quarta-feira, 25 de março de 2020

FILME: ATRAÇÃO DE RISCO

ENTREVISTA: RENATO SIQUEIRA DIRETOR DO LONGA: ”ATRAÇÃO DE RISCO”

Prepare-se para um interessante bate-papo com Renato Siqueira, um profissional que ostenta a bandeira e luta diariamente pelo cenário independente do país. Diretor, roteirista, produtor, montador, ator e especialista em efeitos especiais, também é professor de atuação no SENAC. 
Nascido em São Paulo nos anos 80, se formou em radialismo e teatro. Desde os seus 14 anos de idade, se prova um amante de cinema, dedicando a sua carreira em diferentes vertentes e acumulando mais de 30 obras ficcionais.
Além de diversas participações na TV, recebeu indicações em diversos festivais de cinema com o seu filme de estréia, no qual se tornou o primeiro longa-metragem de terror sobre possessões a ter lançamento mundial para 86 países via NETFLIX. A sua jornada com Diário de um Exorcista – ZERO se tornou inspiração para produtores nacionais e internacionais. 
Recebam agora o grande Renato Siqueira! Agradeço aqui o tempo cedido pelo cineasta. Seja bem-vindo ao espaço do Cinem(Ação).
Dito quem é o “Renato’’, nos apresente Atração de Risco e fale um pouco do que se trata o seu Longa.
Renato Siqueira: Trata-se de um thriller de suspense, recheado de segredos, mistérios e reviravoltas, com toques de terror psicológico que mistura estilo o “psicopata” com “stalker”. 
É um prazer saber que somos os primeiros a entrevistá-lo! E estamos aqui falando de um filme 100% independente ou que contou com alguma lei de incentivo?
Renato Siqueira: Eu sempre trabalhei com investimento privado, seja com o dinheiro do meu bolso, ou com empresas e parceiros que invistam no cinema, portanto, meus filmes são até agora 100% independentes. Eu não sou de forma alguma contra as leis audiovisuais, só acho que elas não funcionam como deveriam funcionar. Essas “leis” pregam em ajudar quem precisa, mas não é isso que acontece. Nós sabemos que essas “leis” só beneficiam uma classe, que eu a costumo chamar de “elite”. Essa “elite” monopoliza todo o dinheiro público designado para os projetos e também a publicidade da forma que deseja. Se o seu filme não tiver rostos conhecidos, ou um diretor contratado de certas “empresas”, então, o mercado se fecha para você. Não vou mentir, eu fui atrás de órgãos públicos para tentar ganhar algum incentivo, mas devido a burocracia no processo de seleção, captação e outros problemas, evitei novamente a recorrer a essa ilusão. Eu espero que tudo seja reformulado e as leis funcionem e beneficiem quem realmente precisa, que a repartição seja justa para todos.
Entendo perfeitamente. Queria registrar aqui o meu agradecimento pela oportunidade de entrevistá-lo novamente, viu? Tive a honra de bater esse papo quando o Diário de um Exorcista – ZERO chegou no NETFLIX e já gostaria de perguntar: o cenário nacional melhorou ou piorou de lá pra cá? 
Renato Siqueira: Eu que trabalho focado no empreendedorismo, está muito melhor, pois acredito que o cinema está passando por um ciclo de mudanças que para alguns “chorões” isso não é bom. Para mim é extremamente maravilhoso, porque vejo um cinema nacional mais forte, com opções tanto na parte privada, quanto na pública. Uma se torna extensão da outra, trabalhando juntas, fortalecendo e dividindo os incentivos para arte e cultura. Pensa comigo, no atual momento de todas as mudanças no cenário cinematográfico brasileiro, com a escassez de conteúdos novos, as produtoras, distribuidoras e investidores no geral, ficam sem opções para ofertar conteúdos novos, e o que acontece? Nesse momento o investimento privado torna-se essencial, sem estar vinculado ou dependente de financiamentos públicos, ou seja, essas empresas investem em seus produtos ou abrem falência. As que trabalham sério, continuaram no mercado, porque não sobrevive somente do governo, e assim o mercado se recicla, ficando só a coisa boa, surgindo uma nova leva de investidores, que vão investir sem medo no cinema, porque terão um bom retorno financeiro. E essa maravilha já está acontecendo bem diante dos nossos olhos. 
