Livro II Simpósio de Educação
Livro II Simpósio de Educação
Livro II Simpósio de Educação
Língua, Ciência e
Formação de Professores
em Timor-Leste
ISBN 978-989-98671-0-9
Ilustração fotográfica:
Alessandro Tomaz Barbosa. Keu Apoema & Vanessa Lessio Diniz
Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou duplicada sem autorização expressa do autor ou do
editor.
A publicação deste livro é apoiada pela Embaixada do Brasil em Timor-Leste e Tipografia Sylvia
Díli
Em pleno centro de Díli, completamente carbonizado, onde os prédios
foram transformados em amontoados de ferros retorcidos, com destroços
que continuam a cair, ameaçando quem passa, vejo um senhor contemplar
da calçada o estrago sem uma lágrima, mas com uma expressão de dor
profunda e surda. Ele olha para mim, encontra meu olhar desolado e diz,
numa mistura de tétum e português, a frase que eu ouviria tantas vezes no
Timor: “Queimado, queimado, mas agora nosso!”.
Forganes (2002)1
1
Trecho do primeiro capítulo do livro: Queimado queimado, mas agora nosso! Timor: das cinzas à
liberdade de Rosely Forganes. Editora: Labortexto editorial. São Paulo, 2002. 507p.
Em busca de letras2
Vicente Paulino
2
Este poema é resultado da inspiração do Professor Vicente Paulino que teve na leccionação da aula
Sociologia do Ensino aos alunos do 2º ano do curso de Ensino de Língua Portuguesa da UNTL, ano
lectivo 2015. Disponível em http://emarkulturas.blogs.sapo.tl/5239.html (acesso a 22/2/2016).
ÍNDICE
INTRODUÇÃO
A produção do conhecimento científico em Timor-Leste 13
Vicente Paulino & Alessandro Tomaz Barbosa
O 17
Bobonaro, Timor-Leste
A Contribuição das mídias na divulgação da Língua Tétum para as audências em Díli 273
através dos Programas Noticiosos da Rádio Timor-Leste
Rosa Alves
11
12
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO EM TIMOR-LESTE
Neste livro, reunimos artigos encaminhados para o II Simpósio de Educação – Língua, Ciência e
Tecnologia no Timor-Leste, realizado durante os dias 14, 15 e 16 de abril de 2015. Trata-se de um evento
realizado em parceria colaborativa, envolvendo o Programa de Qualificação de Docentes e Ensino de
Língua Portuguesa no Timor-Leste (PQLP/CAPES), a Faculdade de Educação, Artes e Humanidades
(FEAH) da Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL) e o Programa de Pós-Graduação e Pesquisa
da UNTL. O evento foi dedicado a discussões e debates sobre diversos temas relacionados à Educação e
principalmente à disseminação do conhecimento no Timor-Leste. Ainda é necessário destacar que o
desenvolvimento do Simpósio contou com a valiosa parceria da Embaixada do Brasil em Díli, da Sapo.Tl
e do The Dili Weekly.
Os três dias de realização do II Simpósio representaram 72 horas e 4.320 minutos de apresentações,
partilha de conhecimentos, debates e troca de ideias. Nesse espaço, surgiram novos conceitos e
consolidaram-se novas ideias, que estão agrupados neste volume. Sendo assim, convido professores,
pesquisadores, alunos entre outros sujeitos que se interessam pela educação em Timor-Leste a lerem esse
livro com espírito de ―querer saber mais‖.
Destacamos que a nossa existência não pode ser justificada só pelas palavras voadas sem paragens,
mas deve ser preservada pelos textos, porque o texto é uma forma de apresentar a racionalidade do ser
humano que parte sempre com sentido de um algo. Assim, é com grande alegria que publicamos este
livro, que é fruto de uma cooperação que move a dinâmica de aquisição do conhecimento no campo
social, cultural e linguístico em prol da formação do ser humano ao longo da sua existência, pois tal como
afirmou Platão: o ser humano é verdadeiramente humano pela educação. Acrescentamos então: (...) e
pelas ideias socializadas em eventos e parcerias com instituições que têm interesses pelo o ensino e a
educação.
O livro é composto por 31 capítulos, distribuídos em quatro partes: 1. Língua e Ensino; 2. Formação
de Professores; 3. Educação Popular, Científica e Tecnológica; e 4. Currículo, Cultura e Comunicação. A
autoria dos capítulos conta com a participação de pesquisadores timorenses, brasileiros e portugueses.
Os oito primeiros capítulos compõem o grupo temático Língua e Ensino. Esses trabalhos apresentam
reflexões e discussões sobre o uso e o ensino da língua portuguesa e da língua tétum no Timor-Leste e
suas funções enquanto elementos da identidade nacional timorense. A questão da língua foi discutida e
interpretada de diversas formas, a fim de refletir o seu modo de utilização na educação escolar e
universitária. Nesses capítulos, as pesquisas esforçam-se em apresentar os métodos de ensino da língua
portuguesa utilizados pelos professores timorenses, fazendo análise das competências linguísticas
desenvolvidas no processo de ensinar e aprender. Ressaltamos que todo o processo de ensino-
aprendizagem é compreendido no campo linguístico; é nesse campo que a língua assume a função de
coletividade em torno de sua funcionalidade, enquanto elemento primário da comunicação do ser humano
na sociedade. Por exemplo, de onde você fala? Seja no mercado, na igreja, nas ruas e nas escolas, o que
interessa é a fala de um ser em qualquer sítio mostrado e representado por uma língua ou mais línguas,
por exemplo, o mambae, makasae, midiki, makalero, baiqueno, bunak, kemak, fataluku, entre outras.
Na segunda parte, que corresponde aos capítulos que discutem a formação de professores,
encontramos obras que fazem reflexões sobre a prática do professor da escola básica, quanto à utilização
de materiais didáticos e às estratégias metodológicas adotadas pelos docentes que almejam um ensino
interdisciplinar e contextualizado. Nesses textos, também são discutidas questões que envolvem a
formação inicial de professores nas áreas das Ciências e da Língua Portuguesa.
13
Na terceira parte, Educação Popular, Científica e Tecnológica, os capítulos nos revelam a importância
de o ensino de ciências e tecnologia deixar de ser enfocado em conteúdos distantes e fragmentados,
baseados em conhecimentos científicos supostamente neutros e autônomos, e passar a abordá-los de
forma interdisciplinar e contextualizada, enfocando situações vividas pelos educandos em seu cotidiano.
Nessa direção, o professor timorense Antero Benedito da Silva, no capítulo intitulado ―Educação
Timoriana: uma proposta alternativa‖, ressalta a importância de uma ―Educação Timoriana‖ como uma
alternativa de luta pela libertação do povo. Não se pode ignorar a existência de uma educação popular e
de saberes tradicionais e a sua respectiva influência pedagógica no combate ao analfabetismo, nas letras e
na mentalidade. A educação popular e os saberes tradicionais são aculturados por um médium chamado
―o lugar da experiência‖, vivenciado pela ―arte de contar histórias‖ através do ―haktuir aknanoik‖ onde se
administram as pessoas e coisas de rituais no processo de sacralização do lúlik (significado: sagrado,
tradução da língua tétum para a língua portuguesa) como ponto de partida para compreender a educação
intercultural e dialógica na cultura timorense.
Finalmente, na parte que trata de ―Currículo, Cultura e Comunicação‖ são abordadas questões
envolvendo a construção e a implementação do currículo padrão mínimo estabelecido pelo Ministério da
Educação, a reestruturação do currículo do Ensino Básico, Secundário e do Ensino Superior do país e a
heterogeneidade da cultura timorense marcada pela arte, poesia, dança, pelo plurilinguismo das línguas
maternas, das línguas de trabalho e pela coexistência da língua tétum e da língua portuguesa como línguas
oficiais. Por fim, nessa última parte do livro, são apresentados dois capítulos que dão ênfase à área de
comunicação e que discutem questões de gênero, a estrutura do texto jornalístico e a Rádio como meio
para a promoção e o ensino da língua tétum.
Sabe-se, pois, a comunicação e a educação são duas áreas importantes na vida das pessoas, enquanto
cidadãos-comunicantes e cidadãos-educadores. A caracterização dos sujeitos na comunicação e na
educação inicia-se na família e desenvolve-se no ensino, escolar. Dessa forma, não se pode falar do
ensino sem mencionar os professores/educadores/formadores, sem destacar os materiais didáticos
disponibilizados para lecionar e sem refletir sobre as abordagens metodológicas adotadas pelos docentes,
principalmente no cenário timorense, onde o conceito de formação dos professores continua a ser um
objeto prioritário de estudo e de aposta para fortalecer a qualidade do ensino-aprendizagem.
Sem mais delongas, não poderíamos deixar de registrar a felicidade de publicar um livro que
apresenta mais de 50% dos textos escritos por autores timorenses, totalizando um número de 38
pesquisadores. Em agosto de 2014, na Primeira Conferência Internacional sob a temática ―A produção do
conhecimento em Timor-Leste‖ realizada na UNTL, um pensamento foi recorrentemente verbalizado,
principalmente pelo Professor Vicente Paulino. O professor proclamava: ―Pesquisadores internacionais,
façam pesquisa junto com os pesquisadores timorenses: nós também queremos escrever sobre nós‖. Esse
apelo foi ouvido e por meio deste livro buscamos romper com a rigidez de fronteiras epistêmicas e
1
territoriais estabelecidas e controladas pela colonialidade do saber e poder e abrimos espaço para a
emergência de vozes, línguas, culturas e histórias do povo timorense.
Assim, este livro passa a ser um marco na história da educação no Timor-Leste no que diz respeito a
participação dos timorenses como investigadores autônomos e críticos do seu país.
1
Formas modernas de exploração e dominação. A colonialidade do saber e poder nos revela, que, para além do legado de
desigualdade e injustiça sociais profundas do colonialismo e do imperialismo (atualmente marcado pela imagem de centro-
periferia), há uma predominância epistemológica do eurocentrismo sobre outras epistemes.
14
PARTE I
LÍNGUA E ENSINO
15
16
DE SAMUTUABEN BOBONARO, TIMOR-LESTE
António Soares
Manuel Belo de Carvalho
Mariene de Fátima C. de Queiroga
Introdução
Melhorar a qualidade da educação é um desafio necessário para uma abordagem global e integrada
da aprendizagem que envolve professores, gestor escolar, família, comunidade e os alunos no processo de
educação e socialização. O formador tem o papel de mediar o conhecimento, e a interação entre eles afeta
a produção das atividades no ensino e aprendizagem. De acordo com Orlandi (1988), o professor deve
estar sensível as condições e circunstâncias de aprendizagem dos alunos, pois cada aluno tem condições
distintas de aprendizagem, sendo necessário a utilização de métodos de ensino apropriados, assim como a
realização de atividades com materiais adequados para cada contexto.
A língua portuguesa como língua adicional2, na Escola Básica Filial de Samutuaben, em Cailaco,
município de Bobonaro, Timor-Leste, tem diversas formas de ensino e métodos de atuação dos
professores na interlocução do conhecimento. Dessa forma, Orlandi (1988) chama a atenção da
responsabilidade do professor, em vista dos princípios para implementação dos sistemas de
aprendizagem, a saber: o ensino aprendizagem conforme a necessidade, motivação, características e
recursos dos aprendentes; elaboração de métodos e materiais apropriados e adequações que permitam
avaliar métodos de aprendizagem. Sobre isso, ―a escolha do método deve prestar atenção aos materiais
apresentados, assim como os objetivos de aprendizagem, o tempo disponível, o número de alunos,
conteúdos e condições de aprendizagem‖ (AZEREDO, 2007: 35).
O processo de ensino e aprendizagem da língua portuguesa precisa de preparação de temáticas,
conforme o contexto. Além de dominar os métodos do ensino, o docente também deve considerar
conhecimentos que podem dar suporte, além do material, que estão diretamente relacionados com os
alunos no processo de aprendizagem. De acordo com o professor de língua portuguesa da Escola Básica
Filial de Samutuaben, ―seria necessário mais professores qualificados para criar um ambiente de
aprendizagem eficaz, no processo de aprendizagem, de modo que os resultados da aprendizagem dos
alunos estejam em um nível ideal‖ (José Borges, 2014).
A implementação de lições nas escolas para atingir o nível de sucesso no processo educacional deve
ter em vista a variedade de propósitos e diferentes características dos materiais. A perspectiva da
aprendizagem contextual e colaborativa se faz pertinente para essa discussão. Aprendizagem contextual é
um conceito que ajuda o professor a relacionar o conteúdo a ser estudado com as situações do mundo real
e incentiva os alunos a fazerem conexões entre o conhecimento que ele tem ao conhecimento adquirido e,
assim, aplicar o contexto famíliar e comunitário. Além dessa, a aprendizagem colaborativa pode
proporcionar oportunidades para facilitar as práticas de aprendizagem. Para investigação desse método,
existe uma análise mais profunda que identifica as diferenças no desempenho dos alunos na
2
Tendo em vista o contexto multilíngue no Timor-Leste, a língua portuguesa, apesar de ser uma das línguas oficiais, não é
língua materna e, portanto, considerado língua adicional nesse trabalho.
17
instrumentalização da língua portuguesa. Nem todos os métodos podem ser aplicados em determinados
materiais, a seleção é fundamental para atingir os objetivos da aprendizagem.
Com base nas descrições acima, o interesse na realização dessa pesquisa está na análise desses dois
tipos de aprendizagem, a contextual e a colaborativa (Contextual Teching and Learing). Um conceito de
aprendizagem entre o material ensinado aos alunos em situações do mundo real e incentivo na conexão
entre os seus conhecimentos e sua aplicabilidade na vida e no cotidiano. Assim, esse trabalho está
orientado na avaliação metodológica dessas aprendizagens, no nível do 60 ano, da Escola Básica Filial de
Samutuaben. Dessa forma, pretende-se questionar os métodos tradicionais de ensino em língua
portuguesa, como língua não materna, nas diversas ciências, no contexto multilíngue, especificamente,
nessa escola de Samutuaben, sob a hipótese de uma reformulação dos conteúdos. E assim, problematizar
os materiais específicos utilizados nas aulas do Ensino Fundamental, de acordo com o Currículo Nacional
vigente em Timor-Leste. De acordo com a pesquisadora do Centro de Estudos Comparatistas, da
Universidade de Lisboa, Maria Lurdes (1986) ―o ensino de língua não-materna, nessa medida, releva-se
pertinente e até desejável quanto aos conteúdos e competências linguísticas nas aulas de Português‖. A
preocupação consiste na articulação dos conteúdos e comptências da educação para a cidadania, visto que
aprender o idioma e encontrar as melhores formas de integração social são processos concomitantes e
complementares.
De acordo com Mendonça (2003: 35-47), língua é um fundamental instrumento de acesso ao
conhecimento. No plano oral e escrito, a formalização do ensino é norteada pela relação do rigor e
exigência na perspectiva linguística. Nesse sentido, a estruturação dos diferentes conceitos entre a
aprendizagem contextual e colaborativa, se faz necessária nesse trabalho como abordagem metodológica
para fins acadêmicos, em especial, a abordagem do ensino em língua portuguesa. Tendo em vista o
contexto apresentado, outro fator relevante, diz respeito ao modelo de ensino da língua portuguesa, como
língua não-materna, adotado nas escolas internacionais. O sistema de ensino nacional, do básico ao
secundário, nem sempre pode proporcionar aos filhos de estrangeiros, aulas de português como língua
adicional. A existência dessas aulas em regime de apoio3, nem sempre promove meios para as fazerem
funcionar. De forma geral, os alunos são integrados nas aulas de Português e, quando possível, são-lhes
lecionadas aulas complementares à proficiência dessa língua como língua não-materna.
O estudioso Suhrkamp, (1990: 11-47) defende que o propósito do ensino e aprendizagem no contexto
multilíngue e multicultural é dos aprendentes se comunicarem nessa língua para ―satisfazerem as suas
necessidades‖4. Ora, perante um grupo de pessoas que querem aprender outra língua, o ensinante deve ter
consciência das razões que os levam ao desejo de aprender. A base dessa interação deve passar,
necessariamente, por compreender o ensino de uma língua estrangeira como uma descrição das emoções
que resultam da comunicação (ou tentativa de) numa outra língua.
Do ponto de vista educativo, a adoção da ideia de que o ser humano tem capacidade de selecionar,
assimilar e processar as informações, atribuindo a elas significados, supõe mudança significativa no modo
de compreensão do processo de ensino-aprendizagem. O aluno apresenta-se com uma bagagem de
conhecimentos, capacidades e destrezas prévias, além de uma ideia pré-formada acerca da escola, do
professor, assim como da atuação desse no exercício da profissão. Traz também consigo as crenças,
valores e seus modelos mentais acerca da sua realidade. O aluno constrói o seu conhecimento, porém
nunca o faz só. Tal processo de construção justifica a importância que tem a influência decisiva do
professor, assim como certa ―carga social, que também são produtos da atividade e do conhecimento
4
Multilíngue e multicultural significa utilizar o grupo para realizar atividades com modelos de materiais e o conhecimento
das pessoas.
18
humano registrados socialmente‖. (COLL; SOLÉ, 1996:120). Consideramos ainda que os conhecimentos
prévios trazidos pelos alunos são vistos como elementos norteadores para a interpretação de informações
recebidas, assim como também ―contribuem para selecionar e organizar os diversos significados
relacionados, que o aluno passa a estabelecer frente a um novo conteúdo a ser apresentado‖. (Margono,
2001: 135). Conforme Carrara (2004), apud Maia, (2005: 1), ―a prendizagem contextual e colaborativa
resulta da ação conjunta entre o educador ou parceiro mais experiente e aquele que aprende‖. Essa
afirmação reforça a opinião de Dillenbourg, (1999), que define o termo aprendizagem colaborativa como
―uma situação em que duas ou mais pessoas aprendem ou tentam aprender algo juntas‖ (p. 01). Para
entender melhor o significado da aprendizagem colaborativa é preciso saber que esse processo acontece
através da interação.
A estudiosa Fátima Clemente, (1988: 11-47), fala da necessidade de diversificar metodologias que
efetive a eficácia progressiva da aprendizagem e promova a abertura para que o aluno tenha interesse e
pré-disposição para inovações. Esses podem ser indicativos relevantes para o sistema motivacional
cooperativo, frente as práticas pedagógicas alternativas de vários campos do conhecimento. Perrenoud
(1988: 07) aponta que ainda existem docentes que não se concebem espontaneamente como ―conceptores
- dirigentes5‖ de suas situações de aprendizagem. Podemos entender que, enquanto o professor praticar
uma pedagogia magistral e pouco diferenciada, ele assume sua incapacidade de domínio frente às
próprias situações de aprendizagem, às quais submetem seus alunos. O autor ainda ressalta claramente
que, para organizar e dirigir situações de aprendizagens é necessário tempo para o professor expandir
seus repertórios educativos, no âmbito do novo paradigma educacional. Cabe, portanto, acrescentar nesse
tópico a contribuição de Angélica Alves (1996) ao discorrer sobre as perspectivas do ensino:
5
Conceptores-dirigentes são indicativos relevantes para o sistema motivacional cooperativo, frente a práticas pedagógicas
alternativas de vários conhecimentos, inclusive dos professores.
19
Os métodos de ensino e as aprendizagens
Realização da aprendizagem
O sucesso na aprendizagem pode ser obtido quando cada indivíduo se esforça para fazer uma
atividade que se baseia na necessidade e desejo de cumprir, o que seria para Djamarah (1994: 22), a
―conquista do resultado‖.
Os resultados obtidos na forma de impressões resultam na alteração do indivíduo, por meio das
atividades de aprendizagem. O sucesso na aprendizagem que tem uma sugestão é a avaliação do
progresso educacional dos alunos em tudo que foi aprendido do conhecimento e habilidade com
competências estabelecidas após a avaliação relacionada com a escola. O sucesso na
aprendizagem é o resultado da avaliação educacional sobre o progresso dos alunos e após a
atividade de aprendizagem em sala de aula. (DJAMARAH, 1994: 22),
6
Tem em vista a aprendizagem como componente educacional em relação aos equipamentos que implementam o Ensino Básico.
20
Entre as razões de ordem cultural e histórica, a escolha do Português como língua oficial
correspondeu ao reconhecimento dessa língua como função importante na estrutura gramatical e lexical
da Língua Tétum, e consequentemente, inclusão do país na Comunidade dos Países em Língua
Portuguesa–CPLP. Desse modo, a preocupação para reformulação do ensino e questões de aprendizagem
problematizaram certas práticas tradicionais. Nesse sentido, apontamos algumas reflexões acerca dos dois
tipos de aprendizagem contempladas nesse trabalho, a contextual e colaborativa.
O processo de aprendizagem contextual considera a experiência dos alunos, especialmente da vida
em comunidade. De acordo com Viena Sanjaya (2008: 255) existem três coisas que precisam ser
entendidas na aprendizagem contextual e que as estratégias de ensino devem priorizar, a saber: (1) a
utilização de vários materiais didáticos, (2) incentivo aos alunos na descoberta da relação entre o material
que está sendo estudado e situações da vida real, na relação da experiência escolar e cotidiana; e (3)
incentivar os alunos a aplicarem o conhecimento em suas vidas, aprender ou orientar estratégias sobre
processos padrões.
Consoante a isso, Viena Sanjaya (2008: 256), classifica quatro características no ensino contextual
como estratégias de aprendizagem (contextual teching and learing): (1) a aprendizagem é um processo
existente de ativação do conhecimento então pode ser separada do conhecimento que foi aprendido, (2) a
compreensão de novos conhecimentos adquiridos não é para decorar, mas para entender; (3) a atenção
para o conhecimento e experiência adquirida deve ser aplicada na vida do estudante; dessa forma, (4) é
necessário refletir estratégias de desenvolvimento do conhecimento.
A implementação do modelo contextual teching and learing em sala de aula visa desenvolver um
aprendizado autônomo e significativo, que seja possível a construção do próprio conhecimento. É
importante salientar que as atividades de consulta e a formação de meios para realização de uma
aprendizagem em grupo são fundamentais para uma avaliação reflexiva. Dessa forma, o caminho
percorrido por esse método de aprendizagem segue também desafios.
Apontamos como vantagem a motivação dos alunos em virtude do material didático relacionado a
vida cotidiana, participação ativa da aprendizagem e reflexão sobre a modelagem e configuração dos
meios e recursos. Entretanto, um dos percalços seria, por vezes, a relação de temáticas ou conteúdos de
forma contextualizada com a diversidade circunstanciada.
Já o método colaborativo, num conceito mais amplo, consiste no trabalho coletivo e participativo e
inclui o professor como parte integrante do aprendizado, não apenas o instrutor do ensino. De acordo com
Sri Anitah (2008: 33), a aprendizagem colaborativa não é apenas a colaboração entre os alunos de um
grupo regular, ―mas um trabalho em conjunto no intuito de alcançar determinados dos objetivos‖. O
pesquisador Agust Suprijona (2009: 54) define a aprendizagem colaborativa como uma ―filosofia sobre a
responsabilidade pessoal e respeito pelos outros‖.
Com base no exposto, professor e aluno são envolvidos no alcance do conhecimento por meio dos
conteúdos de língua portuguesa, numa relação interlocutória. Desse modo, a aprendizagem irá mobilizar
os estudantes na vida em comunidade. O pesquisador Sri Anitah (2008: 34) menciona três elementos
importantes na aprendizagem colaborativa: (1) o aumento do conhecimento em grupo; (2) o
desenvolvimento do sentimento de comunidade entre os alunos e a capacidade de percepção e
gerenciamento das diferenças de opiniões, e (3) a autonomia no posicionamento individual também no
intuito de solucionar problemas em todo o ensino. Nesse sentido, as habilidades de ensino e trabalho em
conjunto, num pré-esforço, revertidos em cada habilidade usada e implementação de grupos, formam
individuos responsáveis pelas atividades em sala de aula. De acordo com Ribeiro (2005), os contextos da
aprendizagem estão sob um novo cenário de instabilidade macro econômica e traz novos desafios, mas os
desafios de sempre ainda persistem. A busca por produtividade continua mais forte do que nunca e o
imperativo da inovação jamais foi tão importante. Novas pressões têm se acumulado: gerar valor em um
21
ambiente de maior incerteza e com maior restrição de recursos; garantir competividade sem abrir mão do
compromisso com a sustentabilidade; organizar um ambiente estimulante ao mesmo tempo aumentar o
nível de exigência por qualidade e resultados, que claramente exitem nas empresas, nos profissionais e na
capacidade de aprender.
Na aprendizagem colaborativa, de acordo com Beto Valle (2010: 25), o trabalho em conjunto é
necessário para alcançar objetivos. ―Dentro da sala de aula, se diz estar a trabalho‖ para a construção do
conhecimento. O trabalho participativo em que propunha maneiras diferentes de organizar grupos pode
desenvolver atividades com desempenho de trabalhos que lhes dariam a aprendizagem de alguns
conteúdos através de discussões, análises, reflexões, leituras compartilhadas e, assim, promover efeitos na
aprendizagem de forma democrática.
Com base na Direção Nacional de Currículo Escolar, o objetivo da aprendizagem é que os alunos
compreendam e ampliem a visão de mundo para que possam aplicá-los além das aulas de língua
portuguesa, na comunidade e na vida secular.
Sobre as garantias do Currículo estão as responsabilidades de decisão sobre os assuntos curriculares
de todos os níveis de ensino, competindo-lhe, entre outros aspectos: coordenar a elaboração dos planos e
dos respectivos estudos preparatórios; elaborar os programas escolares para os vários níveis de ensino e
formular planos de intervenção; coordenar e avaliar o desenvolvimento de planos educativos, ao nível
pedagógico e didático; assegurar a adequação dos planos de estudo e dos programas escolares aos
objetivos do sistema educativo e à diversidade cultural e social do país, participar na definição das
orientações que regulam a elaboração e aprovação dos manuais escolares. Além desses, prepara normas e
critérios de avaliação das aprendizagens, assim como exames nacionais, incluindo a elaboração das
provas e a avaliação do processo.
O sistema de avaliação dos docentes da Escola Básica Filial de Samutuaben, vai além de provas,
trabalhos e outras atividades formais. A análise dos professores consiste na observação multidimensional
e na auto-avaliação dos alunos. O professor de língua potuguesa, do 6º ano, José Borges, atua assim há
seis anos. Ele fez um diagnóstico das capacidades de escrita e comunicação dos estudantes e declarou a
importância de sempre mantê-los informados sobre o que será desenvolvido. Diariamente ele coloca a
programação da aula no quadro e descreve os conteúdos a serem trabalhados, as atividades e objetivos da
aula. As crianças verificam no caderno o que foi estudado e se a aprendizagem dos conteúdos foi
realmente efetiva, ―dessa maneira, eles reconhecem progressos e dificuldades‖, explica José Borges. A
auto-avaliação é realizada de duas maneiras: oral e escrita, e acontecem no final de cada trimestre e diz
respeito a todas as disciplinas. A aluna Laís Ventura, por exemplo, admitiu que não gostava de falar em
Português pois se sentia insegura. Trabalhadas as dificuldades, a situação mudou: ―hoje sinto que sou
capaz de realizar atividades que pareciam muito difíceis‖ (LAÍS VENTURA, 2014).
No término da aula, o docente compara a auto-avaliação das crianças com seus registros. ―Se a
diferença for gritante, posso não estar olhando para a criança como deveria‖, reflete, o professor Borges.
As quetões que, na opinião da turma, não foram aprendidas serão retomadas em atividades diferenciadas.
Os que já atingiram determinado objetivo também participam com interesse, de acordo com esse
professor.
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Considerações finais
Os resultados da breve observação do ensino da língua portuguesa na turma 60 ano, da Escola Básica
Filial Samutuaben, Cailaco-Bobonaro/2014 parece não ser uma realidade apenas desssa escola no país.
Entre outras dificuldades, as enfrentadas pelos alunos no processo de ensino e aprendizagem diz respeito
ao domínio do uso da língua portuguesa tanto na oralidade, leitura, escrita, quanto dos conhecimentos
explícitos e gramaticais, tanto nas aulas de língua portuguesa quanto em outras disciplinas.
Os professores e os alunos cumprem a demanda da Lei de Base do sistema educativo e da
Constituição da República Democrática Timor Leste, e introduz as línguas oficiais, como língua de
instrução no ensino e aprendizagem em sala de aula. Entretanto, a escassez de ambientes linguísticos
favoráveis para comunicação em língua portuguesa interfere no desempenho e competências da língua na
comunicação diária, fora da sala de aula e, muitas vezes, na própria escola.
Como mediador do conhecimento, o professor deverá incentivar a participação ativa dos alunos nas
aulas e nas atividades de aprendizagem, afim de despertar o interesse ao aprendizado tanto da língua
portuguesa, quando da utilização dessa língua no ensino de outras disciplinas. Além disso, a integração da
família e da comunidade como parte do processo de formação e conscientização do aluno é de
fundamental importância para o processo de socialização. Aos alunos urge autonomia linguística da
língua portuguesa, assim como a prática do aprendizado correspondente aos domínios da oralidade,
leitura, escrita e compreensão, para a então inclusão nas demandas ofertadas no mercado de trabalho.
A participação do Estado se faz necessária na promoção de estruturas físicas e materiais que
contemplem a valorização da formação contínua dos profissionais da eduacação e disponha de centros de
estudo e pesquisa, assim como promova a informatização das escolas e condições digmas para o exercício
da educação.
Referências bibliográficas
23
MENDONÇA, Alberto (2003). Estratégias de aprendizagem no ensino fundamental: Aprendizagem
Cooperativa. Surabaya: Biblioteca Learning.
ORLANDI, Eni (1998). Interpretação. Autoria, Leitura e efeitos do trabalho simbólico. Petrópolis: Vozes.
PERRENOUD, Philippe (1998). Avaliação dos Estabelecimentos Escolares: um Novo Avatar da Ilusão
Cientificista? Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação Universidade de Genebra 1998.
Trad. de Luciano Lopreto. In: Idéias (Fundação para o Desenvolvimento da Educação, Sao Paulo,
Brasil), " Sistemas de Avaliação Educacional ", n° 30, pp. 193-204. Disponível em:
http://www.unige.ch/fapse/SSE/teachers/perrenoud/php_main/php_1998/1998_49.html.
RIBEIRO, Casio (2005). Educação para as crianças com dificuldades de aprendizagem. Editora
Reservados.
SUHRKAMP, Verlag (1990). Populism and constitutional review in Germany School. PTPabelan.
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Supremo Satya.
SANJAYA, Viena (2008). Criando um Modelo de Aprendizagem do Ensino criativo e eficaz. Jakarta:
Terra Alfabetização.
SUPRIJONA, Agust (2009). Aprendizagem Cooperativa. Surabaya: Biblioteca Learning.
VALLE, Beto (2014). Desempenho Movido a Conhecimento. Palestra realizada na AmCham Porto
Alegre em junho de 2014.
24
O ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA PORTUGUESA EM TIMOR-LESTE:
CONSIDERAÇÕES DE PROFESSORES DO ENSINO BÁSICO 1
Introdução
Como língua oficial de Timor-Leste, juntamente com o Tétum, a LP figura no ensino obrigatório do
país, como pode ser visto na Lei de Bases da Educação de Timor-Leste (LEI n.º 14/2008) em seu Artigo
1
Este trabalho utiliza dados coletados no desenvolvimento da Monografia intitulada "Formação continuada de professores
de Língua Portuguesa no distrito de Díli", que será apresentada como requisito para a conclusão do curso de Formação de
Professores da Universidade Nacional de Timor-Lorosa'e (UNTL).
2
Além das línguas supracitadas, em Timor-Leste verifica-se a presença de mais de vinte línguas nativas e vários dialetos.
(CHOUPINA; RIBEIRO, 2012).
25
8.º: "As línguas de ensino do sistema de ensino timorense são tétum e o português." Ou seja, o ensino de
LP deve ocorrer junto ao ensino do Tétum. No que diz respeito ao ensino básico, objeto de estudo desta
pesquisa, a Lei de Bases da Educação garante no Artigo 12.º que entre os objetivos desse nível de ensino
está a garantia de domínio dessas duas línguas. Essas prescrições vão refletir no currículo dirigido às
escolas, ou seja, na prática docente dos sujeitos que atuam nos ambientes educativos do país. Contudo, é
preciso ressaltar a distância que há entre aquilo que está presente no currículo prescrito, organizado em
contextos extraescolares e o que ocorre na sala de aula.
O professor, como mediador das ações didáticas, exerce papel fundamental na concretização de
propostas que se inserem na prática educativa. Por conta disso, merece lugar de destaque quando se pensa
em conteúdos e metodologias de ensino de LP em Timor, haja vista as peculiaridades dessa língua como
objeto de ensino no contexto timorense.
O que se observa é que muito dos professores timorenses que estão nas salas de aula não tem
formação em LP e, inclusive, apresentam muitas dificuldades em relação a essa língua, o que dificulta seu
trabalho pedagógico. Afinal, é sabido que o docente precisa conhecer aquilo que ensina. Sendo assim,
observamos uma lacuna no que diz respeito à formação desses profissionais.
Reflexo disso e de um conjunto de outros elementos é o ensino de LP em Timor-Leste, cujo caminho
é marcado por avanços e recuos. Tal movimento se constrói, sobretudo, pela influência de fatores
externos à língua – àqueles que compõem o contínuo movimento histórico e social de um povo. Com
base nesse percurso histórico, em Timor, como aponta Brito (2010, p.183),
a língua portuguesa nunca chegou a tornar-se língua normal de comunicação oral, nem língua de
contato entre etnias diferentes – papel que sempre coube ao tétum. Manteve, via de regra, o
caráter de língua clerical, administrativa e de cultura; embora sua função seja relevante no plano
interno, articulando a unidade cultural por meio de uma pequena elite de letrados nativos e, no
plano externo, procurando associar a cultura local ao universo lusíada.
Dessa forma, quando se pensa no ensino de LP nos ambientes educativos de Timor é preciso levar em
conta que se trata do ensino de uma língua que não é a língua utilizada cotidianamente pelos timorenses,
não é a língua materna desse povo. De acordo com Ançã (1999), é preciso ter em conta esse quadro e
utilizar-se da língua materna do aluno como estratégia que auxilia o desenvolvimento da língua que se
deseja ensinar.
Sendo assim, a multiplicidade linguística presente em Timor-Leste não pode ser ignorada
quando se pensa em ensino de LP ou de outra língua na escola. Como aponta Soares (2014), a escola
como espaço de socialização vai repercutir a multiplicidade linguística presente em Timor-Leste, ou seja,
multiplicidade que constitui, em parte, o repertório linguístico (plurilíngue) dos alunos. Essa
multiplicidade está presente no contexto escolar. Constitui as interações que ali se desenvolvem. Se
pensarmos o ensino de LP em Timor deixando de lado esse elemento linguístico estaremos retrocedendo
no que diz respeito à aquisição e desenvolvimento de uma língua não materna. Afinal, este processo não
se dá por exclusão de uma língua em detrimento da outra, e sim por meio de estratégias que se utilizem
das línguas que o aluno já domina como instrumento para se chegar à língua meta.
26
Formação de professores em Timor-Leste
É preciso, portanto, compreender o atual momento no que se refere à educação em Timor-Leste como
um processo cujos resultados serão visíveis em longo prazo. Contudo, seu desenvolvimento não pode
ocorrer à margem dos sujeitos que medeiam as prescrições e a sala de aula, os professores.
Metodologia
27
de uma ―Série de perguntas abertas, feitas verbalmente em uma ordem prevista, mas na qual o
entrevistador pode acrescentar perguntas de esclarecimento‖.
As perguntas constantes na entrevista foram elaboradas tendo como foco o programa curricular
utilizado nessas turmas, os conteúdos trabalhados na disciplina de LP e demais elementos constantes na
prática pedagógica dos sujeitos entrevistados. Abaixo elencamos as três perguntas dirigidas ao
professores:
1. Quais são as dificuldades que o senhor(a) enfrenta no processo de ensino-aprendizagem da Língua
Portuguesa?
2. No seu ponto de vista, como é que os alunos podem melhorar o domínio da Língua Portuguesa na
sala de aula?
3. Quais são os métodos e estratégias que o senhor(a) utiliza no processo de ensino-aprendizagem de
Língua Portuguesa com suas turmas de 6º ano?
As respostas obtidas foram transcritas e compõe o córpus de análise desta pesquisa. Optamos por
transcrevê-las de acordo com a norma padrão da Língua Portuguesa. De posse desses dados, utilizamos,
como recurso metodológico, a análise de conteúdo, que se constitui como metodologia de pesquisa usada
para descrever e interpretar o conteúdo de toda classe de documentos e textos. De acordo com Moraes
(1999), este tipo de metodologia permite a interpretação de mensagens e possibilita o conhecimento mais
profundo de seus significados. Esse mesmo autor propõe cinco etapas constitutivas do processo da análise
de conteúdo:
1. Preparação das informações: serve para identificar as diferentes amostras de informação a serem
analisadas. Para isto é preciso realizar a leitura de todos os materiais e decidir quais deles efetivamente
estão de acordo com os objetivos da pesquisa;
2. Unitarização ou transformação do conteúdo em unidades: momento de definição da unidade de
análise (conjuntos de informações que tenham um significado completo em si mesmas);
3. Categorização ou classificação das unidades em categorias: estabelecimento de categorias, o qual
deve seguir um conjunto de critérios: As categorias devem ser válidas, exaustivas e homogêneas. A
classificação deve ser exclusiva e consistente, buscando-se produzir um número reduzido de categorias;
4. Descrição: momento inicial de comunicação dos resultados do trabalho, de expressar os significados
captados e intuídos nas mensagens analisadas;
5. Interpretação: permite, juntamente com a descrição, compreender o fenômeno que constitui objeto de
estudo e fazer o investigador chegar à sua explicação e podendo mesmo em alguns casos, fazê-lo chegar
a formas de previsão.
Nesta seção apresentamos a análise dos dados coletados na escola através da entrevista realizada com
dois professores que lecionam nas turmas de 6º ano. Buscamos, por meio dessa análise, mostrar as
considerações de professores acerca de sua prática com a LP no ensino básico de Timor.
A primeira pergunta que fizemos diz respeito ao sujeito professor e sua percepção sobre a prática
docente que desenvolve, sobretudo, as dificuldades que enfrenta nesse processo:
Quais são as dificuldades que o senhor (a) enfrenta no processo de ensino-aprendizagem da Língua
Portuguesa?
28
As duas professoras entrevistadas – que aqui denominaremos professora da turma A e professora da
turma B – apresentaram uma dificuldade em comum: a falta de materiais didáticos, como o livro de
Língua Portuguesa. A professora da turma B disse, inclusive, o que ela procura fazer para superar essa
dificuldade:
Professora da turma B: Não têm materiais didáticos como o livro de Língua Portuguesa para facilitar
o processo de ensino-aprendizagem, então eu uso a minha estratégia ou método para facilitar para os
alunos.
A professora da turma A, além da falta da material didático, mencionou como dificuldade para
realizar sua prática a má infraestrutura do espaço destinada às aulas. Professora da turma A: [...] outra
dificuldade também é a sala de aula que não há boas condições, por exemplo, mesas, carteiras, quadro,
portas e janelas também são as dificuldades.
Chama atenção primeiramente que nenhuma das duas professoras mencionou que tem dificuldade
com a LP, seja para comunicação ou como objeto de ensino. Para compreender tal resposta é preciso
considerar a faixa etária dessas duas docentes: uma tem 58 anos e a outra tem 62 anos. Esse dado é
relevante se considerarmos o histórico de Timor-Leste e o seu reflexo no atual quadro educacional do
país. Podemos supor, por meio da idade dessas docentes, que sua formação se deu em um período
anterior à invasão indonésia, ou seja, sua formação foi realizada na língua do antigo colonizador,
Portugal. Dessa forma, ambas apresentam um bom domínio do português, o que auxilia sobremaneira a
prática pedagógica com essa língua.
Em relação às outras dificuldades mencionadas, a falta de livro didático e as más condições de
infraestrutura dos espaços onde se realizam as aulas, consideramos que, em parte, cabe ao governo de
Timor-Leste a responsabilidade por modificar esse quadro. Contudo, é preciso considerar também a
história de Timor-Leste. O país passou por uma grande crise no setor da educação e que atingiu
diretamente, dentre outros aspectos, a infraestrutura das escolas. Ao deixar o país, em 1999, as tropas
indonésias queimaram e destruíram as escolas que havia no território timorense.
Essas considerações nos permitem inferir que muitas vezes a dificuldade enfrentada pelos docentes,
como no caso que verificamos nesta pesquisa, não é causada por fatores internos à língua, ou seja, por
dificuldades em trabalhar com a LP. E sim por fatores externos à língua, mas que afetam diretamente o
processo de ensino-aprendizagem.
A segunda pergunta que fizemos para as duas docentes da escola de Ensino Básico no 4 Culu-Hun foi
centrada no aluno: No seu ponto de vista, como é que os alunos podem melhorar o domínio da Língua
Portuguesa na sala de aula?
Ao analisarmos as respostas dadas a essa pergunta, observamos uma diferença entre as respostas das
professoras. A professora da Turma A, ao discorrer sobre a maneira como o aluno poderia melhorar o
domínio da LP, atribui ao próprio aluno a responsabilidade pelo seu aprendizado:
Professora turma A: No meu ponto de vista, para melhorar a sua capacidade para aprender os
alunos na Língua Portuguesa eu acho que eles próprios têm que ter todo interesse de aprender,
então eles sabem e sabem melhor, mas o aluno que um dia vem e outro dia falta então não vai
apanhar nada daquilo que a professora dá. Ele não pode apanhar por isso ele não pode saber.
Professora da turma B: No meu ponto vista eu tenho que fazer qualquer maneira para os meus
alunos dominarem bem a Língua Portuguesa [...] eles não compreendem bem a Língua Portuguesa
então a professora tem que ter o princípio para eles melhorar bem a Língua Portuguesa.
29
Podemos afirmar que as duas professores apresentam diferentes respostas devido às concepções e
métodos de ensino que empregam em suas aulas. Enquanto a professora da turma A centra seu processo
de ensino na figura do aluno, a professora da turma B o centra no professor. Chama atenção que nessas
falas o processo de interação professor-aluno é ignorado.
Na entrevista fizemos também uma pergunta sobre como as professoras desenvolvem a sua prática
pedagógica na disciplina de Língua Portuguesa:
Quais são os métodos e estratégias que o/a senhor(a) utiliza no processo de ensino-aprendizagem de
Língua Portuguesa com suas turmas de 6º ano?
A professora da turma A disse que utiliza na sala de aula aquilo que ela aprendeu na universidade, no
curso de Bacharelato. Além disso, é importante ressaltar, como já mencionamos aqui, que ela aprendeu a
LP antes do período da invasão indonésia.
Professora da turma A: [...] eu ainda utilizo o método que eu aprendi antes da guerra para aplicar
aqui. Essa professora, anteriormente, disse caber ao aluno o interesse em aprender, porém como resposta
a essa terceira questão, quando questionada acerca dos métodos que utiliza, ela disse que procura meios
para o aluno aprender.
Professora da turma A: Se os alunos não compreendem aquilo que professora dá tenho que procurar
os meios para que os alunos possam perceber e compreender bem aquilo que a professora dá.
Perguntamos se ela utiliza, em sua prática pedagógica, algum material didático. Como resposta, a
professora disse que, pelo fato de não possuir material didático, sua estratégia é fazer fotocópia do
material utilizado no ano anterior com a turma de sexto ano e reaproveitá-lo com a turma atual.
Professora da turma A: Não temos [material didático] por isso nós tiramos fotocópia de exames
anteriores e então mudamos frases porque não temos materiais didáticos sobre três disciplina como
Língua Portuguesa, Estudo do Meio e Matemática.
Não cabe a nós julgarmos a estratégia adotada pela professora, porém, podemos perceber que sua
atitude gera uma estabilização no conteúdo e método utilizados no ensino, desconsiderando, nesse caso, a
transitoriedade e heterogeneidade dos sujeitos aprendentes. Consideramos que cabe ao setor responsável,
no caso o Ministério da Educação de Timor-Leste, disponibilizar aos docentes os recursos necessários à
realização de sua prática.
Além disso, faz-se necessário também a oferta de cursos de formação continuada voltados, sobretudo,
aos métodos de ensino de LP, pois, no caso observado nesta pesquisa, as professoras não apresentam
dificuldades relacionadas à língua, contudo ao serem questionadas sobre os métodos que utilizam houve,
em suas respostas, elementos que nos permitem inferir que este conceito não está bem claro para estas
docentes.
Em relação a essa pergunta, a professora da turma B disse como ela realiza sua prática pedagógica
elencando etapas, nas quais observamos objetivos e propostas, e não apenas o método que utiliza:
1. Pesquisar a participação dos alunos;
2. Fazer uma maneira para motivar a interligação e a criatividade de cooperação;
3. Introduzir no meu cotidiano assunto de interesse e conhecimento dos alunos;
4. Utilizar a minha técnica para diminuir o trabalho na minha sala de aula;
5. Atividade em grupo e fazer pesquisa;
6. Fazer pequeno desenho para que eles possam desenvolver uma ideia sobre a construção do
desenho;
7. Debate entre a professora e os alunos.
30
A professora fala ainda que procura desenvolver sua prática de forma democrática, em que é
importante a participação dos alunos. Diz que sua prática está centrada no aluno e que promove a
pesquisa e a experimentação em sala de aula.
Professora da turma B: Então participação dos alunos, centrado nos alunos e atividade participativas
e mais inclusivas [...] primeiro dá observação para que eles possam analisar e depois compreender e dar
informação.
Em relação ao uso do material didático, a professora da turma B disse que é sua responsabilidade
preparar o plano de aula e criar o seu trabalho didático, usando a sua criatividade. Podemos dizer que a
resposta da professora é decorrente da já mencionada falta de material didático em resposta a primeira
pergunta da entrevista.
Nesse ponto percebemos mais uma diferença na prática dessas duas professoras que utilizam métodos
diferentes pra suprir a falta do material didático. A professora da turma A utiliza fotocópia de materiais
anteriores, enquanto a professora da turma B diz usar a sua criatividade para produzir seus materiais.
Essas distintas estratégias utilizadas pelas duas docentes integrantes desta pesquisa nos fazem refletir
sobre a importância do professor e das escolhas que esse sujeito faz no processo de ensino-aprendizagem.
O professor é elemento fundamental nesse processo e suas ações vão guiar o desenvolvimento do
aprendizado dos alunos.
Considerações
O atual quadro educacional de Timor-Leste reflete o histórico desse país. No período de ocupação
indonésia, de 1975 até 1999, todas as escolas foram queimadas e destruídas. Após a independência, em
1999, houve um movimento de reconstrução dos setores afetados, como a educação. Contudo, podemos
dizer que esse movimento avança muito lentamente.
No caso desta pesquisa, vimos que a língua não é a principal dificuldade das docentes, pois elas
estudaram em LP, no período anterior à ocupação indonésia. Porém, vimos que os fatores externos à
língua, como a infraestrutura e a falta de recursos didáticos, são citados como empecilhos para o
desenvolvimento da prática pedagógica. Ou seja, Timor-Leste ainda precisa de muitos recursos porque,
mesmo quando os docentes sabem a LP, eles acabam por enfrentar outras dificuldades.
O docente, as concepções e métodos que utiliza, fazem a diferença no processo de ensino-
aprendizagem. Suas escolhas pedagógicas vão orientar os rumos das aulas. No caso desta pesquisa, a
língua não é uma dificuldade para as professoras, mas é para os alunos. Sendo assim, cabe aos docentes,
com o devido respaldo do governo, seja por meio de recursos ou cursos de formação continuada,
desenvolver meios para que os alunos melhorarem o domínio da Língua Portuguesa.
Referências
ANÇÃ, Maria Helena. Da língua materna à língua segunda. Noesis. nº 51, julho/setembro, 1999.
Disponível em: <http://area.dgidc.min-edu.pt/inovbasic/edicoes/noe/noe51/dossier1.htm> Acesso
em 19 de fevereiro de 2015.
CHOUPINA, C. M.; RIBEIRO, I. Desenvolvimento de competências comunicativas em português L2: o
caso de Timor-Leste. In.: TEIXEIRA E SILVA, R.; YAN, Q.; ESPADINHA, M. A.; LEAL, A. V.
(orgs.). III SIMELP: A formação de novas gerações de falantes de português no mundo. 2012, p.
16-27.
BRITO, R. H. P. Ciências & Letras, Porto Alegre, n. 48, p. 175-194, jul./dez. 2010 Disponível em:
<http://seer1.fapa.com.br/index.php/arquivos> Acesso em 19 de fevereiro de 2015.
31
LAVILLE, Christian; DIONNE, Jean. Em busca de informações. In:______. A construção do saber:
manual de metodologia em ciências humanas. Porto Alegre: Editora Artes Médicas Sul Ltda; Belo
Horizonte: Editora UFMG, 1999. p. 165-195.
MORAES, Roque. Análise de conteúdo. Revista Educação, Porto Alegre, v. 22, n. 37, 1999, p. 7-32
REIS, Reis Maria Francisca Soares dos. (2011) A co-oficialidade da Língua Tétum e da Língua
Portuguesa: um desafio para a formação de professores de Timor-Leste. Dissertação (Mestrado em
Educação) – Dissertação apresentada à faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 2011.
SOARES, L. M. M. C. V. P. Línguas em Timor-Leste: que gestão escolar do plurilinguismo? Tese
(Doutorado em Educação) – Tese apresentada à Universidade de Aveiro, 2014.
TIMOR-LESTE. (2008). Lei n.º14/2008 de 29 de Outubro – Lei de Bases da Educação. Disponível
em:<http://www.jornal.gov.tl/?mod=artigo&id=1453> Acesso em 30 de janeiro de 2015.
32
UMA ANÁLISE DAS LACUNAS LINGUÍSTICAS E CIENTÍFICAS DO EXAME NACIONAL
DE MATEMÁTICA
David Raimundo1
Introdução
Conclui-se a partir das citações apresentadas que devemos encarar os mecanismos de avaliação como
parte integrante e fundamental do sistema de educação. No contexto do desenvolvimento do sistema
educativo de Timor-Leste importa também refletir acerca da forma como os alunos são avaliados e
importa garantir que a avaliação feita constitui uma forma rigorosa e justa de aferir as competências dos
estudantes. É neste âmbito que se insere o presente artigo.
Este artigo nasceu a partir de um pedido do professor Cesário Oliveira, a quem expressamos o nosso
agradecimento, para que elaborássemos uma resolução detalhada do Exame Nacional de Matemática do
Ensino Secundário Técnico-Vocacional do Ano Letivo 2014. Este exame, tal como a generalidade dos
Exames Nacionais de Timor-Leste, é constituído por 50 perguntas de escolha múltipla. Ao resolvermos o
exame concluímos que 7 dessas perguntas de escolha múltipla não apresentavam a resposta correta entre
as quatro opções disponíveis. Este problema originou uma análise mais profunda das lacunas e
inconsistências do exame e é essa análise que aqui apresentamos.
O propósito desta análise é dar um pequeno contributo, de forma construtiva, para a melhoria do
sistema de ensino e aprendizagem de Timor-Leste. Importa referir que este é um trabalho aberto a
críticas, complementos e correções. É pelo esforço coletivo e pela reflexão coletiva que juntos
construímos o presente e o futuro de Timor-Leste.
1
Correio eletrónico: [email protected]. O autor está disponível para receber questões ou complementos ao seu
trabalho e também para fazer chegar aos potenciais interessados o enunciado do Exame Nacional sob análise.
33
Avaliação através de Perguntas de Escola Múltipla
O Exame sob análise tem a particularidade de ser constituído exclusivamente por Perguntas de
Escolha Múltipla (PEM). Por um lado, devemos reconhecer que a utilização de PEM é hoje prática
comum em diversas disciplinas e em diversos graus de ensino e são inegáveis os seus benefícios como
ferramenta para assimilação de conhecimentos. McDermott et al. (2013) apresenta o resultado de um
estudo que aponta para tais benefícios. Eis a conclusão desse estudo: a realização frequente de
questionários de escolha múltipla ou de resposta rápida por parte dos alunos melhora a sua performance
posterior nos testes de avaliação, pois contribui para a retenção de informação. Por outro lado, trata-se
aqui não apenas da utilização de PEM como ferramenta didática, mas como ferramenta única de
avaliação dos estudantes num momento de avaliação de extrema importância por assinalar o findar do
Ensino Secundário.
Na literatura existente sobre o recurso a exames constituídos por PEM reconhecem-se vantagens e
desvantagens desta opção quando comparada com o uso de perguntas de desenvolvimento (PD). A
principal vantagem prende-se com a facilidade de correção e com os ganhos económicos que daí advêm:
as PEM exigem menos tempo de correção e menos recursos humanos despendidos nessa tarefa. Também
os estudantes podem preferir a avaliação através de PEM, pois este tipo de avaliação anula a
subjetividade da correção e da cotação que o avaliador atribui. Por outro lado, alguns autores apresentam
críticas que apontam para a existência de limitações dos testes constituídos por PEM. Baseamo-nos em
(TORRES et al., 2009: 8-9) para listar algumas das críticas mais comuns:
As PEM só medem a capacidade de memorização e não dão liberdade de resposta para medir
habilidades cognitivas mais complexas;
as PEM abrem a porta à aleatoriedade, pois os alunos podem adivinhar a resposta correta mesmo sem
ter conhecimentos sobre a matéria que está a ser avaliada;
as PEM têm tolerância-zero, ou seja, um pequeno erro do aluno pode conduzi-lo à resposta errada e a
uma cotação nula, mesmo que a sua abordagem e o seu raciocínio estejam corretos;
as PEM são artificiais quando comparadas com os problemas que surgem na vida real, uma vez que,
num contexto quotidiano ou profissional, os problemas não vêm, em geral, acompanhados de uma
lista de soluções alternativas.
Não existe consenso relativamente à validade destas críticas, havendo muitos autores que as
consideram equivocadas. De facto, podemos afirmar que o ponto 2, uma crítica prevalecente no senso-
comum, trata-se de uma falácia: num exame de PEM o aluno pode até adivinhar corretamente algumas
respostas, mas a probabilidade de obter uma nota final positiva recorrendo apenas às respostas aleatórias
é ínfima e diminui consoante o número de PEM for maior. Os cálculos apresentados em Torres et al.
(2009: 9) sustenta a conclusão de que esta crítica é equivocada.
No que diz respeito a analisar a validade das outras críticas, importa restringir a reflexão à disciplina
de Matemática. Com isto, assumimos que a adequação do recurso às PEM como método de avaliação
pode variar de disciplina para disciplina. A Matemática é uma disciplina com características próprias que
merece, neste assunto, um tratamento específico.
A utilização de PEM como forma de avaliar os conhecimentos dos estudantes de Matemática tem sido
objeto de muita pesquisa e as conclusões dessas pesquisas não são consensuais. O estudo da National
Mathematics Advisory Panel - NMAP - (2008) dos Estados Unidos da América apresenta a seguinte
conclusão favorável à utilização de PEM:
34
O Painel examinou a literatura existente acerca das propriedades psicométricas dos
items de resposta aberta quando comparados com os items de escolha múltipla. As
evidências na literatura científica não suportam a hipótese de que o formato de resposta
aberta, e em particular de resposta curta, mede aspetos diferentes de competências
matemáticas em comparação com o formato de escolha múltipla. (pp. 60)
Porém Shepard (2008) defende que esta conclusão é errada e que os diferentes formatos de teste só
medem as mesmas competências matemáticas se forem desenhados cuidadosamente para serem
praticamente idênticos, ou seja, se consistirem em questões que são na sua essênsia iguais, sendo a única
diferença a disponibilização ou não de opções alternativas. O autor apresenta uma tabela que resume os
resultados de 16 pesquisas comparativas entre o formato PEM e outros formatos (pp: 605). Segundo o
autor, esta tabela aponta para uma conclusão diferente daquela que é apresentada pelo NMAP: as
competências que podem ser avaliadas através de PEM são limitadas e a opção por perguntas de outros
formatos gera diferenças na performance dos alunos. Uma conclusão interessante para a qual Shepard
aponta é para a maior capacidade que as estudantes do sexo feminino têm perante PD em comparação
com as PEM.
Esta breve pesquisa bibliográfica ilustra a divergência de posições quanto à eficácia das PEM como
método de avaliação na disciplina de Matemática. Tendo em conta estas divergências, podemos afirmar
que ainda não existe uma ciência absolutamente estabelecida e sistematizada em torno da avaliação
através de PEM. A opção pelo formato PEM na disciplina de Matemática acaba por ser deixada ao
critério de cada professor e de cada instituição.
Pessoalmente, por entendermos as vantagens das PEM, mas, simultaneamente, encontrarmos validade
nas críticas que lhes são apontadas, tendemos a ser favoráveis a uma utilização mista de PEM e de PD na
avaliação dos alunos. Consideramos que na Matemática é importante avaliar não só se o aluno obtém o
resultado final correto, mas também o raciocínio que o conduz a esse resultado. A argumentação lógica-
dedutiva que serve de base à Matemática deve ser valorizada. A utilização exclusiva de PEM não dá
relevo a essa componente, uma vez que o raciocínio não é incluído na resposta do aluno e também porque
as PEM têm tolerância-zero ao erro. Somos também sensíveis à crítica que diz respeito à artificialidade
das PEM. De facto, os problemas de cariz matemático com que nos deparamos no quotidiano ou no meio
profissional não vêm, regra geral, acompanhados de uma lista de soluções alternativas.
De qualquer forma, uma vez tomada a decisão de optar por um exame constituído por PEM, é
necessário procurar a forma mais rigorosa e eficaz de as elaborar.
35
Questão 1. Sabe-se que a proporção de x:y=z:1, o valor x=500 e y=6, então o valor z é...
ii. Compreensão do objetivo. Depois de ler o enunciado, o estudante deve saber exatamente qual é o
problema e o que é que se espera que ele faça para o resolver, mesmo antes de ler as alternativas. A
pergunta não pode ser ambígua, deve ser escrita com clareza, o examinando tem de perceber com
exatidão o que lhe está a ser pedido. O mesmo é dizer que a pergunta deve conter em si toda a
informação necessária para que o examinando compreenda o problema. Não deve incluir subtilezas,
nem ser formulada com a intenção de enganar ou induzir os alunos em erro. O Exame cumpre em
termos gerais esta regra. Foram detectadas no exame ligeiras ambiguidades que dizem respeito a
informações que deveriam constar no enunciado para que o aluno soubesse que as soluções do
problema estavam restringidas a certas condições. Foi também detectada a falta de clareza da
seguinte questão3:
Questão 12. Numa progressão aritmética o termo geral a n=3n-1, então o sétimo primeiro termo é...
a. 8 b. 7
c. 20 d. 19
Neste caso o enunciado não é claro uma vez que a expressão sétimo primeiro termo é enganadora. A
utilização desta expressão parece resultar de uma lacuna linguística: o redator usou a expressão sétimo
primeiro possivelmente influenciado por ordinais como décimo primeiro ou septuagésimo primeiro.
Neste caso o ordinal correto é apenas sétimo. Apesar de ser possível chegar à resposta certa contando com
a ajuda das opções alternativas disponíveis, este erro pode causar confusão nos alunos. Outro exemplo de
uma questão formulada de forma pouco rigorosa é a Questão 3: em geral, quando não é dito nada em
contrário, deve assumir-se que na solução de um sistema de 2 equações com 2 incógnitas é apresentado
em primeiro lugar a abcissa (x) e só depois a ordenada (y). No caso da Questão 3 é apresentado primeiro
a ordenada e depois a abcissa sem que haja qualquer indicação nesse sentido. Finalmente, também
entendemos que o rigor deveria ser mais acautelado em questões como a Questão 13, problemas de
trigonometria em que deveria ser especificado no enunciado qual o quadrante do ângulo pedido.
iii. Situações a evitar. Segundo Pinto (2001), na elaboração de PEM deve também ser evitada a
avaliação de conhecimentos irrelevantes e sem importância e o uso de informações que não foram
aprendidas. Devem também ser evitadas PEM que apenas apelem à recordação de factos isolados.
Através da tabela 2, mais adiante, analisaremos até que ponto as questões do Exame Nacional de
Matemática correspondem a tópicos relevantes da matéria do Ensino Secundário de Matemática.
3
Note-se novamente o pouco rigor linguístico da redação da questão. Na primeira parte da pergunta está ausente a forma
verbal do verbo ser. Deveria estar escrito ‗o termo geral é...‘. Este tipo de gralhas é recorrente no exame e torna os
enunciados pouco rigorosos e potencialmente confusos. Mostram que os responsáveis pela redação e revisão do exame não
dominam a Língua Portuguesa com o rigor de que um exame destes carece.
36
Regras para a escolha dos distratores
iii. Resposta certa equidistribuída. A resposta correta deve estar aproximadamente o mesmo
número de vezes nas várias alternativas. Note-se que as respostas certas do Exame distribuem-se
pelas opções A, B, C e D da seguinte forma:
Opção Frequência Absoluta Frequência Relativa
A 11 26%
B 18 42%
C 9 21%
D 5 12%
Tabela 1: Distribuição das respostas certas do Exame.
37
Idealmente, as frequências relativas de cada opção devem rondar os 25%. No Exame sob análise
encontramos frequências que se afastam bastante dessa percentagem, nomeadamente as opções B e D.
Verifica-se também que as opções A e B têm uma frequência relativa acumulada de 68%, enquanto as
opções C e D têm uma frequência relativa acumulada de 32%. Talvez esta situação se explique pela
pressa em registar a resposta certa, acabando esta por ter uma frequência mais elevada nas primeiras
letras. Esta é uma situação que requere cuidado, uma vez que um aluno perspicaz pode detectar padrões
nas opções que aumentem a sua probabilidade de optar pela resposta correta mesmo que não domine o
assunto sobre o qual está a ser questionado.
Finalmente, importa dar atenção a um aspeto mencionado em Torres et al. (2009: 8): os distratores
que nunca sejam escolhidos pelos examinandos devem ser substituídos por outros mais plausíveis. Na
prática, isto significa que aquando da elaboração dos próximos Exames devem ser evitados os distratores
que em Exames de anos anteriores não tenham sido escolhidos pelos alunos.
Concluímos este ponto citando Camilo e Silva (2008: 2) como resumo das regras acima apresentadas:
―[Numa PEM] o tronco deve ser explícito. A pergunta clara. As opções sucintas. Deve ser possível
responder à pergunta formulada sem ter acesso às opções de resposta. Seleccione bons distratores:
plausíveis, homogéneos e com uma extensão semelhante à da opção correcta‖.
Conteúdo do Exame
Nesta secção debruçamo-nos sobre o conteúdo do Exame no que diz respeito aos temas acerca dos
quais os alunos foram questionados e ao rigor com que as questões foram apresentadas. Para melhor
sintetizar a informação, foram elaboradas duas tabelas que resumem o conteúdo do Exame nos aspetos
acima mencionados:
Uma das possibilidades que um exame exclusivamente constituído por PEM oferece é a possibilidade
de cobrir de forma mais extensa os vários temas da disciplina, por comparação com as PD (estas seriam
menos abrangentes, embora permitindo aprofundar de outra forma os temas). Mas a distribuição exibida
na tabela 2 mostra que esta possibilidade não foi concretizada no Exame. De facto, a tabela mostra que
houve uma grande desproporcionalidade nos conteúdos do Exame. Eis alguns dos dados que merecem
atenção:
30 das 50 questões são dedicadas a apenas três temas: Primitivação e Integração, Trigonometria,
Cálculo de Limites. Ainda que estes sejam temas exigentes e estejam entre os mais avançados do
Programa do Ensino Secundário, esta situação não é ideal. Um aluno que domine estes três
temas será aprovado mesmo que não tenha um bom conhecimento dos restantes temas.
38
Há 15 questões sobre Primitivação e Integração e apenas 2 questões sobre Derivação. Esta é uma
desproporção que deve ser revista. Os dois temas pertencem ambos ao programa do 12º ano e
têm igual importância. Um aluno deve dominar as regras de primitivação, mas também as regras
de derivação (tendo até em conta que essas regras estão relacionadas). Para além disso, as
aplicações das derivadas no estudo de funções devem também ser valorizadas. O Exame não tem
nenhuma questão em que estejam diretamente envolvidas essas aplicações: estudo da monotonia
de uma função, cálculo de extremos relativos e/ou absolutos, cálculo da equação da reta tangente
ao gráfico da função num ponto, relação entre a derivabilidade e a continuidade de uma função,
etc. Para além disso deve referir-se que as questões do Exame de maior grau de dificuldade
foram relativas ao tema da Primitivação e Integração, apresentando algumas delas um grau de
exigência que nos parece excessivo (por exemplo, as questões 35 e 37).
Não há nenhuma questão que faça uso do conceito e das propriedades da função exponencial e
há apenas uma questão sobre logaritmos. Estes são temas da matéria do 11º ano que poderiam
ser mais valorizados no Exame.
O tema das Probabilidades consta no programa do 12º ano, mas o Exame não tem nenhuma
questão sobre este tema. Em contrapartida, há 5 questões sobre Estatística. Esta distribuição
pode ser reequilibrada em Exames futuros.
Nos programas do 10º e 12º constam temas de Geometria (Reta e Circunferência, Cónicas) que
não são testados no Exame.
Uma ligeira reformulação deste enunciado exemplifica como uma questão pode adquirir um contexto
mais prático sem aumentar o seu grau de dificuldade:
Questão 46. As notas do João nas disciplinas do 12º ano foram $5, 7, 6, 5, 7, 6, 8, 7, 9, 7$. Qual é a
frequência relativa da nota $7$?
2. Perguntas demasiado idênticas. O Exame tem vários pares ou trios de perguntas praticamente
idênticas, avaliando assim as mesmas competências. Por exemplo, as questões 19 e 23 consistem
no cálculo de limites que têm exatamente a mesma natureza. Poder-se-ia ter optado por incluir o
cálculo de um limite de natureza diferente.
3. Perguntas para as quais os alunos não estavam preparados. Algumas questões abordam
conceitos ou raciocínios que são marginais ao Programa do Ensino Secundário, sendo de supor
que a maioria dos alunos não estaria preparada para tais questões. Por exemplo, a questão 9
39
envolve o conceito de secante, mas este conceito trigonométrico não está apresentado nos manuais
do aluno do Ensino Secundário. As questões 41 até 45 dizem respeito ao cálculo de Primitivas,
mas estão formuladas de um modo que não encontra paralelo nas Tarefas e Questionários do
Manual do Aluno do 12º ano. Mesmo um aluno que domine o tema da Primitivação teria
dificuldade em responder corretamente a estas questões caso não tenha lidado anteriormente com
questões do mesmo género.
3tan(𝑥)
Questão 28. Limx--> 0 é...
𝑥
a. 1 b. 2
c. -1 d. 0
A resposta certa é o valor 3, que não se encontra nas opções, talvez por lapso.
Atentemos agora para a Questão 22:
40
1
Questão 22. A soma da progressão geométrica infinita 3+1+ +... é...
3
a. 3 b. 4
c. 5 d. 2
A resposta correta é 4,5 e não é matematicamente aceitável que se dê uma resposta por aproximação
(até porque tal não é dito no enunciado). Esta é uma pergunta de grau de dificuldade elevado relacionada
com séries geométricas (infinitas), uma matéria que os alunos do ensino secundário não estudam de
forma sistemática. Ainda que pudessem chegar à resposta por dedução (através dos limites das somas
sucessivas), a resposta certa não consta nas opções alternativas. Parece-nos que este erro pode dever-se a
uma lacuna científica (ou raciocínio apressado) do próprio redator.
No que respeita à dificuldade do exame, consideramos que, em termos gerais, o grau de dificuldade
do Exame é aceitável, face aos atuais currículos do Ensino Secundário Técnico-Vocacional. Seria
também pertinente uma reflexão acerca da adequação e da exigência dos currículos. Tal reflexão não é
aqui incluída por sair fora do âmbito deste artigo. É também de salientar que essa reflexão está prevista
no Plano de Educação 2013-2017 que prevê o redesenhamento de todo o currículo do Ensino Secundário
Técnico-Vocacional entre 2014 e 2016.
Sugestões adicionais
Tendo em conta que o sistema de ensino e aprendizagem da RDTL ainda se encontra numa fase de
desenvolvimento e tendo em conta que não são abundantes os recursos humanos com experiência e
conhecimento especializado, consideramos que é aceitável o recurso a exames exclusivamente
constituídos por PEM. No entanto, é necessário aumentar o rigor das PEM, de acordo com as sugestões
baseadas nas recomendações existentes na literatura especializada na área. Acrescentamos ainda algumas
sugestões práticas relativas ao processo de elaboração do exame. Tendo em conta que os Exames
Nacionais de outras disciplinas também seguem o modelo de Escolha Múltipla, as mesmas
recomendações podem ser aplicadas ou adaptadas para as diferentes disciplinas:
- Antes de elaborar o Exame deve ser feita uma Matriz dos Conteúdos que se pretende avaliar e do
peso que cada conteúdo terá na avaliação. Essa Matriz pode ser facultada aos professores e alunos
para que estes adequem a preparação àquilo que lhes será exigido no Exame.
- A tarefa de construção das PEM e de elaboração do Exame deve ser uma tarefa entregue a uma
equipa de trabalho e não a um único professor. Desta equipa de trabalho deverão fazer parte
professores de matemática ativo, que tenham simultaneamente conhecimento das dificuldades dos
alunos e do progresso geral da aprendizagem da matemática por parte da juventude timorense e
um domínio sólido dos conceitos matemáticos. Deve também garantir-se que a equipa de trabalho
contém pelo menos um elemento que tenha um excelente domínio da língua portuguesa que possa
fazer uma revisão cuidadosa dos enunciados.
- Ao mesmo tempo que se elabora o Exame podem ser elaboradas tabelas como a Tabela 1 e a
Tabela 2 de forma a garantir que as questões do Exame têm uma distribuição adequada no que diz
respeito à letra onde consta a resposta correta, aos temas avaliados e também ao grau de
dificuldade.
41
- Depois de elaborado o Exame, os responsáveis devem verificar se as questões do Exame
correspondem à Matriz anteriormente elaborada. Caso haja uma discrepância, algumas questões do
Exame devem ser substituídas por outras de modo a ir ao encontro à Matriz.
- O Exame deve ser resolvido e revisto por um ou mais professores que não tenham feito parte da
sua elaboração. A revisão deve ser feita quer a nível linguístico, quer a nível Matemático. Nesta
resolução deve garantir-se que todas as PEM incluem a resposta correta e devem ser corrigidas
eventuais ambiguidades. De modo a garantir que o exame é adequado para alunos de diferentes
contextos socio-económicos de Timor-Leste, neste processo podem ser consultados professores de
vários distritos.
Conclusão
Neste artigo ficam expostas as fragilidades do Exame Nacional de Matemática de 2014, mas fica
também patente que é possível evitar essas fragilidades em futuros exames adoptando uma abordagem
mais sistemática e cuidada, seguindo as recomendações dadas pela literatura existente nesta área no que
diz respeito à elaboração de Perguntas de Escolha Múltipla e dos respetivos distratores, e no que diz
respeito ao processo de redação do exame.
Bibliografia
Camilo, H; Silva, J. A. P. (2008) ―Os Testes de Escolha Múltipla‖, Essências Educare - Fichas
Pedagógicas GEM, Universidade de Coimbra
Case, Susan M.; Swanson, David B. (2003). ―Constructing Written Test Questions For the Basic and
Clinical Sciences‖, National Board of Medical Examiners, 3rd edition
McDermott, Kathleen B.; Agarwal, Pooja K., D'Antonio, Laura; Roediger, Henry L.; McDaniel, Mark A.
(2013). ―Both multiple-choice and short answer quizzes enhance later exam performance in middle
and high school classes‖, Journal of Experimental Psychology: Applied 20 (1), 3-21
National Mathematics Advisory Panel (2008). The Final Report of the National Mathematics Advisory
Panel, U. S. Department of Education
Pellegrino, James W.; Chudowsky, Naomi; Glaser, Robert (2001) Knowing What Students Know: The
Science and Design of Educational Assessment, National Academies Press
Pinto, Amâncio da Costa (2001). ―Factores relevantes na avaliação escolar por perguntas de escolha
múltipla‖, Psicologia, Educação e Cultura, 5 (1), 23-44
Shepard, Lorrie A. (2008). ―Commentary on the National Mathematics Advisory Panel
Recommendations on Assessment‖, Educational Researcher, AERA, 37: 602-609
Torres, Cristina; Lopes, Ana Paula; Babo, Lurdes; Azevedo, José (2009) ―Developing Multiple-Choice
Questions in Mathematics‖, International Conference of Education, Research and Innovation 2009
Proceedings, 6218-6229
Neto, Teresa; Bessa, José; Serra, Lucinda (2012). Matemática - Manual do Aluno - 11º ano, Ministério da
Educação de Timor-Leste
Neto, Teresa; Bessa, José; Serra, Lucinda (2013). Matemática - Manual do Aluno - 11º ano, Ministério da
Educação de Timor-Leste
Neto, Teresa; Bessa, José Serra, Lucinda (2014). Matemática - Manual do Aluno - 12º ano, Ministério da
Educação de Timor-Leste.
42
O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NA UNIVERSIDADE NACIONAL TIMOR
LOROSA’ : UM ESTUDO SOBRE O DEPARTAMENTO DE LÍNGUA PORTUGUESA
Antecedentes
A língua portuguesa não é uma nova língua para o povo timorense. Ela f o i utilizada durante 4
séculos e meio, embora como instrumento de colonização, no seio desta comunidade, acabando por
traçar a sua identidade cultural, nacional e, por dadas razões, foi consagrada língua oficial do país.
―Quem aprende uma nova língua adquire uma alma nova‖. Esta frase de Juan Ramón Jiménez foi
escolhida para introduzir este trabalho, porque mesmo que ainda existam pessoas que tentem
enfraquecê-la com diversos gestos, o departamento de língua portuguesa, em parceria com outras
instituições, lutará sempre para que todos os cidadãos timorenses adquiram uma alma rejuvenescida,
aprendendo a utilizar a língua portuguesa especialmente na área de ensino-aprendizagem e como língua
de comunicação. O objeto deste estudo é a avaliação formativa do curso de Licenciatura em Língua
Portuguesa, desenvolvido pelo Departamento de Língua Portuguesa, da Faculdade da Educação,
Artes e Humanidades da UNTL,durante os dez anos de sua existência.
Pretende-se, neste estudo, registrar atividades realizadas pelo departamento de língua portuguesa da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e; descrever o processo de ensino-aprendizagem de língua
portuguesa deste departamento, sua eficiência, eficácia e efetividade; analisar as mensagens escritas,
opiniões, sugestões e até críticas recolhidas dos estudantes, docentes e outros entrevistados e
autoavaliar-se para obter melhorias futuras.
43
estudantes ocupados em atividades educacionais. Como resposta, surgiu um mar de professores
voluntários movidos apenas por nacionalismo, resistência e necessidade de acomodar milhares de jovens
com estudos interrompidos, na tentativa de diminuir a pressão político-social evitando manifestações
diárias de jovens nas ruas de Díli.
Na terceira semana de outubro do ano de 1999, por iniciativa da autora deste trabalho, foram
recrutados 22 colegas professores voluntários e, com eles, criou-se o primeiro curso livre de línguas
portuguesa e inglesa, lecionadas a 2.000 jovens nas ruínas do edifício do Liceu Dr. Francisco
Machado.
Foi determinada pela política educacional da jovem nação que a língua portuguesa
intermediasse o ensino. Essa decisão, porém, se deve a um desejo político, principalmente pelo fato de a
língua portuguesa ter sido a língua da luta e da resistência durante os vinte quatro anos de
dominação, e não pela conveniência linguística. Valeu-lhe, pois, o setor da educação ser indicado como
a prioridade da Cooperação Portuguesa em Timor Leste no relatório apresentado pelo Ministério dos
Negócios Estrangeiros em maio de 1999. Os pressupostos então presentes mantêm-se, e a vontade
claramente expressa pela liderança política corresponde a um valioso contributo de Portugal neste setor,
que originou a criação de importantes ações conjuntas com estruturas da sociedade civil.
Para melhor estruturar o ensino da língua portuguesa, havia a necessidade de oficializá-la com
instituições relevantes. Para isso, criou-se o Centro de Língua Portuguesa do Instituto Camões em 2001.
Para assegurar a lecionação dos cursos extracurriculares e de aperfeiçoamento da língua em todas
as áreas do funcionalismo público timorense, recrutaram-se 9 professores timorenses do ensino
primário, incluindo esta autora que vos escreve, como monitores do Instituto Camões. Essa equipa,
desde 2001, funcionou sob a coordenação de professores portugueses sendo, uma delas, a
professora Esperança Figueiredo. E uma das nossas principais tarefas consistia na produção de materiais
didáticos específicos a cada área, como: Academia de Enfermagem, Academia da Polícia, Ministério
das Finanças, Ministério da Saúde, Serviços Alfandegários, Aeroporto e outras instituições.
