Ramos 2016
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Ramos 2016
Rui Ramos
O panorama linguístico de Timor-Leste, como o de outros países e áreas desta região do globo e de
outras regiões, é fortemente caraterizado por uma avassaladora diversidade. Num território muito restrito,
é possível identificar um conjunto alargado de línguas, dialetos e variantes, que constituem um quebra-
cabeças para qualquer decisor político que tenha de configurar o país com unidade e coerência, mas
também um desafio muito aliciante para quem queira olhar para a realidade timorense como um
laboratório linguístico vivo e atual.
Questões como esta têm sido objeto de análise e reflexão, pelo menos desde a década de ’90 do
século passado, por estudos que configuram a diversidade biocultural e que vêm dando importância à
articulação entre língua, cultura e ambiente natural (ou território). O assunto não pode ser encarado de
forma simplista, identificando laços de correlação deterministas, mas reconhecendo a complexidade das
mútuas influências. Ainda assim, Luisa Maffi aponta alguns fatores climáticos e geográficos que
condicionam globalmente todos os tipos de diversidade:
no início do século XXI, a biodiversidade global está a sofrer uma crise de extinção,
com estimativa de perdas anuais de espécies de plantas e animais pelo menos 1.000
1
Todas as citações foram traduzidas para língua portuguesa para facilidade de leitura. As citações de originais em língua
portuguesa viram atualizada a sua grafia seguindo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990.
2
Segundo o sítio Ethnologue (http://www.ethnologue.com), existem atualmente 7.102 línguas no mundo.
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vezes maiores do que os dados históricos precedentes. A diversidade linguística sofre
uma crise similar. O desaparecimento de línguas, em algumas áreas como as Américas,
atingiu os 60% ao longo dos últimos 35 anos (2012: 8032).
Estes autores afirmam a existência de uma correlação significativa entre “pontos quentes” (hotspots)
de biodiversidade (regiões caraterizadas por ocorrências excecionalmente altas de espécies endémicas e
por perdas de, pelo menos, 70% do seu habitat natural) e regiões de grande diversidade linguística.
Identificam 35 hotspots de biodiversidade no mundo nos quais se concentram 3.202 línguas, quase
metade das atualmente existentes. Citam explicitamente, entre estes casos, o da Wallacea, área geográfica
onde se inclui Timor-Leste, com mais de 250 línguas autóctones. Na figura 1, apresenta-se a distribuição
geográfica de línguas autóctones e não migrantes no mundo (dados de 2009):
A figura 2 apresenta a área geográfica que corresponde à Wallacea onde, como foi afirmado, Timor-
Leste se inclui:
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A figura 3 apresenta um quadro geral da diversidade de plantas e de línguas no mundo. Como pode
verificar-se, as zonas mais ponteadas a preto são aquelas onde há maior diversidade linguística e pode
constatar-se que correspondem largamente às zonas de maior diversidade vegetal (marcada com cor mais
escura).
Figura 3 - diversidade vegetal e diversidade linguística (Stepp et al., 2004, apud Maffi, 2005: 619)
3
Esta obra recente, apresentando uma espécie de “estado da arte” do assunto, apresenta um largo conjunto de referências
(mais de 80) que podem ser úteis aos interessados.
4
“Timor é um só”.
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A diversidade biocultural no discurso institucional global
Nesta equação, o respeito pela diversidade biocultural terá de ser equacionado, como muitos
académicos vêm apontando. Não só os académicos, porém. Também os decisores políticos a nível global
reconhecem crescentemente o papel primordial da diversidade biocultural na construção e preservação da
identidade dos povos.
É nesse sentido que se orienta a Convenção sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das
Expressões Culturais, aprovada pela Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em 2005. No seu Artigo 4º, a Convenção esclarece que a
diversidade cultural se refere à “multiplicidade de formas em que se expressam as culturas dos grupos e
das sociedades”. No seu preâmbulo, afirma-se explicitamente que “a diversidade cultural é uma
caraterística essencial da Humanidade”; que esta “deve ser valorizada e preservada em benefício de
todos”, na medida em que “gera um mundo rico e variado, que alarga as possibilidades de escolha e nutre
as aptidões e os valores humanos, constituindo, portanto, um motor fundamental do desenvolvimento
sustentável das comunidades, dos povos e das nações”; que “se desenvolve num quadro de democracia,
de tolerância, de justiça social e de respeito mútuo entre os povos e as culturas, (…) [sendo] indispensável
à paz e à segurança a nível local, nacional e internacional”. Reconhece-se que “a diversidade linguística é
um elemento fundamental da diversidade cultural” e reafirma-se “o papel fundamental que a educação
desempenha na proteção e na promoção das expressões culturais”.