Se me permite, quanto tempo demorou para vocês terem alcançado o ápice do projeto, desde a pré-produção até a pós?
Renato Siqueira: Foram 2 meses de gravação e 10 meses de pós-produção. Foi uma longa jornada, aproximadamente 1 ano de noites em claro, longe da minha família. Só eu, Deus e a minha ilha de edição. Porque para mim, se não tiver sacrifício, não á ganho, não há vitória. 
Eu citei o Diário de um Exorcista – ZERO porque foi um grande marco para o cinema independente, mas como você disse, Atração de Risco não tem demônios e nem possessões. Trocaram os espíritos por um belo suspense. O que te fez mudar a pegada do horror macabro e explorar o thriller psicológico ?
Renato Siqueira: Eu sempre gosto de dizer que eu não sou o cara do terror, sou eclético. Gosto de mudar e me adaptar, mas não posso negar que tenho muito apreço pelo terror e pelo suspense. Não tenho uma regra, de repente posso escrever um drama, uma comédia, sei lá, depende do meu estado de espírito. 
E essa diversidade em suas obras, essa busca por mostrar domínio cinematográfico, você acredita que vai circundar todos os subgêneros do terror ou acabar ultrapassando esses limites e talvez um dia produzir um romance ou um material de ação desenfreada?
Renato Siqueira: Como disse, sou bastante eclético, depende do meu estado de espírito, mas vou revelar um segredo. Meu gênero favorito é o suspense e sabe porque? Porque dentro do espaço fílmico desse gênero, eu consigo transmitir com mais facilidade a sensação de pavor que o nosso cérebro desencadeia quando estamos com medo. Sabe aquele frio na espinha que nos arrepia? É, eu gosto de mexer com isso, acho fascinante… E porque eu estou dizendo isso? Primeiro, porque essa é a minha forma de trabalhar, antes de começar a roteirizar uma história, eu me insiro nela, criando uma metalinguagem direta ou indireta. Direta é quando quero que o público saiba que muita coisa que aconteceu no filme, realmente aconteceu em “partes”, na minha vida. Indireta é quando não quero que isso seja perceptível ao público, mas as sensações, os medos e pânicos que vivi nessa vida, sempre estarão lá, presentes nas minhas obras. Essa é minha assinatura. Transformar meus pesadelos e acontecimentos da minha vida, em material orgânico para sétima arte. Dessa forma, eu me sinto livre para me entregar de corpo e alma ao trabalho. Eu sempre digo isso, quer me conhecer? Assista e decifre meus filmes. 
Renato, você sempre atuou em seus filmes? De onde surgiu essa vontade? Pois hoje eu sou roteirista, louco pra dirigir, mas não quero atuar de jeito nenhum. Nos conte um pouco sobre essa trajetória.
Renato Siqueira: Essa história de atuar é complicado, daria uma entrevista bem longa (risos). Eu sempre tive vontade de atuar para o cinema, e como fazia filmes desde os 14 anos e atuava neles. Gostei tanto que quis estudar. Entrei nas artes dramáticas, comecei teatro, estudei, ganhei alguns prêmios e foi isso. Quando fui para publicidade e cinema, eu percebi que não sabia nada, porque é uma linguagem totalmente diferente. Eu parei e pensei “pô, o que os profissionais em um set de filmagem querem do ator?”. Para que eu pudesse ter o conforto de estar em cena. Aí eu comecei estudar tudo. Mas você sabe que quando sai de qualquer faculdade você sabe um pouco disso, um pouco daquilo, mas isso eu não queria. Como eu estava naquela base de conquistar uma atuação verdadeira diante da câmera, de me sentir confortável, eu comecei a estudar mesmo. Me formei como câmera. Como diretor de fotografia. Como diretor artístico. Montador. Efeitos visuais e quando vi que tinha um grande currículo, fui trabalhar em novelas. Mas eu encontrava grandes erros, via câmeras quebrando o eixo. Via várias coisas erradas de profissionais. E me veio o estalo, “vou fazer os meus próprios filmes”. E comecei e não parei mais, porque me apaixonei e tinha toda uma bagagem para isso. Não precisava de nenhum profissional para fazer, porque eu fazia tudo.
