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DISRITMIAS CARDÍACAS — ASPECTOS CLÍNICOS E TERAPÊUTICOS — REV. MED. — VOL.

66 — N-1:18 a 22 — 1985

DISRITMIAS CARDÍACAS-ASPECTOS
CLÍNICOS E TERAPÊUTICOS
Maria Cecília Solimene*

Disritmia cardíaca, por definição, é qualquer modificação do II. D I S T Ú R B I O S D A C O N D U Ç Ã O D O E S T Í M U L O


ritmo cardíaco, devida a distúrbios na formação e/ou na condução do 1. N o N S A
estímulo. — bloqueio sinoatrial
O reconhecimento e tratamento adequado das disritmias cardía- — bloqueio intra-atrial
cas são muito importantes, pois elas podem precipitar ou agravar a 2. N a junção
insuficiência cardíaca e a insuficiência coronária, levar a quadros de — dissociação átrio-ventricular
baixo débito por redução do fluxo sangüíneo cerebral de até 25 a 4 0 % — bloqueios átrio-ventriculares
e, finalmente, são consideradas como a principal causa de morte Io grau
súbita, e m especial, na fase aguda do infarto do miocárdio. 2o grau (Wenckebach ou Mobitz I e Mobitz II)
As disritmias cardíacas podem decorrer ou não de comprometi- 3o grau ou completo
mento miocárdico. Assim, temos as causas cardíacas, propriamente
ditas, e as não cardíacas: III. DISTÚRBIOS DA FORMAÇÃO E DA CONDUÇÃO DO ESTÍ-
I — C A R D Í A C A S : insuficiência coronária aguda ou crônica; MULO.
miocardiopatias "sensu latu" e, e m nosso meio, a de etiologia chagá- — parassistolia
sica; aneurismas ventriculares; síndromes de pré-excitação decorren- — síndromes de pré-excitação
tes da existência de vias anômalas de condução; prolapso da valva
mitral; cardiopatias congênitas; intoxicações por medicamentos: digi- Serão então abordadas as disritmias mais freqüentemente encon-
tálicos; B-bloqueadores, antiarrítmicos, etc. tradas, quanto aos aspectos clínicos e terapêuticos.
II — N Ã O C A R D Í A C A S . Distúrbios eletrolíticos (em particular
a hipopotassemia), hipoglicemia, tireotoxicose, processos febris, ane- TAQUICARDIA SINUSAL — caracteriza-se por uma freqüência
mia, hipertensão craniana, traumas torácicos e cerebrais, emoções, cardíada acima de 100 por minuto, raramente excedendo 160 por
fumo, café, etc. minuto. Muitas vezes considerada benigna, pode ser o primeiro sinal
A s disritmias cardíacas podem ser classificadas e m três grandes de insuficiência cardíaca, devendo então o paciente ser medicado com
grupos, de acordo c o m sua própria definição: digitálicos e diuréticos. N a insuficiência coronária, agrava o quadro
I. D I S T Ú R B I O S D A F O R M A Ç Ã O D O E S T Í M U L O isquêmico pelo aumento do consumo de oxigênio, devendo ser con-
II. D I S T Ú R B I O S D A C O N D U Ç Ã O D O E S T Í M U L O trolada c o m B-bloqueadores, na ausência de insuficiência cardíaca.
III. D I S T Ú R B I O S D A F O R M A Ç Ã O E D A C O N D U Ç Ã O D O ESTÍ- Quando decorre de processos tóxicos, infecciosos, metabólicos e
alterações endócrinas, deve ser tratada a causa básica.
MULO
Os distúrbios da formação do estímulo ocorrem no nó sinusal B R A D I C A R D I A S I N U S A L — apresenta freqüência cardíaca infe-