Criou-se o departamento da Língua Portuguesa na Universidade Nacional Timor Lorosa‘e e, com
ele, o Curso de Licenciatura em Língua Portuguesa e Culturas Lusófonas, em outubro de 2001. É a
única universidade oficial, a UNTL tem a disciplina de Português no p lano curricular, pelo menos,
nos seus primeiros dois anos e em todos os departamentos dos outros cursos. Na UNTL é oferecido um
curso intensivo de português durante três anos.
Sendo a língua portuguesa língua oficial do país, consequentemente, ela é língua de ensino em todos
os níveis de escolaridade. Com base nesta decisão, o governo traçou estratégias e políticas
nacionais para a área de educação. Criou-se um curso que pudesse formar professores para ensinarem a
língua portuguesa, realizado pelo departamento de português na Faculdade de Educação, Artes e
Humanidades da UNTL. Todavia, após de10 anos da existência desse curso, surge a necessidade de fazer
uma pausa para refletir acerca dos seus trabalhos, ou seja, estabelecer uma apreciação crítica, fazendo
uma comparação entre os resultados obtidos e os objetivos pré-definidos.E para iniciarmos uma auto-
avaliação, devemos responder: o que é avaliar? Quem vamos avaliar? Para que avaliar?
Avaliação
44
pressupostos, das lógicas e dos atores nela implicados. Por outras palavras, implica a
reflexão e a explicitação de algumas questões pertinentes: Por que avaliar? Para quê?
Para quem? Para que tipo de decisões? Trata-se, pois, de clarificar as ―intenções
subjacentes‖ aos projetos de avaliação.
A avaliação retratada neste estudo é, sem margem de dúvidas, uma avaliação institucional, e, como
tal, é considerada a opinião e sugestão dos gestores, docentes ou informantes privilegiados e estudantes,
além de consultar os programas, os currículos, a eficiência e efetividade incluindo os resultados do
ensino-aprendizagem obtidos durante estes dez anos contrastando-os com o nível dos estudantes à entrada
da universidade e com as expetativas da sociedade.
Os dados fornecidos pela avaliação formativa permitem ao avaliador identificar os conhecimentos
anteriores dos alunos, as suas expetativas, incluindo as suas atitudes, suas necessidades e seus interesses
em tornarem a aprendizagem mais relevante e mais significativa, como Ferreira (2007: 11-52) afirma:
A função formativa da avaliação tem, essencialmente, uma finalidade pedagógica
(HADJI, 1994) e tem como caraterística principal a de estar integrada no processo de
ensino-aprendizagem. Baseando-se numa lógica de "suscitar um máximo de
aprendizagens no maior número de estudantes" (CRAHAY, 1999, p. 278), realiza-se
com o propósito de favorecer a melhoria de algo: o processo de aprendizagem dos
alunos, uma estratégia de ensino, um projecto educativo, a criação de um material
pedagógico, etc. (GIMENO SACRISTÁN, 1993). Carateriza-se, genericamente, por
incidir no processo de ensino-aprendizagem e não nos seus resultados, ou na
averiguação dos pré-requisitos necessários às novas aprendizagens.
Quer isto dizer, que o aluno é sujeito da sua aprendizagem e deve ser motivado a refletir sobre as suas
próprias fraquezas, as suas capacidades inteletuais de que é dotado no sentido de considerar os
conhecimentos científicos anteriormente adquiridos, tentando compará-los com a progressão depois da
lecionação dos conteúdos curriculares. Conhecendo os seus pontos fracos, pode ele autoavaliar-se e
perspetivar o seu nível seguinte. Outro objetivo, igualmente importante desta função, refere-se ao
professor no sentido de fazer um exame de consciência. No entanto, estas afirmações são muito boas
teoricamente, todavia, o que na realidade acontece é o fato de que muitos estudantes entram neste curso
não por mérito ou pela própria escolha, mas por uma conveniência, principalmente financeira, para
enquadrar a Universidade Nacional Timor Lorosa‘e com mais regalias do Estado, comparando com
outras universidades privadas aqui existentes. Não exclui, ainda, a intervenção do Ministério de Educação
e Cultura e da própria Universidade, que enquadram estudantes que não são dotados de capacidades
inteletuais demonstradas nos testes diagnósticos escrito e oral realizados à entrada da universidade.
Metodo logia
Sendo um estudo de caso, a metodologia utilizada neste estudo é o método que se baseia no registo e
interpretação das observações feitas pela pesquisadora e não um método que se baseia em números.
Procurou-se, ainda, aprofundar o estudo pela observação e vivência direta da autora e realizaram-se
entrevistas a formados pelo curso colocadas nas instituições públicas ou privadas, docentes do
departamento (equipa luso-timorense), particularmente a 55 estudantes ativos do curso, decano da FCE/
Vice-Reitor da UNTL para assuntos académicos. Além disso, foram consultadas as referências escritas
nas bibiotecas de Díli, incluindo documentos como: Constituição da República Democrática de Timor-
Leste e a Lei de Bases da Educação de Timor-Leste, Estatuto da Universidade Nacional de Timor-Leste e
diferentes planos curriculares pelos quais o curso tem passado. Tanto aos sujeitos inquiridos como aos
entrevistados foi-lhes conservado o anonimato.
45
Sujeitos inquiridos
Em conformidade com os objetivos acima citados e para uma maior abrangência de fontes,
decidiu-se recolher opiniões dos 14 docentes que compõem o corpo docente do DLP. Um outro
inquérito foi aplicado a 65 estudantes do curso de Licenciatura em Língua Portuguesa, que
foram selecionados com a colaboração dos diretores das turmas e dos seus respetivos docentes. Foi
distribuído a 65 estudantes, do 2º ao 5º ano, realizado em situação de sala de aula. No final, porém, só
foram devolvidos 55 dos 4 grupos.
Inquérito
As questões que orientam este estudo apresentadas no inquérito feito aos docentes puderam ser
distribuídas em duas categorias principais. Um primeiro grupo de questões que pretende gerar
informações relacionadas com a aproximação dos docentes aos estudantes e os esforços realizados
como resposta aos desafios encontrados no terreno como:a) identificar lacunas e áreas de ineficiência; b)
fatores que constituem obstáculos para o bom funcionamento do curso; c ) apontar dificuldades de
competência científica dos estudantes; d) descrever motivos de abandono escolar; e) apontar esforços
tidos para melhorar os resultados; f) referir consequências das alterações dos currículos do curso e da sua
interferência no sucesso escolar; g) justificar se o departamento teve sucesso ou insucesso.
A última questão consistiu em sugerir conselhos para melhorar o sucesso educativo do curso
realizado neste departamento. As opiniões dos estudantes foram registradas a partir de 27 questões, que
puderam ser agrupadas em 10 categorias que seguidamente são apresentadas:
a) Saberes científicos, pedagógicos e didáticos;
b) os métodos que os professores mais frequentemente utilizam; ―quais os preferidos e porquê‖;
c) tipos de avaliação mais usados pelos docentes do curso; ―Instrumentos de avaliação utilizados no
Curso‖;
d) formação académica que devem ter os docentes da licenciatura;
e) experiência profissional dos docentes em outros níveis de ensino, com a justificação da resposta e
outras como atividades que habitualmente realiza com os professores fora dos tempos lectivos;
f ) materiais didáticos (livros, sebentas, materiais audiovisuais) utilizados pelos professores.
Recursos bibliográficos disponíveis (biblioteca do Centro de Língua Portuguesa/ Instituto Camões
e do Centro Cultural Português) são suficientes para superar as suas necessidades de pesquisa,
justificando a resposta;
g) salas de aula q u e oferecem um ambiente escolar (espaço, cadeiras, recursos de apoio); apoio
logístico aos alunos (fotocópias; empréstimo de livros); ―uso de computadores com acesso a
internet) dado pelo curso‖;
h) relação entre os professores e alunos do curso, entre os próprios alunos e entre os alunos e a direção
do curso e da faculdade;
i) aspetos positivos e negativos do curso;
j ) sugestões que possam contribuir para melhorar o sucesso do curso.
Análise de dados
46
muito se preocupou com a educação, mais especificamente com a do ensino superior, não só para elevar
o nível educacional do seu povo, mas também para a formação de quadros superiores, porque o
desenvolvimento de um país está diretamente ligado ao desenvolvimento do capital humano. Em
consequência de inúmeras lutas contra os doadores e a própria UNTAET, ressurgiu a UNTL como
universidade pública, pilar de um estado democrático para a realização pessoal e profissional do
indivíduo, do membro da sociedade e do país independente do qual faz parte.
A avaliação contínua deste Departamento pode ainda ser observada nas várias alterações pelas quais
os planos curriculares têm passado, sendo a última avaliação realizada em junho de 2011. Esta, porém,
ainda foi sujeita à apreciação da Faculdade de Educação, nas reuniões de trabalho interdepartamental.
Estas informações, porém, não bastaram para estar mais ligada aos correntes acontecimentos. Recorreu-
se, então, ao inquérito por questionário aos docentes e aos estudantes, como seguidamente se
transcreve.
47
sobrepostos com o seu horário académico, diminuindo automaticamente as suas horas de estudo e de
pesquisa. Esta realidade, muitas vezes afeta o aluno e o deixa minimizado perante aos que moram com
os pais e são-lhe facilitados meios eficazes que lhes permitem acesso livre ao estudo, pesquisa e
extensão.
Quanto às razões de desistência dos estudantes (419 inscritos desde 2001 a 2010), os docentes
são de opinião que se deve à ausência de pré-requisitos; opção por uma área de estudos de acordo com
oportunidades posteriores de saídas profissionais; dificuldades económicas.
Como foi referido em epígrafe, consequentemente, ingressam no curso, mesmo sem bagagem
intelectual; já no decorrer deste, não conseguem acompanhar a progressão; reconhecem a sua
fraqueza e desistem depois dos primeiros testes. Registram-se ainda os que desistem porque não têm
capacidades financeiras e abraçam o primeiro emprego que lhes depara para a sua sustentabilidade,
sem poder articular com o seu horário académico.
Segundo a observação participante da própria autora, inicialmente, muitos estudantes
participaram nos testes de admissão ao curso apenas por curiosidade e para testar os seus
conhecimentos de domínio desta língua, mas não com o intuito de continuar os estudos nesta área do
saber por ocupações profissionais. Outros são mais motivados, obtendo bolsas de estudo em outros ramos
fora do país, além das principais razões anteriormente apresentadas.
Aos esforços feitos no sentido de melhorar os resultados, os docentes apontam a continuação do ano
propedêutico, a reestruturação do currículo para ir sempre ao encontro do perfil de entrada dos alunos,
definindo um plano curricular real para o contexto timorense; o fornecimento de materiais e a
facutação do uso de computadores e do acesso à internet; baixar o nível e fazer revisão, ou seja,
retroceder o processo para ir ao encontro dos conhecimentos anteriores do público-alvo e da criação de
materiais didáticos adequados
Neste contexto, importa realçar também o esforço do Centro de Língua Portuguesa/Instituto Camões
para que o espaço (embora pequeno) faculte recursos facilitadores da preparação de trabalhos e da
própria investigação, através da disponibilização de computadores (novos) com acesso à Internet.
O fato de haver contínuas alterações curriculares, como foi atrás citado, é considerado um grande
desafio para o sucesso do curso. Por outro lado, os professores consideram como oportunidade de maior
interatividade pertinente em sala de aula no sentido de originar debates entre estudantes e docentes
dentro da sala de aula em que cada aluno tenta encontrar argumentos mais adequados para defender as
suas opiniões e tem uma melhor percepção da mais-valia da sua capacidade de raciocínio e da sua
opinião crítica.
Há que lembrar também que a transição entre cooperações deu lugar a constantes alterações
curriculares que originou insatisfação nalguns alunos. Alguns chegaram mesmo a desistir, pois
reconheceram que há disciplinas já realizadas nos planos anteriores que não tiveram reconhecimento
da faculdade. No entanto, a equipa docente no terreno teve de procurar as melhores soluções para
todos os alunos envolvidos, mesmo quando alunos que entraram num determinado ano e se inscreveram
nas disciplinas correspondentes ao modelo curricular vigente, se viram obrigados, no ano seguinte, a
integrar um novo modelo.
Essas sucessivas alterações são ainda consequência da falta de um coordenador científico-
pedagógico para apreciar e decidir as disciplinas que devem constar no currículo desta formação.
Como se pode verificar, 90% dos docentes consideram que o curso tem tido sucesso. Embora
apontem variadas razões para essa afirmação, tambem dão ênfase aos desafios encontrados versus
resultados obtidos. Mas declaram que, embora seja ainda reduzido em quantidade, são formados de
qualidade, cobiçados pelo mercado de trabalho, principalmente pela qualificação dos jovens da
geração de 1 9 75, ou seja, dos que adquiriram bases em língua portuguesa apenas em cursos informais
de seis meses, antes do seu ingresso no universo na universidade e que, graças aos esforços pessoais,
obtiveram bons e positivos resultados.
48
Perspectivas dos estudantes
Dos 65 inquéritos distribuídos, foram devolvidos 55. A Língua Materna dos estudantes é muito
variada, atingindo o número de 12 línguas. Apenas dois dos participantes têm o português como língua
materna. No entanto, talvez esses informantes confundissem a língua materna com a língua segunda.
Segundo observação: participante da autora e em conversa informal com os docentes concluiu-se
que nenhum aluno deste departamento tem o português como língua materna. A diversidade
destas línguas maternas não deve ser considerada obstáculo, antes, pelo contrário, uma riqueza cultural.
Neste inquérito feito aos estudantes, além das questões de identificação, ainda apresenta questões
de opinião, especificamente fechadas em que é apresentada aos inquiridos uma lista de respostas
possíveis onde são pedidas que indiquem a que melhor corresponde a que eles desejam dar, ou seja,
quatro questões presentes que abordam o número de disciplinas que constituem o plano curricular do
curso. Os materiais didáticos são ou não adequados? A formação académica dos docentes mais
adequada e o ambiente escolar, ou seja, o espaço da sala de aula reúne ou não condições de estudo?
São e x e m p l o s d a s questões de resposta múltipla nas quais o inquirido assinala apenas as que
constituem os principais centros de interesse.
Além disso, há ainda questões referentes a métodos mais frequentes que os professores utilizam; os
tipos e os instrumentos de avaliação mais utilizados, no qual faz-se necessário colocar a resposta por
ordem crescente, isto é, da menos à mais adequada. Nestas questões fechadas, são analisadas a
frequência com que ocorrem determinados assuntos, tendo em conta que a análise de ocorrência visa
determinar o interesse do inquirido por diferentes objetos ou conteúdos, incluindo a hipótese de que
quanto maior for o interesse deste por um dado objeto maior será a frequência da ocorrência no
discurso dos indicadores relativos a esse assunto. Além das questões fechadas acima abordadas, há ainda
20 questões abertas em que é pedida a opinião do inquirido no q u e se referem a vários aspetos do
curso. E stas questões ligam-se ao ―estudo avaliativo‖ dos objetos referidos pelo inquirido e que também
demonstram atitudes favoráveis e desfavoráveis do sistema de valores do mesmo.
A última questão apresentada é a de sugestões que possam contribuir para o sucesso, ou seja,
melhorar os resultados do referido curso. Essas sugestões são depois associadas às dos docentes
apresentadas nas respostas ao inquérito por questionário a eles posto.
Considerações finais
No final destes inquéritos chegou-se à conclusão que: a língua materna constitui um fator importante
nesta pesquisa pois, a língua tétum, como foi atrás referida, tem ―uma grande percentagem (40%) do
seu léxico constituída a partir do português‖; nesta medida, os estudantes que têm o tétum como
língua materna teriam maior facilidade de aprendizagem do português, quando comparados com
falantes de outras línguas maternas. Essa facilidade varia de 34% para o tétum a 2% para naweti, sa‘ami e
galole. Todavia, a língua portuguesa constitui um elemento diferenciador, importante para a
afirmação do Estado e para a sua projeção externa, constituindo também um fator crucial para o
desenvolvimento da língua tétum. Assim, por razões políticas, históricas e socioculturais a
Constituição da República Democrática de Timor-Leste, no seu artigo 13, consagrou-a como língua
oficial do país, em parceria com o tétum. Esta decisão, porém, tem que ser respondida com recursos
humanos qualificados para se realizarem ações de escolarização naquela língua.
Dentre os inquiridos, encontram-se muitos trabalhadores e estudantes. As profissões que exercem são
muito diversas, incluindo, sobretudo, professores, mas também tradutores, funcionários públicos,
entre outros.
49
A Universidade Nacional Timor Lorosa‘e é uma instituição que luta pela qualificação de alto nível de
timorenses e que tem por missão graduar profissionais de elevado valor académico e constituir
um centro de excelência.
Para que tal suceda:
- o Departamento de Língua Portuguesa da Faculdade de Educação, Artes e Humanidades da
Universidade Nacional Timor-Lorosa‘e, desde a sua fundação, tem conseguido dar alguma
resposta aos desafios com que se confronta, contribuindo para a formação do capital humano;
- a equipa docente do Departamento tem mobilizado esforços no sentido de recorrer a
variados materiais didáticos, utilizar diferentes métodos e vários instrumentos de avaliação,
tendo sempre em perspetiva de incluir os estudantes, centro de aprendizagem, tanto nas atividades
letivas como nas extracurriculares, para promover a imersão linguística;
- os estudantes têm aproveitado as facilidades existentes, conseguindo articular o seu
trabalho académico com outras atividades profissionais e familiares.
É verdade que o Departamento não tem conseguido graduar um número de estudantes que
corresponda às necessidades do país, mas a autora considera que já não é tempo de emergência e não há
a urgência de manter os jovens ocupados com atividades letivas para evitar manifestações públicas ou
outros atos que possam originar violência; entende-se, antes, que a qualidade deve ser promovida. Esta
desejada qualidade enfrenta, muitas vezes, desafios, com muitos estudantes a considerarem que há uma
exigência excessiva, e com as sucessivas alterações curriculares que têm sido introduzidas. Contudo, é
pela qualidade que o departamento se enraíza;.
Timor-Leste é um país potencialmente rico. No entanto, essa riqueza ainda se encontra
escondida e precisa de ser explorada. A pergunta reside em quem será o ator, quando atuará, onde e
como. As perguntas serão: ―Se não for agora, quando será? Se não formos nós, quem será? Se não for na
UNTL, onde será? Se não se lutar pela qualidade, como será o futuro da educação de Timor-
Leste?‖;
Tendo em conta os itens abordados entende-se que:
- É fundamental que o Ministério de Educação e Cultura esteja em estreita articulação com a
Universidade, no sentido de se definirem os caminhos de entrada no mercado de trabalho
dos Licenciados e Bacharéis formados no Curso de Licenciatura em Ensino de Língua
Portuguesa. Estes profissionais constituem, indiscutivelmente, o grupo de docentes com melhor
preparação e capacidade para responder às necessidades educativas da realidade timorense;
no entanto, o Ministério de Educação não os integra nas escolas públicas do país incluindo
a criação de condições para que possam, de um modo adequado, desempenhar as funções que
lhes estão confiadas. Sem essa atenção especial, os formandos vão ser enquadrados em
outros ministérios, desmotivando os futuros candidatos;
- devem ser tomadas as medidas adequadas no sentido de efetivar a utilização do tétum e do
português em todos os atos da Administração Pública, nomeadamente nas comunicações
internas e externas e em quaisquer anúncios públicos, investindo-se também nos serviços de
interpretação e tradução mediante a criação de revisores de imprensa e criação de uma política
linguística clara para o país;
- devem ser feitos esclarecimentos no momento da inscrição dos estudantes na universidade e
ser realizados exames de admissão escritos e orais com a participação dos professores de língua
portuguesa, considerando que continua a haver alunos que se candidatam à Licenciatura em
Ensino de Língua Portuguesa porque não encontram outra alternativa na escolha de cursos
oferecidos pela universidade.
50
Referências
51
52
A ESTRUTURA LINGUÍSTICA DA LÍNGUA MACASSAE
Considerações Iniciais
Por meio deste trabalho busca-se descobrir e explorar a história e a estrutura linguística da Língua
Macassae. É notório que a existência da Língua Macassae desde os séculos passados, implicitamente a
estrutura histórica e estrutura linguística, é justamente uma herança que compõe a unidade do Timor-
Leste: são diferentes etnias, todos falam as diversas línguas diferenciadas por coloridos herdados das
etnias: malaios, mestiços e dos negros papuásicos. Portanto, é necessário um estudo adequado em relação
a sua história e aos seus processos de evolução em harmonia de tempo a tempo sem discriminação uma a
outra pelos próprios apreciadores desde a sua chegada e estádia no território crocodilo.
É necessário ainda procurar saber as origens das estruturas linguísticas, adoptando opções
estratégicas e estudos adequados com as típicas estruturas e compartimentadas do passado, cujo desenho
tinha em vista a mudança nas suas evoluções. Cada língua como coração da cultura numa dada sociedade,
parcialmente, ou seja, integralmente, tem a sua origem na ocorrência da evolução na existência em
determinada sociedade através de um processo imediato ou intercaladas. A isso, compartilhamos com as
observações de Sílvio Elia (2002: 53) sobre a existência da Língua Macassae em Timor-Leste, onde se
caracteriza como: língua nativa, língua oral, língua de cultura e mais recentemente como língua de
acesso ao desenvolvimento de qualquer nível de possíveis estudos. Portanto, o estudo que se pretende
realizar comporta as relações linguísticas de substrato, adstrato e superstrato, pois o macassae é uma
língua de substrato, quando se verificam as marcas das suas estruturas linguísticas.
A Língua Macassae
A língua macassae é uma das quatro línguas papuásicas falada no leste de Timor-Leste ao lado de
Fataluco, Macalero e Bunaque. A Língua Macassae é uma língua nativa da etnia macassaense, símbolo
da unidade entre etnia e símbolo da cultura. O seu aparecimento em Timor-Leste não se sabe exatamente
qual o ano do seu início, porém, a sua existência coincide com a do seu falante nativo. No uso coditiano,
o idioma macassae é categorizado como língua de cultura, em uso de vários tipos culturais intraeticidade,
com estatuto de língua nativa.
Do ponto de vista linguístico, o macassae é uma das línguas que tem diversidade de nomes, como em
Macassae Lari [Macassae Planalto] e Macassae Soba [Macassae Planíce] não é da perspectiva geográfica,
contudo pela perspectiva e característica do uso. O idioma Macassae é um dos ramos das línguas de
Trans-Nova-Guiné, subgrupo das línguas de Papua no Tronco das línguas da Micro-Melanésia da
Polinésia Oriental, onde é classificado na família das línguas do Malaio-Polinésia.
A base do idioma Macassae é a Língua Papuásica oriunda da Ilha de Papua desde os séculos
anteriores inexatamente de saber. Na sua evolução e no seu desenvolvimento acontecia uma mudança
significativa pela consequência deestatuto de língua de trabalho tradicional verbalmente sob a
administração colonial tinha influenciado vocábulos de outras línguas paralelamente tradicional, ou seja
verticalmente de outras línguas superestratos. Devido a essa influência, acontecia também determinados
vocábulos origem do macassae. Um dos exemplos que aqui, insiro as palavras antigas no uso
comummente: likasa [mundo], sigireta [sintina], kanape [hadak ou cama tradicional de medida menor
feita de bambus preparados aos hóspedes de prestígio].
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Agrupação da História Geográfica Dispersada
A existência do idioma Macassae em Timor-Leste é uma das línguas maternas que era oriunda da
família Malaio-Polinésia, do tronco de Polinésia, do subtronco de Polinésia Oriental. Do ramo de
Melanésia ao lado do ramo Micronésia por meio de transgeneológica de línguas.
A Língua Macassae é uma das línguas nativas dos timorenses falada no território de Timor-Leste nos
municípios de Baucau, Lautem e Viqueque, sobretudo nos bairros adjacentes de outras línguas nativas, a
saber: Baucau: Baguia, Laga e parte leste de Venilale; Lautem: Sagadate, Luro e os bairros adjacentes;
Viqueque: Ossú, Uatolari e distintos bairros adjacentes de Viqueque: Beaço, Beobe, Monumento,
Fatudere e Luca. O idioma Macassae é uma variedade da Língua Papuásica, uma das línguas da
Austronésia Oriental do ramo das Línguas de Melanésia em uso como uma das variedades da língua
nativa falada no Leste de Timor-Leste pelo falante nativo macassaense desde a sua existência. A seguir
insere-se um gráfico de transgeneológica de línguas abaixo.
O esquema de classificação das famílias de línguas:
Famílias das línguas
Tronco de Polinésia
Dialetos
Na sua realidade a Língua Macassae cresceu com muitas variedades conforme os seus falantes
nativos, pelas quais chamamos de dialeto e segundo o seu uso que se denominamos variedade de línguas.
Segundo a característica dos falantes nativos se diferenciam pelos seguintes dialetos:
1. Dialeto regional, a variedade do uso da mesma língua em distintas áreas no terrtitório com
diferentes características de expressões. Assim sendo, conhecemos então Macassae Laga,
Macassae Baucau, Macassae Ossú, Macassae Uatolari, Macassae Luro, etc.
2. Dialeto social, o dialeto de determinada comunidade que determina os diversos extratos sociais.
Entre eles, diversas faixa etária de género masculino ou feminino, sociedades rurais e sociedade
urbana, sociedade analfabeta e sociedade alfabetizada.
3. Dialeto temporal, os dialetos produzidos numa determinada época. Por exemplo, macassae
antiga mais caracterizada de vocábulos primitivos e macassae atual mais caracterizada de
54
vocábulos assimilados. A destinação de um estrangeiro conhecido por diferentes expressões, Dai
hai Ma‘u – Sinór hai ma‘u = O senhor já vem.
4. Idioleto, significa todas as cunhas de língua de cada falante em uso. Embora o mesmo vocábulo
da mesma língua, o cunho peculiaridade de cada falante na pronunciação de fonemas, palavras,
frases no nível da gramática. Por exemplo, a pronunciação do fonema /p/ em /b/ ou cada vez em
/f/. Assim sendo a expressão palavra pão em paun, baun, faun ou em vaun. Na sintaxe: La‘a
paun tehu. La‘a baun teu. La‘a faun teu. La‘a vaun teu.
Variedade em Uso
A variedade em uso do macassae de acordo com a sua existência ao lado de outras línguas
paralelamente. São as seguintes variedades:
i. Variedade segundo o assunto da fala: a) variedade local, b) variedade cultural, c) variedade literária oral
ii. Variedade segundo relação entre locutor e interlocutores:
Subvariedade: a) variedade conversação, b) variedade contos literários, c) comunicação popular
iii. Variedade segundo a forma: De acordo com a sua forma de uso, a Língua Macassae é usada
cotidianamente de forma oral informal.
Sotaque
No dizer de Antônio Houaiss, sotaque significa a pronúncia característica de um país, de uma região,
de um indivíduo ao falar uma língua tanto nativa quanto estrangeira, devido à transferência que ele faz de
hábitos fonéticos da língua materna para outra língua. Tem dois tipos de sotaque do idioma Macassae,
pelos quais; sotaque F e de sotaque P. Sotaque F assemelha-se a locais do Norte de Baucau, Laga,
Quelicai, Baguia e Sagadate. Enquanto o sotaque P compreende-se que é falado em Ossú, Venilale,
Viqueque, Uatulari. O referido sotaque da língua neste trabalho, focaliza-se ao sotaque de P. Os sotaques
de F e P a sua diferença no uso das palavras comuns ou nome próprios com fonemas de f e p. Ao
diferenciar os dois distintos sotaques, descreve-se os seus exemplos nas palavras utilizadas eilustradas
abaixo.
Sotaque F = faru, famila, fatili, sofa, sufa, fi, fige‘e, finta, faun, forsa, Afina, sosefina
Sotaque P = paru, pamila, patili, sopa, supa, pi, pige‘e, pinta, paun, porsa, Apina, Sosepina
Falante Atual
Como as outras línguas faladas por outras etnias de todo canto do mundo que demonstram as suas
características dinámicas, sempre se evolui conforme o crescimento dos seus falantes, o macassae
também aumenta de acordo com os seus falantes de década a década. Por início, da existência do
macassae em Timor-Leste nunca sabiam exatamente o total dos seus falantes nativos. Nas últimas
décadas após a independência, com o alistamento dos falantes de cada língua materna tem-se o total
significativo de cada língua falada.
De acordo com Luís Costa (2001) linguista timorense, no início da década da independência, os
falantes do macassae eram o total de 70.000 o que é um número significante ao lado dos outros falantes
de outras línguas nativas. Devido a sua dinámica na evolução, só no final da primeira década da
independência, segundo UNESCAP (2008) uma das organizações da ONU em Timor-Leste, registrou que
os falantes da língua macassae atingiram 110 mil falantes, ocupando a terceira posição, atrás dos números
de falantes do Tétum com total de 120 mil e do Mambae com 117 mil falantes.
55
A Estrutura do Alfabeto do Macassae
Sabemos que o idioma Macassae é uma das línguas faladas verbalmente desde a sua existência. Seja
assim, qualquer língua falada cujo encadeamento de sons lógicos com sentido significativo. Esses sons
lógicos são representados por gráficos alfabéticos. Inclui-se aqui, o idioma Macassae, que
linguisticamente não tem a própria gráfica de alfabeto, porém adota o alfabeto árabe-latino como as
outras línguas adotam.
De acordo com os sons das falas da Língua Macassae pelos seus nativos, segue o sistema alfabético
árabe-latino e possui as seguintes estruturas do alfabeto, a ser suas letras e fonemas: fonemas vogais e
fonemas consonantais. Fonemas vogais são os mesmos com as vogais de outras línguas faladas e mais
estudadas pelas quais constitui-se por: a A, e E, i I, o O e u U. Enquanto que as consoantes também são as
mesmos, só que o número de uso das consoantes são mais reduzidas que as outras. O total das letras ou
fonemas consoantes são 12: b B, d D, g G, h H, k K, l L, m M, n N, p P, r R, s S e t T.
Portanto, o total dos fonemas tanto vogais quanto consonantais constitui-se por 18 letras: cinco vogais
e 18 consoantes. Este total transcrevendo por base das características das falas dos falantes nativos
analfabetos no uso na comunicação diária no nível familiar dos falantes nativos, no nível cultural entre
famílias na mesma aldeia, entre aldeias, sucos.
Sistema Ortográfico
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Kk Kk Kk Kk Kk
Ll Ll Ll Ll Ll
Mm Mm Mm Mm Mm
Nn Nn Nn Nn Nn
Pp Pp Pp Pp Pp
- Qq - quintal - - Kintal
Rr Rr Rr Rr Rr
Ss Ss Ss Ss Ss
Tt Tt Tt Tt Tt
Ww - - Ww Ww
Vv Vv Vv vidru - - biduru
Xx Xx Xx Xarope - - Sarope
Yy - - - -
Zz Zz Zz Zebra - - sebra, bandesa
Palavras adotadas
Qualquer língua humana acusa aspecto aberto de outras e para outras línguas no contexto de interação
ao enriquecimento de vocabulários. Assim como o macassae possui esta característica dinámica e aberta
horizontalmente e verticalmente. Horizontalmente, no sentido de o macassae enriqucersse de vocábulos
de outras línguas maternas no mesmo extrato do seu vizinho local. Verticalmente, enriquecersse de
vocábulos de outras línguas superestrato oriundo de local mais afastado do local da sua existência.
Na tabela abaixo inserem-se alguns exemplos de vocábulos adotados no enriquecimento dos
vocabulários do macassae em uso cotidiano.
No Livro Intitulado "Senarai Kata Serapan dalam Bahasa Indonesia" (1996) obra de Pusat
Pembinaan dan Pengembangan Bahasa (Centro de Língua).
57
Fonologia
A língua Macassae constitui-se de 17 fonemas, pelos quais 12 consoantes, ou seja letras mortas e 5
vogais, ou seja, letras vivas. O sistema da gramática é bastante simples quando comparamos com outras
línguas que têm o sistema da gramática bem mais complexa.
Vogais
Consoantes
Morfologia
No nível da morfologia, uma das características peculiares do macassae é a sílaba aberta no meio e no
final e em uso nas palavras aparelhadas de antónimos, sinónimos e de substantivos mais frequento no uso
e na fala nos eventos culturais, ou seja, nas cerimónias tradicionais celebradas.
No caso do primeiro ‗‗sílaba aberta no final da palavra‘‘ as palavras construídas em uso na
comunicação, a maioria absoluta termina-se com sílabas abertas, ou seja, as palavras finalizam-se por
sílaba vogal. Exemplos: lebene = plana, litaka = ultrapassa, lalini = transportar, luara = sinzento,
bo‘uru = gorda, bokunu = redonda, etc. Portanto, não apenas a sílaba aberta no final das palavras nativas,
ainda pior, incoropora-se também às palavras adotadas de outras línguas em sílaba fechada no médio e no
final, os falantes nativos de macassae pronunciam-na em sílaba aberta.
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Palavras adotadas de outras línguas, sobretudo da língua portuguesa fechada a sílaba média nos
vocábulos no macassae, os falantes nativos pronunciavam em sílabas abertas. Por exemplo as palavras de
médio sílabas fechadas advogado, bloco, calça, calção, caderno, carpinteiro, colchão, estrada, partido,
pedreiro, vidro diariamente sotaquear em sílabas abertas na sílaba média, eis aduvogadu ou adabogada,
buloko, kalasa, kalasaun, kaderunu, karapinteiru, kolisaun, estarada, paratidu, pedereiru, viduru.
As palavras adotadas de Tétum: botir, di‘ak, furak, ki‘ik, metan, os falantes nativos de macassae
pronunciam em sílaba aberta no final como em butili, di‘aka, furaka, ki‘iki, metana. Assim como as
palavras adotadas de português com sílaba fechada no final, pornuncia-se em macassae como sílaba
aberta no final. Os exemplos evidenciados como em capaz, chinelos, lapis, paz, pronunciam-se por
palavras com sílaba final em abertas, como capaza, sinelusu, lapisi, paza. Uma outra palavra estrangeira
tão conhecida de Timor-Leste de Indonésia islam, os macassaenses pronunciam em sílaba aberta no final
islama. Todavia, no uso codidiano, seja a nível de conversa popular quanto no nível rítmico cultural,
sempre apareciam as palavras aparelhados antónimos. Alguns exemplos das palavras destacadas são os
seguintes: sibiki‘i, ko‘ini-harai, digara-asana, tupura-asukai, sege-rau, usa-gamu, rau-redeke, butiri-
metana, ‘omamutu-ra‘isa, ti‘iri-‘a‘ehe, etc.
Além de aparelhado antónimo acima destacado, ainda tem outras palavras aparelhados em uso na
comunicação: aparelhadas sinónimos, substantivais e numerais, como nos seguintes casos:
Aparelhados sinónimos: badiu-pasaleru, bibi-bai, bura-kesi, bura lolo-kesi lolo, giari-giatu, ko‘ini-
patana, kuda-‘arabau, lihat-sabara, lolini-hatete, mooro-laliri, oi-sobu, roumutu-alamutu.
Aparelhados substantivais: bukae-wa‘alesa, busu-esekai, bubu‘a-sasoka, bua-malu, kape-asipani, iti-
tana, irahou-amadana, kulu-kama, matahupa-matanami, mesa-kadera, noi-nora, sinó-ba‘inó, sulu-ra‘u,
sulukapi-ra‘ikapi, suturi-sita‘a, tu‘u-toro, ururu-abara, uru-watu, ‘utasa-‘atasa, etc.
Aparelhados numerais: baunu-berene, sibiki‘i-baunu, riala-podere, rihunu-rasa, ‘u-lola‘e, etc.
Gramática
Comparada com as línguas Europeias na língua Macassae não se reconhece as palavras distintas de
género masculino e género feminino. Por exemplo, o pronome pessoal "gi" não é específico para
distinguir seja ele em português de género masculino quanto de género femino. A mesma coisa ocorre em
‗‗dada‘‘ que equivale a avó em português ‗‗noko‘‘ em português irmão e irmã assim como "kara" do
sentido de namorado ou namorada. Entretanto, para se diferenciar entre os sexos é necessário acrescentar
o marcador de sexo dos pronomes mencionados, "gi tupurae" ela, gi ‗‗asukai‘‘ ele. ‗‗Dada asukai‘‘ avô
‗‗dada tupurae‘‘ avó, ‗‗dada mata asukai‘‘ neto ‗‗dada mata tupurae‘‘ neta, assim sucessivamente aos
outros pronomes pessoais.
Nas palavras numerais também não se distingui entre o género masculino do género feminino. Aqui
inserindo os exemplos de número cardinal um e dois ou uma e duas em macassae apenas ‗‗u‘‘. Nos
números ordinais primeiro e primeira e as outras não são distinguidas como em português. No caso, os
números dos filhos de um casal de três filhos para cima, no macassae usa-se três termos: ‗‗inawa‘e‘‘
primeiro ou primeira filho a, ‗‗tamene‘e‘‘ segundo ou segunda filho a, ‗‗waihula‘‘ último filho ou última
filha. Assim sucessivamente para mais de três filhos. Por esses exemplos, concebemos que o macassae é
uma das línguas com a característica gramaticalmente isolada. No sentido de não ter as flexões das
palavras de número, género, pessoa, caso, tempo, etc. No âmbito deste, na Língua Macassae utiliza-se
dois pronomes da primeira pessoa do plural, a saber "ini" e "pi". "Ini" em portugês nós exclusivo que não
se inclui o interlocutor, ou seja, contra de quem está a falar, enquanto que "pi" é o pronome da primeira
pessoa do plural inclusivo que inclui-se então o locutor e os interlocutores.
A composição da estrutura básica das frases verbais de uma ordem de constituentes de Sujeito -
Objeto - Predicado (SOP) não é como nas outras línguas que seguem a ordem canónica de Sujeito –
59
Predicado – Objeto (SPO). Dentro da tipologia linguística da língua Macassae, destacamos que na
construção da oração segue a ordem SOV como sendo a ordem vocabular básica que tem diferença na
estrutura das orações de outras línguas mais estudadas. Em seguida, inserimos aqui os exemplos de quatro
línguas de ordem canónica sendo os mesmos sentidos, porém com diferente estrutura da ordem de
constituentes. O macassae segue a ordem SOV enquanto que as outras quatro línguas seguem a ordem
canónica SVO.
S O V Língua
Mestre libru leh Macassae
Mestre lee Livru Tétum
Guru Baca Buku Malaia
The teacher Read a book Inglês
O professor lendo o livro Português
Podemos dizer que a língua Macassae apresenta a ordem SOV como a ordem básica da língua,
pois é a única ordem que ocorre em uma oração declarativa simples:
1. Posição Relativa do Sujeito, Verbo e Objeto: O verbo (V) sempre ocorre em posição no final da
oração, logo após ao objeto (O).
S O V
Tupura mana hai hau taka.
mulher buraco já fechar
‗A mulher fechou o buraco‘.
2. Posição Relativa do Verbo Principal com Verbo Auxiliar: O verbo auxiliar ocorre antes do objeto,
portanto, antes do verbo principal:
S Aux O V
Tupura la‘a mana taka.
mulher vai buraco fechar
‗A mulher vai fechar o buraco‘
3. Posição Relativa do Sujeito OD, OI e Verbo: A presença de um objeto indireto, ocorre após o objeto
direto e imediatamente antes do verbo:
S OD OI V
Eduardo libru ‘u ma ani gini.
Eduardo livro o para eu dar
O Eduardo deu o livro para mim.
60
5. Adposição: A língua Macassae apresenta posposições, compartilhando com o universal 4 de
Greenberg que diz que em línguas que apresentam a ordem básica SOV possuem posposições. Estas
posposições seguem substantivos a que se relacionam. Observe o morfema isi no exemplo (24) e o
morfema woi em (25), ambas posicionam-se à direita do nome:
S N Posp V
Gi ama isi la‘a
ele roça em vai
Ele vai a roça. (Ex.24, 24)
S N Posp V
Ani ate woi hai hau misa
Eu árvore det já subir
Eu subi na árvore. (Ex. 25, 25)
6. Construção Genitiva: Segundo Greenberg, em línguas que possuem posposições, o genitivo quase
sempre precede o nome. De fato, isto ocorre em Macassae. A tipologia de ordem do genitivo e nome em
Macassae seguem o universal 2 de Greenberg. Portanto, o genitivo quase sempre precede o nome.
G N
Kona gi ari.
Macaco do fígado
O fígado do macaco.
8. Comparações: As comparações das ordens vocabulares nas orações em Macassae sobre a comparação
de superioridade, inferioridade e de igualdade dos elementos constituintes: objeto comparado (OC),
objeto comparante (OCp) e marcadora comparativa (MCp).
Comparação de superioridade:
OC OCp MCp Adj
Asi para ere ai ge‘e lita ko‘ini.
Minha canoa é teu do que maior
Minha canoa é maior do que a tua.
Comparação de inferioridade:
OC OCp MCp Adj
‘Apa ‘ere ‘u wori lita harai.
Pedra esta um aquela do que pequeno
Esta pedra é pequena do que aquela.
61
Como uma das línguas isoladas, na língua Macassae também não se reconhece a flexão de tempos. O
tempo caracteriza-se por acrescentação de adjuntos adverbiais de três tempos conjugados (passado,
presente, futuro), com marcadores de tempo ‗‗hai, naga e dete ou apa‘‘. A designação dos três
marcadores são: hai para o passado; naga equivale-se o presente e dete ou apa refere-se ao futuro seja
exato ou inexatos na ação.
Exemplos: Gi hai hau nawa = ele/ela já comeu.
Gi naga nawa = ele/ela está a comer.
Gi nawa apa = ele/ela vai comer.
Gi nawa nana = ele/ela quer comer.
O macassae também não reconhece os artigos de géneros masculino e feminino como em português. E
as preposições também não são bem reconhecidas na estrutura sintática. Se mencionar algum substantivo
não precisa conjugar os artigos. Pasta, liburu, ‘oma, ‘apa, por exemplo. Enquanto que as preposições, na
estrutura sintática do macassae, posicionam-se nas posposições de formas verbais. Eis exemplos: la‘a dete
(vou embora), la‘a nana (irei embora), la‘a apa? (vais embora?). Eis o dete, nana e apa são marcadores
verbais nas posposições do verbo la‘a (ir).
Mesmo com uma gramática simples o macassae tem a sua peculiaridade própria, que é em uso na
comunicação um pouco conplicado para as pessoas que pela primeira vez a usá-lo na interação entre os
interlocutores. Uma outra peculiaridade do macassae é a língua glotálica. O caso, a expressão de
determinadas palavras por característica dos sons expressados com sons fortes na garganta. Usa a mesma
palavra mas diferentes sons e diferentes sentidos na comunicação.
Exemplos:
Glotálicos não glotálicos
‘a ou ‘ae planta venenosa a ou ae chuva
bo‘oro cozinhar boor agarar com cordas de pauda‘a
cabeça da esposa
he‘i direção descida hei expressaão espantosa
la‘a andar la ervas pastagens aquáticas
ma‘a terra ma tua/bebidas alcólicas
‘u um uta chover
etc etc.
62
gi- da‘a gida‘a Cabeçalho
no- Noi Nonoi estimada de senhoria
ga- temporal Gana Gagana Antigamente
ge- temporal Geri gegeri Antigamente
verbo Gana gegana transportar, carregar
pe- adjetival Pelu Pepelu Lindaço
Sufixo
-da Tamene Tamenda segundo filho
-kai Pelu Pelukai Ralativo de pelunu
-nu Pelu Pelunu linda, bonita
-koru substantival da‘a da‘akoru superior, senhorio
-ro Lolo Loloro bem mais alinhado
Bobó Booro
Infixo adjetival
-ke- Keta Keketa de forma várzea
-no- Nogo Nonogo Tolo
-na- Nawa Nanawa Comidas
-’e- ‘ete ‘e’ete espera um momento
Considerações Finais
Referências
AMBAR, M. M. 1992: Para uma sintaxe da inversão sujeito-verbo em Português. Lisboa: Edições
Colibri.
ARAÚJO, L. M. S. de Estruturas subjacentes de alguns tipos de orações declarativas afirmativas no
dialeto Gavião-Jê. Florianópolis, UFSC, 1977. dissertação de Mestrado.
63
BECHARA, Evanildo, Moderna Gramática Portuguesa. 37º Ed. RJ. Editora Lucerna, 2001.
CÂMARA JR, J.M. 1979. História e Estrutura da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro, Padrão Livraria
Editora Ltda,
COSTA, Luís. 2001. Guia de Conversação Português-Tétum. Instituto Camões, Lisboa, Portugal.
COSTA, Luís. 2001. Dicionário de Tétum-Português. Instituto Camões, Lisboa, Portugal.
DOOLEY, Robert A. (red.) Estudos sobre línguas tupí do Brasil. Série lingüística, nº 11, Summer
Institute of Linguistcs, Brasília: 1984.
ELIA, Sílvio. A língua portuguesa no mundo. 2ª ed. São Paulo: Ática, 2001. (Série Princípios).
FIOREZE, Romeu. 2003. Metodologia da pesquisa: Como planejar, executar e escrever um trbalho
científico. UFPB/Editora Universitária, João Pessoa.
FORTUNE, D. L. & FOTUNE, G. Gramática Karajá: um estudo preliminar em forma transformacional.
Brasília, Loraine Irene Bridgeman, 1973. Série Lingüística SIL, no. 1.
MAIA, Marcus. (1998). Aspectos Tipológicos da Língua Javaé. Lincom Studies in Native American
Linguistics 11. München: Lincom-Europa, 90p.
MARTELOTTA, Mário E., BARBOSA, Afrânio e LEITÃO, Márcio M. Ordenação de advérbios
intensificadores e qualitativos em -mente, em cartas de jornais do séc. XIX: bases para uma análise
diacrônica. Rio de Janeiro, 2001. Mimeo.
VILELA, Mário; KOCH, Ingedore. Gramática da língua portuguesa. Coimbra: Almedina, 2001.
64
INSTITUTO DA LÍNGUA PORTUGUESA DA UNIVERSIDADE NACIONAL
’ : Ã ÇÃ
Rui Ramos
O panorama linguístico de Timor-Leste, como o de outros países e áreas desta região do globo e de
outras regiões, é fortemente caraterizado por uma avassaladora diversidade. Num território muito restrito,
é possível identificar um conjunto alargado de línguas, dialetos e variantes, que constituem um quebra-
cabeças para qualquer decisor político que tenha de configurar o país com unidade e coerência, mas
também um desafio muito aliciante para quem queira olhar para a realidade timorense como um
laboratório linguístico vivo e atual.
Questões como esta têm sido objeto de análise e reflexão, pelo menos desde a década de ‘90 do
século passado, por estudos que configuram a diversidade biocultural e que vêm dando importância à
articulação entre língua, cultura e ambiente natural (ou território). O assunto não pode ser encarado de
forma simplista, identificando laços de correlação deterministas, mas reconhecendo a complexidade das
mútuas influências. Ainda assim, Luisa Maffi aponta alguns fatores climáticos e geográficos que
condicionam globalmente todos os tipos de diversidade:
no início do século XXI, a biodiversidade global está a sofrer uma crise de extinção,
com estimativa de perdas anuais de espécies de plantas e animais pelo menos 1.000
1
Todas as citações foram traduzidas para língua portuguesa para facilidade de leitura. As citações de originais em língua
portuguesa viram atualizada a sua grafia seguindo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990.
2
Segundo o sítio Ethnologue (http://www.ethnologue.com), existem atualmente 7.102 línguas no mundo.
65
vezes maiores do que os dados históricos precedentes. A diversidade linguística sofre
uma crise similar. O desaparecimento de línguas, em algumas áreas como as Américas,
atingiu os 60% ao longo dos últimos 35 anos (2012: 8032).
Estes autores afirmam a existência de uma correlação significativa entre ―pontos quentes‖ (hotspots)
de biodiversidade (regiões caraterizadas por ocorrências excecionalmente altas de espécies endémicas e
por perdas de, pelo menos, 70% do seu habitat natural) e regiões de grande diversidade linguística.
Identificam 35 hotspots de biodiversidade no mundo nos quais se concentram 3.202 línguas, quase
metade das atualmente existentes. Citam explicitamente, entre estes casos, o da Wallacea, área geográfica
onde se inclui Timor-Leste, com mais de 250 línguas autóctones. Na figura 1, apresenta-se a distribuição
geográfica de línguas autóctones e não migrantes no mundo (dados de 2009):
A figura 2 apresenta a área geográfica que corresponde à Wallacea onde, como foi afirmado, Timor-
Leste se inclui:
66
A figura 3 apresenta um quadro geral da diversidade de plantas e de línguas no mundo. Como pode
verificar-se, as zonas mais ponteadas a preto são aquelas onde há maior diversidade linguística e pode
constatar-se que correspondem largamente às zonas de maior diversidade vegetal (marcada com cor mais
escura).
Figura 3 - diversidade vegetal e diversidade linguística (Stepp et al., 2004, apud Maffi, 2005: 619)
3
Esta obra recente, apresentando uma espécie de ―estado da arte‖ do assunto, apresenta um largo conjunto de referências
(mais de 80) que podem ser úteis aos interessados.
4
―Timor é um só‖.
67
A diversidade biocultural no discurso institucional global
Nesta equação, o respeito pela diversidade biocultural terá de ser equacionado, como muitos
académicos vêm apontando. Não só os académicos, porém. Também os decisores políticos a nível global
reconhecem crescentemente o papel primordial da diversidade biocultural na construção e preservação da
identidade dos povos.
É nesse sentido que se orienta a Convenção sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das
Expressões Culturais, aprovada pela Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em 2005. No seu Artigo 4º, a Convenção esclarece que a
diversidade cultural se refere à ―multiplicidade de formas em que se expressam as culturas dos grupos e
das sociedades‖. No seu preâmbulo, afirma-se explicitamente que ―a diversidade cultural é uma
caraterística essencial da Humanidade‖; que esta ―deve ser valorizada e preservada em benefício de
todos‖, na medida em que ―gera um mundo rico e variado, que alarga as possibilidades de escolha e nutre
as aptidões e os valores humanos, constituindo, portanto, um motor fundamental do desenvolvimento
sustentável das comunidades, dos povos e das nações‖; que ―se desenvolve num quadro de democracia,
de tolerância, de justiça social e de respeito mútuo entre os povos e as culturas, (…) [sendo] indispensável
à paz e à segurança a nível local, nacional e internacional‖. Reconhece-se que ―a diversidade linguística é
um elemento fundamental da diversidade cultural‖ e reafirma-se ―o papel fundamental que a educação
desempenha na proteção e na promoção das expressões culturais‖.
Reconhece-se igualmente nessa Convenção que
No seu artigo 2º, a Convenção apresenta oito princípios pelos quais se rege:
- Princípio do respeito dos direitos humanos e das liberdades fundamentais;
- Princípio da soberania;
- Princípio da igual dignidade e do respeito de todas as culturas;
- Princípio da solidariedade e da cooperação internacionais;
- Princípio da complementaridade dos aspetos económicos e culturais do desenvolvimento;
- Princípio do desenvolvimento sustentável;
- Princípio do acesso equitativo;
- Princípio da abertura e do equilíbrio.
68
A diversidade biocultural como riqueza diferenciadora em Timor-Leste
O que foi apresentado acima tem por objetivo sublinhar, da forma mais veemente possível, que os
timorenses possuem uma riqueza dificilmente igualável, e que essa riqueza não é o petróleo, mas um bem
imaterial, pedra angular da sua identidade. A diversidade biocultural que carateriza este povo e esta terra
é, entre outros aspetos, uma marca diferenciadora e justificativa da sua independência política, um
produto da sua história e uma garantia de identidade ao longo dos tempos. Essa diversidade biocultural
inclui, naturalmente, um pilar fundamental: a diversidade linguística que, como foi afirmado no início
desta exposição, é uma bênção, um desafio e um quebra-cabeças.
A componente mais difícil de enfrentar, o tal quebra-cabeças, prende-se essencialmente com a
coesão nacional, impossível de assegurar sem elementos que, contrabalançando a diferenciação,
promovam a unidade na diversidade. E Timor-Leste, tal como todos os restantes países do mundo, deve
lutar, na medida das suas possibilidades, contra as ―crises convergentes de extinção‖ (Harmon, 1995) que
ameaçam o equilíbrio da vida.
Neste cenário, seria possível o Estado timorense sobreviver sem língua(s) nacional/ais, que
permita(m) a intercompreensão de todos os cidadãos e o acesso à informação, à educação, aos serviços do
Estado?
É legítimo pensar que não. Timor-Leste, país independente e coeso, não sobreviveria sem uma ou
várias línguas dominadas pela generalidade dos seus cidadãos.
Mas não seria viável que todas as línguas locais, ou a maioria delas, pudessem ser adotadas como
línguas nacionais. Os motivos são muitos, mas dois impõem-se de imediato: trata-se de línguas ágrafas e
nunca foram devidamente descritas e formalizadas. Aliás, essa circunstância constitui um obstáculo
inultrapassável a uma ideia peregrina que fez caminho na sociedade e nos meios políticos timorenses
durante vários anos, que previa o ensino da leitura e da escrita destas línguas ágrafas no início da
escolaridade.
Do ponto de vista linguístico, não se trata de línguas ―menores‖ ou ―primitivas‖ porque, para um
linguista, todas as línguas são válidas, são produto e são condicionante da sociedade que as usa. Contudo,
do ponto de vista funcional e da organização do Estado, são inadequadas para servir os propósitos de
garantir coesão e sentimento de pertença. Mesmo o tétum, língua cooficial ao lado do português, e hoje
mais desenvolvido do que à data da independência do país, padece em larga medida desta inadequação.
Esclareça-se o conceito de ―adequação‖, Mühlhäusler (2001 (1983)) considera que as línguas devem
apresentar os seguintes tipos de adequação: a) adequação referencial (a capacidade da língua de ir ao
encontro das necessidades dos seus falantes como instrumento de significação referencial – ou
referenciação); b) adequação sistemática (a capacidade de a língua constituir uma estrutura que tenda
para a máxima economia e a máxima eficiência, e ter uma estrutura semântica clara e uniforme, com uma
terminologia traduzível sem ambiguidades); c) adequação social (a língua deve ser aceitável pelo maior
número possível de falantes numa dada comunidade, deve promover a unidade social e a
intercomunicação e prover às necessidades presentes e futuras).
Numa outra publicação com outros autores (HARRÉ et al., 1999), Mühlhäusler acrescentará a estes
um outro item: a adequação ambiental (a capacidade de disponibilizar aos falantes recursos para estes se
pronunciarem sobre questões ambientais e construírem uma relação harmoniosa com os ecossistemas).
Ora, fácil é de constatar que as línguas locais não preenchem estes requisitos. O seu uso mais ou
menos forçado em circunstâncias alheias aos seus contextos de utilização históricos promoveria,
69
certamente, a importação massiva de léxico, construções sintáticas e valores semântico-pragmáticos com
um excecional potencial de as descaraterizar rapidamente.
Fica o recurso à língua do antigo colonizador. Tal como foi opção nas antigas colónias portuguesas
em frica, o português, ―não sendo língua de ninguém, poder ser de todos‖. Ou seja, não sendo a língua
de um grupo restrito, pode ser tomada como língua de todos os timorenses. A apropriação da língua
portuguesa, que os timorenses foram fazendo ao longo da história, é parte da cultura timorense e fonte de
muito do léxico do tétum; é também influência aos níveis fonético, sintático e semântico-pragmático.
Sendo uma língua de cultura, com um património literário extenso, evoluída e plástica, a língua
portuguesa fornece aos seus falantes os instrumentos para a comunicação, cumprindo a sua função
externa; contudo, como todas as línguas, tem também uma função interna: o pensamento. Com maior
poder de servir o pensamento abstrato do que tétum, a língua portuguesa pode ser vista como uma fonte
de desenvolvimento intelectual ao nível individual e coletivo.
Além disso, como pode ler-se no Programa de Ação de Lisboa, da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa (CPLP), o domínio da língua portuguesa ―dá aos falantes de cada língua materna uma
oportunidade igual de acesso e permanência no sistema educativo, capaz de promover e de reforçar a
inclusão e a paz social‖ (CPLP, 2014). O uso da língua portuguesa estabelece ainda fortes laços com toda
a comunidade lusófona, espalhada pelos vários continentes, e dá acesso a múltiplas possibilidades ao
nível cultural, educativo ou de negócios na sociedade global. Note-se que a língua portuguesa é uma das
mais faladas do mundo, é a que tem mais falantes nativos no hemisfério sul, apresenta grande dinamismo
demográfico e é uma das três línguas contemporâneas com vocação global (ao lado do Inglês e do
Espanhol). Não concorrendo nos mesmos usos e práticas culturais que as línguas locais, tem menor
probabilidade de as influenciar e se sobrepor, favorecendo a preservação daquelas. Desta forma, favorece
a unidade na diversidade.
Missão do ILP
Desde 1999, a cooperação entre Timor-Leste e os países lusófonos, com natural relevo para Portugal
e o Brasil, concretizou-se em múltiplos projetos e programas. A vertente da língua assumiu entre eles
papel saliente.
Neste quadro de cooperação, em janeiro de 2014, foi assinado entre o Camões, Instituto da
Cooperação e da Língua, I. P., e a Universidade Nacional Timor-Lorosa‘e (UNTL) um memorando de
entendimento com vista à criação, na estrutura da UNTL, do Instituto da Língua Portuguesa (ILP).
De acordo com o memorando, este organismo encontra suporte para a sua criação no reconhecimento
de que o domínio da língua portuguesa pelos cidadãos timorenses constitui um vetor de grande relevo
para o desenvolvimento socioeconómico do país, assim como para a sua afirmação geoestratégica no
contexto regional. Poderíamos acrescentar que o domínio da língua portuguesa é um direito de todos os
cidadãos timorenses, decorrente da consagração constitucional do português, ao lado do tétum, como
língua nacional em Timor-Leste; e que daí decorre a obrigação de a instituição educativa nacional facultar
a formação em língua portuguesa a todos os interessados, na medida dos recursos existentes.
O memorando de entendimento abre portas à construção de um projeto ambicioso e abrangente,
numa perspetiva de médio e longo prazo, com uma estratégia consistente. Contempla quatro áreas de
atuação, que compreendem o desenvolvimento de competências didático-pedagógicas e tecnológicas de e
em língua portuguesa dos docentes da UNTL e de outras universidades; o desenvolvimento de
competências em língua portuguesa dos alunos da UNTL, de funcionários públicos e da sociedade civil; o
estabelecimento de parcerias as para a formação em língua portuguesa em instituições universitárias dos
países da região.
70
Estes objetivos podem ser estruturados em seis domínios: a) organização interna e funcionamento do
ILP (seleção de docentes, elaboração dos estatutos, definição de projetos de investigação, alocação de
recursos materiais, criação de imagem institucional e webpage, definição de um referencial de
proficiência linguística em língua portuguesa adequado à realidade timorense); b) formação em língua
portuguesa para a UNTL (para docentes, funcionários e alunos); c) formação em língua portuguesa para
outras instituições de ensino superior; d) formação em língua portuguesa para a Administração Pública e
restantes agentes do Estado e da sociedade civil nos vários municípios; e) promoção da língua portuguesa
na sociedade (em articulação estreita com os órgãos de comunicação social, nomeadamente os públicos);
f) projeção da língua portuguesa no contexto regional (com protocolos que prevejam a oferta formativa
em países da região).
Estes são os domínios de atuação que podem ser definidos com base no memorando que deu origem
ao ILP e que definem outras tantas linhas de atuação. Exigem planeamento atempado, visão de médio e
longo prazo, constância na ação e determinação. Exigem também uma gestão atenta, ativa e consistente
do instituto, com articulação eficaz entre todos os seus membros (diretor, coordenadores e professores),
solidamente fundamentada no conhecimento científico acumulado e cumprindo as práticas académicas e
científicas que devem nortear a ação de um instituto integrado numa universidade, espaço privilegiado da
ciência.
Ação do ILP
Até ao momento5, a ação do ILP tem-se concretizado num conjunto de processos e de produtos, que
a seguir se apresentam por domínio.
1. No primeiro âmbito, da sua organização interna, há a assinalar a constituição de uma equipa de
professores com conhecimentos específicos e/ou experiência no ensino da língua portuguesa como língua
segunda/estrangeira, maioritariamente portadores do grau de mestre, de um coordenador logístico e de um
coordenador científico e pedagógico com doutoramento, oriundo de uma universidade portuguesa.
Contudo, a formalização do instituto no quadro da UNTL ainda não foi concretizada e o ILP não dispõe
ainda de estatutos próprios.
Como trabalho de base e guia para a definição de objetivos, conteúdos e estratégias de ensino da
língua portuguesa, surge o desenvolvimento, que se encontra em curso, de um referencial de proficiência
em língua portuguesa específico para o contexto timorense, inspirado no Quadro Europeu Comum de
Referência para as Línguas. Um referencial deste tipo permitirá definir planos e cursos de língua
portuguesa, avaliar conhecimentos e competências prévios dos candidatos à formação, avaliar a
aprendizagem dos alunos, avaliar o próprio processo de formação e certificar conhecimentos e
competências de forma rigorosa e cientificamente validada.
Fora do âmbito do ILP, um referencial de proficiência linguística também permitirá aos promotores
de cursos de língua portuguesa a construção de programas, de metas de aprendizagem e de níveis de
mestria linguística que os formandos devem alcançar.
Um referencial com aceitação pela comunidade científica timorense, pelos decisores políticos, pela
Administração Pública e por todos quantos estão envolvidos em formação e divulgação em/da língua
portuguesa deve ser visto como um instrumento basilar da política de língua do país. Permitirá a seleção
de candidatos à Função Pública de modo rigoroso, a organização de planos de formação com requisitos
apurados e bem definidos no seu desenho, estudos científicos sobre perceções e sobre o domínio da
língua portuguesa pelos vários setores ou grupos da sociedade, entre muitas outras possibilidades.
5
Como este texto corresponde, com alterações menores, a uma conferência proferida em abril de 2015, alguns dados podem
estar desatualizados à data da respetiva publicação.
71
2. No âmbito da oferta de formação em língua portuguesa dentro da UNTL, há que assinalar os
cursos de língua para estudantes de mestrado, para funcionários, para docentes que farão doutoramento
em Portugal e aulas extracurriculares para alunos do 1º ano da Licenciatura em Ensino da Língua
Portuguesa.
Os docentes do ILP, em articulação com os docentes do Departamento da Língua Portuguesa e
alguns do Departamento de Disciplinas Transversais, organizaram portefólios de materiais didáticos para
33 unidades curriculares, essencialmente pertencentes à formação de professores de língua portuguesa.
Desta forma, os docentes da UNTL passaram a dispor em 2015 de materiais revistos, organizados e
selecionados segundo critérios mais sólidos, que poderão utilizar nas suas aulas.
No início do ano de 2015, vários professores do ILP passaram lecionar cinco unidades curriculares
da Licenciatura em Ensino da Língua Portuguesa e de uma da Licenciatura em Filosofia, a pedido dos
departamentos respetivos. Esta ação apoia os docentes da UNTL e oferece mais garantias de ensino de
qualidade (nomeadamente, porque evita sobrecarga letiva aos docentes ou a constituição de turmas
excecionalmente numerosas). Além disso, asseguram a orientação de 18 monografias de final de curso.
Desde fevereiro de 2015, os professores do ILP apoiam igualmente a redação de nove dissertações de
mestrado, cujos orientadores se encontram em Portugal e que vêm sentindo dificuldades de comunicação
com os estudantes.
Em fevereiro de 2015, o senhor vice-reitor para os assuntos académicos solicitou a oferta de cursos
de língua portuguesa e de didática para os docentes da UNTL. Um procedimento básico exige a
realização de um exame de diagnóstico, para o posicionamento dos estudantes e a organização de turmas
de nível.
Mas foi decidido alargar essa avaliação, realizando um estudo de teor sociolinguístico tendo como
público todos os docentes. Utilizando um inquérito, analisar-se-ão as perceções sobre as línguas, quais as
que são dominadas pelo público, que práticas culturais e linguísticas são mais comuns, que formação o
público teve em língua portuguesa e em didática e complementar-se-ão esses dados com o teste de
diagnóstico a língua portuguesa. Desta forma, os decisores da UNTL ficarão com mais informação
caraterizadora do universo de docentes, para adotar medidas de modo mais fundamentado. Os
instrumentos de recolha de dados encontram-se construídos, faltando somente operacionalizar o processo
de aplicação do inquérito e do teste de diagnóstico.
3. Ainda não se avançou com formação para docentes de outras universidades.
4. A formação para os agentes da Função Pública e para a sociedade civil está em fase de preparação,
mas, pelo menos para já, exclusivamente em Díli. Tem havido diversos pedidos para o efeito, mas ainda
não teve início qualquer curso ministrado ou desenhado pelos docentes do ILP. Espera-se que, em breve,
possam ser produzidos objetivos, materiais e orientações didáticas para a lecionação, tanto ao nível da
língua portuguesa em termos gerais como do seu domínio para fins específicos.
5. A promoção da língua portuguesa através dos meios de comunicação social apresenta-se como
uma estratégia altamente produtiva, se for bem projetada e executada. Contudo, até ao momento é um
vetor de possível atuação não explorado.
6. Relativamente à projeção da língua portuguesa no contexto regional, ainda não há frutos visíveis.
Potencialidades e riscos
As potencialidades
Como foi referido acima, a principal potencialidade do ILP reside na construção de um projeto
coerente e ambicioso de organização e dinamização do ensino e divulgação da língua portuguesa em todo
o país. O ILP é um organismo timorense (ainda que decorra da cooperação com Portugal), instalado numa
instituição de prestígio como a UNTL, dirigido por um timorense (o reitor da universidade, que acumula
72
funções de diretor do ILP), com recursos humanos qualificados (e, espera-se, também em breve com
recursos materiais mais adequados) que pode desenvolver numa perspetiva global, de médio e longo
prazo, o ensino e a divulgação da língua portuguesa, prestando um serviço de grande relevo à sociedade
timorense.
Mais do que cingir-se ao ensino formal, o ILP pode estender a sua ação à conceção de planos de
formação, à produção de materiais didáticos, ao desenvolvimento de estudos e à promoção da língua
portuguesa para lá dos muros da instituição académica.
Pode mesmo vir a tornar-se uma entidade certificadora das diversas formações ministradas por
entidades várias ou fazer o reconhecimento de competências ou proficiência em língua portuguesa para
fins diversos.
Uma efetiva promoção da língua portuguesa à escala nacional reduziria as diferenças entre cidadãos
e favoreceria o desenvolvimento e a igualdade social.
Riscos
Na fase atual, o maior risco que se apresenta reside na canibalização do ILP pelo Departamento da
Língua Portuguesa, visto que este tem consumido e consome ainda a maioria dos recursos humanos
disponíveis. Desta forma, o instituto esgota-se em ações internas à UNTL, compreensíveis de um certo
ponto de vista, mas limitadoras da ambição e potencial do ILP. Encarar o instituto como um recurso
disponível e os seus docentes como mão de obra qualificada pronta para qualquer tipo de função, sem
planificação adequada, pode enviesar os seus objetivos e a sua ação.
Ao nível da projeção da língua portuguesa no tecido social timorense, o facto de o ILP responder às
solicitações oriundas da sociedade civil e dos órgãos do Estado significa que há abertura a essas
solicitações, o que é positivo, mas significa igualmente que o instituto estará a operar por reação, no curto
prazo, não sendo proactivo e não mostrando possuir um planeamento estratégico próprio. Isto levanta
dificuldades, por exemplo, ao nível da alocação dos recursos humanos.
O atraso na formalização do instituto no quadro da UNTL, mais de um ano depois de o memorando
de entendimento ter sido assinado, pode causar alguma estranheza e gerar algumas apreensões,
nomeadamente quanto à vontade política de terminar o processo.
Uma ausência de política coerente, a resposta avulsa a solicitações ocasionais ou uma navegação à
vista, de curso prazo, podem desestruturar o trabalho e fazer baixar a qualidade, afastando os critérios de
cientificidade que devem sempre pautar o trabalho do ILP. Nesse caso, o risco de se tornar num projeto
falhado aumenta. Esperemos que esse cenário não venha a concretizar-se.
Nota final
73
Referências
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http://www.cplp.org/Files/Billeder/cplp/1-Resol_PALis.pdf (consultado em 31-3-2015).
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Promoção da Diversidade das Expressões Culturais. Diário da República, 1.ª série, N.º 54, 16 de
março de 2007.
74
A UTILIZAÇÃO DO MANUAL ESCOLAR DA DISCIPLINA DE BIOLOGIA NO 10º ANO,
NO DECURSO DO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM
Introdução
A educação deve ser entendida como um processo para influenciar os alunos para que eles possam se
adaptar ao ambiente que lhes rodeia, para modificar sua sociedade positivamente. As ciências e a
tecnologia, rapidamente se desenvolvem através da educação, no que faz parte da escola. Quando falamos
em educação, hoje em dia, percebemos-a como uma acção social pode elevar o desenvolvimento do
conhecimento do ser humano. A educação, também na sua realização, se faz nas escolas com os sujeitos,
sobretudo com os alunos e professores. Por um lado, a motivação e orientação aos alunos para uma boa
qualidade da educação deve partir dos pais, da família. E, por outro lado, há a responsabilidade dos
professores que ensinam nas escolas, em relação à formação sobre a moral e o comportamento dos
estudantes, para que se tornem qualificados.
Embora a Lei de Bases da Educação (LBE), exponha a necessidade de reorganização da educação, a
fim de dar conta dos estímulos estabelecidos pelos processos globais e pelas transformações sociais e
culturais na sociedade, na área das Ciências Biológicas, o ensino dessas se organiza, ainda hoje, de modo
a privilegiar o estudo de conceitos, linguagem e metodologias desse campo do conhecimento, tornando o
conhecimento científico pouco eficaz na interpretação e intervenção da realidade, principalmente no
ensino e aprendizagem na sala de aula, em que esta visão é extremamente fragmentada. Para chegar a um
nível de educação qualificada precisa-se elevar e reforçar o conhecimento dos alunos.
Num contexto educacional concebido como um sistema de componente educativo com uma função
central, todos têm o direito de obter o processo de educação. Mas, para ter um bom resultado na educação
qualificada, é preciso que as várias partes sejam coniventes, que suportam o sistema científico: os pais, os
alunos, os professores, as condições ambientais, as facilidades escolares, o currículo e o manual escolar,
estejam alinhados, apontando direções.
O currículo prepara os alunos para um trabalho específico, sendo elaborado em conformidade com o
nível e tipo de ensino no âmbito do estado no sentido de aumentar os conhecimentos, as potencialidades e
as capacidades dos alunos, tendo em conta a diversidade das potencialidades locais e o meio ambiente,
além das necessidades de desenvolvimento regional e nacional e os desafios do próprio mundo, bem
como o desenvolvimento da ciência, tecnologia e arte, as dinâmicas de desenvolvimento global, a unidade
nacional e os valores nacionais.
No período de 2013 – 2014, foi realizada a formação de professores do ensino sobre a utilização do
currículo e manuais escolares. Pretendeu-se analisar os impactos das formações de professores nas
escolas sobre o currículo do Ensino Técnico-vocacional e a capacidade dos professores na utilização dos
manuais escolares no ensino e aprendizagem. Este estudo analisa os impactos da formação no período de
2013 que foi dada pelo Ministério da Educação de Timor-Leste, juntamente com Associação Nacional de
Escolas Profissional (ANEPSO) de Portugal, e Gest Entrepreneur (uma associação Portuguesa que está a
elaborar o manual do ensino em empreendedorísmo).
Pires et al. (2008) mostra que o ensino de Ciências Naturais no currículo da Educação de Jovens e
Adultos está passando atualmente por várias mudanças, de forma a buscar um ensino mais dinâmico,
atualizado, contextualizado, onde se privilegia os temas de maior relevância para os alunos, a fim de
75
buscar uma aprendizagem mais significativa e que os mesmos possam interagir com os conteúdos em sala
de aula. Assim, é necessário selecionar temas e problemas relevantes para que os alunos sejam motivados
a refletir criticamente sobre eles. É uma forma de introduzir temáticas na perspectiva da Ciência,
Tecnologia e Sociedade no currículo convencional. É por meio de intervenções curriculares que emergem
as aberturas para as alterações curriculares mais abrangentes.
A escola é uma instituição de ensino formal para os alunos, sob a direcção do professor. Os alunos
apreendem e progridem de forma sistemática para obter o nível do ensino. Outra parte é a de dar
oportunidade para os alunos desenvolverem as actividades de aprendizagem e/ou realizar a interacção no
processo de ensino e aprendizagem juntamente com os professores e outros alunos, para ampiar as
possibilidades de construção do conhecimento. Os ambientes escolares constituem como um lugar
importante, por que a aprendizagem dos alunos e o desenvolvimento do conhecimento desses dependem,
também, do ambiente. Um problema que os professores estão enfrentando é a variedade de
comportamento dos alunos, ou seja, de personalidades diferentes no processo do ensino e aprendizagem.
O manual escolar como um guia é fundamental na construção do conhecimento pelos professores e
alunos. Como Dos Santos Botas (2008:46) afirmou que "Os manuais escolares quando bem elaborados
podem ser de guias, abrir caminhos, constituir pontos de referência para quem trabalha com eles". Para
ensinar precisa preparar a planificação de aula, pois através do manual escolar o professor pode construir
uma ideia de trabalho.
A ideia acima está de acordo com a afirmação dos autores Pereira e Durarte, (1999:367): ―A maioria
dos professores planifica o seu ensino tendo por base o manual escolar; - O manual escolar constitui o
suporte básico e fundamental para organizar as aprendizagens dos alunos; - muitos professores
consideram que o manual constitui um mediador importante na construção do conhecimento científico
escolar‖.
O uso do livro didático fornecido pelo governo favoreceu a aprendizagem dos alunos. Com ele,
despertaram maior interesse e participação nas aulas, além de reforçar o nível de aprendizagem
significativa em Ciências e Biologia. Isso se deve ao fato de o livro fornecer ao aluno a possibilidade de
conhecer realidades antes nunca conhecidas por ele, principalmente em relação as imagens e experiências
práticas. Bruzzo (2004) afirma que o conhecimento das Ciências Naturais está intrinsecamente associado
à apreciação de imagens e ilustrações, pois isso facilita a interação dos alunos com os conteúdos e com as
vivências do seu quotidiano. Já Oliveira, Delsin e Rodrigues (2003) mostram a ausência de livros
didáticos em Ciências, dificultam o processo de ensino-aprendizagem. A utilização de revistas e artigos
científicos, em apoio ao livro didático, mostrou-se bastante eficiente na aprendizagem. Essa metodologia
mostra que as Ciências Biológicas são dinâmicas e se encontram em constante transformação, e que
novos conhecimentos são desenvolvidos a cada dia. Resultados semelhantes foram alcançados por
Oliveira, Delsin e Rodrigues (2003) ao trabalhar com alunos na disciplina de ciências.
Problema de investigação
Os problemas que emergem dos processos de concepção e de utilização dos manuais escolares,
juntamente com a centralidade deste recurso pedagógico no processo de ensino-aprendizagem, têm
conduzido a um amplo conjunto de recomendações e opiniões, muitas vezes divergentes, sobre a
pertinência do seu uso nas salas de aula. Deste modo, a análise desta documentação pode gerar um
interessante campo de investigação na interface entre a educação biológica e os estudos de políticas
públicas. Além disso, coloca-se o problema de saber de que forma é que as inventariações de problemas,
que surgem nos diferentes relatórios encomendados pelas autoridades educativas, pode ser articulada com
agendas de investigação ou contribuir para investigação de carácter aplicado. Será interessante reflectir
também sobre o que as autoridades educativas podem esperar e impulsionar, em termos de investigação, a
partir desses relatórios.
76
Questões e objectivos de investigação
A questão desta investigação foi: "Quais as opiniões dos professores principiantes em relação à
utilização do manual escolar da disciplina de biologia no 10° ano de escolaridade, no decurso do PEA?".
O objetivo deste estudo foi conhecer as perceções dos professores principiantes em relação à utilização do
manual escolar da disciplina de Biologia, no 10º ano de escolaridade. Pretendeu-se conhecer suas
opiniões, identificando as dificuldades que enfrentam no decurso da sua prática pedagógica no Ensino
Secundário.
Metodologia da investigação
Local e Lugar de investigação
Este estudo foi realizado na Faculdade de Educação, Artes Humanidades da Universidade Nacional
Timor Lorosa‘e, entre os dias de 2 à 7 de Fevereiro de 2015.
População
População em princípio, são todos os membros pertencentes a grupos de pessoas, animais, eventos
ou objetos que vivem juntos em um só lugar. Sobre este assunto, de acordo com Nanawi (1985: 141)
apud Setyawan (2006) "A população é a totalidade de todos os valores possíveis, como calcular ou medir
os resultados quantitativos e qualitativos sobre as características específicas de um conjunto completo
de objetos". Com base no exposto desta teoria, todos os elementos da população é objeto de pesquisa
local, que têm valor qualitativo e quantitativo que pode ser estudado ou analisado, segundo as
características. Assim, a população deste estudo são todos os futuros professores do ensino de Biologia da
Faculdade de Educação, Artes e Humanidades da Universidade Nacional Timor Lorosa‘e.
