Carlos Costa
Manaus, 2009
MANAUS, 1969
Manaus era uma cidade provinciana, quando foi implantado modelo de desenvolvimento Zona Franca de Manaus moldado no tripé Indústria, Comércio e Pecuária. A cidade era muito pequena e não tinha mais do que 300 mil habitantes. Terminava na Avenida Boulevard Álvaro Maia. Depois, onde hoje fica uma Usina de Energia Elétrica, no início do que é hoje a Avenida Djalma Batista, tinha o “Seringal Mirim”, assim chamado em razão das inúmeras seringueiras nativas que lá existiam.
A estrada João Coelho, depois estrada de Flores e hoje Avenida Constantino Nery, era a maior rua em extensão. Não havia a Avenida Djalma Batista, nem o Amazonas Shopping Center. Existia uma grande e bela área de balneários, o mesmo ocorrendo com a Estrada do Contorno, projetada pelo prefeito Paulo Pinto Nery.
A área onde hoje está localizada a Avenida Efigênio Salles exibia balneários naturais, resultado da passagem do Igarapé do Mindu por toda a sua extensão. Não havia piscinas; no máximo, algumas águas represadas para as pessoas tomarem seus banhos. Havia o “Balneário do Parque 10 de Novembro”, o “Guanabara Clube de Campo” (o único que resiste até hoje), o “Tucunaré Clube de Campo”, o “London Clube de Campo”, o "Jacundá Clube de Campo”. Os outros todos ficaram poluídos
A Zona Franca estava começando. O projeto de sua criação, aprovado 10 anos antes pelo deputado federal Francisco Pereira da Silva, dava os primeiros passos em direção ao que é hoje o polo Industrial de Manaus (PIM). A sede da Suframa – Superintendência da Zona Franca de Manaus - tinha lugar onde hoje funciona hoje a sede do Sebrae.
Circulavam poucos ônibus em Manaus. Funcionavam a “Ana Cássia”, “Viação Demétria”, agregada à “Ana Cássia”, “Viação Bons Amigos”, “Viação Nosso Transporte” e “Viação Monte Ararate”, com regularidade. Também havia umas kombis, chamadas de expressinhos, que atendiam nas áreas dos bairros de São Raimundo, Glória e proximidades.
A cidade era entrecortada de igarapés e o maior movimento era feito pelas catraias: do Morro da Liberdade para o bairro da Cachoeirinha; do Educandos para o centro da cidade; da Aparecida para o São Raimundo etc. Os remadores tinham que ter braços firmes para transportar as pessoas. Quase não existia ponte ligando essas áreas.
O empresário colombiano Alonzo Puertas Baptista decidiu abrir o primeiro bar gay de Manaus, na Estrada de Flores, de nome “Patrícia Bar”. Causou um escândalo na cidade. Mais escândalo ele promoveu quando anunciou pela imprensa que iria escolher a Primeira Rainha Gay de Manaus. Durante o baile, a mesma sociedade que o criticou no início, estava presente para prestigiar seu carnaval.
O Km 0 de Manaus ficava ao final da Avenida João Coelho, onde funciona hoje um quartel do Corpo de Bombeiros, antes da Estrada dos Franceses, que também não existia.
Surgiu, mais tarde, o bordel Saramandaia, na Avenida Torquato Tapajós, continuação da Avenida Constantino Nery.
Cheguei a Manaus nesse ano, embora tivesse nascido em 1960, no bairro do Morro da Liberdade, em Manaus, e ido morar na comunidade do “Varre-Vento”, um distrito do município de Itacoatiara.
Vim em busca de estudos. Comecei a estudar aos sete anos, na escola improvisada na casa de minha tia Terezinha da Costa Amaral, onde aprendi o básico. Já sabia ler, escrever e fazer pequenas operações matemáticas. Como quase toda criança tinha sempre uma madrinha que residia em Manaus, vim em busca dela, sozinho.
Minha mãe, Josefa Bezerra da Costa, costurou para mim uma bermuda de tergal marrom com dois bolsos na parte de trás. Meu pai, Paulo Torres da Costa, construiu para eu transportar minhas poucas coisas, uma maleta em madeira, com uma chave:
- É para você não ser roubado dentro do motor, enquanto estiver dormindo!
Também minha mãe teve o cuidado de me fazer aprender a comer com garfo e faca:
- É para você não passar vergonha dentro da embarcação.
Desembarquei no Cais do Porto com o endereço de minha madrinha Natércia, anotado no bolso da bermuda da pessoa cuja casa me serviria de abrigo. Mas, antes, fiquei olhando para as calotas dos carros. Eu me via nelas de uma forma meio esquisita, dependendo da distância que eu olhava.
Decidido, entreguei o endereço ao motorista do táxi e ele me disse que conhecia o local.
Assim, cheguei à casa da minha madrinha, decidido a estudar. Matriculei-me no Grupo Escolar Adalberto Valle, onde tive minha primeira paixão platônica por Claudine, filha de um Oficial de Justiça. Eu a julgava muito linda. Mas ela nunca soube disso. Eu era muito tímido para revelar-me. Ao concluir as quatro primeiras séries, fui transferido para o Colégio Dorval Porto.
Durante meus estudos no Colégio Dorval Porto, convivi com algumas pessoas que marcaram a minha vida. Uma delas foi uma professora de biologia, Letícia Barbosa de Moraes, colecionadora dos livros “Grandes Romances Históricos”, com vários autores e títulos: “Nossa Senhora de Paris”, “Ivan, o Terrível”, “Corcunda de Notre Dame”, “Madame Bovoari”, “Salambô” “Os Miseráveis”, “Nossa Senhora de Paris” e muitos outros romances clássicos. Também convivi com os professores e professoras.
Do outro lado da rua, quase em frente ao Grupo Escolar “Adalberto Vale” existia o “Batuque da Mãe Zulmira”. Nós olhávamos pelas frestas das paredes para saber o que acontecia lá dentro. Não tinha nada demais. Era só o barulho dos atabaques e umas pessoas “pegando santo”. Os ônibus tinham no local a sua estação. Comecei a publicar os meus primeiros poemas infantis, quase sempre sem muito sentido, no jornal mural “Pirilampo”, uma publicação interna do Grupo Escolar onde comecei e conclui meu curso primário.