(NSA), músculo atrial, nó átrio-ventricular ( N A V ) e músculo ventri- rior a 50 por minuto, porém raramente abaixo de 40 por minuto. E m
cular. Podem ser passivos, ou ritmos de escape, quando decorrem da geral, associa-se à arritmia sinusal, que se define c o m o u m a irregulari-
incapacidade da formação do estímulo do N S À ou então de sua dade do ritmo, onde existe u m a diferença de 0,12 seg. ou mais entre
liberação e ativos, quando resultam do aumento da excitabilidade os ciclos mais curtos e os mais longos. A bradicardia sinusal ocorre
miocárdica. O s distúrbios da condução e da transmissão do estímulo e m atletas, na hipertensão arterial, hipertrofia miocárdica, vagotonia,
ocorrem no N S A , feixes internodais, N A V , feixe de His e seus hipotireóidismo, mas pode decorrer de insuficiência coronária, e m
ramos, rede de Purkinje e miocárdio ventricular. especial nos infartos inferiores agudos e de intoxicações por drogas,
I. D I S T Ú R B I O S D A F O R M A Ç Ã O D O E S T Í M U L O especialmente digitálicos e B-bloqueadores. Freqüentemente, apare-
1. Ritmos sinusais ce na doença do nó sinusal, à qual será feita referência. A bradicardia
— taquicardia sinusal sinusal deve ser tratada c o m atropina ou simipatomiméticos; e m
— bradicardia sinual presença de crises sincopais, dispnéia e precordialgia, pode ser neces-
— arritmia sinusal sário o implante de marcapasso, m e s m o que temporário.
— parada sinusal A parada sinusal ocorre quando há interrupção do ciclo cardíaco
— doença do nó sinusal por falha do N S A , momentânea ou persistente. E m geral, aparece e m
2. Ritmos de escape (passivos) casos de doença do nó sinusal e bloqueio sino-atrial.
— juncionais (e próximos à junção) D O E N Ç A D O N Ó S I N U S A L — esse termo é usado para descre-
— idioventriculares ver u m grupo de estados clínicos nos quais se encontram u m a ou mais
— marcapasso mutável das seguintes características: 1 — bradicardia sinusal persistente e
3. Ritmos ativos severa, 2 — períodos longos de parada sinusal, às vezes sem ritmo de
— extrassístoles supraventriculares e ventriculares escape, 3 — fibrilação atrial crônica c o m freqüência ventricular
— taquicardias paroxísticas supraventriculares e ventriculares baixa; 4 — bloqueio sino-atrial; 5 — bradicardia e taquicardia alterna-
— "flutter" atrial e ventricular das. A causa principal é a coronariopatia obstrutiva, embora possa
— fibrilação atrial e ventricular surgir e m doenças degenerativas. E m geral surge entre os 50 e 70 anos
de idade, mas pode ser encontrada e m jovens; existem desde formas
totalmente assintomáticas até as que apresentam sinais clínicos seve-
ros c o m o tonturas, síncope, dispnéia e precordialgia. Nesses casos,
Médica Assistente do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da graves, é necessário seu tratamento. Distúrbios da condução átrio-
Faculdade de Medicina USP ventricular geralmente se associam à doença do nó sinusal e assim, há
Doutora em Cardiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de quem designe essa síndrome como "doença nodal dupla" O trata-
São Paulo.