Vejo que a produção de Atração de Risco está em um nível ainda mais alto e conta com grandes nomes no casting. Você diria que o Diário de um Exorcista – ZERO abriu muitas portas para você?
Renato Siqueira: Sem dúvidas as portas se abriram. Após o lançamento do “Diário de um Exorcista”, eu e meu parceiro, meu braço direito, Beto Perocini, ganhamos uma certa confiança no mercado. Sempre fazendo propostas de produzir com pouco, mas fazendo com qualidade. Com essa visão, estamos avançando e recebendo outras propostas para produzir longas nesse mesmo formato. Eu sempre digo, se me derem uma verba de 5 milhões para produzir um longa, eu faço com esse dinheiro 6 longas com extrema qualidade. Uma proposta bastante atrativa para quem quer investir em cinema, não acha? A partir dessa premissa, as chances de um investidor ter retorno é infinitamente maior. 
Ô se é! É um jeito interessante de pensar e propor trabalho. Aliás, eu gosto muito do casting, parece que você escolheu a dedo esse pessoal. Como foi trabalhar com tamanha equipe?
Renato Siqueira: Quando abrimos os testes para o “Atração de Risco” não sabíamos o que nos esperava. A seleção foi anunciada em duas etapas, a primeira o ator/atriz tinha que enviar uma cena, com um texto que a produção estava disponibilizando. A partir daí escolheríamos os candidatos para o teste presencial. Até aí tudo bem. No segundo dia da primeira etapa ficamos assustados, já tínhamos recebidos 1300 vídeos, e até o fim da data estipulada recebemos um total de 8 mil vídeos. Meu irmão, é vídeo teste que não acaba mais. Tivemos que redobrar nossos esforços e passar algumas noites em claro para escolher minuciosamente os atores para a segunda etapa. De 8 mil vídeos, selecionamos 40 pessoas para o teste presencial. Por isso posso dizer, meu elenco eu selecionei a dedo com muito amor. E posso me gabar também, pois meu faro de diretor está a cada dia mais apurado. 
Oito mil?! Que demais! Confesso aos leitores que já assisti o filme e é coisa de louco. Recomendo! Mas queria frisar que houve uma grata evolução entre seus longas, isso é graças a equipe? Bugdet? A pós está incrível!
Renato Siqueira: Como teve uma verba privada, eu consegui terminar esse material todo em um ano. Melhorei muito na parte da equipe, estou com uma equipe fantástica para gravação e o próximo passo será investir em ter outros editores trabalhando comigo, porque na parte de montagem, edição e pós produção, meu irmão, ficou igualzinho ao “Diário de um Exorcista”. Eu tive que arcar com tudo. Eu editei, eu montei, eu fiz o som 5.1. Eu fiz tudo que você pode imaginar, color grading. Tudo que você viu ali foi trabalho meu. Não tive ajuda de ninguém. Posso dizer que o Beto me ajudou em algumas coisas, mas já com 80% do material pronto.
Que trabalheira! Nos conte mais sobre essa parceria com Beto Perocini, de onde surgiu essa amizade? Cedo demais para perguntar se já planejam mais coisas juntos?
Renato Siqueira: Beto Perocini, além de ser um grande profissional, que eu admiro muito, hoje ele é meu amigão também. Eu trabalho com cinema desde os meus 14 anos, atuar então, vem de berço. Nos anos 2000 comecei a lançar meus curtas na internet e foi assim que o Beto me conheceu. Olha que honra, ele se tornou fã do meu trabalho e quando estava para se formar na escola de cinema, me convidou para atuar em seu TCC. O Perocini foi até a minha casa, com bastante humildade para me mostrar o roteiro do curta, eu amei. Se tratava de um curta de super herói, fiquei motivado em participar do projeto e tomei a liberdade de chamar para atuar também no projeto, um outro grande amigo, Ruben Espinosa. Claro, com a permissão do Beto. O trabalho aconteceu, ficando bem satisfatório para época, e a partir daí, iniciamos nossa jornada de trabalho e amizade que já dura muito anos. Eu e o Betão, como costumo chamá-lo, estamos já com um novo projeto de suspense engatilhado, se não fosse pela quarentena devido ao Coronavírus, já até teríamos iniciado a produção dele.