Corria, no Morro da Liberdade, em pistas sem asfaltos e cheias de pedras, puxando “carros” feitos com latas de leite e também imaginando serem carros os aros de bicicleta e pneus velhos de carros que, para controlá-los, dobrava um arame ao ponto de fazer um apoio lateral e os empurrava, com meu amigo de infância João da Silva Couto, que sempre me acompanhava nessas brincadeiras. Às vezes, amarrávamos até quatro latas vazias de leite e dizíamos que era um “carro compactador”.
A casa de minha madrinha era ótima, mas tinha um problema: eram muitos filhos, o Doca, Chaguinha, Manoel e mais uns seis. Sabia que ela não teria como me sustentar; pois, meu padrinho, Francisco Januário Calado, era apenas tratorista no Departamento Estadual de Estradas e Rodagens, que fazia diretamente todas as obras do Governo da época. Decidi, então, adquirir uma caixa de picolé e ir vendê-los. No início vendia poucos, depois fui aumentando, aumentando até o peso que eu suportasse carregar. Vendia-os fora do horário dos meus estudos, até começar a anoitecer.
Foi uma vida feliz, recheada de muitos acontecimentos. Não havia violência, mas havia as “racinhas”, que eram grupos de colegiais que brigavam no meio da rua, uma escola contra a outra. Não havia o uso de armas, só os dois chefes das “racinhas”, escolhidos entre os mais fortes e determinados. Os outros, ficavam só em volta, olhando. Terminada a “batalha”, cada grupo saía para o seu lado. A luta terminava ali. Como as “racinhas” eram entre colégios, havia algumas que ficaram famosas em suas lutas: as do Colégio Pedro II, o ‘Estadual’, contra a Escola Técnica, por exemplo.
No bairro do Morro da Liberdade, como não havia água encanada, só no da Cachoeirinha, tínhamos que atravessar de catraia para ir buscá-la. Um depósito, tipo galpão para beneficiamento de açúcar, com várias torneiras vindas de um poço artesiano (coisa que quase não existia naquele ano de 69), e de lá, todos os finais de tarde, eu e alguns filhos da minha madrinha, apanhávamos água para beber, mas tínhamos que caminhar um pouco dentro do mato até chegar ao local para pega-la.
Estudando pela manhã e vendendo picolé à tarde, fui levando minha vida e ganhando meu dinheiro. Durante meus estudos no Colégio Dorval Porto, aos 11 anos de idade, decidi vender jornal. Acordava todos os dias às 4h da manhã, tomava um copo de Nescau com pão e ovo, pegava o primeiro ônibus às 04h30min, ainda com muito frio, devido à grande umidade, e ia para o trabalho. No colégio Dorval Porto, fiz amizade com a professora de inglês Alice Fabrício da Silva, que me incentivou muito a publicar meu primeiro e único livro de poesias, (Des)Construção..., em 1978, reeditado 20 anos depois pelo projeto “Valores da Terra”, desenvolvido na gestão da Secretária Municipal de Cultura, Lívia Mendes.
Já adolescente, frequentei muitos cinemas de Manaus. Começava sempre pelo Cine Guarany, às 12h, na primeira sessão e só chegava em casa à noite, depois de ter passado pelos cines Polytheama, Vitória, Éden, Odeon, Avenida, Palace e Ipiranga, na sessão das 20h.
Sempre, eu e meus amigos da Escola primária, freqüentávamos os cinemas; havia a ilusão de classificar a virgindade de uma moça pelo uso das calças: se tivesse as pernas muito afastadas uma da outra, devido o quadril largo, dizíamos que ela não era mais virgem; se ela usasse calça de lycra colada ao corpo, mas não tivesse o afastamento, “essa era a virgem”.
Gostávamos de assistir aos filmes que, em média, demoravam 30 dias em exibição: “Tarzan”, “Mil Máscaras” “Mini Maciste”, “Sabata”, “Django” e outros. De todos, o que mais apreciávamos mesmo era de “Tarzan”. Costumávamos brincar: “eu queria ser forte que nem o Tarzam”. Todos os cinemas, Guarany, Polyteama, Vitória, Edem, Odeon, Pálace, Avenida e outros que não lembro os nomes, pertenciam a família de Adriano Bernardino.
De tanto assistir ao filme “Tarzan contra as Amazonas”, tínhamos decorado as cenas e as falas. Certa vez o cinema, estando cheio de pessoas para assistir o mesmo filme de “Tarzan”, em uma cena em que ele corria por uma ponte de corda fugindo das índias e parava, olhando para trás, gritávamos em coro: “Tarzan!”. Quando ele olhava, como se estivesse olhando para a platéia, todos riam ao mesmo tempo.
Na televisão, gostava de ver filmes, como os de “Daniel Boone”, com Fess Parker, seu companheiro índio Mingo, sua esposa Rebeca e seus dois filhos. Também assistíamos aos filmes de “Zorro”, em capítulos. Ao final do capítulo, anunciavam: “O que vai acontecer amanhã ao Zorro! Não percam o próximo capítulo, neste mesmo horário, neste mesmo canal!”. Ficávamos grudados no horário para não perder um só capítulo. Havia, também, os filmes de Batmam, Rintintim e Zorro, em capítulos e muitos outros.
Durante meus estudos na nova escola, nutri uma outra paixão platônica pela aluna da minha sala, Maria Farias de Souza, mas ela nunca soube disso porque eu só vivia “agarrando” outras alunas. Escrevia o nome dela na porta dos banheiros, nas carteiras escolares ou em qualquer outro lugar que julgasse conveniente. Com a Claudine, não cheguei a esse ponto.