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mento medicamentoso é falho, muitas vezes agrava a disritmia e a diuréticos e assim, nos casos de hipopotassemia comprovada, deve
cardioversão elétrica para a fibrilação atrial é insatisfatória, podendo ser administrado cloreto de potássio (45 m E q ) e m solução glicosada,
resultar e m período longo de assistolia. Assim, quando o tratamento é lentamente, intravenoso.
necessário, é feito mediante o implante de marcapasso atrial ( N A V N o infarto do miocárdio, as extrassístoles ventriculares ocorrem
íntegro) ou ventricular (doença binodal). e m aproximadamente 9 5 % dos pacientes nas primeiras 24 horas,
R I T M O S D E E S C A P E — E m vigência de depressão da formação persistindo durante toda a evolução hospitalar e m cerca de 7 0 % .
ou da transmissão do estímulo no N S A . o N A V freqüentemente Alguns tipos de extrassístoles ventriculares foram denominadas pre-
assume a função de marcapasso, sob a forma de u m único batimento monitórias de taquicardia e fibrilação ventricular; tais seriam as
(escape) ou de u m ritmo de comando (ritmo juncional, de freqüência multifocais, pareadas, bigeminadas, trigeminadas e as precoces tipo R
40 a 60 por minuto). Estudos recentes mostram que a configuração da sobre T. Embora se saiba atualmente que não há manifestações
onda P e suas relações de tempo c o m o complexo Q R S dependem não elétricas premonitórias de qualquer disritmia, costuma-se indicar o
só do local de formação do estímulo, c o m o também das propriedades tratamento da extrassistolia ventricular do infarto do miocárdio se a
eletrofisiológicas dos tecidos circunvizinhos. Assim, tendem-se atual- freqüência de batimentos ectópicos for muito elevada, ou se a disrit-
mente a abolir as designações de ritmo nodal (superior, médio, mia for sintomática (dispnéia, precordialgia, sinais de baixo débito). O
inferior), ritmo do seio coronário. ritmo nodal coronário e ritmo de medicamento de eleição é ainda a Íidocaína venosa; nos casos rebel-
átrio esquerdo. Desse m o d o . chamam-se R I T M O S J U N C I O N A I S des, pode ser administrada a procainamida ou amiodarona venosa.
Á T R I O - V E N T R I C U L A R E S . Reconhecem-se. e m geral, por onde P N a insuficiência coronária crônica, nas miocardiopatias "sensu
negativas e m D 2 . D 3 e a V F podendo vir antes (com P R curto) ou latu" ou e m qualquer entidade que se acompanha de extrassistolia
após o complexo Q R S , ou então não serem reconhecidas por estarem ventricular freqüente ou sintomática, podem-se empregar os antiarrít-
englobadas por ele: o complexo Q R S é semelhante ao do ritmo sinusal micos habituais, c o m o manutenção, pela via oral. Tais seriam: quini-
habitual. O antigo ritmo de átrio esquerdo mostraria ondas P negati- dina, procainamida, amiodarona, disopiramida e, nos casos onde não
vas e m V' O s ritmos de escape, por decorrerem de bradicardia haja disfunção ventricular, os B bloqueadores.
sinusal ou de paradas sinusais, desaparecem quando tratada a causa
básica dessas disritmias. Muito freqüentemente, aparecem na intoxi- TAQUICARDIAS SUPRAVENTRICULARES
cação digitálica, e nesses casos pode ser utilizada a difenilhidantoina
para a reversão ao ritmo sinusal. soluções venosas de cloreto de Em geral, a taquicardia supraventricular ocorre em crises paro-
potássio se houver hipotassemia ou, simplesmente, a suspensão do xísticas, ocasionando sensação de desconforto ao paciente, palpita-
digital. O s ritmos juncionais, e m geral, são compatíveis c o m função ções, precipitando ou agravando a insuficiência coronária. Freqüente-
cardiovascular satisfatória; caso não o sejam, deve ser utilizado o mente não se conseguem distinguir eletrocardiograficamente os paro-
marcapasso temporário, até a reversão do quadro. xismos supraventriculares dos ventriculares. Seu diagnóstico é sus-
O s ritmos idioventriculares resultam da incapacidade da junção peitado pela presença de u m ritmo regular rápido (150 a 200 por
e m assumir o comando do automatismo, e m casos de depressão do minuto), c o m número igual de pulsações arteriais e batimentos da
N S A ou bloqueio átrio-ventricular. T ê m freqüência de 40 por minuto ponta. Ocorrem freqüentemente na insuficiência coronária aguda ou
ou menos, são irregulares, incapazes de manter u m débito satisfatório crônica (nestes casos, muitas vezes, sob esforço físico ou emoções),
e assim, e m sua presença, é necessário o tratamento pelo implante de na intoxicação digitálica (talvez pela ativação de marcapassos ectópi-