Amostra
Os instrumentos utilizados neste estudo são: guião de entrevista e documentação sobre o manual
escolar do 10º ano de escolaridade no ensino secundário.
Entrevista
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descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma
ideia sobre como o sujeito, interpretam aspetos do mundo‖. Segundo os mesmos autores (Idem: 33), uma
entrevista é considerada ―como uma conversa tendo em vista um objetivo‖. E ainda, ―A entrevista deve
desenvolver-se de forma consistente, caraterizando-se pela focalização, fidedignidade e validade de um
certo acto social como uma conversação‖ (CARDOSO, 2012: 63).
Contudo apesar da entrevista ser considerada um método de recolha de informações, Bardin
(2011:90) refere que, no sentido mais rico da expressão, o espirito teórico do investigador deve
permanecer continuamente atento, para que as suas próprias intervenções se traduzam em elementos de
análise tão fecundos quanto possível. Para que seja uma entrevista mais flexivel, procedemos as
entrevistas semiestruturadas, para as quais foram construidas e validados os respectivos guiões. A
entrevista semiestruturada não é uma entrevista inteiramente livre, mas confere certa informalidade ao
processo. Como referem Ludke e André (1986:33), numa entrevista ―a relação que se cria é de interação,
havendo uma atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem responde‖, especialmente
quando se utiliza uma ―entrevista não totalmente estruturada‖.
No pensamento do professor Camilo Cunha (2007:77) e De Ketele e Roegiers (1993:22). A
entrevista é uma técnica que é mais utilizada no paradigma qualitativo, resultado de uma negociação entre
o investigador e o entrevistado com o fim de descobrir a interpretação das exposições.
Fontes documentais
Sá-Silva et al (2009: 5), o documento como ―fonte de pesquisa pode ser escrito e não escrito, tais
como filmes, vídeos, slides, fotografias ou pósteres. Esses documentos são utilizados como fontes de
informações, indicações e esclarecimentos que trazem seu conteúdo para elucidar determinadas questões
e servir de prova para outras.‖ Nesste estudo, utilizamos o manual escolar e sebenta de Biologia do 10º
ano no ensino secundário.
Para compreender melhor o objecto da pesquisa e as respostas elaboradas para recolha dos dados, o
processo começou com a análise por item das questões. Para análise dos dados neste estudo, utilizou-se a
análise do conteúdo para conhecer as ideias dos professores sobre a utilização da língua de instrução, as
dificuldades enfrentadas e os métodos do ensino. A partir da análise desses fatores, poderemos provocar
um olhar geral sobre o ensino do conteúdo do manual escolar e sebenta do 10º ano no ensino secundário.
Resultado da investigação
De um modo geral, os resultados demonstram a preferência pela utilização de uma sebenta elaborada
em 2007/2008, num trabalho de parceria entre professores brasileiros e timorenses. As aulas decorreram
em regime bilíngue, privilegiando-se o português, mas também o tétum. Os professores assumiram terem
sentido dificuldades em falar corretamente a língua portuguesa.
Quando comparadas, as sebentas e os manuais escolares. apresentam diferenças ao nível de
organização dos temas. Nas sebentas, o programa encontra-se dividido em duas unidades temáticas, que
se subdividem em capítulos. Nos manuais, existem três unidades temáticas, que se subdividem em
subtemas.
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No que diz respeito aos métodos de ensino utilizados pelos professores, observou-se uma
diversidade. Não existindo, ainda, equipamentos laboratoriais à disposição, representando um recurso
muito limitado nas escolas de ensino secundário no Timor-Leste.
Os professores apontaram dificuldades para contribuir na aprendizagem dos alunos, em relação aos
conteúdos presentes no manual do aluno. Os professores principiantes dizem ter utilizado apostilas, na
tentativa de resolver alguns dos problemas de aprendizagem que enfrentam com os alunos, em contexto
de sala de aula, e onde os manuais escolares não eram suficientemente esclarecedores.
Considerações finais
Baseando-se nos resultados e nas dicussões, concluimos que há o uso do manual escolar pelos
futuros professores nos seus lecionamentos. Eles disseram que a sabenta é mais fácil para trabalhar com
os alunos do que manuais escolares. O motivo pela preferência das sebentas nas aulas ao invés dos
manuais está relacionado a estrutura dos documentos. Enquanto nas sebentas o programa encontra-se
dividido em duas unidades temáticas, que se subdividem em capítulos, nos manuais, existem três
unidades temáticas, que se subdividem em muitos subtemas.
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ERROS ORTOGRÁFICOS DA LÍNGUA PORTUGUESA NA COMPOSIÇÃO DE ALUNOS DO
7º ANO, DO 3º CICLO, DO ENSINO BÁSICO EM TIMOR-LESTE
O que é a ortografia?
A ortografia é a parte da gramática que trata do emprego correto das letras e dos sinais gráficos da
língua escrita. De acordo com o regulamento da Academia Brasileira de Letras e Academia das Ciências
de Lisboa, a ortografia da língua portuguesa é o sistema de escrita padrão, usado para representar a língua
e contém 26 letras do alfabeto latino, além dos sinais gráficos.
A estabilização da ortografia do português durou 700 anos, quando surgiram os primeiros textos
escritos em língua romanesca, falada na faixa ocidental da Península Ibérica e, em 1911, concluiu a
fixação das bases do sistema ortográfico. Nesse mesmo ano, foi quando se fixou finalmente a ortografia
do português, ―Bases da Ortografia Portuguesa‖ tendo como a referência da proposta dos filólogos
Gonçalves Viana e Vasconcelos Abreu (FARACO, 2014).
Os 700 anos de laboriosa construção e estabilização da ortografia do português foi respeitado,
quando adotou-se um sistema misto definido por uma conjunção de fatores fonológicos, etimológicos,
morfológicos e de tradições culturais. Uma obra de séculos de exercício e experimentos sob esses
diversos critérios, não foi assim possível tratar por um critério único (FARACO, 2014).
O sistema ortográfico do português é composto pelas relações com o sistema de sons da língua. As
relações estabelecidas entre esse sistema e o sistema ortográfico são caracterizadas por dois tipos
diferentes, as biunívocas e as múltiplas. A relação biunívoca é uma representação gráfica, que
corresponde a apenas um fonema, ou um fonema tem apenas uma representação gráfica. A relação
múltipla é observada quando um grafema pode representar vários fonemas, ou quando um fonema é
representado por vários grafemas. A seguir podemos observar os casos em que tal relação se verifica, por
Miranda (2008):
Quadro 2- Exemplo de relação múltipla; um grafema representando vários fonemas, de acordo com a posição -
extraído de Miranda (2008).
Grafema Fonema Exemplo
/x/ ‗rato‘, ‗enrolado‘
‗r‘ /r/ ‗era‘, ‗prato‘, ‗tambor‘
/k/ ‗casa‘,‗macaco‘,‗cravo‘
‗c‘ /s/ ‗cena‘, ‗macio‘
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Quadro 3- Exemplo de relação múltipla; um fonema representado por mais de um grafema
– extraído de Miranda (2008).
Fonema Grafema Exemplos
‗ss‘ ‗passado‘
‗sc‘ ‗nascer‘
‗sç‘ ‗nasça‘
/s/ ‗xc‘ ‗exceção‘
‗s‘ ‗semente‘, ‗urso‘
‗c‘ ‗cinema‘, ‗ócio‘
‗ç‘ ‗moço‘, ‗março‘
‗x‘ ‗experiência‘
‗j‘ ‗jato‘, ‗caju‘, ‗jibóia‘
ž ‗g‘ ‗geléia‘, ‗mágico‘
Em relação aos 3 quadros, que se estabelecem entre fonemas e grafemas, no sistema ortográfico da
língua, revelam um pouco da dificuldade dos alunos em aprender a ortografia. Além disso, todos os
sistemas ortográficos adotados no português, sempre oscilaram entre duas posturas: a grafia etimológica e
a grafia fonológica. A grafia etimológica procura preservar o modo como as palavras se escreviam em
grego e latim. E a grafia fonológica é o sistema ortográfico, que representa os fonemas da língua, dos
sons da fala (BIZZOCCHI, 2013).
Segundo Bizzocchi (2013), Duarte Nunes de Leão, em 1576, defendia a grafia etimológica na sua
Orthographia da lingoa portuguesa. A ortografia etimológica é evidentemente mais conservadora e exige
grande poder de memorização dos falantes, bem como, conhecimento de grego e latim. E a grafia
fonológica foi defendida por aqueles que entendem a língua como instrumento prático de comunicação,
cuja escrita deve ser mais racional e simples possível. Em uma língua ou idioma há a mistura dessas duas
coisas diferentes, instrumento de comunicação e património histórico e cultural de um povo. Um termo
entre as duas atitudes tem se procurado na maioria das línguas europeias. Por exemplo, substituiu-se ―ph‖
por ―f‖, mas mantém-se a distinção entre ―ss‖ e ―ç‖. Dessa questão, nada errado, no entanto, o problema
sobre o que deve ser mantido como o ―x‖ de ―extensão‖, e o que deve ser simplificado, como o ―ph‖ de
―farmácia‖ por ―f‖, das opções feitas pelos elaboradores de reformas ortográficas anteriores (mudanças
nas bases do sistema), normalizaram com base na etimologia de grafias oscilantes.
Em 1943, ―portuguez‖ e ―embriguez‖ se escreviam com ―z‖, convencionou-se que o ―português‖
deveria ser com ―s‖, já que, nosso sufixo ―-ês‖ provém do latim ―-ensis‖, enquanto o sufixo ―-ez‖, de
―embriguez‖, vem do latim ―-ites‖.
Baseado nos detalhes apresentados acima, os investigadores tem de fazer um levantamento sobre: 1)
Quais são os erros ortográficos que acontece na composição dos alunos; 2) Quais os erros ortográficos
que mais acontecem. É portanto, o objetivo geral desse estudo é analisar os erros ortográficos da língua
portuguesa, em composições de alunos do sétimo ano, do Terceiro Ciclo, do Ensino Básico. Esse objetivo
geral desenrola-se em três objetivos específicos: 1) identificar os erros que acontecem na composição dos
alunos; 2) descrever e quantificar os erros ortográficos dos alunos; 3) refletir sobre as implicações
didáticas dos erros encontrados nas composições.
O acordo ortográfico (AO), documento oficial, pretende aproximar a ortografia de todos os países da
língua portuguesa. A discussão apresenta está baseada em informações coletadas, em sua maioria, de
pesquisas da internet, em virtude da dificuldade de encontrar material impresso sobre o novo Acordo
Orográfico.
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No início do século XX, em 1911, a primeira grande reforma ortográfica da língua portuguesa surgiu
em Portugal, que estabeleceu um modelo ortográfico de referências para as publicações oficiais e para o
ensino. Entretanto, o Brasil não adotou esse primeiro formulário ortográfico. A partir desse momento, a
ortografia da língua portuguesa passou por um longo processo de discussão e negociação, com objetivo
de unificar a norma ortográfica nos países lusófonos.
Em 1915, houve a união da Academia Brasileira de Letras e a reforma de 1911. No entanto, depois
de quatro anos (1919), houve a revogação desse acordo. Somente em 1931, o primeiro acordo ortográfico
foi aprovado entre Portugal e Brasil, mas esse acordo só está no papel, nunca foi colocado em prática.
Durante 9 anos, Portugal e Brasil mantiveram sua posição. Em 1940, a Academia das Ciências de
Lisboa publicou o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. Em 1943, do existente acordo
ortográfico entre Portugal e Brasil, foi publicado um Formulário Ortográfico. Apesar desse acordo, em
1945, entrou em vigor um novo acordo ortográfico. No entanto, esse novo acordo apenas foi aplicado em
Portugal, o Brasil continuou a seguir o formulário ortográfico de 1943.
Em 1970, houve revisões que aproximaram as duas variedades escritas. Por causa das várias
tentativas de chegar a um consenso, essas revisões não foram aprovadas oficialmente, nem uma reforma
para um documento normativo comum.
Em 1971, no Brasil, houve alterações com objetivo de aproximar a ortografia brasileira a portuguesa
e, em 1973, houve alterações com o acordo do português europeu para aproximar a ortografia brasileira.
E em 1975, as duas Academias projetaram um novo acordo. Contudo, não foi transformado em lei ou
aprovado oficialmente devido ao período de convulsão política que Portugal vivia. Depois de 11 anos
(1986), ambos os países apresentaram memorando sobre o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. E,
em 16 de dezembro de 1990, os países lusófonos assinaram o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
Em 17 de Julho de 1998, foi celebrado o primeiro protocolo modificativo, que elimina as datas para a
elaboração do vocabulário comum da língua portuguesa e vigor do acordo ortográfico de 1990.
Em julho de 2004, os chefes de Estado da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa-CPLP,
reunidos em São Tomé e Príncipe, aprovaram o Segundo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico,
e definiram que ―o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa entrará em vigor com o terceiro depósito de
instrumento de ratificação, junto da República Portuguesa‖ e aprovaram a adesão de Timor Leste (CPLP,
2004). Assim, o acordo ortográfico foi ratificado por três países, Brasil, em outubro de 2004, Cabo Verde,
em abril 2005, e São Tomé e Príncipe, em 17 de novembro de 2006, como um meio para validar o AO em
todos os países da CPLP.
Em 16 de maio de 2008, a assembleia da república portuguesa terminou a ratificação do segundo
protocolo modificativo (PORTUGAL, 2008). Em 3 de setembro de 2009, João Câncio Freitas, então
Ministro da Educação timorense, informou que a ratificação de acordo ortográfico tinha sido efetuada,
conforme resolução do Parlamento Nacional de Timor-Leste. No mesmo ano, em 24 de novembro, Guiné
Bissau ratificou, por unanimidade, o acordo ortográfico e em 7 de junho de 2012, foi a vez do conselho
de Ministros de Moçambique.
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Alguns problemas que afetam a escrita da língua portuguesa não podem ser considerados erros.
Como em situações de ditado de palavras, em que as tentativas de escrita da palavra oralizada não estão
relacionadas ao padrão da língua portuguesa. Tomamos por exemplo, ―não naun‖, ―casa kaja‖,
―chapeo sapeo‖, ―hotél otel‖, ―hospital ospital‖ e ―pão paun‖.
De acordo com Carraher (1985, apud MOTA et al., 2000) ―erros etimológicos são erros de letras
ambíguas que podem ser revolvidos com base na origem das palavras (por exemplo, ―laranjeira‖ é escrita
com ―j‖ porque é derivado de ―laranja‖).
Fonologia é o ramo da linguística que estuda os sistemas sonoros das línguas. Da variedade de sons
que o aparelho vocal humano pode produzir, e que é estudado pela fonética, só um número relativamente
pequeno é usado distintivamente em cada língua. (PINTO, 1997: 29)
O objetivo da análise de erros (AE) é prever áreas de dificuldade na aprendizagem de língua
estrangeira (LE), através de um inventário quantitativo dos erros mais frequentes na produção dos
aprendizes (Gargallo, 2004). Então, o primeiro passo para definição de AE é compreender melhor a
própria concepção de erro como base desse modelo de investigação.
Erros são uma estratégia tanto de crianças que aprendem a sua LM, como de indivíduos que
aprendem uma segunda língua, que difere daqueles erros que são produtos de desvios acidentais de
produção linguística, pois se caracterizam por sua sistematicidade e revelam o conhecimento subjacente
da língua-objeto em um determinado momento (Corder, 1967).
De acordo com Corder (1967:25), os erros provam a existência de um sistema de linguagem
específico dos aprendizes, que não diz respeito nem a língua materna (LM) e nem a língua-alvo. Nesse
sistema, a ―competência transitória‖ do aprendiz é caracterizada por apresentar ―erros sistemáticos‖.
Corder (1971) denominou a linguagem, para esse contexto, como dialeto idiossincrático, dos que
aprendem uma segunda língua. Além de evidenciarem o sistema de língua transitória, existem três níveis
importantes dos erros; (i) para o professor, pois informa o quanto o aluno progrediu e, consequentemente,
o que resta por aprender; (ii) para os pesquisadores, porque evidencia como o aluno adquire ou aprende
uma língua ou quais estratégias ou procedimentos que emprega; (iii) para o próprio aluno, pois os erros
são modos para testar hipóteses acerca da natureza da língua, que está aprendendo (CORDER, 1967).
No processo de aprendizagem, os aprendizes compreendem a LE através da observação da sua
própria produção linguística. Então, podemos afirmar que a definição de Análise de Erros é um modelo
de estudo que busca, através da observação da produção linguística do aprendiz de LE, compreender o
processo de aquisição de línguas estrangeiras.
Para melhorar os métodos e procedimentos de ensino sobre AE, Santos Gargallo (2004) propõe o
propósito pedagógico da AE como identificação e descrição, numa atuação linguística, em uma
determinada situação de comunicação intercultural.
Em relação a definição do conceito de erros, Santos Gargallo (2004) considera outros fatores que
caracterizam as etapas metodológicas da AE, do paradigma qualitativo e quantitativo, a saber: (a)
compilação de corpus de dados; (b) identificação, descrição e classificação de acordo com um conjunto
de categorias; (c) explicação das causas dos erros; (d) avaliação dos erros; (e) discussão dos resultados;
(f) implicação didáticas para o processo de ensino e aprendizagem.
Diante disso, houve critérios e definições que estabeleceram a definição da compilação de corpus de
dados, determinada por diversos aspectos; o tamanho da amostra, a eleição da amostra, o perfil do
informante, o perfil do interlocutor, o cenário de interação e a tarefa comunicativa.
Para a identificação, descrição e classificação dos erros, devem ser usados os critérios que estão
relacionados aos objetivos da pesquisa; critérios descritivo/linguístico, etimológico, comunicativo,
pedagógico, pragmático e critério cultural.
A melhor didática do processo de ensino-aprendizagem é o propósito da AE. Então, os resultados da
adaptação das estratégias e procedimentos de ensino-aprendizagem facilitam a aprendizagem dos
estudantes.
84
Então, podemos afirmar que a definição de Análise de Erros é um modelo de estudo que busca,
através da observação da produção linguística de aprendiz de LE, compreender o processo de aquisição
de línguas estrangeiras, e suas conclusões podem propor procedimentos didáticos que permitam reduzir a
presença de formas não desejadas (SANTOS GARGALLO, 2004).
Para melhorar os métodos e procedimentos de ensino sobre AE, Santos Gargallo (2004) propõe o
propósito pedagógico e afirma que o objetivo de AE é a identificação, descrição das formas que afastam
da norma standarte e que poderão prejudicar uma atuação linguística adequada em uma determinada
situações de comunicação interculturais.
A análise possibilitou verificar uma grande quantidade de erros relacionados a ausência do acento
agudo. Foram encontradas 250 ocorrências nessa categoria. Notificamos também a ausência do acento
circunflexo, em 44 casos; a troca da letra ―c‖ pela ―s‖, em 42 situações; uso do acento circunflexo
indevido, em 22 casos; acréscimo da letra ―n‖, com 21 erros; acréscimo da letra ―i‖, com 15 erros; troca
da letra ―s‖ pela ―z‖, com 14 erros e troca da letra ―o‖ pelo ―u‖, no final da palavra, em 11ocorrências.
Para saber melhor os erros encontrados na produção escrita dos alunos, vamos observar a quantidade
erros, em cada categoria, nas tabelas a seguir:
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Troca da letra ―c‖ por ―g‖ 3 ―gampo‖ Campo
Acréscimo da letra ―e‖ 3 ―apreender‖ aprender
Troca da letra ―f‖ por ―v‖ 2 ―provessor‖ professor
Ausência do acento til ( ᷈ ) 2 ―nao‖ Não
Troca da letra ―g‖ por ―j‖ 2 ―lonje‖ Longe
Acréscimo das letras ―ee‖ 2 ―leer‖ Ler
Troca da letra ―n‖ por ―m‖ 2 ―importamte‖ importante
Troca da letra ―j‖ por ―z‖ 2 ―zardim‖ Jardim
Acréscimo do acento agudo 2 ―léste‖ Leste
Troca do ―ç‖ pelo ―c‖ 2 ―nacões‖ nações
Ausência da letra ―m‖ no final da 2 ―mi‖ Mim
palavra
Troca da letra ―o‖ por ―a‖ 1 ―nas‖ nós
Acréscimo da letra ―s‖ no final da 1 ―obrigados‖ obrigado
palavra
Troca da letra ―n‖ por ―l‖ 1 ―lilgua‖ língua
Troca da letra ―c‖ por ―z‖ 1 ―voze‖ você
Ausência da letra ―u‖ 1 ―portgues‖ português
Ausência da letra ―r‖ 1 ―cadeia‖ cadeira
Troca da letra ―v‖ por ―b‖ 1 ―bolta‖ Volta
Troca da letra ―c‖ por ―ss‖ 1 ―ofissial‖ oficial
Troca da letra ―i‖ por ―e‖ 1 ―cemeterio‖ cemitério
Troca da letra ―c‖ por ―x‖ 1 ―prexisa‖ precisa
Acréscimo da letra ―ss‖ 1 ―messas‖ mesas
Troca da letra ―r‖ por ‖o‖ 1 ―proque‖ porque
Troca da letra ―z‖ por ―s‖ 1 ―cosinha‖ cozinha
Troca da letra ―x‖ por ―ç‖ 1 ―eçplicar‖ Explica
Troca da letra ―a‖ por ―e‖ 1 ―importanta‖ importante
Troca das letras ―ss‖ por ―ç‖ 1 ―noça‖ nossa
Acréscimo da letra ―l‖ 1 ―crecidlas‖ crescidas
Troca da letra ―h‖ por ―l‖ 1 ―trabahlo‖ trabalho
Troca da letra ―l‖ por ―r‖ 1 ―frores‖ flores
Troca da letra ―u‖ por ―r‖ 1 ―gurpo‖ grupo
Troca da letra ―s‖ por ―j‖ 1 ―meja‖ mesa
Troca da letra ―e‖ por ―a‖ 1 ―secratario‖ secretário
Troca do ―ç‖ por ―s‖ 1 ―nasao‖ nação
Troca da letra ―s‖ por ―g‖ 1 ―megas‖ mesas
I Categoria: Acentuação
O quadro 4 mostra a quantidade de erros, na ausência e acréscimo, do acento agudo, com 250
ocorrências de ausência e apenas 2 casos de acréscimos. Isso indica que muitos alunos não sabem utilizar
o acento agudo ou não se sentem seguros para aplicá-lo.
A quantidade de erros de ausência do acento circunflexo, com 44 ocorrências, e a quantidade de erros
relacionados ao acréscimo do acento circunflexo, com 22 casos, indicam que os alunos, nesses casos,
também desconhecem o uso do acento. Porém, a diferença entre os erros de ausência e de acréscimo é
muito menor. Isso indica que os alunos conhecem mais o acento circunflexo e que se sentem mais
seguros para sua utilização.
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Não houve ocorrências de palavras com dupla grafia relacionadas aos acentos, tais como:
acadêmico/acadêmico, fenômeno/fenômeno, oxigênio/oxigênio.
A quantidade da ausência do acento til ( ᷈ ), com 2 ocorrências, e a quantidade do acréscimo desse
acento, com 3 ocorrências, podem estar relacionadas a menor quantidade de palavras que possuem esse
acento na língua portuguesa. É interessante perceber que a ausência dos acentos é maior do que os
acréscimos, nos casos de erros dos acentos agudo e circunflexo. No entanto, nos equívocos do uso do til,
o acréscimo desse acento está em maior quantidade do que a ausência dele, como é possível observar no
quadro abaixo:
O quadro 6 mostra que a maior quantidade de erros foi no acréscimo da letra ―n‖, com 21 casos, e a
seguida, a quantidade de acréscimos da letra ―i‖, em 15 situações. Essas duas questões indicam que
ortograficamente os alunos têm dificuldades de escrever as palavras da língua portuguesa, em que a
pronúncia acrescenta um fonema e acabam acrescentando uma letra. Por exemplo, a palavra ―muito‖ com
―muinto‖, ―trabalho‖ com ―trabailho‖, isso por causa da pronúncia da palavra. A quantidade de
acréscimos da letra ―h‖, com 5 ocorrências, indica que os alunos tem dificuldade na escrita. A quantidade
do acréscimos da letra ―e‖, em 3 situações e a quantidade de acréscimos da forma ―ee‖, em 2 casos,
significa que os alunos têm dificuldade na escrita, por causa da adaptação na pronúncia e interferência na
língua escrita. A quantidade de acréscimo da forma ―ss‖, com 1 caso, e as outras categorias com esse
mesmo número de ocorrência, pode significar que os alunos compreenderam as regras de ortográficas, no
entanto, faltou concentração no momento da escrita da palavra.
87
III Categoria: Ausência de letras
O quadro 7 mostra que a maior ocorrência na ausência de letras foi a letra ―e‖, com 10 registros, a
ausência da letra ―s‖, em 5 casos, as letras ―o‖, ―i‖ e ―a‖, em 4 situações, cada uma, e a ausência da letra
―m‖, em 2 casos. Isso indica que os alunos têm mais dificuldades na escrita, por causa da pronúncia e
concentração na escrita das palavras. A ausência da letra ―u‖ e letra ―r‖, em 1 registro de casa, indica que
poucos alunos cometeram esses erros.
O quadro 8, último de nossa análise, mostra a quantidade de trocas das letras ―c‖ por ―s‖, em 42
situações, da ―s‖ pela ―z‖, em 14 casos, da letra ―o‖ por ―u‖, no final da palavra, em 11 ocorrências, ―s‖
por ―c‖, em 10 situações, do ―u‖ pelo ―o‖, em 9 casos, a troca da letra ―g‖ por ―c‖ e ―c‖ pelo ―k‖, em 8
casos, do ―s‖ por ―ç‖, em 6 casos, do ―c‖ por ―ç‖ em 5 situações, da letra ―m‖ por ―n‖, no final da palavra
e das letras ―q‖ por ―g‖, ―e‖ por ―i‖ e ―x‖ por ―s‖, em 4 registros. As trocas das letras ―v‖ por ―f‖, ―c‖ por
―g‖ e ―b‖ por ―p‖, ocorreram em 3 situações. As trocas do ―ç‖ por ―c‖, ―f‖ por ―v‖, ―j‖ por ―z‖, ―g‖ por
―z‖ e ―n‖ por ―m‖, ocorreram em 2 casos. A quantidade de troca das letras ―v‖ por ―b‖, ―n‖ por ―l‖, ―ç‖
por ―s‖, tiveram 1 registro.
Em relação a troca de letras, os alunos têm dificuldade na escrita, por causa da pronúncia, que está
relacionada com a língua materna ou a língua que eles se comunicam diariamente. Há muitos casos de
troca de letras, alguns com muitos erros, outros com poucos, como por exemplo, a troca do ―c‖ por ―s‖ e
do ―s‖ por ―z‖. Na produção escrita, os alunos trocaram a letra ―c‖ por ―s‖, como nos casos:
presisa/precisa, ofisial/oficial, conhese/conhece. Outro caso ocorre na letra ―s‖ por ―z‖, como: caza/casa,
coiza/coisa, fraze/frase. Nessas situações, essas palavras estão relacionadas como exemplo de uma
relação múltipla, isto é, um fonema representado por mais de um grafema (Miranda, 2008). No caso da
troca do ―o‖ por ―u‖, no final da palavra, o erro parece estar relacionado à pronúncia que transforma o
fonema ―o‖ em ―u‖. Então o aluno escreve como ouve, trocando a letra ―o‖ por ―u‖, como acontece na
palavra ―futuro‖.
88
Troca a letra ―g‖ pela ―c‖ 8 ―costa‖ gosta
Troca a letra ―c‖ pela ―k‖ 8 ―eskola‖ escola
Troca a letra ―s‖ pela ―ç‖ 6 ―presiça‖ precisa
Troca a letra ―c‖ pela ―ç‖ 5 ―voçe‖ você
Troca a letra ―m‖ pela ―n‖ no final da palavra 4 ―jardin‖ jardim
Troca a letra ―q‖ pela ―g‖ 4 ―guando‖ quando
Troca a letra ―e‖ pela ―i‖ 4 ―profissora‖,―profissor‖ professora/professor
Troca a letra ―x‖ pela ―s‖ 4 ―esplicar‖ explicar
Troca a letra ―v‖ pela ―f‖ 3 ―folibol‖ voleibol
Troca a letra ―c‖ pela ―g‖ 3 ―gampo‖ campo
Troca a letra ―b‖ pela ―p‖ 3 ―ampiente‖ ambiente
Troca a letra ―ç‖ pela ―c‖ 2 ―nacoes‖ nações
Troca a letra ―f‖ pela ―v‖ 2 ―provissor‖ professor
Troca a letra ―j‖ pela ―z‖ 2 ―zardim‖ jardim
Troca a letra ―g‖ pela ―j‖ 2 ―lonje‖ longe
Troca a letra ―n‖ pela ―m‖ 2 ―importamte‖ importante
Troca a letra ―v‖ pela ―b‖ 1 ―bolta‖ volta
Troca a letra ―n‖ pela ―l‖ 1 ―lilgua‖ língua
Troca a letra ―ç‖ pela ―s‖ 1 ―nasao‖ nação
Troca a letra ―i‖ pela ―e‖ 1 ―cemeterio‖ cemitério
Troca a letra ―o‖ pela ―a‖ 1 ―nas‖ nós
Troca a letra ―s‖ pela ―j‖ 1 ―meja‖ mesa
Troca a letra ―c‖ pela ―ss‖ 1 ―ofissial‖ oficial
Troca a letra ―e‖ pela ―a‖ 1 ―secratario‖ secretário
Troca a letra ―s‖ pela ―g‖ 1 ―megas‖ mesas
Troca a letra ―a‖ pela ―e‖ 1 ―importente‖ importante
Troca a letra ―c‖ pela ―x‖ 1 ―prexisa‖ precisa
Troca a letra ―r‖ pela ―o‖ 1 ―proque‖ porque
Troca a letra ―c‖ pela ―z‖ 1 ―voze‖ você
Troca a letra ―x‖ pela ―ç‖ 1 ―eçplica‖ explica
Troca a letra ―z‖ pela ―s‖ 1 ―cosinha‖ cozinha
Troca a letra ―ss‖ pela ―ç‖ 1 ―noça‖ nossa
Troca a letra ―h‖ pela ―l‖ 1 ―trabahlo‖ trabalho
Troca a letra ―l‖ pela ―r‖ 1 ―frores‖ flores
Troca a letra ―u‖ pela ―r‖ 1 ―gurpo‖ grupo
Considerações finais
Os erros que mais ocorrem na produção escrita dos alunos são a ausência e acréscimo dos acentos,
ausência e acréscimo das letras e troca de letras. Através desse resultado de pesquisa, sugiro que todos os
professores tenham máxima atenção ao facilitar o conhecimento aos alunos, para superar os erros
encontrados na produção escrita em todos os níveis do Ensino Básico.
Com o resultado dessa investigação, que foi realizada na Escola Ensino Básico Central Dom-
Baumeta Suco-Liurai, em Timor-Leste, queria recomendar aos: 1) professores do Ensino Básico que
89
criem várias estratégias e atividades práticas na aula, especificamente sobre ortografia, pronúncia de
fonemas da língua portuguesa, acentuação, para que eles, individualmente ou ditado pelo professor,
façam a correção de cada palavra. Podem criar também atividades bilíngues ou trilíngues, tétum, língua
materna e português; 2) alunos que pratiquem, escrevam e pronunciem os fonemas ou palavras da língua
que estão aprendendo.
Por isso, o Acordo Ortográfico precisa ser trabalhado em sala de aula, para os alunos saberem um
pouco a história da língua portuguesa. Além disso, perceber a variedade e riqueza linguística do
português, em seus processos interculturais.
Referências
90
PARTE II
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
91
92
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES CRÍTICO-REFLEXIVA: PRESSUPOSTOS
NECESSÁRIOS AO DESVELAR COLABORATIVO DA PRÁTICA DOCENTE
Introdução
Neste texto buscamos propor pressupostos para um processo formativo que intenta na análise
dialética e dialógica da prática político-pedagógica de professores de ciências da Rede Municipal de
Ensino de Florianópolis (RMEF), construir um que fazer crítico transformador (FREIRE, 2007). Para
tanto, é necessário junto aos educadores ouvir a realidade concreta em que atuam, problematizar as
situações de sofrimento que vivenciam e denunciar o seu processo de desumanização (FREIRE, 2005). É
com o intuito de conhecer coletivamente para posteriormente transformar crítica e eticamente a realidade
que devemos mergulhar na concretude da ação pedagógica diária dos professores evidenciando suas
dificuldades e anunciando suas potencialidades. É com esta perspectiva que selecionamos o ensino de
zoologia presente no 7º ano da RMEF, como um dos potenciais contextos materiais para discutir a práxis
político-pedagógica dos professores de ciências.
Considerando a historicidade do ensino de ciências naturais, percebemos que essa prática sempre foi
fortemente influenciada por contextos internacionais revelando uma forte relação de poder e dependência
do Brasil, aos países europeus e norte americano (KRSILCHICK, 2000; 2008). Devido a essa
historicidade, ainda hoje, o ensino de zoologia no Brasil, como uma componente curricular da disciplina
de ciências e biologia, é fortemente marcado por um positivismo sanitarista eurocêntrico que data de
meados do século IX e XX e que conduziu as pesquisas nacionais sobre os ciclos biológicos de vetores e
doenças neotropicais (ZARUR, 1994). Desta forma, o Sanitarismo brasileiro provido de estudos
higienistas europeus (CAPONI, 2006) baseava-se na concepção de que a resolução dos problemas de
saúde nacional estava na resolução da saúde pontual, ou seja, corrigir através de ações higienizadoras
estatais, escolarizadas, a defasagem conceitual familiar que comprometia a saúde da criança garantindo
assim a estabilidade e a segurança nacional (MOHR; SCHALL, 1992).
Produz-se então na escola uma tradição de ensino que estabelece um padrão curricular hermético e
profilático frente à realidade brasileira, dificultando proposições, conteúdos e práticas diversificadas ao
ensino de animais (ROCHA; SANTOS, 2014). Tradicionalmente o ensino de zoologia objetiva apresentar
a biodiversidade animal e sua classificação, o que torna este conhecimento diretamente dependente das
pesquisas científicas de ordem biológica baseadas na descrição, organização e catalogação das espécies
animais. Entretanto, ainda são poucos os trabalhos de pesquisa que discutem o ensino propriamente dito
deste conteúdo (AMORIM et al., 2001).
A análise do ensino de zoologia presente no ensino básico evidencia que a classificação animal
presente tanto nas práticas de ensino, quanto nos materiais didáticos ainda limita-se ao modelo de
classificação essencialista, linneliano e aristotélico (AMORIM et al., 2001; VASCONCELOS; SOUTO,
2003). Um modelo que se baseia na apresentação enciclopédica de um conhecimento sobre a vida animal
altamente descritivo e fragmentado, de forma que a natureza, posta como uma entidade hostil (RAZERA;
93
BOCCARDO; SILVA, 2007), é compreendida como uma verdade inquestionável. Desta forma, todos os
agrupamento animais revelam-se como ―[...] tipos naturais discretos e estáveis no tempo e no espaço.‖
(SANTOS, 2008), relegando as atuais contribuições da teoria sintética da evolução (SANTOS; CALOR,
2007). A crítica exposta não tem por objetivo abolir as classificações das aulas de zoologia, pois, como
Mayr (1982) aponta, as classificações são necessárias sempre que tivermos que lidar com a diversidade.
Entretanto, da forma como está posta na escola, a classificação da diversidade animal está isolada em um
currículo de ciências composto por um gigantesco compêndio de nomes, conceitos e práticas que se dão
de maneira fragmentada e descontextualizada à realidade (ROCHA, 2013).
É na lógica de não haver diálogo entre os conhecimentos do professor e dos alunos, que podemos
afirmar que o ensino de zoologia presente na realidade da RMEF está contribuindo para uma educação
bancária, pois resume-se a aplicação autoritária e silenciadora de conceitos científicos que devem ser
meramente memorizados (VASCONCELOS; SOUTO, 2003; ROCHA; 2013). Assim, contribuímos para
a reprodução de um modelo de sociedade, de ciência e de natureza incoerentes com o real, estando esses
modelos muito mais a serviço de uma elite dominadora e opressora do que a serviço da ética democrática
e da igualdade para com todos os seres humanos (FREIRE, 2005; 2007; FREIRE; SHOR, 2011;
GIROUX, 1997). Desta forma, na educação bancária não existe diálogo, apenas a narração de conteúdos
alheios a realidade.
Tendo em vista tais problemáticas é comum no discurso dos professores a seguinte fala
significativa1, ―Então o professor tendo autonomia ele pode [...] no seu pensamento, nas suas
concepções optar né, [...] ver [...] qual é o conteúdo que é importante para o aluno e aquele que não;
Porque se não ele não vence.‖. Fala de um professor de ciências do 7º ano do ensino fundamental‖
(ROCHA, 2013).
A fala apresentada evidencia as dificuldades que o professor precisa enfrentar ao trabalhar os
conteúdos de zoologia. Para este profissional, é extremamente complicado conseguir abordar em apenas
um ano letivo a extensa grade de conteúdos sobre os grupos de animais, tradicionalmente aceita e
incorporada ao currículo escolar. No entanto, o que se observa é que esse tradicionalismo não é
questionado. Este professor, dentro do conteúdo programático proposto, apenas foca seus esforços na
mudança da forma com que os grupos animais são trabalhados, dando prioridade aos animais que
acredita, na visão dele, ser mais significativos para seus alunos, entretanto, não modifica propriamente
dito o conteúdo proposto, sentindo a necessidade de cumpri-lo durante todo o ano letivo, ―vencendo‖ os
conteúdos mesmo tendo consciência desta impossibilidade prática (ROCHA, 2013).
1
De acordo com Silva (2004, p.18), a fala significativa caracteriza-se como a expressão da comunidade escolar e seus
diferentes segmentos. Para garantir o significado social coletivo, tais falas devem trazer a denúncia de algum conflito ou
contradição vivenciada pela comunidade escolar local, expressando uma determinada representação historicamente
construída do real. É nesta lógica que a fala apresentada busca expressar uma visão coletiva do ensino de zoologia na RME
de Florianópolis que representa uma situação de opressão sobre o trabalho dos professores. Este concebido a partir de um
fatalismo frente a sua ação pedagógica.
94
Ao expor essa fala significativa buscamos problematizá-la junto ao leitor, uma vez que esta fala
levanta muitos questionamentos a respeito dos motivos que levam um profissional a tentar de fato
―vencer‖ um currículo historicamente idealizado por sujeitos muitas vezes distantes da sala de aula.
(PIMENTA; GHEDIN, 2002; GIROUX, 1997; FREIRE; SHOR, 2011) Logo, qual é o significado deste
―vencer‖? Qual é o compromisso da ação pedagógica? com o currículo, ou com a aprendizagem do
aluno? Como podemos saber o que é importante para o nosso aluno e o que não é dentre os diversos
conceitos e grupos animais, se a preocupação na ação docente parece se concentrar na carga conceitual e
não no diálogo? Como podemos pensar em autonomia profissional, se o professor está apenas
reproduzindo um currículo tradicional? Será que este profissional possui de fato autonomia quando tenta
sanar a problemática sem questionar porque e para que deve ministrar tais conteúdos? Como construir a
criticidade (BRASIL, 1998) junto aos alunos sem refletir crítica e pedagogicamente sobre esse objetivo,
seus significados e as condições materiais, estruturais e ideológicas, dentro e fora da ação docente? Ou
seja, como formar um sujeito crítico sem ser essencialmente um professor crítico?
Ao ler a fala, podemos observar que este professor percebe a contradição entre manter a carga
conceitual e a impossibilidade de cumpri-la, mas será que ele poderia ou deveria questionar-se quanto à
sua prática, quanto aos motivos e objetivos de sua ação? Freire e Shor (2011) trazem um apontamento
muito importante quanto ao valor do ato de ensinar imerso em uma ideologia 2 autoritária e
desumanizadora que separa da práxis pedagógica docente a teoria da prática e a reflexão da ação.
Desta forma fica evidente a impotência que os professores sentem ao confrontar-se com os contextos
burocratizados de ensino em que atuam. Contextos esses que são promovidos a partir de um conjunto de
intencionalidades conservadoras, que direcionam a educação brasileira para um modelo mecânico de
ensino, pautado na adaptação dos sujeitos frente ao mercado neoliberal global. Consequentemente, a
partir de um processo de alienação e opressão as ações docentes se adéquam à racionalidade técnica para
a formação de recursos humanos dóceis e manipuláveis (FREIRE; SHOR, 2011; FREIRE, 2005). Na
lógica desta meta desumanizadora os professores são negados, e muitas vezes também se negam,
2
A ideologia é um constructo social que se traduz em formas nas quais os significados são produzidos, mediados e
incorporados em formas de conhecimento, práticas sociais e experiências socioculturais. No caso específico da dimensão
educacional, a ideologia é um conjunto de doutrinas e meios através dos quais professores e educadores dão sentido a suas
próprias experiências, no/do mundo em que estão imersos (GIROUX, 1997).
95
enquanto sujeitos autênticos e autônomos (PIMENTA; GUEDIN, 2002; FREIRE; SHOR, 2011;
GIROUX, 1997), muitas vezes reproduzindo discursos como:
A docência seria uma ação pedagógica pautada somente na prática de ensino apartada de uma
teoria;
Por ser um agente da prática, o professor é considerado somente um técnico consumidor de
teorias e/ou metodologias acadêmicas;
Por ser um consumidor da produção acadêmica, o professor não é capaz de produzir seus
próprios conhecimentos, ou seja, não possui saberes e por isso, não é capaz de conceber
autenticamente com rigor novas metodologias de ensino, nem a produção curricular;
Desta forma, como um ser somente da prática o professor é concebido como um agente
consumidor isolado ao seu contexto, fortemente imediatista e mecânico, não sendo capaz de
realizar pontes entre a sua ação e a vida de seus alunos.
O seu ensino e por conseqüência a aprendizagem são reduzidos ao conteúdo escolar disciplinar,
não abordando contextos sociopolíticos mais amplos;
E tendo em vista seu papel pedagógico técnico e bancário, o professor não possui plena
autonomia sobre sua prática pedagógica, ação esta que se auto-justifica para a promoção de um
currículo autoritário e silenciador externo ao contexto de ensino e aprendizagem.
Logo, o sujeito professor através da opressão burocrática é negado e através da alienação de sua
prática se auto-nega enquanto um sujeito dialeticamente capaz de transformar o mundo e a si
mesmo.
Pimenta (2005) sustenta que as organizações escolares produzem uma cultura própria baseada em
necessidades específicas que exprimem os valores e as crenças que os membros dessa organização
partilham. Assim, compreendemos que a escola não tem um caráter unicamente divulgador e ou
reprodutor de conhecimentos científicos, mas também pode se configurar como um espaço de produção
de conhecimentos e práticas sociais que tem potencialidades sobre a transformação da realidade concreta.
É nessa premissa que se funda nossa crítica à consciência ingênua e a intencionalidade desumanizadora
da gestão pública e da academia que negam as possibilidades da escola e de seus sujeitos em construir um
corpo de conhecimento capaz de ampliar a qualidade social e técnica de suas ações. Essa preocupação
também nos induz à esperança libertadora, na medida em que une a linguagem da crítica à linguagem da
possibilidade (GIROUX, 1997). Pois, é na problematização do conhecimento histórico e ideologicamente
dado sobre a escola que é possível soerguer as necessidades objetivas da comunidade escolar local, o que
acaba por possibilitar o empoderamento do professorado (FREIRE, 2005).
Na medida em que se estabelece uma socialização dialógica e problematizadora sobre os contextos,
as práticas dos professores da RMEF, e as contradições em que estes estão imersos, produz-se um
conhecimento capaz de instaurar o enfrentamento dos limites e as potencialidades concretas de um ensino
comprometido com uma racionalidade emancipatória (SAUL, SILVA, 2009).
Para tanto, construímos um corpo de dados3 em conjunto com as dúvidas e as aflições dos
professores, que ao refletir sobre seu contexto nos revelaram seus encaminhamentos cotidianos. Ao
analisar e desvelar esse corpo de dados coletivamente e colaborativamente em um processo
problematizador sobre a realidade a qual vivenciam, intentamos junto aos professores um despertar da
3
Os dados aqui fazem referencia a análise da realidade cotidiana dos professores da RMEP e encontram-se na dissertação
apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação Cientifica e Tecnológica/UFSC. De forma geral, tais dados
versam sobre as relações de opressão e alienação postas sobre o professorado de ciências (ROCHA, 2013).
96
curiosidade epistemológica, ou seja, uma permanente busca pela autonomia. Logo, é necessário
oportunizar a reflexão crítica e problematizadora dos próprios sujeitos, levando-os a um distanciamento
crítico de sua prática, para assim permitir que avaliem quais seriam os limites e possibilidades de sua
ação na transformação da realidade escolar local. É nesse pressuposto que se funda a proposição deste
trabalho, no sentido em que busco uma proposta de formação, que leve em consideração tais profissionais
como co-sujeitos do processo de emancipação através de sua prática social educativa.
―É preciso superar a visão, historicamente dominante, do professor como mero técnico‖
(ZEICHENER, 2000, p.11) alcançando a compreensão de um intelectual (GIROUX, 1997) enquanto
sujeito de sua práxis político-pedagógica. Contudo, para alcançar este objetivo, o professorado necessita,
para além da reprodução de livros didáticos, construir sua prática no contato autêntico e coletivo com a
sala de aula, estabelecendo uma amalgama crítica entre teoria e prática pedagógica. Uma teoria
construída sobre a prática, mas que não se finda nela mesma, que busca na avaliação das ações à reflexão
crítica capaz de destacar os limites teóricos necessários a sua superação, promovendo um ensino ético
indissociável ao estudo rigoroso e autêntico das expressões postas pela vida humana. Desta forma, o
professorado pode constituir sua docência inserida ao movimento de sua formação permanente (FREIRE,
2005). O termo permanente aqui não faz referência apenas ao processo de aprendizagem do ofício dos
professores em sua vida profissional, mas a uma concepção de sujeito comprometido com a constante
busca reflexiva de sua humanização. Caracteriza-se na busca pelo desenvolvimento dialético da sua ação
social concomitantemente a (re)construção criativa e rigorosa da consciência que este tem sobre a mesma,
possibilitando o seu ser mais4. Desta forma, somente nesse processo de busca reflexiva e crítica sobre as
relações pedagógicas entre teoria e prática no e com o mundo é que pode se fundar a formação
permanente dos sujeitos professores em direção à conscientização e a apropriação de sua história
(FREIRE, 2005; 2007; 2008; 2011; RIGOLON, 2008; GIROUX, 1997).
A formação permanente das educadoras, que implica a reflexão crítica sobre a prática,
se funda exatamente nesta dialeticidade entre prática e teoria. Os grupos de formação,
em que essa prática de mergulhar na prática para, nela, iluminar o que nela se dá e o
processo em que se dá o que se dá, são, se bem realizados, a melhor maneira de viver
a formação permanente. O primeiro ponto a ser afirmado com relação aos grupos de
formação na perspectiva progressista em que me situo é que eles não produzem sem a
necessária existência de uma liderança democrática, alerta, curiosa, humilde e
cientificamente competente. Sem essas qualidades os grupos de formação não se
realizam como verdadeiros contextos teóricos. [...] Um segundo aspecto que tem que
ver com a operação dos grupos é o que se pretende ao conhecimento que os grupos
devem ter de si mesmos. É o problema de sua identidade, sem o que dificilmente se
constituem solidariamente. E, se não conseguem ao longo de sua experiência, não lhes
é possível saber com clareza o que querem, como caminhar para tratar o que querem,
que implica saber para quê, contra que, a favor de que, de quem se engajam na
melhora de seu próprio saber. [...] À medida que marchamos no contexto teórico dos
grupos de formação, na iluminação da prática e na descoberta dos equívocos e erros,
vamos também, necessariamente ampliando o horizonte do conhecimento científico
sem o qual não nos ―armamos‖ para superar os equívocos cometidos e percebidos.
Este necessário alargamento de horizontes que nasce da tentativa de resposta à
necessidade primeira que nos faz refletir sobre a prática tende a aumentar seu
espectro. O esclarecimento de um ponto aqui desnuda outro ali que precisa
igualmente ser desvelado. Esta é a dinâmica do processo de pensar a prática. É por
isso que pensar a prática ensina a pensar melhor da mesma forma como ensina a
praticar melhor. (FREIRE, 1997, p.75)
4
Movimento de busca permanente do indivíduo em comunhão social, ética, política e cultural pelo se fazer sujeito na
transformação coletiva de sua realidade objetiva (FREIRE, 2005; 2007)
97
É nesse sentido que concordamos com Freire (2005) e Giroux (1997) ao apontar como caminho a
emancipação à necessidade de os professores assumirem a responsabilidade ativa pelo levantamento de
quais metas deveriam lutar. Logo, não podem somente criticar o que está posto, mas levantar das
contradições vividas novas possibilidades de ação como intelectuais crítico-transformadores que são
(GIROUX, 1997). Ao conceber os professores como intelectuais podemos elucidar a importante ideia de
que toda atividade humana envolve alguma forma de pensamento. Nenhuma atividade, independente do
quão rotineira possa ser, é abstraída do funcionamento da mente em algum nível. Este ponto é crucial,
pois ao argumentarmos que o uso da mente é uma parte geral de toda atividade humana, nós dignificamos
a capacidade humana de integrar o pensamento e a prática, e assim destacamos a essência do que
significa encarar o professorado como profissionais reflexivos. É necessário explorar momentos de
formação que, ―[...] favoreçam processos coletivos de intervenção reflexiva da prática pedagógica,
capazes de identificar os problemas para resolvê-los, incentivar a sistematização e socialização das
práticas docentes [...]‖ (ROSA-SILVA; LORENCINI JUNIOR, 2007, p.2). Deve-se superar o atual
ensino de ciências e biologia, que por uma demanda do mercado e em decorrência de um currículo dos
anos de 1960, ainda ―limita-se a apresentar a ciência completamente desvinculada de sua aplicação e
das relações que tem com o dia-a-dia do estudante, amplamente determinado e dependente da
tecnologia.‖ (KRASILCHIK, 2008, p. 185). Tomando todo este contexto, faz-se necessária a proposição
de um curso de formação junto aos professores da RMEF, que busque uma oportunidade de reflexão
crítica sobre a prática e a teoria que incidem sobre a docência.
A formação crítico-reflexiva deve se distanciar das atuais propostas de formação contínua da que
geralmente fazem uso de práticas transmissivas, conteudistas e não comunicativas (ROCHA, 2013;
FREIRE, 2011), apartando a teoria da prática. Nessa formação burocratizada intenta-se a implementação
de metodologias e projetos estatais de formação, originadas externamente ao contexto escolar, estando
muito mais comprometidas com um conservadorismo tecnocrático do que emancipador. É nesse sentido
que essa proposta de formação deve ter como pressuposto o diálogo crítico-colaborativo e reflexivo, que
rompe com o modelo tradicional de formação. Entretanto, o que se entende por reflexividade?
Não faz sentido identificar se os professores são ou não reflexivos, mas constatar como está se dando
esse processo de reflexão e sobre o que estão refletindo, pois ―Há uma diferença qualitativa entre refletir
sobre racismo, amendoim ou queijo, [...] Tentamos ampliar o conceito de ensino reflexivo, de modo que
os professores pensem sobre isso e vejam quais são as alternativas.‖ (ZEICHENER, 2000, p.12). É com
essa perspectiva que partimos da problematização das inquietações docentes fortemente vinculadas às
suas práticas cotidianas no ensino de zoologia, este altamente técnico, em direção a uma reflexividade
cada vez mais crítica (VAN MANEM, 1977). Portanto, evitamos começar uma formação introduzindo
textos para que o professores, enquanto consumidores os leiam. Embora os materiais textuais sejam um
importante instrumento de contato do professor com as teorias educacionais, apresentá-los desnudos de
vivências e práticas, acabam por não ter significação. Nessa lógica, temos como premissa que, ―A leitura
crítica dos textos e do mundo tem que ver com a [...] mudança em processo.‖ (FREIRE, 2001, p.267). O
ponto de partida e de chegada é a prática docente, entretanto, esta proposta de formação não pode ter a
pretensão de trazer respostas e receitas prontas aos problemas dos professores, como se fossem
unicamente de cunho metodológicos e didáticos. É necessária uma construção analítica coletiva orientada
à emancipação. Logo, as discussões teórico práticas devem emergir do contexto escolar e de seu entorno,
possibilitando questionamentos e posicionamentos ativos perante aos problemas docentes (PIMENTA,
2005; SILVA; SAUL, 2009). A discussão deve minimamente motivar questionamentos perante o ―Para
98
que‖ se faz o ensino de zoologia na escola, ―Por que‖ se faz assim, ―Para quem‖ é essa prática, ―O que‖
se ensina de significativo na área e ―Como‖ fazer diferente para sanar as problemáticas identificadas no
processo de investigação coletiva. Assim, inspirado no processo de codificação e de descodificação da
abordagem temática freireana (FREIRE, 2005; FREIRE; SHOR, 2011), busca-se dialética e
dialogicamente desvelar as situações de fatalismo que esses professores vivenciam para o enfrentamento
da racionalidade técnica em direção à racionalidade emancipatória (SAUL; SILVA, 2009).
Assim, ―[...] as consciências, co-intencionadas à codificação desafiadora, re-fazem seu poder
reflexivo na ―ad-miração‖ da ―ad-miração‖, que vai-se tornando de uma forma de ―re-ad-miração‖.
(FREIRE, 2011, p.127). Desta forma, a proposta de formação crítico-reflexiva é subdividida quatro
movimentos propostos por Smith (1992), baseados na descodificação em Freire (2005). São eles:
Informar; Descrever; Confrontar e Reconstruir. Cada encontro é dedicado a uma situação fatalista
específica, reconhecida pelo grupo a partir da problematização. É importante dizer que nessa
problematização optamos em utilizar as falas significativas 5 coletadas da realidade cotidiana de
professores de ciências da RMEF em atuação, e que representam limites de reflexão sobre a docência.
O processo formativo se inicia com um informar sobre o cotidiano no ensino de Zoologia, suas
intencionalidades e seu currículo oculto (GIROUX, 1997) descrevendo suas problemáticas e
contradições, intentando desvelar a totalidade à que está submetida à ação do professor de ciências. Parte-
se do ensino de zoologia e intenta-se chegar ao enfrentamento da situação de opressão docente
culminando na análise de seus processos de alienação, para a autonomia docente sobre sua práxis político
pedagógica. Assim, buscamos problematizar efetivamente quem determina a prática docente.
Tendo definido coletiva e colaborativamente essa premissa, podemos de fato pensar em uma
reconstrução dos direcionamentos a ação docente no ensino de ciências e zoologia. Logo, concordo com
Freire ao determinar que,
É preciso gritar alto que, ao lado de sua atuação no sindicato, formação científica das
professoras iluminada por sua clareza política, sua capacidade, seu gosto de saber
mais, sua curiosidade sempre desperta, são os melhores instrumentos políticos na
defesa de seus interesses e de seus direitos. Entre eles, por exemplo, o de recusar o
papel de puras seguidoras dóceis dos pacotes que sabichões e sabichonas produzem
em seus gabinetes numa demonstração inequívoca, primeiro de seu autoritarismo;
segundo, como alongamento do autoritarismo, de sua absoluta descrença na
possibilidade que têm as professoras de saber e de criar. E o curioso nisso tudo é que,
às vezes, os sabichões e as sabichonas que elaboram com pormenores seus pacotes
chegam a explicitar, mas quase sempre deixam implícito em seu discurso, que um dos
objetivos precípuos dos pacotes, que não chamam assim, é possibilitar uma prática
docente que forje mentes críticas, audazes e criadoras. E a extravagância de uma tal
expectativa está exatamente na contradição chocante entre o comportamento
apassivado da professora, escrava do pacote, domesticada a seus guias, limitada na
aventura de criar, contida em sua autonomia e na autonomia de sua escola e o que se
espera da prática dos pacotes: crianças livres, críticas, criadoras (FREIRE, 1997,
p.12).
Pensamos que ao delinear essa possibilidade formativa junto aos professores de ciências da RMEF,
podemos contribuir para ampliar as discussões a respeito da escola não somente como espaço de ação
pedagógica, mas também como espaço promotor de conhecimentos rigorosos e criativos essenciais a
transformação social da realidade orientada à emancipação da comunidade escolar e de seu entorno.
5
O critério de seleção para a escolha das falas significativas a ser problematizadas durante o curso foi sua relação com os
elementos específicos da racionalidade técnica que culminavam em representações fatalistas. Situações vistas aqui como
fonte de questionamentos capazes de levar à superação coletiva e propositiva sobre a prática docente.
99
Referências Bibliográficas
100
SANTOS. C. M. D. Os dinossauros de Hennig: sobre a importância do monofiletismo para a sistemática
biológica. Scientia e studia. São Paulo. v. 6. n. 2. p. 179-200. 2008.
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práticas contextualizadas. 2004. Tese (Doutorado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica
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SMYTH, J. Teacher‘s work and the politics of reflection. In: American Educational Research Journal.
Vol. 50. nr.3. 1992. p.254-262.
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ZEICHENER, K. Formação de professores: contato direto com a realidade da escola. Entrevista, jul./ago.,
v.6, n.34, Presença Pedagógica, 2000.
101
102
O DESENVOLVIMENTO DO PROFESSOR NO CONTEXTO DA FORMAÇÃO CONTINUADA DA
LÍNGUA PORTUGUESA NO ENSINO BÁSICO (1° E 2° CICLOS)
Introdução
103
Objetivo do Estudo
Orientou a elaboração deste trabalho acadêmico um objetivo de caráter geral: analisar os problemas
enfrentados pelos professores no ensino da língua portuguesa no 3o, 4o, 5o e 6oanos (1o e 2o ciclos) e
gestores do Ensino Básico da Escola Básica Filial 12 de Outubro - Díli, e identificar como os programas
de formação continuada podem contribuir na superação destes.
Esse objetivo geral desdobrou-se em três objetivos específicos: 1) identificar as dificuldades
enfrentadas pelos professores e gestores no processo de ensino e aprendizagem de língua portuguesa no
3o, 4o, 5o e 6oanos (1o e 2o ciclos) do Ensino Básico da Escola Básica Filial 12 de Outubro - Díli; 2)
analisar as dificuldades dos alunos no processo de aprendizagem da língua portuguesa no 3 o, 4o, 5o e
6oanos (1o e 2o ciclos) do Ensino Básico da Escola Básica Filial 12 de Outubro - Díli; e 3) avaliar se a
formação continuada auxilia os professores a resolver estes problemas.
Metodologia de Investigação
Essa pesquisa investiga as dificuldades enfrentadas pelos professores e alunos no processo de ensino
e aprendizagem de língua portuguesa do 3o, 4o, 5o e 6o anos do Ensino Básico da Escola Básica Filial 12
de Outubro - Díli, bem como refletir se a formação continuada que auxilia os professores a resolver estes
problemas. Esta escola, localiza-se no subdistrito Don-Aleixo e distrito de Dili. Neste suco a população é
proveniente de diferentes distritos.
As opiniões e representações em causa foram geradas a partir da aplicação de entrevistas aos
professores de língua portuguesa do 3o, 4o, 5o e 6o anos, coordenador da Escola e os alunos 5o e 6o anos da
Escola Básica Filial 12 de Outubro - Díli.
No desenvolvimento do estudo, dados produzidos a partir de entrevistas serão apresentados. A
unidade do estudo será assegurada pela consideração da formação dos professores enquanto fenômeno
social, dotado de uma significação específica.
A entrevista é uma maneira de recolher dados através do contato direto entre o entrevistador e o
entrevistado numa situação de comunicação e interação, existido efetivamente uma interação direta entre
o investigador e o investigado. Os entrevistados foram selecionados a partir de informações-chaves, como
referem Goetz e LeCompte (1988: 218), ou seja, a sua seleção residiu no fato de estes poderem prestar
informações válidas, não desconsiderando o fato de qualquer opinião é dada de acordo com a própria
interpretação de cada indivíduo. O guião de entrevista para professores da disciplina de língua portuguesa
é constituído por dez perguntas; o guião para o coordenador da escola, sete perguntas; e o dos alunos por
quatro perguntas. Tais entrevistas pretendem perceber as formações dadas na disciplina de língua
portuguesa durante o processo do ensino de aprendizagem na sala de aula. Foram aplicadas entrevistas ao
coordenador da escola, quatro professores de língua portuguesa e três alunos da Escola Básica Filial 12 de
Outubro – Díli durante o primeiro semestre do ano letivo de 2015. No total foram realizadas oito
entrevistas, tendo sido atribuído a todas um código em função da ordem cronológica com que se realizam,
a saber: E01, E02, E03, E04, e assim sucessivamente; a qual permite identificar cada entrevista com
maior rapidez, estando a esse número associado o entrevistado, a data da entrevista e o horário.
104
Tabela 1. Mapa das entrevistas realizadas (Fonte: Original elaborado pelos autores)
Código Data e hora Entrevistado
E01 27-01-2015 -10H00/10H30 Professor da Língua Portuguesa no3oano.
E02 27-01-2015-11H00/11H30 Professor da Língua Portuguesa no 4oano.
E03 27-01-2015-13H00/13H30 Professor da Língua Portuguesa no 5oano.
E04 27-01-2015-14H00/14H30 Professor da Língua Portuguesa no 6oano.
E06 28-01-2015-13H00/13H30 Aluno 5oano
E07 28-01-2015-14H00/14H30 Aluno 6oano
E08 28-01-2015-15H00/15H30 Aluno 6oano
E05 29-01-2015-10H00/10H30 Coordenador da Escola
População e Amostra
Fazem parte da amostra dessa investigação: quatro professores de língua portuguesa que ministram
aulas do 3o ao 6o anos do Ensino Básico; três alunos representantes dos alunos do 5 o e 6o anos; e o
coordenador da Escola Básica Filial 12 de Outubro - Díli. No total compuseram a amostra desse estudo
oito sujeitos.
105
Análise das Concepções dos E01, E02, E03 e E04
E01
O entrevistado 01 é do sexo masculino, tem 55 anos de idade, possui formação pela Sekolah
Pendidikan Guru (SPG) obtida ainda no tempo da ocupação indonésia. Trabalha na Escola Básica Filial
12 de Outubro – Díli com a docência de língua portuguesa para uma turma de 3º ano do Ensino Básico
que conta com 60 alunos.
Sobre os métodos e estratégias que o professor utiliza no processo ensino e aprendizagem da língua
portuguesa com sua turma, o E01 afirmou que baseando-se na implementação o currículo novo, o
processo de ensino e aprendizagem está centrado no aluno e, por isso, métodos flexível.
A respeito das dificuldades enfrentadas pelo professor no ensino da língua portuguesa em sua turma,
o docente afirmou que ele enfrenta dificuldades relacionadas ao número de alunos por turma do Ensino
Básico, em torno de 50 a 60 alunos.
Relacionado sobre as dificuldades enfrentadas pelos alunos no processo de aprendizagem da língua
portuguesa o E01 afirma que o principal desafio que enfrenta é relacionado à compreensão dos alunos em
língua portuguesa que, na sua opinião, ainda é mínima. Para que os alunos possam melhorar o domínio
dessa língua, esse docente exige sempre que os alunos falem em língua portuguesa na sala de aula. O E01
afirma que avalia as aprendizagens dos alunos a partir de um processo de avaliação somativa e formativa.
Relativamente à formação continuada dos professores da língua portuguesa, o E01 afirmou que, em
sua escola, ainda não houve formação específica dessa área. Portanto, quando questionado sobre as
últimas atividades de formação continuada dos professores da língua portuguesa e o conteúdo destas, esse
professor considerou que não poderia responder a questão já que ainda não houve formação especializada
em língua portuguesa.
Quando questionado se a formação continuada dos professores poderia ajudar os professores a
resolver os problemas enfrentados em sala de aula, o docente considerou que não poderia dar essa
resposta porque ele nunca teve esse tipo de formação. O entrevistado destacou que é necessário haver
formações especializadas em cada área e assim capacitar os professores.
E02
O entrevistado E02 é do sexo masculino, tem 58 anos de idade, possui formação pelo PROFEP-
TIMOR obtida no período de independência de Timor-Leste. Trabalha na Escola Básica Filial 12 de
Outubro – Díli lecionando aulas de língua portuguesa para uma turma de 4º ano do Ensino Básico, com
62 alunos.
Sobre os métodos e estratégias utilizados no processo de ensino e aprendizagem da língua portuguesa
com sua turma, o E02 afirmou que o seu ensino é sempre centrado no aluno e que utiliza o método
flexível. Quanto às dificuldades enfrentadas pelo docente no ensino de língua portuguesa em sua turma, o
E02 afirmou que a maior dificuldade por ele enfrentada é a quantidade de 62 alunos em sala.
Relacionado às dificuldades enfrentadas pelos alunos no processo de aprendizagem da língua
portuguesa o entrevistado afirma que a compreensão dos alunos do português ainda é mínima. Para os
alunos melhorarem o domínio dessa língua, o professor afirmou que exige para que os alunos falem em
língua portuguesa na sala de aula. O entrevistado ainda informou que realiza a avaliação somativa e a
avaliação formativa.
Relativamente à formação continuada dos professores da língua portuguesa, o E02 afirmou que, em
sua escola, ainda não houve formação específica dessa área. Portanto, quando questionado sobre as
últimas atividades de formação continuada dos professores da língua portuguesa e o conteúdo destas, esse
professor considerou que não poderia responder já que ainda não houve formação especializada nessa
área.
106
Quando questionado se a formação continuada dos professores poderia ajudar os professores a
resolver os problemas enfrentados por ele em sala de aula, esse docente também considerou que não
poderia dar essa resposta porque ele nunca teve esse tipo de formação. O E02 também destacou que é
necessário haver formações especializadas em cada área e assim capacitar os professores.
E03
O entrevistado E03 é do sexo masculino, tem 50 anos de idade, possui formação Bacharelato em
Educação obtido no período de independência de Timor-Leste. Trabalha na Escola Básica Filial 12 de
Outubro – Díli dando aulas de língua portuguesa para uma turma de 5 o ano do Ensino Básico que conta
com 55 Alunos. Relativamente sobre os métodos e estratégia que o professor utiliza no processo ensino e
aprendizagem da língua portuguesa com sua turma, o E03 afirmou que utiliza o método flexível e que o
seu ensino está sempre centrado no aluno. Explica que esse método pode ser o de perguntas e respostas e
também o método expositivo: o professor escreve no quadro e explica. De acordo com o docente, é isso
que se aplica na sua escola.
Sobre as dificuldades enfrentadas pelo professor no ensino de língua portuguesa em sua turma, o
entrevistado também afirma que o excesso de alunos dificulta o ensino para os professores na sala de
aula. Em relação às dificuldades enfrentadas pelos alunos no processo de aprendizagem da língua
portuguesa o E03também diz que a compreensão dos alunos da língua portuguesa ainda é mínima. Para
os alunos melhorarem o domínio do português, esse professor diz que, no seu ponto de vista, o docente
tem de explicar claramente em língua portuguesa aos alunos em sala de aula. Se o professor fala ou
explica em português, os alunos também podem compreender.
Sobre a avaliação do processo de ensino aprendizagem desenvolvido junto aos alunos o E03 afirmou
que na sua turma ele faz avaliação somativa, e também avalia a participação dos alunos na sala de aula e
o aproveitamento dos mesmos. Relativamente à formação continuada oferecida aos professores da língua
portuguesa, o docente afirmou que ainda não há cursos específicos dessa área, mas que já participou de
outros cursos (de ética dos professores e metodologia). O entrevistado sugeriu que os líderes e
intelectuais de Timor-Leste devem promover mais formações especializadas em cada área, assim os
professores poderão ensinar com boa qualidade e para futuro da nação.
E04
O entrevistado E04 é do sexo masculino, tem 65 anos de idade, possui Bacharelato em Educação
obtido no período da independência de Timor-Leste. Trabalha na escola como professor de língua
portuguesa de turma de 6o ano, do Ensino Básico, com 55 alunos. O entrevistado afirmou que costuma
utilizar o método de autonomia, isto é, flexível, porque o ensino aprendizagem é sempre centrado no
aluno. Em relação às dificuldades enfrentadas no ensino da língua portuguesa em sua turma, o professor
afirmou que a maior dificuldade que encontra é o número elevado de alunos em cada turma, porque em
médio são 45 a 60 alunos em cada turma.
Relacionado às dificuldades enfrentadas pelos alunos no processo de ensino aprendizagem da língua
portuguesa, o E04 afirma que a principal dificuldade dos alunos no 6 o ano é que do 1o até 5o ano do
Ensino Básico não são habituados a falar a língua portuguesa durante as aulas, porque os professores
sempre utilizam a segunda língua nacional, a língua tétum, na introdução da matéria. Quando chegam ao
6o ano do Ensino Básico, a dificuldade é maior na compreensão da língua portuguesa. Para os alunos
melhorarem o domínio da língua portuguesa o professor acredita que deve habituar a comunicar-se com
os seus alunos na língua portuguesa. Também considera importante diminuir o número de alunos e sugere
a quantidade de 35 a 40 alunos para cada turma.
Sobre o processo de avaliação, o docente afirma que utiliza avaliação somativa e avaliação formativa
e sempre busca a colaboração dos outros professores da escola. Em relação à formação continuada, o E04
afirmou que ainda não houve formação específica para os professores melhorarem o seu trabalho no
107
ensino da língua portuguesa. As primeiras formações tinham como objetivo a reintegração no regime de
carreiras. Nas formações seguintes foram privilegiados os métodos pedagógicos do ensino.
Sobre como a formação continuada dos professores para resolver os problemas enfrentados na sala
de aula, o entrevistado afirmou que é necessário haver sempre formação, principalmente nas áreas
específicas (língua portuguesa, matemática e estudo do meio). Por último, o E04 sugere que para os
alunos melhorarem a sua aprendizagem da língua portuguesa, os professores devem comunicar-se em
língua portuguesa com seus alunos em sala de aula.
O entrevistado E05 é o coordenador da escola, que avalia o trabalho dos professores através do plano
diário e observe os materiais didáticos que serão usados para conhecer melhor metodologia que é
utilizada pelo professor. Com relação às dificuldades que os professores enfrentam no processo do ensino
da língua portuguesa, o coordenador apresentou diferentes dificuldades como falta de materiais didáticos,
de biblioteca e de livros produzidos pelo Ministério.
Considera como desvantagem enfrentada pelos docentes o fato de os alunos serem plurilíngues o que
torna difícil de produzir alguns palavras corretas. Como vantagem, o E05 acha que os alunos
compreenderam bem a língua na parte escrita e nos conhecimentos explícitos. Para melhorar as
competências dos professores no ensino da língua portuguesa o E05 afirmou que, na sua opinião, os
professores precisariam melhorar o método de ensino para atrair os alunos no processo letivo, quanto aos
docentes, seria necessário e motivar a participação em diferentes formações para obterem qualidade do
ensino na escola.
Questionado se a Escola Básica Filial 12 de Outubro - Díli promove algum tipo de formação
continuada aos professores da língua portuguesa, o E05 afirmou que no ano 2012 até 2014 todos os
professores frequentaram o curso sobre o processo de aprendizagem. Ele ainda afirmou que nesta escola
não há atividade, mas que todos os professores participam na atividade de formação no Centro de Ensino
Básico. O entrevistado ainda informou que as últimas formações que os professores frequentaram foi o
Bacharelato no final do ano 2014.
E06
O entrevistado E06 é do sexo feminino, tem 10 anos de idade, estuda na Escola Básica Filial 12 de
Outubro - Díli no 5o ano do Ensino Básico. Em relação às aulas de língua portuguesa, o E06 disse que, na
sua escola, do 1o até 6o ano, os professores utilizam nas suas aulas a língua portuguesa e a língua tétum.
Questionado se acha fácil aprender a comunicar em língua portuguesa, esse aluno disse que acha fácil a
comunicação e compreensão, mas era difícil a conversação com os seus amigos. Sobre as dificuldades
enfrentadas pelos alunos na aprendizagem da língua portuguesa, o E06 disse que a principal delas é a
falta de dicionários.
E07
O entrevistado E07 é do sexo feminino, tem 11 anos de idade, estuda na Escola Básica Filial 12 de
Outubro – Díli no 6o ano do Ensino Básico. Esse aluno disse que tem aulas de língua portuguesa duas
vezes por semanas. Afirmou que o professor utiliza a língua portuguesa na sala de aula. O E07 diz que
acha fácil aprender e se comunicar em português. Sobre as dificuldades que os alunos enfrentam para
aprender e usar a língua portuguesa, esse entrevistado afirmou que as dificuldades consistem na
pronúncia dos verbos e na compreensão dos regras gramaticas, etc.
108
E08
O entrevistado E08 é do sexo feminino, tem 11 anos de idade, estuda na Escola Básica Filial 12 de
Outubro – Díli no 6o ano do Ensino Básico. Com relação às aulas de língua portuguesa, ela afirmou que o
professor fala em que português e os alunos também. Se os alunos têm dificuldades, os professores
traduzem para tétum. O E08 disse que acha fácil aprender e se comunicar com a língua portuguesa. Sobre
as dificuldades que os alunos enfrentam para aprender e usar essa língua, o entrevistado afirmou que
também tem dificuldade de colocar os verbos no tempo correto.
Os docentes, quando questionados sobre as suas dificuldades no ensino da língua portuguesa em sua
turma, todos os professores E01, E02, E03 e E04 dificulta o aprendizado afirmam que ―o número elevado
de alunos em suas turmas (de 45 a 60 alunos)‖.O E05, ainda aponta outras dificuldades enfrentadas pelos
professores: ―a falta de materiais didáticos, de biblioteca e de livros produzidos pelo Ministério‖.
Os entrevistados E01, E02 e E03 afirmam que ―o principal desafio que enfrentam em sala de aula
está relacionado à compreensão dos alunos em língua portuguesa que, em suas opiniões, ainda é mínima‖.
Para os entrevistados E01 e E02, declaram que ―para resolver esse problema seria exigir aos alunos
falarem em língua portuguesa em sala de aula‖. Do ponto de vista do E03, ―o professor tem que explicar
de forma clara para os alunos em sala de aula utilizando a língua portuguesa‖. Para ele, ―se o professor
fala ou explica em português, os alunos também podem compreender‖. O E04 também destaca a
―importância dos professores se comunicarem com os alunos em língua portuguesa durante suas aula,
(…) os professores do Ensino Básico não são habituados a falar a língua portuguesa durante as aulas, mas
sim utilizam a língua tétum‖.
A opinião do entrevistado E05, é diferente da opinião dos entrevistados E01, E02 e E03. Para ele os
―alunos compreendem bem a língua na parte escrita‖. A opinião dos alunos também é diferente da
opinião de seus professores. Sobre as dificuldades que eles enfrentam para aprender e usar essa língua, os
alunos acham ―fácil aprender, compreender e comunicar-se na língua portuguesa‖. O entrevistado E06 diz
que ―acha difícil conversar com seus amigos em português‖. Os entrevistados E06 e E07 afirmam que
―têm dificuldades de utilizar os verbos no tempo correto, além das regras gramaticais e a ausência de
dicionários para consulta pelos alunos‖. Os E06 e E07 também declaram que ―seus professores se
comunicam em tétum e em português em sala de aula‖.
Na parte de formação, todos os entrevistados E01, E02, E03 e E04 afirmaram que ―ainda não
receberam formação específica da área de língua portuguesa‖. No entanto, todos acham necessário ―haver
formações específicas em cada área para assim poder capacitarem-se‖. O E05 confirmou que ―nesta
escola não houve atividades de formação específica para os professores de Língua Portuguesa‖. O E05
acrescenta que ―é importante motivar os professores a participarem de diferentes formações para obterem
qualidade do ensino na escola e precisam melhorar o método de ensino para atrair os alunos no processo
letivo‖.
Conclusões
Baseado na análise dos resultados apresentados no Capítulo 4, concluímos que o grande número de
alunos em sala de aula representa dificuldades aos professores para desenvolver o processo de ensino e
aprendizagem da língua portuguesa. Alguns professores acham que os alunos compreendem muito pouco
essa língua, mas os alunos acham que é fácil aprender e se comunicar em português. Na opinião do
coordenador, a compreensão dos alunos na parte escrita é boa. Os professores E03 e E04 chamam a
109
atenção para o fato de que os professores deveriam falar mais português em sala de aula, para assim os
alunos compreenderem bem a parte oral.
Também concluímos que não existe formação específica de língua portuguesa para os professores do
Ensino Básico. Se tivesse formação na área, talvez os professores utilizariam mais o português em sala de
aula e melhorariam os métodos de ensino para motivar os alunos para a aprendizagem dessa língua.