Foi quando surgiram umas garotas no colégio, que eu as chamava de “Turma da Gatolândia”. Muitos fatos interessantes aconteceram com elas. Todas procuravam a nossa turma porque queriam fazer apenas sexo. Numa oportunidade, o colega de sala Luiz Eron Castro Ribeiro pegou uma delas, a levou para os fundos da escola e começou a fazer sexo com a menina, em pé. O nosso professor de Matemática, Manoel Veríssimo, entrou com o seu carro no estacionamento que havia aos fundos da escola e viu o Eron com a menina, mas nada comentou.
A rua onde fica o colégio era escura demais. Ao lado do prédio havia um matagal, entrecortado por caminhos que só nós conhecíamos. Ao final das trilhas, colchões que usávamos para praticar sexo com mais conforto. Nenhum dos nossos amigos tinha dinheiro e nem tempo para ir ao motel porque esses fatos aconteciam no horário do nosso recreio, quando podíamos deixar a escola.
Eu e meu irmão Roberto estávamos a fim de uma moça que trabalhou em nossa residência, Ernestina. Ela dormia em uma rede em frente ao quarto do pai. Um dia, combinei que passaria parte da noite na rede dela. Ela tirou toda roupa e me esperou nua. Na hora em que cheguei e a acordei, no escuro, ela perguntou:
- Quem está aí, é o Roberto ou o Carlos? Respondi que era eu e entrei. O punho da rede não agüentou, quebrou e caímos no chão. Meu pai levantou, acendeu a luz e foi ver o que tinha acontecido. Como eu dormia em rede, mas do outro lado da casa, foi até mim e avisou:
- Ainda bem que fui eu quem acordou. Se fosse tua mãe, ias apanhar dela.
Eu estava fingindo que estava dormindo, coberto com o lençol da cabeça aos pés.
Um outro professor nosso da escola, que ministrava aulas de música, Werner Petrollius, costumava freqüentar um bar cheio de quartos que existia próximo de nossa escola. Em toda prova, ganhávamos nota 10, na maioria das vezes, mesmo quando escrevíamos bobagens. Um dia, fiquei curioso com isso. Fui até o bar que o professor freqüentava e vi quando ele entregou as provas para uma das mulheres que trabalhavam no local corrigi-las. Ela as jogou para cima e as pegou no ar. Estas foram corrigidas, com todo rigor, pelo professor. As outras mereceram notas dez.
Depois de concluir a 8ª série no Dorval Porto, matriculei-me no Gymnásio Amazonense Pedro II. Já não vendia mais jornal. Mas passei a lavar carros, engraxar sapatos, vender bolachas recheadas em motores e vender cascalho em tambor, batendo um triângulo para chamar a freguesia.
Ao concluir apenas o primeiro ano do segundo grau, a “pedido” da orientadora educacional Terezinha Mangabeira, passei a estudar no Instituto de Educação do Amazonas (IEA), onde conclui meu curso de magistério para dar aulas de 1ª a 4ª séries.
Escrevi “a pedido” da orientadora, mas as coisas não aconteceram bem assim. O certo era eu escrever assim: com medo de ser expulso do colégio antes de concluir o meu primeiro ano do segundo grau, me transferi para o IEA. Não é que eu fosse danado ou bagunceiro; eu era muito contestador, numa época que ainda existia o Decreto Nº 288, do Regime Militar. Esse Decreto autorizava a expulsão de qualquer aluno que contestasse professores, criasse problemas em sala de aula ou fosse subversivo, fato que impediria o aluno de ser matriculado em outra escola.
No IEA, não foi muito diferente. O diretor Rozendo Neto, dizendo que eu era um subversivo, só porque usava cabelo grande e barba no rosto, queria sempre me expulsar. Acho que fui o único aluno que conseguiu estudar em todas as salas do segundo andar do colégio, sem ser expulso, graças à intervenção sempre providencial do nosso psicólogo e orientador educacional, professor Glaucimar.
A INFÂNCIA
Nasci no bairro do Morro da Liberdade, mas fui criado até os nove anos, no interior do Estado do Amazonas, na localidade de Varre-Vento, no Distrito de Itacoatiara. Meu nome de batismo é CARLOS (Alberto Bezerra da) COSTA
Tive uma infância feliz e uma adolescência cheia de muita alegria, em uma família pobre de nove irmãos. Sou o quarto filho. Meu pai, Paulo homem rude, trabalhava do nascer ao-pôr-do-sol. Juntamente com minha mãe, Josefa, eram agricultores e batismo é: Carlos Alberto Bezerra da Costa, amavam a terra como parte da vida deles. Eram analfabetos funcionais. Meu pai e minha mãe lutaram muito para garantir minha sobrevivência,, meus estudos, enfim possibilitar que eu chegasse aonde me encontro hoje.
Quanto aos meus irmãos, a que me proporciona mais recordações é Ivete, que morreu quando eu era criança. Ela foi sepultada no quintal da nossa casa pelo meu pai, que também fez o caixão e cavou a sepultura.
Tive três sonhos com minha irmã. Não eram sonhos de Ícaro, personagem da mitologia grega, que criou asas e rumou com destino ao sol.
No primeiro, ela aparecia dizendo que nosso pai tinha cavado uma sepultura em cima de um olho d´água.
No segundo, voltou a reclamar de novo e pedir que meu pai a retirasse de lá e a colocasse em outro lugar.
No terceiro, ela deixou o caixão e um punhado de terra molhados em cima de uma geladeira velha, a gás, que havíamos comprado.
Nunca contei esses sonhos para o meu pai. Hoje, o lugar da sepultura dela não existe mais. Foi levada por sucessivas quedas de terra.
Quando criança, sonhava que criava asas e saía voando por sobre desfiladeiros e penhascos. Ao começar a cair, alguém me segurava e me puxava para cima. Nunca entendi direito o significado desse sonho, mas sabia que ele significava algo.
Cheguei a ser tido como morto por três vezes. Na primeira, caí no rio Solimões, me tiveram como morto e prepararam meu enterro, mas voltei à vida, já dentro do caixão. Indaguei o que estava acontecendo; a segunda foi devido a uma febre muito alta e eu tive convulsões e também declararam minha morte, mas voltei à vida; a terceira foi conseqüência de um suposto rato que teria mordido minha cabeça dentro de uma rede. Minha avó estava certa quando dizia:
- Esse menino vai viver muito, ainda, teria dito minha avó, Lucila Torres da Costa, com o que concordou minha tia, Terezinha da Costa Amaral, mãe e irmã do meu pai.