marcapasso temporário ou definitivo, conforme se consiga ou não cos, m a s freqüentemente por fenômenos de reentrada), nas síndro-
controlar a causa básica. mes de pré-excitação e e m cardiopatias congênitas, c o m o a comunica-
O marcapasso mutável resulta do deslocamento da origem do ção interatrial, a estenose subaórtica hipertrófica e anomalia de
estímulo de u m ponto a outro do N S A ou deste para a junção átrio- Ebstein.
ventricular e vice-versa. H á alterações da onda P caracterizando u m As manobras de estimulação vagai fazem cessar bruscamente o
ou outro ritmo. E m geral, não tem significado clínico; pode aparecer paroxismo; se forem ineficazes inicia se a digitalização venosa rápida.
temporariamente na insuficiência coronária aguda ou preceder a para os casos de insuficiência cardíaca, ou então podem ser utilizados
fibrilação atrial. por via venosa, o verapamil ou a amiodarona ou até o propranolol,
este se não houver disfunção ventricular de base. N a falha desses
EXTRASSÍSTOLES tipos de medicação ou nos casos de comprometimento hemodinâmico
severo, recorre-se à cardioversão elétrica. Para o tratamento prolon-
As extrassístoles supraventriculares são freqüentemente encontra- gado, utilizam-se quinidina, amiodarona ou associações quinidina
das isoladas e m indivíduos normais, particularmente sob tensão emo- digital, por via oral.
cional ou sob o uso excessivo de fumo, álcool e café. Entretanto, Existe u m a forma de taquicardia chamada "juncional não paro-
p o d e m ser sinal de distensão atrial nas valvopatias mitrais ou nas xística", muito grave, e m geral acompanhando a insuficiência cardía-
disfunções miocárdicas, constituindo-se e m sinal de alerta para o ca refratária c o m intoxicação digitálica. Sua freqüência varia de 70 a
tratamento da causa básica. Ocorrem também na insuficiência coro- 125 por minuto, pode ser de difícil diagnóstico pela ausência de ondas
nária e, por fenômenos de re-entrada, podem gerar crises de taquicar- P, e deve ser tratada c o m sais de potássio, procainamida ou difenilhi-
dia paroxísticas ou de fibrilação atrial. Nesses casos, devem ser dantoina; e m casos e m que ocorra na vigência de insuficiência coro-
controladas mediante o uso de antiarrítmicos, c o m o a quinidina e a nária aguda, deve ser tentada a cardioversão elétrica.
amiodarona. Q u a n d o precursoras de insuficiência cardíaca, são facil- A taquicardia atrial c o m bloqueio átrio-ventricular, e m geral de 2"
mente abolidas pelo uso de digital. grau, é freqüentemente encontrada e m casos de intoxicação digitáli-
A s extrassístoles ventriculares ocorrem e m cerca de 5 0 % da ca, quando deve ser interrompida pelo uso de cloreto de potássio e m
população assintomática, havendo u m aumento significativo e m sua solução glicosada, via venosa ou então de difenilhidantoina. Nesses
incidência nas faixas etárias mais avançadas. Admite-se que o indiví- casos, a cardioversão elétrica está contraindicada. Por outro lado, se
duo normal possa apresentar cerca de 50 a 100 batimentos ventricula- surgir e m pacientes que não utilizam digital, este pode ser utilizado na
res, e m geral isolados, e m 24 horas, especialmente e m situações de redução da freqüência ventricular ou pode ser tentada a cardioversão
tensão emocional, esforço físico, consumo de café, fumo, álcool, elétrica, seguida de medicação antiarrítmica profilática (quinidina ou
anorexígenos, etc Qualquer cardiopatia se acompanha de extrassísto- amiodarona).
les ventriculares, m a s sua grande importância se verifica nos casos de
intoxicação digitálica e de insuficiência coronária aguda. N o s casos TAQUICARDIA VENTRICULAR
de intoxicação digitálica, geralmente elas surgem bigeminadas ou
trigeminadas, originam-se de vários focos e freqüentemente geram
episódios curtos ou mantidos de taquicardia ventricular podendo É uma disritmia grave, freqüentemente associada a distúrbios
desencadear a fibrilação ventricular. Nesses casos os pacientes tem hemodinâmicos, c o m queda do débito cardíaco e hipotensão arterial.
seu quadro de disfunção ventricular agravado e o tratamento deve ser Pode ocorrer e m distúrbios eletrolíticos, miocardites graves e cardio-
imediato, pelo uso intravenoso de íidocaína ou difenilhidantoina e, miopatias primárias, porém as principais causas são a intoxicação
nos casos rebeldes, de procainamida. Deve ser lembrado que tais digitálica e o infarto agudo do miocárdio. A o eletroardiograma, obser-
pacientes, e m geral, se encontram espoliados e m potássio, pelo uso de va-se u m ritmo ligeiramente irregular, c o m freqüência e m geral maior

