanaceto),
distúrbios mentais (hipérico, kava-kava, valeriana), hiperplasia da próstata (saw palmetto) e climatério (cimicífuga). Os
aspectos negativos que mais se destacaram foram: potencial hepatotóxico no uso prolongado, reações alérgicas ou
irritantes, efeito fotossensibilizante, interferência na coagulação sanguínea e maior risco de hemorragia, efeito
uterotônico e maior risco de aborto, alterações na habilidade e atenção, interferência na regulação hormonal e interações
medicamentosas com diversas classes de fármacos. Constatou-se que os dados de segurança destes medicamentos para
gestantes, lactantes e crianças ainda são insuficientes e, portanto, o uso não é indicado, exceto sob supervisão médica.
Neste contexto, é importante que profissionais de saúde priorizem o uso racional de medicamentos fitoterápicos, à
semelhança dos medicamentos convencionais.
Abstract
The idea that herbal medicines offer reduced risks to the patient is still widespread. However, the researches related to
the safety of herbal medicines are increasing as well as efforts to improve the regulation of these products. In this work,
an analysis on the adverse potential of some herbal medicines was carried out, in order to highlight the risks that they
can offer the patient, with those of simplified registration process and sale under medical prescription in Brazil being
selected from literature survey. According to the pharmacological action, the drugs were grouped into seven categories:
infections (bearberry leaf, purple coneflower herb), irritable bowel syndrome (ispaghula husk, peppermint leaf),
circulatory disorders (ginkgo leaf), migraine (feverfew), mental disorders (St. John's Wort, Kava Kava, Valerian Root),
benign prostatic hyperplasia (Saw Palmetto fruit) and climacteric (Black Cohosh). The negative aspects that could be
highlighted were: hepatotoxic potential in long-term use, allergic or irritant reactions, photosensitizing effect,
interference with blood coagulation and increased risk of bleeding; uterotonic effect and increased risk of abortion,
changes in ability and attention, interference in hormonal regulation and drug interactions involving several classes of
drugs. It was found that safety data for use in pregnant women, nursing mother and children are still insufficient and the
use of these products is not indicated, except under medical supervision. Therefore, it is essential that health
professionals prioritize the rational use of herbal medicines, similar to conventional medicines.
Introdução
Quadro 1 - Elenco de medicamentos fitoterápicos de registro simplificado com venda sob prescrição médica
Infecções do
Arctostaphylos uva-ursi (L.) Spreng. Uva-ursi Ericaceae Folha
trato urinário
Raiz ou Sintomas do
Actaea racemosa L. Cimicífuga Ranunculaceae
rizoma climatério
Infecções do
Partes aéreas
Echinacea purpurea (L.) Moench Equinácea Asteraceae trato urinário e
floridas
respiratório
Distúrbios
Ginkgo biloba L. Ginkgo Ginkgoaceae Folha
circulatórios
Hortelã-
Mentha piperita L. Síndrome do
pimenta Lamiaceae Folha
cólon irritável
Introdução
Espécie Nome popular Origem
no Brasil
Ásia-Tropical, Ásia-
Plantago ovata Forssk. Plantago Temperado, Espanha, África e Nãob
América do norteb
Serenoa repens (W. Bartram) Small. Saw palmetto América do norteb Nãob
a-Plant Database/University of Connecticut (UCONN); b-Plants of the World On Line (POWO); c-European
Medicines Agency Database (EMA); d-Tropicos Database
De acordo com as bases de dados botânicas pimenta, na Região Sul (Figuras 1 a 3). Registros
as espécies mais frequentes no Brasil (Quadro 2) são apontam também para ocorrência de equinácea e
tanaceto, com distribuição por todo país, hipérico, plantago no país.17,18
predominantemente na Região Sudeste e hortelã-
Uso adulto e
Casca da 3 a 30 g do pó, padronizado de acordo pediátrico
Plantago
semente com o índice de intumescência acima de 6
anos
Distúrbios
intestinais Uso adulto e
Óleo volátil
Hortelã- 60 a 440 mg de mentol e 28 a 256 mg pediátrico
das partes
pimenta de mentona acima de 8
aéreas
anos
Extrato seco
Enxaqueca Tanaceto das partes 0,2 a 0,6 mg de partenolídeos Uso adulto
aéreas
Extrato seco
etanólico da 0,9 a 2,7 mg de hipericinas totais
Hipérico Uso adulto
sumidade expressas em hipericina
florida
Uso adulto e
1,0 a 7,5 mg de ácidos
Extrato seco pediátrico
Valeriana sesquiterpênicos expressos em ácido
da raiz acima de 12
valerênico
anos
Extrato
Hiperplasia
lípidico
benigna da Saw palmetto 272 a 304 mg de ácidos graxos Uso adulto
esteroidal dos
próstata
frutos
Quadro 4 - Resumo dos principais elementos de risco dos medicamentos fitoterápicos em estudo
Infecções do
Náusea; vômito; febre; reações Reações alérgicas graves em pacientes
Equinácea trato urinário e Não conhecidas
alérgicas atópicos
respiratório
Inchaço dos lábios; ulceração da Aumenta o risco de hemorragia quado Não indicado para pacientes com distúrbios
mucosa oral no uso prolongado; associado a anticoagulantes; pode interagir de coagulação ou em fase pré-cirúrgica;
Tanaceto Enxaqueca
problemas gástricos; erupções com diversos fármacos que são efeitos rebote na suspensão abrupta do
cutâneas metabolizados no fígado tratamento
Quadro 4 - Resumo dos principais elementos de risco dos medicamentos fitoterápicos em estudo (Continuação)
Conclusões
O grupo de medicamentos adotado neste estudo necessidade da prescrição, os agravos para os quais
mostrou-se representativo para a temática estes medicamentos são indicados não correspondem
pretendida. De maneira geral, os medicamentos a problemas autolimitados, evidenciando a
fitoterápicos de registro simplificado e de venda sob importância do acompanhamento médico para que
prescrição médica possuem contraindicações e condições patológicas mais críticas não sejam
precauções de uso significativas, a depender das negligenciadas ou mascaradas. Por isso, é
particularidades clínicas do paciente, e podem causar fundamental que os profissionais de saúde priorizem
reações adversas graves, bem como interações o uso racional de medicamentos fitoterápicos, à
medicamentosas importantes. Além disso, os dados semelhança dos medicamentos convencionais, desde
de segurança para gestantes, lactantes e bebês são a prescrição adequada, o acompanhamento
insuficientes, devendo o uso ser criteriosamente terapêutico e a notificação de reações adversas,
avaliado. Além do potencial adverso, que justifica a trazendo também contribuições de relevância para a
área da farmacovigilância.
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