Ao me indagarem o que eu tinha ido fazer no fundo do rio Solimões, respondi:
- Fui amarrar os bodes do meu pai. Só havia uma questão: não havia criação de bodes na fazenda. Havia algumas cabeças de gado que nos sustentavam com o leite diário. Então, como eu poderia ter respondido tão rápido que tinha “ido amarrar os bodes do meu pai”?
Depois desses três episódios, fiquei tomando um remédio chamado de “jalapa drageada” ou “pílula da vida” até os meus sete anos. Depois, parei.
A concretização dos meus sonhos de Ícaro ocorreu mais tarde, em dois momentos distintos: o primeiro, quando passei a viver na família de Theomário Pinto da Costa e Dulce Fernandes Neves Pinto da Costa.
Depois, quando passei a trabalhar por 23 anos ininterruptos com o administrador de empresas e empresário Francisco Saldanha Bezerra. As famílias Costa e Bezerra, pela ordem, concretizaram meus sonhos. A primeira, dando-me uma direção firme e determinada. A segunda, concretizando os meus sonhos de realização profissional e de consumo.
A primeira família ensinou-me a ter gosto pelos estudos; o empresário ajudou-me a concretizar meus sonhos materiais.
AMIGOS, NAMORADAS E PAIXÕES QUE DEIXEI PELO CAMINHO
No Grupo Escolar Adalberto Valle, estudei com João Couto da Silva, Bosco Saraiva, “Nego Achimo”, William e Williana, dois irmãos, Claudine, Eduardo Silva, radialista da Rádio Difusora, e outros tantos que não lembro mais. Como dito, Claudine foi minha primeira grande paixão platônica em sala de aula. Paixão de adolescente.
Roque de Almeida Lima, atualmente engenheiro e professor, estudou comigo na 4ª série. Com ele, ganhei meu primeiro concurso promovido pela Polícia Rodoviária Federal, sobre o tema “Trânsito”. Ele desenhou e pintou um assunto relacionado ao tema. A Escola ganhou um prêmio, e nós ganhamos uma vitrolinha. Ficamos muito orgulhosos do nosso feito.
O Roque desenhava e pintava muito bem na sua adolescência. Tinha só mãe e morava em uma casa de madeira, no bairro do Morro da Liberdade. Não tinha nem dinheiro para comprar fardas. Ia para a Escola só de sandálias, isso quando conseguia comprar uma. Se não conseguisse, comprávamos para ele.
Claudine era de uma beleza embaraçosa. Estive na residência dela, quando começou a faltar muitas aulas em virtude de uma gripe. Fui recebido por ela, em seu quarto, ela usando apenas uma bata branca e com calcinha branca. Foi um colírio para os meus olhos vê-la naqueles trajes.
Tivemos inúmeras professoras: Haidée, que chegava sempre com seu namorado num carro karmanguia, sem capotas; Rosa Eduarci Marinho, minha segunda paixão, esta correspondida anos mais tarde quando comecei a trabalhar no Jornal “A Notícia”, lancei meu primeiro livro de poesias “(Des)Construção...”, e ingressei um ano mais tarde, na União Brasileira de Escritores, aos 19 anos.
A professora Rosa, ao deixar nossa escola e ser transferida para uma outra, mereceu de nossa parte uma festa com bolo e guaraná. Ficou muito emocionada com a homenagem. Antes da transferência para outra escola, a convidamos para nos dar aulas de educação física aos sábados, em uma área improvisada e aceitou. Outra convidada foi a professora Francisca, mais conhecida como “Chiquinha”, pessoa que gostava de encostar-se aos cantos das mesas ou sentar-se em cima delas para ministrar suas aulas.
A professora Rosa sempre arrumava um jeito de nos levar para lugares que não conhecíamos. Alugava caminhões e nos levava ao Balneário do Parque 10 de Novembro, um dos melhores que existiam em Manaus. O Balneário ficava em frente à Fábrica de Jóias Duque, da família De Carli, que também possuía a Fábrica de Roupas Raymond da Amazônia. Em ambas as fábricas, empregavam muitas pessoas.
Anos depois, quando o vereador Fábio Lucena acusou, pelo jornal “A Crítica”, o empresário Carlos Alberto De Carli, de ter feito um empréstimo no Banco do Brasil, em que o vereador também trabalhava, para financiar uma plantação de cana-de-açúcar que afirmava não existir. Fui contratado pelo empresário para fazer sua defesa pelo jornal “A Notícia” e provar que no seu empreendimento, Fazendas Unidas, havia cana plantada, o que era uma realidade. Ficava na Estrada Manaus – Itacoatiara.
Pedi ao empresário para alugar ônibus, a fim de levar os jornalistas ao local que o vereador afirmava não existir. Todos os jornais que foram convidados para a visita e que se fizeram presentes ao local, publicaram matérias em páginas inteiras dizendo que “As Fazendas Unidas são uma realidade”.
O vereador passou a ter muita raiva de mim por esse meu profissionalismo. No dia que em ele se elegeu pela primeira vez para um cargo federal, saindo da Câmara Municipal direto para o Senado da República, recebi um telefonema pessoal dele, convidando-me para ir a um jantar de despedida para a imprensa, que seria oferecido em um restaurante que existia na Avenida Álvaro Maia, ao lado de onde funciona hoje o Supermercado Roma e que serve de estacionamento. Consultei o empresário Andrade Neto e ele disse que eu podia ir, mas nada sobre Fábio Lucena seria publicado em “A Notícia”. Ele pessoalmente recebeu a mim na porta, apertou minha mão e pediu desculpas por ter ficado aborrecido comigo no episódio das “Fazendas Unidas”. Disse que queria esquecer o incidente, e se tornou meu amigo.