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S.L. 17a. fam. br. bras. Diagni CIA op. FIBRILAÇÃO ATRIAL

8/12/78 3:30 hs. Monitor


E disritmia freqüente na valvopatia mitral reumática (especial-
mente na estenosa mitral), na doença obstrutiva coronária e na
evolução tardia das cardiomiopatias congestivas. Pode surgir e m
paroxismos ou ser persistentes; ocorre também, e m surtos, no prolap-
so valvar mitral, nas síndromes de pré-excitação e na tireotoxicose.
E m geral a freqüência atrial é 450 a 600 por minuto e a resposta
ventricular é irregular (R-R variável). Quando a freqüência ventricu-
lar é rápida, surgem a fadiga, sinais de insuficiência cardíaca, dor
precordial, tonturas e outros sinais de insuficiência vascular cerebral.
N o infarto do miocárdio ela costuma surgir nos casos de necroses
miocárdicas extensas, c o m comprometimento do N S A e d a junção. O
melhor tratamento seria a cardioversão elétrica, quando a disritmia é
de início recente (menos de seis meses), pode também ser tentada a
associação de quinidina e digital, antes da cardioversão. N o s casos
crônicos, c o m cardiomegalia e átrio esquerdo gigante, seria mais
conveniente controlar a freqüência ventricular c o m o uso de digital e
quinidina ou amiodarona.
8/12/7B 15:00 hs Dl longo 8/12/78 15:00 hs. Cateter esofágico

DISSOCIAÇÃO ÁTRIO-VENTRICULAR
Nesse tipo de disritmia não existe um verdadeiro bloqueio na
condução átrio-ventricular; os átrios e ventrículos batem independen-
temente, controlados por marcapassos diferentes ( N S A — átrio,
8/12/78 18:10 hs. Monitor
junção — ventrículo); e m geral o ritmo ventricular é mais rápido;
p o d e m ocorrer "capturas" ou seja, eventualmente o estímulo sinusal
penetra o N A V e alcança os ventrículos. Essa distrimia é c o m u m no
infarto do miocárdio de parede inferior e, e m geral, é autolimitada,
sem repercurssões clínicas para o paciente; nesses casos, atribui-se à
hiperatividade simpática e parassimpática concomitantes. Ocorre
também na intoxicação digitálica; nessa eventualidade, apenas sus-
pende-se o digital ou pode se utilizar a atropina venosa; se houver
comprometimento importante da função cardiovascular, pode ser
necessário o uso de marcapasso, m e s m o que temporário.

Fig. 2 — Taquicardia paroxística supraventricular. A derivação esofágica


mostra condução 2:1.
que 100 por minuto (podendo ser 60 ou até 200 por minuto), havendo
complexos Q R S alargados, deformados, não precedidos por ondas P
A taquicardia ventricular surge e m 6 5 % dos casos de infarto do
miocárdio nas primeiras 24 horas, e m surtos autolimitados ou manti-
dos; as crises autolimitadas p o d e m não ser percebidas pelo paciente e
apenas são diagnosticadas pela monitorização eletrocardiográfica
contínua. O s surtos mantidos são, e m geral, acompanhados de mal
estar, baixo débito, dispnéia ou dor precordial e necessitam tratamen-
to imediato. O tratamento de escolha é a cardioversão elétrica,
seguida de medicação profilática. Entretanto, especialmente nos ca-
sos de intoxicação digitálica, onde se contraindica a conversão elétri-
ca, pode ser usada a Íidocaína ou a procainamida ou m e s m o a
difenilhidantoina, todas pela via venosa. N a ausência de disfunção
ventricular, pode ser utilizado o propranolol venoso.

FLUTTER ATRIAL
É uma disritmia pouco freqüente, quase sempre associada a uma
cardiopatia orgânica e pouco freqüente e m indivíduos normais. Ca-
racteriza-se por u m ritmo rápido, regular, c o m freqüência atrial de 300
por minuto e ventricular de 150 por minuto; e m geral, existe u m
bloqueio 2:1. Deve ser feito diagnóstico diferencial c o m taquicardia Fig. 3 — Flutter e Fibrilação Ventricular. Traçados obtidos pelo sistema
paroxística supraventricular e, às vezes, c o m a própria fibrilação Holter, de duas derivações. O 1o traçado mostra taquicardia ventricular,
atrial. Freqüentemente, quando a distinção não é possível, a disritmia que origina flutter ventricular (2o traçado) e este, fibrilação ventricular (3o
é chamada fibrilo-fluiter. E m geral, agrava ou precipita a insuficiência traçado).
cardíaca e a insuficiência coronária. O uso de digital venoso é
benéfico para diminuir a freqüência ventricular, por retardar a condu- BLOQUEIOS ÁTRIO-VENTRICULARES
ção átrio-ventricular. O tratamento mais efetivo é a cardioversão
elétrica, seguida de medicação profilática de manutenção (quinidina Caracterizam-se por uma dificuldade na condução do estímulo
ou amiodarona). E m casos crônicos, rebeldes a qualquer terapia, sinusal para alcançar os ventrículos, através do sistema de condução
pode ser utilizada a estimulação atrial por marcapasso c o m freqüência átrio-ventricular. O bloqueio átrio-ventricular pode ser de três graus:
muito rápida; às vezes, isso transforma o flutter e m fibrilação atrial, e Io, c o m apenas aumento do tempo de condução átrio-ventricular,
então a freqüência ventricular é melhor controlada pelo uso de digital. mostrando aumento do intervalo P R ; 2o, c o m aumento progressivo do