Olha só! Mais um trabalho indo pro forno, demais! Se me lembro bem, Diários de um Exorcista – ZERO foi uma adaptação literária, é verdade que Atração de Risco está fazendo o caminho inverso? 
Renato Siqueira: Na verdade tanto o “Diário de um Exorcista”, quanto o “Atração de Risco”, fizeram o caminho inverso. Primeiro, eu e o Beto escrevemos os roteiros juntos, e no processo de gravação dos longas, fomos adaptando a história para letras. No “Diário de um Exorcista”, chamamos para nos ajudar a escrever e também para ser co-autor da obra literária, o escritor Luciano Milici. O mesmo processo aconteceu com o “Atração de Risco”, para nos auxiliar, chamamos o escritor Dan M que também se tornou co-autor da obra. Os dois livros ficaram sensacionais, o “Diário de um Exorcista” está a venda nas livrarias e o “Atração de Risco”, está em produção e logo será lançado.
Em nossa última entrevista – convido a leitura de todos – perguntei quais diretores o inspirava e sua resposta não se limitou apenas ao cinema de horror. Sendo assim, dessa vez lhe pergunto quais obras de suspense lhe inspira?
Renato Siqueira: Sou fanático pelo terror e suspense dos anos 80 e 90. Eles me inspiram muito. Bom, vou citar só alguns nomes de filmes do gênero suspense, ok? “Atração Fatal”, “Instinto Selvagem”, “O Silêncio do Lago”, “Invasão de Privacidade”, “Silêncio dos Inocentes”, “Infidelidade”, “Obsessão Fatal”, “Dormindo com o Inimigo”, “A mão que balança o berço”, “Medo”, “Anjo Malvado” e por aí vai…
Agora, quebrando o gelo um pouco com uma leve brincadeira, você teria algum ator/atriz que seria um sonho poder dirigir e atuar ao lado?  Se sim, por que exatamente essa pessoa?
Renato Siqueira: Vamos ao sonho que nunca vou realizar (risos) . Ellen Burstyn e Al pacino, para mim, atuar ou dirigi-los, tanto faz (risos). Agora porque essas pessoas? A resposta se encontra no trabalho magnífico que eles exerceram durante as suas carreiras. 
Agora vamos ao que interessa! Quando esse filmão estréia e por onde o leitor do Cinem(Ação) poderá assistir?
Renato Siqueira: A partir do dia 16/04/20, a produção estará disponível nas seguintes plataformas digitais: NOW, Looke, Google Play, iTunes, Vivo Play e Microsoft Store.
Poxa, no atual cenário de pandemia, será ótimo! Facilita bastante! E este formato de streaming vem sendo uma escolha estratégica da equipe ou um pedido do mercado em geral?
Renato Siqueira:  No momento trabalhar no mercado de nicho ou formato Streaming, como preferir, está sendo muito melhor em questões financeiras. 
Com a sua experiência no segmento, como você vê o cenário nacional hoje? O que temos que evoluir para virar uma indústria? O streaming é o caminho natural para isso?
Renato Siqueira: No Brasil temos excelentes profissionais e quanto ao streaming, com certeza é o futuro. Já é. Porque possibilita que o produtor independente tenha um bom retorno financeiro. Agora vem o principal, sermos empreendedores, não ficar só na dependência do dinheiro público, buscar outros caminhos, fazer do investimento privado algo tão rentável quanto ao cinema de financiamentos públicos. Quando essa proporção ficar equiparada, teremos um grande avanço no cinema nacional, eu diria até o início de uma indústria.
Queria primeiramente parabenizá-lo por tamanha dedicação e competência, e falar que sempre estarei aqui, torcendo, consumindo e te ajudando a divulgar. Em breve farei uma crítica por aqui. Parabéns mesmo pelo esforço, e espero em breve estar fazendo uma terceira entrevista! 
Agora para encerrar, te presenteamos com este espaço para que convoque o público a assistir “Atração de Risco” no dia 16/04 e deixe uma mensagem para o pessoal do Cinem(Ação). 
Renato Siqueira: Se você quer ver boas atuações em um suspense nacional de tirar o fôlego, assista “Atração de Risco” pois, a tentação é a mais afiada das lâminas. 