Depois da primeira pessoa com quem me relacionei a Edna, tive outras namoradas: Maria Luiza, do bairro São Lázaro, Radija Barbosa de Melo, filha de Nilamon Barbosa de Melo, um empresário da área de móveis, do bairro Educandos. Radija me conheceu quando eu comprava uma cama de solteiro na loja do pai dela. Veio atender-me com um imenso sorriso e deu-me o telefone dela, mas pediu que eu ligasse só na hora em que o pai dela não estivesse em casa. Fiz isso algumas vezes, mas como ela nunca aceitou sair comigo para festas, desistir.
Depois, quando estudava no Colégio Dorval Porto, conheci Julia da Cunha e Silva, uma professora de Inglês. Ela lecionava na mesma escola em que eu estudava e se dirigia ao município de Manacapuru, em uma bolsa, para visitar a fazenda de seu pai.. Depois veio Mara Lobato, do bairro da Raiz, com quem tive um filho, Odimar Queiroz Sampaio, do bairro de Aparecida,Wandira Bezerra, do bairro da Betânia, Dalva Pucu Carneiro, do bairro Praça 14 de Novembro com quem pretendia me casar, Rosa, uma funcionária do Incra, do bairro Praça 14 de Janeiro e Ormy da Conceição Dias Bentes, do centro da cidade, Cl com quem também pretendia me casar, Cléia, do bairro da Betânia, Cleide, do bairro Colônia Oliveira Machado, além de outras que não lembro mais os nomes porque foram namoros de curta duração ou porque não tiveram grande importância na minha vida. Mas a união só aconteceu aos 22 anos, no religioso, depois que saí da Faculdade, com Maria Tereza Santos de Oliveira, viúva do delegado da Polícia Civil, Itagiba Ramos de Oliveira.
Durante os dois anos que estudei no Instituto de Educação do Amazonas – IEA, fiz e também deixei alguns amigos pelo caminho: o colega de sala, Francisco, que passou a ser professor de matemática e que eu o .apelidei carinhosamente de “Chico Tripa”, mas não sei mais nem o porquê. Mantive uma longa relação com a irmã dele de nome Ana, que depois se casou e foi morar fora do Amazonas; o professor de matemática João Martins Dias; o diretor Rosendo Neto, que sempre queria me expulsar da Escola; o psicólogo, professor e orientador educacional, Glaucimar, que sempre intercedia a meu favor e vários outros que não recordo mais.
Após separar-me da Tereza, depois de cinco anos morando sozinho, casei-me novamente, no civil, com Yara Marília de Souza Queiroz, com quem continuo casado até os dias atuais. Yara, grande companheira, com quem tive outro filho, o Carlos Costa Filho, é filha do saudoso Deputado Estadual e brilhante advogado Francisco Guedes de Queiroz.
Quanto às fases de aventuras com os amigos, por volta dos meus 30 anos, em que eu, o Dr. Raimundo Silva, Dr. Flávio Queiroz de Paula e o Dr. Ivo Alberto Brasil Lagos passeávamos de lancha aos finais de semana, tinha uma namorada que trabalhava na Fábrica de Relógios Nelima, a Cleide. O certo mesmo é que o Silva – que detesta ser chamado pelo seu primeiro nome, Raimundo, porque insiste em dizer que “isso não é nome, é um palavrão”, um domingo à tarde, telefonou para minha casa e pediu que eu fosse buscar uma namorada dele, que morava no Parque 10 de Novembro, sobrinha do ex-reitor Octávio Hamilton Botelho Mourão, inventando para ela uma desculpa qualquer.
Fui lá, inventei que o Silva não estava se sentindo bem e me ofereci para levá-la a uma festa. Levei-a e só saí da casa dela quatro dias depois. Eu tinha extraído um dente e tive muita febre depois. Ela ficou cuidando de mim.
Maria Luiza foi a primeira namorada que levei a sério. Cheguei a vir do Rio de Janeiro, onde estava fazendo um curso de especialização em Assessoria de Comunicação e Marketing Empresarial, para participar do aniversário de 18 anos dela. Como eu já a namorava desde os 13 anos – eu já tinha 19 anos –, a mãe dela Lady de Lima Magalhães pegou-me pelo braço e perguntou:
- Afinal, o que o senhor está querendo com minha filha? Está enrolando a moça há cinco anos e nada decide!
Maria Luiza, atrás da mãe, respondeu:
- O que eu queria com ele, já fiz quando tinha 15 anos. Agora, só somos amigos!
A mãe dela passou mal e quase desmaiou.
É que, em sua festa de 15 anos, pediu-me para conhecer um motel e eu a levei. Depois, a irmã dela ficou dizendo que se eu não a levasse também ao motel, iria contar tudo para a mãe dela. Não adiantaria mais nada porque a Maria Luiza já tinha contado tudo.
O pai dela, Francisco de Lima Magalhães era do tipo calado, mas muito observador. Uma vez, acendeu a luz da sala, que sempre permanecia apagada quando namorávamos e nos pegou, a Maria Luiza debruçada na janela da sala com uma saia que usava sempre abaixo dos joelhos, mas sem calcinha por baixo e eu, debruçado nas costas dela.
Pigarreou um pouco, mais um pouco depois de acender a luz. Estávamos tão entretidos que nem percebemos o seu movimento e o acender da luz da sala. Ele perguntou:
- Minha filha, já não está na hora de terminar o seu namoro, não?
Era o sinal que a nossa “festa” havia chegado ao fim.
No dia em que ingressei na União Brasileira de Escritores, com a publicação do meu primeiro livro, (Des)Construção...,houve uma festa. Convidei a professora Rosa Eduarci Marinho como minha companhia. Ela aceitou. De lá, saímos direto para a Cabana dos Barés, um bar tradicional em Manaus, onde conversamos muito e a professora queria saber mais informações ao meu respeito. Anos mais tarde, ingressei, juntamente com o médico Simão Pecher, no Clube da Madrugada, grupo de intelectuais que se reunia embaixo de um pé de mulateiro, na Praça Heliodoro Balbi, mais conhecida como Praça da Polícia, para discutir temas do momento. O Ivo Brasil Lagos participou da fundação desse Clube, pois também era um intelectual.