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tempo de condução pelo N A V até o bloqueio (Wenckebach ou Mobitz PARASSISTOLIA V E N T R I C U L A R


I) ou bloqueios regulares 2:1, 3:1, etc. e P R constante (Mobitz II); 3o,
quando o estímulo sinusal não alcançar os ventrículos (bloqueio átrio- É uma disritma complexa, onde a freqüência dos batimentos
ventricular total); as ondas P são regulares, mas os complexos Q R S ventriculares mostra u m "mínimo múltiplo c o m u m " e não há acopla-
são largos, aberrantes, de freqüência baixa, mostrando a ativação por mento fixo c o m o complexo Q R S prévio; ainda não b e m esclarecida,
u m segmento hissiano baixo. O s bloqueios átrio-ventriculares podem parece depender da existência de u m foco automático, hissiano, que
ser congênitos (quando e m geral o ritmo juncional comanda os se manifesta ou não dependendo do grau de bloqueio do tecido
ventrículos e é compatível c o m manutenção de débito adequado) ou adjacente.
decorrer de miocardiopatias (chagásica, e m nosso meio), da doença
binodal, da intoxicação digitálica ou da doença coronária aguda
SÍNDROMES D E PRE-EXCITAÇAO
(infarto do miocárdio). As formas de Io grau e 2o grau Mobitz I, e m
geral, não necessitam tratamento. A s demais ou os bloqueios evoluti-
São disritmias de diagnóstico apenas eletrocardiográfico, carac-
vos ou sintomáticos (sintomas cerebrais, dispnéia, precordialgia) são
terizadas pela presença de feixes anômalos de condução. Clinicamen-
tratados mediante a implantação de marcapasso. Se a causa do
te, exteriorizam-se pela ocorrência de crise de taquicardia paroxísti-
bloqueio não for reversível, a implantação do marcapasso é defini-
ca, e m geral supraventriculares, que devem ser controladas da manei-
tiva. ra já descrita; se muito freqüentes, deve ser utilizada a manutenção de
antiarrítmico por via oral, como a quinidina ou amiodarona.
As mais comuns são: síndrome de Wolff Parkinson White (PR
curto 0,12s, ritmo sinusal, Q R S alargado por onda delta) e síndrome
G.P.C. *6». masc. br.
de Lown-Gagnon-Levine (PR curto apenas). N a primeira, conforme a
localização do feixe de Kent (via anômala), teremos duas variedades:
a) c o m onda delta positiva e m Vi a V 4 e negativa e m Dl a V L e b )
onda delta negativa e m V ^ a V 4 positiva e m Dl e a V L . A aberrância
do Q R S é tipo bloqueio de ramo direito na variedade A e tipo bloqueio
de ramo esquerdo na variedade B.