Por outra parte, a formação continuada de professores, específica da língua portuguesa, seria
importante para: (a) aprofundar os conhecimentos dos conteúdos a serem ensinados; (b) desenvolver a
capacidade dos professores para usar a língua portuguesa na vida quotidiana; (c) aprender novos métodos
para o ensino da língua e assim motivar os alunos para melhorar seus conhecimentos do português e
assim elevar a qualidade do ensino.
Implicações
O Ministério da Educação deve desenvolver formação contínua específica de língua portuguesa para
os professores do Ensino Básico e, assim, garantir que os professores e os educadores apoiem os
estudantes no aprendizado do português, importante para prepararem-se para o futuro. Também é
necessário que o Ministério da Educação forneça os materiais necessários para as escolas implementarem
as atividades de ensino e aprendizagem da língua portuguesa (dicionários, materiais didáticos, biblioteca
e livros).
A construção da nossa identidade é que poderá garantir aos nossos professores as competências e
esforço intelectual. Os professores utilizam os materiais simples para ensinar os alunos na escola para
desenvolver a qualidades e a credibilidade ao estudante para o futuro. Que os professores podem
assegurar através de todos os materiais e da qualidade do ensino em todas as áreas e em todos níveis.
Sugestões
Através dos resultados dessa investigação direta feita sobre o processo de ensino e aprendizagem da
língua portuguesa no 1o e 2o ciclos do Ensino Básico e a formação continuada dos professores, aponta-se
as sugestões : a) é necessário que o Ministério da Educação e as escolas promovam ações de formação
continuada para aumentar a qualidade de cada professor na área do saber disciplinar, do saber
pedagógico-didático e da língua portuguesa em geral.; b) é necessário estruturar as atividades de
formação continuada de forma que os professores sejam mais implicados nelas e, sobretudo, passem a ser
mais envolvidos em um trabalho conjunto; c) o Ministério da Educação deveria criar condições
favoráveis para os professores trabalharem com recursos didáticos adequados para garantir o ensino com
qualidade; e d) o Ministério da Educação deve capacitar e incentivar os professores a falar sempre em
língua portuguesa e tétum ao longo do processo de ensino aprendizagem.
Referências Bibliográficas
110
FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA LÍNGUA PORTUGUESA
NO POSTO ADMINISTRATIVO DE METINARO
Januário da Costa
Manuel Belo de Carvalho
Raquel Antunes Scartezini
Introdução
Em Metinaro existem cinco escolas de 1o e 2o ciclos do Ensino Básico, as quais serviram de campo
para essa investigação. Este estudo analisa as concepções de um conjunto alargado de sujeitos que
participam de duas dessas escolas, incluindo os professores de Língua Portuguesa do 2 o ciclo do Ensino
Básico, coordenadores de ambas escolas e o Inspetor Geral de Metinaro e Hera.
111
População e amostra
No caso dessa investigação, a população são os profissionais das cinco escolas de Ensino Básico,
contando com um coordenador cada, e trinta e sete professores ao todo.
Foi selecionada uma amostra por conveniência da população de estudo. Adotou-se como critério a
disponibilidade da equipe de cada escola em participar da investigação. Foi destacada uma amostra de
onze sujeitos de duas das cinco escolas existentes no posto administrativo de Metinaro. Fazem parte dessa
amostra, além dos professores e coordenadores das duas escolas, o Inspetor Geral de Metinaro e Hera.
Instrumentos
A presente investigação foi orientada pela abordagem metodológica qualitativa. A partir da aplicação
de questionários e entrevistas buscou-se conhecer as opiniões e representações dos professores de Língua
Portuguesa do 2º ciclo do Ensino Básico das escolas A e B, dos coordenadores de ambas escolas e do
Inspetor Geral de Metinaro e Hera.
Entrevistas e questionário
A entrevista dirigida os coordenadores buscava conhecer suas opiniões sobre (a) como os professores
de Língua Portuguesa do 2º ciclo do Ensino Básico podem melhorar suas competências profissionais; (b)
as dificuldades enfrentadas por esses professores no ensino dessa língua; (c) os fatores que influenciam as
dificuldades dos professores no ensino aprendizagem da Língua Portuguesa; (d) as mudanças que devem
ser introduzidas na formação de professores; (e) qual é a língua utilizada pelos professores para esclarecer
as dúvidas dos alunos durante o processo de ensino e aprendizagem; (f) o impacto das teorias
pedagógicas e metodológicas que os professores utilizam no processo de ensino e aprendizagem; (g) os
materiais que os professores utilizam para facilitar a aprendizagem dos alunos; (h) como os professores
utilizam os documentos oficiais (materiais escolares e guia do professor); bem como (i) o método que os
dirigentes utilizam para avaliar o trabalho dos professores.
112
A entrevista dirigida ao Inspetor Geral de Metinaro e Hera buscava conhecer sua opinião sobre (a) as
mudanças que devem ser introduzidas na formação de professores de Língua Portuguesa do 2 o ciclo do
Ensino Básico; (b) como o Ministério da Educação deve avaliar os trabalhos dos professores em
exercício; (c) as necessidades para a formação contínua de professores de Língua Portuguesa do Ensino
Básico; (d) as intervenções que o Ministério da Educação pode fazer para melhorar o nível de
qualificação dos professores em exercício; (e) os aspectos mais e menos positivos da atividade de
formação dos professores em exercício para o ensino da Língua Portuguesa; (f) as vantagens e
desvantagens das formações de professores a curto e longo prazo; (g) como os inspetores e diretores
municipais avaliam os trabalhos dos professores em exercício; (h) aspectos e critérios possíveis que
podem ser utilizados na avaliação do trabalho dos professores.
O questionário aplicado aos professores foi composto por três partes:
(1) a primeira delas composta por 17 itens que buscam esclarecimentos sobre a formação geral
dos professores de Língua Portuguesa do 2º ciclo do Ensino Básico;
(2) a segunda parte composta por 8 itens busca informações sobre a formação prática dos
professores de Língua Portuguesa do 2º ciclo do Ensino Básico;
(3) a terceira e última parte, com 9 itens, visa conhecer as atividades que os professores
desenvolvem em sala de aula com os alunos.
Os resultados apresentados nesta seção procedem dos dados coletados pelos questionários aplicados
aos professores de Língua Portuguesa do 2 o ciclo do Ensino Básico das Escolas A e B, assim como das
entrevistas realizadas com os coordenadores de ambas escolas e com o Inspetor Geral de Metinaro e
Hera. As informações obtidas a partir de cada instrumento de investigação utilizado são apresentadas a
seguir.
Os questionários aplicados aos professores foram constituídos por trinta e quatro (34) perguntas
divididas em três partes. Esse instrumento buscava conhecer aspectos: (a) da formação geral e (b)
formação pedagógica dos professores de Língua Portuguesa do 2 o ciclo do Ensino Básico, bem como (c)
a didática utilizada durante o processo do ensino de aprendizagem da Língua Portuguesa em sala de aula.
113
totalmente dessa afirmação. Por outro lado, todos os professores (100%) concordam que ainda necessitam
aprender a utilizar materiais didáticos na sala de aula. Os professores também concordam que o processo
ensino-aprendizagem em sala de aula exige uma habilidade profissional de saber-ensinar. A totalidade
dos professores afirma que durante suas formações aprenderam a utilizar vários métodos de ensino e a
cumprir o papel de motivador, facilitador, implementador e inovador na sala de aula.
Os docentes também são unânimes ao afirmar que, durantes suas formações, aprenderam um sistema
de avaliação em continuidade. Além disso, todos eles assinalaram que concordam totalmente com a
afirmação de que na escola os trabalhos devem ser avaliados a partir de critérios estabelecidos,
considerando que o processo avaliativo deve partir de objetivos estabelecidos previamente pelo professor.
Também são unânimes ao concordar que há necessidade de se trabalhar em parceria e colaboração com
os colegas e entendem que as atividades de ensino serão supervisionadas pelo coordenador da escola.
A partir desses dados, compreendemos que a formação inicial buscou capacitar os professores de
maneira a conhecer e aprofundar os conhecimentos das várias áreas disciplinares. No entanto, a maioria
dos professores acredita que ainda precisa aprender mais sobre os conteúdos de cada disciplina.
Todos os professores sabem que para promover o processo ensino-aprendizagem em sala de aula é
preciso, além do saber disciplinar, conhecimentos específicos didático metodológicos. Porém, os
professores relatam que durante suas formações enfrentaram dificuldades na aprendizagem de didática e
metodologias.
Os professores afirmam conhecer vários métodos de ensino. Consideram que sabem planejar suas
aulas; trabalhar com grupos; aplicar a avaliação contínua e que o processo avaliativo deve partir de
objetivos estabelecidos previamente pelo professor. No entanto, acham necessário alargar os seus
conhecimentos sobre a prática pedagógica e ter oportunidade para aprender a utilizar os diferentes
materiais didáticos em sala de aula. Provavelmente, eles sentem essa necessidade porque não passaram
pelo ensino superior na área especialidade da educação. Os professores estão conscientes de que devem
atuar como facilitadores e motivadores das aprendizagens dos alunos sempre buscando implementar
atividades inovadoras em suas aulas.
Os professores consideram que a formação prática pedagógica dos professores de Língua Portuguesa
sempre desenvolve bons profissionais, enquanto 12,5% considera que quase sempre. Eles consideram
que a formação prático-pedagógica dos professores dessa disciplina sempre procura transmitir os
documentos normativos (currículo, programa, guia do professor e manuais escolares) para desenvolver as
competências dos professores.
De acordo com os professores a formação prático-pedagógica de professores de Língua Portuguesa
sempre procura transmitir teorias e práticas aos professores de uma forma adequada. Segundo eles, a
formação prático-pedagógica de professores de Língua Portuguesa desenvolve as capacidades dos
formandos em teoria e prática, assim como ensina aos docentes a resolver as dificuldades dos alunos em
sala de aula e ainda ensina avaliar os trabalhos dos alunos de maneira individual e em grupos.
Os professores investigados consideram que os cursos de formação de professores são eficazes na
formação de aspectos práticos e metodológicos e que esses cursos ensinam tanto a teoria quanto a prática
do ensino de língua portuguesa, e também valorizam a participação ativa dos professores em formação.
Os docentes consideram ter conhecimento profundo sobre os documentos normativos do ensino da
Língua Portuguesa (currículo, programa, guia do professor e manuais escolares). Os professores avaliam
que conhecem a pedagogia do ensino da Língua Portuguesa de maneira a facilitar a aprendizagem dos
alunos, assim como dominam diferentes formas de avaliação dos seus conteúdos.
114
Resultado do questionário sobre as atividades de Língua Portuguesa desenvolvidas em sala de aula
pelos professores
Todos os professores afirmam que nas atividades de ensino e aprendizagem em sala de aula eles
utilizam os manuais e materiais didáticos em Língua Portuguesa; comunicam-se com os alunos nessa
língua; utilizam a metodologia ativa e comunicativa buscando vários métodos de forma a motivar e
encorajar os alunos a aprender melhor.
Quanto ao uso de materiais didáticos para facilitar a compreensão dos alunos em sala de aula, os
professores apresentam diferenças em suas práticas. Enquanto 50% afirma que não utiliza materiais
didáticos para facilitar a compreensão dos alunos, outros 50% afirmam que usam. Considera-se que nesse
item possa ter acontecido uma falha na compreensão dos professores que, talvez, não tenha observado a
palavra ―não‖ na afirmativa: ―Na minha atividade de ensinar não costumo utilizar materiais didáticos para
facilitar a compreensão dos alunos em sala de aula.‖
Os docentes ainda concordaram que em suas práticas precisam dominar a gestão da turma em sala de
aula. Também afirmam que realizam a avaliação a partir de critérios rigorosos sobre as competências dos
alunos oral e escrita.
115
Entrevista com Inspetor Geral de Metinaro e Hera
O Inspetor Geral de Metinaro e Hera também foi convidado a participar de uma entrevista
estruturada pelo investigador. Essa entrevista buscava saber a respeito de suas considerações sobre a
formação de professores de Língua Portuguesa do 2 o ciclo do Ensino Básico, assim como sobre as ações
do Ministério da Educação nesse campo.
O inspetor considera que os professores necessitam de formação contínua em distintas áreas de
desenvolvimento: linguístico, científico, social e pessoal. Na sua opinião, um dos desafios iniciais das
atividades de formação contínua de professores dessa área é os professores entenderem as explicações
orais dadas pelo formador em português, bem como compreenderem os textos escritos. Porém, em sua
opinião os docentes não têm tempo, facilidade e oportunidade para participar das atividades de formação
de professores.
Considera como um dos aspectos mais positivos no ensino da Língua Portuguesa nas escolas o uso
de manuais e materiais didáticos que facilitam aos alunos a aprendem a fazer perguntas em português nas
aulas. Como aspecto menos favorável considera que não há facilidade para ajudar no ensino de
aprendizagem na sala de aula. Em sua opinião, o Ministério da Educação pode melhorar o nível da
qualificação dos professores em exercício através de Habilitação Literária de nível inicial secundário,
diploma I, diploma II, licenciatura.
Conclusões
116
concluímos que as dificuldades enfrentadas pelos professores na formação demonstram o pouco
conhecimento da Língua Portuguesa pelos professores que deveriam utilizar essa língua para ensinar e
intervir diariamente na sala de aula, bem como a falta de metodologias adequadas para facilitar a
aprendizagem dessa língua pelos alunos.
Portanto, a formação contínua de professores de Língua Portuguesa do 2º ciclo do Ensino Básico de
Metinaro precisa incentivar o uso do português pelos professores para que eles possam ensinar aos alunos
na sala de aula com boa qualidade e criar alguns pensamentos novos sobre a maneira do ensinar. Para
isso, os professores ainda precisam aprender novas metodologias do ensino de Língua Portuguesa para
melhorar a qualidade do ensino dessa língua.
É necessário que as escolas promovam ações de formação contínua para elevar a qualidade de cada
professor na área do saber disciplinar e do saber pedagógico-didático da Língua Portuguesa. É necessário
estruturar atividades de formação contínua de forma que os professores sejam mais implicados e
sobretudo, passem a ser mais envolvidos em trabalho conjunto dos seus pares. O INFORDEPE (Instituto
Nacional de Formação de Docentes e Profissionais de Educação), por sua vez, deveria criar condições
favoráveis para os professores trabalharem com recursos didáticas adequados para garantir o ensino com
qualidades nos níveis da escolaridade de ensino básico.
Referências Bibliográficas
117
118
A UTILIZAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS NA DISCIPLINA DE ESTUDO DO MEIO DA
ESCOLA BÁSICA CENTRAL FAROL – DILI, TIMOR-LESTE
Introdução
1
Encontramos a utilização dos termos Colonização Portuguesa e Ocupação Indonésia na leitura dos seguintes trabalhos:
CAVR (2005) e ANDERSON (1993). Pudemos perceber que se trata de uma forma para diferenciar esses momentos, porém
ambos se referem a períodos de dominação estrangeira envoltos de opressão e violação dos direitos humanos.
2
Língua Indonésia.
3
Atualmente representa uma das línguas oficiais do país, juntamente com a Língua Portuguesa, entretanto é a língua mais
usada pela população timorense, tanto nos espaços públicos como nas esferas domesticas e tradicionais.
119
Antes da saída das tropas militares indonésias do país, ocorreu muita destruição às instituições de
ensino e aos materiais educativos. Os prédios foram derrubados, os materiais educativos rasgados e
ambos foram queimados. Os professores e técnicos de educação voltaram para a Indonésia, deixando
Timor-Leste sem recursos humanos e estruturais para desenvolver a educação no país.
Desde o referendo, o país passou por diversas mudanças, reformas e reestruturações no seu sistema
educacional. Entretanto, ainda enfrenta muitas dificuldades, algumas delas como a falta de estrutura,
materiais e recursos humanos para o desenvolvimento do trabalho na área da educação.
Considerando essa realidade, tentamos contribuir através de um recorte de pesquisa para uma análise
sobre o sistema educacional timorense. Dessa forma, este trabalho apresenta parte da pesquisa realizada
pela primeira autora para a conclusão do curso de licenciatura do Departamento de Formação de
Professores do Ensino Básico da Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL).
Este pretende compreender como ocorre a utilização de materiais didáticos no processo de ensino-
aprendizagem na disciplina de Estudo do Meio da Escola Básica Central Farol, localizada em Díli. Como
objetivos específicos, pretendemos: Identificar quais os materiais didáticos são utilizados por professores
da disciplina de Estudo do Meio; Compreender por que os professores utilizam diferentes materiais
didáticos ou não utilizam; e Identificar os problemas que se encontram no uso desses materiais durante o
processo de ensino-aprendizagem do Estudo do Meio.
Nosso trabalho tomou como principal referencia o pensamento freireano. Paulo Freire, educador e
filósofo brasileiro, nascido em 1921 em Reci
fe -PE, apresentou ao mundo ideias de ensino partindo da proposta da educação libertadora, isto é,
uma educação que tem como objetivo a emancipação de seus educandos, emancipação destinada
principalmente à população socialmente excluída e oprimida.
Em Timor-Leste, Paulo Freire influenciou o modelo pedagógico de alfabetização de massa
desenvolvido durante o período de resistência contra a Indonésia, o Modelo de Letramento da Pedagogia
Maubere, que levou em conta a importância do conhecimento tradicional popular e do contexto
timorense. Segundo Benedito da Silva (2012), além de alfabetizar, o objetivo era também ensinar às
pessoas sobre o nacionalismo e sobre a luta pela libertação nacional, com o objetivo de construir uma
sociedade mais humana. Com relação ao processo de ensino-aprendizagem, as proposições freireanas
afirmam que não existe ensino sem aprendizagem e que o ser humano aprende como um todo, isto é, seus
conhecimentos prévios, sentimentos, pensamentos e ações são importantes nesse processo. Educar
alguém é um processo dialógico, aberto, um intercâmbio constante, onde educador e educando trocam de
papéis o tempo inteiro. O educador necessita:
Saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a
sua própria produção ou a sua construção. Quando entro em uma sala de aula devo
estar sendo um ser aberto a indagação, à curiosidade, às perguntas dos alunos, a
suas inibições; um ser crítico e inquiridor, inquieto em face da tarefa que tenho – a
de ensinar e não a de transferir conhecimento (FREIRE, 2011, p.47).
Segundo Freire (1980), a aprendizagem deve ser entendida como um processo de construção do
conhecimento. Os professores precisam ser capazes de perceber em suas ações educativas a possibilidade
de intervir no mundo, de promover transformações e ser, junto com seus alunos, sujeitos da história e não
apenas objetos. Assim, educar é promover a capacidade de interpretar o mundo e agir para transformá-lo.
120
Em Timor-Leste, a educação libertadora é importante, pois se tratando de uma Nação em formação
e transformação, é fundamental seus cidadãos compreenderem as modificações em seu país. Dessa
forma, a prática pedagógica do professor é essencial para a formação de alunos que questionem e reflitam
sobre a sua realidade.
Durante a construção do conhecimento, é imprescindível que os professores iniciem os conteúdos
curriculares partindo sempre de temas relacionados ao contexto dos alunos e da compreensão inicial que
estes têm sobre o determinado conteúdo ou problema apresentado e, através da relação entre alunos e
professores, ir ampliando a compreensão dos alunos, construindo e reconstruindo novos conhecimentos.
Becker (2011), com base nos pensamentos freireanos, diz que é importante respeitar o contexto cultural
dos alunos, o local que os educandos vivem e o conhecimento que eles já possuem sobre o mundo, pois
aprender é um ato de conhecimento da realidade em que se vive.
Para Paulo Freire (1987), o conhecimento também é uma construção coletiva, feita com múltiplas
visões daqueles que o vivem, não pode ser construído por uns, e apenas transmitidos para os outros.
Freire considera ainda, que os conhecimentos prévios trazidos pelos alunos são vistos como elementos
norteadores para a interpretação de informações recebidas e também contribuem para selecionar e
organizar os diversos significados relacionados, que o aluno passa a estabelecer frente a um novo
conteúdo a ser apresentado.
A sala de aula é um espaço coletivo e de socialização, onde professores e alunos ampliam seus
significados sobre suas realidades no âmbito do processo de ensino-aprendizagem, fazendo diferença
significativa na construção e reconstrução do conhecimento científico. Para Freire (1980), portanto,
ensinar não é só transmitir ou transferir os conhecimentos para outra pessoa, mas ensinar é fazer pensar, é
estimular para a identificação e resolução de problemas, é ajudar a criar novos hábitos de pensamento e
ação.
Desse modo, o professor tem um papel relevante de levar o aluno a aprender. Aprender também é
adquirir o domínio do conteúdo ensinado, mas o professor tem que saber esses conteúdos. Segundo
Ferreira (2007), torna-se necessário para o aluno aprender novas experiências, compreender as coisas que
se veem, ouvem, sentem e fazem, observando e refletindo sobre a vida. A autora ainda diz que os
conceitos de ensino e aprendizagem não se separam. Isso significa que se há ensino deve haver
aprendizagem e cabe ao professor orientar o caminho dos alunos. Então, o professor precisa buscar a
interação entre os problemas, conhecimentos e experiências.
Passando a pensar o processo de ensino-aprendizagem na disciplina Estudo do Meio, encontramos no
Plano do Currículo Nacional para a Educação Primária de Timor-Leste (2003) que Estudo do Meio pode
ser estendido como um conjunto de elementos, fenômenos, acontecimentos, fatores e processos
relacionados à natureza, que ocorrem no meio ambiente envolvendo a vida e a ação das pessoas, ocorrem
no lugar e adquirirem significado. Assim, o conhecimento do Meio deverá partir da observação e análise
dos fenômenos, dos fatos e das situações que permitam uma melhor compreensão dos mesmos e
conduzam à intervenção crítica no Meio.
Ainda com base nesse documento, o Estudo do Meio assume um espaço importante para promover a
educação para a cidadania, visando o desenvolvimento da consciência cívica dos alunos como elemento
fundamental no processo de formação de cidadãos responsáveis, críticos, ativos e intervenientes. E leva
ao intercâmbio de experiências vividas pelos alunos e à sua participação, individual e coletiva, na vida da
turma, da escola e da comunidade.
Entendemos que o objetivo da disciplina Estudo do Meio é que os alunos possam vivenciar através
da mesma, diferentes experiências educativas pensadas através da formação crítica do sujeito. E assim,
optamos por compreender como ocorre a prática pedagógica do professor dessa disciplina, pois se trata de
uma disciplina que colabora para o conhecimento sobre o mundo.
Nesse sentido, buscamos analisar quais os materiais didáticos são utilizados pelos professores
durante o processo de construção do conhecimento. Compreendemos os Materiais Didáticos como um
121
conjunto de dispositivos utilizados ao mesmo tempo ou não, que auxiliam o processo de aprendizagem,
ou seja, ―é todo material utilizado como auxílio no ensino-aprendizagem do conteúdo proposto para ser
aplicado pelo professor a seus alunos‖ (SOUZA, 2007 p. 111).
Os materiais didáticos são facilitadores para um ensino mais dinâmico e mais interativo. Também
podemos afirmar que ―os recursos de ensino são recursos humanos e materiais que o professor utiliza
para auxiliar e facilitar a aprendizagem‖ (FERREIRA, 2007, p.25). São também chamados de recursos
didáticos, meios auxiliares, meios didáticos, materiais didáticos, recursos audiovisuais, multimeios ou
material institucional. Preferimos, porém, para essa pesquisa usar ―materiais didáticos‖, por parecer um
termo mais abrangente.
Os materiais didáticos podem estar dentro ou fora da escola, levam o aluno a observar e prestar a
atenção, permitem que o mesmo distinga forma, posição, estrutura, funcionamento de equipamentos,
movimento e identifique diferenças: de animais, de plantas, de sexos, de insetos, de objetos. Segundo
Ferreira (2007, p.26), os materiais didáticos ajudam a comunicação, a compreensão e a estruturação da
aprendizagem e tem função importante no incentivo, no alcance e objetivos efetivos.
Portanto, os materiais didáticos são de importância fundamental para uma aprendizagem
significativa, desde que sejam utilizados de forma adequada e por professores que conheçam a realidade
na qual estão atuando, possibilitando ao aluno um estudo mais dinâmico, aumentando a capacidade de
observação do mundo que o rodeia.
Como metodologia de pesquisa utilizamos a abordagem qualitativa. Este tipo de pesquisa destaca
mais o processo do que o produto final e se preocupa em mostrar o ponto de vista dos participantes diante
do contexto social, visto que suas raízes têm origem em diferentes variáveis investigativas.
O convívio com o ambiente escolar foi muito importante para o desenvolvimento desse trabalho,
especialmente para compreender a dinâmica da escola e do trabalho docente. Para a escrita do mesmo,
diferentes fontes de dados foram utilizadas, como por exemplo, leituras de trabalhos realizados na área do
estudo, leitura dos referenciais teóricos, anotações das observações de aula e entrevistas com professores.
Para análise dos dados, utilizamos o referencial da Análise de Conteúdo, baseando-nos nos estudos
de Laurence Bardin (2008). A Análise de Conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das
comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens ou falas dos sujeitos. Isto significa não somente produzir perguntas ou respostas sobre uma
determinada mensagem, mas embasá-las com teóricos de diversas concepções de mundo.
Para Bardin (2008, p. 121), a análise de conteúdo compreende três fases, sendo elas:
A pré-análise: a organização de todos os materiais que serão utilizados para a coleta dos dados,
assim como outros materiais que podem ajudar a entender melhor o fenômeno e fixar o que o
autor define como corpus da investigação, que seria a especificação do campo que o pesquisador
deve centrar a atenção.
Descrição analítica: nesta etapa o material reunido que constitui o corpus da pesquisa é mais
aprofundado, sendo orientado em princípio pelas hipóteses e pelo referencial teórico, surgindo
desta análise quadros de referências, buscando sínteses coincidentes e divergentes de ideias.
Interpretação inferencial: é a fase de análise dos dados coletados. A reflexão, a intuição, com
embasamento em materiais empíricos, estabelecem relações com a realidade, aprofundando as
conexões das ideias, chegando se possível à proposta básica de transformações nos limites das
estruturas específicas e gerais.
122
De acordo com Trivinos (1987), deve ocorrer interação dos materiais, não devendo o pesquisador
reduzir sua análise apenas aos conteúdos encontrados nos documentos. Deve-se ainda, tentar aprofundar a
análise e desvendar o conteúdo oculto dos documentos, revelando ideologias e tendências das
características dos fenômenos sociais que se analisam.
O princípio da análise de conteúdo é definido na demonstração da estrutura e dos elementos desse
conteúdo para esclarecer diferentes características e extrair sua significação. A análise de conteúdo não
obedece a etapas rígidas, mas sim a uma reconstrução simultânea com as percepções do pesquisador com
vias possíveis nem sempre claramente delimitadas.
Achados da pesquisa
Para adquirir os dados trabalhados na análise desta pesquisa foi realizada uma entrevista com sete
professores, que teve por objetivo compreender como ocorre a utilização de diferentes materiais didáticos
e como esses influenciam no processo de ensino-aprendizagem dos alunos.
As entrevistas foram realizadas com professores da disciplina Estudo do Meio da Escola Básica
Central Farol durante os dias 27 e 28 de outubro de 2014. Realizamos uma entrevista semiestruturada,
onde cada entrevistado respondeu uma série de perguntas pré-formuladas. As perguntas foram
construídas a partir das questões de pesquisa e análise da investigação.
Foram realizadas questões abertas e fechadas. Para manter o anonimato e dar maior liberdade para as
respostas, os professores foram identificados da seguinte maneira: P1, P2, P3, P4, P5, P6, e P7. O quadro
1 apresenta a identificação e o perfil de cada professor entrevistado:
123
Com a intenção de compreender como os professores trabalham os conhecimentos prévios dos
alunos durante o processo de ensino-aprendizagem na disciplina Estudo do Meio, perguntamos: qual o
conhecimento que esses alunos já possuem sobre os conteúdos trabalhados na disciplina? No quadro 2
podemos ver as respostas:
Podemos observar pelas respostas que apenas o P2 e P7 conversam com os alunos sobre o que estes
já conhecem dos conteúdos que serão trabalhados na aula, os demais professores entendem que o
importante é apenas apresentar o tema da aula, ou afirmam que os alunos já conhecem o tema, pois leem
no manual. Lembrando que, para Paulo Freire, os conhecimentos prévios, conhecimentos do dia a dia, do
cotidiano que os alunos levam para a sala de aula são muito importantes para a participação dos mesmos
na construção de conhecimento, para esses não receberem conteúdos de forma pronta e acabada. É
importante o aluno refletir, questionar e relacionar os conteúdos com o seu contexto.
O que o aluno já sabe é a ponte para a construção de um novo conhecimento, quando a criança reflete
sobre um conteúdo novo, ele ganha significado e torna mais complexo o conhecimento já existente.
Dando continuidade a entrevista e com a preocupação de compreender como os professores
interpretam a importância da disciplina Estudo do Meio, fizemos a seguinte pergunta: Por que a disciplina
de Estudo do Meio é importante para o aluno?
Todos os professores responderam que a disciplina é muito importante para seus alunos. Atribuíram
essa importância ao fato da disciplina trazer maior conhecimento sobre a natureza e o ambiente que os
rodeiam, também ao fato de ensinar a disciplina em língua portuguesa, desenvolvendo a capacidade do
aluno em relação ao domínio de umas das línguas oficiais do país. Apenas o P3 considera a disciplina
importante, simplesmente por ser preciso ensinar o que está nos manuais do professor e do aluno.
A disciplina Estudo do Meio trabalha com temas relacionados ao meio ambiente, a questões
biológicas do ser humano, da fauna, da flora, aos lugares e à vida em sociedade. Dessa forma, a utilização
de diferentes materiais didáticos auxilia os alunos a significarem os conteúdos trabalhados em sala de
aula, podendo relacioná-los com seu dia a dia.
Perguntamos aos professores como eles despertam o interesse dos alunos em relação aos conteúdos
da disciplina Estudo do Meio, tivemos algumas respostas iguais, sendo essas: 1. Escrever no quadro e
explicar a matéria, 2. Conversar com o aluno, 3. Encorajar o aluno, e 4. Ensinar o aluno. Não tivemos
nenhuma resposta em que o professor diz pensar em diferentes práticas pedagógicas ou o uso de
diferentes materiais didáticos para facilitar e auxiliar o processo de ensino-aprendizagem.
Depois, perguntamos: Quais os materiais didáticos você utiliza na aula? E as respostas podem ser
observadas no gráfico 1:
124
Gráfico1. Uso de materiais didáticos (Fonte: Elaborado para a pesquisa)
8
6
4
Materiais didáticos
2 utilizados na disciplina
Estudo do Meio
0
A partir dos dados encontrados no gráfico 1, verificamos que os professores entrevistados utilizam
diferentes materiais didáticos, sendo os principais: manual do aluno e professor, cartolina, cartões,
revistas, gravuras e globo - todos os materiais são fornecidos pela escola. Notamos que o material
utilizado por todos os professores é o manual do aluno e do professor, material de apoio pedagógico e
didático dos conteúdos curriculares e distribuído pelo Ministério da Educação de Timor-Leste.
Podemos dizer que encontramos um fator de complicação para o processo de ensino-aprendizagem
nas aulas da disciplina de Estudo do Meio. A Escola Básica Central Farol não possui número suficiente
de manuais, havendo 1 para cada 3 estudantes, o que dificulta a leitura dos textos e a observação das
imagens presentes no material. Além disso, há um elevado número de alunos por sala (mais de 60).
Quando questionados sobre o manual do professor, 6 docentes disseram gostar do material, pois
existe muitos exemplos e atividade para serem realizadas com os alunos, apenas o professor P6 relata que
somente a utilização do manual do professor não é o suficiente para o planejamento e o estudo das aulas
de Estudo do Meio, são necessários leituras de outros livros para a elaboração das aulas. As respostas dos
professores podem ser verificadas no quadro 3:
Ainda sobre a insuficiência do manual do aluno para todos os estudantes, esses não podem ser
levados para a casa, são utilizados apenas na sala de aula. Com base nas observações das aulas de Estudo
do Meio, notamos que os estudantes ficam em contato com o livro entre 10 a 15 minutos de aula. Outra
realidade observada é a dificuldade dos professores realizarem trabalhos em grupos, pois as mesas e
cadeiras são muito pesadas, dificultando a mudança. Além disso, há uma grande quantidade de alunos e
barulho na sala de aula.
125
Considerações finais
Partindo da análise dos dados coletados sobre a disciplina Estudo do Meio na Escola Básica Central
Farol, verificamos que os materiais didáticos mais utilizados pelos professores dessa disciplina são:
Manual do aluno e do professor, cartolina, cartões, gravuras, revistas, jornal e globo terrestre. O Manual
do Aluno e do Professor – livros de apoio didático e pedagógico distribuído nas escolas pelo Ministério
da Educação - são os principais materiais utilizados por esses professores, estando presentes em todas as
aulas.
Os professores entrevistados centram o seu planejamento de ensino nos conteúdos encontrados
nesses manuais, uma vez que na Escola Básica Central Farol não possui um horário destinado para o
planejamento de ensino coletivo.
O uso predominante desse material não contribui para a participação dos alunos na construção de
conhecimento. Os professores realizam principalmente a transferência dos conteúdos, seguem o texto
escrito no material e aplicam as atividades, mas sem relacionar tais conteúdos com o cotidiano e contexto
desses alunos. Outro problema encontrado está no fato de não haver material suficiente para todos os
alunos, que precisam dividir um mesmo manual com outros três estudantes.
Acreditamos que o conhecimento é algo que precisa ser construído. Nesse sentido, cabe ao professor
fazer a mediação para colocar o aluno diante do objeto de conhecimento. O professor precisa estar
presente, acompanhar e orientar a interação do aluno com o conhecimento.
A falta de planejamento de ensino, juntamente com a falta de infraestrutura escolar, materiais
didáticos, e de uma formação inicial de qualidade aos professores, podem trazer sérios problemas à
construção de conhecimento. Diante dessa situação, o professor pode apenas reproduzir e transferir os
conteúdos curriculares, não realizando práticas pedagógicas em que o aluno também seja sujeito da ação.
A partir dos resultados, acreditamos que esta pesquisa é importante para aprofundar e desenvolver as
capacidades dos professores timorenses, que muitas vezes não utilizam diferentes materiais didáticos nas
aulas. Essa é uma maneira de possibilitar aos professores uma reflexão sobre as suas próprias práticas
pedagógicas. Acreditamos também, que esta pesquisa pode servir como um guia para os professores que
atuam nessa disciplina, auxiliando na reflexão sobre suas aulas.
A utilização de diferentes materiais didáticos é importante durante o processo de ensino-
aprendizagem, pois são meios facilitadores na construção de conhecimento. Nem sempre temos
disponíveis na escola materiais didáticos, esse é um fator de complicação. Dessa forma, é importante o
professor realizar trabalhos em grupo, ouvir o aluno antes de iniciar o conteúdo e relacionar o conteúdo
com o dia a dia do aluno.
Referências Bibliográficas
126
FERREIRA, Sheila M. M. (2007). Os recursos didáticos no processo de ensino-aprendizagem. Cabo
Verde.
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SOUZA, S. E. (2007). O uso de recursos didáticos no ensino escolar. In: I ENCONTRO DE PESQUISA
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TRIVIÑOS, A. N. S. (1987). Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em
educação. São Paulo: Atlas.
127
128
PEDAGOGIA CRÍTICA DO LUGAR: CONTRIBUIÇÕES METODOLÓGICAS
PARA O ENSINO EM TIMOR-LESTE
Introdução
As dinâmicas territoriais mundiais atualmente são condicionadas pelo movimento produzido a partir
da nova fase do capitalismo, assentada na globalização. A globalização implicou um intenso intercâmbio
técnico e mercantil, mas não se traduziu da mesma forma na união social e política entre nações e povos.
Podemos dizer, que ―passamos a viver num mundo de aceleração da velocidade do transporte de
mercadorias. Não foram, contudo, aceleradas maiores liberdades de expressão, como a livre circulação
de ideias, tampouco ocorre o livre trânsito de pessoas entre territórios nacionais; novos muros e
barreiras também são marcas distintivas do processo de globalização‖ (ALVES; DINIZ, 2014, p.99).
O processo desenfreado de globalização vem modificando o mapa político do mundo, envolvendo
salientes transformações nas esferas econômicas, políticas e culturais. Interesses e culturas de países
hegemônicos muitas vezes se sobressaltam às tradições e aos conhecimentos locais dos países periféricos.
Uma questão que precisamos constantemente refletir é: Será que os Lugares4 vêm perdendo espaço no
mundo ou ainda existem as particularidades do espaço?
Ainda segundo Alves e Diniz (2014), a globalização não é um processo capaz de homogeneizar as
culturas; pelo contrário, o que assistimos é a valorização dos lugares com a supremacia de processos
culturais extremamente arraigados ao seu pedaço de chão, o que em geografia se costuma denominar de
processos de territorialização.
Timor-Leste vem passando por um processo intensivo de globalização, principalmente após a entrada
de instituições como a ONU e o Banco Mundial no país. Essas esperam que o país se reestruture e se
desenvolva economicamente a partir de padrões hegemônicos. Empresas estrangeiras e cooperações de
ajuda internacional também influenciam na entrada de novas culturas. É possível hoje andar pelas ruas de
Díli e ver imagens dos jogadores de futebol Lionel Messi e Neymar Júnior estampadas nas Microlet
(transporte público timorense), e seus cortes de cabelo e estilos de roupas são imitados pelos jovens
estudantes universitários. Também nos deparamos com grande quantidade de restaurantes estrangeiros e o
início dos fast foods no país, como o Burger King, que já possuem três franquias na capital Díli, uma
cidade de aproximadamente 235.000 habitantes, e que o salário mínimo do país é de U$115. Assim,
podemos ver a desigualdade e a segregação social se assentando na cidade.
Na área educacional, tanto em Timor-Leste como no Brasil, o que podemos encontrar são currículos
construídos verticalmente, apresentando conteúdos fragmentados e descontextualizados com a realidade e
o cotidiano dos estudantes – não apresentam a dinâmica e as diferentes trajetórias existentes na nossa
sociedade, transmitindo muitas vezes um único olhar sobre o tempo e o espaço. Assim, muitos temas e
conceitos não são compreendidos em sua totalidade e os professores acabam exercendo apenas o papel de
transmissores destes conteúdos. Dessa forma, este trabalho apresenta uma proposta metodológica de
ensino com base na Pedagogia Crítica do Lugar. Pretendemos contribuir para o ensino em Timor-Leste
4
Categoria analítica da geografia – de forma geral é a parte do espaço geográfico no qual o indivíduo sente pertencimento,
possui identidade, é onde suas relações se dão e são estabelecidas.
129
mostrando uma experiência5 de prática pedagógica contextualizada, ou seja, trabalhando com a realidade
histórica do educando e com o local da escola na elaboração de conhecimentos escolares.
A experiência de trabalho utilizando essa metodologia partiu da pesquisa-ação colaborativa -
pesquisa que ocorreu em parceria entre universidade e escola da rede pública. Teve como objetivo a
formação continuada de professores voltada para o currículo local, isto é, o desenvolvimento do estudo e
a elaboração de projetos pedagógicos teve relação direta com as problemáticas ambientais locais. A
construção de um currículo local, que valorize o conhecimento contextualizado, e sua aplicação em sala
de aula pode contribuir para uma maior aprendizagem e desenvolvimento dos alunos. Além disso, é
preciso que haja uma maior integração entre as disciplinas, para que assim seja possível o aluno entender
a realidade a sua volta, justificando então a importância de um trabalho interdisciplinar.
A Pedagogia Crítica do Lugar/Ambiente é uma proposta metodológica de ensino que pode nos
ajudar enquanto professores, e consequentemente ajudar os alunos a compreender melhor as mudanças
mundiais vivenciadas. Os conteúdos disciplinares em alguns momentos acabam não tendo conexão com a
realidade ou sentido, tornando o aprendizado desprazeroso e nada estimulante para o aluno. Outro fator
que diminui o prazer na aprendizagem é a negação ou a ocultação do conhecimento que o aluno traz em
sua trajetória, seu conhecimento prévio. Este, por sua vez, é de fundamental importância quando
lembramos que a educação precisa focar na formação de cidadãos críticos, que reflitam sua condição no
seu lugar e no seu tempo. Essa proposta metodológica pode ser realizada de forma interdisciplinar,
articulando conteúdos e conhecimentos de diferentes disciplinas, proporcionando a construção de um
currículo escolar local. As práticas interdisciplinares são interessantes, pois trazem diferentes visões sobre
um mesmo tema trabalhado e contribuem para um trabalho docente mais integrado, mais coletivo. Dentro
dessa metodologia é fundamental levar o cotidiano do aluno para dentro da sala de aula, e trazer novos
modos de ensino praticado pelas escolas. O contexto não pode ser apenas ilustrativo, muitas vezes nos
deparamos com imagens do local do aluno nos materiais didáticos, mas por detrás delas não existe a
intenção de que esse aluno seja sujeito participativo da construção de conhecimento, pois o conhecimento
já vem pronto. A Pedagogia Crítica do Lugar espera que:
Compiani também coloca que mesmo quando o contexto é trabalhado na sala de aula, por exemplo,
voltado para as problemáticas urbanas, essas são tratadas apenas de problemas locais (como
exemplificações, simples identificações), ―sem derivar para os problemas globais. Normalmente, pratica
uma simplificada contextualização, não enxergando que lugar e global são indissociáveis e apreendidos
pela dialética contextualização/descontextualização e horizontalidade/verticalidade‖ (COMPIANI, 2007,
p. 32). Entendemos por horizontalidade, o que é local – particular/singular/histórico rumo à
contextualização, e por verticalidade, o que é global – geral/propriedade/generalização rumo à
descontextualização.
5
A experiência ocorreu no âmbito do projeto de políticas públicas Ribeirão Anhumas na Escola e se tornou a pesquisa de
mestrado da primeira autora.
130
A experiência de prática pedagógica vivenciada no âmbito dessa metodologia aconteceu no
município de Campinas, estado de São Paulo, Brasil. Ocorreu durante o desenvolvimento do projeto
Ribeirão Anhumas na Escola6, que partiu da pesquisa-ação colaborativa entre universidade e escola
pública de Ensino Fundamental e Médio, equivalentes respectivamente ao Ensino Básico e Secundário de
Timor-Leste. Essa dinâmica de trabalho criou uma relação entre universidade e escola pouco presenciada
nas pesquisas escolares no Brasil, uma vez que quebrou muitos paradigmas tanto dos professores da rede
pública, como dos pesquisadores do projeto. Esse se configurou a partir das vozes e dos olhares de todos
os participantes. A relação hierárquica foi rompida, todos aprenderam e ensinaram uns para e com os
outros.
Apesar de o projeto ter como estrutura dois grandes grupos de participantes - os formadores
(professores, pesquisadores e bolsista da universidade ou de institutos de pesquisa), e os colaboradores
(professores das escolas públicas) - todos formaram e foram formados.
O grande diferencial desse projeto foi a utilização da pesquisa-ação colaborativa. Essa metodologia
de pesquisa dentro das pesquisas escolares constrói uma concepção de conhecimento escolar horizontal,
quebrando a verticalidade e dominação das ações da universidade sobre a escola e fazendo surgir uma
cultura de valorização dos conhecimentos produzidos dentro do ambiente escolar.
A pesquisa-ação colaborativa é uma pesquisa feita com outros e não sobre outros, por
exemplo, quando professores trabalham em conjunto com outros professores da sua
escola ou grupo de professores participantes de um coletivo. Os pesquisadores da
universidade ou institutos de pesquisa ou ongs etc participam de diferentes formas
nesses coletivos. E esses professores trabalham com seus alunos para melhorar os
processos de ensino e aprendizagem de sala de aula bem como as condições de ensino
em suas escolas (COMPIANI, 2006).
A comunidade escolar (gestores, professores e alunos) está cansada de pesquisas verticais, em que
pesquisadores entram na escola, coletam dados, analisam aulas, criticam aulas e práticas dos professores,
impõem práticas e conteúdos de trabalho, sem nunca ouvirem ou pensarem a partir das demandas locais,
sem contar que muitas pesquisas não retornam seus resultados à unidade escolar. É uma ação de cima
para baixo, onde prevalecem esta hierarquia e esta superioridade do conhecimento acadêmico em relação
à escola.
O tempo e o espaço da escola são outros, completamente diferentes dos tempos e espaços
vivenciados na academia; suas necessidades e questionamentos são outros, o tempo do aluno e da sala de
aula também é muito diferente do ambiente acadêmico, porém ambos devem ser respeitados e
valorizados, pois conhecimento também é produzido dentro da escola entre professores e alunos.
Para ocorrer a construção de conhecimento escolar, a escola precisa substituir a repetição e a
fragmentação de conteúdos, já que muitos professores realizam apenas a transferência didática para os
alunos, não levando os mesmos a uma reflexão dos conteúdos abordados em aula. A escola precisa
desafiar o aluno a pensar e a refletir. Uma das possibilidades é apresentar situações-problemas,
contextualizando situações do cotidiano com o conteúdo desenvolvido na sala de aula.
A situação-problema leva o aluno a buscar soluções para suas dúvidas e incertezas, a criar hipóteses,
e inicia um ensino em que o aluno participa democraticamente de sua construção. Com base em
Compiani (2006), podemos dizer que contextualizar os conteúdos curriculares pode levar o aluno a
questionar sua realidade, tornar o plano de ensino contextualizado, potencialmente, pode permitir que o
aluno analise e transforme a realidade.
Segundo Zimmermann & Compiani (2014), no projeto Ribeirão Anhumas na Escola, o contexto foi
considerado processo e produto das interações e diálogos construtores de conhecimentos escolares.
6
Para conhecer melhor o projeto Ribeirão Anhumas na Escola acesse: https://ead.ige.unicamp.br/anhumas/.
131
Além disso, buscou-se compreender as problemáticas de uma localidade sem que
fossem silenciadas as relações dessas com os problemas planetários, mais
generalistas. Assim, a cultura, história e vida social dos alunos estiveram em
constante diálogo com conhecimentos mais gerais e os diferentes modelos e
definições construídos das ciências e das humanidades. Nesse sentido, não valoriza o
conhecimento cotidiano em detrimento do científico, mas prioriza a rica e complexa
mediação entre esses dois conhecimentos na escola, de modo a entender que o
conhecimento escolar é a unidade que se dá no conflito e tensão entre conhecimento
cotidiano e científico (ZIMMERMANN; COMPIANI, 2014, p. 2).
O projeto visava à formação de um coletivo de professores, e essa foi pensada a partir de temas que
foram considerados relevantes para se trabalhar os conhecimentos geocientíficos com base na, Pedagogia
Crítica do Lugar. Para Compiani (2013), a interdisciplinaridade, o contexto e o lugar são novos modos de
lidarmos e pensarmos as relações da sociedade com o ambiente, e partindo do poder interpretativo dos
professores e dos alunos, podemos transformar a escola num ambiente mais criativo, pulsante e vivo,
onde estaremos formando cidadãos mais críticos que poderão participar ativamente de uma sociedade
mais democrática.
Os professores envolvidos no projeto realizaram uma formação contendo 100 horas de reuniões de
estudo e planejamento (reuniões de trabalhos coletivos e pedagógicos dos professores em formação), 48
horas de oficinas dos eixos-temáticos (Cartografia/Geologia, Biologia, Pedologia, e Riscos Ambientais) e
136 horas de eixos-disciplinares (Interdisciplinaridade, Educação Ambiental, CTSA - (ciência,
tecnologia, sociedade e ambiente) - e Local/Regional); momentos distribuídos ao longo do ano de 2007.
Esses encontros e atividades se constituíram como a base teórica e metodológica, e também como auxílio
para formulação do projeto escolar e dos projetos individuais de pesquisas dos professores que foram
desenvolvidas no ano de 2008.
No ano de 2009, acompanhamos a continuidade da aplicação dos projetos escolares. Três professores
das áreas de matemática, português e artes tiveram o objetivo de que seus alunos reconhecessem o seu
lugar de vivência e o seu entorno, contextualizando o conteúdo curricular em atividades fundamentadas
na educação ambiental. Além das disciplinas mencionadas anteriormente, esse coletivo de professores
contou com o apoio pedagógico de uma bolsista de Iniciação Científica da área de geografia para pensar,
planejar e desenvolver atividades conjuntamente.
O eixo norteador do trabalho interdisciplinar foi o Trabalho de Campo, segundo Compiani &
Carneiro (1993), o campo é como um local privilegiado do contato com os objetos, os fenômenos
concretos e o ambiente. E foi a partir disso que os professores conseguiram em sala de aula relacionar
seus conteúdos disciplinares com os problemas locais.
Para que fosse possível unir quatro disciplinas, entre elas, o português, a matemática, as artes e a
geografia, no segundo semestre de 2009 foi necessário que abordássemos temas explorados pela
geografia para nortear o trabalho de campo realizado com os alunos, e a partir dos mesmos explorá-los
nas demais disciplinas. Os temas trabalhados foram: Cartografia, Bacias Hidrográficas, Ciclo Hidrológico
e Solos.
Após a aplicação desses conteúdos, foi realizado o trabalho de campo no Ribeirão das Pedras, no
qual os alunos estudaram o Uso e a Ocupação do Solo na região. Os alunos do 6º ano observaram no
campo a paisagem, o relevo, os tipos de rochas e solos, analisaram dois perfis de solo, os tipos de
residência do lugar, e mediram a temperatura e a umidade relativa do ar em duas paradas distintas. Todos
os alunos responderam um roteiro de campo durante cada ponto de parada.
Analisamos posteriormente as respostas encontradas nos roteiros de campo e também em três
atividades desenvolvidas por cada um dos professores pós-campo, essa análise teve como objetivo
descobrir se conteúdos de Geografia / Geociências ligados a uma proposta de Educação Ambiental
132
nortearam ou não o trabalho interdisciplinar dos professores. Cada professor também trabalhou os
conteúdos curriculares partindo dos estudos e observações realizadas durante o trabalho de campo. No
quadro 1, é possível verificar os conteúdos curriculares trabalhados a partir do contexto em cada
disciplina.
Analisando as respostas dos alunos nos roteiros de campo e também nas atividades mencionadas,
pudemos perceber que a partir do trabalho de campo realizado conseguimos discutir uma Educação
Ambiental que envolvesse todas as disciplinas trabalhadas no subgrupo. O 6º ano é uma sala composta
por alunos de faixa etária entre 10 a 12 anos, e apesar de pouca idade, esses conseguiram discorrer sobre
assuntos de certas complexidades, como por exemplo, a influência do tipo de rocha na cor do solo e os
minerais que a compõe.
133
É possível pensar em ações interdisciplinares dentro das escolas, e existir maiores diálogos entre
professores de diferentes áreas. Os trabalhos de campo são ricos momentos pedagógicos, que podem ser
realizados no próprio entorno da escola, trabalhando conteúdos curriculares partindo do contexto
vivenciado pelos alunos.
Considerações Finais
Referências Bibliográficas
ALVES, V. E. L.; DINIZ, V. L. (2014). PIBID-Geografia: repensando o papel do professor e das práticas
geográficas escolares. In: Guilherme do Val Toledo Prado; Eliana Ayoub. (Org.). PIBID-UNICAMP:
Criando uma nova cultura nos cursos de formação de professores. 1ªed.: Leitura Crítica, v. 1, p. 91-107.
BARBIER, R. (2002). O Método em Pesquisa-Ação. In: A pesquisa-ação. Brasília: Plano Editora, pp. 117-146.
CALLAI, H. C. (2004). O estudo do lugar como possibilidade de construção da identidade e pertencimento. A
questão social no novo milênio. VIII Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais. Setembro.
COMPIANI, M. & DAL RÉ CARNEIRO, C. (1993). Os papeis das excursões geológicas. Ensenanza de lãs
Ciências de La Tierra, p. 90-98.
COMPIANI, M. (2006). Proposta do Projeto Elaboração de conhecimentos escolares e curriculares
relacionados à ciência, à sociedade e ao ambiente na escola básica com ênfase na regionalização a partir
dos resultados de projetos de políticas públicas. Campinas.
COMPIANI, M. (2007). O lugar e as escalas e suas dimensões horizontal e vertical nos trabalhos práticos:
implicações para o ensino de ciências e educação ambiental. Ciência & Educação, v. 13, n. 1, pp.29-45.
COMPIANI, M. (2013). Projeto Ribeirão Anhumas na Escola: fundamentos pedagógicos e educacionais. In:
COMPIANI, M. (Org). Ribeirão Anhumas na Escola: projeto de formação continuada elaborando
conhecimentos escolares relacionados à ciência, à sociedade e ao ambiente. Curitiba: CRV, pp.11-35.
FAZENDA, I. C. (1994). A Interdisciplinaridade: história, teoría e pesquisa. Campinas: Papirus.
MASSEY, D. (2009). Pelo espaço: uma nova política da espacialidade. Tradução Hilda Pareto Maciel,
Rogério Haesbaert. Editora: Bertrand Brasil. Rio de Janeiro.
ZIMMERMANN, N.; COMPIANI, M. (2014). Investigando o processo de construção de práticas pedagógicas
de professores participantes do Projeto Ribeirão Anhumas na Escola sobre o contexto local. Congreso
Iberoamericano de Ciencia, Tecnología, Innovación y Educación. Buenos Aires, Argentina.
134
A IMPORTÂNCIA DAS ESTRATÉGIAS DIDÁTICAS NAS AULAS
DE ESTUDO DO MEIO
Introdução
135
Metodologia
Participaram dessa pesquisa nove alunos do 6º ano do Ensino Básico (II Ciclo). A escolha desses
alunos deve-se ao elevado número de alunos que estudavam nessa série escolar. Totalizando o número de
alunos do 6º ano (turma A, B e C) tínhamos 98 estudantes. Buscando garantir o anonimato e a
privacidade dos sujeitos, os alunos serão representados como A1, A2, A3, A4, A5, A6, A7, A8 e A9.
O local onde realizou-se essa pesquisa foi a escola Básica Filial 1.2. Rumbia Caicoli, localizada em
Díli, no sub-distrito de Vera Cruz, no Suco de Rumbia. A Localização da escola de Rumbia é estratégica,
situa-se no centro da comunidade, dando assim facilidade de deslocação dos alunos de Casa-Escola-Casa,
área de Matadouro, Colmera, Mascarenhas, Balide rai hun, Quintal boot, e cobre também Quintal kiik.
Portanto, a localização da escola é numa zona estratégica onde se situa a população.
O questionário utilizado nessa pesquisa é composto por perguntas fechadas e abertas. Através das
perguntas fechadas, obtivemos informações relacionadas ao perfil dos sujeitos. As questões abertas, que
correspondem à segunda parte dos questionários, foram feitas para aprofundar o que os alunos entendiam
sobre a importância do desenvolvimento de diferentes estratégias didáticas no Ensino do Estudo do Meio
do 6º ano do 2º ciclo do Ensino Básico.
Segundo Richardson (1999, p. 191-192) as questões fechadas caracterizam-se por apresentar
categorias ou alternativas de respostas preestabelecidas, enquanto que as questões abertas levam os
sujeitos a responderem com frases. As questões dos questionários foram agrupadas em blocos ou partes e
tiveram a seguinte composição:
Quadro 1: Partes ou Blocos Temáticos e suas respectivas questões – Questionário aplicado aos alunos
da disciplina Estudo do Meio do 6º ano do 2º ciclo do Ensino Básico.
Questionário – alumnus
Parte I: Identificação do aluno Questões não representadas por números.
Parte II: Metodologia do ensino Questões de 1 a 4
Referencial Metodológico
Após a coleta dos dados, adotamos como procedimento metodológico a ―Análise de Conteúdo‖
proposta por Bardin (2008). Para esse autor, a análise de conteúdo compreende três fases: a pré-análise;
descrição analítica e a interpretação inferencial. A fase da pré-análise é caracterizada como fase da
organização do material, essa primeira fase possui três momentos: ―a escolha dos documentos a serem
submetidos à análise, a formulação de hipóteses e dos objetivos e a elaboração de indicadores que
fundamentem a interpretação final‖ (BARDIN, 2008, p.121, grifo do autor).
Nessa primeira etapa realizou-se uma leitura para permitir o primeiro contato com o material, essa
primeira leitura dos questionários é caracterizada como leitura ―flutuante‖, sendo importante para
conhecer a estrutura da narrativa e ter as primeiras orientações e impressões em relação à mensagem dos
documentos1 de forma a definir o corpus da pesquisa (BARDIN, 2008, p. 122).
No segundo momento foi realizada a descrição analítica, nessa etapa o material de documentos que
constitui o corpus da pesquisa foi submetido a um estudo aprofundado. Segundo Trivinos (1987) nessa
1
Os documentos nessa pesquisa é representado pelos questionários aplicados aos alunos.
136
etapa os procedimentos como codificação, classificação e a categorização são básicas nesta instância do
estudo. A operação de codificação consiste em tratar os dados coletados através de recortes, agregação e
enumeração (BARDIN, 2008).
Nessa operação de codificação é que será o momento de escolha de unidades de registro, a seleção de
regras de contagem e a escolha de categorias. A unidade de registro é a ―unidade de significação a
codificar e corresponde ao segmento de conteúdo a considerar como unidade de base, visando à
categorização e a contagem frequencial‖ (BARDIN, 2008, p. 130).
Segundo Bardin (2008) pode-se utilizar seis técnicas de análise de conteúdo para a interpretação da
comunicação: análise categorial, análise de avaliação, análise da enunciação, análise da expressão, análise
das relações e análise do discurso. Para esse trabalho foi adotado a análise categorial.
A Análise Categorial consiste em fazer o desmembramento do texto em unidades (categorias), ou
seja, é reunido um grupo de elementos com características em comum (BARDIN, 2008).
A terceira etapa consiste na interpretação inferencial, nesse momento a análise alcança uma maior
intensidade. O pesquisador ―infere‖ sua visão sobre as categorias construídas, tendo como objetivo
interpretar o quê o texto quer dizer.
Resultado e discussão
A maioria dos sujeitos participantes da pesquisa é do sexo feminino (66,6%) que correspondem a 6
alunos. A faixa etária dos alunos que participaram da pesquisa tem média de 10 a 13 anos.
Perguntamos aos alunos o que eles entendem sobre Metodologia de Ensino. A partir dessa questão,
criamos algumas categorias:
Aos serem questionados o que entendem sobre Metodologias de ensino, percebemos que os alunos
não citam nenhuma definição, enunciando apenas os tipos de metodologia de ensino. A figura acima
demostra que 18,4% dos alunos entendem sobre metodologia de ensino o ato de escrever, sendo a
percentagem maior. Os alunos que correspondem a 13,6% entendem metodologia de ensino como
aprender, ler e outros (as disciplinas que compõem o 2º ciclo do Ensino Básico). Os alunos também
entendem como metodologia de ensino: contar, explicar e ensinar (9,0%), conforme exposto no gráfico 1.
Em relação as metodologias utilizadas pelos professores, a figura 2 aabaixo, mostra que sete dos
alunos que correspondem a 18,4% afirmam que as metodologias de ensino que o professor utiliza é contar
e ler, enquanto que 15,7% destacam que as metodologias do ensino que o professor utiliza são jogos e
escrever.
137
Gráfico 2: As metodologias do ensino que o professor utiliza, segundo os alunos da disciplina
estudo do meio.
Segundo Krasilchik (1996), quanto mais às experiências educativas em sala de aula se parecer com
as situações em que os alunos deverão aplicar seus conhecimentos, mais fácil se tornará a concretização
do aprendizado.
Segundo a figura 3 abaixo, entre os 9 alunos da turma A, B e C, 30% dos alunos gostam das
metodologias de ensino, como jogos e contar. A partir do enunciados desses alunos, percebe-se a
importância do ensino lúdico, visando um ensino-aprendizagem prazeroso e eficaz.
Segundo a fala do aluno 6 ―as metodologias do ensino que eu gosto é ler, porque pode aumenta o
valor‖ (A6). Percebemos nessa pesquisa que muitas vezes o interesse dos alunos em uma metodologia
está relacionado aos testes escolares. Esses enunciados demonstram que a metodologia de ensino e a
avaliação dos alunos caminham juntas, a escolha de uma metodologia de ensino implica no tipo de
avaliação que será adotada pelos professores.
As metodologias do ensino que eu gosto é cantar, porque a cantar fala sobre a arte música e entanto a música
pode fazer as pessoas alegria e várias muitos música que as pessoas para refrescar (A4).
As metodologias do ensino que eu gosta é cantar, porque as músicas que eu gosta (A8).
138
do professor ensinar as sete disciplinas em uma turma, é importante conhecer também quais as
metodologias que os alunos gostam para poder ensinar a partir do interesse dos alunos.
Em relação a importância do desenvolvimento das metodologias de ensino para a aprendizagem dos
estudantes da disciplina estudo do meio. Os alunos A8 e A9 responderam:
Identificamos que todos os alunos que participaram dessa pesquisa consideram importante que o
professor desenvolva várias metodologias de ensino. Os enunciados dos alunos demonstram que eles têm
interesse nas estratégias didáticas que o professor utiliza e não apenas no conteúdo.
Nessa pesquisa, percebemos que os alunos consideram importante que seja desenvolvido na
disciplina Estudo do Meio várias metodologias de ensino, de forma, que permita a interação e a
participação nas aulas.
Considerações Finais
Referências
139
140
FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR
DO DISTRITO DE DILI
Eliasefa Barreto
Keu Apoema
Márcia Vandineide Cavalcante
Introdução
Este artigo tem como objetivo apresentar o processo de formação dos professores da Educação Pré-
Escolar no Distrito1 de Díli, realizado pelo Ministério da Educação (ME-TL), nos primeiros dez anos pós
Restauração da Independência em Timor-Leste (2002).
A recuperação de tal processo se deu por meio de documentos legais emitidos pelo ME-TL,
notadamente os certificados de cursos entregues aos professores em formação durante os anos em
referência. Além desses documentos, realizou-se entrevistas com pessoas ligadas à Educação Pré-Escolar
em diferentes períodos da história de Timor-Leste, na tentativa de se compreender melhor aspectos
históricos do país que de alguma maneira interferiram na Educação Pré-Escolar timorense.
Com uma abordagem qualitativa e proposta metodológica histórica-descritiva, centrada na análise
documental e na realização de entrevistas, a partir da perspectiva apresentada por Ludke, Menga e Andre
(1986), este artigo traz um breve resgate histórico sobre a educação escolar em Timor-Leste, principiando
com a colonização portuguesa, seguindo com o domínio indonésio e periodo pós independência, com um
olhar especial para a Educação Pré-Escolar2.
Em seguida, apresenta-se um Panorama da Educação Pré-Escolar do Distrito de Díli e,
posteriormente, dados das formações para professores da Educação Pré-Escolar, realizadas em Dili, no
periodo pós-independência. Tais dados são acrescidos de informações construídas a partir da memória da
pesquisadora Eliasefa Barreto, que participou de tal processo, primeiro como professora em formação e,
depois, como professora formadora.
A Educação Escolar em Timor-Leste teve princípio entre os anos de 1863 e 1974, de acordo com
Durand (apud MARTINS, 2010:28), ainda no período da colonização portuguesa, quando era organizada
por missionários dominicanos que trabalhavam na catequização e na área do ensino. O sistema de
educação naquela época envolvia apenas ler, escrever e noções de matemática, sendo ministrado em
língua portuguesa. As escolas estavam concentradas nos postos de administração, nos centros urbanos e,
sendo assim, poucos tinham acesso à escolaridade. Naquele período, havia escolas para meninos e escolas
para meninas e adotava-se um sistema tradicional de ensino centrado no professor.
No período da ocupação indonésia, o território de Timor-Leste passou a ser considerado a sua 27a
província, com o nome de Timor-Timur, dividindo-se administrativamente em kabupaten (municípios),
kecamatan (posto administrativos), desa (sucos) e dusun (aldeias). A partir de 1980, escolas primárias
1
Recentemente, o Governo de Timor-Leste mudou a nomenclatura de Distrito para Município. Contudo, como a pesquisa
para este trabalho foi concluida em maio de 2015, preferiu-se manter neste texto o termo Distrito.
2
Este trabalho tem por base a da monografia de finalização do Curso de licenciatura em educação da professora Eliesefa
Barreto, sob orientação da Profa. Márcia V. Cavalcante e Keu Apoema, na Universidade Nacional de Timor Lorosa‘e.
141
foram construídas em todos os sucos. Em algumas aldeias, havia escolas do primeiro ciclo e, na sede do
suco, havia escolas do segundo ciclo. Desta maneira, a maioria das crianças tiveram acesso à escola, ao
mesmo tempo em que se tornou obrigatório o ingresso na Educação Básica entre seis a oito anos de idade.
Escolas de Ensino Pré-Secundário foram construídas nas sedes dos postos administrativos e Escolas de
Ensino Secundário nas sedes dos municípios.
No ano de 1980, foi construída a primeira escola Pré-escolar de Timor-Leste pela Me. Margarida
Soares, pertencente à organização Congregação de Canossa. Naquela época, provisoriamente, utilizava-se
salas da residência do Bisbo Dom Martinho Lopes, em Dili. Depois disso, em 1982, essa escola foi
contruída pela mesma Me. Margarida Soares, em Bemori, e entregue para a congregação São Carlos em
Dili3.
Somente a partir de 1987, foram construídas pelo governo da ocupação indonésia escolas de
Educação Pré-Escolar em Dili e em outros municípios. Naquele período, a Educação Pré-Escolar
chamava sekolah Taman kanak-kanak (TK), ministrada majoritariamente por professores indonésios. A
língua de ensino era a bahasa Indonésia, obrigatória na educação formal em todos os níveis de
escolaridade, enquanto o português e o tétum eram proibidos dentro do espaço escolar.
Em 1987, o governo indonésio promoveu as primeiras formações para os professores da Educação
Pré-Escolar. Naquele período, já existiam 75 TK, construídas pelo governo como escola pública, ou por
ONG, como escolas privadas. A educadora Sra. Gilberta Baião, encarregada da Educação Pré-Escolar de
Timor –Leste, desde o período indonésio até os dias de hoje, declarou em entrevista que ―essas escolas
eram existentes em todo o terrítório. Existiam os professores contratados pelas ONG, que eram a maioria,
e havia também os professores contratados pelo governo como funcionarios permanentes‖ 4.
O educador da criança deve ter um conhecimento apropriado sobre o seu potencial de crescimento e
desenvolvimento, pois é claro que precisa planear os objetivos e atividades que envolve o currículo dessa
faixa etária (MATTA; VASCONCELOS, 2001). Segundo o Referencial para as Políticas de Educação
Pré-Escolar de 2013, é função do Ministério da Educação, através do Plano Estratégico para a Educação
(2010- 2015), definir e promover uma política para a formação profissional dos professores da Educação
Pré-Escolar, incluindo a formação técnica e pedagógica dos mesmos, assim como creditando as
formações já realizadas (ME-TL, 2013).
Para se obter uma educação qualificada, necessita-se melhorar a formação profissional, seja na
universidade, na formação permanente ou continua. Deve estar no centro das políticas públicas nacionais
de educação a preocupação em elevar o nível dos profissionais, assim como o conhecimento dos
educadores sobre suas práticas pedagógicas. Tais processos de formação ajudam a desenvolver a
capacidade dos professores, podendo os mesmos serem mais criativos e motivados.
Em uma perspectiva freiriana, é necessário ainda estimular uma reflexão crítica sobre a prática.
Segundo Paulo Freire (2001:48-49):
A formação terá como base uma reflexão dos sujeitos sobre sua prática docente, de
modo a permitir que examinem suas teorias implícitas, seus esquemas de
funcionamento, suas atitudes etc., realizando um processo constante de auto-avaliação
que oriente seu trabalho. A orientação para esse processo de reflexão exige uma
proposta crítica da intervenção educativa, uma análise da prática do ponto de vista dos
pressupostos ideológicos e comportamentais subjacentes.
3
Fonte: entrevista realizada com professora da pré-escolar, diretora da escola naquele período. Concedida à pesquisadora em
28 /08/2014, Díli.
4
Fonte: entrevista concedida à pesquisador em 23 /06/2014, Díli.
142
Através desta afirmação e da observação do cenário atual, é possível perceber que o Ministério da
Educação de Timor-Leste vem realizando formações com o objetivo de qualificar os professores da
Educação Pré-Escolar, buscando ainda o empoderamento dos formadores timorenses. Para além disso, o
plano do ME-TL, através da Direção Nacional da Educação Pré –Escolar (DNEPE), tomando como
documento o Quadro de Competências para os Professores da Educação Pré-Escolar, aponta as
dimensões que devem nortear o trabalho: ―observar, caracterizar e contextualizar; planear; agir e
executar; eever e avaliar; comunicar e articular‖ (ME-TL, 2013: 17).
5
UNAMET: United Nations Missions in East Timor, missão da paz da ONU responsável pela consulta popular que decidiu
pela restauração da independência.
143
Como pode ser visto acima, o Ministério da Educação (ME-TL) é o agente de planificação das
políticas públicas educacionais, elaboração do currículo e matérias didáticos, bem como realiza o
processo de acreditação das escolas. O Instituto Nacional de Formação de Docentes e Profissionais da
Educação (INFORDEPE), por sua vez, é o agente executivo dos programas planificados pelo ME-TL,
implementação do currículo, promoção de formações para os professores, contato com a administração da
Educação Distrital para repasse de informações administrativas para os professores. A administração da
Educação Distrital fica responsável pelo monitoramento das formações, relatórios trimestrais sobre os
dados e funcionamento das escolas e acompanhamento de aspectos administrativos da vida funcional dos
professores e demais funcionários das escolas.
As Pré-Escolas, pós Independência, organizam suas turmas em dois grupos: o grupo A é composto
por crianças de 4 a 5 anos, ou seja, faz parte desse grupo a criança que tem 4 anos completos e irá
completar 5 anos do decorrer do ano letivo. O grupo B é composto por crianças de 5 anos completos e
que irá completar 6 anos do decorrer do ano letivo.
6
Informações não obtidas.
144
5 2006 4 16 20 INO4 1 5 6
6 2007 5 18 23 INO4 3 2 5
7 2008 7 23 30 INO4 30 6 36
8 2009 9 27 36 INO4 3 7 10
9 2010 11 30 41 15 35 9 59
10 2011 12 31 43 26 43 7 76
11 2012 13 30 43 26 43 8 77
12 2013 13 21 44 70 0 127 197
13. 2014 15 32 47 80 92 70 242
Fonte: M.E. Direção Nacional da Educação Pré-Escolar e Direção Municipal da Educação Município Díli
Vale observar que a maioria dos professores são contratados por períodos determinados de tempo ou
são voluntários. Há ainda, dentre aqueles que atuam na rede privada, uma parte que são de fato
contratados pelo Governo.
Tabela 03: Dados dos professores da Educação Pré-Escolar de cada Distritoo em território
com habilitação Literária 2014.
Habilitação Literário Total
No Município 4a Classe Pré-Secundário Secun SPG-Tk /KPG Bacha Comple Licen
dário relato mentar ciatura
1 Aileu 0 0 14 0 1 7 0 22
2 Ainaro 1 0 22 4 1 4 0 32
3 Baucau 2 1 18 6 7 0 4 38
4 Bobonaro 1 0 66 1 2 0 4 74
5 Covalima 0 0 50 3 0 3 0 56
145
6 Dili 12 4 132 12 9 62 11 242
7 Ermera 0 0 15 0 3 18 0 36
8 Lautem 2 1 26 0 13 0 60
9 Liquiça 1 2 53 0 12 0 0 68
10 Manatuto 0 0 8 5 0 3 0 16
11 Manufahi 1 0 89 2 0 2 0 94
12 Oecusse 2 1 2 2 1 4 0 12
13 Viqueque 1 0 49 3 4 7 1 65
Sub Total 23 9 544 38 40 123 20 815
TOTAL 8157 Professores permanentes, contratados e voluntários
Fonte : M.E. Direção da Educação Distrital de cada um do Município, referentes a 2014.
123
23 9 38 40 20
146
independência. Para tanto foi realizado um levantamento dos seguintes dados sobre essas formações:
período, local, carga horária, tema da formação, conteúdos e objetivos abordados, número de
participantes, formadores e organizações que apoiaram o evento.
É possível que não se destaque todos os itens mencionados, referentes a cada formação descrita, isso
se dá devido à falta de documentos comprobatórios sobre as formações.
Tabela 04: Quadro geral de Formações dos professores de pré-escolar em Timor-Leste após Indenpendência
N0 Nome da Organizado pelo Carga Conteúdos e Tema Ano
formação horário Letivo
Gov. ONG
a
1. 1 fase do Curso MECJD Plan 02-12 / 09 / -Aprende através do 2002
de reciclagem para internacional. 2002 brincar
de Pré-Primária Timor-Leste
2. 2a fase do Curso MECJD Plan 17-26 / 03 / -Metodologia do 2003
de reciclagem para internacional. 2003 ensino da Pré-Primária
de Pré-Primária Timor-Leste -Desenvolvimento da
criança
3. Formação dos MECJD Plan Timor- 19-29 / 01 / -Desenvolvimento de 2004
formadores Leste 2004 conteudos dos temas do
currículo da pré-
ptimária
4. Formação dos MECJD Plan Timor- 17-28 / 09 / -Etica profissional 2004
formadores Leste 2004 -Manajemento de sala
de aula
5. Formação dos MECJD Plan Timor- 28/01-2/02 - Psicologia da criança 2005
formadores Leste /2005 -Direitos das crianças
6. 1a fase do MEC UNICEF 05-08 / 09 / Título: ―Aprender e 2005
treinamento da 2005 ensinar-Um execício
UNICEF contínuo‖
Conteudos em:
Tema- Psicologia
infantil;pensamento
lógico; metodologia do
ensino; históricos
infantis e saúde na
infância.
Práticas: Jogos
dinámicos,músicas com
gestos, fabricação de
cartazes e teatro etc;
confecção de materiais;
montagem de história
7. Formação dos MEC Plan Timor- 19-23/09/ Conteudos em: 2005
formadores Leste 2005 Tema - Manejamento
da classe; Fase
desenvolvimento da
criança; Planeamento
anual; artes; Músicas e
jogos para as crianças.
Práticas:- Treinar os
professores como
organizar uma
classe;como planear o
147
programa anual,
semanal, diário em
relação com os temas;
ensair materiais
didáticos; recriar os
jogos infantis
8. Curso de português ME Cooperação De fevereiro Ensino de Língua 20082009
instrumental Brasileira de 2008a Portuguesa com base no e 2010.
baseado do dezembro de Currículo da Pré-
currículo de pré- 2010. Escola.
primária
9. Curso de português ME Cooperação De Outubro Monitora pedagógica 2008-
instrumental Brasileira de 2008- nas oficinas 2009
baseado do Maio de
currículo da pré- 2009 (200h)
primária no nível
intermédio
10. Treinamento do ME Fundação 2 semanas - Literacia para criança 2009
desenvolvimento Alola -Prática música para
da capasidade do criança pré-primária
conhecimento para -Atividade e jogo de
o processo numeracia
aprendizagem da -Gestão da classe
pré-primária -Jogo do
desenvolvimento da
motora grossa
- Conhecer o
desenvolvimento da
criança
-Professor
profissionalismo
-Arte
-Nível do
profissionalismo
11. Treinamento do ME/ Fundação 1 semana -Centro de atividade 2009
desenvolvimento INFPC Alola
da capacidade do
conhecimento para
o processo
aprendizagem da
pré-primária
12. Formação intensiva ME 15 dias (75h) -Metodologia do ensino 2011
para professores (INFORDEPE) - Ética profissional
13. TOT de formador ME 27- Conteudos Curriculares 2012
(INFORDEPE 30/11/2012
14 Formação intensiva ME Conteúdos Curriculares 2013
(INFORDEPE)
15 Treinamento para ME New Zeland, Implementação da 2014
os professores (INFORDEPE Chil-fund, revisão currículo do
Unicef, and Pré- escolar
Care
Internacional
148
A primeira formação para os professores da Educação Pré-Escolar, após a independência, foi
realizada em setembro de 2002 pelo então Ministério da Educação, Cultura, Joventude e Desporto
(MECJD). Esta formação, financiada pela Plan International, teve a primeira fase realizada no Instituto de
Formação dos Professores e Contínua em Balide, atual INFORDEPE. Tal formação contou com cerca de
80 participantes, todos professores da Educação Pré-Escolar de todo o território; parte dos formadores
eram estrangeiros, porém contaram com o apoio de professores timorenses. A pesquisadora Eliasefa
Barreto integrou essa formação como participante, pois começava a sua atuação como professora da
Educação Pré-Escolar. Em março de 2003, ocorreu a segunda fase da formação nos mesmos moldes da
primeira.