FATOS QUE DEVEM SER CONTADOS
Durante um ano que estudei no Colégio Pedro II, eu e alguns amigos, costumávamos freqüentar às sextas-feiras, a “Feira das Frutas”, também chamada de a "Feira das Putas”, dada à grande quantidade de ‘mulheres da noite’ que lá frequentavam.
Numa certa sexta-feira, sete homens lisos, incluindo eu, foram à “Feira das Frutas” atrás de sexo. Todos entre 18 e 19 anos. Menos eu que tinha 16. Encontramos uma freqüentadora, de nome Raimunda, que aceitou sair com todos:
- Desde que entre um de cada vez! Avisou.
Entrou o primeiro, o segundo, o terceiro. Depois, entramos todos juntos, na maior baderna. Ela parou, olhou e perguntou:
- Vocês vão querer me currar, é?
Não a curramos, mas todos pegaram uma carga de “chato”.
Na segunda-feira, ficamos nos coçando em sala de aula. Eu fui logo procurar o Dr. Menescal de Vasconcelos, em sua drogaria. Cheguei todo desconfiado, encostei-me no balcão. Ele perguntou:
- Pegou gonorréia, foi? Essa era a doença mais comum da época.
- Não doutor. Estou me coçando todo e não sei o que é!
- Entre aqui no consultório que vou lhe examinar.
Baixei o short que usava na ocasião. Ele olhou. Olhou de novo e disse:
- Eu tenho uma injeção infalível!
Decidi tomá-la. Doeu muito quando ele aplicou-me nas nádegas. Era uma benzetacil, um dos primeiros antibióticos a ser usado que servia para quase tudo.
Fiquei bom e indiquei aos outros colegas o nome e o endereço da farmácia. Não sei se alguém procurou pelo Dr. Menescal. Só sei que uma semana depois estavam todos curados e nunca mais voltamos a procurar mulheres na “Feira das Frutas”. Alguns se depilaram todo, até no peito. Outros passaram creolina, gasolina e Neocid e nada resolvia.
Tivemos um professor de Física, o Wandler que, ao saber que um colega nosso tinha descoberto por onde passava a fiação do segundo andar do Colégio Pedro II, perguntava sempre às sextas-feiras:
- Será que vamos ter aula hoje? Acho que não vai ter energia elétrica.
Era o sinal para o colega desligar o fio. Tínhamos que esperar por quinze minutos. Se a luz não voltasse, as aulas eram suspensas e a turma liberada.
Seguíamos para o “Bar Amarelinho”, onde o professor fazia a chamada.
Aliás, as sextas-feiras era o pior dia que tínhamos para estudar. O primeiro e o segundo tempo eram de física; depois vinha o professor Pedro Ivo, a “bomba de nêutron”, com a aula de química, e o último tempo era de matemática.
O apelido “bomba de nêutron” para o professor Pedro Ivo é porque ele sempre carregava uma pasta tipo OO7. Antes de abrir a pasta e iniciar sua aula, sempre dizia que “a arma mais perigosa e letal que existe era a bomba de nêutron”.
“UM DIA FUI JORNALEIRO”
Como citado anteriormente, Manaus era uma cidade muito pequena, mas cheia de carros importados. No início da Zona Franca, eram vendidos em Manaus carros do tipo Mustang, da Ford, Citroen, que tinha uma concessionária no mesmo local onde hoje funciona a “Livraria Valer”. Os carros do tipo “Mustang” eram os proferidos do filho do empresário hoteleiro, morto em uma pescaria, Jonas Martins Lopes, senhor Jonas Martins. Ele apostava corridas e sempre que um se acidentava, ligava para a concessionária e pedia outro. Sempre era atendido.
A Praça da Igreja da Matriz era toda cheia de palmeiras imperiais, em meio a trilhos de bondes, toda com paralelepípedos. Em frente da Igreja, embaixo das escadarias laterais, havia um zoológico.
O comércio de artigos importados instalado na Rua Marechal Deodoro era quase todo dominado por turcos e árabes e fechava sempre no mesmo horário. Era ora de parar de vender jornais e ir prestar contas.
Na Avenida Getúlio Vargas e ao final da Rua da Instalação, havia duas construções, no meio a pista: eram os “Pavilhões São José” e o “Tabuleiro da Baiana”, respectivamente.
Comecei a freqüentar cinemas. Os filmes tinham início às 12hs, e só parava quando assistia ao último filme, às 20h. Toda semana, a diversão era juntar dinheiro para ir ao cinema no domingo. Se não conseguíssemos o dinheiro todo, catávamos garrafas do tipo escuro e as vendíamos em frente ao cinema Guarany, para o dono do “Pavilhão São José”, que pagava bem se a garrafa fosse preta. Com esse dinheiro, entravávamos no cinema eu, Jorge Lopes da Silva, às vezes o João da Silva Couto ou outro amigo que convidávamos.
Comecei vendendo os jornais “A Crítica”, “A Notícia” e o “Jornal do Commércio”, os únicos que existiam em Manaus, na saída do Porto de Manaus, em uma banca coberta; depois, na esquina das Ruas Marechal Deodoro com Theodoreto Souto. Em seguida, na Avenida Leopoldo Peres, na calçada da Fábrica de Cigarros Gaivota; no interior do mercado municipal Walter Rayol e, por fim, em uma banca coberta, nas esquinas das Avenidas 7 de Setembro com Joaquim Nabuco, na calçada da Drogaria São Paulo. Pegava os jornais diretamente nas redações mas os revendia para uma pessoa conhecida por “X-9”. Muitos trabalhavam para ele e sempre prestavam contas das vendas no interior do “Tabuleiro da Baiana”. Mais tarde, foi lançado o jornal diário “O Meio Dia”, que saia às doze horas. Eu o vendi também. Era do empresário Andrade Neto.
Durante o meu trabalho em frente a sede dos Correios, conheci uma senhora em uma Belina, de cor amarela, que todos os dias parava no início da ladeira da Rua Theodoreto Souto, pedia os três jornais e, em seguida, pedia para bater o tapete do seu carro e tirar um lanche no banco de trás do carro. Tinha suco, fruta e café com leite.