MEDICAMENTOS ANTIARRÍMICOS MAIS UTILIZADOS

1 — Quinidina — diminui a excitabilidade, condutibilidade e


automaticidade das células atriais e do sistema His-Purkinje, havendo
pouca ação no N A V , e m doses terapêuticas.
A via de administração pode ser oral ou intramuscular, não se
utilizando a via venosa, devido à possibilidade de hipotensão e
choque. Para a reversão da fibrilação atrial, utilizam-se 200 mg, via
vi oral, cada quatro horas, até a dose total de 2g. C o m o tratamento de
manutenção, utilizam-se 200 m g cada seis horas. A administração
intramuscular (800 mg) costuma acompanhar a cardioversão elétrica
das taqufarritmias supraventriculares.
2 — Procainamida — ação semelhante à quinidina, utiliza-se
especialmente no controle de disritmias ventriculares. Pode ser admi-
nistrada pela via venosa, na dose de 100 a 250 mg, lentamente, cada
VI cinco minutos, até a dose total de 1 g ou o controle da disritmia; a
seguir, pode-se manter infusão contínua e m solução glicosada, no
máximo 50 mg/minuto. A via oral é utilizada como terapêutica de
manutenção, 300 a 600 m g cada quatro horas.
Fig. 1 — Bloqueio átrio-ventricular de 2o grau — Mobitz II (1o e 2° traçados). 3 — Disopiramida — ação e indicações semelhantes à quinidina e
Implantado marcapasso (3o traçado). procainamida. E m nosso meio existe apenas o produto para a admi-
nistração oral, que se faz c o m 100 a 200 mg, cada oito ou seis horas.
4 — Amiodarona — diminui a velocidade de condução e a
BLOQUEIOS DE R A M O excitabilidade celular no N S A , fibras atriais, N A V e fibras ventricula-
res, c o m menor ação no sistema His-Purkinje. Notadamente, deprime
São os distúrbios da condução intraventricular do estímulo, em a condução nas vias anômalas, sendo a droga de eleição no controle
geral localizados a partir da bifurcação do feixe de His. C o m o regra, das taquicardias paroxísticas das síndromes de pré-excitação. N a
tais distúrbios são reconhecidos através de aumento da duração dos reversão de taquiarritmias, utiliza-se a via venosa, 5mg/kg, gota a
gota, diluída e m 50 ml de solução glicosada, e m dez minutos; pode-se
complexos Q R S ( 0,12s); devem-se à ativação assíncrona dos ventrí-
repetir na dose de 2,5 mg/kg, a seguir. Nos pacientes e m que se deseja
culos, sendo a área bloqueada ativada tardiamente, por via muscular.
a obtenção de níveis terapêuticos rapidamente, pode-se iniciar o
Podem ser isolados (bloqueio completo do ramo direito, bloqueio tratamento da disritmia, ou seguir ao esquema acima descrito, do
completo do ramo esquerdo, bloqueios divisionais ântero-superior, seguinte modo: 600 a 1500 m g e m 24 horas, diluída e m solução
ântero mediai e póstero inferior) ou associados. São achados comuns glicosada, concomitantemente com uso oral de 600 a 800 mg/dia. A
nas miocardiopatias (chagásica, e m nosso meio), na evolução tardia manutenção pela via oral se faz com 100 a 600 m g diários, fracionan-
da cardiopatia hipertensiva e na doença arterial coronária. Podem do-se as doses maiores que 200 mg.
ocorrer após cirurgia cardíaca, especialmente após a correção da 5 — Lidocaina — Aumenta a velocidade de condução e diminui o
comunicação interventricular. N o infarto agudo do miocárdio, seu automatismo celular, especialmente no sistema His-Purkinje. E m
aparecimento indica grande extensão da necrose e deve ser instalado doses habituais, não deve deprimir a condução átrio-ventricular n e m
o automatismo sinusal. Utiliza-se no controle das disritmias ventricu-
o marcapasso temporário, até a estabilização do quadro; teme-se
lares. A administração é pela via venosa, no seguinte esquema: 1 —
nesses casos, a instalação abrupta de u m bloqueio atno-ventricular
200 mg, divididos e m duas doses de 100 mg, c o m intervalo de 15
total, incompatível c o m débito adequado nesses pacientes e m geral minutos; 2 — infusão contínua, por 24 horas, e m solução glicosada, 2
c o m disfunção ventricular pela destruição miocárdica. O s bloqueios a 4 mg/min.
crônicos não necessitam tratamento; nos casos e m que se faz necessá- 6 — Difenilhidantoina — a ação é semelhante à lidocaina; parece
rio o uso de digitálicos e/ou antiarrítmicos e essas drogas pioram ainda acelerar a condução átrio-ventricular. Utiliza-se para o controle das
mais a condução intraventicular, também está indicado o marcapasso disritmias ventriculares e daquelas decorrentes de intoxicação digitá-
definitivo. lica. A administração é venosa, 50 a 100 m g cada cinco minutos, até a