Reconhece-se igualmente nessa Convenção que
No seu artigo 2º, a Convenção apresenta oito princípios pelos quais se rege:
- Princípio do respeito dos direitos humanos e das liberdades fundamentais;
- Princípio da soberania;
- Princípio da igual dignidade e do respeito de todas as culturas;
- Princípio da solidariedade e da cooperação internacionais;
- Princípio da complementaridade dos aspetos económicos e culturais do desenvolvimento;
- Princípio do desenvolvimento sustentável;
- Princípio do acesso equitativo;
- Princípio da abertura e do equilíbrio.
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A diversidade biocultural como riqueza diferenciadora em Timor-Leste
O que foi apresentado acima tem por objetivo sublinhar, da forma mais veemente possível, que os
timorenses possuem uma riqueza dificilmente igualável, e que essa riqueza não é o petróleo, mas um bem
imaterial, pedra angular da sua identidade. A diversidade biocultural que carateriza este povo e esta terra
é, entre outros aspetos, uma marca diferenciadora e justificativa da sua independência política, um
produto da sua história e uma garantia de identidade ao longo dos tempos. Essa diversidade biocultural
inclui, naturalmente, um pilar fundamental: a diversidade linguística que, como foi afirmado no início
desta exposição, é uma bênção, um desafio e um quebra-cabeças.
A componente mais difícil de enfrentar, o tal quebra-cabeças, prende-se essencialmente com a
coesão nacional, impossível de assegurar sem elementos que, contrabalançando a diferenciação,
promovam a unidade na diversidade. E Timor-Leste, tal como todos os restantes países do mundo, deve
lutar, na medida das suas possibilidades, contra as “crises convergentes de extinção” (Harmon, 1995) que
ameaçam o equilíbrio da vida.
Neste cenário, seria possível o Estado timorense sobreviver sem língua(s) nacional/ais, que
permita(m) a intercompreensão de todos os cidadãos e o acesso à informação, à educação, aos serviços do
Estado?
É legítimo pensar que não. Timor-Leste, país independente e coeso, não sobreviveria sem uma ou
várias línguas dominadas pela generalidade dos seus cidadãos.
Mas não seria viável que todas as línguas locais, ou a maioria delas, pudessem ser adotadas como
línguas nacionais. Os motivos são muitos, mas dois impõem-se de imediato: trata-se de línguas ágrafas e
nunca foram devidamente descritas e formalizadas. Aliás, essa circunstância constitui um obstáculo
inultrapassável a uma ideia peregrina que fez caminho na sociedade e nos meios políticos timorenses
durante vários anos, que previa o ensino da leitura e da escrita destas línguas ágrafas no início da
escolaridade.
Do ponto de vista linguístico, não se trata de línguas “menores” ou “primitivas” porque, para um
linguista, todas as línguas são válidas, são produto e são condicionante da sociedade que as usa. Contudo,
do ponto de vista funcional e da organização do Estado, são inadequadas para servir os propósitos de
garantir coesão e sentimento de pertença. Mesmo o tétum, língua cooficial ao lado do português, e hoje
mais desenvolvido do que à data da independência do país, padece em larga medida desta inadequação.
Esclareça-se o conceito de “adequação”, Mühlhäusler (2001 (1983)) considera que as línguas devem
apresentar os seguintes tipos de adequação: a) adequação referencial (a capacidade da língua de ir ao
encontro das necessidades dos seus falantes como instrumento de significação referencial – ou
referenciação); b) adequação sistemática (a capacidade de a língua constituir uma estrutura que tenda
para a máxima economia e a máxima eficiência, e ter uma estrutura semântica clara e uniforme, com uma
terminologia traduzível sem ambiguidades); c) adequação social (a língua deve ser aceitável pelo maior
número possível de falantes numa dada comunidade, deve promover a unidade social e a
intercomunicação e prover às necessidades presentes e futuras).
Numa outra publicação com outros autores (HARRÉ et al., 1999), Mühlhäusler acrescentará a estes
um outro item: a adequação ambiental (a capacidade de disponibilizar aos falantes recursos para estes se
pronunciarem sobre questões ambientais e construírem uma relação harmoniosa com os ecossistemas).
Ora, fácil é de constatar que as línguas locais não preenchem estes requisitos. O seu uso mais ou
menos forçado em circunstâncias alheias aos seus contextos de utilização históricos promoveria,
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certamente, a importação massiva de léxico, construções sintáticas e valores semântico-pragmáticos com
um excecional potencial de as descaraterizar rapidamente.