Durante a fase em que vendia jornal, conheci uma moça que trabalhava no Supermercado Agromar. Todo dia pegava ônibus junto comigo. Ela sempre tinha uma flanela para passar no local em que eu sentava. De tanto conversar com a moça, a convidei para ir ao Motel Cobras comigo, único que existia na época.
Levei quase um ano inteiro convidando-a, até que ela aceitou.
Pedi emprestado o Fusca do meu cunhado, Edson Paixão. Mandei lavá-lo todo e fui buscá-la. Chegando ao motel, ela tirou umas pílulas da bolsa, as tomou, tirou a roupa, ficou totalmente nua na cama e o “principal” não reagiu.
Nervoso, entrei no banheiro, imaginando-a nua e linda em cima da cama, mas nada aconteceu.
Decidi ir embora. No meio do trajeto, tive ereção, mas decidi que não voltaria mais ao motel e fomos embora.
Depois desse fato, procurei-a no supermercado, falei com ela algumas vezes, mas, decepcionada, não aceitou sair uma segunda vez.
Fiquei com esse trauma durante anos, mas depois passou, naturalmente.
COPA DO MUNDO DE 70, O GOVERNO MILITAR E O PROGRESSO NA BETÂNIA
No ano de 1970, em plena Ditadura Militar, a Seleção Brasileira ganhou o tri-campeonato de futebol de campo na cidade de Guadalajara, no México. O Governo aproveitou-se para fazer propagandas em cima do feito da seleção brasileira. Muitas músicas foram gravadas na época enaltecendo o Brasil e, no bairro da Betânia, começou o progresso: primeiro veio o asfaltamento da rua, depois surgiu o Bar Copa 70, um pouco antes existia o Bazar Centenário, tudo na Avenida Adalberto Valle, em que eu morava.
Adolescente, costumava vestir roupas pretas, ao estilo da moda lançada pelo conjunto musical “Os Incríveis”, com calças largas, boca de sino, para freqüentar o Bar Copa 70. Todas as vezes que eu entrava no bar, cheio de espelhos, para assistir a mulheres semi-nuas dançando no palco, uma garçonete sempre vinha sentar-se à mesa para conversar. Gostava da conversa e da companhia dela, mas nunca procurei saber o seu nome.
No Bazar Centenário, uma televisão e um rádio pequeno narravam o último jogo da Seleção. Depois do jogo, com o Brasil sagrando-se campeão, pulei e dancei de alegria, sem entender de nada. A música “Guadalajara, mora em meu coração” tocava a todo instante.
Havia um campo de futebol no nosso bairro. Gostávamos de assistir aos times, todos uniformizados, disputando as partidas com muita garra.
A CRIAÇÃO DO ISS, POR MANOEL RIBEIRO
No meio da noite, toca o telefone na redação do Diário do Amazonas. Era a Secretária Municipal de Comunicação da Prefeitura Municipal de Manaus, Celes Borges, me consultando sobre o que eu achava da idéia do prefeito Manoel Ribeiro passar a cobrar o Imposto Sobre Serviços na cidade de Manaus. Disse-lhe:
- Vou publicar uma nota no Diário do Amazonas sobre esse assunto e depois você pede a opinião do povo.
O ISS foi criado por Manoel Ribeiro. Eu, no Diário, de vez em quando publicava uma notinha sobre a idéia do prefeito, elogiando-o pela iniciativa. Acho que, hoje, o Imposto Sobre Serviços é uma das grandes fontes de receitas do Município de Manaus.
O projeto de criação da ZFM, aprovado em 1953 e só implantado em 1969, depois que a guerrilha cubana destituiu o ditador Fulgêncio Batista, com medo de a revolução comunista se espalhar pela Amazônia, nada falava sobre isenção de ISS para as empresas de serviços. A Amazônia, em 1969 era uma região totalmente desolada, mas com mão de obra barata em Manaus. O Governo Militar tratou logo de construir a Estrada Transamazônica, implantar o Projeto Calha Norte, construir batalhões de fronteiras na Amazônia e integrar a Região, com o resto do Brasil, por telefonia, através da Camtel, depois Telamazon. A Camtel era a Companhia de Telecomunicações. A CAMTEL era a Companhia Amazonense de Telecomunicações.
Durante o segundo governo de Amazonino Mendes, foi decretada a intervenção na Prefeitura de Manaus, afastado o prefeito Manoel Ribeiro e, nomeado o prefeito interventor Alfredo Nascimento. No meio da disputa política, Manoel Ribeiro recorre contra a intervenção, Alfredo é afastado e assume em seu lugar o presidente da Câmara, Carrel Ypiranga Benevides. Depois, volta o prefeito eleito que estava em Brasília, Manoel Ribeiro. O prefeito tinha sido acusado de superfaturamento de obras na construção de um Edifício Garagem pela Construtora Santa Bárbara e de não colocar asfalto em uma espessura de 5 centímetros. No dia da confusão, acusaram-no de ser proprietário de um prédio de apartamentos na Constantino Nery, que teve seu nome trocado por outro: era Edifício Manoel Ribeiro e passou a ter um outro nome.
Antes do Governo Militar, a Amazônia era esquecida; uma ligação de Manaus para o Rio de Janeiro, pela Cantel, pedia-se de manhã e tinha-se que esperar em casa, sem sair, até que ligação fosse completada. Levava, em média, sete horas de espera entre o pedido e a concretização do pedido. Hoje, tudo é mais fácil devido ao desenvolvimento da tecnologia.
“PRÊMIO ESCRITOR DO ANO”
Na década de 80, já tinha lançado o livro de poesias “(Des)Construção...” e, ainda, trabalhava em “A Notícia”. A apresentadora da TV Amazonas, Consuelo Nunes, lançou o “Prêmio Escritor do Ano”. Ganharia o prêmio o escritor que vendesse mais livros e fosse colocada em uma urna, o comprovante da compra. Eu, o Danilo Du Silvan e o poeta Jorge Tufic, fomos os participantes. No final, o Jorge Tufic ganhou o prêmio. O Danilo Du Silvan denunciou que havia fraude. Como ele não conseguiu provar nada, o Jorge recebeu o prêmio. Desde essa época, fiquei amigo do Jorge Tufic, a quem, até então, eu só conhecia pelos seus livros e de nome.