Em 2003, aconteceu a primeira formação para formadores, com um representante por Distrito, na
qual Eliasefa Barreto passou a integrar a equipe de formadores, representando o Distrito de Dili. O
objetivo dessa formação era preparar os formadores timorenses, ampliando o conhecimento a cerca dos
conteúdos dos temas relacionados ao currículo do Pré-escolar, previamente elaborado por uma equipe
composta por estrangeiros e timorenses. Também esta formação contou com o apoio da Plan
International. A partir dessa formação dos professores-formadores começou a haver uma descentralização
das formações, passando a ocorrer não somente em Dili, mas sim, em cada um dos 13 Distritos. Em
janeiro de 2004, ocorreu uma nova formação para formadores. Dessa vez, convidou-se também pais e
professores do ensino básico do 10 e 20 anos, com o objetivo de envolver a comunidade nas questões
relacionadas ao processo de ensino aprendizagem da Educação Pré-Escolar.
A primeira formação no ano de 2005 se realizou em Dili, no Instituto Nacional de Formação de
professores e Contínua (INFPC), entre janeiro e fevereiro, com formadores representantes de cada um dos
distritos. A formação foi ministrada por facilitadores membros do Ministério da Educação e ONG‘s
internacionais tais como Instituto Mery Meckyllop, Instituto Católico de formação dos Professores (ICFP
Maristas Baucau), Assistência Médica Internacional-AMI (Brasileira), Cristão Visão (Brasileira). O foco
dessa formação continuou a ser o currículo aprovado em 2003.
Em setembro de 2005, outro parceiro internacional, a UNICEF, promoveu uma formação com o
tema: ― aprender e ensinar, um exercício contínuo‖. Foi a primeira formação envolvendo os seguintes
componentes: psicologia infantil; pensamento lógico; metodologia do ensino; histórico infantil e saúde da
infância. Para além disso, essa formação deu a oportunidade de praticar os conteúdos através de jogos,
dinâmicas, músicas com gestos, fabricação de cartazes e teatro, entre outras atividades lúdicas.
Continuando seu processo de colaboração com a Plan International, no mesmo período, o Ministério
organizou outra formação com os formadores, abordando os seguintes temas: manejamento da classe;
fases do desenvolvimento infantil; planeamento anual; artes; músicas e jogos para as crianças, elementos
importantes para se estimular a criatividade dos educadores, bem como organizar a sua prática.
No periodo de 2006, o país enfrentou a crise política envolvendo a Falintil, Força da Defesa de
Timor-Leste(F-FDTL) e a Polícia Nacional de Timor-Leste(PNTL), o que gerou conflitos entre a
população da parte Leste (Loro-Sa‘e) e Oeste(Loro-Monu) do país, desestabilizando a segurança
nacional. Por isso, nesse período, todas as atividades de formação foram paralizadas. No ano seguinte, em
2007, a situação política normalizou-se pouco a pouco, com escolas e agentes educacionais voltando a
desenvover suas atividades paulatinamente, primeiramente no interior, já que em Dili a situação
permaneceu tensa em termos de segurança ainda por algum tempo.
Já o ano de 2008 foi marcado pela retomada de muitas atividades no sistema educacional, incluindo a
formação para formadores que contou com um curso programadado e organizado pela Professora Gilberta
da Conceição Baião, Chefe de Departamento da Direção Nacional do Ensino Pré-Primária (ME-TL),
juntamente com professora Márcia V. Cavalcante, integrante do Programa de Qualificação Docente e
ensino de Língua Portuguesa da Cooperação Brasileira em Timor-Leste(PQLP-CAPES). O curso foi
149
direcionado aos professores da Educação Pré-Escolar do Distrito de Dili8. Em 2009, houve uma formação
bastante significativa para os educadores do Distrito de Dili, voltado para a monitoração das oficinas do
curso de português instrumental, baseado no currículo da Pré-Primária – atual Pré-Escolar. Com carga
horária inicial de 73 horas, foi realizado pelo ME-TL em parceria com a cooperação Brasileira
(PQLP/CAPES), envolvendo aproximadamente 40 participantes. Nesse curso, realizado sem apoio
financeiro de outras organizações, os educadores participaram ativamente, contribuindo, inclusive, com a
compra de materiais. O curso estendeu-se para uma carga horária total de 200 horas e um de seus
aspectos positivos foi o envolvimento dos participantes com mais experiência no ensino-aprendizagem
daqueles ainda iniciando o estudo da língua portuguesa.
Ainda no período de 2009, o Instituto Fundação Alola cooperou com o ME-TL para a capacitação de
professores de Educação Pré-Escolar. Essa formação abordou temas como: literacia para infância; gestão
da classe; profissionalismo como um educador; música para pré-primária; jogos para o desenvolvimento
da coordenação motora.
No periodo de 2011, o ME-TL, através do IINFORDEPE, pela Direção Gabinete da Formação
profissional e Contínua (GFPC), realizou um curso intensivo para todos os professores em todo o
território. Nessa ocasião, aproximadamente 300 professores de Educação Pré-Escolar, entre voluntários e
permanentes, se concentraram no Distrito de Dili. Com carga horária de 150 horas, divididas em duas
fases, o curso teve o objetivo de completar os critérios para a carreira dos profissionais docentes nas áreas
de metodologia do ensino e ética profissional. A equipe de formadores era composta por doze
timorenses, pessoas escolhidas porque já tinham o conhecimento sobre educação pré-escolar desde o
período da ocupação da Indonésia, com experiência no ensino e também na gestão escolar, tendo atuado
como coordenadores das escolas onde lecionavam.
Tal formação foi obrigatória para os professores permanentes e contratados pelo Governo. Mas, na
realidade, permitia-se a oportunidade também para os voluntários participarem, de modo a aprofundar o
seu conhecimento e melhorar sua prática pedagógica. Outra vez sem apoio financeiro, a formação contou
com forte envolvimento dos formandos. Em abril de 2012, o INFORDEPE/ME organizou o Curso
Intensivo, com quatro formadores, voltado para a preparação de materiais, conteúdos, jogos, brincadeiras
e músicas, com o objetivo de ampliar os conteúdos curriculares em várias atividades para os professores
em base Distrital. A formação para os professores foi realizada nos polos de Baucau, Dili, Manufahi,
Bobonaro e Região Autônoma de Oe-Cursse, envolvendo diretamente os formadores daqueles polos.
Entre novembro e dezembro de 2013, houve uma formação exclusivamente para os professores que
frequentavam Bacharelato, Licenciatura/Formação Inicial e também para os que frequentavam o Curso
Complementar oferecido pelo INFORDEPE/ME/Gabinete de Formação Académica (GFA). Foram 30
formandos e 3 formadores, envolvendo 2 formadores timorenses e um brasileiro. Esta formação teve o
apoio da Cooperação Brasileira na elaboração do manual, bem como na sua execução. Já nesse momento,
houve o devido apoio para alimentação e transporte dos participantes.
Em abril de 2014, organizado pela Direção Nacional da Educação Pré-Escolar (DNEPE), juntamente
com os formadores nacionais da Educação Pré-Escolar do INFORDEPE, aconteceu a primeria formação
do ano, em cada Distrito, para os coordenadores da Educação Pré-Escolar. Tendo como tema central
―avaliação formativa‖, esses coordenadores multiplicaram a formação para os professores nas suas
respectivas escolas.
Diferentemente da anterior, a segunda formação foi realizada em três etapas. Na primeira, realizada a
partir da colaboração entre os facilitadores nacionais do INFORDEPE e um parceiro internacional – ONG
Nova Zelândia, trabalhou-se com os formadores dos cinco polos, durante três dias. A segunda etapa foi
8
Informações detalhadas sobre o Curso de Portugûes Instrumental-CPI, verificar: CAVALCANTE, Márcia V. (2013).
Ensino de língua portuguesa para professores da pré-escola: uma experiência em Timor-Leste. 108f. Dissertação
(Mestrado) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo.
150
voltada para os coordenadores e inspetores da Educação Pré-Escolar, em uma proposta de formação de
formadores. Em seguida, a terceira etapa foi realizada pelos coordenadores e inspetores que
desenvolveram um trabalho de multiplicação para os professores de seus respectivos Distritos. Esta
formação em particular teve muitos problemas, especialmente porque não foi específica para a Pré-
Escolar e sim realizada conjuntamente com o Ensino Básico, com insuficiência de material e problemas
na infraestrutura, o que causou grande insatisfação entre os particpantes.
Além destas formações de curta duração, em 2010, o Minitério da Educação, através do
INFORDEPE, criou um Curso Intensivo para os professores da Educação Pré-Escolar, dividido em quatro
competências: domínio da língua portuguesa, ética profissional, metodologia do ensino e conteúdos
curriculares. O curso teve duração de três anos e atendeu aos professores permanentes e voluntários,
compondo um grupo de aproximadamente trezentos e dez pessoas. Em 2013, com o apoio do UNICEF,
elaborou-se um novo currículo para a Educação Pré-Escolar, o mesmo foi aprovado pelo Parlamento
Nacional em 2014. A partir de então, todo o processo de formação vem sendo organizado pelo
INFORDEPE e DNEPE, juntamente com a Direação do Currículo, atendendo atualmente a mais de 900
professores, contando-se com 60 formadores, todos timorenses.
Conclusão
Por meio deste plano, o Ministério da Educacão tem cooperado com os parceiros internacionais e
nacionais para que, juntos, possam desenvolver a qualidade da Educação Pré-Escolar, facilitando a
formação dos professores, na revisão do currículo, no desenvolvimento de recursos didáticos e na
captação de recursos financeiros. Por outro lado, os parceiros estão diretamente envolvidos nas partilhas
dos conhecimentos e das experiências através das formações.
Sendo assim, é necessário afirmar que é necessário que cada vez mais a Direção Nacional da
Educação Pré-Escolar realize programas de formações intensivas, construa salas de aula adequadas para
a Educação Pré-Escolar, aumente o investimento na formação inicial e continuada dos educadores e
despenda esforços no desenvolvimento de recursos didáticos para a prática pedagógica.
Esses esforços são necessários levando-se em consideração desafios como: a carga horária do ensino-
aprendizagem insuficiente, grande número de crianças por turma, escolas, muitas vezes, sem espaço
suficiente para realização de atividades práticas com as crianças.
Um outro grande e talvez maior desafio é no que diz respeito à formação dos professores da
Educação Pré-Escolar. Já que de acordo com os dados obtidos, a maioria dos professores da Educação
Pré-Escolar tem apenas o nível secundário, o que indica uma necessidade de investir mais na formação
inicial, ou seja, na possibilidade de cursarem o nível superior na área de Educação com foco especial na
Educação Pré-Escolar. Para os professores que já possuem Licenciatura é necessário oferecer-lhes
oportunidade de cursos de Pós-Graduação voltado para Educação Pré-Escolar.
Em relação à formação continuada, precisa-se de um planejamento estratégico do Ministério da
151
Educação para que dessa forma esse processo seja mais efetivo e eficaz, no sentido de que haja uma
diversidade maior de abordagens temáticas nos programas das formações e que os projetos nessa àrea
sejam mais concretos no que diz respeiro aos objetivos e à continuidade.
Referências
FREIRE, Paulo (2001). Pedagogia da Autonomia: saberes necessaries à prática educativa. São Paulo,
Paz e Terra.
LUDKE, Menga e ANDRE, Marli.E.D (1986). A Pesquisa em Educação: Abordgens Qualitativas. São
Paulo: Editora Pedagógica e Universitária.
MARTINS, Francisco Miguel (2010). Autoavaliação Institucional da Educação Superior: Uma
Experiência Brasileira e Suas Implicações para a Educação Superior de Timor-Leste. Tese
(Doutorado) – Universidade Federal da Bahia, Salvador.
MATTA, Dinalba Ferreira e VASCONCELOS, Paulo Sérgio Torres (2001). A Educação e a Criança na
Pré-Escola: Metodologias Motivadoras e Sedutores. Monografia (Licenciatura Plena em Pedagogia).
Belém, Universidade do Amazonas.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (ME-TL) (2013). Direção Nacional da Educação Pré-escolar. Um
Referencial para as Política de Educação Pré-Escolar. Díli: Ministério da Educação (ME-TL).
REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DE TIMOR-LESTE (2008). Lei de Bases da Educação, Lei No.
14/2008 de 29 de Outubro. Díli: República Democrática de Timor-Leste.
152
PARTE III
EDUCAÇÃO POPULAR, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
153
154
EDUCAÇÃO TIMORIANA: UMA PROPOSTA ALTERNATIVA
Introdução
Conforme relatos escritos, ouvidos e vivenciados, era opinão dominante no inicio da intervenção das
Nacões Unidas em Timor-Leste, que o pais havia se transformado em ‗a blank slate - tabularasa‘. E de
acordo com a intelectual Australiana Helen Mary Hill (Boughton 2011), foi pautado nesse pensamento
que agentes internacionais e alguns timorenses construiram nosso Timor. O palácio presidencial era
chamado de Palacio das Cincas (Palace of ashes) do Xanana Gusmao em Caicoli, reforçando o
pensamento dominante da época. Havia a afirmação recorrente de que Timor não tem nehuma estrutura,
seja material ou imaterial, nada, zero, ‗we built timor out of nothing‘.
Podemos verificar hoje que o pensamento de tabularasa ou nothingness a respeito da jovem Nação
Timor-Leste, não se referia meramente as infra-estruturas em ruinas do nosso pais pós-ocupado pela
Republica da Indonesia, que saiu do territorio no final do ano de 1999. Mas o nothingness tem outros
signos conotativos tais como: a ausência do sistema sociopolítico, econômico e também a ausência de
conhecimento conforme o modelo eurocentrico9 do que seja definido como episteme. Timor foi reduzida
a tabulrasa, o territorio da ausência, dessa forma não se permitiu naquele momento que houvesse
contribuição de uma epistimologia timorense ja que na ausência não há nada a ser vislumbrado, aliás,
Timor não pode ter cultura e nem esperiências, sua localização e no vazio. Entretanto, pensadores como
Mojab e Dobson tem opiniões bem distintas. Eles defendem que os sobreviventes-resistentes de invasões
em seus proprios territorios têm a sua maneira de aprender e de se estruturar nos ambientes de guerra. Se
conseguiram a sobrevivência foi por causa de suas agências de inteligência, organização social,
habilidade de adaptação e inovação (Boughton 2011, p.193). Ainda de acordo com Mojab e Dobson, o
objetivo da educação continuada em Timor deve ser orientada pelo resgate das experiencas da educacção
da Resistencia, devido ao sentido que exerce no povo timorense e do dialogo com os diversos saberes na
qual foi contruida, que diga-se de passagem criados sob influência da necessidade.
Argumenta-se entre os estudiosos de ciências educacionais que as alternativas no universo da
educação constituem-se por dimensões e são elas: as políticas, as estruturais, as culturais e a natureza de
gestão e pedagogia. A pedadogia é talves o espírito da educação que o know howI adquirido procura
estimular os estudantes a serem independentes nos seus pensamentos, reflexções e ações (da Silva, AB
2014,p.81), por isso constiui-se em epistemologia.
A presente proposta de estruturação não finalizada (pois deve ser dinâmica, viva, em constante
construção) de uma Educação Timoriana refere-se a articulações entre as ciências e práticas, pautadas
sempre nas culturas, fé ou espiritualidades (beliefs) e praticas timorense, que vão constituir-se em uma
narrativa de educação contemporânea. Entretanto, a Educacão Timoriana tem a sua herança colonial, que
necessita de processos de compreenção, apontamentos críticos e debates, para assim superar toda forma
9
Conforme pensamento de Mignolo Eurocentrismo não dá nome a um local geográfico, mas à hegemonia de uma forma de
pensar Universal fundamentada no grego e no latim e nas seis línguas europeias e imperiais da colonialidade.
155
de poder colonial que insista em permanecer e subjulgar aquilo que se difere de um padrão uni-versal
ocidental. Em relação ao sistema de educação e do próprio fundamento que estabelece o marco zero
epistêmico, requerido como propriedade intelectual do poder colonial das metrópoles, deve-se procurar
percebé-los e questioná-los para dessa forma libertar-se da ciência unicamente colonial e edificar o
conhecimento e praticas timorense, não mais de forma subserviente e hierarquica a um modelo
hegemônico mais por meio da troca intercultural, porém de bases timorianas.
A finalização do poder colonial Português em 1975 foi substituida rapidamente pela imposição de
um novo sistema colonial, agora pela Indonesia, tambem em 1975, definido por análises jurídico-
internacionais de invasão, que culminou no surgimento de uma resistênsia popular que lutou em várias
frentes, nacionais e internacionais, até o ano de 1999. A vitória da resistencia foi determinada 24 anos
depois da invasão Indonésia numa votação popular que pôs fim a ocupação violenta e seguida de
estrangeiros, marca o inicio de um país soberano timorense. A educação timoriana hoje tem influência e
raizes desta complexidade do domino colonial, o Portugues, Indonesio e da Organização das Nações
Unidas (ONU) no periodo transição entre 1999 ate 2002.
A americana Susan Nicolai após trabalhar em Timor no inicio do periodo da transição liderada pelo
ONU em 2000, anunciou em sua pesquisa numa publicação com o titulo,‖Learning independence
education in emergency and transition in Timor-Leste since 1999‖, estabeleceu a sua posicão como
observadora educacional timorense do periodo pós-colonial. Nicolai argumenta que cada regime colonial
tem a sua herança (legacy), ―each of East Timor‘s administrations had introduced new ways of working—
language, civil service and structure---into the education system and indeed into governance as a whole
(NICOLAI, 2002, p.41)‖, e que hoje ainda permanece a influencia no sistema de educação timorense.
As heranças coloniais principais são divididas em tres grupos.
Primeira, o elitismo é uma das herancas coloniais. Existia uma escola de primeiras letras e de
educação que convidavam para frequentar seus cursos apenas os filhos dos régulos. Essa situação consta
em registros publicos do ano de 1839 (BELO, 2011, p.23). 100 anos mais tarde no inicio de 1940, con o
regime do Novo Estado, Salazar propôs contrato público com a igreja católica designando-a para
introduzir o sistema de educação nacional com o financiamento do Estado. Apesar de ser uma política
pública a educação não era universal, sua orientação estava voltada para servir a elite (LENNOX, 2000,
p.28; NICOLAI, 2002, p.41). A escola Liceu Dr. Francisco Machado, fundada em 1960, foi identificada
como estrutura pública voltada para a frequência dos filhos das elites colonias. Enquanto que a escola
técnica fundada no ano de 1968 oferecia estudos mecânicos e comerciais, como a escola nocturna e
privada Francisco Xavier do Amaral, em St.Cruz, foi escola dos Mauberes, dos operários e camponeses.
Segunda herança colonial foi a politica linguística. Em 1901, o missionário Padre Manuel Mendes
Laranjeira publicou uma cartilha da língua tétum que foi adotada como método oficial para todas as
escolas de Timor (BELO, 2014, p.46). Entretanto o tetum nao foi desenvolvido pelo Estado Colonial
dentro dos currículos escolares. Não havia publicação dos dicionários, livros e revistas em lingua tétum.
O Governo portúguês, não por a caso, utilizou a língua portuguesa como lingua intermediária até o ano de
1975. Durante o periodo da ocupação-invasão da Indonésia, a lingua Indonésia (uma versão da lingua
malay) foi a lingua educacional em todo nivel de ensino e até hoje ainda possui sua influência no sistema
de educação timorense.
Terceira herança colonial foi um sistema de reprodução sem adaptação do sistema educacional
colonial. Da Silva (2011) argumentou que o obscurantismo foi uma politica colonial para continuar o
domínio sobre o povo timorense. Ate 1974, menos de 20% dos timorenses foram literados. Nicolai
argumenta ainda que a educação em Timor foi uma forma de promoção da cultura portuguesa e valores
Católicos, apesar da inculturação desses valores. Um exemplo atual da continuidade da promoção cultural
portuguesa, é a não aceitação de registro de nomes timorenses na certidão de nascimento, permiti-se
apenas nomes cristãos.
156
Nicolai (2002, p.42) defende que ―It was done through encouraging portugues culture and Catholic values.
Teaching did not include local culture or geography, and instead emphasized the East Timor‘s links with the empire.
Essentially, during this period, ties to Portugal represented ‗a window to the west‘ for the elite‖. Salienta ainda o
autor que durante o periodo da ocupação Indonésia, o governo transformou a situação, investindo na
politica de educação universal a todos e quantitavimente os números das escolas e estudantes cresceram.
Identificou-se 788 escolas primárias com 167.181 estudantes; 114 escolas pre-secundárias com 32.197
estudantes; 54 escolas secundárias com 18.973 estudantes no final de 1999. Apesar de tudo, a educação
teve o objectivo de ‗indonezianization‘ dos timorenses para ser fiel ao Indonésio (NICOLAI, 2002, p.43),
e o resultado foi contrário pois o povo decidiu o seu destino para ser uma nação soberana. Outro objetivo
da educação foi fundamentar o desenvolvimento econômico, de acordo com a orientação do
desenvolvimento do arquipélago (Nicolai,S 2002, p.43). Mas na altura, os timorenses estavam lutando
pelos seus direitos de auto-determinação politica. O interesse de desenvolvimento da economia foi para
beneficiar mais os Indonesios, particularmente os generais e as elites militares e não os povos locais
timorenses.
Fox (2006) e Da Silva (2014) fizeram observações semelhantes ao de Nicolai. Fox colocou o
sistema de educação timorense dentro da perspectiva teórica do Estado pós-colonial. A complexidade da
educação pós-colonial, de acordo com Fox é caraterizada por uma corrente triangular entre a herança
colonial, política de formacão do Estado e a realidade da globalização. Cada um deles tem a sua
influência na educação nacional pós-colonial. A questão da política linguística em Timor, a controvérsia
na adoptação do Tétum e Português, constitui uma das caracteristicas da educação pós-colonial (CARL,
2006). No ano de 2000 até meados de 2002, o Governo transitório foi liderado pela ONU, onde a
educação era orientada ao ensino primário que, foi implementado de acordo com a vontade do Banco
Mundial, estratégia pela qual visava combater a pobreza e fomentar o crescimento econômico.
Na mesma perspectiva, de acordo com Da Silva, os desafios da nossa educação sāo combinacões de
causas políticas, estruturais, socioculturais e a natureza da gestão e pedagogia. Obviamente que as
soluções são as combinações dos mesmos aspectos, entretanto são necessidades imediatas (Da Silva,
2014, p. 81). Noutro artigo sobre a educação da paz, Da Silva (2013) acrecentou ainda que o sistema da
educação Timorense está infrentando uma relação triangular dos poderes entre domínio positivista da
ciência, poder politico, fé ao poder das práticas rituais e religião comunitarias e a religião moderna como
cristianidade e o Islamismo. Estes desafios são realidades e tensões contemporâneas. Os timorenses
recorrentemente nos últimos tempos enfrentam estas complexidades para tomar decisões na vida
cotidiana, tanto como cidadãos como um Estado jovem e soberano.
O poder politico dessa triangulação refere-se aos sistemas políticos nacionais e internacional, que
tem a influência na direção e na filosofia da nossa educação. As tentativas da intervenção internacional ao
sistema timorense para influenciar o nosso sistema de educação de acordo com o sistema neo-liberal é
extremamente forte por parte das agencias internacionais. O resultado disso é a redução dos objectivos da
educação para fomentar a reflexão e emancipação e o excessivo olhar para o crescimento econômico.
Transformação desta relação triangular, salientou Da Silva, o objectivo da educação da paz Timorense
(Da Silva, 2013.p.21). A educação também possui o seus problema nas areas de gestão pedaģógica,
como a deficiencia na formação continuada de gestores educacionais.
Quanto a pedadogia, como afirmado anteriormente, é talvez o espírito da educação que a experiência
acumulada desde o periodo da resistência, poderá dar sentido e facilitar os estudantes serem
independentes no seus pensamentos e ações. Neste caso a pedagogia do sistema bancário, que apenas
deposita o conhecimento em uma relação hierarquica de quem sabe para quem não sabe (professor-
estudante) deve ser ultrapassado. A própria construção do termo a-luno significa sem luz, ou seja, sem
conhecimento.
157
Os Professores e o domino da ciência e pedagogia
O Governo, junto com a cooperação portuguesa, facilitou o curso de português nos distritos para
assegurar o dominio da língua portuguesa, mas muitos ainda necessitam de mais formação (Nicolai, 2002,
p.102). A Universidade Nacional Timor Lorosae (UNTL) tem mais de 400 professores, mas pela primeira
vez, após de 15 anos de sua nova estruturação, começou a formação dos professores. No inicio de Março
de 2015, a UNTL organizou uma conferéncia de dois dias sobre o Research Based Teaching and
Learning (RBTL). Não só formação da língua, mas também formação pedagógica e formação permanente
das matérias, passando pelas pesquisas e seminários, entretanto ainda são futuros compromissos do
Ministério da Educação a continuidade dessas ações. Outras medidas para mobilizar e encorajar os
professores e o incentivo da criação de sindicatos dos professores. O único sindicato que existi hoje é o
Sindicato dos Professores de Timor-Leste. Antigamente chamado de East Timor Teachers, associação
fundada pelos Estudantes da Solidariedade em 2000 (Nicolai, 2002. p.94). Entretanto não se encontra
sindicatos dos professores do ensino superior tanto público como privado. A combinação de medidas
estruturais realizadas por iniciativas dos professores são cruciais para contribuir no melhoramento da
qualidade do ensino em todos os níveis.
Os professores podem aprender através das praticas existentes, resgatando as práticas do período da
resistencia e levando em conta as praticas culturais. UNICEF estabeleceu programas Eskola Foun (Nova
Escola) que utilizam child centered learning (CCL) com os seguintes princípios: ―inclusiveness, child-
centredness in terms of pedagogy and provision of healthy, safe and protective learning environments;
and democratic participation‖ e aplicação destes princípios pode alcançar uma educação com mais
qualidade. A formação dos professores é integrada e 339 professores vêm de 38 escolas com 12.602
estudantes envolvidos no projecto (UNICEF Timor-Leste 2010. p.20). O Governo estabeleceu o Instituto
de Formação dos Docentes e Professores de Timor-Leste (INFORDEPE) como centro operacional desse
processo, e com apoio da Cooperação Brasileira o Instituto esta oferecendo uma alternativa de formação
para melhorar a qualidade de ensino e aprendizagem.
158
Batalha pela Epistimologica Timoriana
O intelectual Frances Facoult argumentou que conhecimento é poder. Desde a época da renascença
onde a razão significava superioridade e possibilitava a abertura de caminhos para a revolução industrial,
reflete até os dias de hoje, Knowledge is power and belong. Essa ideologia permanece e as superpotências
do norte adotam esse principio. Pelo fato de ter conhecimentos tecnologicos produzidos e acumulados,
surge o impeto de descobrir e dominar outros mundos distantes, impondo uma colonização da terra, do
corpo e da alma, produzindo politicas locais e internacionais imperialistas. E com os alicerces nestes
principios, hoje ainda persiste poderes coloniais, que se resignificam e se camuflam na educação, politica,
sociedade, espiritualidade, moda etc. Da nossa parte, podemos continuar nossa resistência vitoriosa e
questionar a influência de politicas de dominação e de benefício principalmente aos paises imperiais.
O nosso sistema de educação dependente e reproduz a ciencia Uni-versal e um modo de vida
eurocêntrico, em detrimento a um pensamento timoriano Pluri-versal, que respeita as culturas, tradições,
linguas e dialoga com outros saberes. Imposição da ciência e tecnologia estrangeira significa também a
imposição da epistimologia eurocêntrica e suas linguas imperiais (ingles, francês, portugues, alemão,
espanhol e italiano).
Dentro de uma episteme timoriana, o conceito matenek em lingua Tétum refere-se ao sujeito que tem
domínio dos assuntos da vida e ainda constitui-se outro significado, do substantivo knowledge que o
sujeito ganha por meio de sua capacidade de compreender - hatene as externalidades e os fenômenos que
acontecem na vida. O Naueti, lingua nativa encontrada na zona de Matebian, que tem semelhança ao Uai-
ma, Kairui, Nikidi e Idate, nas outras zonas de Baucau, Viqueque e Manatuto, existe o conceito táda que
se asemelha ao to know do Ingles. Alguém que conhece bem ou tem domínio a qualquer assunto ganha o
adjetivo tada-ná (knowledgeable) e normalmente são as pessoas que possuem mais experiências da vida
comunitaria. Na lingua Naueti tem outro conceito, tada-osi refere-se domínio de assunto, que demonstra
aproximidade ao conceito knowledge.
Tetum Naueti
Hatene Tada = to know (Verbo)
Matenek Tadána = knowledgeable (substantive); knowing;
MatenekTada-osi = tem domino o assunto ou tenho conhecemento.
O matenek ou o tada-osi tem a sua hierarquia. O matenek dos timorenses tem a sua cosmologia. O
conhecimento sobre os assuntos metafísicos e espirituais normalmente são considerados a pessoas
matenek por causa da sua permanência na pratica do pensar e de compreenção dos fenomenos fora do
domínio humano.
A herança colonial foi profundamente internalizada pela nossa educação e o conhecimento dos paises
colonizadores subalternalizou os conhecimentos nativos. A reclamação dominante hoje em dia no Timor
e o processo de aculturação dos valores religiosos e das linguas locais, por imposição de uma
alfabetização pautadas na cultura grega e romana são questões simbólicas do colonialismo Português.
Mas parece que existe a aceitação por parte dos timorenses e de agentes internacionais, o progressivo
crescimento das religiões estrangeiras e a supressão das religiões nativas, a adaptação da lingua
portuguesa e supressão das linguas e epitimologias locais e adoção da cultura escrita e o desaparecimento
das culturas orais timorenses.
A nossa educação colonial foi orientada para dominio do knowledge dos colonialistas. Aprendermos a
matemática, ciências naturais, filosofia e ciências sociais desenvolvida na Europa. Mas uma educação
timoriana tem outro objetivo: resgate da educação do periodo da resistência e o conhecimento baseado
nas cosmologias das terras de Timor.
O recente debate sobre o progresso da nossa nação é identificado com o conceito crescimento, growth,
trata-se de assunto emergente. Qualquer regime politico que acolha o growth como paradgma do regime.
159
As nossa educação então aceita o conceito como ciência nas nossas escolas. Os intelectuais que
analisaram o growth, identificaram que o growth tem suas limitações. Growth tem alta dependência dos
recursos naturais. O nosso growth depende da indústria do petroleo. Quando acabar o petroleo,
considerado recurso não renovável, o growth vai desaparecer também.
Mas o nosso sistema politico reproduz o conhecimento sobre growth nos textos, que vai ser fonte das
ciências nas universidades. Mas o conceito growth tem caráter acumulativo. Existem praticas culturais
que os Mombaes de Timor chamam de Slulu-Mlulu (Ermera e Ainaro), e os Makalero‘s chamam de
Fulidadai, e Manatuto (Arosan) e Bunak (Kawak), em Anhamland e indigenas do Norte do territorio
chamavam de Garma. Esses exemplos são um conjunto de praticas de trabalhos colectivos da comunidade
nas áreas da produção agricola e trabalhos sociais. Estamos a tentar construir uma escola chamada
Economia Fulidaidai-Slulu nas zonas de agriculturas em Timor, para encorajar o progresso da
epistimologia timoriana, de acordo com a cultura do povo. Suas bases são comunitarias, coletivistas e
espirituais, de produção e respeito com a natureza.
Até hoje, a privatização da educação, da saúde e recentemente da água, que antigamente eram
consideradas bens comums são pacotes da política neoliberal. Escreveu Garrett Hardin (1968), a tragédia
de bens comums, para protestar contra a política de privatização do mercado capitalista neoliberal. Mas,
mesmo assim, os novos Estados pós-coloniais seguiram e seguem o modelo do Estado neoliberal.
O Timor-Leste tem apenas uma única universidade nacional, a UNTL que por exemplo, admitiu
menos de 3000 estudantes no ano lectivo de 2015, e abandonou os outros mais de 12.000 graduados
secundaristas por ano nas mãos das instituições privadas, que operam em condições precárias além de
serem muito caras para o padrão de Timor. Entretanto, encontra-se no plano estratégico da UNTL uma
cláusula que diz o seguinte: ―conduct demand survey to identify courses that are needed in the market
and introduce new courses based on the market needs (UNTL 2011, p.32), que demonstra a influência da
política neoliberal. A Universidade Nacional Timor-Lorosae (UNTL) pela primeira vez discute o método
Research Base Teaching and Learning (RBTL), que antigamente era associada ao participatory research
promovido pelas agências de saúde do Reino Unido.
No mês do março de 2015, mais uma vez o plenário da UNTL foi dominado por assuntos
empresariais, não era a promoção do Estado e luta das comunidades pela justiça, economia local e
ambiente, e não havia a reflexão sobre o real contexto social dos timorenses, que a maior parte do povo
são camponeses e que são dependentes do sector da agricultura de subsistência.
160
Para definir os desafios da nossa educação timoriana, torna-se necessário considerar também os
regimes criticos do sistema de educação, tanto do Paulo Freire e a crítica contra a educação neoliberal,
quanto explorar as alternativas ainda existentes no contexto timorense (como a agricultura e economia
coletiva da fulidaidai, por exemplo) e mundial recente. O paradigma clássico e neoliberal, de acordo com
Gadotti, já causaram muita dor, muito sofrimento a professores e estudantes, e estão levando o planeta na
rota do esgotamento de seus patrimonios naturais. Ele como muitos outros intelectuais apelam para a
necessidade de um novo paradigma educacional (GADOTTI, 2009).
Gadotti propõe uma nova civilização, denominada civilização planetária, como visão alternativa da
sociedade mundial e uma nova pedagogia chamada Pedagogia da terra, para a promoção da
aprendizagem do sentido das coisas a partir da vida quotidiana. A eco pedagogia parte de uma
consciência planetária (gêneros, raças, espécies, reinos, educação formal, informal e não formal...) -
(GADOTTI, 2001). No final, a educação pela libertação e a educação em defesa do Estado e da
subsidiariedade das comunidades locais, não são de interesse do mercado capitalista regional, nacional e
global.
Em Timor existia as práticas duma nova pedagogia timoriana. A Pedagogia Maubere como uma
narrativa timorense sobre as práticas científicas e culturais revolucionárias durante o período da luta pela
Independência, também o imperativo da preservação da relação intrínseca do povo com a natureza e
mundo, planeta ou Rai Inan. Da Silva (2009) falava sobre o desaparecimento das plantações como
sândalos nos inícios dos anos de 1900, do bombardeamento por bombas químicas nos finais do ano de
1978, e o estabelecimento dos campos de concentração de massa nas terras baixas ao longo do ano de
1980. Todos causaram destruições ambientais, e hoje o Timor possui apenas 8% de suas florestas
originais.
Naori Miyazawa salientou sobre o destruição de 192,250 hectares das zonas florestais entre os anos
de 1972-1999 associado à ocupação do regime militar indonésio (MIYAZAWA, 2002, p.21). Estabeleceu
o grupo informal CHE (Collegio da Humanidade e Ecologia) 2004 e organizou um estudo de ação
participatório envolvendo mais de 100 estudantes sobre a identificação de destruição ecológica ao longo
das terras altas de Dili, foi uma prática alternativa educacional da Pedagogia de Maubere que ganhou
simpatia dos participantes. Necessitamos multiplicar ações como estas para podermos oferecer
alternativas que potencialmente construirá relações orgânicas entre escola de qualquer nível com as
comunidades locais como arena de aprendizagem orientada à proteção do nosso ambiente e da nossa
cultura.
Pedagogia da terra e a Pedagogia de Maubere são novas pedagogias, que necessitam debates e
inovações para promover uma qualidade da vida humana e do planeta, que significa o futuro da existência
da humanidade.
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162
CIRCULANDO SENTIDOS NO PISA: ANÁLISE DE DISCURSOS
SOBRE CIÊNCIAS E TECNOLOGIAS
Introdução
Neste trabalho são apresentados e discutidos parte dos resultados de uma pesquisa envolvendo
aspectos do funcionamento da leitura em sala de aula de ciências, a partir de textos do campo da leitura e
das ciências naturais, veiculados pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes – PISA
(SIMAS FILHO, 2012). Originalmente a pesquisa teve como objetivos: compreender que sentidos sobre
ciências e tecnologias (C&T) são produzidos por estudantes do nono ano do Ensino Fundamental;
analisar as condições de produção da leitura e dos discursos envolvendo esses textos, em situações de sala
de aula, na disciplina de ciências, em uma escola fundamental. Aqui faremos um recorte com o intuito de
compreender que sentidos sobre C&T circulam em textos do PISA. Para tanto analisamos discursos de
C&T presentes em um texto da prova do ano 2000, intitulado ―A tecnologia cria a necessidade de novas
regras‖ (PISA 2000:97).
Considerando esse contexto, assinalamos que Almeida (2004), em estudos sobre a ciência e a
linguagem, enfatiza o papel da C&T como entidades sociais. Nesse sentido, traz questões epistemológicas
importantes para a compreensão da C&T, explorando especificamente aspectos como a ideologia e as
leituras possíveis envolvendo esses campos de conhecimento. A autora, tendo como suporte a Análise de
Discurso (AD) de linha francesa, aponta possibilidades para a leitura escolar dos discursos sobre C&T,
visando analisar as condições de produção desses discursos. Nesse aspecto, a autora assume que:
Partindo desse pensamento, realizamos um estudo qualitativo, tendo como aporte teórico-
metodológico a AD de linha francesa com foco para as questões que envolvem a não transparência da
linguagem e a não neutralidade dos discursos sobre C&T que circulam na prova do PISA e na sociedade.
Pontuamos que os critérios para a escolha do texto focaram nos aspectos das relações entre Ciência,
Tecnologia e Sociedade (CTS) em uma perspectiva latino-americana (LINSINGEN, 2007; THOMAS,
2008; DAGNINO, 2008; LINSINGEN e CASSIANI, 2010). Sendo assim, nessa perspectiva, a educação
CTS se filia aos diversos aspectos das relações sociais e econômicas regionais que envolvem o campo das
políticas públicas de C&T e tem por objetivo ―restabelecer o elo entre ciência e sociedade no ensino de
ciências e tecnologias na America Latina, por meio de sua natureza social, cultural, política e econômica‖
(LINSINGEN, 2007:2). Portanto, nesse viés, o ensino de ciências pautado na educação CTS em uma
linha latino-americana, tem como pressuposto abordagens educacionais contextualizadas, socialmente
referenciadas e comprometidas em termos curriculares (LINSINGEN, 2007). Nesse sentido, concordamos
com Linsingen (2007), que um ensino de ciências desenvolvido sob o enfoque CTS possibilita ―maior
inserção social das pessoas no sentido de se tornarem aptas a participarem dos processos de tomadas de
decisões conscientes e negociadas em assuntos que envolvam ciência e tecnologia‖ (Idem:13)
163
Aspectos teóricos-metodológicos
Partindo do princípio de que não há pesquisa ateórica, portanto, nem metodologia ateórica (Perroni,
1996:17) a opção e compreensão dos aportes teóricos e metodológicos utilizados na análise do corpus
influenciaram substancialmente este trabalho, especialmente porque o mesmo insere-se no campo da
linguagem com interfaces no ensino de ciências. Dessa forma, ao optarmos pela AD de linha francesa
como referencial teórico e analítico, concebemos o discurso como parte da natureza humana, ou seja,
como uma realização do sujeito, sendo por isso um ―objeto‖ sócio-histórico e ideológico que torna
possível a transformação do homem e da sua realidade. Para a AD o discurso é definido como efeito de
sentidos entre interlocutores (PÊCHEUX, 1995), os quais são entendidos aqui como sujeitos do discurso.
Para esse referencial, o sujeito está submetido à linguagem e se constitui quando o indivíduo é interpelado
pela ideologia (ORLANDI, 2009).
Nessa perspectiva discursiva, o ―dado empírico‖ é caracterizado pela incompletude, já que a
linguagem é tomada como não transparente. Esse aspecto é questionado pela AD ao interrogar, por
exemplo, a existência de um único sentido para um texto ou imagem, isto é, para um ―dado‖ de
linguagem. Os sentidos sempre podem ser outros. Logo, segundo Silva, Baena & Baena (2006), o
problema da transparência da linguagem na pesquisa na área da educação científica ―pode aparecer de
diferentes maneiras, na maioria das vezes implícito, quando trabalhamos com a análise de ‗dados‘ de
linguagem‖ (Idem: 349).
Dentre essas maneiras, os autores destacam que o problema da transparência da linguagem pode
surgir quando se considera, por exemplo, que não haveria mediação teórica nos sentidos que são
―captados‖ pelo pesquisador com base nesses ―dados‖ e quando eles refletem a realidade, ou melhor,
deixam-na visível como se ela própria, a linguagem, não existisse, e pudéssemos encontrar o mundo, o
sentido, o conteúdo por meio dela, sendo apenas uma constatação de evidências. Nessa dimensão, quando
a linguagem é tratada como transparente, considera-se que a forma é separada do conteúdo, ou seja, o
como se diz do que se diz (SILVA, BAENA e BAENA, 2006).
Ao considerarmos a não transparência da linguagem, pensamos que as leituras dos textos do PISA
vão além da mera decodificação de palavras, frases e imagens. Eles são objetos discursivos que
possibilitam a articulação das questões do discurso da/sobre C&T aquelas do sujeito e da ideologia.
Textos esses passíveis também de leituras polissêmicas sobre C&T. Nesse contexto, visando estabelecer
relações menos ingênuas e menos naturalizadas sobre a forma como C&T podem ser entendidas e
mediadas constitutivamente pela linguagem em sala de aula de ciências, nosso olhar se volta para as
relações entre ciência, tecnologia e sociedade (CTS). Numa perspectiva CTS a educação científica deve
considerar aspectos sócio-políticos, econômicos e culturais. Sendo assim, os alunos devem ter a
possibilidade de refletir sobre a ação humana e os reflexos da C&T sobre o ambiente e a sociedade,
deixando de lado o discurso ingênuo de proteção à natureza, mas discutindo sobre as questões sociais
relacionadas à produção, consumo e desigualdade social (KARAT, CUNHA e SIMAS FILHO, 2011).
Nesse sentido, Linsingen (2007, p. 13) considera que:
Assim, levando em conta esses aportes, abordaremos na sequência algumas análises. Reforçamos que
para a AD todo discurso se estabelece na relação entre interlocutores e, portanto, não há discurso pronto e
acabado, pois um discurso remete a outro(s). Dessa forma,
164
Cada material de análise exige que seu analista, de acordo com a questão que formula,
mobilize conceitos que outro analista não mobilizaria, [...]. Uma análise não é igual a
outra porque mobiliza conceitos diferentes e isso tem resultados cruciais na descrição
dos materiais. (ORLANDI, 2009:27)
No presente estudo, o texto que é foco de análise com base na AD têm origem na leitura das provas
do PISA. O PISA é um sistema de avaliação internacional focado nas áreas de leitura, matemática e
ciências e aplicado ciclicamente (a cada três anos) a estudantes de quinze anos dos países membros da
Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e de outros países ―convidados‖. O
Brasil, por exemplo, tem participado do programa como convidado desde sua primeira aplicação, no ano
2000.
Como o PISA busca articular seu conteúdo a realidade dos estudantes é comum, dentre as situações
discursivas serem explicitadas questões legais e éticas que afetam a C&T. Sendo assim, o corpus de
análise nesse trabalho constitui-se do texto ―A tecnologia cria a necessidade de novas regras‖, item
veiculado ao PISA 2000, pertencente a um gênero jornalístico do tipo editorial, cuja autoria não foi
revelada na prova. O texto tem como objetivo debater e formar opinião sobre questões jurídicas e éticas
envolvendo o destino de dois embriões congelados deixados por um casal de australianos mortos em um
acidente aéreo.
Partindo de um olhar de que não há neutralidade nos discurso de/sobre C&T na sociedade, e de que
esses discursos e a linguagem não são transparentes, passamos a considerar e levantar alguns
questionamentos: Que possíveis discursos de C&T estão presentes no texto analisado? O que esses
discursos poderiam estar silenciando? Que sentidos de C&T esses discursos materializam? Em síntese:
Que possíveis discursos de/sobre ciências e tecnologias podem estar circulando nos textos do PISA?
Considerando esse contexto, inferimos que os textos veiculados no PISA trazem em si uma
discursividade, isto é, uma possível multiplicidade de discursos sobre C&T. Sendo assim, apontamos que
o discurso só se materializa porque há uma interlocução entre sujeitos, os quais se constituem na relação
do simbólico com a história e a ideologia (ORLANDI, 2009).
Nesse aspecto, é possível perceber no texto analisado vestígios de um discurso que remete a
possibilidade de que as ciências e as tecnologias são processos unívocos. Desta forma, observamos que o
título do texto ―A tecnologia cria a necessidade de novas regras‖ (PISA 2000:97, grifo nosso), poderia
ser interpretado como ―A ciência cria a necessidade de novas regras‖ (grifo nosso). Embora esse título
remeta para um discurso relacionado às tecnologias, o texto inicia dessa forma: ―A CIÊNCIA, tem a
tendência de andar adiante [..]‖ (PISA 2000:97, grifo nosso) leva a um efeito de sentido que a CIÊNCIA
(escrita em letra maiúscula) é responsável pela necessidade da criação de novas regras. Além disso, essa
parte inicial do texto nos dá também indícios de sentido que remete a um discurso inaugural da ciência
sobre o desenvolvimento humano, como pode ser visto num outro recorte do texto: ―A CIÊNCIA tem
tendência de andar adiante da lei e da ética. Isso se comprovou, [...] com as técnicas para superar a
infertilidade humana‖ (PISA 2000:97, grifo nosso).
Considerando esse recorte também percebemos marcas de um discurso em que as tecnologias são
consideradas unicamente como a técnicas. Logo, pensemos que nesse texto as tecnologias são concebidas
como um conjunto de habilidades empíricas (DAGNINO, 2008), portanto, de caráter procedimental
(LINSINGEN, 2007). Dessa forma, concordamos com Linsingen (2007) quando menciona que em se
tratando de ensino de ciências e tecnologia é necessário uma mudança de olhar, no sentido ―em que a
atividade tecnocientífica, pensada como atividade meio, passaria a ser orientada por uma lógica distinta
da que hoje à estrutura, orientada para a técnica como meio e não um fim em si mesma‖ (Idem:3). Assim,
165
em termos de processo de ensino-aprendizagem acreditamos que essa mudança de olhar pode propiciar
um movimento pedagógico que amplie a visão sobre as tecnologias correntes no cotidiano dos alunos.
Outro aspecto a ser analisado é que podemos perceber indícios no texto de um discurso determinista
sobre C&T, pois observamos um possível sentido de que quanto mais as ciências progridem, mais as
tecnologias avançam e mais a sociedade se desenvolve. Desse modo, observamos marcas de um
determinismo das ciências sobre as tecnologias.
A partir desse excerto, podemos evidenciar que os avanços das ciências são responsáveis pelo
desenvolvimento das tecnologias, ou seja, os ―avanços das técnicas para superar a infertilidade humana‖
são determinados pelo desenvolvimento das ciências no campo da pesquisa em reprodução humana.
Assim, concordamos com Thomas (2008:218) que é impossível e inconveniente realizar a priori
distinções entre ―o científico‖, ―o tecnológico‖, bem como ―o social‖. O referido autor utiliza-se da
metáfora do ―tecido sem costura‖ para caracterizar as relações CTS numa abordagem sociotécnica, onde
o argumento central é que C&T são socialmente construídas e a sociedade é cientifica e tecnologicamente
construída. Logo, concordamos com Thomas (idem) quando diz que somente a partir de uma abordagem
sociotécnica para CTS poderemos superar as limitações dos determinismos científicos, tecnológico e
social.
Outro ponto aqui a ser analisado é que e que o texto está relacionado à divulgação científica e por
isso, consideramos uma ilusão acreditar na neutralidade da mídia impressa e eletrônica. Nessa ótica,
salientamos que os textos veiculados pelo PISA não são instrumentos neutros, pois foram produzidos sob
determinado contexto socio-histórico, político e ideológico. Dessa forma, ao colocar nas avaliações
determinados tipos de textos e temáticas em detrimento de outros, o PISA, garante a hegemonia de um
conhecimento eurocêntrico e assegura o status quo dominante sobre os países participantes. Sendo assim,
pensamos que o discurso de/sobre C&T que o PISA se filia segue a visão de um conhecimento mono
cultural equivocadamente universal, numa perspectiva de perpetuar um modelo de C&T, que se filia a
neutralidade da produção do conhecimento científico e tecnológico, bem como a uma visão empirico-
indutivista, a-histórico e dogmático desses conhecimentos. Logo, um conhecimento que serve como
instrumento de regulação econômica e que promove a ideologia fatalista que anima o discurso neoliberal
da globalização (FREIRE, 2009).
Considerando a historicidade do texto e os processos de construção dos efeitos de sentido, passamos
a elencar o que ele possivelmente silencia. Pontuamos que o não-dito em um texto é significante, tem
história, não é apenas um complemento da linguagem (ORLANDI, 2007; ALMEIDA, 2004). Portanto, o
silêncio produz efeitos de sentido. Podemos observar tais efeitos quando é apresentado no texto a ideia de
que ―A CIÊNCIA tem a tendência a andar adiante da lei e da ética‖. Essa frase pode remeter a um não-
dito que considera a ciência como uma entidade superior e envolta em verdades absolutas. Nesse caso, o
conhecimento científico é visto como rígido, absoluto, neutro e infalível, já que não é posto em dúvida.
Outro efeito de sentido relacionado ao silêncio possivelmente está na forma escrita da expressão ―A
CIÊNCIA‖, destacada no texto em letras maiúsculas e logo no início da frase. Essa expressão pode
marcar um discurso imperativo e autoritário para a ciência. Então, apesar de se tratar de um texto
polêmico e atual, trazendo uma controvérsia sobre de embriões humanos, ao observarmos o seu
funcionamento pensando o ensino de ciências, podemos inferir que o texto não garante um contraponto à
interpretações do ensino tradicional, onde o professor assume um discurso de C&Ts como verdadeiro,
desconsiderando os sentidos produzidos pelos alunos em suas vivências, nem mesmo trabalhando com
uma ideia de C&Ts mais críticas.
166
Por fim, pontuamos que nos discursos que envolvem a ciência, a voz do cientista, representa uma
voz coesa e unívoca do conhecimento científico, respaldando a autoridade científica. É por isso que é
possível perceber marca de um locutor-enunciador universal que garante a verdade, própria do
conhecimento científico e o consenso das notícias veiculadas (ORLANDI; GUIMARÃES e TARALLO,
1989). Nesse aspecto, com base no texto, pensamos que a ciência pode expressar um sentido vinculado à
verdade, o que remete a um discurso livre de controvérsias. Decorrente disso, acreditamos que as C&Ts
estão longe de ser consenso na sociedade, embora comumente sejam vistas dessa forma. Pensamos que
tais empreendimentos humanos são elementos de disputa na sociedade, e, portanto, não neutros, já que
estão envolvidos em interesses tanto de cunho econômico quanto político.
Algumas considerações
Dependendo dos interlocutores envolvidos no discurso, determinados sentidos de/sobre C&T podem
ser produzidos, pois em todo discurso existe o já dito, a memória, o interdiscurso que está além dos
sujeitos, atravessa as posições assumidas pelos sujeitos nos discursos. Portanto, é possível realizar leituras
parafrásticas (o mesmo, o já lá no texto) de/sobre C&T, pois em todo dizer há sempre algo que se
mantém, isto é, que permanece. Porém, por outro lado, múltiplos sentidos, não infinitos, podem ser
produzidos em cada contexto, abrindo-se para leituras polissêmicas (o a se dizer, o diferente), numa
ruptura de processos de significação, onde acontecem deslocamentos de sentidos sobre C&T (ORLANDI,
2000, ORLANDI, 2009). Logo, embora seja difícil traçar limites definidos entre a paráfrase e a
polissemia, pois existe uma articulação entre essas formas de leitura, devemos considerar que a
linguagem funciona na tensão entre o mesmo e o diferente, ou seja, entre a leitura parafrástica e a leitura
polissêmica dos discursos de C&T (ORLANDI, 2000).
Pensando nesses aspectos e considerando a realidade do ensino de ciências no Brasil, percebemos
uma contradição ao se trabalhar com os discursos de/sobre C&T em aulas de ciências. Sendo assim, o que
nos parece ser mais frequente é uma prática discursiva com fortes tendências a processos parafrásticos, já
que normalmente são priorizadas formas de leitura e de escrita vinculadas ao livro didático, onde o foco é
a repetição, a homogeneização, a busca de uma interpretação única e a sedimentação de sentidos
dominantes de sobre C&T, ou seja, a busca de um ―sentido verdadeiro‖ sobre C&T. Assim, uma prática
focada somente em leituras parafrásticas pode resultar num fazer pedagógico que considera as C&Ts
como absolutas, neutras, ahistóricas e universais.
Para Orlandi, (2000; 2009) quando pensamos discursivamente a linguagem, num movimento entre o
já dito e o a se dizer, estamos produzindo mudanças na rede de filiação de sentidos, e é nesse jogo entre a
paráfrase e a polissemia que os sujeitos e os sentidos fazem suas trajetórias, se significam. Portanto,
acreditamos que o processo de ensino aprendizagem assentado na tensão entre essas duas ―forças‖
(paráfrase e polissemia) viabiliza novas perspectivas para a educação, especialmente a educação científica
e tecnológica, pois possibilita a abertura de espaço para o movimento, a construção de outros sentidos, o
―novo‖, tendo como decorrência a superação de um modelo hegemônico de transmissão de
conhecimentos e de assimilação de sentidos sedimentados. Assim, de acordo com o campo de
conhecimento da AD, é necessário, possível e real
167
Diante dessas reflexões, consideramos que as leituras sobre a AD de linha francesa foram
fundamentais na definição do objeto simbólico deste estudo, no caso o texto do PISA selecionado para
análise de discursos sobre C&T. Assim, partindo da leitura e estudos sobre esse referencial,
consideramos o textos como objeto discursivo, objeto esse que possibilita a articulação das questões do
discurso da/sobre C&T aquelas do sujeito e da ideologia. Logo, texto esse passível de leituras
polissêmicas, onde não há interpretações homogêneas, sentidos únicos e ―verdadeiros‖ (SIMAS FILHO,
2012).
Nesse contexto, pensamos que ao considerarmos que as C&Ts possuem um sentido verdadeiro para
explicar o mundo corremos o risco de percebê-las como sendo universais, objetivas, superiores e neutras.
Um olhar como se as C&T não fossem empreendimentos humanos e, portanto, um discurso isento de
fazeres persuasivos, ou seja, sem interesses ideológicos, políticos e econômicos sobre as C&Ts (SIMAS
FILHO, 2012).
Ao analisarmos os possíveis discursos de/sobre C&T que estão circulando nos textos do PISA,
também produzimos reflexões sobre as condições de produção desse sistema de avaliação. Desse modo,
ao levarmos em conta o potencial discursivo de/sobre C&T presente em tais textos, consideramos que a
educação formal, especialmente o ensino de ciências, tem um papel essencial na construção de sentidos
de/sobre C&T pelos estudantes. Sentidos esses que considerem as especificidades e articulações destas
práticas sociais. Ademais, não podemos desconsiderar conforme apontam Furlan & Megid (2009) que,
apesar de a ciência ser pouco questionada, lhe é posta um papel de legitimação social, pois, ―A ciência,
por sua vez, é também vista pela sociedade como um lugar de poder e legitimação de dizeres.‖ (Idem:12).
No contexto de ensino a legitimação é reforçada por concepções pontuais de avaliação cujos critérios
orientam-se a partir de intencionalidades nem sempre comprometidas com o processo de ensino-
aprendizagem. Sendo assim, se partimos do fato de que sistemas internacionais de avaliação do ensino
têm sua origem nas ações econômicas empreendidas por organizações criadas pelos países do chamado
primeiro mundo (OCDE, por exemplo), observamos que atualmente o PISA tem estado presente nas falas
dos seus gestores para ser justificado como um meio de produzir melhorias na qualidade da educação nas
escolas e sistemas de ensino. Assim, as classificações ou rankings da qualidade da educação estabelecidas
pelo PISA, entre os países participantes servem para constatar, por exemplo, que um nível maior de
letramento amplia as perspectivas de emprego e portanto, o sucesso no mercado de trabalho. Dessa
forma, ficam evidentes as relações de poder que envolve o PISA, já que os países membros da OCDE são
os que se destacam nas avaliações e os países convidados como o Brasil, ficam mal classificados,
geralmente ocupando os últimos lugares. Nesse contexto, percebemos uma explícita separação entre os
países que aparentemente detém o conhecimento e os que não o detêm (SIMAS FILHO, 2012). Logo, os
sentidos de C&Ts veiculados pelo PISA seguem a lógica do mercado, pois centram-se na produção de
resultados técnicos, incentivando a competitividade entre os países participantes, sendo instrumentos de
regulação econômica e social.
Referências
168
FURLAN, C. C. ; MEGID, C. M. Língua e Linguagem em Movimento na Sala de Aula. In:
BOLOGNINI, C. Z.; PFEIFFER, C.; LAGAZZI, S. (Orgs). Discurso e Ensino: Práticas de
Linguagem na Escola. Campinas, SP. Mercado de Letras, 2009.
INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICAS EDUCACIONAIS – INEP. Pisa 2000: Relatório
Nacional. Brasília, 2001.
KARAT, M.; CUNHA, F. S. R.; SIMAS FILHO, J. P. O ENEM em Aulas de Biologia: Trabalhando na
Perspectiva CTS – Relato de Experiência. EREBIO Sul, V, Londrina, PR, 2011.
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Latina. Ciência & Ensino: Unicamp, Campinas, v. 1, p. 1-16, 2007.
LINSINGEN, I. e CASSIANI, S. Educação CTS em Perspectiva Discursiva: Contribuições dos Estudos
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Campo. Cortez Editora, São Paulo, 1989.
ORLANDI, E. P. Discurso & Leitura. 5ª ed. São Paulo: Cortez; Campinas: UNICAMP. 2000.
______As formas do silêncio: No movimento dos sentidos. 6ª ed. Campinas: Editora da UNICAMP, 2007.
______Análise de discurso: princípios e procedimentos. 5. ed. Campinas, SP: Editora Pontes, 2009.
PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Tradução de Eni Pulcinelli
Orlandi et al. 2 ed. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1995.
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o Dado no Estudo da Linguagem. Editora da UNICAMP. São Paulo, 1996.
PROGRAMA DA OCDE PARA AVALIAÇÃO DE ALUNOS - PISA: Itens liberados de Leitura.
Instituto Nacional de Estatísticas Educacionais – INEP, Brasília, 2003.
SILVA, H. C. da; BAENA, C. R.; BAENA, J. R. O Dado Empírico de Linguagem na Perspectiva da
Análise de Discurso Francesa: Um Exemplo sobre as Relações Discursivas entre Ciência, Cotidiano
e Leitura. Ciência & Educação, v. 12, n. 3, p. 347-364, 2006.
SIMAS FILHO, J. P. Leituras do PISA: Sentidos sobre Ciências e Tecnologias em Sala de Aula de
Ciências. Florianópolis: 2012. Dissertação (Mestrado em Educação Científica e Tecnológica).
Universidade Federal de Santa Catarina.
SIMAS FILHO, J. P. THOMAS, H. Estructuras cerradas versus procesos dinâmicos: trayectorias y estilos
de innovación y cambio tecnológico. IN THOMAS, Hernán. e BUCH, Alfonso. Actos, actores y
artefactos: sociologia de la tecnologia. Bernal: Universidad Nacional de Quilmes, 2008.
169
170
EDUCAÇÃO CTS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE BIOLOGIA
EM TIMOR–LESTE
Introdução
Os estudos CTS começam a tomar um novo e importante rumo a partir de meados de 1960 e início
dos anos 1970, como resposta ao crescimento do sentimento de que o desenvolvimento científico e
tecnológico não possuía uma relação linear com o bem-estar social (Nascimento; Linsingen, 2006).
Educar, numa perspectiva CTS é, fundamentalmente, possibilitar uma formação para maior inserção
social das pessoas no sentido de se tornarem aptas a participar dos processos de tomadas de decisões
conscientes e negociadas em assuntos que envolvam ciência e tecnologia. Em outras palavras, é favorecer
um ensino de/ sobre ciência e tecnologia que vise à formação de indivíduos com a perspectiva de se
tornarem cônscios de seus papéis como participantes ativos da transformação da sociedade em que vivem
(LINSINGEN, 2007: 13).
Nesse sentido, é importante explorar assuntos que muitas vezes estão fora do currículo tradicional, o
que está relacionado com a crítica de Michael Apple (1999). Segundo esse autor, o currículo nunca é
apenas um conjunto neutro de conhecimentos que, de algum modo, aparece nos textos e nas salas de aula
de uma nação. Pelo contrário, é sempre resultado da seleção de alguém, da visão de um grupo acerca do
que seja conhecimento legítimo, ou seja, o currículo ―é produto das tensões, conflitos e concessões
culturais, políticas e econômicas que organizam e desorganizam um povo‖ (Apple, 1999: 59).
Partindo de que a construção curricular do ESG se deu principalmente pelos portugueses
(colonizador do Timor-Leste no início do século XVI até 1975), consideramos que o plano curricular do
Timor-Leste se configura como uma adaptação do modelo de currículo português, composto por aspectos
usados em sociedades ocidentalizadas, e que muitas vezes não reflete sobre questões da realidade
timorense. Dessa forma, as perguntas norteadoras dessa pesquisa são: Quais os sentidos construídos pelos
estudantes de Biologia da Universidade Nacional Timor-Lorosa‘e (UNTL) sobre as interações entre
Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS)? Como essa temática é trabalhada no contexto da formação de
professores de Biologia desta universidade?
Atualmente a maioria dos docentes que atuam no ensino de Biologia em Timor-Leste foram
formados no período em que o país estava sob domínio da Indonésia, só conhecendo os termos técnicos
das disciplinas de Biologia em bahasa indonésia e não em português. Por essa razão, o Timor-Leste
enfrenta um grande desafio, a formação de professores para o ensino de Biologia em Língua Portuguesa.
O Plano Curricular do ESG (2011) destaca que o Ministério da Educação de Timor-Leste deverá
assegurar a todos os professores a oportunidade de seguir uma formação adequada para poderem elevar a
qualidade do seu desempenho profissional, de modo, a garantir uma oferta formativa de base sólida nas
áreas de ―Ciências e Tecnologias‖ e ―Ciências Sociais e Humanidades‖. Dessa forma, o Plano do
Ministério da Educação (2013-2017), enfatiza que a formação de professores para atuarem nessas duas
áreas é uma ação vista como primordial para o desenvolvimento do país.
Diante desse cenário, esse trabalho tem como objetivo analisar como o enfoque CTS está sendo
abordado na formação dos professores de Biologia.
171
Tecendo a pesquisa
Utilizamos como referencial teórico e metodológico a Análise de Discurso (AD) da linha francesa,
que tem aportes na obra de Michel Pêcheux e desdobramentos no Brasil, através dos trabalhos de Eni
Orlandi. Além desse, para entender o campo CTS, utilizamos os estudos de nosso grupo - DICITE - que
têm contribuído para uma discussão sobre educação CTS numa perspectiva discursiva. (LINSINGEN;
CASSIANI, 2011).
Na perspectiva da AD, o discurso se dá na inter-relação entre interlocutores (rompe com o modelo
emissor-receptor). Ao citarmos o termo ―discurso‖, nos referimos ao efeito de sentidos entre
interlocutores (PÊCHEUX, 2006).
Nessa perspectiva, o discurso é um processo contínuo, que não se esgota em uma situação particular.
Algumas coisas foram ditas antes e outras serão ditas depois. O que temos, são sempre ―pedaços‖,
―trajetos‖, estados do processo discursivo (ORLANDI, 2008, p.14).
Buscando construir um dispositivo analítico para essa pesquisa, mobilizamos as condições de
produção em jogo sobre os discursos sobre CTS. As condições de produção podem ser consideradas em
um sentido amplo que incluem o contexto sócio-histórico e ideológico e as condições de produção em um
sentido mais estrito que corresponde às circunstâncias de enunciação (ORLANDI, 2012).
Para essa autora, as condições de produção compreendem fundamentalmente os sujeitos e a situação.
Dessa forma, a memória também faz parte das condições de produção do discurso, no sentido de que as
―aciona‖ e as faz valer.
Em relação às condições de produção estrita, consideramos nessa pesquisa, os alunos do curso de
Biologia da Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH/UNTL), assim como, o local da
entrevista, o roteiro e os objetivos. Na perspectiva da AD, esses aspectos são analisados e amparados pelo
contexto sócio histórico e ideológico.
Ao nos apoiarmos no referencial teórico e metodológico da AD, Orlandi (2012, p.67), enfatiza que
essa análise demanda um ir-e-vir constante entre teoria, consulta ao corpus e análise. No campo CTS,
novos aportes teóricos latino-americanos, realizados pelo grupo Modernidade/ Colonialidade (CASTRO-
GÓMEZ; GROSFOGUEL, 2007), apresentam perspectivas instigantes para a análise discursiva das
relações de subordinação/subalternidade das relações de poder globais e regionais que se insinuam no
ensino de ciências e tecnologia e que acabam por favorecer a reprodução das relações de dependência,
seja por meio do silenciamento das culturas e especificidades locais e regionais, ou por meios mais
explícitos de relações de poder. (p. 166).
172
Resultados e discussão
Ao questionarmos os alunos sobre o que eles entendem sobre as interação CTS no ensino de
Biologia, o aluno 4 enfatiza a importância do ensino de ciências está relacionado a realidade do aluno.
Amorin (1995), a partir dos resultados da sua pesquisa de mestrado, destaca que os elementos da
Ciência e Tecnologia (C&T) que não são contextualizados em uma sociedade específica, geralmente não
levam a um desenvolvimento da capacidade crítica dos alunos frente aos diferentes papéis da C&T, a fim
de lhes garantir tomadas de decisão mais conscientes.
Autores como Cassiani e Linsingen (2009) e Cassiani, Linsingen e Lunardi (2012) enfatizam a
importância de temas gerados principalmente em função das situações vividas pelas pessoas na sua
comunidade façam sentido no âmbito das relações CTS, ou seja, que possam ser tratados e
problematizados em seus aspectos políticos, econômicos, sociais, científicos.
Segundo Linsingen (2007), a renovação educativa proposta pela perspectiva CTS pode ser favorecida
por uma mudança de olhar, de educadores e de educandos. Assim, o ensino de ciências e tecnologia deixa
de ser enfocado em conteúdos distantes e fragmentados, baseados em conhecimentos científicos
supostamente neutros e autônomos, e passa a ser enfocado em situações vividas pelos educandos em seu
cotidiano.
No enunciado do aluno 2 a seguir, é destacado a aplicação dos estudos CTS na sociedade.
[...] explica sobre ciência, tecnologia, sociedade e ambiente, fala sobre, aprende
ciência, e depois, através de ciência, para aplicar na sociedade, e depois, através de
prática para aprofundar os conhecimentos, depois quando conhecer através de prática,
para aplicar na sociedade (A2).
173
pessoas no processo de decisão e produção de conhecimentos tecnológicos e científicos, produzindo
sentidos da ciência, como algo neutro e determinista.
Nessa direção, destacamos a necessidade do ensino de Biologia em Timor-Leste incluir os estudos
referentes às consequências sociais e culturais do desenvolvimento científico e tecnológico,
estabelecendo as relações entre desenvolvimento, progresso social e melhoria da qualidade de vida.
Em relação aos modos como o enfoque CTS vêm sendo desenvolvidos na formação de professor de
Biologia, os alunos citam algumas atividades, como:
A realização de Conferências (I Conferência Científica: A produção de conhecimento científico
no Timor-Leste, realizado em 2014; I e II Simpósio de Educação, realizado nos anos de 2014 e
2015, respectivamente);
Seminários;
Práticas (visitar distritos como o objetivo de dividir experiências com a sociedade);
Utilização dos manuais escolares.
Aprende a ciência aqui, depois disso, eu vou [...] dar uma técnica para os alunos,
depois os alunos dar para a sociedade, as comunidades, para adaptar essas ciências
(A6).
1
Grupo de trabalho organizado pelos membros do GEECITE, ligados pelo Projeto Pró-Mobilidade da CAPES, com a
coordenação de Gaspar Varela e Suely Cunha da parte timorense, além de Suzani Cassiani e Patrícia Giraldi da parte
brasileira.
2
Evento organizado em parceria com o Programa de Qualificação de Docentes e Ensino de Língua Portuguesa
(PQLP/CAPES).
174
Conforme Orlandi (2012,) todo discurso se delineia na relação com outros dizeres presentes e dizeres
que se alojam na memória. Assim, enfatizamos que os sentidos atribuídos em um enunciado devem-se às
distintas condições de produção.
Um condicionante importante na produção dos discursos sobre CTS é o fato de todos os participantes
dessa pesquisa estarem imersos no Grupo Ensino de Ciências e Tecnologia na Educação (GEECITE) da
UNTL. Segundo Linsingen et al. (2014), as discussões nesse grupo são permeadas por reflexões
epistemológicas da C&T e por Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia (ESCT) latino-americano,
além da sociologia da tecnologia como âmbito privilegiado de produção de sentidos sobre as profundas
imbricações socioculturais. Dessa forma, o GEECITE se tornou um excelente espaço para se estudar e
discutir no contexto timorense propostas pedagógicas pautadas na Educação CTS.
Em relação às atividades desenvolvidas na formação dos futuros professores de Biologia, percebe-se
por meio das entrevistas, críticas a algumas ações. Isso pode ser evidenciado na fala do aluno 5: ―o
professor ensina sobre os métodos que esta escrito, mas ele não liga como que a sociedade enfrenta‖
(A5).
Assim como o aluno 5, percebemos também críticas relacionadas ao uso dos manuais escolares,
como podemos evidenciar na fala do aluno 4.
Aqui em timor, muitas vezes os professores de ciências utilizam o manual para ensinar
os alunos e dependem desse manuais mesmo, mas eu acho, para o futuro, nós somos os
futuros professores, tem de mudar esses métodos, esses sistema de educação (A4).
Concordamos com o aluno 4, em relação o ensino de Biologia ser desenvolvido para além dos
manuais. Isso fica ainda mais alarmante, ao sabermos que a construção dos manuais se deu
principalmente pela cooperação portuguesa e brasileira, tendo pouca participação dos timorenses.
Segundo Ramos e Teles (2012), na reforma do currículo realizada pelos portugueses, o ministro da
educação de Timor-Leste tinha considerado que a reestruturação do plano curricular, assim como a
elaboração dos programas das disciplinas, dos manuais para os alunos e dos guias para os professores
deveriam ser em articulação com professores timorenses. No entanto, fatores como a carência de meio de
comunicação, a falta de conhecimento na área específica e de Língua Portuguesa e a dificuldade do
ministério timorense efetivar a constituição das equipes homólogas, fizeram com que essas equipes de
professores timorenses não fossem constituídas.
Mesmo diante desse cenário, os manuais para os alunos e os guias para os professores foram
elaborados pelos professores portugueses e entregues ao Ministério de Educação em Timor-Leste.
Consideramos que a forma como foi implementada esses documentos nas escolas se deu em um
movimento de cima para baixo, tornando os professores timorenses passivos nesse processo de
construção curricular. Entretanto, ressaltamos que num país com tantas demandas, em que os livros são
tão escassos, pensar em jogar fora o bebê junto com a água do banho, seria muito desanimador.
No Plano Curricular do ESG, publicado em 2011, percebemos uma grande ênfase a utilização desses
manuais. De acordo com esse documento, o governo precisa dar a devida importância à elaboração de
manuais escolares para alunos e guias didáticos para os professores, mostrando empenho em procurar
fontes de financiamento para a sua publicação e meios adequados para a sua distribuição.
Além dessas atividades, os resultados dessa pesquisa apontam que os launos ao pronunciarem sobre
CTS, destacam a dimensão ambiental, como podemos verificar nos enunciados a seguir:
Explica sobre ciência, tecnologia, sociedade e ambiente, fala sobre, aprende ciência,
e depois, através de ciência, para aplicar na sociedade (A2).
É como uma área que liga com o ambiente, então precisa ligar para a sociedade,
conhecer sobre ciência e tecnologia (A5).
175
Entendemos que são vários interdiscursos que podem participar na construção dos dizeres desses
alunos (A2 e A5), quando são estimulados a pronunciarem sobre CTS: a) a presença de uma disciplina de
Educação Ambiental no currículo de Biologia da UNTL; b) Docente que ministra essa disciplina planeja
atividades trazendo o enfoque CTS; c) Trabalhos acadêmicos produzidos por teóricos que adotam a
terminologia CTSA.
Em relação aos trabalhos que adotam a terminologia CTSA. Segundo Vilches, Gil-Pérez e Praia
(2011), nos últimos anos vêm aumentando a aproximação entre o movimento CTS e Educação ambiental.
Segundo esses autores as origens do movimento CTSA estão ligadas, entre outros, às investigações de
Rachel Carson (1980) em torno dos efeitos nocivos do DDT sobre os seres humanos e ao impacto do seu
livro "Primavera silenciosa" sobre grupos de cidadãos e educadores. Dessa forma, a incorporação da letra
―A‖ de Ambiente para a expressão CTS, responde ao anseio de dar uma maior ênfase às consequências
ambientais dos desenvolvimentos científicos.
No entanto, conforme esses autores, para alguns teóricos, essa incorporação é desnecessária, uma vez
que estas consequências ambientais formam uma parte essencial das relações CTS.
Nesse sentido, em outras pesquisas sobre a educação em Timor-Leste (CASSIANI & LINSINGEN,
2015), temos visto a inclusão de CTSA em manuais didáticos de ciências do pré-secundário do novo
currículo proposto pela cooperação portuguesa, inscrita no final de cada capítulo, numa posição não
muito valorizada. Não há a devida problematização que requer esse tipo de abordagem, sem temas
cotidianos locais, sendo colocados apenas: instruções de como fazer um relatório de laboratório; como
fazer uma pesquisa de campo sobre biodiversidade; atividades de laboratório ou experimentais;
ilustrações descontextualizadas, como uma estação de tratamento de água; experimentação (água, lente de
aumento, tensão superficial), entre outras.
Acreditamos que, conhecer os textos e os discursos que podem estar constituindo os sentidos sobre
CTS no curso de Licenciatura em Biologia da UNTL, nos possibilita compreender alguns aspectos das
condições de produção ampla e repensar a formação inicial de professores de ciências e o uso do material
didático.
Considerações Finais
A partir desses resultados, consideramos importante elaborar alguns caminhos para uma proposta
pedagógica progressista, crítica, pensando na formação de professores timorenses sintonizados com a
realidade sociocultural.
Sugerimos a necessidade do currículo de formação de professores de Biologia em Timor-Leste
incluir os estudos CTS, de forma que o ensino de C&T aponte às consequências sociais e culturais do
desenvolvimento científico e tecnológico, estabelecendo as relações entre desenvolvimento da C&T,
progresso social e melhoria da qualidade de vida.
É fundamental avançar no entendimento da transnacionalização do currículo, que traz conhecimentos
de um outro povo com outra cultura, imprimindo conhecimentos ditos ―universais‖ que parecem neutros,
ahistóricos, higienizados e que não permite o diálogo de saberes.
A criação de espaços pedagógicos que permita os professores e alunos timorenses refletirem e
discutirem o movimento de transnacionalização curricular pode se constituí como uma saída para que os
sujeitos envolvidos percebam esse movimento como uma forma de colonialidade do saber/poder ( a
reprodução dos modelos que vem dos países ―centrais‖).
Mignolo propõe no livro ―Histórias locais Projetos globais‖ (2003) um exercício de descolonização
intelectual que redefine e re-significa nossos horizontes políticos e epistemológicos como intelectuais e
como sujeitos históricos.
176
Nessa perspectiva, esse autor cita o conceito de epistemologias de fronteira (pensamento liminar ou
pensamento de fronteira) que abre espaço para o reconhecimento da diferença colonial, para a emergência
de vozes, línguas, culturas, significados e histórias. Trazendo à tona a polifonia, a pluralidade de
possibilidades do conhecer, nenhuma tendo necessidade de eliminar a outra para se afirmar. O
pensamento liminar ou de fornteira constrói-se no diálogo com os saberes hegemônicos e desenvolve-se
nas fissuras da colonialidade, a partir de saberes que foram subalternizados nos processos imperiais
coloniais (MIGNOLO, 2003).
Nesse sentido, consideramos a necessidade dos estudos pós-coloniais, da descolonização do saber e
as epistemologias do sul para buscar romper com a rigidez de fronteiras epistêmicas e territoriais
estabelecidas e controladas pela colonialidade do poder.
Referências
177
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PÊCHEUX, M. O Discurso: estrutura ou acontecimento. Campinas: Pontes, 4ª ed. 2006.
RAMOS, A. M.; TELES, F. Memória das políticas educativas em Timor-Leste: A consolidação de um
sistema (2007-2012). Aveiro: Universidade de Aveiro, 2012.
VILCHES, A.; GIL-PÉREZ, D.; PRAIA, J. De CTS a CTSA: educação por um futuro sustentável. In:
SANTOS, W.L.P. dos; AULER, D. (Orgs.). CTS e educação científica: desafios, tendências e
resultados de pesquisa. Brasília: Editora Universidade de Brasília. 2011. p.161-184.