Fica o recurso à língua do antigo colonizador. Tal como foi opção nas antigas colónias portuguesas
em África, o português, “não sendo língua de ninguém, poder ser de todos”. Ou seja, não sendo a língua
de um grupo restrito, pode ser tomada como língua de todos os timorenses. A apropriação da língua
portuguesa, que os timorenses foram fazendo ao longo da história, é parte da cultura timorense e fonte de
muito do léxico do tétum; é também influência aos níveis fonético, sintático e semântico-pragmático.
Sendo uma língua de cultura, com um património literário extenso, evoluída e plástica, a língua
portuguesa fornece aos seus falantes os instrumentos para a comunicação, cumprindo a sua função
externa; contudo, como todas as línguas, tem também uma função interna: o pensamento. Com maior
poder de servir o pensamento abstrato do que tétum, a língua portuguesa pode ser vista como uma fonte
de desenvolvimento intelectual ao nível individual e coletivo.
Além disso, como pode ler-se no Programa de Ação de Lisboa, da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa (CPLP), o domínio da língua portuguesa “dá aos falantes de cada língua materna uma
oportunidade igual de acesso e permanência no sistema educativo, capaz de promover e de reforçar a
inclusão e a paz social” (CPLP, 2014). O uso da língua portuguesa estabelece ainda fortes laços com toda
a comunidade lusófona, espalhada pelos vários continentes, e dá acesso a múltiplas possibilidades ao
nível cultural, educativo ou de negócios na sociedade global. Note-se que a língua portuguesa é uma das
mais faladas do mundo, é a que tem mais falantes nativos no hemisfério sul, apresenta grande dinamismo
demográfico e é uma das três línguas contemporâneas com vocação global (ao lado do Inglês e do
Espanhol). Não concorrendo nos mesmos usos e práticas culturais que as línguas locais, tem menor
probabilidade de as influenciar e se sobrepor, favorecendo a preservação daquelas. Desta forma, favorece
a unidade na diversidade.
Missão do ILP
Desde 1999, a cooperação entre Timor-Leste e os países lusófonos, com natural relevo para Portugal
e o Brasil, concretizou-se em múltiplos projetos e programas. A vertente da língua assumiu entre eles
papel saliente.
Neste quadro de cooperação, em janeiro de 2014, foi assinado entre o Camões, Instituto da
Cooperação e da Língua, I. P., e a Universidade Nacional Timor-Lorosa’e (UNTL) um memorando de
entendimento com vista à criação, na estrutura da UNTL, do Instituto da Língua Portuguesa (ILP).
De acordo com o memorando, este organismo encontra suporte para a sua criação no reconhecimento
de que o domínio da língua portuguesa pelos cidadãos timorenses constitui um vetor de grande relevo
para o desenvolvimento socioeconómico do país, assim como para a sua afirmação geoestratégica no
contexto regional. Poderíamos acrescentar que o domínio da língua portuguesa é um direito de todos os
cidadãos timorenses, decorrente da consagração constitucional do português, ao lado do tétum, como
língua nacional em Timor-Leste; e que daí decorre a obrigação de a instituição educativa nacional facultar
a formação em língua portuguesa a todos os interessados, na medida dos recursos existentes.
O memorando de entendimento abre portas à construção de um projeto ambicioso e abrangente,
numa perspetiva de médio e longo prazo, com uma estratégia consistente. Contempla quatro áreas de
atuação, que compreendem o desenvolvimento de competências didático-pedagógicas e tecnológicas de e
em língua portuguesa dos docentes da UNTL e de outras universidades; o desenvolvimento de
competências em língua portuguesa dos alunos da UNTL, de funcionários públicos e da sociedade civil; o
estabelecimento de parcerias as para a formação em língua portuguesa em instituições universitárias dos
países da região.
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Estes objetivos podem ser estruturados em seis domínios: a) organização interna e funcionamento do
ILP (seleção de docentes, elaboração dos estatutos, definição de projetos de investigação, alocação de
recursos materiais, criação de imagem institucional e webpage, definição de um referencial de
proficiência linguística em língua portuguesa adequado à realidade timorense); b) formação em língua
portuguesa para a UNTL (para docentes, funcionários e alunos); c) formação em língua portuguesa para
outras instituições de ensino superior; d) formação em língua portuguesa para a Administração Pública e
restantes agentes do Estado e da sociedade civil nos vários municípios; e) promoção da língua portuguesa
na sociedade (em articulação estreita com os órgãos de comunicação social, nomeadamente os públicos);
f) projeção da língua portuguesa no contexto regional (com protocolos que prevejam a oferta formativa
em países da região).
