145 - Taquicardias Ventriculares
145 - Taquicardias Ventriculares
145 - Taquicardias Ventriculares
As arritmias cardíacas podem ser sumariamente definidas como ritmos cardíacos diferen-
tes do ritmo sinusal. Paul Marino comparou as arritmias agudas aos fenômenos devastadores da
natureza, pois, elas surgem repentinamente, criam alguns desastres e desaparecem tão inespera-
damente quanto surgiram. Os motivos que geram as arritmias em anestesia são os mais diversos
como hipovolemia, distúrbios hidroeletrolíticos, dor, drogas, interações farmacológicas, ansieda-
de, etc.
A monitorização cardíaca rotineira nas salas de cirurgia tornou mais freqüente à identificação
dessa alteração no cotidiano do anestesiologista. Hoje, o tratamento das taquiarritmias tornou-se
parte integrante da prática anestésica.
Durante um procedimento anestésico não é necessário saber todos os detalhes e pormenores
de uma arritmia aguda, porém cabe ao anestesiologista saber identificar o ritmo cardíaco e estabi-
lizar o paciente sempre que possível.
* Título Superior em Anestesiologia conferido pela SBA; Especialista em Docência para o Ensino Superior conferido pelo
Centro de Ensino Superor de Maceió; Tutor da Liga de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva de Alagoas; anestesista da
Unidade de Emergência Armando Lages em Maceió e do Hospital Escola Doutor José Carneiro, médico intensivista da
Clínica Santa Juliana em Maceió.
A diminuição do DC leva a hipoperfusão generalizada. Quando a perfusão cerebral diminui
ocorre tontura, pré-síncope e síncope. Quando a perfusão coronariana diminui o paciente apresen-
ta angina de peito, infarto agudo do miocárdio e dispnéia. Com a perfusão periférica diminuída
temos astenia e fadiga. A taquicardia por si só já leva ao aumento do consumo miocárdio de oxigê-
nio e a diminuição da oferta de oxigênio ao órgão, propiciando condições favoráveis aos eventos
isquêmicos coronarianos.
O aumento da PCP origina um quadro de congestão pulmonar com dispnéia e até
edema agudo de pulmão. Esse aumento pode ainda prejudicar o enchimento do ventrículo
esquerdo e diminuir ainda mais o débito cardíaco perpetuando o quadro de hipoperfusão
generalizada.
Classificação
O coração trabalha fisiologicamente numa faixa entre 60 e 100 batimentos por minuto (bpm).
Quando a FC se torna maior do que 100 bpm a chamamos de taquicardia.
As taquicardias podem ocorrer por três mecanismos: automaticidade aumentada, atividade
deflagrada ou por reentrada. A reentrada é a causa mais comum nos pacientes que são clinicamente
significantes.
A reentrada ocorre quando o impulso elétrico segue por uma área onde existe um bloqueio
Medicina Perioperatória
unidirecional o qual propaga o impulso por uma via alternativa. Essa via apresenta condução lenta
e faz o impulso retornar a área comprometida já sem o bloqueio unidirecional. O impulso volta a
seguir pela via alternativa e repete o processo. A reentrada pode ocorrer em qualquer local do
coração.
As taquiarritmias são classificadas de acordo com sítio gerador do impulso em relação ao
sistema de condução atrioventricular (AV). As taquicardias supraventriculares (TSV) se originam
acima do sistema de condução AV e apresentam um complexo QRS com morfologia normal e
estreita. As taquicardias ventriculares (TV) se originam abaixo do sistema de condução AV e pos-
suem um complexo QRS com duração maior do que 0,12 segundos, ou seja, é um complexo com
morfologia alargada. Tanto a TSV como a TV podem ser novamente subdivididas de acordo com
a sua regularidade do intervalo RR. Veja a figura 1 para melhor compreensão.
Taquicardia Ventricular
A figura I mostra que a FC maior do que 100 bpm e a presença do complexo QRS alargado
ocorrem tanto na TV como na TSV com condução aberrante. Os critérios eletrocardiográficos
detalhados ajudam a fazer o diagnóstico diferencial entre essas duas arritmias, porém podem não
ser necessários já que em cerca de 95% das taquicardias com complexo QRS alargado em pacien-
tes com doença cardíaca de base são TV. Alguns critérios mais simples ajudam e devem ser obser-
vados para confirmar o diagnóstico, como: a marcante irregularidade que ocorre na TSV e a pre-
sença de batimentos em fusão e a dissociação atrioventricular que aparecem na TV. Os batimentos
em fusão são complexos QRS com morfologia entre o normal e o bizarro. Um batimento em fusão
é evidência de atividade ectópica ventricular.
As duas principais causas de TV em nosso meio são a doença coronariana e a cardiopatia
chagásica.
O tratamento agudo de uma taquicardia ventricular deve seguir alguns passos, Observe a
1232 figura II para melhor compreensão.
Figura I - Esquema diagnóstico para identificação das taquicardias. FC – freqüência cardíaca,
TSV – taquicardia supraventricular, TV – taquicardia ventricular, TSVca – taquicardia supraventricular
com condução aberrante, WPW – síndrome de Wolf-Parkinson-White, FAca – fibrilação atrial
com condução aberrante e TP – Torsade de Pointes.