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Educação, 2011. Disponível em: file:///C:/Users/Brazil/Desktop/PlanoCurricular_V2.pdf. Acesso em:
20 de fev. 2015.
República Democrática de Timor-Leste. Plano do ministério da educação 2013-2017. Ministério da
Educação, 2012. Disponível em: http://planipolis.iiep.unesco.org/upload/Timor-Leste/Timor
Leste_Ministerio_da_Educacao_Plano_2013-2017.pdf. Acesso em: 20 de fev. 2015.
RAMOS, A. M.; TELES, F. Memória das políticas educativas em Timor-Leste: A consolidação de um
sistema (2007-2012). Aveiro: Universidade de Aveiro, 2012.
178
ANÁLISE COMPARATIVA SOBRE A POTENCIALIDADE DA NICOTINA ENCONTRADA
EM CIGARRO LA-LIGHTS E TABACO (Nicotina tabacum L.) CULTIVADO
Inês do Carmo
Celina Maria Godinho
Introdução
Tabaco é o nome comum das plantas do gênero Nicotiana, pertencente à família das Solanaceae, em
particular a espécie botânica Nicotiana tabacum. É desta planta que se extrai a substância chamada
nicotina. Entretanto, antigamente o tabaco era uma erva que o ser humano apenas utilizava para consumo.
A nicotina é uma amina terciária consistindo em uma piridina e um anel pirrolidina (BENOWITZ,
1996). É um alcaloide líquido natural. É uma base volátil, incolor (pKa = 8,5) que se torna marrom e
adquire o odor do tabaco na exposição ao ar tendo meia-vida de aproximadamente duas horas
(GOODMAN & GILAMN, 2005). A estrutura e fórmula da nicotina é C10H14N2, o peso da molécula é de
1,6223 mols, e o nome químico é 3 - (2 -N-metilpirolidil) piridina (STRECHER, 1968).
Atualmente, o tabaco é cultivado em todas as partes do mundo, sendo responsável por uma enorme
atividade econômica que envolve milhões de dólares. Apesar do grande malefício que provoca à
sociedade, o tabaco é uma das drogas mais consumidas mundialmente.
Originalmente o tabaco era apenas encontrado na América e foi trazido para a Europa pelos
espanhóis no início do século XVI, quando se veio a tornar muito popular. A planta ganhou o nome de
Nicotiana após Jean Nicot, um embaixador francês, que em 1560, exaltou em público a virtude do tabaco
como agente curativo contra enxaquecas (SILVA, 2004).
Em Timor-Leste há várias plantas, de inferiores até as superiores, incluindo as plantas de tabaco.
Nossos ancestrais já conheciam diversos usos para o tabaco, como para fumar e fazer o sonque e também
para uso medicinal para curar picadas de insetos. A maneira de fumar era embrulhar o tabaco com as
cascas do milho ou papel, e o sonque do tabaco era acompanhado pelo condimento masca, ou seja, para
mascar precisa misturar uma folha de betel ou fruta de betel, uma fatia areca, uma ou duas pitadas de cal,
e mastigar até ficar encarnada (mama malus).
O consumo de tabaco em Timor-Leste se dá em qualquer lugar, no interior de transportes coletivos,
na estrada e no trabalho. O tabaco também é utilizado em festas tradicionais, na abertura da festa ―mama
malus‖, para os convidados que participam pela primeira vez. Nesta cerimônia, todos os participantes
devem comer mama malus antes do início da festa, por isso esta parte chama-se lok bua Malus.
O tabaco em Timor-Leste origina-se diretamente da folha do tabaco e não se faz um processo no
laboratório, bem como não se utiliza filtro, e também o sonque é utilizado diretamente da folha fresca e
folha fermentada ou seca.
179
O tabaco é o produto resultante do tratamento das folhas de um arbusto pertencente à família das
solanáceas (Simões, 2005), com um a dois metros e meio de altura, designada por nicotina tabacum L.
Morfologicamente o tabaco tem forma de raiz, caule, folha flor e semente.
As folhas frescas do tabaco contêm entre 85% e 90% de água e as secas entre 8% e 14%, sendo o
resto formado por 3,6% de substâncias nitrogenadas, 4,5% de lipídios, 20,7% de cinzas, uma quantidade
variável de sais de cálcio, potássio e magnésio e, por fim, entre 0,68% a 4,8% de nicotina (CAIXINHAS,
1991).
O número de folhas, a textura e a forma são determinados pela variedade das plantas, das condições
do meio ambiente e das práticas culturais adotadas (FILHO, 1968). Qual é a qualidade do tabaco? A
qualidade dependerá do tratamento em relação ao cultivo do tabaco e da maneira que as pessoas cultivam
essa planta em Timor-Leste.
A Organização Internacional de Estandardização (ISO) é quem determina as normas para a produção
do cigarro no mundo, estabelecendo um método para determinar um padrão.
Componente sólido é deixado sobre a seção do filtro da nicotina, como já foi instituído em PP. 81/1999.
A Standarização Nacional da Indonésia (SNI) do cigarro de L.A. Lights é: 1,5 mg de nicotina e 20 mg de
alcatrão.
A indústria de cigarro L.A. Lights chama-se PT Djarum, e fica localizada em Kudus, Java Central. A
fabricação de cigarros é feita a partir de folhas secas de tabaco, embrulhado com papel e substâncias
aromáticas, obtidos a partir das plantas do tabaco. O cigarro é um cilindro com comprimento de 70-120
mm e 10 mm de diâmetro (ANONYMOUS 1,2011).
PT Djarum produz as seguintes variedades de cigarro: Djarum Super, Djarum Seper CS, Djarum
L.A-Lights e Djarum L.A-lights Mentolho. Esta indústria distribui seus produtos em Timor-Leste como
material de comércio (ANONYMOUS 1,2011).
O tabaco pode ser usado de diversas maneiras de acordo com sua forma de apresentação: inalado
através do cigarro, charuto, cigarro de palha, aspirado, conhecido como rapé ou mascado em forma de
fumo-de-rolo; porém sob todas as formas ele é maléfico à saúde. Há tipos de uso que minimizam os
danos, como os cigarros com mentol, filtros especiais, cigarros com baixos teores de nicotina como o
light e extra light, porém os mesmos têm uma composição semelhante, não havendo, portanto, cigarros
saudáveis ou cachimbos e charutos que não façam mal à saúde.
Diante disso, tanto o chefe do governo geral como o executivo, os ministérios, como o Ministério da
Educação e o Ministério Saúde, assim como os locais públicos onde são prestados cuidados a saúde da
população, incluindo as ambulâncias ou qualquer outro veículo que transporta pessoas doentes ficam
responsáveis por emitir normas para proibir o consumo de tabaco nos edifícios públicos que gerem.
O Primeiro Ministro Dr. Rui de Araújo abre espaço para ―O Ministério da Educação, nos
estabelecimentos públicos de ensino‖ evitar que os alunos consumam tabaco, de forma que previna a
dependência de tabaco e também das doenças (TIMOR-LESTE, SITE OFICIAL 2015),
O Primeiro Ministro Dr. Rui de Araújo também deu espaço para O Ministério da Saúde nos
―estabelecimentos públicos onde sejam prestados cuidados de saúde, incluindo nas ambulâncias e
veículos de transporte de doentes‖ (TIMOR-LESTE; SITE OFICIAL 2015). O Ministério busca
sensibilizar às pessoas, para poderem parar de consumir o tabaco. Outra parte, os condutores e os
ambulantes, não podem fumar ao conduzir o veículo, dessa forma é possível evitar acidente.
De acordo com a proibição, o Chefe do Governo lança também medidas de sensibilização. O
Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações cita: ―deve promover campanhas de
sensibilização contra o tabaco, incluindo ações de esclarecimento, para alertar sobre os perigos e
malefícios do tabaco e apelar para que não se fume nos veículos de transporte coletivo de passageiros e
nos táxis‖. (TIMOR-LESTE; SITE OFICIAL 2015).
180
Em Timor-Leste, cresce o número de unidades de saúde que, conscientes de suas responsabilidades
quanto à qualidade de vida de seus usuários, vem implementando programas de controle do tabagismo,
esse partem da constatação de um número elevado de fumantes na população em Timor-Leste.
O tabagismo é o ato de se consumir cigarros ou outros produtos que contenham tabaco, cuja droga ou
princípio ativo é a nicotina. Os fumantes são classificados em passivo e ativo, sendo que os ativos são os
que praticam o tabagismo, regular e continuamente e os passivos são os que, apesar de não praticarem o
tabagismo, frequentam ambientes poluídos com as substâncias da fumaça do cigarro.
O tabagismo se desenvolve a partir da dependência química à nicotina, ela é uma das 4.700
substâncias tóxicas presentes na fumaça do cigarro, mas que se encontra também em outras formas de uso
do tabaco, como cachimbo, rapé, narguilé e cigarro eletrônico. E em Timor-Leste, utilizado embrulhado
em casca do milho, antes de formar o cigarro electrônico.
A nicotina tem uma variedade de efeitos no corpo humano e é tóxico para o tecido nervoso. Em
princípio, a nicotina irá causar o estreitamento dos vasos sanguíneos rapidamente fazendo a pressão
arterial sistólica e diastólica aumentarem, a frequência cardíaca aumenta rapidamente, tais como a
contração forçada do coração, resultado da diminuição da assimilação de oxigênio pelo nosso corpo em
função da fumaça inalada no processo, trazendo riscos para outros órgãos como o cérebro e condição do
músculo cardíaco.
No colóquio, o Chefe do Governo afirmou que toda as pessoas tem o direito de fumar. No entanto,
acrescentou, os fumadores devem respeitar os não fumadores. Porque o cigarro tem impacto negativo na
saúde dos que não fumam, principalmente em lugares fechados, sejam edifícios públicos ou em casa.
―Vou dar um exemplo. No caso em que, no lar, o pai é fumador, a mãe e os filhos sofrem o impacto do
fumo do cigarro. Isto significa que essa opção individual vai afetar não só o próprio, mas também todo o
agregado‖, explicou Rui Maria de Araújo, salientando a ―falta de lógica na atitude‖. (TIMOR-LESTE;
SITE OFICIAL 2015).
As consequências do consumo de tabaco para a saúde envolvem riscos de danos aos órgãos vitais do
corpo do humano, como a hipertensão, cancro do pulmão, cancro cardiovascular, danos ao sistema
nervoso, órgãos reprodutivos, cancro na boca. O cigarro também é muito prejudicial ao feto da mãe
fumante.
O tabagismo tem sido considerado um problema de saúde publica mundial, mais de dez milhões de
morte no mundo por doenças de tabaco. Torna-se, portanto, importante aprimorar formas de tratamento
aos fumantes que queiram parar de fumar e busquem ajuda por não se sentirem capazes de consegui-lo
sozinhos (ISMAEL, 2007). Uma vez que o tabagismo tem sido considerado um problema à saúde
mundial, publica-se o resultado em uma alta morbimortalidade, e todos os estudos que possibilitam
melhorar o atendimento aquele que quer parar de fumar são importantes.
Os programas de controle do tabagismo devem ser eminentemente educativos, atuando nos diversos
segmentos da população, com o objetivo de conseguir em menor tempo demonstrar a população os riscos
causados pelo consumo do tabaco, de forma que baixe a prevalência dos fumantes.
As causas principais que levam à iniciação do hábito de fumar nos jovens são sobretudo influências
do ambiente, particularmente de amigos e de colegas, através da curiosidade, desejo de imitação e de
afirmação social. Já a pessoa que mantém o vício é muitas vezes influênciada por diversos fatores, entre
eles, destacou o estresse.
Os estabelecimentos comerciais deverão, igualmente, ser sensibilizados para esta questão, pelo
Ministério do Comércio, Indústria e Ambiente, que deverá apelar para que estes não façam publicidade ao
tabaco. Este ministério fica também responsável por desenvolver campanhas de sensibilização e ações de
esclarecimento ―sobre a necessidade de serem criados espaços livres de fumo nos restaurantes, bares,
estabelecimentos comerciais, locais destinados ao jogo, ao desporto, ao lazer e nos estabelecimentos
hoteleiros e empreendimentos turísticos‖ (TIMOR-LESTE, SITE OFICIAL 2015).
181
Não se nasce com o hábito de fumar, inquéritos realizados nos últimos anos vieram comprovar que
em Portugal, como em outros paises, o hábito de fumar é adquirido, via de regras, pelos 20 anos, e que a
proporção de mulheres que fumam vem aumentando, em especial nos meios urbanos (SILVA;
MESQUITA et al.,1991; 315).
Diante do exposto nessa introdução, este trabalho teve como objetivo saber a diferença de teor de
nicotina entre o cigarro L.A-Lights e o tabaco cultivado.
Metodologia de Pesquisa
Tabela 2. Reagentes utilizados para a realização das análises laboratoriais e suas respectivas funções.
Nº Reagente Função
1 HCL 20% É uma solução aquosa ácido. Utilizado com reagente químico, é um dos ácidos que se
ioniza completamente em solução aquosa.
Ether (Pa) 1 Pode ser utilizada como solvente para a nicotina, óleos e outras substâncias para
2 litro separação.
Água destilada É uma água quimicamente pura, isto é, purificada por destilação ou solvente de um
3 1 litro modo a eliminar os sais dissolvidos e outros componentes.
Indicador Utilizada em titulações ácido-base, sendo que sua coloração muda de incolor em meio
4 Penofthalina ácido para cor-de-rosa em soluções básicas.
5 NaOH 10%: Para utilizar a titulação, ou amplamente utilizado em reações químicas.
182
Os procedimentos do trabalho foram realizados nas seguintes etapas:
Maceração dos cigarros dos cigarros L.A-Lights e tabaco cultivado, separadamente, até estado de
grão ou pó.
Adição de 2 g do material moído/pó (tabaco) em copo químico 100 ml e 4 ml de solução de HCl 20%,
usando uma pipeta de medição. Mistura com a barra de agitação.
Adição 40 ml de éter e bem fechado, agitação até ficar uniforme, enquanto pega na parte fechado e
não salto maré.
Repouso durante 24 horas até que o topo do éter esteja claro.
Aquecimento em Water Bahts dentro de água morna durante 4 minutos até éter inferior 2 ml.
Adicição de 20 ml de água destilada.
Filtragem de solução e entrada em novo erlenmeyer
Tranferência de 20 ml de solucão em bolão (Labu Takar) 50 ml e adição de água destilada até a
marca.
Ritirada de 20 ml de solução em Erlenmeyer 100 ml e adição de 4 ml de indicador penofthalina e
depois titulação com NaOH 0,01N, é assim até a mudança de cor castanho-escuro para vermelho.
este processo de titulação foi repetido por três vezes.
A análise volumétrica é um método clássico de análise quantitativa que tem a base na medição do
volume de uma solução de concentração conhecida, que reage exibindo determinadas variações conforme
resultado do que se está analisando. O processo de titulação é a solução de concentração conhecida e
designa-se por titulação padrão ou titulante e a solução que se vai analisar chama-se solução a titular ou
titulado (DOMINGUES; ABREU, 1998).
As fórmulas utilizas neste trabalho foram:
De Normalidade
Reacção: 2C10H14N2(aq) + 2NaOH (aq) 2 C10H13NaN2(aq) + 2H2O(l)
( )
% nicotina
Mg Nicotina = 1000 Nicotina
Descrição
N = Normalidade do padrão de NaOH
V = Volume de NaOH
~ = Igualdade 1 ml de NaOH 0,01 = 1,6223 mg de nicotina.
Para deterinar o teor de nicotina no cigarro e no tabaco cultivado foi determinado através dos
seguintes processos:
183
Determina ao teor da nicotina em cigarro L.A-Lights
( )
% nicotina L.A
( 1 )1 3
=
1
( 1 ) 1 3
=
1
=
% Nicotina L.A = 0.00245 %
Mg nicotina =
1
= 0,025 mg.
Resultados
184
Tabela 3. Resultado da titulação dos cigarros L.A-Lights e tabaco cultivado.
Testado Amostra Volume (Amostra) Vol. NaOH 0,01N Mg Nicotina % da
Nicotina
3x 6 g LA-Lights 60 ml 4,5 ml 0,0025 mg 0,025 %
3x 6g 60 ml 29,1 ml 0,016 g 1,6 %
Tabaco cultivado
No cigarro L.A a presenҫa de nicotina foi baixa (0.0025 mg ou 0,025 %), porque se faz uma
separaҫão e análise no laboratório, o grande teor de nicotina foi vaporizada no ar antes da produҫão na
fábrica. No tabaco cultivado a presença de nicotina foi de 0,016 mg (1,6% de nicotina). O processo de
tratamento do tabaco foi armazenado até ser bem fermentada. Depois se faz o corte, até secar, e fazer o
consumo diretamente.
Standarizaҫão no Governo Indonésio indica que o teor é 1,5 mg e o alcatrão ou tar (alcatrão) de
nicotina é de 20 mg. E o governo de Timor-Leste ainda não publicou o padrão de Standarizaҫão de
nicotina.
Quando há consumo de tabaco através do cigarro, a composiҫão quimica é menor, comparado ao
consumo do tabaco cultivado, já que não existe a filtragem dos seus componentes químicos.
Concluímos neste trabalho, baseados na standarização publicada pelo governo de Indonésio, que o
teor da nicotina é 1.5 mg e alcatrão 20 mg, dessa forma, a produção do cigarro não pode apresentar teor
mais alto do que o padrão estabelecido. Timor-Leste, porém, ainda não publicou o padrão de
estandarização da nicotina.
Os resultado demonstram que ao comparar o cigarro L.A.Lights (0.0025 mg de nicotina) e o tabaco
cultivado (1,6% de nicotina), o tabaco cultivado apresenta um elevado teor de nicotina.
Quando há consumo do tabaco através do cigarro, a composiҫão química é menor, comparado ao
consumo do tabaco cultivado, já que não existe a filtragem dos seus componentes químicos e não há
separação em laboratório.
Referências
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Pharmacology and Toxicology (36): 597-613.
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controle do tabaco. The Word Bank, agosto.
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Portuguesa, 3025ª ed., vol.01, 287p.
CAHYONO, B. 1998. Tembakau Budidaya dan Analisa Usaha Tani. Kanisius, Yogyakarta.
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185
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VULPINARI, O (2005). Dkk, The Roul of Health Professionals in Tabacco Control. World Health
Organization.
186
UMA ANÁLISE DO CONTEÚDO DE PRÁTICAS DE PRODUÇÃO ANIMAL
E BIOTECNOLOGIA NO MATERIAL DIDÁTICO DE BIOLOGIA:
A CONTEXTUALIZAÇÃO PARA O TIMOR-LESTE
Introdução
De acordo com a visão mundial, os animais geralmente são utilizados para responder as necessidades
humanas, como a alimentação, usos culturais e afetivos, criando condições específicas de produção e
manejo desses animais, como o confinamento em fazendas e criadouros. Entretanto, esse modelo de
criação animal só é benéfico às necessidades humanas gerando um grande stress animal. Nessa forma de
criação, não há liberdade para os animais, sendo estes considerados coisas úteis e sem sentimentos
(RAZERA; BOCCARDO; SILVA. 2007). Segundo o filosofo e jurista inglês Jeremy Bentham (1748 -
1832), o primeiro a expor a teoria do utilitarismo, este é: [...] um tipo de ética normativa segundo a qual
uma ação é moralmente correta se tende a promover a felicidade, e condenável se tende a produzir a
infelicidade (PAIXÃO, 2001 apud. RAZERA, BOCCARDO, SILVA, 2007. p. 3). Sendo a felicidade
medida a partir do acumulo das coisas e da utilidade que elas possuem. È por isso que essa forma de
pensamento e ação humana é antropocêntrica, porque o bem estar das pessoas é mais importante que o
bem estar dos animais. Esse fato ocorre, pois a produção animal é baseada nas actividades econômicas,
cujo objetivo é ganhar dinheiro e não criar uma condição confortável às criações (HAYWARD, 1998
apud. RAZERA; BOCCARDO; SILVA. 2007, p. 1).
Em Timor-Leste toda família precisa estar relacionada aos animais, devido as suas necessidades
alimentares e culturais. Por isso, existem duas formas de produção animal, uma ligada à caça tradicional e
outra à criação familiar. Ambas são distintas das formas de produção voltadas à economia industrial
global. Historicamente os timorenses têm um modelo de produção animal que não aprisiona grandes
criações, sendo os animais criados livremente no campo ou em pequenas criações familiares. Essa forma
de produção é orientada pela lei Tara Bando reconhecida até hoje na Lei Ambiental Nacional de Timor-
Leste (TIMOR-LESTE, 2012b). Lei esta que no passado foi formulada pelos Liurai 1 e Lia-Na´in2 e que
davam autorização para a caça e a redução do consumo de carne das criações. A lei Tara Bando se define
por um processo que consiste em primeiramente realizar o Fini, ou estoque de sementes e posteriormente
permitir um período de caça, momento pontual que ocorre a cada três anos. Depois de uma semana de
caça, a carne e as sementes são distribuídas para as famílias, que não podem caçar.
Esse meio de produção ajuda o ecossistema a manter-se equilibrado, porque evita as atitudes das
pessoas que exploram o ambiente a partir de suas necessidades monetárias individuais. O equilíbrio
ambiental é alcançado porque no Tara Bando é exigido um tempo significativo entre cada período de
caça, o que possibilita a reprodução e um equilíbrio das populações de animais. No que se refere às
criações familiares, o Tara Bando regula o consumo de carne com o objetivo de aumentar a quantidade de
animais domésticos para responder as necessidades alimentares e culturais futuras das famílias. Em
1
Um líder político ou monarca da estrutura social presente ate o fim de Timor português.
2
Um líder religioso e cultural responsável pela organização e resolução das necessidades do povo e da cultural.
187
Timor-Leste normalmente não se utiliza os animais para fins econômicos, mas para realizar trocas em
situações sociais e cultuais específicas como Barlaque3, o Fetosan4, Umane5, Uma Lulik6, dentre outras
cerimônia culturais.
A partir desta explanação das distintas formas de produção animal postas sob a sociedade timorense,
questionamos como tais relações de produção se apresentam ao ensino de ciências na rede pública de
ensino de Timor-Leste. De acordo com o currículo oriundo da reestruturação curricular do ensino
secundário geral em Timor leste, a partir da cooperação entre o Ministério da Educação, Instituto
Português de Apoio ao Desenvolvimento, Fundação Calouste Gulbenkian e a Universidade de Aveiro,
financiados pelo fundo da língua portuguesa (TIMOR-LESTE, 2012a), o conteúdo que disserta sobre as
relações de produção animal denomina-se “ ráticas de rodução nimal e iotecnologia”. Para a
realização do processo de ensino-aprendizagem deste conteúdo, normalmente ministrado no nível do 11º
ano do Secundário na disciplina de Biologia, os professores fazem uso de um manual de estudos, sendo
este, o objeto de análise deste trabalho, pois, ‖[...] os livros didáticos constituem um recurso de
fundamental importância, já que representam em muitos casos o único material de apoio didático
disponível para alunos e professores. (VASCONCELLOS; SOUTO, 2003, p.93). Como normalmente
ocorre na realidade de Timor-Leste, principalmente nas áreas rurais do país.
O conteúdo analisado é uma sub-unidade da unidade temática ―5.3 Dinâmicas Biológicas e Produção
Animal‖ apresentando-se posteriormente as subunidades ―5.1 Mobilização de Nutrientes e Trocas
Gasosas‖ e ―5.2 Regulação e Crescimento‖. Desta forma é na sub-unidade analisada que há a
possibilidade de se abordar a relação entre os homens e os demais animais. A partir deste contexto, é
nosso problema de pesquisa discutir se os conteúdos relacionados à produção animal e biotecnologia
estão contextualizados à realidade de Timor-Leste. Uma cultura em que os animais são criados sempre
próximos aos homens e suas famílias.
Por isso é preciso ficar claro que,
[...] há uma relação necessária entre o nível do conteúdo do livro e o nível da atual
formação do leitor. Estes níveis envolvem a experiência intelectual do autor e do leitor.
A compreensão do que se lê tem que ver com essa relação. Quando a distância entre
aqueles níveis é demasiado grande, quanto um não tem nada que ver com o outro, todo
esforço em busca da compreensão é inútil (Freire, 2001, 265-266).
Desta forma pensamos que o manual precisa levar em consideração o contexto real do leitor, que
neste caso é o aluno do 11º ano do ensino secundário geral de Timor-Leste. Pois se o material pretende
construir conhecimentos científicos junto ao aluno, é necessário ao processo de ensino-aprendizagem uma
relação mais dialógica dos conteúdos científicos frente à realidade material e cultural do país (FREIRE,
2009). A partir desta necessidade nossos objetivos específicos são: Investigar se os conteúdos científicos
analisados se articulam à realidade de Timor-Leste e qual a contribuição da linguagem presente no
manual para a possibilidade de aprendizagem dos alunos timorenses.
3
Cerimônia de apresentação das famílias pelo qual se reconhece a possibilidade de casamento a partir da troca de valores,
como dinheiro, animais e bem de consumo.
4
Título familiar da irmã(s) que se casou e que é responsável por garantir uma renda a sua família de origem.
5
Título familiar do irmão(s) que é responsável pelas decisões estruturais e culturais da família.
6
Casa sagrada de Timor Leste, ou seja, um lugar específico de armazenamento de objetos sagrados e espaço onde se
realizam as actividades culturais de uma dada geração.
188
Caminhos metodológicos
Como a realidade investigada é extremamente complexa, originada da ação educativa humana entre
sujeitos em constante alternância como a realidade de Timor-Leste, focaremos a maior parte dos
instrumentos de coleta em dados qualitativos, não por negarmos os dados quantitativos, mas por
julgarmos que, ao priorizar a pesquisa qualitativa em fenômenos sociais, enfatiza-se uma maior
possibilidade do surgimento de novas questões no decorrer do processo investigativo. Desta forma, este
trabalho, a partir desta perspectiva de pesquisa, compreende o uso dos manuais em processos educativos
como um complexo fenômeno social, cheio de interesses, ações e comportamentos entre os sujeitos que
influenciam no processo de aprendizagem das ciências. É por isso que o interesse desta pesquisa está
relacionado à qualidade científica dos conteúdos para o ensino e a aprendizagem da Biologia e a
qualidade contextual do texto presente no manual para a construção do conhecimento significativo para
os alunos.
A coleta dos dados foi feita a partir da observação do manual utilizado pelos alunos do 11 o ano, no
ensino secundário geral em Timor-Leste. Durante nossa análise buscamos com a leitura do manual avaliar
e diferenciar a possibilidade pedagógica do conteúdo observado articulada à realidade de Timor-Leste.
A fim de analisar o manual no conteúdo proposto foi necessário criar critérios de avaliação, estes
inspirados nos parâmetros de análise de Vasconcelos e Souto (2003). Os parâmetros estão organizados
em quadros que concentram temas específicos. O primeiro quadro descreve sobre os conteúdos teóricos
propostos no manual. Nele os parâmetros são determinantes para entendermos a qualidade do conteúdo
analisado. O segundo quadro descreve sobre os recursos visuais presentes no manual, estando os
parâmetros voltados a descrever sobre a qualidade das imagens presentes no material didático. O Terceiro
quadro é voltado para a análise das dos exercícios e das atividades complementares. O ultimo quadro
busca discutir sobre os recursos complementares como glossários, atlas e guias de experimentação.
Através desses quadros podemos compreender e analisar, de forma geral, como o manual se
estrutura. E para tanto,cada parâmetro está subdividido em um gradiente de Fraco até Excelente. A
qualidade ―fraco‖ surge quando encontramos os conteúdos científicos de forma descontextualizada com a
realidade de Timor-Leste, e o excelente quando há uma contextualização.
Na análise da teoria procuramos construir critérios enfocados no conteúdo científico específico das
Ciências Biológicas correlacionando-o com aspectos pedagógicos como: O grau de cognição a partir dos
parâmetros 2, 3, 4 e 5, o estímulo à problematização a partir dos parâmetros 1 e 7 , e o nível de
contextualização do conhecimento a partir do parâmetro 6. Tais parâmetros são significativos, pois,
―Partimos do princípio de que as informações trabalhadas nos livros didáticos devem promover o
contato do aluno com o conhecimento disponível, possibilitando a compreensão da realidade que o
cerca‖ (VASCONCELLOS; SOUTO, 2003, p. 96).
189
Adequação a serie:
Neste parâmetro buscamos avaliar se o manual analisado está de acordo com as orientações do
currículo proposto pelo ministério da educação de Timor-Leste. Averiguando se o conteúdo analisado é
adequado para o 11º ano.
Quanto a este parâmetro, avaliamos a qualidade como ―Regular‖. Tudo que está escrito no manual,
quanto ao conteúdo científico, segue o currículo nacional, mas não são apontados no manual a
metodologia de ensino proposta no currículo. Alguns conteúdos presentes no livro não estão
contextualizados à realidade dos alunos que cursam o 11º ano do secundário. Pensamos que esse livro não
responde muito bem às condições e as situações dos alunos, porque os contextos que estão escritos no
manual não tem relação com a realidade de Timor-Leste. Por exemplo, os conteúdos, escritos na página
88, falam sobre o controle de higiene na aqüicultura, relatam um sistema de controle que é mais moderno
que os sistemas de controle da aqüicultura de Timor-Leste. Entretanto não questionam se tais alunos
nessa idade, já haviam visto uma atividade de aqüicultura.
Clareza do texto:
Neste parâmetro avaliamos a clareza do português no manual para a compreensão dos alunos.
Segundo a nossa análise, a clareza do texto presente no conteúdo proposto, é ―Regular‖. Podemos
perceber no manual que há alguns conteúdos que não possuem explicação clara e profunda sobre o que
está escrito. Como por exemplo, os conteúdos escritos na página 86 do manual:
Nesse conteúdo não há explicação clara sobre a ―utilização sustentável dos recursos naturais‖ e
sobre a ―Importância da Biotecnologia animal, no sentido do desenvolvimento sustentável‖. A palavra
―Biotecnologia‖ e ―Sustentável‖ são conceitos que precisam ser melhor definidos, bem como a
construção das frases segue uma estrutura de difícil compreensão por parte dos alunos que estão em
processo de aprendizagem do português e das ciências naturais. Logo tais adequações seriam importantes
para que os estudantes pudessem construir consideração e relações junto às práticas presentes em sua vida
diária.
Nível de atualização:
Nesse parâmetro avaliamos se os conteúdos científicos presentes no manual estão atualizados aos
atuais resultados de pesquisas. Segundo a nossa análise a atualização do texto, é ―Boa‖, pois o conteúdo
explicita os conhecimentos científicos propostos na era da globalização. A atualização se mostra através
da explicitação das atuais biotecnologias para criar e tratar os animais com objetivo de melhorar a
produção. Decidimos não qualificar este parâmetro como Excelente, pois este seria a única fonte de
informação aos estudantes deste nível. Por isso, há uma grande dependência dos estudantes timorenses
que por falta de referencias, não conseguem acompanhar os conhecimentos científicos posteriores a
produção do manual.
190
Grau de coerência:
Esse parâmetro avalia se os conteúdos se contradizem com a ciência e ou linguisticamente.
Entretanto avaliamos que não houve incoerências nas informações apresentadas, por isso qualificamos
como ―Excelente‖
Definição Clara:
No parâmetro Definição Clara, avaliamos que o manual ainda é muito ―Fraco‖ na explicação da
maioria dos conteúdos científicos devido a sua difícil linguagem científica sem definições claras e
profundas. Por exemplo, na página de 88 que fala sobre as pragas que atacam os animais.
Nesse conteúdo não há explicações claras a respeito das pragas que atacam as criações dos homens
de forma ―Direta‖ e ou ―Indireta‖. O que significa o termo ―Indireta‖ no contexto do trecho analisado?
Desta forma, se os professores e alunos só dependem desse manual para as aulas, o material não responde
as necessidades pedagógicas. Logo, eles não vão compreender adequadamente os conhecimentos
científicos. Este problema também gera um grande impacto sobre professores e alunos de áreas rurais,
pois eles dependem muito desse manual, não havendo outras referências ou fontes de informações.
Adequação contextual:
Esse parâmetro nos mostra se os conteúdos científicos no texto estão adequados à realidade dos
alunos. De acordo com a nossa análise e discussão a adequação contextual, é ‖regular‖, pois o autor
demonstra preocupação em apresentar no manual o contexto de Timor-Leste. Entretanto o conhecimento
que o autor tem sobre o país não está de acordo com a realidade do mesmo. Por exemplo, nas páginas 87
e 88 em que se relatam os aspectos preventivos e curativos relacionados às doenças comuns à produção
animal, o texto aponta o seguinte trecho:
191
Neste trecho, podemos perceber que as indicações propostas desconsideram que em Timor-Leste,
apesar de ter um curso de Saúde Animal na UNTL, ainda são poucos os profissionais atuantes diante da
grande quantidade de animais. Desta forma, exigir um procedimento sem problematizá-lo junto à
realidade do país pode induzir uma ação mecânica e ineficaz. De acordo com Freire (2001) ensinar, papel
do professor e do autor desse manual, não pode contribuir para a burocratização da mente, mas deve
sempre buscar em sua prática pedagógica reconstruir junto aos alunos e leitores os caminhos de sua
curiosidade, através da busca por formas de garantir a discussão dos alunos, questionando sua
ingenuidade. Logo, seria interessante que textualmente o manual expusesse o problema sobre a demanda
por profissionais em saúde animal para que os alunos buscassem alternativas viáveis para contribuir com
a situação problema do país.
Outro ponto importante é que não está presente no conteúdo teórico nenhuma articulação das formas
de produção animal e biotecnologia com a tradição de criação animal do povo de Timor-Leste ignorando
sua história cultural local. Desta forma, pensamos que o manual pode contribuir para uma invasão
cultural (FREIRE, 2011), ou seja, induz valores e praticam externas desconsiderando a identidade
cultural de um povo ou grupo social.
Os Manuais didáticos não contêm apenas linguagem textual, mas também outros elementos
informativos que podem ajudar a atividade docente e a aprendizagem do aluno como as imagens que
podem esclarecer elementos difíceis de descrever textualmente. O livro deveria utilizar tais recursos para
transformar a leitura em um mundo de formas, adaptações, ambientes e cores (VASCONCELLOS e
SOUTO, 2003).
Qualidades de Ilustração:
Observamos que a qualidade das imagens, no conteúdo proposto, são ― xcelente”, pois as imagens
são fotos de qualidade que possibilitam aos alunos compreender melhor o conteúdo escrito no manual e
sua relação com o real a partir de exemplos de animais, ambientes e processos de criação.
192
O texto esta a falar sobre a importância de se entender as doenças contagiosas sobre os animais em
cativeiro. Entretanto, na imagem posta não são apresentados animais doentes, apenas animais em
cativeiro. Nessa mesma imagem também há uma contradição com o texto, pois os peixes, presentes na
figura ―C‖ não estão no cativeiro.
Inserção ao longo do texto (diagramação):
A diagramação é uma estrutura de organização das imagens e elementos textuais do material
didático. De acordo com nosso trabalho, tal organização é ―Excelente‖, porque os textos buscam seguir
uma estrutura relacionada às imagens. Essa estrutura cria uma lógica de leitura que facilita a compreensão
dos alunos sobre o conteúdo.
Grau de inovação:
Nesse parâmetro, como no conteúdo analisado não temos esquemas ou modelos explicativos apenas
fotos, buscamos discutir se as imagens são autenticas ou não e quais são suas referências. Desta forma,
decidimos qualificar o parâmetro como ―Excelente‖, porque todas as imagens que se apresentam nesse
manual foram idealizadas e organizadas pelos ilustradores do mesmo. As imagens são originais, o que
contribui para uma criatividade e articulação entre os textos e as fotos usadas.
193
Contextualização da imagem:
Neste parâmetro buscamos entender a possibilidade de as imagens presentes no manual estarem
articuladas a realidade do aluno e do país (VASCONCELLOS e SOUTO, 2003). Essa articulação é
importante, pois além de facilitar a construção dos conhecimentos, pois revelam a realidade do povo
timorense, também pode contribuir para uma valorização de sua identidade cultural, social e ambiental.
Desta forma, qualificamos como ―Bom‖ tal articulação imagem contexto, pois algumas imagens
presentes no manual não são representativas a realidade de Timor-Leste. Como é possível observar na
imagem a seguir.
Essas imagens representam criadouros de galinhas, porcos e peixes que ainda não existem
efetivamente na realidade do país, sendo as criações domesticas, em sua maioria, ainda rurais e
familiares. Logo, questionamos, como é que o aluno pode aprender sobre distintas formas de produção
animal se o que ele estuda não existe de fato na realidade dele? Esse fato, a nosso ver, representa um
problema complexo para a construção de conhecimentos do aluno, na medida em que ele não
compreendera a relação e a diversidade de formas de produção. Logo o conteúdo escolar, estando fora da
realidade do aluno, em nada contribui para a transformação da mesma (FREIRE, 2011).
Uma vez que o conhecimento não pode ser transferido (FREIRE, 2011), os sentidos e significados
contidos nos manuais didáticos precisam ser re-construídos pelos alunos (VASCONCELOS, SOUTO,
2003). Desta forma, não basta o livro conter os conceitos e definições é preciso repensar os objetivos, as
justificativas e a forma como tais elementos teóricos são dispostos no material, uma vez que estes
materiais são usados tanto por alunos quanto por professores. Neste trabalho, ao propomos com o critério
―actividades propostas‖ buscamos entender como o manual do ensino secundário geral de Timor-Leste,
estabelece as atividades e exercícios propostos. Logo, discutimos se tais elementos possibilitam ou não a
contextualização e problematização dos conhecimentos dos alunos frente a sua realidade. Por isso, são
trabalhados os seguintes eixos: questões propostas, atividades práticas, estímulo a novas tecnologias e
projetos em grupo:
194
Atividades Sim Não
Propõe questões ao final de cada capitulo/tema?
As questões têm enfoque multidisciplinar?
As questões priorizam a problematização?
Propõe atividades em grupo e/ou projeto para trabalho do tema exposto?
As atividades são isentas de risco para alunos?
As atividades são facilmente executáveis?
A atividade tem relação direta com o conteúdo trabalhado?
Indica fontes complementares de informação?
Estimula a utilização de novas tecnologias (ex. Internet)
195
Essa questão pode provocar a capacidade de análise dos alunos, pois cria um problema desafiador
presente na realidade do aluno. Entretanto, o conteúdo analisado ainda é muito pouco problematizado,
porque só houve duas questões com esta preocupação. Pensamos que para se realizar a problematização o
autor necessitaria pesquisar mais sobre a realidade dos alunos, identificando os problema a serem
resolvidos nos exercícios.
196
Indica fontes complementares de informação?
Não, as atividades não se utilizam de outros referenciais ou fontes para reforçar os conteúdos.
Apenas estão presentes as fontes dos conteúdos do texto. Desta forma os alunos não têm acesso ou
indicação de outras referencias para aprofundar seus conhecimentos sobre a temática
A obra analisada não possui um Glossário o que dificulta a compreensão de palavras e termos
científicos principalmente em um contexto como o de Timor-Leste que ainda está se adaptando a língua
portuguesa, como uma língua oficial de instrução. Entretanto, pensamos que mesmo tendo um glossário,
este seria insuficiente para a aprendizagem se estivesse somente em português, sendo necessário também
levar em consideração uma definição conceitual em Tétum outra língua oficial do país, sendo está, a mais
falada.
Da mesma forma os alunos não tem acesso ao Atlas ilustrativo relacionando os conceitos científicos
em Timor-Leste e no mundo. Logo, os alunos não podem reconhecer, por exemplo, as distintas formas de
produção animal nas diferentes localidades do planeta, incluindo Timor-Leste, não produzindo
questionamentos frente à diversidade de formas de produção animal.
No conteúdo analisado no manual, não traz um caderno de exercícios, sendo suas atividades
integralmente dispostas durante o texto e ao final dele. Entretanto, acreditamos que seria necessária a
existência desse material para que os alunos possam ter mais oportunidades de aprendizado
contextualizado a sua realidade.
No manual não são apontados guias de experimentação, pois no conteúdo analisado não existem
atividades laboratoriais. Entretanto, pensamos que é possível se pensar em experimentações para avaliar,
por exemplo, qualidade da carne, leite e ovos, bem como as doenças relacionadas aos animais
domésticos. Esse tipo de atividade se articulada ao contexto local de Timor-Leste pode aproximar teoria e
prática na discussão da produção animal e biotecnológica no país.
Apesar de existir um Guia do professor, este trabalho não o analisou, focando suas considerações no
manual do aluno. Pensamos que para um próximo trabalho seria possível realizar a analise do manual/
guia do professor para fazer maiores considerações a respeito da utilização do material didático durante o
processo de ensino .
197
Considerações Finais
Segundo Vasconcelos e Souto (2003), o livro de Ciências deve propiciar ao aluno uma compreensão
científica, filosófica e estética da sua realidade. Entretanto, consideramos ao analisar o manual do aluno
no conteúdo de Produção Animal e Biotecnologia, do 11 0 ano da rede publica em Timor-Leste, que os
conteúdo são descontextualizados à realidade do país, principalmente quanto às áreas rurais em que
professores e alunos dependem muito desse material. A maioria dos conceitos são descontextualizados,
pois apesar de os conteúdos de práticas de produção animal e biotecnologia falar muito sobre os diversos
modos de criação de animal, tais tratamentos não levam em conta a realidade e o modelo de criação
presente em Timor-Leste. Desta forma, o manual não está levando em consideração a cultura tradicional
de criação de animais no país trazendo unicamente para dentro das salas de aula formas de produção
animal capitalistas e não relacionadas as trocas sociais e culturais cotidianas das famílias timorenses.
Outro problema está na forma como os conteúdos científicos aparecem no manual, não possuindo
uma explicação clara, o que dificultam os alunos no processo de aprendizagem. Desta forma, como é que
o aluno pode aprender a transformar sua realidade a partir do conhecimento científico, se o que ele
aprende na escola não está claro e explicitamente ligado á sua realidade? Por isso, propomos através deste
artigo, que, anteriormente a produção do manual didáticos, é preciso realizar estudos científicos frente a
realidade educacional, cultural e social do país , para posteriormente articular tal contexto a uma
linguagem científica clara em Tetum e Português.
Referências Bibliográficas
FREIRE. P. (2001) .Carta de Paulo Freire aos Professores. Ensinar, aprender: leitura do mundo, leitura
da palavra. Estudos avançados 15 (42).
FREIRE, P. (2009). Pedagogia da Autonomia, Saberes necessários a prática Educativa. Paz e Terra. São
Paulo.
FREIRE. P. (2011). Extensão ou Comunicação?. Paz e Terra. 15. Ed. São Paulo.
RAZERA; BOCCARDO; SILVA (2007). Nós, a Escola e o Planeta dos Animais Úteis e Nocivos.
Ciência & Ensino, Vol.2, n.2.
TIMOR-LESTE (2012a). Ministério da Educação. Reestruturação curricular do Ensino Secundário
Geral em Timor-Leste cooperação entre o Ministério da Educação de Timor-Leste, o Instituto
Portuguesa de Apoio ao Desenvolvimento, a Fundação Calouste Gulbenkian e a Universidade de
Aveiro financiamento do fundo da Língua Português.
TIMOR-LESTE, Ministério do Comercio, Industria e Ambiente. (2012b). Lei de Bases do Ambiente
Decreto - Lei26/2012.
TIMOR-LESTE, Ministério da Educação: MENDES, A; SANTOS, C; PINHEIRO, E. (2013). Manual do
Aluno BIOLOGIA 11º ano de escolaridade. 1ªed.
VASCONCELOS, S. D; SOUTO, E. (2003). O livro didático de Ciências no ensino fundamental –
proposta de critérios para análise do conteúdo zoológico. Ciência & Educação, v. 9, n. 1, p. 93-104.
198
CONSTRUÇÕES DE MATERIAIS DIDÁTICOS NO ENSINO DE GENÉTICA
EM TIMOR-LESTE
Introdução
A partir de nossa realidade no que se refere ao ensino de Biologia, mais especificamente o tema de
genética, percebemos uma falta de materiais didáticos para os alunos em sala de aula. Dessa forma,
entendemos que nas escolas timorenses predomina um ensino em que os alunos apenas recebem os
conteúdos transmitidos pelos professores, de forma passiva e acrítica. Diante disso, buscamos nesse
artigo contribuir para pensarmos em novos métodos de ensino na disciplina de genética, estimulando os
professores e alunos a pensarem em novas maneiras de ensinar e estudar genética.
Destacamos que para ter um sucesso no processo de ensino e aprendizagem sobre genética em sala
de aula, precisamos construir mudanças sobre a relação entre alunos e professores e vice versa. Essas
mudanças podem ser construídas por meio de diálogo, para formar o sujeito crítico e reflexivo sobre a sua
realidade. Assim como nos fala Freire (1983. 24), ―tentar fazer com que aqueles substituam seus
conhecimentos, associados a sua ação sobre a realidade‖.
Partimos de que estudar genética significa convidar os estudantes a terem curiosidade de aprender
como o gene age numa célula viva? Será que o gene é um fator determinante para nós e nossa geração?
Por quê? Motivados pelas discussões em sala de aula sobre o tema genética, formulamos alguns
objetivos: analisar o processo de ensino-aprendizagem sobre genética e compreender as concepções dos
alunos em relação ao estudo sobre genética, partindo do estudo de organismos vivos (ex: plantas) e
produção de materiais didáticos.
Ao ensinar à informação genética propomos nesse trabalho aprofundar o tema não só a parte teórica,
mas também criar junto com os alunos uma prática de construção de materiais didáticos. Como
professores da Biologia, precisamos pensar em maneiras adequadas para levar os alunos a apreenderem a
genética em sala de aula. Assim, percebo na fala de Libâneo, (2013, p. 75), que a didática e a trabalho
docente não buscam apenas alcançar os objetivos de ensino, mas, o essencial é criar as condições e meios
que mobilizem o aluno para um estudo ativo e o seu desenvolvimento intelectual e crítico.
Entendemos que a construção de material didático revela-se uma parte da ecologia didática, ou seja,
envolve uma postura pedagógica que por analogia, a sala de aula, num contexto de ensino de genética, é
tomada como um ambiente pedagógico, onde as interações e relações professor-aluno e aluno-aluno são
fundamentais no processo educativo. Os temas abordados na construção de materiais didáticos de
modelos pedagógicos foram: As heranças cromossômicas humanas: as estruturas DNA e RNA no seu
processo de replicação, transcrição e tradução; as segregações de gametas de mono até triibridismo e seus
cruzamentos de progenitores; a condensação dos cromossomos na fase de divisão mitótica e meiótica; o
cariótipo humano masculino e feminino em cartazes, dentre outros. Nessa atividade também realizamos
algumas práticas relacionadas à extração DNA no vegetal e uma exposição temática.
Na literatura de educação em ciências, o termo modelo aparece com frequência, mas assume diversos
significados. Sendo assim, consideramos que os modelos pedagógicos construídos pelos alunos
constituíram como uma articulação entre conteúdo e metodologia. Ressaltamos que as imagens e
ilustrações ajudam os professores e alunos a compreenderem o conteúdo que se apresentam de forma
complexo, abstrato e de difícil compreensão.
199
Segundo Piaget (1977), a aprendizagem é um processo dinâmico e criativo, para isso torna-se
importante que os alunos sejam capazes de construírem o seu próprio saber. Nessa direção, Tobin (1992),
acentua que a aprendizagem se deve focar não só no modo como o individuo tenta extrair significado dos
fenômenos, mas, também no papel do contexto social como mediador da aprendizagem.
O assunto de genética trabalhado nessa atividade foi Gene. Cada gene é um trecho de pares de
nucleotídeos ao longo de uma molécula. Portanto, uma molécula pode conter milhares de genes
diferentes. Os genes estão situados em 23 moléculas diferentes de DNA correspondentes aos 23
cromossomos de célula. A maioria dos genes contêm as instruções para a síntese de proteína. Cada
proteína consiste em um ou mais polipeptídios, que são cadeia de aminoácidos.
Se houver alguma mudança na sequência de nucleotídeos , significa que o individuo sofreu alguma
mutação no gene, caso não ocorra uma reparação. Esta mudança pode ser ocasionada por meio de alguma
radiação.
Metodologia
A atividade envolvendo a produção dos materiais didáticos foi realizada com alunos do 8º período do
curso de Biologia na Faculdade de Educação, Artes e Humanidade (FEAH) da Universidade Nacional
Timor Lorosa‘e (UNTL) e contou com a participação de 67 estudantes. À iniciativa dos alunos na
construção dos materiais didáticos se configurou como uma nova experiência no ensino e aprendizagem
de Genética. Durante as aulas de genética, os alunos questionavam: como aprender a genética? Será que é
difícil apreender genética? Como entender a genética? Porque não entender genética? Para tanto, como
professores desta disciplina, temos uma noção de que precisamos responder essas questões de forma
crítica e não simplesmente transmitir o conteúdo.
O ensino de genética no 8º período foca nos conteúdos relacionados às células dos organismos;
cromossomos; ácidos nucleotídeos; segregação dos gametas em meiose, entre outros temas. Na execução
das atividades com os alunos, inicialmente planejamos algumas discussões em sala de aula. Dividimos os
estudantes em grupos para poderem participar intensivamente do debate sobre o conteúdo. A realização
da atividade ocorreu nas seguintes etapas:
Primeira etapa: Produção do material didático. Nesta fase os estudantes receberam seus temas e
já iniciaram o trabalho, mobilizando algumas referências didáticas.
Segunda etapa: Apresentação da produção do material didático.
Terceira etapa: Discussão entre os estudantes e professores partindo dos materiais didáticos
apresentados e dos conceitos de genética abordados.
Quarta etapa: Procedeu-se uma avaliação dos estudantes pelos professores, com o objetivo de
julgar o quanto a atividade foi importante para que os alunos pudessem aprender os conteúdos
de genética. A avaliação foi realizada oralmente, no final da discussão.
Quinta etapa: A partir das discussões dos conteúdos e da apresentação do material didático, os
alunos entregaram relatórios.
Sexta etapa: As práticas de extração de DNA das células vegetais. Cujo objetivo foi responder
algumas curiosidades dos estudantes sobre os conceitos ensinados em sala de aula.
Sétima e última etapa: Realizou-se uma avaliação escrita para provar se realmente os alunos
entenderam os conteúdos de genética discutidos durante a atividade.
200
Como foi feito a produção dos materiais didáticos?
Escolhemos as sementes de alimentos como: feijão, milho, soja, arroz de várias cores e sementes de
plantas não comestíveis pelos homens. Para construírem os materiais didáticos os alunos utilizaram: fios
de eletricidade, cordas finas, cartazes, marcadores, cola, entre outros objetos. A prática de construção dos
materiais didáticos foi guiada por imagens presente nos livros didáticos de genética.
A produção deste material didático foi realizada em quatro (4) momento: 1. Dividir os alunos em
grupos; 2. Os alunos desenharem nos cartazes as figuras pertinentes aos conceitos; 3. Os alunos passarem
cordas ou fios e colassem nos cartazes; 3. Os alunos encherem as figuras, as sementes identificadas
seguem a combinação na produção; 4. A última etapa consiste em aguardar um tempo para que a cola
prenda as sementes nos cartazes.
Essas etapas de produção do material didático foram difíceis e levaram muito tempo, isso por que na
construção dos modelos pedagógicos foram utilizadas também pequenas sementes, o que dificultou o
manuseio durante a elaboração do material didático, de forma que os alunos precisaram ter muita
paciência e atenção. Por fim, para alcançar o resultado desta pesquisa, analisamos se os alunos
conseguiram aprender o conteúdo de genética, a partir da produção de materiais didáticos.
Resultado e Discussões
1. 2
A partir dessa pesquisa, destacamos inúmeras perspectivas dos estudantes frente à construção dos
materiais didáticos e das discussões sobre o conteúdo de genética:
201
Tabela 1. Falas dos estudantes sobre a construção de materiais didáticos.
Argumentos Auxiliar Sugestão
Primeiro argumento - A transmissão do
conhecimento muito importante através do uso Desenvolver este método de ensino
de material didático no ensino. Porque além de Ajuda a entender o em outros conteúdos relacionando ao
construi-los, dá-nos uma ideia para perceber de conteúdo sobre ensino Biologia.
como cria-los. Um exemplo seria nossa prática. genética.
Além disso, estender mais modelos quando tiver
faltado.
- A ser bom promotor na aprendizagem e
quando for um professor no futuro.
Segundo argumento: o conteúdo de ciência
genética é difícil para nós na aprendizagem, por Ajuda a descobrir Sugeriram que aproveitássemos
que, para saber a informação genética existem algumas dificuldades outros recursos relacionados a
muitas contextualizações articuladas e figuras em relação a genética.
presentes nos livros didáticos. Por isso, com a importância dos
construção de material didático se nós treinar a conteúdos da
compreender a cada elementos na estrutura e genética.
molécula que arcabouço a fita de DNA.
No terceiro argumento: Gosta de apreender Os alunos Sugeriram que continuássemos a
como fazer extração de DNA para descobrir os confirmaram que é passar esta atividade prática aos
filamentos de DNA que compõe na célula bom saber e alunos. Outra sugestão é o
vegetal. conhecer os compartilhamento dessa atividade
filamentos de DNA com com alunos do ensino secundário
na extração. em Timor-Leste.
Nota que cerca de 82 % dos estudantes avaliado foram validados (alcançaram resultado positivo com
a atividade), enquanto e 18 % dos estudantes foram invalidados. Isso significa que a construção e o uso
do material didático são ferramentas que podem auxiliar no ensino e aprendizagem de genética. Além
disso, este método é considerado pelos alunos como um método de ensino inovador.
Destacamos que a Língua Portuguesa dificultou a realização dessa atividade e na aprendizagem dos
alunos. Entretanto, usamos no decorrer dessa atividade dual língua (língua tétum e Língua Portuguesa)
para viabilizar a aprendizagem dos alunos. Além disso, percebemos a heterogeneidade dos alunos em sala
de aula, em relação à língua científica, participação do aluno na aula e na realização das tarefas
educativas.
Consideração Final
A partir dos resultados, consideramos que para pensarmos na elaboração desse tipo de atividade
precisamos pensar os objetivos/conteúdos de genética conectados de forma inseparáveis com o método de
ensino. Não se separa forma (método) e conteúdo. Assim, podemos concluir que o conteúdo determina o
método, assim como o método determina o conteúdo. De acordo com Libâneo, (2013, p.169) ―os métodos
não têm vida independentemente, dos objetivos e conteúdo. Assim como assimilação dos conteúdos
depende tanto dos métodos de ensino como de aprendizagem‖. Por fim, consideramos importante e
necessário o uso de materiais didáticos auxiliares como modelos pedagógicos para o processo de ensino-
aprendizagem de genética. Acreditamos que esse tipo de atividade torna o conteúdo de genética menos
abstrato e mais compreensível, de forma, que consideramos esta, um meio para obtermos sucesso no
ensino de genética no contexto timorense.
202
Referência Bibliográfica
Freire. Paulo. (1983). Extensão e Comunicação. Paz e Terra, Candido António, Furtado Celcio, Gasparin
Fernando e Cardoso. 8ª.
Libâneo. Jose. (2013). Didática. Cortez, Editora, 2.ª edição.
Setúval. Francisco (2009). Os Modelos Didáticos com Conteúdos de Genética e a sua Importância na
Formação Inicial de Professores para o Ensino de Ciência e de Biologia. Universidade Federal
Bahia-UFBA, 1ª. Edição. P. 04.
Snustad, Peter. (2008). Fundamentos de Genética. 4a Ed-São Paulo, USP Brasil.
Suryo (2004). Genética.10a Ed.- Universidade Gaja mada, Yogyakarta.
Amabis, M. J. (2004). Biologia. 2a Ed. São Paulo.
203
204
V “ ”
OS ESTUDANTES DO ENSINO BÁSICO NO MUNICÍPIO DE BAUCAU: VEMASSE,
V ,Q ’
Introdução
A educação é uma parte muito importante na vida das pessoas, acredito que através da educação
podemos melhorar a condição do país e dar condições de vida as famílias. Sabemos que a educação de
Timor Leste desde o início da restauração de independência, enfrenta varias dificuldade, como: falta de
sala de aula, cadeiras, mesas, além da falta de professores formadores na área específica.
Na busca de solucionar algumas dificuldades que o país vem enfrentando, o Governo RDTL
implementou no ano de 2011 o programa de Merenda Escolar para os estudantes do Ensino Básico.
O programa Merenda Escolar foi implementado pela lei orgânica do Ministério da Educação de
Timor Leste, através da Direção Nacional Ação Social Escolar (DNASE). Este programa exerce a função
de oferecer alimentos para todos os estudantes do Ensino Básico em todo território nacional. Além disso,
existem cinco objetivos gerais:
1. Melhorar a nutrição dos estudantes do ensino básico e minimizar o número de crianças que
abandonam a escola;
2. Motivar e melhorar o interesse dos estudantes para a aprendizagem;
3. Desenvolver a economia local;
4. Promover a participação dos administradores, conselho da escola, diretor e o conselho dos pais;
5. Promover a ligação entre comunidade e a escola.
Diante disso, este programa conta com a cooperação entre os Ministérios da Educação (ME),
Ministério da Saúde e Ministério do Turismo Comércio e Indústria. Cada Ministério se responsabiliza por
disponibilizar os recursos que lhe compete. O Ministério da Educação foi o criador do programa e tem a
responsabilidade de distribuir a verba e controlar o processo de implementação. No processo de
distribuição do orçamento, desde o início de programa até 2013, o ME disponibilizou 15 centavos para
cada estudantes, por dia. Em 2014, aumentou esse valor para 25 centavos, para cada estudante, por dia.
A outra função ME é controlar todos os processos, desde a distribuição do orçamento até a
implementação no campo. Conforme o Diretor da (DNASE) há um recurso para o salário dos servidores
que corresponde a 50 dólares mensais. Os cozinheiros recebem salário como os servidores, mas eles
ganham conforme o valor que resta da verba que utilizam para comprar os alimentos que devem ser
adquiridos dos agricultores locais.
O Ministério de Saúde organiza o treinamento básico para os trabalhadores (cozinheiros e os
servidores), desde a preparação até o processo de distribuição dos alimentos. Esse Ministério também é
responsável pelo controle da qualidade nutricional e de preparar o menu geral, conforme o quadro:
205
Horário Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado
Leite, pão Batata Soja com Banana Bolo de Banana achada
1a semana com manteiga dôce, com Leite achada, com mandioca com
chá chá chá/água
Sopa com Leite, pão Mandioca Batata doce, Salada de frutas, Bolo de
2aSemana carne e água com com água chá/água com chá/água Bandeira
marmelada
Soja, com Pão com Gelatina com Bolo, com Pão (isi kelapa), Feijoada, com
3aSemana leite /água ovo e leite frutas chá/água chá/água chá/água
Leite, pão Gelatina Salada de Gelatina Pão, com Bolu, com
4aSemana com ovo com Leite fruta, com chá/água chá/água
(omelete) água
(Manual foun ba merenda eskolar ―versaun Tetum)
O Ministério do Turismo Comércio e Indústria fica responsável apenas em fornecer 0,75 gramas de
arroz para cada estudante, por dia. De acordo com a nossa observação o programada merenda escolar,
realizado pelo governo, indica a necessidade de alguns ajustes para que possa beneficiar os estudantes e
comunidade local. Notamos que a implementação desse programa é um processo que exige a articulação
entre instituições, escola e comunidade. Essa parceria parece não ter sido preparada e isso reflete na falta
de estrutura física na escola, falta de formação aos articuladores do programa e falta de incentivo aos
produtores locais. Através da disciplina de Metodologia da pesquisa que foi ministrado pelo Prof. David
Aleixo, M. Pd, estruturamos essa pesquisa como o objetivo de identificar quais são os processos que se
acumulam neste programa, desde o processo de distribuição do orçamento até a maneira de distribuição
dos alimentos para os estudantes.
Metodologia
Nesse trabalho foi realizado uma observação em quatro (4) postos administrativos localizados no
município de Baucau-TL: uma (1) escola de Ba‘aguia; quatro (4) escolas de Vemasse; uma escola de
Venilale e duas escolas de Quelicai. Foram realizadas também entrevistas abertas e aplicação de
questionários com diretor das escolas, professores, estudantes, cozinheiros e o diretor da Direção
Nacional Acção Social Escolar (DNASE).
Resultados
Baseado em nosso plano para essa investigação, dividimos os resultados conforme o total dos postos
administrativos onde realizamos as observações e entrevistas.
Ba’aguia
Nesse posto administrativo entrevistamos 262 estudantes, disitribuídos em nove (9) classe/turma na
Escola Ensino Básico Central de Osso-Huna e uma cozinheira. A cozinheira explicou que:
206
Essa declaração é preocupante, pois o fato dos cozinheiros terem que tirar do seu salário as sobras do
valor da merenda pode ter implicações no seu orçamento familiar. Uma vez que o cozinheiro não é
reconhecido como um profissional e seu trabalho não é remunerado, isso pode gerar insatisfação, além da
redução da qualidade da alimentação dos estudantes.
Venilale
No posto administrativo de Venilale entrevistamos uma cozinheira da Escola Ensino Básico Filial
Badu-mori. De acordo com as informações obtidas nessa entrevista, o programa da merenda escolar
nesta escola está parada, porque o governo ainda não deslocou o orçamento.
Conforme relatos da cozinheira da escola localizada No posto administrativo de Venilale:
já fez dois meses que a merenda está parada, porque falta orçamento para comprar os
alimentos [...] Além disso, ela acrescentou que [...] durante o andamento deste
programa os trabalhadores sentiram que o menu que foi distribuído pelo governo não
está efetivo, porque, não está relacionado com os produtos locais que existem em
Venilale.
Com isso, é possível constatar a falta de articulação dos Ministérios com o grupo de agricultores
locais. Entendemos que essa articulação deve envolver a formação e o incentivo do governo para que
esses agricultores cultivem os produtos com qualidade e quantidade que atendam as necessidades da
escola.
Vemasse
No posto administrativo de Vemasse observamos 4 escolas de ensino básico:
Ensino Básico Filial 1o – 2o Ciclo Católico Vemasse Tasi, composto por 6 turmas;
Ensino Básico Filial 1o – 2o Ciclo Público Cai-Cua, composto por 4 turmas, totalizando 154
estudantes;
Ensino Básico Filial 1o – 2o Ciclo Público No.1 Vemasse Tasi, composto por 6 turmas,
totalizando 302 estudantes;
Ensino Básico Filial 3o Ciclo Público Vemasse Tasi, composto por 9 turmas, totalizando 389
estudantes.
Conforme as informações coletadas, existem dois espaços que funcionam como cozinha (Wai La
Cama e Aubaca). A existência de duas cozinhas deve-se a existência de dois Centros de Ensino Básico.
Então, cada cozinha prepara os alimentos para cada centro. Durante na nossa atividade observamos que
muitas vezes os estudantes não gostam dos laimentos servidos nas escolas. Conforme alguns relatos dos
estudantes ―nós não gostamos da comida porque muitas vezes comemos o arroz com ovo, arroz com
feijão e quase todos os dia as comidas ficam estragados, porque os estudantes não querem comer‖. Além
disso, os cozinheiros enfrentam problema com o menu geral por falta de produtos locais compatíveis.
Quelicai
Observamos duas escolas: Ensino Básico Central 3o Ciclo Lai-soru-lai, composto por 6 turmas,
totalizando 261 estudantes e a escola Ensino Básico 1o – 2o Ciclo Darala com o total de 185 alunos.
Nessa oportunidade nos foi relatado, pelos cozinheiros que:
207
muitas vezes a merenda escola não funciona. Porque, não há dinheiro pelo governo ou
seja governo cancelou o orçamento. Além disso, o menu geral não esta relacionada
com os produtos locais que existe no Quelicai. Para resolver essa problema os
trabalhadores utilizam os materiais para cozinhar conforme dos produtos locais.
Entendemos que na tentativa de resolver a situação, os cozinheiros trocam os alimentos do menu por
alimentos disponíveis no momento e no local. Além disso, conforme informações dos entrevistados, no
ano de 2012, os estudantes após se alimentarem nessa escola apresentaram um mal-estar. Isso demonstra
a falta de controle de qualidade e de fiscalização no preparo dos alimentos.
Considerações finais
Com base nos resultados desse trabalho, podemos concluir que quase todas as escolas enfrentam os
mesmos problemas como: menu geral muitas vezes indisponível em alguns lugares do país, baixa
qualidade dos alimentos, falta de controle de qualidade por parte do governo, falta de treinamento e
formação dos profissionais envolvidos, má gestão dos trabalhadores, má gestão do orçamento, falta de
fiscalização no preparo dos alimentos, falta de articulação do programa com outros setores da
comunidade local, por exemplo, com os agricultores. Diante disso, para melhorar a qualidade dos
alimentos da merenda escolar, o governo através do Ministério da Educação, precisa criar uma lei que
ampare a contratação de trabalhadores qualificados, e oferecer uma formação para uma equipe de
técnicos para controlar a qualidade da implementação das ações e do andamento do programa, desde a
distribuição do orçamento até a distribuição dos alimentos.
Quando se trata da nutrição de estudantes é preciso ter atenção especial, pois o desenvolvimento
cognitivo depende da qualidade de vida dos sujeitos e isso inclui uma alimentação balanceada e de
qualidade.
Referência
MENISTERIO EDUKASAUN (2013). Manual foun ba merenda eskolar (versaun tetum). Diresaun
Nasionál Asaun Social Eskolar. Acesso em : 14 de maio.
208
PREVENÇÃO DA DOENÇA MALÁRIA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NA
ESCOLA SECUNDÁRIA PÚBLICA GERAL FINANTIL
COMORO-DÍLI/TIMOR-LESTE
Celestina de Jesus
Rufina dos Santos
Lara Maria Aquino Guterres
Introdução
A malária já foi uma doença muito frequente em Timor-Leste. Antigamente muitas pessoas
contraíam essa doença e morriam. Atualmente ela está controlada em Timor-Leste, como verificamos no
trabalho de Yapabandara et al. (2015). Segundo dados referidos nesse estudo, no período de 2006 á
2012, a incidência de malária em Timor-Leste diminuiu de 223 mil casos em 2006 para 6148 casos em
2012. Isso representa uma diminuição de 97% de pessoas infectadas pela malária em um período de sete
anos, o que é resultado de inúmeras estratégias e medidas governamentais, entre as quais cita-se a criação
do Programa Nacional de Controle da Malária (PNCM) e do Laboratório Nacional de Controle de
Qualidade. Esse laboratório destina-se ao treinamento de microscopistas para fazer o diagnóstico da
doença nos postos de saúde dos distritos timorenses e nos serviços de emergência dos hospitais de Timor-
Leste (YAPABANDARA et al., 2015). Os dados citados na pesquisa de Yapabandara et al. (2015) já são
resultados de coletas feitas pelo PNCM em cooperação com os serviços distritais de saúde e o sistema de
informação e gestão em saúde do Ministério da Saúde de Timor-Leste. Além disso, o PNCM desde 2006
tem realizado levantamentos entomológicos em todo território timorense para a implementação de um
programa de controle do mosquito Anopheles sp., vetor da malária (YAPABANDARA et al., 2015).
Entendemos por vetor o veículo que transporta o parasita entre dois hospedeiros. Assim, tanto seres
vivos como objetos podem se comportar como vetor. Se for um objeto como seringa contaminada pode
trasportar o agente causador da malária de um paciente contaminado para um indivíduo saudável. O vetor
intermediário da malária é o mosquito do gênero Anopheles sp. (SEIXAS, 2013). Em Timor-Leste foram
encontradas 13 espécies de Anopheles, todas transmisoras da malária (YAPABANDARA et al., 2015).
O agente causador da malária é um protozóario pertencente ao género Plasmodium sp.. Este
protozóario é introduzido no sangue do ser humano através da picada da fêmea do mosquito. Quando o
mosquito Anopheles sp. pica o ser humano para se alimentar de sangue, o Plasmodium sp., que se
encontra nas glândulas salivares do inseto, entra na corrente sanguínea do indivíduo. Através do sangue o
parasita atinge as células do fígado humano, podendo aí permanecer latente durante algum tempo ou
começar de imediato a se multiplicar ativamente. Os novos parasitas que surgem no fígado voltam a
corrente sanguínea e invadem os glóbulos vermelhos onde voltam a se reproduzir, levando ao
rompimento destas células. Esse processo lança milhares de Plasmodium sp. na circulação. Se um
mosquito picar um ser humano infectado, torna-se vetor da doença, pois o parasita que veio no sangue
ingerido pelo inseto atravessa seu estômago, multiplica-se e atinge as glândulas salivares, completando o
seu ciclo (SEIXAS, 2013).
Existem quatro espécies do protozoários que causam a malária: Plasmodium falciparum,
Plasmodium vivax, Plasmodium maláriae e Plasmodium ovale, sendo que o tipo da malária manifestada
dependerá da espécie que o ser humano for infectado (SEIXAS, 2013).
209
Tendo em vista esse contexto, nesse artigo relatamos uma experiência didático-pedagógica
desenvolvida em duas turmas do 11o ano do Ensino Secundário na Escola Geral Finantil Comoro,
localizada em Díli, Timor Leste. A temática escolhida e desenvolvida foi sobre saúde da população
timorense, com foco na doença malária. Objetivamos trabalhar informações sobre a doença malária,
procurando levantar os conhecimentos prévios dos alunos para relacioná-los com a realidade escolar e
social em que vivem e ao conhecimento científico. Assim, nossa pretenção foi dialogar com os alunos,
trocando conhecimentos sobre a malária, afim de contribuir com a escola e a sociedade e também com a
prevenção dessa doença em Timor Leste.
As atividades didáticas foram realizada por três estudantes do curso de Licenciatura em Biologia da
Faculdade de Educação Artes e Humanidades da Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL), como
um trabalho da disciplina de Parasitologia, cursada no quarto semestre do referido curso. Nessa disciplina
foram estudados conteúdos, tais como: a relação entre parasita e hospedeiro, conceito de vetor, tipos de
vetores, os parasitas e as doenças relacionadas a esses, as epidemias que ocorreram e ocorrem em Timor
Leste e em outros países, por exemplo: virus Ebola em alguns países na África e a malária no Brasil e
também em Timor-Leste, dentre outros conteúdos.
Considerando esses conteúdos optamos pelo tema malária para realizar nosso trabalho, tendo em
vista a prevenção dessa doença na comunidade escolar e na sociadade timorense. Assim, inicialmente
relizamos uma entrevista (anexo1) com dois médicos que atuam no Hospital Nacional Guido Valadares
(HNGV) localizado em Díli. Queriamos saber algumas informações científicas sobre a malária e o seu
contexto em Timor-Leste. Essas informações nos auxiliaram na preparação das atividades de intervenção
na escola onde realizamos nosso trabalho.
Escolhemos a Escola Secundária Geral Finantil, pois já tínhamos contato na Universidade com a
professora de Ciências Naturais da escola. Essa escola situa-se no Suco Comoro em Díli, em uma
comunidade que possui sérios problemas de saneamento básico, por exemplo, esgoto a céu aberto, lixo
nas ruas e na própria escola. Além disso, quando chove um pouco mais a escola fica alagada o que
impossibilita a realização das aulas.
Nosso primeiro contato na unidade escolar se deu com a professora da disciplina, pois precisávamos
da sua parceria para realizar nosso trabalho. A professora concordou que realizássemos as atividades
didáticas em uma manhã, reunindo duas turmas do 11º ano, totalizando 40 alunos. Também tivemos uma
conversa com o diretor da escola para que o mesmo autoriza-se a realização das atividades nas turmas.
Nesse momento fizemos algumas perguntas para conhecermos um pouco da realidade daquela unidade
escolar. O diretor lamentou que a Escola Pública Finantil fosse diferente de uma escola privada, porque
não têm espaços didáticos, como biblioteca e laboratório de ciências, o que segundo ele torna mais difícil
a aprendizagem dos alunos com o uso apenas de manuais didáticos.
Considerando as informações dadas nas entrevistas sobre a malária e o seu contexto em Timor-Leste,
bem como os conteúdos que abordam a doença presentes no livro de Parasitologia de Seixas (2013) e no
manual didático de Biologia do 10o ano adotado nas escolas secundárias de Timor Leste, preparamos uma
sequência didática para duas aulas, sendo:
- Apresentação dos nossos objetivos.
- Conversa inicial com os alunos sobre o que é a malária? O que eles já sabem sobre essa doença?
- Apresentação de power point sobre a malária, dados em Timor-Leste, características, vetor, ciclo
da doença, seu tratamento e prevenção.
- Atividade em grupos: trabalho com questionário de pesquisa.
210
Com relação aos nossos objetivos, os mesmos foram oralizados no início das atividades, pois
tínhamos que explicar para os alunos porque estávamos realizando o trabalho sobre a malária na escola.
Além disso, precisávamos conhecer um pouco da realidade daqueles alunos e tentar estabelecer um
diálogo com eles, trocando conhecimentos sobre o tema, tendo em vista o processo de ensino-
aprendizagem. Logo, nessa sequência didática buscamos trabalhar a prevenção da malária com os alunos
no contexto de Timor-Leste, afim de contribuir com a escola e a sociadade timorense.
Considerando as atividades didáticas realizadas com os alunos, avaliamos que a maioria deles
tiveram interesse e participaram das discussões em sala de aula. Embora o conteúdo sobre a malária
tenha sido trabalhado pela professora no ano anterior percebemos que muitos alunos, pelo tipo de
pergunta elaborada de forma menos complexa sobre a referida doença, apresentaram problemas de
compreensão do conteúdo. Logo, avaliamos que nossa intervenção contribuiu para que eles tivessem
novos conhecimentos sobre a malária, suas características, como diagnosticar, tratar e o mais importante
fazer a prevenção da doença.
Nos questionários respondidos pelos alunos, que serão analisados detalhadamente em outro
momento, percebemos que eles gostariam que esse trabalho tivesse continuidade na escola. Salientaram
que novas intervenções acontessesem, envolvendo o tema da malária.
Contudo, enfrentamos alguns problemas na realização das atividades didáticas, entre os quais a
carência de equipamentos na escola, tais como: falta de computador e data show, o que não nos permitiu
realizar a apresentação de power point sobre a malária, suas caracteristicas, ciclo do parasita, seu
tratamento e prevenção. Essa condição nos obrigou a apresentar por meio de esquemas no quadro os
conteúdos preparados nos slides. Consideramos que esse fato prejudicou nosso trabalho porque não
podemos utilizar várias imagens sobre a doença que auxiliariam no diálogo com os alunos. Quanto aos
211
questionários, os mesmos foram inicialmente preparados para serem respondidos individualmente, mas
escolhemos trabalhá-los em grupo para que fizessem uma discussão antes de responder as perguntas.
Acreditamos que no planejamento e na ação da atividade, pela limitação do tempo de apresentação e
as condições da referida escola, nós tivemos uma importante experiência que nos auxiliará futuramente a
preparar outras atividades didáticas. Pois, nós contribuimos para que os estudantes expresassem os
conhecimentos que já tinham e relacioná-los a alguns desafios enfrentados pela população timorense
sobre a malária. E, principalmente para os alunos serem o exemplo para a suas familias e sua
comunidade.
Algumas considerações
Referências bibliográficas
212
RELATO DE EXPERIÊNCIA: DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA DA TIPAGEM SANGUÍNEA
(ABO/RH) NA COMUNIDADE ACADÉMICA DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO, ARTES E
HUMANIDADES – FEAH/UNTL
Introdução
O sangue é um tecido vivo que tem como principais funções transportar o oxigênio dos pulmões para
o corpo, defender o organismo contra infecções e promover a coagulação. O sangue também é
responsável em transportar os nutrientes para as células e recolher todos os resíduos que se formam nos
órgãos, levando-os até os rins para serem eliminados através da urina.
O sangue é composto de uma parte líquida e de uma parte sólida. A parte líquida chama-se plasma,
que contém proteínas, hormônios e fatores de coagulação, entre outros componentes. A parte sólida
é formada pelas células e plaquetas que são transportadas pelo plasma (IRIANTO; 2012). Sendo assim,
segundo Irianto (2012) e Beiguelman (2003), a parte sólida do sangue é composta por:
Glóbulos vermelhos, também chamados de hemácias ou eritrócitos: contém a hemoglobina,
substância que faz o transporte do oxigênio dos pulmões para as células e do gás carbônico
das células para os pulmões, onde será eliminado. É a hemoglobina que dá a cor vermelha
ao sangue.
Glóbulos brancos, também chamados de leucócitos: têm como principal função defender o
organismo contra elementos externos (vírus, por exemplo), evitando a ocorrência de
infecções.
Plaquetas: são fragmentos de células que atuam na coagulação do sangue junto com outros
fatores que se encontram dissolvidos no plasma. Assim, possuem a função de promover o
estancamento de sangramentos.