Estes são os domínios de atuação que podem ser definidos com base no memorando que deu origem
ao ILP e que definem outras tantas linhas de atuação. Exigem planeamento atempado, visão de médio e
longo prazo, constância na ação e determinação. Exigem também uma gestão atenta, ativa e consistente
do instituto, com articulação eficaz entre todos os seus membros (diretor, coordenadores e professores),
solidamente fundamentada no conhecimento científico acumulado e cumprindo as práticas académicas e
científicas que devem nortear a ação de um instituto integrado numa universidade, espaço privilegiado da
ciência.
Ação do ILP
Até ao momento5, a ação do ILP tem-se concretizado num conjunto de processos e de produtos, que
a seguir se apresentam por domínio.
1. No primeiro âmbito, da sua organização interna, há a assinalar a constituição de uma equipa de
professores com conhecimentos específicos e/ou experiência no ensino da língua portuguesa como língua
segunda/estrangeira, maioritariamente portadores do grau de mestre, de um coordenador logístico e de um
coordenador científico e pedagógico com doutoramento, oriundo de uma universidade portuguesa.
Contudo, a formalização do instituto no quadro da UNTL ainda não foi concretizada e o ILP não dispõe
ainda de estatutos próprios.
Como trabalho de base e guia para a definição de objetivos, conteúdos e estratégias de ensino da
língua portuguesa, surge o desenvolvimento, que se encontra em curso, de um referencial de proficiência
em língua portuguesa específico para o contexto timorense, inspirado no Quadro Europeu Comum de
Referência para as Línguas. Um referencial deste tipo permitirá definir planos e cursos de língua
portuguesa, avaliar conhecimentos e competências prévios dos candidatos à formação, avaliar a
aprendizagem dos alunos, avaliar o próprio processo de formação e certificar conhecimentos e
competências de forma rigorosa e cientificamente validada.
Fora do âmbito do ILP, um referencial de proficiência linguística também permitirá aos promotores
de cursos de língua portuguesa a construção de programas, de metas de aprendizagem e de níveis de
mestria linguística que os formandos devem alcançar.
Um referencial com aceitação pela comunidade científica timorense, pelos decisores políticos, pela
Administração Pública e por todos quantos estão envolvidos em formação e divulgação em/da língua
portuguesa deve ser visto como um instrumento basilar da política de língua do país. Permitirá a seleção
de candidatos à Função Pública de modo rigoroso, a organização de planos de formação com requisitos
apurados e bem definidos no seu desenho, estudos científicos sobre perceções e sobre o domínio da
língua portuguesa pelos vários setores ou grupos da sociedade, entre muitas outras possibilidades.
5
Como este texto corresponde, com alterações menores, a uma conferência proferida em abril de 2015, alguns dados podem
estar desatualizados à data da respetiva publicação.
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2. No âmbito da oferta de formação em língua portuguesa dentro da UNTL, há que assinalar os
cursos de língua para estudantes de mestrado, para funcionários, para docentes que farão doutoramento
em Portugal e aulas extracurriculares para alunos do 1º ano da Licenciatura em Ensino da Língua
Portuguesa.
Os docentes do ILP, em articulação com os docentes do Departamento da Língua Portuguesa e
alguns do Departamento de Disciplinas Transversais, organizaram portefólios de materiais didáticos para
33 unidades curriculares, essencialmente pertencentes à formação de professores de língua portuguesa.
Desta forma, os docentes da UNTL passaram a dispor em 2015 de materiais revistos, organizados e
selecionados segundo critérios mais sólidos, que poderão utilizar nas suas aulas.
No início do ano de 2015, vários professores do ILP passaram lecionar cinco unidades curriculares
da Licenciatura em Ensino da Língua Portuguesa e de uma da Licenciatura em Filosofia, a pedido dos
departamentos respetivos. Esta ação apoia os docentes da UNTL e oferece mais garantias de ensino de
qualidade (nomeadamente, porque evita sobrecarga letiva aos docentes ou a constituição de turmas
excecionalmente numerosas). Além disso, asseguram a orientação de 18 monografias de final de curso.
Desde fevereiro de 2015, os professores do ILP apoiam igualmente a redação de nove dissertações de
mestrado, cujos orientadores se encontram em Portugal e que vêm sentindo dificuldades de comunicação
com os estudantes.
Em fevereiro de 2015, o senhor vice-reitor para os assuntos académicos solicitou a oferta de cursos
de língua portuguesa e de didática para os docentes da UNTL. Um procedimento básico exige a
realização de um exame de diagnóstico, para o posicionamento dos estudantes e a organização de turmas
de nível.