Quando a TV ocorre sem instabilidade hemodinâmica deve-se optar pelo uso de antiarrítmicos.
Os mais usados são: lidocaina, procainamida, magnésio e amiodarona.
A lidocaina é uma anestésico local que suprime a atividade elétrica dos tecidos arritmogênicos
com pouca atividade em tecido normal. Em infusões prolongadas pode causar uma síndrome
neuroléptica excitatória, por isso é recomendável usar por períodos menores que 12 horas. A dose
de ataque venosa é de 1 a 3 mg.kg-1 e a manutenção é de 1 a 4 mg.min-1.
A procainamida converte tanto uma TV quanto uma TSV. Sua ação bloqueadora ganglionar reduz
a resistência vascular periférica e leva a hipotensão arterial, mormente quando a infusão é rápida ou
quando o paciente apresenta grave disfunção ventricular esquerda. Seu metabólito, N-acetilprocainamida,
foi implicado na torsade de pointes. É administrada sem bolo e em infusão venosa de 25 mg.min-1 até um
total de 17 mg.kg-1. Se a duração do QRS aumentar a droga deve ser suspensa.
O magnésio é efetivo em pacientes refratários a lidocaina e reverte tanto a TV como a TSV.
A depleção de magnésio está presente em grande parte dos pacientes das unidades de terapia
intensiva cirúrgicas e é considerado como fator que contribui positivamente para aumento da mor-
talidade. A dose de ataque venosa é de 2g e a manutenção é de 1g.h-1 por 6 horas.
A amiodarona age tanto nas arritmias supraventriculares como nas ventricualres, pois, blo-
queia receptor alfa e beta adrenérgico, inibe o canal da cálcio, bloqueia o canal de postássio e
combina-se com canais de sódio inativados. O efeito emediato por via venosa é o de aumentar o
intervalo PR sem alterar o complexo QRS. A dose de ataque é de 5 a 10 mg.kg-1 seguida de infusão
venosa para manutenção do efeito terapêutico. Quando infundida rapidamente pode causar
hipotensão arterial sistêmica e bradicardia.
A TV sem pulso é um ritmo de parada cardiorespiratória (PCR). Observando a figura II
percebemos que pedir ajuda aparece como segundo ponto. Alguns estudos já demonstraram que
1234 na PCR presenciada nos primeiros cinco minutos não há diferença na taxa de sobrevivência entre
pedir ajuda primeiro ou iniciar as manobras de reanimação primeiro. Como nem sempre o
desfibrilador está disponível na sala de cirurgia a figura II mostra como primeiro passo iniciar as
manobras de reanimação.
Fazer massagem cardíaca é o mesmo que gerar fluxo sanguíneo para os órgãos nobres.
Quando a massagem é executada corretamente o fluxo sanguíneo cerebral é mantido entre
50% e 90% do normal, a perfusão miocárdica fica entre 20% a 50% do normal e o fluxo
sanguíneo visceral e para as extremidades inferiores é reduzido a 5% do normal. Antes da
publicação do último consenso se perdia em média 50% do tempo da reanimação sem execu-
ção da massagem.
A relação entre a massagem cardíaca e a ventilação sofreu uma modificação que beneficiou as
compressões torácicas. No paciente adulto com 1 ou 2 socorristas a relação é de 30:2. No lactente e
na criança maior com 1 socorrista a relação é também de 30:2. No lactente e na criança maior com 2
socorristas a relação passa a ser de 15:2. Após a garantia das vias aéreas a compressão passa a ser
ininterrupta e a ventilação se faz a cada 6 a 8 segundos. É recomendável que a cada 2 minutos os
A figura I um mostra que a FC maior do que 100 bpm com complexo QRS alargado e
intervalo RR regular também é forma de apresentação eletrocardiográfica da TSVca. A estimulação 1235
vagal ajuda no diagnóstico diferencial já que isso evidencia a presença das ondas P. Se o pacien-
te estiver com instabilidade hemodinâmica deve-se fazer CES, mas se não houver colapso e a
arritmia não reverter com a manobra de estimulação vagal deve-se fazer adenosina na dose
venosa de 6 mg em bolo. Se uma dose de adenisina não reverter pode-se repetir a droga do-
brando-se a dose.
Wolf-Parkinson-White
forma corriqueira, porém a atrial ocorre no sentido caudocranial. O ECG mostra uma TSV regular.
A taquicardia antidrômica ocorre em 10% dos pacientes com ativação ventricular ocorrendo
pela via anômala. Os complexos QRS são alargados e o intervalo RR é regular.
O tratamento para instabilidade hemodinâmica é a CES inicialmente com 50 J. Se não
houver comprometimento cardiovascular a primeira medida é fazer manobra vagal. Caso a
reversão não ocorra com manobra vagal deve-se optar pela adenosina, pelo verapamil ou pela
amiodarona.
A freqüência cardíaca é maior do que 100 bpm, o complexo QRS é alargado, mas o interva-
lo RR é marcadamente irregular.
O tratamento é feito como habitualmente se faz quando ela é classificada como uma TSV. Na
sua forma aguda e com instabilidade hemodinâmica deves fazer CES com 100 J inicialmente. Se
não houver instabilidade então procura-se controlar a FC para a seguir realizar a reversão química.
Torsades de Pointes
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