ENTREVISTA PARA O CINEM(Ação), publicada em sua integridade  no Blog Gandavos, autorizado por Renato Siqueira, diretor do filme Atração de Risco, em 25/03/2020. 

quarta-feira, 18 de março de 2020

O inspetor de aluno


João Batista Stabile

Atualmente percebo com tristeza o que tem acontecido nas escolas, principalmente nas públicas. É lamentável! Agressão de alunos a professores, violência e drogas entre os jovens, depredação dos prédios e outras tantas barbaridades... 

Fala-se em militarizar as escolas, colocar policiais armados, rondas da Polícia Militar. Coloca-se câmeras de segurança nos pátios, tudo na tentativa de inibir a ação de alunos sem interesse nos estudos. Eles vão à escola para passar o tempo e fazer arruaças e assim, atrapalham aqueles desejosos de aprender.

Em minha opinião, tudo isso é consequência de décadas de descaso com a educação pública no país por parte dos governantes, agravada na década de noventa com a implantação da progressão continuada que, na verdade, implica aprovação automática.

Vou recordar como era na década de setenta, quando eu cursei o chamado na época de Ginásio e Colegial, que correspondem agora ao Ensino Fundamental Ciclo II e Ensino Médio respectivamente.

Não sou contra a evolução dos tempos! Muitas coisas facilitaram muito nossas vidas, mas junto com isso, vieram os problemas que desafiam as autoridades da área da educação.

A escola que frequentei fica no município de Presidente Alves, interior do estado de São Paulo. Chamava-se Escola Estadual de Primeiro e Segundo Grau “Cel. José Garcia”. Depois, na década de oitenta, teve seu nome mudado para Escola Estadual de Primeiro e Segundo Grau “Professora Maria Aparecida Coimbra”. Houve mudança também do prédio escolar.

Ela ficava em uma esquina. Era um terreno grande com um declive para o fundo. O prédio fora construído afastado da calçada. Em frente, nas duas ruas, havia apenas uma mureta baixa e entre ela e o prédio havia muitos canteiros de flores.

Os alunos entravam por um portão lateral ao fundo que dava para um pátio coberto ligado ao prédio por um corredor também coberto. Na saída do pátio, havia dois degraus, um lance, mais dois degraus, outro lance e chegava a uma escada de aproximadamente seis ou sete degraus que dava num saguão. Nos dois lados encontravam-se salas de aula, à frente perto da saída, a secretaria, depois uma escada para o piso superior. Subia-se um lance, fazia-se uma curva e outro lance para chegar ao andar de cima, onde existiam mais salas de aulas.