Mas foi decidido alargar essa avaliação, realizando um estudo de teor sociolinguístico tendo como
público todos os docentes. Utilizando um inquérito, analisar-se-ão as perceções sobre as línguas, quais as
que são dominadas pelo público, que práticas culturais e linguísticas são mais comuns, que formação o
público teve em língua portuguesa e em didática e complementar-se-ão esses dados com o teste de
diagnóstico a língua portuguesa. Desta forma, os decisores da UNTL ficarão com mais informação
caraterizadora do universo de docentes, para adotar medidas de modo mais fundamentado. Os
instrumentos de recolha de dados encontram-se construídos, faltando somente operacionalizar o processo
de aplicação do inquérito e do teste de diagnóstico.
3. Ainda não se avançou com formação para docentes de outras universidades.
4. A formação para os agentes da Função Pública e para a sociedade civil está em fase de preparação,
mas, pelo menos para já, exclusivamente em Díli. Tem havido diversos pedidos para o efeito, mas ainda
não teve início qualquer curso ministrado ou desenhado pelos docentes do ILP. Espera-se que, em breve,
possam ser produzidos objetivos, materiais e orientações didáticas para a lecionação, tanto ao nível da
língua portuguesa em termos gerais como do seu domínio para fins específicos.
5. A promoção da língua portuguesa através dos meios de comunicação social apresenta-se como
uma estratégia altamente produtiva, se for bem projetada e executada. Contudo, até ao momento é um
vetor de possível atuação não explorado.
6. Relativamente à projeção da língua portuguesa no contexto regional, ainda não há frutos visíveis.
Potencialidades e riscos
As potencialidades
Como foi referido acima, a principal potencialidade do ILP reside na construção de um projeto
coerente e ambicioso de organização e dinamização do ensino e divulgação da língua portuguesa em todo
o país. O ILP é um organismo timorense (ainda que decorra da cooperação com Portugal), instalado numa
instituição de prestígio como a UNTL, dirigido por um timorense (o reitor da universidade, que acumula
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funções de diretor do ILP), com recursos humanos qualificados (e, espera-se, também em breve com
recursos materiais mais adequados) que pode desenvolver numa perspetiva global, de médio e longo
prazo, o ensino e a divulgação da língua portuguesa, prestando um serviço de grande relevo à sociedade
timorense.
Mais do que cingir-se ao ensino formal, o ILP pode estender a sua ação à conceção de planos de
formação, à produção de materiais didáticos, ao desenvolvimento de estudos e à promoção da língua
portuguesa para lá dos muros da instituição académica.
Pode mesmo vir a tornar-se uma entidade certificadora das diversas formações ministradas por
entidades várias ou fazer o reconhecimento de competências ou proficiência em língua portuguesa para
fins diversos.
Uma efetiva promoção da língua portuguesa à escala nacional reduziria as diferenças entre cidadãos
e favoreceria o desenvolvimento e a igualdade social.
Riscos
Na fase atual, o maior risco que se apresenta reside na canibalização do ILP pelo Departamento da
Língua Portuguesa, visto que este tem consumido e consome ainda a maioria dos recursos humanos
disponíveis. Desta forma, o instituto esgota-se em ações internas à UNTL, compreensíveis de um certo
ponto de vista, mas limitadoras da ambição e potencial do ILP. Encarar o instituto como um recurso
disponível e os seus docentes como mão de obra qualificada pronta para qualquer tipo de função, sem
planificação adequada, pode enviesar os seus objetivos e a sua ação.
Ao nível da projeção da língua portuguesa no tecido social timorense, o facto de o ILP responder às
solicitações oriundas da sociedade civil e dos órgãos do Estado significa que há abertura a essas
solicitações, o que é positivo, mas significa igualmente que o instituto estará a operar por reação, no curto
prazo, não sendo proactivo e não mostrando possuir um planeamento estratégico próprio. Isto levanta
dificuldades, por exemplo, ao nível da alocação dos recursos humanos.
O atraso na formalização do instituto no quadro da UNTL, mais de um ano depois de o memorando
de entendimento ter sido assinado, pode causar alguma estranheza e gerar algumas apreensões,
nomeadamente quanto à vontade política de terminar o processo.
Uma ausência de política coerente, a resposta avulsa a solicitações ocasionais ou uma navegação à
vista, de curso prazo, podem desestruturar o trabalho e fazer baixar a qualidade, afastando os critérios de
cientificidade que devem sempre pautar o trabalho do ILP. Nesse caso, o risco de se tornar num projeto
falhado aumenta. Esperemos que esse cenário não venha a concretizar-se.
Nota final
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Referências
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