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DISRITMIAS CARDÍACAS — ASPECTOS CLÍNICOS E TERAPÊUTICOS — REV. MED. — VOL. 66 — N° 1:18 a 22 - 1985

dose total de 1 g ou a reversão da disritmia; a manutenção é por 300 a RESUMO


400 m g e m solução fisiológica, por 24 horas. A via oral é pouco usada,
recomendando-se, se necessário, a dose de 1 g no Io dia, 500 a 600 m g São estudadas as formas mais comuns de disritmias cardíacas,
nos 2 o e 3o dias e 400 m g diários a seguir. sob o ponto de vista eletrocardiográfico e clínico, dando-se ênfase aos
7 — Atropina — utiliza-se no controle das bradiarritmias sintomá- aspectos mais importantes da terapêutica. São considerados também
ticas, na dose venosa ou sublingual, de 0,25 a 2 m g , cada quatro horas. os medicamentos antiarrítmicos mais utilizados na prática habitual.
Acelera o automatismo sinusal e a condução átrio-ventricular.
8 — Verapamil — pouco efetivo nas disritmias ventriculares, é SUMMARY
utilizado no controle das crises de taquicardia supraventricular, flut-
ter e às vezes fibrilação atrial, por aumentar o período refratário do It were studied the most usual forms of cardiac dysrhythmias on
N A V e assim, bloquear a condução a esse nível. E m geral, consegue- clinicai and electrophysiological aspects; emphaysys is done on the
se a reversão das taquicardias paroxísticas ao ritmo sinusal, m a s nos most important therapeutic goals. It were considered also the c o m m o -
casos de flutter e fibrilação atrial há apenas diminuição da resposta nest employed antiarrhythmic drugs.
ventricular. A dose é 20 a 40 m g , venosa, lenta ou até o gotejamento
contínuo e m solução glicosada, de 0,01 a 0,05 mg/kg/minuto. N a REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
manutenção pela via oral, utilizam-se 120 a 480 m g diários.
1. Benchimol, A. B.; Benchimol, C. B.; Ginefra, P. & Schlesinger, P. —
9 — Propranolol — é u m bloqueador c o m ação de m e m b r a n a
Arritmias cardíacas: clínica e terapêutica. In: Benchimol, A. B. & Schle-
semelhante à quinidina. Sua principal utilização c o m o antiarrítmico
singer, P — Enciclopédia Médica Brasileira, Cardiologia, Rio de Janei-
ocorre quando não se consegue diminuir a resposta ventricular de
ro, Livro Médico Editora, 1978, V-1.
pacientes c o m fibrilação atrial, já digitalizados, ou então nas taquiar-
2. César, L. A. M.; Martins, J. R. M. & Raineri, A. M. O. — Aspectos
ritmias da tireotoxicose. Usa-se t a m b é m nas disritmias ventriculares e
terapêuticos das arritmias cardíacas. Rev. bras. Med. (Cardiologia) 1:
supraventriculares dos casos de prolapso valvar mitral; na síndrome
15, 1982.
d o Q T longo é a droga de escolha. Utiliza-se a via venosa, a
3. Pileggi, F. & Ramires, J. A. F. — Farmacodinâmica das drogas antiarrítmi-
0,lmg/Kg, injetando-se lmg cada cinco minutos, c o m controle eletro-
cas. In: Benchimol, A. B. & Schlesinger, P. — Enciclopédia Médica
cardiográfico e de pressão arterial. Por via oral, é utilizado na dose de
Brasileira, Cardiologia, Rio de Janeiro, Livro Médico Editora, 1978, V-1.
40 a 160 mg/dia. É contra indicado e m qualquer caso de insuficiência
4. Scarpa, W. J. — The sick sinus syndrome. Am. Heart J. 92. 648, 1976.
cardíaca descompensada, podendo ser utilizado e m pequenas doses
5. Solimene, M. C. — Disritmias ventriculares no infarto agudo do miocár-
e m pacientes sob o uso de digital e diuréticos. É contra indicado nos
dio. Estudo e m diferentes períodos da fase hospitalar. Tese de Doutora-
bloqueios átrio-ventriculares de alto grau.
mento apresentada à Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo, 1982.

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