A quantidade de sangue que circula no corpo humano corresponde a 1/12 do peso corporal de cada
pessoa. Por exemplo, alguém que tem 70 kg possui em média 5 litros de sangue. A perda de muito
sangue, em um curto espaço de tempo, pode prejudicar a pessoa e até levá-la a morte (IRIANTO; 2012;
BEIGUELMAN, 2003). Para se evitar esse tipo de problema, são realizadas nos hospitais e Centros de
Hemoterapia as transfusões sanguíneas.
Para que se realize uma transfusão sanguínea é importante conhecer os grupos sanguíneos das
pessoas envolvidas. Dessa forma, há vários sistemas de grupos sanguíneos humanos, entre os quais o
sistema ABO e o fator Rh. O sistema ABO do sangue humano é constituído de quatro tipos sanguíneos:
A, B, AB e O, enquanto que o Fator Rh é formado apenas por dois grupos: Rh positivo (possui o
antígeno Rh) e Rh negativo (não possui o antígeno Rh) (IRIANTO, 2012; BEIGUELMAN, 2003).
O sistema ABO foi descoberto no início do século XX, pelo biólogo austríaco Karl Landsteiner
(1868-1943) e sua equipe de cientistas, visto que eles constataram algumas diferenças no sangue dos
indivíduos, o que, certamente, esclareceu a morte de muitas pessoas após transfusões de sangue
(IRIANTO, 2012). Assim, a descoberta do Sistema ABO foi um marco importante na história da
medicina. O médico e biólogo Karl Landsteiner foi agraciado com o ―Prêmio Nobel de Fisiologia‖, em
1930 devido essa descoberta científica.
213
Segundo informações científicas, a propriedade da incompatibilidade dos tipos sanguíneos do
sistema ABO foi confirmada por meio de reações imunológicas entre substâncias presentes no plasma
sanguíneo e na membrana das hemácias. Nesse caso, essas reações ocorrem, respectivamente, entre os
antígenos (ou aglutininas) e os aglutinogênios (ou anticorpos). Logo, existem no sangue humano dois
tipos de aglutinogênios (A e B) e dois tipos de aglutininas (anti-A e anti-B). Com isso, o sangue das
pessoas do grupo A apresenta Aglutinogênio A e aglutinina anti-B; as do grupo B possuem aglutinogênio
B e aglutinina anti-A. Pessoas do grupo AB não possuem aglutininas no plasma, mas têm aglutinogênios
A e B na membrana das hemácias. Já as pessoas do grupo O não tem aglutinogênios, mas apresentam as
duas aglutininas, anti-A e anti-B no plasma sanguíneo. Em síntese, os grupos sanguíneos do sistema ABO
são classificados em: A, B, AB e O, sendo que o sangue do tipo A apresenta aglutinina (anticorpos) anti-
B no plasma. Assim, indivíduos com esse tipo de sangue podem receber dos tipos A e O, contudo, não
recebem do tipo B e nem do tipo AB. O sangue do tipo B apresenta aglutinina (anticorpos) anti-A no
plasma. Assim, indivíduos com esse tipo de sangue podem receber de B e O, porém, não podem receber
sangue dos tipos A e AB. O sangue do tipo AB é o ―Receptor Universal‖ de forma que AB não possui
aglutininas no plasma e pode receber qualquer tipo de sangue. Em outras palavras, o sangue AB possuem
os antígenos A e B, entretanto, nenhum anticorpo. O sangue do tipo O é o ― Doador Universal‖ uma vez
que possuem os dois tipos de aglutininas (anticorpos) no plasma, anti-A e anti-B, e não apresentam
aglutinogênios (antígenos) dos tipos A e B. Desse modo, ao serem os doadores universais, ou seja, podem
doar seu sangue para qualquer grupo sanguíneo, esses indivíduos só recebem sangue do tipo O. A tabela
abaixo mostra a relação dos grupos sanguíneos do sistema ABO e os tipos de transfusão que os envolvem
(IRIANTO, 2012; BEIGUELMAN, 2003).
Tabela 1: Relação dos grupos sanguíneos do sistema ABO e os tipos de transfusão que os envolvem.
Grupo Sanguíneo Aglutinogênios nas Aglutininas no Recebe de Doa Para
Hemácias Plasma
A A Anti-B AeO A e AB
B B Anti-A BeO B e AB
AB AB - A, B, AB e O AB
O - Anti-A e Anti-B O A, B, AB e O
Além de desvendar a tipologia sanguínea do sistema ABO, Karl Landsteiner diagnosticou o Fator
Rh, cuja denominação é derivada do nome do macaco do gênero ―Reshus‖, que foi utilizado nas
investigações sobre os grupos sanguíneos. Suas pesquisas demostraram que determinados tipos de sangue
possuem ausência do fator Rh, outros têm a presença do fator Rh. Dessa forma, uma vez que os
indivíduos que apresentaram as hemácias aglutinadas pelo anticorpo Rh, foram classificadas como Rh
positivas (Rh+), enquanto que as hemácias dos que não se aglutinaram, foram chamadas de Rh negativas
(Rh-). Uma doença congênita relacionada ao fator Rh é a ―Eritroblastose Fetal‖, também conhecida como
Doença Hemolítica do Recém-Nascido ou ―doença de Rhesus‖. Ocorre quando o sangue de um feto Rh+
é aglutinado pelos anticorpos do sangue da mãe Rh-, num processo chamado de hemólise. Assim, a
criança nasce com profunda anemia e geralmente com icterícia, decorrente da alta destruição das
hemácias (IRIANTO, 2012).
Portanto, fica claro que o sistema ABO e o fator Rh possuem uma função muito importante na
biologia humana. Nesse sentido, para identificar se uma pessoa pode doar ou receber sangue é necessário
conhecer os grupos sanguíneos que ela pertence (do sistema ABO e do fator Rh). Desse modo,
entendemos que a transfusão de sangue é o ato pelo qual o médico transfere certa quantidade do sangue
total ou de alguns dos seus componentes e derivados (plasma, plaquetas, hemácias, leucócitos, albumina,
fatores de coagulação, etc) de um indivíduo, chamado doador, para o sistema circulatório de outro
indivíduo, chamado receptor. Dessa forma, o único substituto para o sangue de uma pessoa é o sangue
214
compatível de uma outra pessoa que só pode ser administrado por meio de uma transfusão venosa. Mas,
como se faz a transfusão de sangue?
O sangue é colhido de uma pessoa (doador) e conservado no interior de uma bolsa plástica
descartável contendo anticoagulante e conservante. Nesse processo, o doador não corre nenhum risco de
contaminação, porque todo o material utilizado é descartável. Ele deve ter idade entre 16 e 69 anos, pesar
mais de 50 quilos, estar em bom estado de saúde, não ser dependente de tóxicos, não estar tomando certos
medicamentos e realizar apenas "sexo seguro". O doador deve ser previamente examinado, realizando
vários exames clínicos para se constatar se está ou não em boas condições de saúde e que o seu sangue
não esteja contaminado. Além do mais, por exemplo, a gravidez, cirurgias recentes, a hipertensão ou a
hipotensão arterial e a anemia, são situações que desqualificam o doador temporariamente, até que o
problema seja superado (IRIANTO, 2012; BEIGUELMAN, 2003).
Constatados os critérios para doação do sangue, as pessoas que possuem bom estado de saúde podem
passar pelo processo de recolhimento do sangue. Nesse sentido, o sangue ou um de seus componentes
pode ser transfundido para uma ou várias pessoas que necessitam. Outro cuidado que se deve ter antes do
início de uma transfusão, é a realização de um exame para assegurar a compatibilidade dos grupos
sanguíneos do sistema ABO entre o doador e o receptor. O sangue deve, então, ser administrado por meio
de uma cânula do calibre apropriado, por via intravenosa. O volume a ser transfundido e o tipo de
transfusão a ser feita devem ser determinados pelo profissional da saúde. O mais comum é que sejam
administrados de 450 a 500 mililitros de sangue total, num período de quatro horas. Um anti-histamínico
pode ser dado ao receptor antes da transfusão para impedir ou minimizar possíveis reações alérgicas
indesejáveis. Nesse caso, o paciente geralmente está internado em um hospital ou recebe a transfusão em
um hemocentro, em regime de hospital-dia, sempre a critério médico (IRIANTO, 2012; BEIGUELMAN,
2003).
O objetivo desse trabalho consiste em ajudar os estudantes e professores que frequentam a Faculdade
de Educação, Artes e Humanidades da Universidade Nacional Timor Lorasa‘e (FEAH UNTL) a conhecer
os seus tipos sanguíneos do sistema ABO/Rh e a importância das transfusões sanguíneas.
Metodologia e Resultados
Considerando todo esse contexto, realizamos uma atividade que permitissem os estudantes e
professores que frequentam a Faculdade de Educação, Artes e Humanidades da Universidade Nacional
Timor Lorasa‘e (FEAH UNTL) conhecerem os seus tipos sanguíneos do sistema ABO/Rh e a
importância das transfusões sanguíneas. Assim, pensamos que o tipo de sangue do sistema ABO e Rh
fazem parte da nossa identidade. Além disso, tivemos a finalidade de alertar as pessoas para participarem
na doação de sangue, o que pode contribuir para salvar vidas. A atividade foi desenvolvida durante uma
exposição científica que ocorreu na FEAH/UNTL no mês de outubro de 2014.
A FEAH existe desde que se iniciou a UNTL. Integram a Faculdade nove departamentos de
diferentes áreas que são: Departamento da Língua Inglesa, Departamento de Ensino de Biologia,
Departamento de Ensino de Matemática, Departamento de Ensino de Química, Departamento da Língua
Portuguesa, Departamento do Ensino de Física, Departamento Formação dos Professores do Ensino
Básico, Departamento do Ensino Físico e Desporto e Departamento de Dalen Tetum. Está localizada no
Liceu, na Avenida Dr. Franscisco Machado em Dili.
A atividade aqui descrita foi realizada na exposição científica por três estudantes do Curso de
Licenciatura em Biologia e um professor do Departamento do Ensino de Biologia da Faculdade de
Educação Artes e Humanidades, Universidade Nacional Timor Lorosa‘e. Essas atividades têm como
referência autores como Bordin; Covas; Langhi Júnior (2006); Colagrossi; Cunha-Laura.; Zorzatto
(2006). O estudo desses referenciais iniciou-se num trabalho da disciplina Anatomia e Fisiologia
215
Humana, cursada no V e VI semestre do referido curso. Nessa disciplina foram estudados conteúdos
sobre a estrutura e funcionamento do ser humano, por exemplo, o sistema circulatório e os grupos
sanguíneos.
Relacionado ao conteúdo do sistema circulatório foi trabalhado na disciplina o sangue e a tipagem
sanguínea, enfatizando os principais grupos sanguíneos, no caso o sistema ABO, o fator Rh e o sistema
MN. Desse modo, realizamos o nosso trabalho, tendo em vista a divulgação científica desse
conhecimento na Comunidade Acadêmica da FEAH/UNTL.
Assim, inicialmente nós fizemos uma discussão com o professor da disciplina que está vinculada ao
Departamento do Ensino de Biologia. Queríamos saber se o tema tipagem sanguínea poderia ser
trabalhado com a comunidade da FEAH/UNTL. Essas informações nos auxiliaram na preparação das
atividades na exposição científica.
Na sequência, fizemos um contato com a Comissão Organizadora da Exposição Científica que iria
acontecer na FEAH/UNTL para realizarmos um trabalho sobre tipagem sanguínea. A comissão
concordou com a divulgação e a realização da atividade se deu durante dois dias, tempo de duração da
exposição científica.
Considerando os conhecimentos sobre tipagem sanguínea descritos na introdução do presente
trabalho, bem como os referenciais como: Bordin; Covas; Langhi Júnior (2006) que falam sobre
Hemoterapia: Fundamentos e Prática e de Novaretti; Dorlhiac-Lliacer; Chamone (2000) que trata sobre as
transfusões sanguíneas envolvendo os sistemas ABO e Rh, preparemos nossa atividade para a Exposição
Científica que consistiu em fazer a tipagem sanguínea dos participantes e frequentadores que eram
principalmente alunos e professores da FEAH/UNTL. Utilizamos alguns materiais de experimentação,
tais como: luvas, algodão álcool, lanceta de sangue, lâmina, reagentes como soro anti-A, soro anti-B, soro
anti-AB, soro anti-D, stick e caixa de safeti.
Realizamos os seguintes procedimentos:
Convidar e motivar os participantes e frequentadores da exposição para realizarem a tipagem
sanguínea e assim saberem o seu tipo sanguíneo do sistema ABO e Rh.
Repassar alguns conhecimentos sobre os grupos sanguíneos humanos para a comunidade
acadêmica.
Realização dos testes de tipagem sanguínea que consistiam em: limpar o dedo com o algodão e
álcool, furar a ponta do dedo com o lanceta de sangue, retirar quatro gotas de sangue e colocar
sobre lâminas limpas, misturar com auxílio do stick o sangue com os soros anti-A, anti-B, anti-
AB e anti-Rh ao sangue que já estava sobre as lâminas (para cada gota de sangue se misturou um
tipo de soro). Observar o resultado (se ocorreu reação de aglutinação).
O sangue que mostrar a reação de aglutinação será identificado. Quando ocorrer aglutinação no
sangue misturado com o soro anti-Rh, identifica-se a pessoa como pertencente ao fator Rh
positivo (+), quando não ocorrer aglutinação, seu fator Rh é negativo (-). Esse procedimento se
repetiu para a tipagem dos grupos do sistema ABO: reação de aglutinação no sangue misturado
com soro anti-A identifica-se como pertencente ao grupo A; reação de aglutinação no sangue
misturado com soro anti-B identifica-se como pertencente ao grupo B; reação de aglutinação no
sangue misturado com soro anti-AB identifica-se como pertencente ao grupo AB; quando não
ocorreu aglutinação em nenhum dos soros identifica-se o sangue como pertencente ao grupo O.
No final da Exposição Científica, conseguimos identificar os tipos sanguineos de 120 participantes,
que estão representados nas figuras a seguir:
216
Figura 1: Indivíduos pertencentes aos grupos sanguíneos do Sistema ABO
Algumas considerações
217
transformação da realidade. Assim, a participação das pessoas nessa atividade acadêmica teve como
motivo principal a problematização sobre a temática dos grupos sanguíneos do sistema ABO e Rh.
Através da troca de questionamentos e ideias sobre a tipagem sanguinea consideramos que podemos
contribuir com a construção do conhecimento científico em Timor-Leste.
Referências Bibliográficas
218
PARTE IV
CURRÍCULO, CULTURA E COMUNICAÇÃO
219
220
O CURRÍCULO DE FILOSOFIA APÓS REESTRUTURAÇÃO DO CURRÍCULO PADRÃO
MÍNIMO EM TIMOR-LESTE
Flávio Clementino
José Roberto Sanabria de Aleluia
Teorias curriculares
O currículo enquanto campo de estudos inicia-se por volta dos anos 1920, nos EUA, provocado pelo
recente processo de industrialização e a massificação da escolarização. Uma das primeiras publicações
sobre é de Franklin Bobbitt, The curriculum, de 1918. O modelo dos primeiros currículos é a fábrica,
tendo o molde teórico a administração científica de Taylor. No currículo encontramos os objetivos,
procedimentos e métodos utilizados para obter resultados mensuráveis (Silva, 2009: 12). Nesse primeiro
momento, não havia uma discussão acerca desse tema, nesse sentido, Bobbitt acaba por inventar um
campo novo, uma discussão que se originava nesse momento. Dessa maneira, todos aqueles que direta ou
indiretamente se ocupavam com os assuntos de administração escolar utilizaram esse formato como um
padrão curricular.
Poderíamos, a partir de então, conceituar o ―currículo‖, porém seu conceito ou definição depende
organicamente das teorias usadas enquanto arcabouço descritivo. Como dito acima, essa discussão inicia-
se com Bobbitt, que na verdade inaugura uma temática, cabendo aos seus sucessores nessa discussão
debater o currículo de forma crítica, descrevendo o currículo através de perspectivas diferentes.
Todavia, embora teorias novas abordem o currículo por vias diferentes, uma questão perpassa todas
elas, a saber: qual conhecimento deve ser ensinado? A questão central se mostra ―o que ensinar‖. Ao
responder essa questão (derivações da mesma pergunta: o que ensinar, qual conhecimento se mostra
essencial, o que os alunos devem saber, qual conhecimento é válido), as teorias se diferenciam no
processo de seleção de conteúdos e sua justificativa para tanto. De acordo com Silva (2009: 15), ―o
currículo é sempre o resultado de uma seleção: de um universo mais amplo de conhecimento e saberes
seleciona-se aquela parte que vai constituir, precisamente, o currículo‖.
Dito isso, pode-se apontar as primeiras teorias sobre o currículo como sendo teorias tradicionais,
aceitam o contexto vigente como dado, sem questionamento prévio da sociedade ou de seus agentes
sociais. As teorias tradicionais partem da questão ―que ensinar‖ como solucionado e partem para o ―como
ensinar‖. As teorias críticas e pós-críticas, por sua vez, se caracterizam enquanto questionadoras e
procuram entender a sociedade de então tentando entender por que um conteúdo é preterido a outro, por
que esse conhecimento e não outro, quem ganha e quem perde com determinadas escolhas, ou seja,
problematizam todo o campo em torno do currículo, daí serem chamadas de teorias críticas.
Outro fator que reafirma o campo ―currículo‖ como relevante para os estudos é o que diz Michael
Apple, importante estudioso da área. Para ele, existe uma relação significativa entre a educação e a
estrutura econômica, assim como o conhecimento e poder. Apple defende outras teses relevantes nesse
contexto; afirma que a educação não é um empreendimento neutro e que o educador está envolvido num
ato político (consciente ou não), em função do caráter do seu oficio, sendo impossível separar sua
atividade educacional das ―diferentes reações dos sistemas institucionais e das formas de consciência‖
que imperam nas sociedades pós-industrialização (Apple, 2006: 35). Dessa maneira, é necessário
entender como a educação atua no setor econômico de uma sociedade (de maneira crítica, reprodutiva),
como as escolas criam e recriam formas de consciência que permitem o controle social nas mãos de
grupos dominantes, constituindo um processo hegemônico de poder. O campo do currículo se mostra o
lugar específico para tais questionamentos e reflexão.
221
O currículo padrão mínimo
O processo de reestruturação curricular vem a público nos dias 18 e 19 de agosto de 2015, quando a
Direção Nacional Currículo Ensino Superior, órgão vinculado à Direção geral Ensino Superior, apresenta
à comunidade os resultados dos trabalhos anteriores para avaliação e sugestão. Esse encontro tem como
objetivo apresentar o documento com a estrutura do Currículo Padrão Mínimo definido pelos grupos de
trabalhos (divididos por áreas de interesses), discutir os resultados alcançados e esclarecer possíveis
dúvidas. Depois da reestruturação, os cursos (novos e os já existentes) ficam distribuídos em 4
modalidades de formação diferentes, como mostra a figura abaixo:
Dos cursos de licenciaturas, apenas História e Geografia apresentam-se como novidades, porém, em
outras modalidades, outros 4 cursos foram criados. O currículo do curso de Filosofia, subárea das
Ciências Sociais e Humanas (área coordenada por Faustino Cardoso Gomes) fica sobre a
responsabilidade do Padre Kasmir Neuma, tendo como assessora Luisa Coutinho. Vejamos algumas
características desse currículo.
222
A filosofia é estudada nas Universidade de Timor-Leste e os Timorenses têm propensão para o
pensamento filosófico graças aos sistemas tradicionais de crenças, à religião católica e à história
recente. O curso de Filosofia estuda os aspectos mais fundamentais da realidade e dos valores,
assim como reflecte sobre as questões fundamentais sobre a nossa existência no mundo. ―Qual é
o significado e o objectivo da minha vida? Quais são as minhas obrigações e responsabilidades
como ser humano? Como devo viver para ser um bom ser humano? Qual é o significado e o que
implica a minha dignidade e a dos outros como ser humano? O que é que a transcendência
significa na minha vida?‖ Exploram-se os ideais filosóficos dos grandes pensadores da História
da Humanidade, e colocam-se as questões filosóficas que são os fatores de base em todos os
outros campos de estudo, tais como Artes, História, Antropologia, Economia, Ciências Sociais,
Ciências Empíricas, assim como a Teologia. (Timor-leste, 2014: 89).
Enquanto objetivo propriamente dito do curso, apenas as últimas linhas ―exploram-se os ideais
filosóficos dos grandes pensadores (...)‖ se enquadram enquanto tal; a maior parte do tempo o texto se
prende numa possível justificativa do porquê estudar filosofia, mostrando alguns aspectos que aproximam
o povo timorense às características desse curso, como exemplo, os ―sistemas tradicionais de crenças, à
religião católica e à história recente‖ o que também se mostra questionável em termos de justificativa.
Outra característica importante do texto, mas ainda não enquanto objetivo, são algumas questões
existencialista-transcendentais, direcionando e, até certo ponto, limitando o debate filosófico em questões
de cunho existencial.
De acordo com o documento, não fica claro que o curso de filosofia possui um fim em si mesmo, ou
seja, ao egresso não há a possibilidade de atuar numa área específica, como por exemplo, professor de
filosofia (do ensino superior ou fundamental). No item Justificativa do grau é afirmado que a licenciatura
em Filosofia assegura uma ―formação de base que se adeque aos estudantes provenientes do ensino
secundário, seguida de uma formação significativa na componente profissional da área de Filosofia‖; o
texto continua afirmando que também há as disciplinas como ―matérias de especialização adequadas ao
exercício das atividades escolhidas‖ (IDEM). Alinhado a essa ideia, o texto continua afirmando que o
curso prepara os alunos ―para uma actividade profissional numa variedade de configurações privadas e
públicas, onde o conhecimento das grandes questões humanas é importante‖.
No texto das competências Específicas, essa veia mercadológica do curso de Filosofia fica explicita,
na medida em que temos as seguintes competências ressaltadas: a) proficiência da comunicação oral e
escrita; b) utilizar a informática na óptica do utilizador; c) aplicar o pensamento crítico para informar e
comunicar julgamento profissionais; d) desenvolver competências organizacionais;
O aluno regresso do curso de Filosofia poderá atuar em vários campos e áreas das mais diversas. É o
que diz o item Saídas profissionais, que apresenta como opções de atuação para o profissional formado
em filosofia: a ) filósofo, investigador; b) docente; c) assessor ou consultor no desenvolvimento de
políticas; d) assessorar nas áreas de ética, deontologia, direito, comunicação; e) colaborar com entidades
estatais, organizações não-governamentais, religiosas, administração local e regional e agentes de
desenvolvimento local e regional; f) outros.
Diante do exposto, o curso de filosofia se apresenta enquanto um acessório ou uma ferramenta a ser
empregada em outras áreas, e em especial aquelas relacionadas ao governo direta ou indiretamente. A
princípio, o objetivo maior do curso seria a formação de mão-de-obra para compor os cargos
governamentais e não necessariamente formar profissionais que terão a Filosofia como campo de atuação,
seja na pesquisa ou no ensino. Mesmo o item Saídas profissionais afirmando o contrário, pois lá
encontramos filósofo, investigador e docente como possibilidade de atuação profissional. Mas
ressaltamos, é a primeira vez que a palavra docente aparece no documento, além, é claro, do curso não
apresentar as disciplinas específicas para a formação voltada para a sala de aula, as disciplinas
pedagógicas por excelência, o que veremos à frente.
223
A organização curricular
Para tecermos alguns comentários sobre o currículo apresentado na reestruturação, adotaremos outros
três currículos como parâmetro comparativo. Provenientes de duas universidades brasileiras, a saber,
UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e USP (Universidade de São Paulo), e de uma
universidade portuguesa, UC, (Universidade de Coimbra). Reafirmo, essa escolha serve apenas como
parâmetro de comparação, deixando o juízo de valor (melhor ou pior) de lado. Todavia, são universidades
de reconhecimento internacional pela qualidade apresentada, sem mencionar o fato de contar com uma
longa história e experiência educacional, em particular, com o currículo de Filosofia.
O curso de Filosofia em Timor-Leste, modalidade licenciatura, é pensado em quatro módulos
distintos e complementares. Cada módulo possui uma distribuição de créditos mínimos e disciplinas
específicas de acordo com sua área de conhecimento. Os módulos são: curso de fundação. Nesse módulo
são ofertadas disciplinas introdutórias dos conceitos básicos em filosofia. De acordo com Ximenes
(2014), é nesse momento que o aluno obtém a ―base firme às teorias básicas, aproximações, estratégias e
programas dentro do programa de estudos‖.
O próximo módulo é o curso profissional. Nesse módulo temos as disciplinas que caracterizam a
identidade do curso; além disso, essas disciplinas integram áreas de conhecimento relacionadas com a
profissão; possui a maior carga horária, assim como o maior número de créditos dos quatros módulos. O
curso de especialização, o terceiro módulo, está organizado com o objetivo de ―desenvolver as
competências necessárias ao desempenho das funções do futuro graduado‖. Nessa perspectiva, são
aprofundadas as discussões sobre temas considerados cruciais para o bom desenvolvimento do graduado
nas áreas teóricas e práticas. Por último temos o conteúdo institucional. São disciplinas que visam atender
exigências do Ministério da Educação, de caráter obrigatório, necessárias para o desenvolvimento das
capacidades linguísticas, de investigação a vida em sociedade, elevando assim o capital social dos alunos.
224
A concepção de filosofia adotada
O curso de filosofia ora apresentado possui uma forte orientação presbiterial, de cunho tecnicista-
existencial (razão instrumental), cujo objetivo está pautado (pelas disciplinas que compõem o currículo e
não o objetivo apontado no documento) nos ―fundamentos da realidade‖ (epistemologia e ontologia) e
―nos valores‖ (ética e política), refletindo sobre a ―existência no mundo‖ (existencialismo). Essa base
existencialista possui um lastro religioso, marcado com as disciplinas Filosofia de Deus, Filosofia da
Religião, Filosofia do Islão e do Cristianismo, especialmente com a afirmação presente nos objetivos do
curso (apontados no documento), como sendo o povo Timorense propenso ao pensamento filosófico em
função dos sistemas tradicionais e crenças, sobre tudo à religião católica. Além dessa via existencial,
podemos afirmar também o caráter tecnicista organizacional, tendo em vista uma formação voltada para
os quadros administrativos das instituições públicas e privadas. Essa informação se justifica na medida
em que se destacam as competências apontadas, como ―aplicar o conhecimento crítico para informar e
comunicar julgamentos profissionais‖.
A partir das disciplinas que compõem o documento produto da reestruturação curricular em Timor-
Leste, algumas questões antigas surgem e outras novas são criadas, porém algumas questões clássicas,
objeto de reflexão de importantes pensadores na história da filosofia, foram resolvidas talvez sem uma
adequada reflexão, por exemplo, qual de fato seria a função da filosofia? Seria a Filosofia uma ferramenta
para outras disciplinas, assim como a Matemática é para a Física (pensando estritamente de forma
instrumental) ou possuiria a filosofia um fim em si mesma, capaz de propor problemas de cunho
existencial (tópico exaustivamente debatido no documento) que, pela sua própria constituição e caráter,
não se subordina a nenhum outro, mas pelo contrário, se mostra a base de solução e compreensão de
todos os demais. Ao propor como ―saídas profissionais‖ a colaboração com entidades estatais e
competências organizacionais como qualidades esperadas os formandos em filosofia, o documento parece
fechar os olhos para essa discussão.
Por outro lado, mesmo dentro das disciplinas profissionais (aquelas voltadas para a constituição da
identidade do curso), há um tecnicismo exacerbado, não no sentido empresarial, mas no sentido
academicista, ou seja, todas as disciplinas clássicas da filosofia estão presentes (históricas e temáticas),
porém não há um espaço de formação para os futuros professores, aqueles que ocuparão os cargos de
ensino, seja na rede pública ou privada, seja nos cursos superiores ou fundamentais. A formação
filosófica é necessária, não há dúvida, mas não podemos esquecer que o conhecimento técnico filosófico
por si só não contribui com a atuação de um profissional em sala de aula. Existem métodos de ensino,
existem teorias a respeito, além das experiências acumuladas no ensino, que podem ser adquiridas via
estágios supervisionados, ou até mesmo em disciplinas voltadas para a docência (práticas de ensino, por
exemplo), não nos esquecendo das disciplinas relacionadas à docência, como psicologia e sociologia da
educação, além das técnicas, como didática e metodologia de ensino. O campo de formação docente do
currículo apresentado pode ser considerado falho.
Uma última questão, mas não menos importante que as demais, é a territorialização da filosofia.
Existiria uma filosofia essencialmente brasileira ou portuguesa ou timorense? Essa pergunta nos projeta
uma questão singular: existem diferentes formas de pensar e de ver o mundo e elas estariam diretamente
relacionadas com a bandeira nacional que determinada pessoa ostenta? As disciplinas Filosofia da Ásia e
do Pacífico e Filosofia Social de Timor-Leste nos levam a pensar que sim. Se tomarmos os problemas
transcendentais e essenciais da filosofia, as questões clássicas como de onde viemos e para onde vamos,
225
perceberemos que as questões regionais não são relevantes para esse debate, pois nesse sentido o gênero
humano é tomado como universal independentemente de sua origem (ocidental ou oriental). Além do
mais, um ponto que deve ser observado em função dessa divisão (oriente e ocidente) é o próprio
parâmetro adotado pelo currículo em questão. Claramente ocidentalizado, o currículo apresenta
perspectivas que adotam a filosofia originada na Grécia e seu desenvolvimento como padrão. Basta
observarmos as divisões (antiga, medieval, moderna, contemporânea) que coincidem com datações
europeias. Qual seria a metodologia adotada numa disciplina como Filosofia de Deus em um contexto
politeísta como o asiático? Seria uma visão ocidentalizada do oriente? Como pensaríamos os problemas
orientais ou o contexto social timorense, seria a partir de bases gregas, portuguesas ou a questão
―nacional‖, ao contrário do que parece, seria apenas mais um problema?
Referências
APPLE, Michael W. Ideologia e Currículo. Trad. Vinícius Figueira. 3º ed. Porto Alegre: Artmed, 2006.
SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte:
Autêntica, 1999
REVISTA CURRÍCULO SEM FRONTEIRAS: ONLINE. Disponível em:
<http://www.curriculosemfronteiras.org/indexeng.htm>. Acessado em: Acesso em: 30 ago. 2014.
TIMOR-LESTE. Processo de reestruturação do Currículo Padrão Mínimo. 2014.
XIMENES, Marçal Avelino. O conteúdo do padrão curricular para o ensino superior em Timor-Leste.
Dili: Ministério da Educação, 2014.
226
ARTE, AGÊNCIA E EFEITOS DE PODER EM TIMOR-LESTE: PROVOCAÇÕES
Este artigo é a versão em língua portuguesa do editorial ―Art, agency and power effects in East
Timor: provocations‖ 1, que enuncia o dossiê "Art, agency and power effects in East Timor"2,
elaborado sob nossa coordenação para a revista Cadernos de Arte e Antropologia e composto por seis
artigos: Arthur,2015; Bexley,2015; Castro,2015; Simião, Rocha e Rodrigues,2015; Soares,2015;
Veiga,2015.
Esta versão, revista e com tradução própria das citações originais em língua inglesa, emerge na
sequência da sua apresentação oral no II Simpósio de Educação: Língua, Ciência e Tecnologia no
Timor Leste que decorreu em Díli, entre 14 e 16 de Abril de 2015.
Este dossiê vem à luz com o objetivo de figurar como um espaço de análise e reflexão
multidisciplinar sobre produções artísticas em e sobre Timor-Leste. Não obstante, o fato de ser concebido
por dois antropólogos impõe suas marcas. No âmbito deste ensaio e como provocação introdutória aos
leitores interessados no tema, esboçamos algumas questões teórico-metodológicas que nos parecem
necessárias, desde a antropologia, para um pensamento crítico sobre arte em e sobre Timor-Leste.
Discutimos perspectivas possíveis para a abordagem do mundo das artes em e sobre Timor-Leste,
articulando-as, na medida do possível, com os artigos que compõe esse dossiê 3.
Ancorados no preceito de que a emergência de campos artísticos (BOURDIEU, 1983; 1996) é um
processo histórico complexo e de longa duração, explicitamos algumas mediações classificatórias e
institucionais que se fazem presentes em Timor-Leste, bem como em outras fronteiras sociopolíticas, para
suas gestações. Nesse sentido, indicamos como a invenção dos mundos das artes está relacionada aos
processos de invenção, transposição e subversão da modernidade. Tais processos, por sua vez, estão
umbilicalmente ligados à construção dos Estados colonial e pós-colonial. Como consequência,
destacamos a dependência do campo de produção artística de outros campos e ação social, e explicitamos
alguns episódios que marcam a genealogia colonial de produção das artes indígenas e populares no então
Timor Português. Convidamos os leitores a engajarem-se na produção de etnografias das mediações
classificatórios e institucionais implicadas na construção de campos artísticos no Timor-Leste
contemporâneo, trazendo ao texto atores que têm protagonizado tais fenômenos.
Exploramos também o potencial analítico da perspectiva agentiva, concebida por Alfred Gell (1988),
na análise do que, desde uma perspectiva interétnica, podem ser reconhecidas como manifestações
artística leste-timorenses. Nesse contexto, trazemos ao ensaio a problemática do paralelismo semântico
1
Kelly Silva e Lúcio Sousa, « Art, agency and power effects in East Timor: provocations », Cadernos de Arte e
Antropologia [Online], Vol. 4, No 1 | 2015. DOI : 10.4000/cadernosaa.829
Este ensaio é, parcialmente, um produto da linha de pesquisa intitulada Processos de invenção, transposição e subversão da
modernidade, coordenada por Kelly Silva no Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília. Agradecemos ao
CNPq por prover recursos, mediante os processos 201269/2011-2, 307043/2012-6, 401609/2010-3 e 457845/2014-7, que
permitiram a produção das informações aqui analisadas, bem como ao Instituto Nacional de Estudos sobre Administração
Institucional de Conflitos (INEAC).
2
"Arte, agência e efeitos de poder em Timor-Leste / Art, agency and power effects in East Timor", in Revista Cadernos de
Arte e Antropologia, vol.4, nº1, 2015. URL: http://cadernosaa.revues.org/821
3
Em razão de restrições de espaço, não abordamos a problemática da produção literária neste ensaio, a qual merece um
estudo à parte.
227
(FOX, 1988), característica da poética ritual na Indonésia Oriental, como caso exemplar. A centralidade
da ideia de reprodução – por oposição à invenção – como um valor estruturante de algumas produções
artísticas entre as populações locais é também aqui tangenciada. Ainda inspirados pela problemática da
agência, indicamos alguns dos modos pelos quais a construção das artes leste-timorenses esteve e está
relacionada com a emergência do mercado turístico, seja no período colonial como pós-colonial, bem
com à formação de uma narrativa nacional pela mobilização de significantes da tradição, do costume, da
kultura. A mobilização do que Veiga (2015: 85-101) denomina fragmentos da tradição, serve, a um só
tempo, à produção de novos orientalismos bem como a um projeto de identificação nacional.
Reajustando o olhar
Logo de saída, parece-nos necessário colocar em perspectiva o modo como arte tem sido concebida
no que, grosseiramente, denominamos como mundo ocidental. A compreensão de que arte é o que serve à
contemplação estética, exclusivamente, e de que ela seja produzida por especialistas, os chamados
artistas, e que constitua um domínio de ação social autônomo em relação aos demais (política, economia,
ritual, regimes de sacralidade, etc) está longe de poder ser generalizada. Constitui-se, antes, como produto
de desenvolvimentos históricos particulares, dos quais destacamos o romantismo que emergiu entre os
finais do século XVIII e XIX na Europa (MORPHY, 2005) e os projetos de purificação que tem
informado a construção da modernidade ocidental4 (LATOUR, 1994). Disso não se deve concluir,
contudo, que outros coletivos sociais não tenham necessariamente instituições ou espaços voltados à
contemplação estética. O que muitas vezes se verifica é que a apreciação e cultivo da estética aparecem
conjugados com outras ações sociais, ligadas à construção da pessoa, à comunicação com os ancestrais e
com a reprodução da vida, de modo mais geral (LAYTON, 1991; GELL, 1998; MORPHY, 2005;
LAGROU, 2009; entre outros).
Parece-nos também preciso colocar em suspensão as variáveis que têm pautado o reconhecimento de
certas expressões culturais enquanto arte no mundo ocidental, uma vez que elas não são passíveis de
aplicação transcultural, a priori. Morphy (2005: 651) identifica a existência de três grandes critérios para
o reconhecimento de certos fenômenos enquanto arte no mundo ocidental: 1) institucional; 2)
autoclassificação e; 3) atributos do objeto.
A variável institucional tem a ver com o reconhecimento de determinada expressão cultural como
arte, o qual a inscreverá em um universo de circulação e consumo particular. Em grande parte dos casos,
o reconhecimento de algo como arte no mundo ocidental tem a ver com seu potencial de comodificação e
incorporação no mercado das artes (BOURDIEU, 1996), mediante sua circulação em museus, galerias,
etc. O reconhecimento de certos fenômenos como arte é um processo social, constituído por mediações de
várias ordens. Dentre tais mediações, merece lugar de destaque as políticas de patrimonialização levadas
a cabo pelos Estados nacionais e agências de governo transnacionais contemporaneamente. Voltaremos a
essa questão mais tarde.
Autoclassificação, por sua vez, diz respeito ao sentido atribuído a determinada expressão cultural por
quem a elabora ou performa. Assim, uma das condições para que algo seja reconhecido como arte (entre
nós) é o fato de ser concebido enquanto arte pelos indivíduos ou coletivos responsáveis por sua
existência. Tal fato, contudo, quase sempre está relacionado com a construção do nome dos artistas, fato
que se dá por meio de múltiplas mediações, nas quais o antropólogo, inclusive, pode ter o seu papel.
Nesse contexto, cabe ressaltar que certos fenômenos podem não nascer enquanto arte, mas adquirir tal
4
Com base em Latour (1994), nós compreendemos a purificação como um processo e a forma de separação através da qual
a moderna episteme projeta fronteiras ontológicas e limites entre o que é considerado como diferentes esferas, seres e
experiências de que é feita a vida social, tais como a oposição entre natureza e cultura, política e conhecimento, justiça e
poder, humanos e não humanos, entre outros.
228
status ao longo de sua biografia, de sua vida social. Exemplar esse fato, são as apropriações ocidentais da
chamada arte primitiva, na qual negociantes, historiadores de arte e até antropólogos, têm tomado parte.
No que concerne aos atributos do objeto, normalmente considera-se arte os fenômenos que se
destacam por seus traços estéticos formais e seu potencial semântico (LYTON, 1991: 14). Outrora, as
habilidades técnicas altamente especializadas envolvidas na elaboração de fenômenos reconhecidos como
arte era também variável importante para o reconhecimento das mesmas enquanto tal. Naquele contexto,
a distinção entre artefato (com utilidade para além da contemplação estética) e arte ainda não era
fundamental (MORPHY, 2005: 649).
O esforço de objetivar, nos limites desde ensaio, as variáveis que, desde o ponto de vista ocidental,
operam como mediadoras no processo de construção do fenômeno artístico tem aqui uma função.
Gostaríamos de convidar o leitor a refletir em que medida tais fenômenos têm se imposto ou não em
Timor-Leste ao longo do tempo. Argumentamos que na medida em que as várias populações que
habitam as fronteiras sociopolíticas que hoje reconhecemos como Timor-Leste foram expostas a
processos de invenção e transposição da modernidade, coloniais e pós-coloniais, foram elas também
expostas a eventos que têm permitido a concepção e imaginação da arte, como um campo relativamente
autônomo de produção e representação, com efeitos dos mais variados. Os artigos que compõe esse
dossiê discutem alguns episódios relacionados a este processo. Nesse cenário, o objetivo de promover o
desenvolvimento – o que quer que venhamos a entender por isso – e a construção nacional destacam-se
como elementos desencadeadores da produção, da invenção da arte. Entre outras coisas, tais fatos
parecem indicar a dependência do campo de produção artística de outros campos de ação social. Tal
tendência está longe de ser exclusiva a Timor-Leste e vai ao encontro do que tem ocorrido em outras
fronteiras sociopolíticas.
Da abordagem semiótica à abordagem agentiva. Novas janelas de tradução e percepção para a arte
em Timor-Leste
A abordagem semiótica da arte tem sido objeto de críticas importantes na antropologia (GELL,
1998). Entre outras coisas, as ideias de que o fenômeno artístico representa ou comunica algo que está
fora dele, assim como a própria ideia de representação, são objetos de questionamento, indicando-se que
não podem ser universalizadas transculturalmente. Expressam senão uma ideologia semiótica particular 5
(KAENE, 2007). Com base em suas pesquisas entre populações da Nova Guiné, Gell (1998: 6), sugere
que abordemos a arte como entidade agentiva, portadora de intenções e causações e produtora de
resultados e transformações.
O deslocamento da atenção analítica do significado para a eficácia, nos termos de Lagrou (2009:32),
pode ser cognitivamente rentável na análise de fenômenos que reconhecemos como artísticos (como
efeito do olhar interétnico) entre as populações leste-timorenses6. Dentre eles, destacamos as narrativas
rituais e seu paralelismo semântico característico (Fox, 1988). Caracterizado como um gênero narrativo
5
Tendo por base a noção de ideologia linguística tal como formulada por Silvertien (2000) – um conjunto de crenças sobre a
linguagem articulado pelos usuários como racionalização ou justificação da linguagem em uso – a ideia de ideologia
semiótica vai além desta primeira ao colocar em pauta o fato de que é preciso observar, primeiramente, o que conta ou não
como linguagem em diferentes paisagens culturais e os efeitos significantes e agentivos atribuídos a suas diferentes
configurações. Para a região da Indonésia Oriental e baseado em sua pesquisa em Sumba, Keane (2007) disponibiliza uma
série de análises que demonstram o poder agentivo de palavras e coisas na negociação da socialidade.
6
A inexistência de uma fronteira entre artefato e arte, ou da insularização e reconhecimento de certos fenômenos que se
caracterizam por qualidades estéticas e semióticas específicas enquanto arte, em certos coletivos sociais, parece sugerir que
sua classificação enquanto tal, enquanto arte, desde o olhar do antropólogo, é fenômeno eminentemente interétnico.
Entendemos por fenômeno interétnico aquele que se origina como produto da interseção dos sistemas classificatórios da
sociedade de origem do antropólogo e dos coletivos sociais com os quais trabalham.
229
que se expressa pela mobilização de palavras ou metáforas sinônimas em estruturas de prosa ou poesia
em performances de comunicação oral, formal e canônica, ao menos parte da eficácia das falas rituais
advém de sua forma e do controle de seu conhecimento e reprodução 7. Esta componente agentiva poderá
ser ainda potencializada pela dança, em que a eficácia do ato se alia à perfomance (SOUSA, 2010). Nesse
caso, sua forma expressiva, sua qualidade estética é razão essencial de sua função e eficácia. No período
colonial, o registro de tais narrativas pareceu sobretudo favorecer a dimensão estética como elemento
constitutivo de uma memória para o futuro que se recupera hoje. Entre outros, os trabalhos de Artur de Sá
(1961), José Rodrigues (1962) e de Ezequiel Pascoal (1967) são exemplares. São registros nos quais, a
mais das vezes, a dinâmica oratória escapa, quer nos processo de transcrição quanto tradução. Todavia, a
inserção etnológica de muitas destas narrativas teve cultores entre alguns trabalhos de índole etnográfica,
de que são exemplos o de Francisco de Azevedo Gomes (1972) com ―Os Fataluku‖ e Jorge Barros Duarte
(1984) em ―Timor Ritos e Mitos Ataúros‖.
À semelhança do que Lagrou (2009: 14, 23, 27) identifica entre as populações ameríndias
contemporâneas, que não reconhecem a arte ou as produções artísticas como entidades autocontidas e de
valor em si, mas como saberes legados por entidades místicas e que tem poder de ação e transformação
sobre o mundo, a oratória ritual na Indonésia Oriental não é concebida como tendo origem em si mesma e
não é autocontida. Sua eficácia deriva de sua associação à voz dos ancestrais, de sua articulação com um
regime de sacralidade responsável pela formação e reprodução do mundo (ver ensaio fotográfico de
Simião, Rocha e Almeida, 2015). Recentemente apropriada como artefacto de legitimação nacional, este
tipo de performance oral ritual tem sido, inclusive, inserida na representação da nova nação, desde as
cerimónias de 20 de maio de 2002, em Díli8.
As narrativas formais, rituais, expressas por meio do paralelismo semântico, são experimentadas
como produtoras de verdade, definindo a ordem e o sentido do mundo e assim o reproduzindo. Nesse
contexto, o monopólio de certas formas narrativas gera efeitos de poder dos mais diversos. Entre
diferentes populações, tal monopólio é concebido como produto de empreendimentos coletivos, dos quais
tomam parte vivos, mortos e ancestrais9. À diferença da valorização da criatividade e inovação que
caracterizam algumas das produções artísticas em nossa sociedade, o bom desempenho de uma narrativa
ritual reside em sua semelhança com o que é tomado como sua forma original. Reprodução e repetição e
não inovação são as variáveis que agregam valor a esta expressão artística. A esse respeito, a reflexão que
Lagrou (2009: 67) tece sobre a pragmática da conservação e da continuidade na produção artística
ameríndia provoca-nos a pensar a respeito de tendência similar das artes locais em Timor-Leste:
7
A título de hipótese, parece-nos que ao menos parte das narrativas da street art, tal como analisadas por Arthur (2015), tem
componentes do paralelismo semântico aqui abordado. Exemplar, nesse sentido, são as várias vezes em que o mobilizador
―Paz no dame‖ (Dame é o termo em Tétum para paz), aparece nas narrativas visuais.
8
Noutros locais de Timor Leste, nessa mesma noite, outras performances se desenrolaram. Será de questionar se os motivos
que levaram os organizadores dos eventos e os oradores rituais foram os mesmos.
9
Fox (1988) nos desafia a pensar nas correlações entre o paralelismo semântico e outros aspectos da dinâmica social local,
como o dualismo classificatório complementar e dinâmicas de organização social. À diferença do dualismo classificatório
complementar, no qual está implicada uma hierarquia de posição entre os termos, no paralelismo semântico isto está ausente
(1988: 26). A partir dessa constatação, Fox nos desafia com uma questão analítica muito interessante: ―como que pares não-
hierarquizados de palavras se transformam em pares hierarquizados de termos?‖
230
Aqueles familiarizados com a pesquisa etnográfica em Timor sabem que a afirmação ‗assim é nosso
costume‘ é também bastante comum entre membros de suas populações. Em seu seminal e percursor
trabalho sobre arte timorense, Ruy Cinatti (1984: 65) afirma:
Tais análises de Cinatti nos permitem colocar como hipótese que o exercício da agência na produção
do que, desde fora, reconhecemos enquanto arte, de modo mais geral nos contextos rurais leste-
timorenses, pode ter muito mais a ver com habilidades de reprodução do que de que criação. O valor
estaria na reposição de uma forma pensada como ancestral, e não na disposição inventiva do artista.
A citação de Ruy Cinatti (1984: 65) corrobora ainda com o ponto de vista com o qual iniciamos este
ensaio. Em muitas fronteiras sociopolíticas, a arte, como contemplação estética e um campo de ação
social autônomo parece não fazer muito sentido. O ensaio fotográfico de Simião, Rocha e Almeida (2015)
também nos oferece indícios de tal fato. Nele podemos constatar como a elaboração estética aparece
associada a regimes de sacralidade específicos (lulik e católico), mas que se comunicam. Neles, a
elaboração simbólica e estética é, a um só tempo, forma e meio de prática religiosa. Com base neste
ensaio e em nossas experiências de pesquisa em diferentes contextos leste-timorenses, arriscamo-nos em
propor que, em certa medida, muitas das experiências religiosas em Timor-Leste podem ser pensadas
como contemplações e manejos estéticos, dada o caráter compulsório de sua expressão materalizada
altamente regulada em formas rituais em que palavras, relíquias, sacrifícios e dádivas têm poder de
agência , sobretudo no universo lulik. Por oposição ao domínio lulik, o cristianismo aparece como
experiência de culto mais desmaterializada, como nos ensina Kaene (2007).
Ainda sobre a questão da agência, ao menos três dos textos publicados no dossiê por nós coordenado
oferecem subsídios para percepção dos efeitos decorrentes da produção e reprodução de um campo de
artes plásticas em Díli: Arthur (2015:41-63), por exemplo, nos mostra como street art tem sido, a um só
tempo, meio de protesto e unificação política, articulando proficiência linguística intergeracional e a
expressão visual dessas reivindicações; informações e análises apresentadas por Veiga (2015) e Bexley
(2015: 29-40), por sua vez, nos permitem constatar como que os espaços de produção e formação
artística, em comunidades como a Art Moris, Gembel, são também espaços para produção de sujeitos e
subjetividades mais autônomos, por oposição a expectativas de sociabilidade mais relacionais e
hierárquicas características de suas instituições de origem (família, casa, partido político etc). Fidalgo-
Castro (2015: 65-84) nos apresenta outra faceta da agência da arte, discutida em seu texto por meio dos
processos de apropriação estatal das casas sagradas, enquanto patrimônio, em Timor-Leste. Nesse caso, a
cultura, vertida em arte expressa na estética das casas sagradas, é alçada à condição de capital cultural e
símbolo da nação que se constrói e imagina por meio dela. Nesse último contexto, a agência da arte
residiria justamente em seu potencial de símbolo para a nação. Tal fato indica não haver necessária
exclusão entre as abordagens agentiva e simbólica da arte.
231
De artefactos à arte indigena e popular: notas genealógicas sobre a construção das artes no Timor
português
(…) a belleza de alguns d`aquelles artefactos, a maneira por que as côres estão
combinadas e a sua duração, mostram-nos que os timores não são destituidos de
habilidade, e que bem dirigidos por fabricantes europeus poderiam competir com os
habitantes de Java no fabrico de certos productos. (Castro, 1867: 335).
Em 1891, Bento de França, no seu opúsculo ―Timor‖, aludindo igualmente à ―indústria fabril‖ dos
―Timores‖ afirma que:
Aquelles insulares não são desageitados; pelo contrario, teem bastante habilidade de
mãos, - mas, mercê da sua invencivel indolencia, limitam os seus artefactos aos que
lhe são estrietamente precisos.
Em todas estas producções, muitas d`ellas tôscas, revelam os Timores, posto que sob
uma expressão selvagem, bastante gôsto, paciencia e habilidade de mãos (FRANÇA,
1891: 40).
No início do século XX estas expressões locais de produção artesanal adquirem uma nova vida
social. O Album Álvaro Fontoura, atribuido ao Governador com o mesmo nome, apresenta uma visão
fotográfica do Timor Português dos finais dos anos trinta. Entre a enumeração encomiástica dos povos e
ação colonizadora, encontra-se um item dedicado à ―arte indigena‖, ilustrada por imagens de fabrico de
artesanato e sua exposição, na feira dedicada a comemorar os 10 anos da ―Revolução Nacional‖.
Ourivesaria, tecelagem de panos, fabrico de joias de casca de tartaruga e caixas de bambu com tampas
antropomorficas, ilustrando indigenas e metropolitanos, parecem enraizar o que se considera ―arte‖ na
recriação de uma produção local destinada essencialmente a uma procura metropolitana que tem nas
feiras anuais da comemoração do 10 de julho, dia de Portugal, em Díli, um mostruário da produção
local10.
Uma das primeiras abordagens etnológicas da arte, embora não se afastando muito de categorizações
antecedentes, é feita em 1959 por António de Almeida (1994 [1959]), com as ―Notas sobre Artes e
10
O albúm está disponível online no endereço: http://www.ics.ul.pt/ahsocial/fontoura/album/pag_inteiras/0.htm Acesso em
03 de março de 2015.
232
Ofícios de nativos de Timor Português‖, onde o autor procura fazer uma sistematização do campo da arte
com um artigo sobre ―artes e ofícios‖ dos nativos de Timor Português, considerando nestes a confeção do
sal, a olaria, a tecelagem, a cordoaria, os entrançados, os objetos decorativos de latão, as joias, as
esculturas em chifre de búfalo e as habitações da parte oriental do território.
A transformação destes bens produzidos em artesanato com um fim estetizante tem um incentivo
pela criação de uma procura, quer de metropolitanos, quer de novos estrangeiros que afluem ao território
nos anos sessenta: os turistas. Francisco Xavier de Menezes (2006 [1968]) explica a influência de
estrangeiros no artesanato timorense, assim como a criação de uma procura interna, a ponto de a mesma
ser, segundo o autor, objeto de incentivo institucional por parte do Centro de Informação e Turismo e a
Casa de Timor.
Um reconhecimento mais amplo da arte timorense ocorre com o artigo de Luís Filipe Tomaz publica
em 1968 1975. Designado ―Arte Popular‖, é dedicado ao território, constando no volume ―Arte Popular
em Portugal, Ilhas Adjacentes e Ultramar‖. Divide a arte em ―artes decorativas‖, predominante em Timor,
e ―artes maiores‖ (arquitetura em pedra, escultura e pintura) praticamente desconhecidas. Todavia, lista e
releva arquitetura; a construção naval; a escultura; os trabalhos em tartaruga; os trabalhos em bambu; a
tecelagem; as rendas, bordados e crivo (fortemente influenciados pela ação colonizadora, nomeadamente
de missionárias); a cestaria; a olaria; a ourivesaria; a metalurgia; a marcenaria; a música e a dança. O
autor comenta que em certas regiões as autoridades administrativas procuravam desenvolver a escultura
em madeira, ―por imitação de modelos balineses‖, no que resultava ―(…) uma arte sem espontaneidade, e
que fica muito aquém da que pretende imitar‖. (TOMAZ, 2008 [1968-1975]).
O mimetismo e fabricação de artefactos com base numa procura externa é também referida por Ruy
Cinatti (1987). Como cita o autor, muita da arte que era exibida na Casa de Timor tinha uma inspiração
administrativa, com responsáveis locais a fomentarem a produção. Mas Cinatti é igualmente crítico do
esvaziamento, adulteração, a que a arte timorense se vê votada nesse processo, que considera ―Votado à
destruição dos valores culturais timorenses‖ (1987: 16), passível de extinguir padrões estilísticos, motivo
e técnicas. O seu livro ―Motivos artísticos timorenses‖ (1987) tem o propósito de fixar esses motivos e
criar um testemunho que permitisse fixar esse património e servir de orientação aos ―futuros artífices‖, os
jovens timorenses. Parece-nos também que o jornal A voz de Timor teve um papel importante no
incentivo e concepção de campos de produção artísticas em e sobre Timor-Leste. Tal fato se dava pela
publicação de poesias, contos, bem como do que eram denominadas ―curiosidades locais‖. Nesse sentido,
o fac-símile abaixo [Figura 1] é um testemunho histórico importante. Entre outros, os trabalhos de João
Soariano, que foi aluno de desenho de Ruy Cinatti, ganham destaque (cf. VEIGA, 2015).
233
Figura 1 João Soriano e Celestino Encarnação. Dois artistas Timorenses. 1973. In Jornal A Voz de Timor. 29 junho.
Um traço comum parece nivelar através dos tempos a perceção da ―arte‖ timorense: a sua relação
estreita com os ofícios e o artesanato, o modo de vida dos nativos. Todavia, é notório que se processa
uma apropriação desses artefactos, eleitos expressões indígenas de arte, ou de arte popular, para um
público metropolitano e turístico, com o incentivo de produção massificada, ―imitada‖, algumas vezes,
de outros modelos por força de autoridades administrativas. Todavia, essa arte nativa, património das
casas sagradas ou esculturas votivas, ganhou um apreço nos mercados exógenos, sendo objeto de
demanda, legal ou ilegal a mais das vezes, como parece transcender das preocupações de Ruy Cinatti em
carta confidencial de 1973, manifestando as suas preocupações com a usurpação desses bens e o risco de
234
deixar em Timor só gente ―deserdada‖.11 O mesmo fato ganhou as páginas do jornal A voz de Timor em
artigo publicado por Ramos Horta em 30 de novembro de 1973, intitulado ―Crime de lesa-arte. A fuga de
valores artísticos e históricos de Timor‖ [Figuras 2 e 3].
Figura 2: Horta, Ramos. 1973. Crime de Lesa-Arte. A fuga de valores artísticos e históricos de Timor. In Jornal A
Voz de Timor, 30 de novembro, p.1.
11
Espólio de Ruy Cinatti, Biblioteca da Universidade Católica em Lisboa. Arquivador Terminus Timor`s D XI: Informação
confidencial – Património Cultural: histórico, artístico e etnográfico timorense. 3.10.1973 . 5 fls.
235
Figura 3: Horta, Ramos. 1973. Crime de Lesa-Arte. A fuga de valores artísticos e históricos de Timor. In Jornal A
Voz de Timor, 30 de novembro, p.5.
236
Da nacionalização das artes à produção de novos orientalismos 12
A apropriação de determinadas expressões culturais enquanto artes nacionais são típicas dos
processos de formação da nação, o qual, em certa medida, é sempre relacional porque leva em
consideração expectativas de quem está de fora e dentro do espaço nacional.
A busca pelo retorno a uma origem imaginada que figure como essência de uma identidade nacional
se faz presente nas políticas culturais governamentais nacionais e internacionais voltadas à reconstrução
das casas sagradas (uma lulik, em Tétum) em Timor-Leste. De modo similar ao que Acciaioli (1985)
identificou na indonésia dos anos 1980, Fidalgo-Castro (2015) indica como em tais políticas está
implicada uma estetização da cultura. Ademais, o autor analisa as tensões e conflitos que podem ser
desencadeadas por tais políticas, dados os efeitos de poder produzidos por elas em cenários locais e
nacionais.
O financiamento do Estado a street art em Timor –Leste pode também ser refletida à luz da
problemática da construção nacional. À diferença do que ocorre em outros países, Arthur (2015) indica a
dependência da street art em Timor do financiamento do Estado. Tal fato, entre outras coisas, faz com
que a Street Art seja utilizada como um instrumento de pacificação, veiculando mensagens de unidade em
contextos de conflito ou pós-conflito.
A relacionalidade e a constrastividade características das dinâmicas de subjetivação individuais e
coletivas é também tema dos artigos de Veiga (2015) e Soares (2015: 17-27). No caso das artes plásticas,
Veiga discute os modos pelos quais ―fragmentos da tradição‖ têm sido mobilizados nos repertórios
estéticos daqueles que compõe o Movimento Kultura. Veiga explora como a mobilização de ―fragmentos
da tradição‖ por parte dos artistas de tal movimento responde a uma dupla demanda. Por um lado, é uma
resposta às expectativas estéticas do mercado que consome as obras que produzem. Tal mercado é
composto, sobretudo, por estrangeiros, que buscam adquirir obras que tragam símbolos que consideram
como tipicamente leste-timorenses, tais como o tais (ikat), o belak (disco de ouro), o kaiobau (peça
ornamental de metal utilizada na testa que faz referência a chifres de búfalos) etc. Assim, pode-se dizer
que o movimento kultura, é refém, em alguma medida, de um certo orientalismo, na medida em que é
esse orientalismo que alimenta as demandas de consumo daqueles que podem adquirir obras de arte
timorenses. De outro lado, os artistas dão sentido à mobilização do que chamam de tradição em suas
obras como meio de divulgar a identidade timorense. Seguindo tendência similar àquela que Leach
(2012) identifica entre os estudantes universitários em Díli, os artistas do movimento kultura afirmam que
ser timorense está estritamente ligado ao vínculo, conhecimento e respeito à tradição. Maria Madeira,
integrante do movimento kultura e uma das artistas plásticas leste-timorense de maior expressão nacional
e internacional, agrega outras racionalidades à mobilização de fragmentos da tradição em suas obras: ela
o faz com o objetivo de conhecer melhor suas próprias origens – Maria Madeira cresceu e foi treinada na
Austrália – e de empoderar as mulheres, que são detentoras de alguns dos saberes relacionados a essas
práticas. No artigo de Arthur constatamos também como a palavra kultura é mobilizada para gerar
efeitos de pacificação. De todo modo, um dos aspectos mais relevantes do movimento kultura, tal como
tratado por Veiga, é o seu potencial de produzir narrativas orientalistas, dada a proeminência da audiência
das artes na definição de seu perfil.
A leitura aqui proposta do artigo de Veiga é, em grande parte, inspirada pelo profundo e provocativo
texto de Antony Soares (2015). Com base em uma leitura comparativa da obra colonial de Paulo Braga e
da crítica produzida em torno da obra de Luis Cardoso, Soares demonstra como o orientalismo nelas se
faz presente. Propõe então que certas narrativas literárias de encantamento e desencantamento, coloniais
e pós-coloniais sobre Timor-Leste são expressões de uma projeção narcísica em que o território e suas
12
Seguimos aqui a provocativa ideia de Said (1996), da invenção de um Oriente plasmado pelos motivos e interesses do
Ocidente.
237
populações aparecem como realizações dos desejos ou frustrações daqueles que produzem e consomem
tais narrativas. Assim, nas narrativas de Paulo Braga ou em parte das interpretações às obras de Luis
Cardoso, os leste-timorenses (ou os lusófonos) são transfigurados em ícones de resistência à dominância
ocidental anglófona que na metrópole seria impossível fazer. Em tais narrativas, sugere Soares, as
genealogias passadas e presentes dos interesses e explorações capitalistas são silenciadas, em nome de
uma projeção narcísica. Permitam-nos retomar nesta introdução uma parte de seu texto:
Além do que já foi dito acima, parece-nos interessante perguntar em que medida expectativas
orientalistas não vêm se impondo na produção artística de e sobre Timor-Leste e os modos como ela
responde a contingências históricas e sociais que tem marcado as trajetórias das elites – nacionais e
transnacionais – que as produzem e as consomem.
Por uma etnografia das mediações na construção dos mundos das artes em Timor-Leste
Na esteira do que, desde há muito, a antropologia e sociologia da arte têm indicado, afirmamos acima
que o reconhecimento de certos fenômenos como arte é um processo social, constituído por mediações de
várias ordens, que passam pela formação do gosto, diálogo com um mercado consumidor, negociação de
linguagens artísticas, mediações institucionais etc. No âmbito desta seção gostaríamos de indicar alguns
dos atores institucionais e dos fenômenos que parecem ter lugar importante nos processos
contemporâneos de construção dos mundos das artes em Timor-Leste, os quais merecem atenção analítica
em pesquisas sobre o tema.
Assim como aconteceu no período colonial, o Estado é um ator fundamental nas dinâmicas de
negociação e conflito relacionadas à emergência e consolidação dos mundos das artes em Timor-Leste.
Sendo o principal investidor no país, os modos pelos quais recursos humanos, financeiros e tecnológicos
são investidos nos campos da cultura e da arte terão papel essencial na conformação de campos artísticos.
Exemplares destas iniciativas são aquelas realizadas pela Secretaria de Estado da Arte e Cultura, abrigada
no Ministério do Turismo, tais como a atribuição de bolsas de estudo, políticas de reconhecimento,
recuperação e patrimonialização de bens culturais (materiais e imateriais), promoção de exposições,
criação de museus e da Academia Nacional de Arte e Indústrias Culturais Criativas, entre outras 13.
A transferência, em 2012, da hoje Secretaria de Estado da Arte e Cultura do Ministério da Educação
para o Ministério do Turismo é um índice do papel que o turismo tem e poderá vir a ter na consolidação
13
Para uma visão das práticas passadas e presentes da secretaria de arte e cultura, consultar: http://www.cultura.gov.tl/
238
de campos artísticos em Timor-Leste, em uma tendência global que se reproduz em diferentes lugares 14.
Morphy (2008: 677) explicita de forma muito clara algumas das implicações das relações entre turismo e
arte:
Nesse contexto, é preciso lembrar que o Estado, em Timor-Leste e alhures, não atua de forma isolada
nem plenamente autônoma. De certa perspectiva, o Estado nacional leste-timorense opera como
mediador na implementação de políticas culturais que são negociadas transnacionalmente por entidades
como a UNESCO, por exemplo. De outra perspectiva, na ausência de quadros qualificados em número
suficiente, o governo das artes e da cultura em Timor-Leste se faz também com a opoio de organizações
da sociedade civil, locais e transnacionais. A esse respeito, merece destaque a importante contribuição do
projeto Tatoli ba Kultura (Caminho para a Cultura), que tem registrado e na medida do possível,
inventariado, bens e expressões culturais em Timor-Leste, seja com o objetivo de preservá-los, seja o de
promovê-los no âmbito da Academia Nacional de Artes e Indústrias Culturais Criativas. De outro modo,
o projeto, escola e museu Art Moris têm sido também seminais na reconstrução e consolidação de campos
artísticos no país, tendo deles derivados outros coletivos artísticos, como o Gembel retratado neste dossiê
pelo artigo de Angie Bexley. Iniciativas como os festivais Ramelau, Arte Publiku, entre outros, têm sido
relevantes na construção social dos campos artísticos. 15 Nesse contexto, é importante ressaltar que
grande parte desses empreendimentos são financiados com recursos da cooperação internacional para o
desenvolvimento que, como em outros campos de ação social no país, continua a ter papel de destaque
nos processos de transposição, invenção e subversão da modernidade em Timor-Leste (SILVA, 2012).
Vale também ressaltar a importância de instituições que têm financiado ou abrigado a produção de
obras artísticas sobre Timor-Leste, embora fora de seu território nacional, como o Espaço e Biblioteca
Por Timor, mantida pela Câmara Municipal de Lisboa, onde está sediado. A mobilização da cultura ou do
que era considerado arte timorense foi uma tática importante nos movimentos de resistência à ocupação
indonésia, e era realizada sobretudo pelos diferentes grupos de leste-timorenses em exílio ou diáspora em
Portugal, Macau e Austrália. Apresentação de coreografias de tebedai, de cantos tradicionais, de pinturas
retratando as condições locais de reprodução social foram canais pelos quais se procurava mobilizar a
opinião e apoio público internacional para a restauração da independência do país. Naqueles contextos,
sua arte e cultura eram apresentadas como violadas pela ocupação militar indonésia (VIEGAS, 1998;
MIRANDA, 2003 e TIQUE, 2013). A trajetória de Maria Madeira, discutida por Leonor Veiga (2015), é
exemplar nesse sentido. Ao seu lado, outros artistas produzindo em condição de diáspora poderiam
também ser citados, tais como Leopoldino Lobato Soriano, Sebastião Silva, Tchum Nhu Lien, Fátima
Guterrez, Abel Júpter T. Freitas da Silva, entre outros.
Análises a respeito dos saberes, significados e efeitos implicados na fabricação do tais, (ikat), assim
como da olaria, da música e da dança entre as populações leste-timorenses parecem-nos extremamente
promissoras para a expansão de uma antropologia da arte em e sobre Timor. Iniciativas nesse sentido já
foram desencadeadas, das quais destacamos os trabalhos de Dunlop (2012), Yampolsky (2014) e
Galipaud and Assis (2014).
14
Para uma análise sobre as formas pelas quais a cultura tem sido manejada para fins de promoção do turismo em Timor-
Leste nos períodos coloniais e pós-coloniais, ver Oliveira (2013).
15
Para informações sobre o Festival Arte Públiku, consultar: http://dilifestival.com/about/
239
Terminamos devolvendo aos envolvidos neste trabalho os agradecimentos devidos. A proposta deste
dossiê, a sua temática inovadora, teve receção por parte de autores vários que representam igualmente a
panoplia cosmopolita que, de uma forma ou outra, se acerca de Timor Leste. Agradecemos a estes, assim
como aos que, por várias razões, não foi possível incluir nesta proposta.
Uma palavra de apreço para todos os pareceristas pelo trabalho dedicado à revisão dos artigos
propostos e as excelentes sugestões dadas. Por fim, uma palavra aos editores, pela coragem de erigirem
este tema como predicado desta revista e por todo o trabalho envolvido neste processo.
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241
242
HAKTUIR AIKNANOIK, GRUPO DE ESTUDOS EM CULTURA E LITERATURA ORAL
Introdução
Este artigo tem como objeto de estudo o grupo Haktuir Aikanoik e a arte de contar histórias,
constituindo-se como um relato de experiência, ao mesmo tempo em que reflete sobre a tradição oral, sua
presença e importância em Timor-Leste. O grupo de estudo e de contação de histórias foi formalmente
fundado em julho de 2014 com integrantes do Departamento de Língua Portuguesa da Faculdade de
Educação, Artes e Humanidades da UNTL (FEAH/UNTL). Em seu escopo de atuação, tem trabalhado
com as seguintes perspectivas: estudo e pesquisa; prática e disseminação da arte de contar histórias;
valorização dos textos da tradição oral timorense e recontos de histórias em português e em tétum.
Na primeira parte deste trabalho, será feito um breve histórico da proposta que nasceu no primeiro
semestre de 2014, decorrente de oficinas de literatura e contação de histórias para alunos que cursavam a
disciplina de Literatura Brasileira, no mesmo Departamento da FEAH/UNTL. Logo em seguida, tece-se
algumas reflexões sobre a arte de contar histórias, os contadores de histórias tradicionais e
contemporâneos, bem como sobre o silenciamento da narrativa na contemporaneidade, sobretudo em
contextos urbanos. Vale ressaltar que, nesse momento, alguns dos teóricos utilizados têm sido estudados
pelo grupo.
Neste relato de experiência, inicialmente será apresentado o processo de desenvolvimento do projeto
do Grupo Haktuir Aiknanoik , bem como de suas ações iniciais, em uma perspectiva freiriana, de
construção de projeto coletivo. Sendo assim, a decisão sobre cada uma das etapas sempre foi partilhada e
vivida em um processo de constante colaboração envolvendo as jovens estudantes que integram o grupo e
as professoras que coordenam o trabalho.
Ao final, entrelaça-se as experiências narradas e algumas das reflexões teóricas suscitadas ao longo
do texto, com comentários sobre possibilidades futuras para o grupo. Vale ressaltar que o Haktuir
Aiknanoik tem se colocado o desafio de ser ponte entre a tradição e a contemporaneidade, entre os mais
velhos portadores das histórias, crianças e jovens, sobretudo dos centros urbanos e, ainda, entre as duas
línguas oficiais do país, o português e o tétum.
243
Breve Histórico
O grupo Haktuir Aikanoik surgiu a partir das oficinas ―A Arte de Contar Histórias‖, desenvolvidas
com alunos/as do 30 ano do Departamento de Língua Portuguesa da UNTL, como atividade de extensão
decorrente da disciplina de literatura brasileira16. As oficinas foram realizadas em parceria com o Museu
da Resistência e tiveram como objetivo desenvolver habilidades que revelassem a sensibilidade
necessária para ouvir e contar histórias.
As narrativas selecionadas para o desenvolvimento das oficinas fazem parte da literatura oral de
Timor-Leste, tendo sido a maioria delas coletadas e registradas pelos/as próprios/as alunos/as em
pesquisa de produção literária, vinculada à disciplina mencionada.
As oficinas foram realizadas em língua portuguesa e em língua tétum, consistindo em 9 horas de
atividades direcionadas, incluindo 3 horas dedicadas a uma roda de contação de história pública, onde
os/as alunos/as participantes contaram histórias para as crianças convidadas a participarem do evento. Por
meio dessa atividade, foi possível perceber habilidades que os/as alunos/as possuem e que, normalmente,
no espaço formal da sala de aula, não têm tido oportunidades efetivas de desenvolverem.
No segundo semestre do mesmo ano, dado os resultados positivos da oficina, bem como o interesse
demonstrado por alunas participantes da atividade de extensão, promoveu-se a continuidade desse
trabalho, visando à criação e solidificação de um grupo de contadores de histórias que pudesse atuar em
diversos espaços sociais, sobretudo em escolas. Assim, o grupo, constituído por doze estudantes17, iniciou
suas atividades em julho de 2014, tendo como coordenadoras as autoras deste artigo. Desde então, o
grupo tem se reunido sistematicamente, no mínimo uma vez por semana, na UNTL ou Fundação Oriente,
organização que tem cedido seu espaço para estudos, ensaios e apresentações.
Nesses primeiros meses, o trabalho centrou-se em três preocupações básicas: 01) o desenho de um
projeto para o grupo; 02) o estudo de textos teóricos sobre as narrativas orais, tanto de autores timorenses
como não timorenses e, 03) o desenvolvimento de atividades práticas e importantes à arte de contar
histórias.
A escolha do nome também se deu coletivamente, em um dos primeiros encontros do grupo. Haktuir
Aiknanoik é a expressão em tétum para contar histórias: haktuir é um verbo que pode ser traduzido como
narrar ou contar e knanoik significa conto, narração, fábula (COSTA, 2012).
Sobre o termo knanoik, Artur Basílio de Sá (1961:7) supõe que seja derivado do verbo hanoin, que
significa pensar, lembrar. Segundo o autor, no desenvolvimento da língua, o verbo pode ter se modificado
para nanoin e knanoin, de onde possivelmente se formou o substantivo knanoik, significando este
lembrança, tradição, memorial. Sobre a presença de ai, árvore em tétum, como prefixo do termo, Basílio
de Sá conta:
16
Na disciplina de literatura brasileira procurou-se estabelecer sempre relações com a literatura timorense, utilizando-se de
análises comparativas entre literatura brasileira e literatura timorense.
17
Este número tem se mantido, saíram duas alunas do grupo inicial, mas entrou outras duas, todas pertencentes ao
Departamento de Letras da FEAH/UNTL.
244
frondosa árvore, das que assinalam aos viajantes, quais marcos quilométricos, as várias
etapas das infindáveis distâncias a percorrer.
De tal narrativa, Basílio de Sá conclui que o ai-knanoik, mais do que um texto, comporta o
significado de uma experiência que envolve partilha, relação com o sagrado e o sentimento de pertença.
Ao pronunciá-lo, o grupo anuncia seu objeto de trabalho e de pesquisa, assim como seus vínculos com as
raízes timorenses. Foi exatamente nessa perspectiva preconizada por Sá que surgiu a indicação e imediata
aceitação da denominação do grupo Haktuir Aiknanoik.
O esboço do projeto foi construído em conjunto com os/as participantes, sempre tomando uma parte
de cada encontro. Assim, coletivamente, definiu-se objetivos, metodologia e justificativa. Como objetivo
geral, o grupo apontou o desejo de ―promover a arte de contar e ouvir histórias, com ênfase nas narrativas
da literatura oral timorense‖. De modo mais específico, estabeleceu-se como alvos: 1) criar um grupo de
contadores de histórias bilíngue português e tétum; 2) formar contadores de histórias do Departamento de
Língua Portuguesa; 3) explorar diferentes possibilidades narrativas; 4) registrar as histórias que fazem
parte da memória do grupo e, 5) divulgar aiknanoik dentro e fora da universidade.
Apresentações Públicas
O grupo tem se apresentado narrando histórias em diferentes espaços: na própria UNTL; em escolas
de diferentes níveis de escolaridade; espaços públicos, privados e ONGs. Durante os encontros, as
participantes do grupo estão cada vez mais participativas e integradas e, como consequência, têm tido um
245
desempenho cada vez melhor na arte de contar histórias. Elas próprias percebem que a cada apresentação
aprimoram a sua desenvoltura tanto na expressão corporal, adequação da voz e também no sentido de
sentirem mais à vontade em relação aos ouvintes. Essa auto percepção do progresso em relação as
apresentações do grupo pode ser percebida por meio dos seguintes trechos de depoimentos das
participantes, em avaliação realizada em um dos encontros, por escrito, de forma anônima.
Todos os povos têm suas histórias. Semelhante ao ―era uma vez...‖ ou ―em tempos que já lá vão‖,
expressão mais comumente usada pelo grupo nos momentos de narração em Língua Portuguesa, essas
narrativas surgiram em um tempo sem datas, não se sabe exatamente quando ou onde. A sua principal
marca é terem sido transmitidas oralmente, de boca a ouvido, ao longo de séculos, de geração a geração,
constituindo-se como experiência poética, estética, pedagógica, histórica, social e cultural.
Nas sociedades fundadas na oralidade, aquelas cuja característica central é construírem suas relações
e redes de conhecimentos sem a presença da escrita (ONG, 2006), narra-se para entreter, educar, para
criar coesão social, para a guarda de saberes delicadamente tecidos através das gerações, das genealogias,
das histórias, crenças e costumes dos mais diferentes grupos e comunidades. François Moïse Bamba, um
contador de histórias de Burkina Faso, África, afirma que é possível reconhecer uma sociedade oral:
(...) quando o essencial de sua cultura e de suas crenças se transmite pela oralidade. E a
oralidade possui vários ramos. Há a palavra antiga, há a palavra grávida, há a palavra
sagrada e há a palavra fútil. Há a canção, as adivinhações, os provérbios, há as charadas,
há os contos. Tudo isso constitui a oralidade (...). Há mesmo a oralidade dos instrumentos
musicais, porque, para nós, os instrumentos musicais falam (RIBEIRO, 2013:182).