Ao pé da escada, devido à curva em cima, ficava um vão entre a escada e a sala da diretora, em seguida era a sala dos professores. Nesse vão, de aproximadamente, dois metros de largura por três de fundo, havia um armário para guardar materiais escolares, uma mesa e uma cadeira. Lá era o posto de trabalho do responsável pela ordem e pelo cumprimento dos horários da escola.

Ele não era fortão, não lutava artes marciais, não usava arma e nem levantava a voz com ninguém. Pelo contrário, era um homem de meia idade, de estatura pequena e calvo. Seus instrumentos de trabalho eram apenas um relógio de pulso de pulseira de couro preta para marcar a hora de trocar as aulas, um sino de bronze com cabo de madeira, para dar o sinal de entrada, troca de aulas e saída e uma régua de madeira de trinta centímetros.

Era o inspetor de alunos, Sr. Alcides Moreira de Oliveira, conhecido pelos professores, funcionários, alunos e pais de alunos, apenas por seu Dadi.
Seu Dadi impunha respeito pela sua postura séria. Era enérgico, sem ser autoritário. Chamava a atenção sem humilhar ninguém. Os adolescentes e jovens o respeitavam, mas não o odiavam, pelo contrário, estimavam-no.

Meu irmão, minha irmã, eu e outros colegas morávamos na fazenda e estudávamos à noite, assim como muitos de outras fazendas e mais os alunos da cidade. Seu Dadi conhecia os pais, se não de todos, da grande maioria dos alunos.

Na hora do recreio, o pátio e os espaços entre o prédio e o pátio ficavam cheios de alunos de quinta série a terceiro colegial. A idade variava de 11 a 18 anos, e havia alguns repetentes com mais de 18.

Quando as vozes e risadas estavam alta demais, ou havia correria dos meninos, seu Dadi chegava no alto da escada e ficava batendo com a régua na mão, até que os barulhentos viam e uns avisavam os outros e a ordem era restabelecida rapidamente.

Não digo que nunca houve problemas. Esporadicamente acontecia sim alguma briga entre os meninos, ou um mau comportamento por parte de algum aluno, mas nesse caso, seu Dadi, sem dificuldade, os encaminhava para a sala da diretora.

Nas formaturas, tanto do ginásio como do colegial, todo ano, seu Dadi estava entre os escolhidos pelos alunos, como paraninfo, patrono ou homenageado de honra da turma. Em minha formatura do terceiro colegial em 1979, nossa turma o escolheu como homenageado de honra.

Eram outros os tempos! Os jovens de hoje jamais entenderão! Não tínhamos celular, tablet ou notebook. Não possuíamos mochila de marca nem material sofisticado. Cada um se virava como podia, de acordo com o poder aquisitivo dos pais.  Mas existia algo que não dependia de dinheiro, posição social ou tecnologia. Havia respeito.Em primeiro lugar aos mais velhos. Isso já dava uma enorme vantagem ao seu Dadi. Depois, devido ao seu cargo, pois ele era uma autoridade constituída dentro daquelas dependências.

Os alunos se dirigiam aos professores sempre respeitosamente. Usavam o tratamento de “senhor” ou “senhora’. Seria inimaginável um adolescente tratar um professor ou professora de “você”. Quando a diretora entrava em uma sala de aula, todos ficavam em pé até que ela os mandasse sentar. No corredor, se seu Dadi, ou um professor ou mesmo um servente da escola chamasse atenção de um aluno, este dificilmente responderia alguma coisa, sentir-se-ia envergonhado.

Infelizmente esse tempo passou e não volta mais.Ele só existe na memória de quem viveu essa época. Termino este relato com o coração apertado de saudade e também de tristeza por saber das condições de nossas escolas atuais!  Que pena!

Autor
João Batista Stabile - Marília - SP