Para Amadou Hampaté Bâ (2010:169), tradicionalista africano do Mali, a tradição oral, todo esse
acervo transmitido de geração a geração, entre os quais se incluem as narrativas, ―é o conhecimento total
(...) a grande escola da vida, e dela recupera todos os aspectos‖. Nesta perspectiva, tradição oral é uma
designação que compreende todo o acervo de conhecimento transmitido de geração a geração, incluindo
canções, os ritos, os conhecimentos sobre ervas, entre outros. Osário (1989) chama a atenção para o
―caráter generalizante‖ de tal expressão, merecendo as narrativas de tradição oral uma designação que
circunscreva de modo mais preciso seu objeto, sugerindo ele o termo ―literatura de expressão oral‖ ou
―literatura oral‖.
246
―Literatura oral‖ é a expressão que se preferiu utilizar neste estudo. Expressão cunhada inicialmente
por Paul Sébillot, em 1881, o termo designa aquilo que, ―para o povo que não lê 18, substitui as produções
literárias‖ (CASCUDO, 2012). Cascudo compreende ainda que a literatura oral possui as seguintes
características: antiguidade, persistência, anonimato e oralidade.
Em Timor-Leste, há um acervo enorme de narrativas da literatura oral. Vicente Paulino (2013:104),
intelectual timorense, coloca que a diversidade étnica e cultural existente no país se reflete na
―diversidade de mitos, muitos deles convergentes em alguns pontos, mas refletindo, normalmente, a
tradição cultural de cada grupo étnico‖. Paulino, assim como outros pesquisadores timorenses, entre eles
Valente de Araújo (2010) e Xisto Viana (2012), indica em suas pesquisas o valor primordial das culturas
orais para o Timor-Leste.
Os portadores da palavra do conto possuem os mais diferentes nomes, foram os aedos na Grécia
antiga, os menestréis na Europa medieval, os griôs na África Ocidental, personagens que
desempenharam, ao longo de séculos, a função de guarda e transmissão das histórias (MATOS, 2005),
algo de extrema importância para sociedades cuja manutenção de seus saberes dependia de um constante
circular entre transmissão e memória. Matos lembra ainda dos mais velhos, os avós, as mães, que em
noites de partilha, tornavam-se eles próprios contadores de histórias, sobre quem ela comenta.
Em Timor-Leste, além dos mais velhos, da figura do katuas ou férik, o Lia Na‘in tem sido
reconhecido como o grande portador da palavra, guardiões das histórias, das genealogias e de tudo o que
se constitui para suas comunidades como história:
Espécie de livros vivos e preciosos (...), o seu testemunho faz fé absoluta. Cabe-lhes
lugar à parte nas hierarquias do clã. [São também] depositários de tesouros sagrados –
materiais e espirituais (PASCOAL, 1967:15).
Os Lian-na‘in, sobre os quais, em verdade, há muito pouco escrito, estão também na centralidade dos
rituais de vida (Lian-Moris) e de morte (Lian-Mate), mediando a relação dos timorenses com o lulik, o
sagrado. Devendo-se aqui recordar que, nas sociedades fundadas na oralidade, mesmo que ali já haja
contato com o mundo da escrita, existe uma relação muito forte entre a pronunciação da palavra e o
sagrado. De acordo com Vicente Paulino,
No entanto, os contadores de histórias e suas histórias parecem pertencer a um tempo que não é mais
o presente. Já há algum tempo nota-se o seu desaparecimento. Em uma Europa devastada pela Guerra,
Walter Benjamin lamentaria o fim do intercâmbio de experiências e, com isto, o fim das boas histórias,
aquelas capazes de ensinar e consolar; Câmara Cascudo, no Brasil anunciaria o fim dos serões por volta
nos anos de 1920 (RIBEIRO, 2013). E, em Timor-Leste, mesmo sendo ainda uma sociedade
profundamente imersa em experiências de oralidade, já nos dias de hoje, teme-se a perda das tradições
orais (VIANA, 2012).
18
Usou-se o termo ―povo que não lê‖ para falar de leitura exclusivamente de textos escritos.
247
Hampatê Bá (apud RIBEIRO, 2013) comenta que, cada vez menos, os mais velhos encontram, em
torno deles, ―ouvidos doces a quem transmitir os seus ensinamentos‖, por estarem os mais jovens cada
vez mais envolvidos nos atrativos das grandes cidades. Francisco de Assis Lima (2005:75), em sua
pesquisa no Sertão do Cariri, interior do Brasil, também aponta que não são os contadores de histórias
que desaparecem, mas a audiência, os ouvintes,
Ou seja, o medo da perda das tradições orais repousa, em verdade, na quebra das cadeias de
transmissão dos mais velhos para os mais novos. As histórias que não são mais contadas, não podem ser
lembradas.
Diante de tal silêncio, surge o contador de histórias contemporâneo, aquele que, segundo Gislayne
Matos (2005:100), ―transforma em arte a sua palavra‖. De acordo com a autora, o contador de história
tradicional é aquele enraizado no viver de sua comunidade, ele ou ela aprende o seu ofício em uma
relação de escuta e experiência com os mais velhos, dando continuidade a uma longa cadeia de
transmissibilidade. Já os novos contadores de histórias ―não receberam sua palavra como herança, não
beberam na fonte da experiência coletiva‖. Em sua grande maioria, formaram-se através de oficinas,
aproximam-se do teatro e da literatura, pesquisam em livros e apresentam-se para os mais diferentes tipos
de públicos, em praças, teatros, bibliotecas.
O Grupo Haktuir Aiknanoik possui a particularidade de não se fixar com precisão em nenhuma das
categorias sobre as quais Matos fala. São, de fato, contadoras de histórias tradicionais e contemporâneas.
Tradicionais porque provêm de comunidades ainda profundamente imersas em experiências de oralidade,
das quais recolhem diretamente relatos, bem como se mantêm em próxima conexão com os valores
próprios do universo oral, entre os quais a sacralidade da palavra.
Por outro lado, sendo jovens estudantes universitárias, moradoras da capital Díli, maior centro
urbano do país, vivem, naturalmente, as experiências que o mundo contemporâneo proporciona, como o
acesso à Internet, telemóvel, o contato com a televisão, com o universo da escrita e também com o
pensamento ocidental. Tanto no trabalho inicial das oficinas no Museu da Resistência, como nos
encontros do grupo, a formação das participantes como contadoras de histórias tem passado pela
sensibilização das jovens estudantes para a própria palavra e experiência com as narrativas orais, como
também para a atuação no mundo contemporâneo.
Os locais mais comuns da narração de histórias na tradição são a casa, o quintal, a árvore, em
processos de iniciação e rituais. Elas circulam entre o âmbito doméstico e o sagrado principalmente,
sendo uma atividade essencialmente comunitária, ou seja, de partilha entre comuns, entre familiares, entre
aqueles que, na maioria das vezes, partilham valores, crenças e costumes. Não à toa, as tradições orais,
entre as quais se inserem os contos, são tão fortemente associadas com as marcas identitárias de um
grupo.
A contemporaneidade traz novos espaços e propõe também novas possibilidades de relação e
performance. O contador ou contadora de histórias, costumeiramente, vive em centros urbanos, por mais
que tenha suas raízes fincadas em áreas rurais, assim como as jovens integrantes do Haktuir Aiknanoik.
Na cidade, o público para o qual se apresenta é o mais diverso possível, crianças e/ou adultos; em geral,
contudo, poucas vezes será um público de familiares. Na contemporaneidade, o contador ou contadora de
histórias assume um outro papel, para além de portador ou portadora dos textos da tradição oral, ele ou
ela assume também o papel de artista, cujo ofício perpassa o entretenimento.
Hassane Koyatê, griô de Burkina Faso, oeste africano, afirma que uma das grandes mudanças que a
contemporaneidade traz para o ofício de contar histórias é a duração das rodas de histórias (RIBEIRO,
2013). Na tradição, elas podem se estender noite a dentro, afinal, constitui-se essencialmente como
248
momentos de partilha entre pessoas próximas, pessoas que circulam em espaços de relativa intimidade.
Em uma noite de contos do oeste africano, assim como naquela narrada por Basílio de Sá, há uma troca
de histórias, de conversas, algumas pessoas chegam, outras partem, enquanto a tessitura das narrativas
continua.
Na contemporaneidade, as rodas de histórias passam a ser eventos, acontecimentos com duração,
início e fim, de modo geral adaptados a pessoas que vem e vão para outros espaços. Não se trata de um
encontro entre pessoas que partilham histórias, mas, substancialmente, um encontro entre ouvintes e o
contador ou contadora de histórias. Este é, pois, o tempo do espetáculo.
Relembrando Matos (2005), o contador de histórias contemporâneo é aquele que tece seu ofício
através de oficinas e apresentações, constrói seu repertório principalmente na pesquisa em livros, ou seja,
em um esforço de transporte do escrito para o oral. No caso do Haktuir Aiknanoik, o percurso muitas
vezes tem sido do oral para o escrito e do escrito para o oral novamente, uma ida e vinda sinfônica entre a
oralidade e escrita.. Outra característica da contação de história na contemporaneidade é a aproximação
da performance das artes cênicas. Nesta direção, mesmo bebendo da fonte das tradições orais, mesmo
tendo experimentado-as, sobretudo em suas infâncias ou ainda nos dias de hoje, quando retornam para
seus municípios, as integrantes tem passado por um processo de formação através de oficinas, com o uso
de exercícios do teatro, trabalho de corpo e voz. Vale ainda colocar que o repertório, apesar de estar
sendo constituído eminentemente com histórias recolhidas, também conta com textos extraídos de livros
de coletâneas de contos timorenses.
Considerações Finais
249
oportunidades, algumas das alunas devem construir seus projetos de investigação para a conclusão da
graduação dentro do tema, podendo até mesmo continuarem a estudar a temática em processos
posteriores de estudo e pesquisa, em programas de mestrado e doutorado, sendo possível, daqui há alguns
anos, encontrar publicações de intelectuais timorenses que tratem da literatura oral em Timor-Leste.
Um outro desafio é a necessidade de aprimorar a experiência cênica, romper os limites da timidez e
explorar as diversas possibilidades de contar histórias, sendo este, inclusive, um dos objetivos expressos
pelo grupo em sua proposta. Uma possibilidade que poderia contribuir nesse aspecto e no
desenvolvimento do grupo como um todo seria a participação do grupo em algum programa de
intercâmbio educacional/cultural que possibilitasse o contato do Haktuir Aiknanoik com outros grupos de
contadores de histórias de outros países, especialmente de países da CPLP 19, para que dessa forma se
possa agregar também um contato maior com a Língua Portuguesa.
Percebe-se, portanto, que as oportunidades e os desafios para o primeiro grupo formalizado como
contadoras de histórias de Timor-Leste são diversos. Nesse sentido, a sua continuidade, em um médio e
longo prazo, depende da coesão do grupo e dos suportes que encontrarão para o desenvolvimento de suas
ações, incluindo pesquisa e prática.
Referências
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COSTA, Luís (2012). Dicionário de Tétum-Português. Lisboa: Edições Colibri.
COUTO, Mia (2009). E se Obama fosse africano?. São Paulo: Companhia das Letras.
HAMPATÉ, BÂ, Amadou (2010). A Tradição Viva. In: J. KI-ZERBO(ed). História Geral da África I -
Metodologia e pré-história da África. Brasília: UNESCO/MEC/UFSCAR. p. 139–166.
LIMA, Francisco A. de S (2005). Conto popular e comunidade narrativa. Recife: Fundação Joaquim
Nabuco; Massangano.
MATOS, Gislayne A (2005). A palavra do contador de histórias. São Paulo: WMF Martins Fontes.
OSÁRIO, Lourenço Joaquim da Costa (1989). A Narrativa Africana de expressão oral: transcrita em
português / Lourenço Joaquim da Costa Rosário. Lisboa: Instituto de Cultura e Língua Portuguesa;
Luanda: Angolê.
PASCAL, Ezequiel Enes (1967). A alma de Timor vista na sua fantasia. Lendas, fábulas e contos.
Lisboa: Barbosa & Xavier.
PAULINO, Vicente (2013). Céu, terra e riqueza na mitología timorense. In Revista Véritas, n. 1 (pp.
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ONG, Walter J. (2006). Oralidad y escritura: tecnologías de la palabra. México: Fondo de Cultura
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RIBEIRO, Kelly Cristine Ribeiro (2013). Contação de Histórias, Seguindo o Curso de suas Águas. 197f.
Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, Salvador.
SÁ, Artur Basílio de (1961). Textos em Teto da Literatura Oral Timorense. Lisboa: Junta de
Investigações do Ultramar, Centro de Estudos Políticos e Sociais.
VIANA, Xisto (2012). Contar histórias: refletir sobre a memória cultural de Timor-Leste. Dissertação
(Mestrado) – Faculdade de Letras, Universidade do Porto, Porto.
19
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
250
TIMORENSES E PAISAGENS NOS CADERNOS DE PAULO BRAGA
Vicente Paulino
1. A vida do autor
Paulo Braga nasceu em Portugal em 29 de Junho de 1905 e morreu em 1960. Esteve em Timor por
volta dos anos 1931 como ―deportado político, onde permaneceu dois anos exercendo funções de
professor do ensino particular, sendo referenciado como Professor Diretor na escola Pátria a funcionar em
sede provisória no Grémio dos Sargentos em Díli ou ao domicílio, lecionando matérias do ensino
primário, secundário, as línguas português, francês e inglês e ainda cursos de especialização‖ (Barreto,
2012). Ao longo da sua estadia em Timor deixou algumas memórias pessoais e colectivas que ele próprio
relatou nos seus populares pequenos ensaios publicados nos Cadernos Coloniais, os quais: ―Nos
Antípodas‖ (1936), ―A terra, a gente e os costumes de Timor‖ (1936), ―Dilí-Bazar Tete – síntese da vida
timorense‖ (1936). ―A ilha dos homens nus – Pulo-Cambing‖ (1936) e ―Timor país de sol e volúpia‖
(1938). Estes textos foram reeditados, em 2005, pela editora Crocodilo Azul, sob o título ―País de sonho e
encantamento: Timor, 1930‖. Os seus trabalhos revelam algumas séries dúvidas sobre o conceito de
―civilização‖ em Timor e a linguagem que ele usou na construção das suas narrativas foi, perfeitamente,
linguagem metafórica, protótipo, elogio e estereotipia. Foi a mesma linguagem que alguns seus
conterrâneos como Manuel Ferreira (Paulino, 2012), Pe. Abílio Fernandes (Tavares, 1999), Pe. João José
de Andrade (Rosa, 2011), Pe. Ezequiel Enes Pascoal (Paulino, 2011) e Pe. Artur Basílio de Sá (Paulino,
2013).
As obras referidas refletiram-se sobre usos e costumes timorenses que foram vistos pelo autor nos
anos de 1930, nomeadamente a história da vida dos timorenses que se encontrava naquela época, bazares,
danças (tebe, tebedai e bidu que o autor classificava como jogos de florestas), ‗estilos‘, história da
existência do conceito da ‗casa sagrada‘, a história das ‗nonas‘ (mulheres que viveram com os europeus),
lutas de galo. Falando também acerca a prática cultural chamada ‗barlaque‘ e a prática cultural ‗fúnebre –
hakoi mate‘. Sendo assim, ―os estilos e os tebedai são os grandes espectáculos da vida timorense‖
(1936b:31), não só, mas narrou-se também a performance da cidade e as serras, onde se desfrutam a
magnífica beleza tropical por qualquer visitante.
As suas obras são de caracteres apontamentos antropo-etnográficos com estilo literário, mas deve
dizer-se que em todas as narrativas parecem que não estão longe de ser caracterizadas como relatos da
história de vida do autor em que se aventurou nas terras timorenses. O mais justo é classificar as obras de
Paulo Braga na mesma caracterização que Vicente Paulino (2012:2) fez aos trabalhos de Manuel Ferreira,
―cujo registo literário se situa entre ‗crónica de viagem‘ ou ‗crónica etnográfica‘‖. Isto significa que
pensar em crónica pressupõe pensar na própria atividade do cronista bem como sua função enquanto
informador de um determinado acontecimento que procura ―registar‖ as informações recolhidas em
escrita.
Assim, as crónicas devem ser consideradas também como documentos para a história, pois segundo
Margarida de Souza Neves (1992:76), a crónica como: (...) documento na medida em que se constitui
como um discurso polifacético que expressa, de forma certamente contraditória, um ―tempo social‖
vivido pelos contemporâneos como um momento de transformações. ―Documento‖, portanto, porque se
apresenta como um dos elementos que tecem a novidade desse tempo vivido. ―Documento‖, nesse
sentido, porque imagem de nova ordem. ―Documento‖, finalmente, porque ―monumento‖ de um tempo
social (...).
251
2. Timor era um país de sonho e encantamento
Já na primeira obra ―Nos Antípodas‖, o autor deu-se especial descrição sobre as mulheres, os galos e
as árvores de Timor. Iniciou a sua reflexão com a apresentação da ilha de Timor com uma linguagem
elogiadora no sentido de apresentá-la ao mundo fora para que as pessoas de outras nações possam visitá-
la, conheça-la de perto. Dizendo assim:
Timor só se compreende quando se conhece um pouco a alma do Oriente, aquela alma de aromas
penetrantes, de cores gritantes e de ruídos álacres, feita de mil perfumes suaves, de mil cores veladas
e de mil sons indistintos, que pelos séculos fora tem encantado algumas sensibilidades de ocidentais
que para lá vão e por lá ficam, ou quem quando regressam, lá deixem, entretanto, uma parte da
própria existência (Braga, 1936a:3).
No respeitante dos galos, ele afirmou que ―os galos constituem um dos grandes motivos da paisagem
timorense. São pretos, brancos ou coloridos, quási imponentes na abundância de penas das asas, na
grandiosidade das caudas e no vermelho agressivo das cristas‖ (1936a:17); enquanto as árvores
timorenses, dizia ele: ―Na paisagem timorense há, antes de mais, a árvore … No princípio é a selva, e a
selva é um universo de beleza e mistério. Só depois existem as outras coisas: os animais, as pedras, as
ribeiras, as casas, os horizontes, as madrugadas‖ (1936a:31) e, mais adianta que ―Nos leitos faiscantes das
ribeiras, nos seixos brancos e lavados, uma árvore consegue sempre nascer‖ (idem:32).
Na segunda obra ―A terra, a gente e os costumes de Timor‖, o autor justificou o seu objectivo que
―Este Caderno fala da mais distante e desconhecida colónia de Portugal - e é um simples apanhado de
impressões. (…) Entretanto, aqui ficam estas páginas de recordações de dias vividos sob os trópicos,
cheios de luz, cheios de sons, cheios de vida, de dias feitos de horas diferentes, mas que nem por isso
deixaram de ser dias que se viveram e já passaram‖ (1936b:2-3). Nesta segunda obra, Paulo Braga
enquanto autor reflectia, sobretudo, aspectos da vida dos timorenses, nomeadamente dos ‗estilos‘
executados: ―lembro-me bem o primeiro ‗estilo‘ nocturno que vi em Timor‖ que ―decorria o fim de
Novembro, quente, sufocante, com as suas chuvas torrenciais. Apressadamente, desciam sobre a terra as
noites tropicais, quási sem crepúsculo, espalhando na montanha dilúvios de silêncio e serenidade‖
(1936b:21) e bazares.
Mostrando também algumas descrições a existência da ‗casa sagrada‘ e suas funções. A uma lúlic é o
templo dos cultos timorense que materialmente pode ser definido como uma casa que se distingue das
outras casas porque reúne dentro de si objectos sagrados, vulgares utensílios que, por qualquer motivo,
passaram a ser lúlic. Espiritualmente, porque se cerca de crendices. E estas são inúmeras. Se o tempo, no
exercício da sua eterna função destrutiva, não as fosse eliminando, Timor nada mais seria do que uma
massa compacta de uma lúlic (1936b:27).
Na sua terceira obra ―Dilí-Bazar Tete – síntese da vida timorense‖, Paulo Braga reflectiu sobre a vida
quotidiana timorense, tanto em Díli bem como em Bazar Tete. Nesta obra, o autor esboçou pelo menos
quatro tópicos fundamentais: ‗Díli de cada dia‘, ‗Longe de Díli‘, ‗a montanha‘ e ‗Bázar-Tete‘. Estes
tópicos inter-relacionam entre si, pois todos eles relatam as actividades de ―bazar‖, ―lutas de galo‖,
―viajar no automóvel‖, ―viajar de cavalo‖ ―viajar na montanha‖, ―danças guerreiras timorenses‖.
Resumindo que em Díli de cada dia ―nasce a manhã, cinzenta e fresca, com as estrelas amortecidas,
com as ervas curvadas ao peso da cacimba. Ao longe, o mar perde-se na neblina e ergue um ruído húmido
e sonolento‖ (1936c:3). Quando a cidade de ―Díli ao amanhecer, tem um aspecto de alameda sob o
orvalho. O automóvel corre entre as casas, que vão abrindo janelas como se fossem gente a abrir os
olhos‖ (1936c:5-6) e era uma cidade velha e histórica onde o navio da colónia agarrado à ponte que tinha
ares de casebre aldeão, talvez de palhota duma aldeia lacustre (1936c:7).
252
Quando longe de Díli, ―sinto em uma impressão de alívio. Ao princípio não a sei definir. Depois
concentro-me e descubro a minha alma. E Díli, comparada à montanha é bem um presídio‖ (1936c:9), por
isso, é melhor ―procura-se a montanha‖ (1936c:10) para refugiar-se a alma. Para que isso foi uma
realidade, Paulo Braga com seus colegas de trabalho, digamos assim, numa da manhã com um automóvel
foram viajando para Bazar Tete1 e quando eles chegaram a Tibar, o sol começou aquecer a terra, daí
deixaram os olhos a desfrutarem ―a beleza serena e doce do mais belo quadro da paisagem timorense, na
água, nas árvores que fazem ilhas de verdura dentro da baía, nos montes escalvados, apenas mostrando a
vida num ou outro eucalipto ressequido‖ (1936c:13).
Passando pela aldeia de Aipelo a direcção de Bazar Tete, como não tinha outra coisa se não relatar
pormenorizada os belos momentos que tenham passado por Paulo Braga na sua viagem, que ele próprio
dizia: ―Tenho a minha frente a planície, atravessada por estrada que terminará no sopé da montanha‖
(1936c:21) e ―no sopé da montanha acabará a estrada. A flora de Timor surgira em toda a sua grandeza,
enchendo a terra de sobras. Caminharei pela selva, por carreiros. É que, para se subir até Bazar Tete, não
há estrada, ou antes, há uma estrada por onde ninguém anda, uma estrada idêntica a muitas outras de
Timor‖ (1936c:22) e já que ―a selva timorense, com as cores e os ritmos, com as folhas, as flores e as
aves, a selva tropical que parece sempre virgem por mais que os homens a atravessassem, a sulquem de
carreiros e nela construam casas‖ (1936c:24), por isso, ―vejo-me só na floresta‖ (1936c:26), mas, algumas
horas depois, ―ao longe, distingue-se já Bazar Téte‖ (1936c:27).
Quando o autor e seus companheiros chegaram esta pequena povoação, encontraram muitas pessoas
no Bazar, pois tal povoação ―possui, como todas as povoações, semanalmente, o seu dia de Bazar‖
(1936c:33) e a tarde acabou-se o Bazar, ―Rufam tambores. Os moradores perfilam-se. Desce a bandeira
nacional‖ (1936c:39) e ―em noites luarentas ou em noites escuras, resplandecem as fogueiras das
queimadas e as fogueiras dos ‗estilos‘. Canções pungentes ressoam na montanha e na floresta, iluminadas
pelos pirilampos, as árvores parecem espectros adormecidos na serenidade da noite‖ (1936c:40).
Nesta crónica de viagem ―Díli-Bazar Tete‖ ele mostrou a sua plena felicidade, pois já não precisava
andar com armas de fogo na mão: ―Tenho dois anos de Timor, percorri a ilha, e jamais conduzi comigo
uma arma e dormi sem fechas as janelas‖ (1936c:16). Sendo assim, ―Em Portugal geralmente conhece-se
mal Timor, apreendeu-se na instrução primária que fica situado na Oceânia, mas depois isso esquece e só
agora, com a guerra (refere-se a Segunda Guerra Mundial), os olhos mais curiosos procuravam nos mapas
a sua exacta posição. De lamentar é que assim tenha sido‖ (Brandão, 1953:152).
Na quarta parte da sua obra ―A ilha dos homens nus‖, Paulo Braga deu um especial enfoque à ilha e a
gente de Ataúro, onde se revela a beleza de uma ilha pequenina no meio de outras ilhas do arquipélago
malaio; qualquer pessoa pode ver de longe o cume de velha montanha de Mano-Coco que submergiu
outrora, último vestígio de um mundo imerso que a água azul cobriu um dia, talvez para nunca mais
voltar a sentir-se batido pelo sol dos trópicos e pelas ondas do Índico e do Pacífico dominadores
(1936d:3)). A ilha de Ataúro era um lugar de tragédia, ao mesmo tempo, foi um lugar de aventura e na
primeira noite ―vi-me no começo da aventura e no país dos homens nus e da escuridão profunda‖
(1936d:5) que dava, entretanto, ―a impressão de se sentir sufocada e esmagada pelo peso da noite escura,
como nunca tinha sentido, o desejo de não morrer‖ (1936d:5-6).
O autor continuou a reflectir que, para aquele tempo, (referia-se ainda aos anos 30 do XX) na ilha
Pulo-Cambing encontravam-se ―casas espalhadas pela planície, raramente, as constroem no solo. No
cimo das árvores a vida é mais sossegada e dorme-se melhor, sem tanto receio das cobras e de toda a
1
É um dos subdistritos que pertence actualmente ao distrito de Liquiça.
253
bicharada da selva. Os horizontes tornam-se mais vastos. Sentem-se também melhor o passar sereno das
brisas perfumadas e harmoniosas‖ (1936d:15), afirmando ainda que ―o homem nu é essencialmente
desportivista‖ (1936d:16), mas ―os homens nus continuam a ser homens nus‖ (1936d:18) e ―a sua alma é
um universo de superstições indefinidas. Jamais soube criar uma divindade. O Maromac timorense, já de
si vago e impersonalizado, só caricaturalmente aparece na espiritualidade do homem nu‖ (1936d:19).
Ao longo do texto ―Nos Antípodas‖, Paulo Braga, construiu as narrativas poucas dignas e
estereotipadas com maior dimensão, nomeadamente o modo como ele tratou narrativamente as mulheres
timorenses, dizendo que as mulheres timorenses foram levadas pelos homens com trocas de búfalos,
porcos, galinhas e patacas (1936a:6-7), desvalorizando-as ainda mais quando o próprio autor justificou
que as mulheres timorenses ―estilizadas nas lipas2 justas ao corpo, com os seios pujantes, ainda novas,
convencem-nos de que existe uma outra mulher em Timor‖ (1936a:11).
A aplicação de outras expressões estereotipadas que não são necessariamente apresentadas todas aqui,
por exemplo, ―as nonas também envelhecem, que um dia vem sempre em que soa a hora do regresso à
selva‖, ou noutra ocasião, nomeadamente em ―A terra, a gente e os costumes de Timor‖ (1936b:35)
escreveu assim: ―o europeu vai [ao bazar para] ver as nonas que já existam e as possibilidades de nonas
que porventura apareçam. Por isso, não olha os géneros agrícolas e pecuários ou os artefactos expostos.
Procura, apenas, as mulheres‖.
Apesar de tudo, o autor continuou o seu jeito de tratar os timorenses como ―indígenas‖ e
caracterizando-os como classe inferior e, numa dada circunstância, criticou alguns europeus
(nomeadamente portugueses) desgraçados que gostaram mais duma mulher que encontraram e com ela
arranjaram filhos em Timor, porém, não foram reconhecidos pelos pais europeus, porque estes não
tiveram dinheiro para pagar as passagens dos filhos (1936c:17). talvez ―a enorme distância que a separa
da metrópole é o seu grande mal e talvez o único defeito que a faz desmerecer no conceito daqueles que
se apaixonam pelos seus encantos‖ (Brandão, 1953:151), nomeadamente a beleza das mulheres
timorenses ―estilizadas nas lipas‖ sem dar nenhuma importância.
Bibliografia citadas
2
O vestuário timorense.
254
Neves, Margarida de Souza (1992), ―Uma escrita do tempo: memória, ordem e progresso nas crônicas
cariocas‖, In: CANDIDO, Antônio et all, A Crônica: o gênero, sua fixação e suas transformações
no Brasil. Campinas Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1992, p.414.
Paulino, Vicente (2012), ―Manuel Ferreira‖, in Ricardo Roque (org.), History and Anthropology of
―Portuguese Timor‖, 1850-1975. An Online Dictionary of Biographies, available at
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1931‖, in Marques, Vítor Rosado., Roque, Ana Cristina & Roque, Ricardo (eds), Actas do
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Tavares, Manuel Viegas (1999), ‗Bua sei saren malus dikin loron ida‘: A integração dos timorenses na
sociedade portuguesa, Lisboa, Instituto Piaget.
255
256
DESNATURALIZANDO OLHARES: A IMPORTÂNCIA DAS DISCUSSÕES
SOBRE IGUALDADE DE GÊNERO PARA PROFISSIONAIS DA COMUNICAÇÃO
EM TIMOR-LESTE
Introdução
Discussões relacionadas às questões de gênero ganharam força no início do século XXI em grande
parte do mundo, hoje podemos ter acesso a diferentes debates e posições políticas, ideológicas e
religiosas sobre essa temática. O surgimento e o aumento do uso das redes sociais contribuíram para a
circulação de informações. A busca por esclarecimento e direitos iguais para todos os gêneros é
responsável por essa avalanche de ideias e posições.
As discussões sobre as temáticas de gênero são transversais, isto é, devem estar presentes em todas as
áreas profissionais e do conhecimento. Aqueles que não atuam diretamente com esse assunto
desconhecem sua importância e como inseri-lo no seu cotidiano. Conhecer e internalizar as problemáticas
referentes às questões de gênero nas esferas públicas e domésticas podem contribuir para o combate à
desigualdade.
A construção de conceitos e valores envolve conhecimentos difundidos através da socialização na
escola, pelos meios de comunicação, pela família e outros meios disponíveis na vida cotidiana. Esses
conceitos relacionados à formação da identidade do indivíduo resultam em alguns modelos de
pensamento, atitudes e comportamentos.
O tratamento reducionista e muitas vezes incorreto dado pelos meios de comunicação aos temas
relacionados às questões de gênero reforçam as desigualdades e os estereótipos de gênero. Além disso,
esses meios transmitem concepções de mundo que acabam sendo construídas socialmente como
necessidades, ou até mesmo como verdades. Assim, é preciso abordar esses discursos de uma forma
crítica.
Segundo Giroux (1995), a história das mulheres não é considerada pelos conteúdos curriculares da
escola, os quais contemplam apenas culturas hegemônicas, que retratam a visão do homem branco
europeu. E isso também é presente nos meios de comunicação.
257
A falta de compreensão crítica sobre os conceitos de gênero e sexualidade, abordados pelos meios de
comunicação e outras fontes, cristaliza valores e reproduz saberes hegemônicos que contribuem para o
aumento das desigualdades.
Dessa forma, este trabalho propõe apresentar a experiência da unidade temática intitulada Igualdade
de Gênero, ministrada por mim no curso Formação de formadores de comunicação, questões de gênero,
direitos humanos e gestão, do Centro de Formação Técnica em Comunicação – CEFTEC em parceria
com o Programa de Qualificação Docente e Língua Portuguesa (PQLP).
A unidade temática foi composta por um total de 15 horas, realizada com profissionais que atuam em
diferentes áreas da comunicação, com o objetivo de historicizar e reconhecer o conceito de gênero como
categoria analítica para promover uma visão crítica das tecnologias da comunicação contemporânea, no
que se refere ao tratamento e inclusão das questões de gênero. Pretendi neste trabalho discutir sobre as
possíveis mudanças e a desnaturalização dos olhares desses formandos sobre as questões e os estereótipos
de gênero encontrados nos meios de comunicação.
A unidade temática foi idealizada para dar visibilidade a temáticas ainda pouco discutidas pelos
profissionais de comunicação em Timor-Leste, buscando evidenciar algumas discussões sobre gênero e
sexualidade em suas interfaces históricas e culturais. Ao final do curso, os formandos podem começar a
elaborar seus trabalhos com um olhar mais voltado para a questão de gênero.
Cabe esclarecer ainda, que o objetivo do trabalho foi realizar rupturas de olhares e instigar a reflexão
sobre as questões de gênero, sem impor um olhar sobre esse assunto, já que as lutas por igualdade de
gênero são diferentes nos diferentes lugares e sociedades.
A minha participação no Grupo de Estudo sobre Mulheres de Timor-Leste (GEM), composto por
professoras do Programa de Qualificação de Docente e Língua Portuguesa (PQLP), possibilitou uma
maior compreensão sobre o papel da mulher em Timor-Leste, mais especificamente sobre as mulheres
que residem na capital, Díli. Esses estudos serviram de suporte para a realização da unidade temática
desenvolvida no CEFTEC.
São os aspectos sociais que definem e sujeitam o comportamento e as funções desempenhadas pelas
mulheres. Por isso, as mais diferentes culturas desenvolveram diversas formas de percepção de gêneros,
que não são estáticas, mas sim se transformam com as mudanças culturais, sociais e econômicas.
Simone de Beauvoir (1967, p. 09), no livro O segundo sexo, afirma que ―Ninguém nasce mulher,
torna-se mulher‖. Discutindo que o ser mulher se dá a partir do conjunto da civilização que elabora esse
produto, ou seja, o que entendemos por padrões e comportamentos femininos são na verdade uma
construção social e não biológica.
O papel das mulheres na sociedade timorense é marcado e definido culturalmente conforme os
grupos e comunidades, mas as mulheres sempre buscaram atuar de forma corajosa, desde o período dos
conflitos e da invasão indonésia (1975-1999) através da participação na luta armada e nas frentes de
resistência.
A independência, a entrada da ONU e a democratização do país iniciaram as políticas de incentivo à
igualdade de gênero, que trouxeram avanços, mas também conflitos entre essas novas perspectivas e o
papel tradicional das mulheres. Surge, então, a formação de uma nova realidade, onde a mulher ocupa
novos espaços na sociedade, mas ainda enfrenta os preconceitos e as dificuldades de um país em
transição.
258
A inclusão das mulheres acontece através de empregos, de incentivo à formação e de geração de
renda, sob o ponto de vista do desenvolvimento do país. Nesse sentido, a educação promove mudanças e
traz possibilidades de transformação na vida das mulheres, que passam a agir com maior autonomia.
Segundo Silva (2014), atualmente existe uma forte tensão entre a cultura tradicional e a modernidade
nas questões de gênero. A igualdade de gênero faz parte da agenda de modernização e desenvolvimento
do país; principalmente em Díli é possível encontrar mulheres desempenhando cargos públicos,
trabalhando nos ministérios, nos setores administrativos, nas universidades, nos centros de pesquisas,
entre outros. Porém, ainda existe um alto índice de violência doméstica nos subdistritos e nas aldeias, e a
participação das mulheres na esfera das políticas tradicionais é rara.
A luta feminista mundial segue diferentes correntes 3 e possui entre suas principais reivindicações: o
direito ao divórcio, direito das mulheres à herança e propriedade de terras, direito e acesso ao mesmo
sistema educacional oferecido aos homens, direitos sexuais e reprodutivos. Também existe a luta por
direitos mais subjetivos, como por exemplo, a mulher ser ouvida e suas opiniões serem consideradas
relevantes.
259
tema. Também foram realizados debate sobre o vídeo/documentário Mulheres Invisíveis4, que aborda a
dupla jornada de trabalho da mulher e a desvalorização salarial vivenciada por essas, e sobre o curta-
metragem Acorda, Raimundo... Acorda!5, que estimula as reflexões sobre a tradicional construção do
masculino e feminino no Brasil, mostrando de forma irônica a inversão dos papéis de gênero. Além disso,
foi apresentado o histórico de luta das mulheres no mundo pela igualdade de gênero, sempre tentando
relacioná-lo com o contexto timorense a partir de relatos dos alunos.
A partir das apresentações e debates realizados, foi discutido o papel da mulher em Timor-Leste e
nos meios de comunicação. Assim, os participantes puderam perceber como a mulher é silenciada na
história das sociedades e como os estereótipos de gênero são construídos na publicidade e na propaganda.
As questões da linguagem e da escrita sexista nos meios de comunicação também foram abordadas. Por
fim, houve a discussão sobre como é a igualdade de gênero no ambiente de trabalho dos formandos.
Como aprofundamento teórico e complementação, foi sugerida a leitura dos seguintes trabalhos: O
segundo sexo: a experiência vivida de Simone de Beauvoir, Microfísica do poder de Michael Foucault, e
As mulheres ou os silêncios da história de Michelle Perrot.
A unidade temática foi ministrada durante cinco dias, distribuídos entre os meses de janeiro e
fevereiro de 2015, no CEFTEC, localizado no Palácio do Governo de Timor-Leste. Ao final de todos os
dias, realizei avaliações sobre as atividades propostas e executadas, para que pudessem ser feitas
reformulações nos planejamentos, caso necessário. Pode ser vista no Quadro 1, a estrutura utilizada na
unidade temática.
Quadro 1. Estrutura da unidade temática Igualde de Gênero (Fonte: Elaborado para a pesquisa)
Os sujeitos da pesquisa são todos formandos que já atuam em diferentes áreas da comunicação e que
pretendem trabalhar com formação nos seus espaços profissionais. O grupo foi composto por: docente do
curso de comunicação da Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL), técnicos de rádio e televisão,
4
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=VycN-Jsm9Lg
5
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=HvQaqcYQyxU
260
redatores e editores de jornal, e participantes de movimentos sociais na comunicação. Nesse trabalho, os
sujeitos serão identificados pelo seu gênero e pela letra inicial de seus nomes.
Foi utilizado como material de análise um recorte das atividades trabalhadas durante a unidade
temática, e as respostas de algumas questões perguntadas. O método de análise das questões, foi baseado
na Análise Textual Discursiva, que, consiste, primeiramente, na desmontagem dos textos (corpus)
chamada de unitarização (MORAES, 2003). A partir da desconstrução dos textos, surgem as ―unidades de
análises‖, em segundo lugar, ocorrendo o processo de categorização.
Segundo Moraes (2003), a categorização é um processo de comparação constante entre as unidades
definidas no processo inicial da análise, levando a argumentos de elementos semelhantes. Os conjuntos
de elementos de significação próximos constituem as categorias. Assim, é no momento em que a
categorização vai sendo construída que precisamos nomear e definir as categorias.
Ainda conforme Moraes (2003), ao utilizar textos é preciso ter a clareza de que um mesmo texto
pode ser compreendido de maneiras diferentes, dependendo da pessoa que está lendo. Isso porque existe
uma relação entre leitura e significação. O significado que cada sujeito estabelece depende das suas
vivências de mundo, dos referenciais teóricos e das intenções que pretende. Diante disso, podemos
afirmar que as leituras e interpretações serão apenas uma forma de estabelecer sentido a partir das falas
dos alunos, sentido este que é construído em um determinado tempo. Tentei levar em consideração o
contexto social, histórico e cultural em que se encontram os participantes desta pesquisa, apresentando,
dessa maneira, um olhar possível sobre os sentidos construídos.
Para isso, foram definidas as seguintes categorias sobre as questões de gênero: O que você entende
por igualdade de gênero? Como é o papel das mulheres em Timor-Leste? Existe igualdade de gênero no
seu local de trabalho? Nos discursos dos participantes da formação foi possível identificar vários
enunciados referentes a essa temática. A pluralidade de discursos sobre as questões de gênero pode estar
atrelada às diferentes histórias de leitura, experiências, conhecimentos e expectativas, construídas ao
longo da vida dos formandos. São a partir dessas relações, estabelecidas entre os sujeitos, e suas histórias,
que são produzidos seus sentidos.
Questionei primeiramente o que os formandos entendiam sobre igualdade de gênero, e encontrei
respostas que estão relacionadas à busca por direitos iguais entre homens e mulheres, conforme pode ser
observado nos seguintes exemplos:
Igualdade de Gênero é um meio para transparar ou fazer balanço entre uma coisa que os
homens e as mulheres podem fazer juntos, mas em outra parte os que os homens têm e
também de contrário as mulheres não tem (FORMANDA E.).
Igualdade de Gênero significa condições de igualdade para homens e mulheres, bem como
a oportunidade de obter os seus direitos como seres humanos (FORMANDO E.).
Ainda sobre a mesma temática, o formando R., ao ser questionado sobre o que entende por gênero,
traz para a discussão os padrões de comportamentos que são esperados por homens e mulheres, e coloca a
problemática dos estereótipos de gênero no nosso dia a dia, assim:
Muitos homens dizem que não é fácil ser homem, porque as pessoas têm expectativas
excessivas para ele. Eles devem ser figura forte, não chorosa e poderosa
(FORMANDO R.).
261
Quando se trata do papel da mulher em Timor-Leste, encontrei discursos semelhantes sobre a
existência de igualdade de gênero no país e que as mulheres podem atuar em todos os espaços, tanto
público como privado. Mas, logo vi que a realidade não é tão ideal assim:
Podemos perceber que o fato das mulheres timorenses hoje ocuparem espaços de trabalhos iguais aos
dos homens é considerado por muitos formandos como igualdade de gênero, porém na esfera do privado,
do tradicional, do familiar, as mulheres de Timor-Leste ainda estão em luta para conquistarem espaços.
Sobre a última questão, os formandos responderam que existe igualdade de gênero no seu ambiente de
trabalho, que homens e mulheres podem desempenhar os mesmos papéis, e que isso depende da
capacidade que cada um tem para desenvolver o trabalho. O problema desse discurso, que foi discutido
durante o encontro, é que as mulheres desde muito novas precisam cuidar da casa, dos filhos e da família,
enquanto os maridos têm maiores possibilidades de melhorarem nos trabalhos. Assim, as mulheres não
têm as mesmas oportunidades que os homens, e isso não está relacionada à capacidade.
Um exemplo dessas diferenças é o comentário de um dos formandos sobre a ida apenas de homens
para realizar gravações nos distritos, pois não seriam lugares seguros para as mulheres.
Mas não significa que não tem o equilíbrio para dividir a posição entre as mulheres e os
homens, por exemplo, a tradição de Fataluco, Lospalos é uma tradição, tem cultura onde o
homem é chefe de família e mulher é dona de casa, mas dentro da família já tem equilíbrio
da posição, onde que a mulher faz a gestão do orçamento da família quando o homem
precisa de dinheiro e sempre faz uma discussão com a mulher (FORMANDO U).
É nesse sentido que está a naturalização do papel desigual da mulher dentro de uma sociedade, as
mulheres são limitadas.
Considerações Finais
A unidade temática Igualdade de Gênero teve como objetivo apresentar o histórico e os conceitos
sobre os estudos de gênero, mostrar que existem sim diferenças entre os gêneros, mas que isso não pode
se transformar em desigualdade, e tentou desnaturalizar o olhar para questões cotidianas, principalmente
relacionadas ao papel da mulher.
A entrada da ONU, do Banco Mundial, da democratização do país e das políticas de incentivo à
igualdade de gênero trouxeram avanços e conflitos entre essas novas perspectivas e o papel tradicional
das mulheres timorenses. Existe a inclusão dessas mulheres através de empregos, de incentivo à formação
e de geração de renda, sob o ponto de vista do capitalismo e das receitas de boa governança da ONU.
Porém, esses avanços dentro dos parâmetros ocidentais e capitalistas não alteram a estrutura social.
Assim, é fundamental os profissionais de comunicação terem cuidado não só no ambiente de
trabalho, mas também no ambiente familiar para não colaborar com a desigualdade de gênero e
inferiorizar a mulher em relação ao homem.
É importante a criação de espaços de debates, o desenvolvimento pesquisas e o ensino nos âmbitos
acadêmico e popular, que possibilitem a compreensão crítica das questões de gênero em Timor-Leste.
Para tanto, os espaços escolares e acadêmicos devem abordar questões relevantes, contribuindo para a
construção social e emancipatória dos formandos e da sociedade civil.
262
Referências Bibliográficas
263
264
CRITÉRIOS DE NOTICÍABILIDADE NAS NOTÍCIAS
SOBRE CAPITAL NO JORNAL DIÁRIO
Noticias
Notícia é qualquer tipo de informação que apresenta um acontecimento novo e recente ou que divulga
uma novidade sobre uma situação já existente, ou seja, como uma construção de factos que ocorreu. A
origem da palavra ―notícia‖ provém do Latim, em que ―notitia‖ significa notoriedade, conhecimento de
alguém, noção. O Daniel Ricardo, citado por Anabela Gradim (2000:41), considera característica
essências da notícia a veracidade, actualidade e a capacidade de interessar, sendo que os valores que
imprimem interesses a factos actuais e verdadeiros são a proximidade, a importância, o conteúdo humano
e a originalidade. Contudo, o Pedro de Sousa (2000), citado por João Carlos Correia (2011:29) defende
que uma notícia deve ser considerada como
A estrutura de notícia deve ser apresentada sob o padrão de ―Critérios de Noticiabilidade‖ de que
fala Nelson Traquina (2002). Neste âmbito, a notícia deve ser composta pelas seguintes formatações:
Título, Lead, e Corpo de Noticia. Isto significa que no estudo jornalístico, toda a formatação de notícia
quer no sentido restrito ou técnico deve seguir o ―género canónico‖ que designa um texto como um
―objecto informativo‖ e que tal estar sempre centrado nos factos e conhecido pela ―existência de um
título, de subtítulos, de um parágrafo inicial chamado Lead, onde se procura responder a seis questões
consideradas fundamentais (O quê? Quem? Quando? Onde? Como? Porquê?) das quais as duas últimas
podem ser respondida no parágrafo seguinte‖ (CORREIA, 2011:28-29).
A estrutura do texto jornalístico é designada por ―pirâmide invertida 6‖, porque em uma estrutura de
texto, o tema de relevância das notícias deverá ser apresentado logo no primeiro parágrafo e nos
parágrafos seguintes surgem outras informações por ordem decrescente de importância, conforme a
estrutura piramidal dos jornalismos.
6
Carl Tiuí Hummenigge (Salzburg, Áustria, 1853 - 1935) a desenvolveu para os periódicos durante a Primeira Guerra
Mundial, visando informar a população acerca dos acontecimentos nos campos de batalha de forma mais clara e objetiva. O
termo pirâmide invertida é utilizado porque a base desta, aquilo que é noticiosamente mais importante, se encontra no topo –
em ordem muito distinta à que seguem, por exemplo, a novela, o drama ou o conto - Wikipedia-A encyciclopédia livre
(acesso em 12/09/2013).
265
Figura 1. Representação de uma pirâmide invertida
O texto jornalístico ao seguir esse método apresenta os factos duma forma decrescente e organizada
em blocos, de tal modo que, idealmente, a subtracção de qualquer um destes no fim do texto para não
colocar outros textos em segundo plano. O método Piramida Invertida (Cf. CORREIA, 2011) coloca uma
notícia bem estruturada, daí a sua importância em ajudar o público-leitor sobre aquilo que é
noticiosamente mais importante. E, a partir deste, a notícia enquanto texto escrito constitui um género
jornalístico. Assim, as notícias são vistas como resultado de processo de comunicação não só entre
jornalistas e fontes, mas também entre os próprios jornalistas com a sua equipe da mesma profissão. Esta
intercomunicabilidade faz parte de um processo decisivo e contínuo na formação, no consenso e na
consolidação de laços que influenciam o seu trabalho jornalístico através da ―partilha de hábitos mentais
comuns‖ (TRAQUINA, 2002: 126; TRAQUINA, 2004:12, 18).
Jornal
Jornal é um meio de comunicação escrita que geralmente é derivado pelo conjunto de actividades
denominado Jornalismo. As suas características são, de maneira geral, o uso de ―papel de imprensa‖ –
mais barato e de menor qualidade dentro daquilo que se entende por linguagem jornalística. O uso do
Jornal é apenas uma folha designada ―papel imprensa‖, porque essas folhas foram impressas,
distribuindo-as aos leitores comuns. A linguagem que se utiliza pelos jornalistas no jornal é a linguagem
simples e apropriada para os leitores puderem compreender melhor o conteúdo das notícias publicitadas.
Relatórios sobre eventos, opiniões, tendências, situações, condições e a interpretação, são importantes e
por isso mesmo devem ser publicitados nos jornais.
O jornal como um ―Impresso de folhas contendo declarações que ocorrem por pessoas com traços
publicados periodicamente, a natureza em geral, e os conteúdos gerais sobre qualquer coisa e em qualquer
lugar do mundo a ser conhecido pelo leitor‖.
O Jornal Diário é um dos jornais mais conhecidos em Timor-Leste. É um jornal que em sua
publicação todos os dias se espalham na comunidade timorense, especialmente os que estão na capital de
Timor Leste. O jornal Nacional Diário pertence do Grupo Média Nacional, denominado GMN. O Grupo
266
Média Nacional é umas das empresas que foi criada por António Veladas (correspondente da RDP) e
Jorge Manuel de Araújo Serrano (timorense, o actual Presidente Conselho da Administração do Grupo
Média Nacional) em 19 de Dezembro de 2003.
Eugénia de Jesus (2011:71) explica que o jornal Diário é composto por 16 páginas e que foi escrita
em três línguas: Tétum, Português, e Indonésia. O título: ―Diário‖ corresponde à ortografia portuguesa e
também à ortografia tétum.
Jornal Nacional Diário foi fundado em Março de 2005. Sediado na antiga estação da polícia
Indonésia, na Avenida Farol, Díli. Segundo a reportagem de New Zealand Media Observation Mission
Report, em 2007, o jornal Diário conseguiu ter 13 repórteres.
O conteúdo do jornal Diário é composto por notícia sobre Capital, Saúde & Educação, Economia,
Desporto, Regional, e Justiça & Segurança. Além dessas notícias, o jornal Diário também consiste em
uma página com Opinião e outro com divertimento. A publicidade e os avisos presentes na parte inferior
da página. Normalmente, os jornalistas nos seus trabalhos diários, fazem cobertura e reportagem sobre as
notícias nacionais e regionais. Reportando também as notícias internacionais, desportos e entretenimento.
O género jornalístico é um carácter de classificação de notícias, que segundo José Luís Martinez
Albertos (apud Dora Santos e Paulo Gonçalves7): ―A definição dos diferentes géneros jornalísticos
prende-se com a natureza dos acontecimentos, com o grau da pesquisa efectuada e com o tratamento dado
à informação‖. A notícia que faz parte da categoria do género jornalístico tem um valor-notícia próprio,
porque o seu modo de construção liga-se ao género literário, como explica José Luís Martinez Albertos
(apud Dora Santos e Paulo Gonçalves): ― o género literário mais escorreito, mais descarnado, mais
fortemente cingido ao puro esqueleto do facto ou acontecimento que se quer transmitir. É, diríamos, o
género jornalístico mais rigorosamente objectivo no seu propósito teórico e sob o ponto de vista da
aparência formal da linguagem utilizada pelo jornalista repórter‖.
No género jornalístico existe uma forma de entrevista. Dora Santos e Paulo Gonçalves explicam que
a entrevista pressupõe dois actos: o de entrevistar e o da transcrição sob a forma de perguntas e respostas
ou de relato do diálogo estabelecido entre o entrevistador e o entrevistado (tratando-se nesse caso de um
diálogo espontâneo). Todavia, este diálogo deve ser orientado por parte do entrevistador para que o
entrevistado não se perca em assuntos sobre os quais não foram interpelados.
7
Fonte: Dora Santos e Paulo Gonçalves, ―Géneros Jornalísticos ―, inwww.cienciaviva.pt/healthxxi/news.asp(acesso em
11/12/2013).
267
Entrevista
Características Linguagem Estrutura
DÁ A CONHECER CLARA, INCISIVA, DESCRIÇÃO DO Podem ser reveladas
PESSOAS ACTUAIS CORRECTA ENTREVISTADO hesitações, sorrisos,
DE INTERESSE gestos, etc., do
GERAL entrevistado
DIÁLOGO ENTRE O SUBSTANTIVOS, CORPO DA Perguntas e Respostas
JORNALISTA E O VERBOS, ADJECTIVOS ENTREVISTA:
ENTREVISTADO
Quadro 2. A forma de construção da entrevista.
E, o que mais comum no mundo do jornalístico é a reportagem. A reportagem é um dos géneros mais
representativos no mundo do jornalismo, pois ela é que evidencia os trabalhos de grandes jornalistas.
Além disso, é o género jornalístico que permite uma maior criatividade dos jornalistas na construção da
realidade social em texto e transformando-o em grande reportagem, que no fundo é uma forma de ―contar
de uma história‖.
REPORTAGEM
Características Linguagem Estrutura
Metodologia
Resultados e Discussões
Tal facto encontra-se já nas edições do mês de Julho de 2013, onde se vê as notícias de carácter
reportagem. Isto significa que o método de escrever a notícia que os jornalistas do jornal Diário utilizam é
a reportagem. As notícias de edições do mês de Outubro são semelhantes com as anteriores edições, isto
significa que em termos de categorização, as várias notícias pertencem a reportagem, análise, informação
opinativa.
268
Mês do Julho
40
30
20
10
0
Reportagem Análise Entrevista Opinião Notícias
Soltas
Série1 39 3 0 0 0
Quanto ao mês de Agosto, podemos dizer que foram publicadas pelos menos de 24 notícias, como se
verifica no gráfico a seguir:
Mês do Agosto
25
20
15
10
5
0
Notícias
Reportagem Análise Entrevista Opinião
Soltas
Série1 21 2 1 0 0
269
Figura 3. Géneros jornalísticos presentes no jornal Diário na edição do mês de Setembro
.
Em relação ao mês de Outubro, foram publicitadas 29 notícias, isto é, 18 notícias de género
reportagem e 11 notícias de carácter analítico.
Mês do Outubro
20
15
10
5
0
Notícias
Reportagem Análise Entrevista Opinião
Soltas
Série1 18 11 0 0 0
A partir dos resultados dessa pesquisa, percebo que o Género Jornalístico usado por jornalistas do
Jornal Nacional Diário sobre Capital é, geralmente, do tipo notícia de Reportagem e Análise. Ressalto
também que estes dois tipos de género jornalístico são familiarizados com as actividades jornalísticas.
270
Sintese
Após a análise da publicação construída no Jornal Nacional Diário nas edições entre meses de
Julho até Outubro de 2013, chego aos seguintes conclusões de que o género Jornalístico que geralmente é
usado por jornalistas do Jornal Nacional Diário para escrever e publicar as notícias sobre Capital é o tipo
de notícia de Reportagem e Análise.; outros tipos de notícia, os jornalistas colocam quando existem as
actividades que são de interesse jornalístico sobre o que está acontecendo e todas as notícias sobre Capital
estão numa página com o título Capital escrito no topo da página.
Referências bibliográficas
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2011.
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empréstimos em jornais timorenses. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2011.
Sousa, Jorge Pedro. As notícias e os seus efeitos. Coimbra: Minerva Editora, 2000.
Traquina, Nelson. A Tribo Jornalística. Uma Comunidade Transnacional. Lisboa: Editorial Notícias,
2004.
Traquina, Nelson. Jornalismo, Lisboa: Quimera, 2002.
271
272
A CONTRIBUIÇÃO DAS MÍDIAS NA DIVULGAÇÃO DA LÍNGUA TÉTUM
PARA AS AUDÊNCIAS EM DÍLI ATRAVÉS DOS PROGRAMAS NOTICIOSOS
DA RÁDIO TIMOR-LESTE
Rosa Alves
Introdução
A aprendizagem de uma língua é feita através de vários contextos, tanto na educação formal como
não-formal. Tudo isto depende das circunstâncias que rodeiam este processo. O trabalho científico que
nos propomos elaborar é para descobrir o efeito do acompanhamento da Rádio na promoção da Língua
Tétum pela comunidade timorense, no distrito de Díli, e de que forma esta prática pode ajudar na
aprendizagem da Língua Tétum.
Quando esta foi consagrada como Língua Oficial, muitos timorenses, especialmente as crianças e
jovens duvidaram sobre o uso de Tétum, tanto na escrita ou na oral, mesmo que todos falem Tétum,
ninguém domina perfeitamente essa Língua.
No entanto, a realidade dos fatos aponta que a Língua Tétum não tem sido escrita e pronunciada de
forma correta pelos timorenses, entre estes, percebemos o uso errado do tétum pelos apresentadores e
locutores das médias electrónicas. Por exemplo, a palavra política, alguns apresentadores leem como
politica, entre outras palavras, como estatística.
Estas competências poderiam ser desenvolvidas através de programas governamentais que
fomentassem o ensino da língua tétum. Por exemplo, poderiam ser criados mais cursos de Língua Tétum
acessíveis a toda a população, bibliotecas fixas e itinerantes e, destaca-se nesta pesquisa, a Rádio Pública
poderia ser utilizada como ferramenta de ensino e aprendizagem da língua tétum.
Tendo por base esta realidade, a investigação que proponho realizar aspira apresentar o cenário atual
existente em Timor Leste em relação ao uso da língua tétum, além de buscar discutir meios que sirva
como alicerce na elaboração de médias que possam reverter a situação existente sobre esse tema.
Por outra parte, na aplicação do bom uso da língua tétum é preciso ter boa vontade e interesse, já que
o uso da língua tétum é garantido por Lei. Por isso, precisa-se aprender a língua, para não perder
oportunidades.
Compreendo que muitas vezes o fato do locutor ou apresentador não pronunciar corretamente a língua
Tétum, não está necessarimente ligada a falta de formação oferecida pelas instituições timorenses, mas a
falta de interesse do apresentador em estudar e aprender de forma correta o uso da língua tétum. Noto
durante este tempo que a instituição Rádio Televisão de Timor-Leste-Empreza Pública-RTTL-EP que em
cooperação com à Rádio Televisão Portuguesa- (RTP) envia Jornalistas para participarem de curos de
formação em Portugal, assim como os Jornalistas seniores da RTP deslocam-se à Timor-Leste para dar
formação aos Jornalistas locutores ou apresentadores de notícias em três línguas Tétum, Portugues e
bahasa Indonésia, no sentido de pronunciar bem as palavras. Considero essa ação importante, pois as
audiéncias não perdem de acompanhar as notícias divulgadas e não afastam a frequência da Rádio Timor-
Leste para outras Frequências.
Algumas vezes as audiências acompanham o programa de rádio, mas o locutor ou apresentador não
pronuncia bem as palavras. Mesmo assim continuam a ouvir, porque consideram a informação
importante. No entanto, o programa da rádio pode perder a credibilidade, resultando na perda de
prestígio. Por causa disso, ressalto que os Jornalistas, locutores ou apresentadores deveram dar atenção a
273
gramática e pontuações. Mas os locutores ou apresentadores profíssionais sabem as regras de
apresentação lêem-se repetidamente antes de apresentar a notícia. A atitude e os valores garantem que o
apresentador pronuncie bem as palavras para as audiências compreenderem, de modo que não percam a
informação, porque à Rádio divulga a notícia só uma vez e não vai repetir, a não ser que o valor da
notícia seja muito grande.
Fundamentação teórica
Entretanto, pela sua funcionalidade, Gilberto Strunck (1989:30) explica que a ideia de uma marca
confere individualidade a um produto ou serviço, assegurando ao proprietário uma sólida posição no
mercado. Seguindo a mesma linha de pensamento mostra a definição feita pelo Comitê de Definições da
American Marketing Association, em 1960,a marca é um nome, termo, sinal, símbolo ou desenho.
A identidade é um conjunto de caracteres que individualiza uma pessoa ou uma coisa, fazendo-a
distinta das demais. Mendes (2005); Paulino, (2012a e 2012b) defenderam que uma pessoa tem o direito
de conhecer o seu passado para defender a sua identidade.
Esta Língua é uma Língua Oficial é uma das Línguas de grande valor histórico para o povo de uma
nação, que será utilizada em todas as ações num País. Enquanto em Timor-Leste os representantes do
Povo Timorense considerarem as línguas oficiais como Tétum e Português, onde foram consagradas na
Constituição da República Democrática de Timor-Leste no dia, 22 de Março 2002, pelos membros da
Assembleia Constituinte, antes a Restauração da Independência de Timor-Leste, em 20 de Maio de 2002,
no artigo 13.
necessário salientar que os timorenses são constituídos por ―múltiplas identidades Linguísticas‖
(Paulino, 2011), por isso mesmo que Timor-Leste é um país plurilingue onde coexistem várias línguas
locais, de origem autronésia e papua, com o português durante quatro séculos da administração colonial
portuguesa e o bahasa indonésia durante vinte e quatro anos de ocupação indonésia (Costa, 2001:59; apud
Paulino, 2011:76).
274
Definições da Rádio e línguas de transmissão
Na literatura encontramos várias definições sobre a rádio. Defendo que a Rádio é uma média
eletrônica que fornece informações ao público nos sons. Segundo Nélia R. Del Bianco (2008), a rádio é
uma tecnologia digital que traz em si a promessa de uma revolução técnica capaz de alterar o modo de
produção da programação e de transmissão das mensagens. A rádio é um meio de comunicação social que
tem vantagens qualitativas para a divulgação da informação científica, ou seja, um instrumento facilitador
de inclusão social de indivíduos e grupos sociais nofenómeno universal e inevitável. As línguas aplicadas
na rádio são a ―língua falada‖ e a ―língua escrita‖. A língua falada é usada por seres humanos como meio
de comunicação diária, enquanto a língua escrita é feita por letrados, como afirma AtalibaTexeira de
Castilho (2002)1, a língua existe para o uso comunicacional, mas na realidade apenas 20% que vai para a
comunicação, o resto é para a sua organização interna e sua respectiva reflexão.
O serviço da rádio em Timor-Leste tem dois tipos de serviço convencionais: a RTL FM (91.7 MHZ)
e a RTL AM (684 KHZ). Existem 65 funcionários na direcção da Rádio Timor-Leste (RTL).RTL tem
dezessete torres para a emissão dos programas, sendo que as dezesseis são de frequências FM e uma de
frequência AM. Assim, em cada distrito existe uma frequência própria, tendo a FM 90.9 (Aileu), FM 96.3
(Ainaro), FM 105.1 MHZ (Baucau), FM 88.7 MGZ (Bobonaro), 90.1 MHZ (Ermera), FM 99.5 MHZ
(Liquiça), FM 97.1 MHZ (Lautem), FM 94.5MHZ (Manatuto) FM 92.1 MHZ (Oecusse), FM 96.3 MHZ
(Same), FM 93, 1 MGH (Suai) e FM 98.5 MHZ (Viqueque).
O funcionamento da RTL começou com o surgimento de Rádio UNTAET, apenas com 15
funcionários no departamento de Programação da Rádio. O Produto principal da RTL é, e sempre foi, a
informação, ou seja, notícias. Em 2002, após a fase de transição da UNTAET, surgiu a Rádio Timor-
Leste. RTL, como parte da RTTL, foi fundada em 20 de Maio de 2002, sob a administração da UNTAET.
Em 2004, foi transferida para os próprios timorenses. Demorou dois anos para que os timorenses
conseguissem administrar a mídia. Esse processo de transição da RTL da UNTAET para o governo,
segundo Rozario Martins, Diretor da Rádio Timor-Leste, não foi um processo fácil.
Após a fase de transição, a RTL começou a se desenvolver e começou a colocar mais programas com
variedades. A rádio começou a dividir suas programações em 45% de notícias, 30% de divertimento, 18%
de programas educativos, 8% de programas de produção externa.
Conclusão
275
Algumas audiências, academistas e sociedade civil afirmam que ouvem a rádio e não se preocupam com
as palavras mal expressadas, pois o mais importante, é saber o que se passa na sociedade.
Concluo que os jornalistas e editorais devem dar atenção à escrita de notícias em língua tétum,
nomeadamente, pontuações, acentos, por exemplo: fó, tékniku, ladún, funsionál, hatán, polítika,
estatística, sasán e outras palavras acentuais, de acodo com o Manuál Hanorin Ortografia Tétum Nian.
Resssalto que os acentos e a ortografia dobrada são responsáveis por dar sentido às palavras, tornando
necessário tomar atenção à escrita antes da notícia ser publicada.
Referências bibliográficas
276
SOBRE OS AUTORES
Adelino da Silva
Graduando do Curso de Química na Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL).
Aida Ximenes
Graduanda do Curso Biologia na Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL). É pesquisadora do Grupo de Estudo sobre Ensino de
Ciência e Tecnologia na Educação em Timor Leste (GEECITE).
Angelita Viegas.S.Ximenes
Graduanda do Curso de Biologia na Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL). É pesquisadora do Grupo de Estudo sobre Ensino de
Ciência e Tecnologia na Educação em Timor Leste (GEECITE).
277
Antero Benedito da Silva
PhD em Educação da Paz (com Justiça) pela University of New England, Austrália, e professor
permanente no Departamento de Desenvolvimento Comunitário na Faculdade de Ciências Sociais da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL) desde 2006. Fundador e atual diretor do Instituto de
Estudos da Paz e Conflitos Sociais – Peace Centre–da Universidade Nacional de Timor-Leste (UNTL).
Responsável pela criação do Programa de Pós-Graduação na área dos Estudos da Paz e Conflitos.
António Soares
Graduado no curso de formação de professores do Ensino Básico na Faculdade de Educação, Artes e
Humanidades (FEAH) da Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL).
Áurea Soares
Graduanda do Curso de Química na Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL).
Celestina de Jesus
Graduanda do Curso de Biologia na Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL). É pesquisadora do Grupo de Estudo sobre Ensino de
Ciência e Tecnologia na Educação em Timor Leste (GEECITE).
278
David Raimundo
Licenciado em Matemática em 2006, na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Doutorado
em Matemática, pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Atualmente integra o corpo
docente do IOB -East Timor Institute Of Business, tendo as seguintes responsabilidades: apoio ao corpo
reitorado, docência de disciplina da área da Matemática, coordenação/apoio à pesquisa académica.
Eliasefa Barreto
Atua no Instituto Nacional de Formação de Docentes e Profissionais da Educação (Infordepe).
Flaviana Pedro
Graduanda do Curso de Biologia na Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL).
Flávio Clementino
Mestre em Educação Tecnológica pelo programa de Pós graduação do Centro Federal de Educação
Tecnológica de Minas Gerais (CEFET/MG), Bacharel e Licenciado em Filosofia pela Universidade
Federal de Minas Gerais (2004) e Especialista em Ensino de Filosofia, pela Universidade Candido
Mendes (2012). Foi Diretor Escolar na rede pública de educação estadual de Minas Gerais entre 2007 e
2012. Atuou como Estagiário Docente no Programa de Qualificação em Língua Portuguesa (PQLP) em
Timor-Leste (2014-2015). Possui experiência em Ensino de Filosofia no Ensino Médio, Ensino Superior
e em Curso preparatório para o Vestibular. Atua preferencialmente com ensino nas disciplinas de ética e
história da filosofia, tendo desenvolvido pesquisas, ainda na graduação, em subtemas da filosofia antiga,
principalmente, com os diálogos platônicos, mitologia, mitos gregos e retórica. Atualmente, desenvolve
estudos sobre o currículo e teorias curriculares.
279
Helder Soares da Costa
Graduado no curso de formação de professores do Ensino Básico na Faculdade de Educação, Artes e
Humanidades (FEAH) da Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL).
Inês do Carmo
Graduada do Curso de Biologia na Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL). pesquisadora do Grupo de Estudo sobre Ensino de
Ciência e Tecnologia na Educação em Timor Leste (GEECITE).
Mariana da Costa
Graduando do Curso de Biologia na Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL). pesquisadora do Grupo de Estudo sobre Ensino de
Ciência e Tecnologia na Educação em Timor Leste (GEECITE).
Januário da Costa
Graduado no curso de formação de professores do Ensino Básico na Faculdade de Educação, Artes e
Humanidades (FEAH) da Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL).
280
(2013), especialização em Comunicação Popular e Comunitária pela UEL - Universidade Estadual de
Londrina (2009) e mestrado em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação na Faculdade
de Filosofia e Ciência - UNESP/Marília (2014). Atua nas áreas de Comunicação, Filosofia e Educação,
com ênfase em Epistemologia da Comunicação e Filosofia da Educação, articulando os seguintes temas:
comunicação e educação, filosofia contemporânea francesa e ensino de filosofia no Brasil. Desenvolveu
Estágio de Docência pelo Programa Qualificação Docentes e Ensino de Língua Portuguesa da CAPES no
Timor-Leste durante o período de maio 2014 até maio de 2015. Atualmente é doutorando do Programa de
Pós-Graduação em Educação na Faculdade de Filosofia e Ciência - UNESP/Marília.
Keu Apoema
Educadora e contadora de histórias. Doutoranda em Educação pela FAE/UFME, mestre em Educação
pela FACED/UFBA e especialista em Arte e Educação pela PUC Minas, centra suas pesquisas no campo
da oralidade, das narrações orais e da arte de contar histórias. Atualmente, seu objeto de estudo são os
Lian Na‘in sira, os senhores da palavra, mestres da tradição de Timor-Leste. Tem experiência na área de
Educação, com ênfase em Arte e Educação, atuando principalmente com os seguintes temas:
metodologias lúdicas e participativas, narrativas orais e contação de histórias. Atuou no Programa de
Qualificação Docente e Ensino de Língua Portuguesa no Timor-Leste (PQLP/CAPES/UFSC),
ministrando disciplinas de Artes no Departamento de Formação de Professores da Universidade Nacional
Timor Lorosa‘e (UNTL), além de coordenar o Grupo de Pesquisa sobre Contação de Histórias e Tradição
Oral Haktuir Ai-knanoik, no Departamento de Língua Portuguesa da mesma universidade, entre outras
atividades.
281
Lindalva de Deus Belo Assis
Graduada no curso de Comunicação Social na Faculdade de Ciências Sociais (FCS) da Universidade
Nacional Timor Lorsa‘e (UNTL).
Lúcio Sousa
Professor do departamento de Ciências Sociais e de Gestão da Universidade Aberta (Portugal).
Doutorado em Antropologia, Antropologia Social. Universidade Aberta (2010). Mestre em Relações
Interculturais. Universidade Aberta (2000). Licenciado em Antropologia (com especialização em
Sociologia das Regiões Tropicais), Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas – Universidade
Técnica da Lisboa (1993).
282
ênfase em literatura, estudos culturais, literatura comparada e intermidialidade, psicanálise e imaginário.
Atualmente é membro do corpo editorial da revista eletrônica de pós-graduação Sebastiana, que publica
trabalhos na área da Literatura, Cultura, Letras, Artes e áreas afins.
Maurício Compiani
Possui graduação em GEOLOGIA pela Universidade de São Paulo (1981), mestrado em Educação pela
Universidade Estadual de Campinas (1988), Doutorado em EDUCAÇÃO pela Universidade Estadual de
Campinas (1996), Livre-docente pela Universidade Estadual de Campinas (2003) e Professor titular
(2010) pela Universidade Estadual de Campinas. Foi professor do Instituto de Geociências da UNICAMP
de 1988 a 2013 e, atualmente, está na Faculdade de Educação no Depto de Ensino de Práticas Culturais
(DEPRAC). Tem experiência na área de Educação, com ênfase em ensino de ciências, atuando
principalmente nos seguintes temas: ensino fundamental e médio, ensino de geociências, estudos críticos
do lugar/ambiente, abordagens sócio-histórica, formação continuada de professores, interdisciplinaridade.
Coordenador de graduação do Instituto de Geociências de 2005 a 2007. Coordenador do Programa de
Pós-graduação em Ensino e História de Ciências da Terra de 2007 a 2010. Coordenador dos projetos
Fapesp Ensino Público 2006/1558-1 e Petrobras Ambiental sobre o tema conhecimentos escolares
relacionados à ciência, à sociedade e ao ambiente em microbacia urbana de 2007 a 2010. De 2004 a 2014
foi lider do Grupo de Pesquisa de Educação Aplicada às Geociências. Sub-coordenador (de fev/2013 a
jan/2015) e Coordenador (a partir de fev/2105) do Programa Multiunidades de Ensino de Ciências e
Matemática (PECIM) da UNICAMP. É membro do grupo de Pesquisa gepCE (grupo de pesquisa em
ensino de ciências) da FE-UNICAMP.
Rosa Alves
Graduada no curso de Comunicação Social na Faculdade de Ciências Sociais (FCS) da Universidade
Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL). Reporter e apresentadora da RTTL.
283
Rufina dos Santos
Graduando do Curso de Biologia na Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da
Universidade Nacional Timor Lorosa‘e (UNTL). pesquisadora do Grupo de Estudo sobre Ensino de
Ciência e Tecnologia na Educação em Timor Leste (GEECITE).
Rui Ramos
Possui doutorado em Linguística pela Faculdade de Letras do Porto, Portugal (2006). É professor da
Universidade do Minho (Instituto de Educação), Portugal. Tem experiência nas áreas de Educação, com
ênfase em Ensino da língua portuguesa, e de Linguística, com ênfase em Análise do Discurso. Leciona ao
nível da graduação e pós-graduação (mestrado e doutorado). Participou em projetos de intervenção e
investigação nacionais (FCT) e internacionais (UNICEF). Tem experiência de colaboração com
instituições e pesquisadores em Timor-Leste e no Brasil. Foi Professor Visitante na Universidade do Vale
do Rio dos Sinos - UNISINOS, em São Leopoldo-RS, Brasil (abril a julho de 2013). Foi Coordenador-
adjunto Científico e Pedagógico do Instituto da Língua Portuguesa da Universidade Nacional Timor-
Lorosae, em Timor-Leste (setembro de 2014 a agosto de 2015).
Suzani Cassiani
Licenciada em Ciências Biológicas com Mestrado e Doutorado em Educação pela UNICAMP.
Atualmente é Professora Associada II no Departamento de Metodologia de Ensino da Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC). Atuou na gestão como diretora de ensino da Pró-Reitoria de
Graduação e como coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica
(PPGECT). Também participou de avaliações da Pós-Graduação da área 46 da CAPES. Sua área de
investigação é em Educação em Ciências e Tecnologias, com ênfase na análise do discurso e estudos
CTS, atuando principalmente nos seguintes temas: formação de professores e prática pedagógica,
educação CTS latinoamericana, funcionamento da linguagem e estudos de colonialidade do saber e poder.
É líder do Grupo de Pesquisa Discursos da Ciência e da Tecnologia na Eduação (DICITE) do Programa
de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica. É uma das coordenadoras do Programa de
Qualificação Docente e Ensino de Língua Portuguesa no Timor-Leste (PQLP/CAPES/UFSC), membro
editorial da revista Ensaio (UFMG) e da Ciência e Ensino (Unicamp). Atualmente é membro da Diretoria
da Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências. Realiza pós-doutoramento (Estágio
Sênior) financiado pela CAPES, no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. É bolsista
Produtividade PQ do CNPq – 1D.
284
Vanessa Lessio Diniz
Mestre em Ensino e História de Ciências da Terra (2014), pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP), bacharel e licenciada em Geografia (2011), pela Unicamp. Atuou como bolsista da CAPES
do Programa de Qualificação Docente e Ensino de Língua Portuguesa no Timor-Leste
(PQLP/CAPES/UFSC). Tem experiência na área de Geografia, com ênfase em Ensino de Geografia,
Ensino de Geociências e Educação Ambiental, atuando principalmente nos seguintes temas: metodologia
do ensino de geografia, formação de professores, currículo local, estágio supervisionado, pesquisa
colaborativa e pedagogia crítica do lugar.
Vicente Paulino
Doutor em Estudos de Literatura e Cultura, especialista em Comunicação e Cultura pela Faculdade de
Letras da Universidade de Lisboa e Professor Auxiliar convidado da Universidade Nacional Timor
Lorosa‘e (UNTL), no Departamento da Comunicação Social da Faculdade de Ciências Sociais (FCS-
UNTL). É diretor da Unidade de Produção e Disseminação do Conhecimento do Programa de Pós-
Graduação e Pesquisa da UNTL, pesquisador colaborador do Centro de Estudos de Migração e Relações
Interculturais (CEMRI) da Universidade Aberta de Portugal, membro da Direção da Associação
Iberoamericana de Estudos do Sudeste Asiático e membro do Conselho de Política Científica da
Associação Internacional de Ciências Sociais e Humanas em Língua Portuguesa.
285
Doutor em Estudos de Literatura e Cultura, especialista em
Comunicação e Cultura pela Faculdade de Letras da Universidade de
Lisboa e Professor Auxiliar convidado da Universidade Nacional Timor
Lorosa'e (UNTL), no Departamento da Comunicação Social da
Faculdade de Ciências Sociais (FCS-UNTL). É diretor da Unidade de
Produção e Disseminação do Conhecimento do Programa de Pós-
Graduação e Pesquisa da UNTL, pesquisador colaborador do Centro
de Estudos de Migração e Relações Interculturais (CEMRI) da Universidade Aberta
de Portugal, membro da Direção da Associação Iberoamericana de Estudos do
Sudeste Asiático e membro do Conselho de Política Científica da Associação
Internacional de Ciências Sociais e Humanas em Língua Portuguesa.
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