Fui e sou amigo do poeta Jorge Tufic até os dias atuais. Hoje, está morando em Fortaleza. Foi embora decepcionado com o Amazonas. Certa vez, em meu aniversário, apareceu em minha casa com o também intelectual Aloísio Sampaio. Os dois beberam tanto que dormiram nas cadeiras em que sentavam. Foi um porre daqueles!
PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA E A DEMISSÃO DE “A NOTÍCIA”
Ganhei alguns prêmios literários também. O primeiro, em nível nacional, foi no Paraná, quando fiquei em terceiro lugar em concurso de contos realizado na cidade de Paranavaí, em 1982, com o conto “Esses Ladrões”. Estava ocupando o governo o intelectual Homero de Miranda Leão, que decidiu me dar a passagem para ir receber o prêmio. Consegui a licença do jornal e fui. Só não sabia que o senhor Andrade Neto estava negociando a venda do jornal para o empresário José Moura Teixeira Lopes, o “Mourinha”.
Como tinha tirado férias, viajei ao Paraná. Segui, depois, para Paranavaí, com o irmão do floriculturista de Manaus, Nelson Buoro. Deixei o Paraná e, usando o dinheiro do prêmio, viajei para São Paulo, descendo depois para a cidade praiana de Santos, onde fiquei hospedado na residência da família Henriques. O pai, senhor Henriques, era funcionário da Petrobras na cidade de Cubatão e tinha dois filhos: Sandra Regina Henriques, com quem me correspondia por carta desde os meus 15 anos e André Henriques, que tocava nas noites de Santos.
Voltei para Manaus ao término de minhas férias, apresentei-me ao novo dono do jornal. Fui escalado por ele para cobrir o coquetel de inauguração de sua fábrica “Jacks da Amazônia”. Não fui, mas pedi para a repórter Ivânia Vieira ir no meu lugar. A matéria foi publicada normalmente, mas eu fui demitido do jornal.
Como era membro da Cipa e ainda tinha quase um ano de mandato para cumprir na função, procurei o senhor Andrade Neto. Ele esteve em minha casa:
- O “Mourinha” está irredutível!
Minha demissão foi concretizada no dia 25 de fevereiro de 1983, pelo senhor José Augusto de Souza Baird, porque fui para a TV Amazonas no mesmo horário, produzir um jornalismo eletrônico que nunca foi ao ar. Entrei na Justiça para que o jornal indenizasse o meu período de mandato na Cipa ou determinasse minha volta ao trabalho. A Justiça determinou minha reintegração, mas “Mourinha” preferiu pagar meu salário sem eu trabalhar e ainda me avisou:
- Onde você estiver, lá não estarei.
Dias depois disso, na Cruz Vermelha Brasileira, dirigido no Amazonas por Francisco Portela, da qual eu também fazia parte como membro, encontrei o “Mourinha”. Ele me cumprimentou e se afastou. ·.
“BAIACU DE OURO”
Depois ganhei o prêmio “Baiacu de Ouro”, o único que recebi em Manaus, depois que já tinha sido demitido de “A Notícia”, ofertado pelo colunista social Carlos Aguiar, no Hotel Tropical, ganhei outras medalhas e Comendas Literárias em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e tenho biografias publicadas em Teresina-PI, por Adrião Neto, e, em Manaus, pelo pesquisador, cronista e crítico literário, Arthur Engrácio.
Registrou todo o evento o fotógrafo da entrega do “Baiacu de Ouro”, by Barros, de origem cearense, que foi “lambe-lambe” na Praça da Matriz, mas virou fotógrafo profissional.
O Barros, já famoso em Manaus, foi um dia visitar seu pai no Ceará, homem de poucos estudos, levou um exemplar para mostrar ao pai. Quando o cearense, homem pobre, sério e rude, mas honesto, viu “fotos by Barros” – como o Carlos Aguiar escrevia no jornal, perguntou:
- Esse by Barros aqui não significa que você virou boiola, não?
O Barros teve que explicar-lhe que embora estivesse escrito “by”, a pronúncia correta era “bay”.
- Assim, melhorou.
ASSESSOR DE COMUNICAÇÃO NA MINERAÇÃO TABOCA S/A
Durante quatro anos, foi assessor de comunicação da Mineração Taboca S/A, empresa instalada no município de Presidente Figueiredo, que explora cassiterita.
Entrei na empresa depois de uma reportagem que escrevi em “A Notícia”, com uma entrevista feita com o geólogo Waltair Prata Carvalho. Fui convidado a conhecer o projeto e escrever a matéria pelos diretores do Departamento Nacional de Produção Mineral, José Belfort dos Santos Bastos e Fernando Burgos. Todos gostaram da matéria de página inteira que havia publicado.
Durante os anos em que trabalhei na empresa, fiz duas amizades que permanecem ao meu lado até hoje: a advogada Ivete Ivo Barros, de origem paulista e o hoje empresário Flávio Willer Cândido. Tratando assuntos da empresa Mineração Taboca S/A junto à empresa EMTU – Empresa Municipal de Transportes Urbanos, fui recebido cordialmente pela advogada Ivete Ivo Barros.
Tinha ido à EMTU pedir autorização para os ônibus que transportavam os funcionários da empresa saíssem e deixassem os trabalhadores no terminal de embarque/desembarque da Empresa Municipal de Transportes Urbanos. Recebi a autorização, depois de muito negociar com a advogada da empresa.
Flávio Willer Cândido era um dos motoristas da empresa Marlin que fazia o transporte de funcionários, mas também era o responsável por desatolar os carros que geralmente ficavam presos na estrada BR-319, ainda sem asfalto. Depois, devido a sua dedicação, tornou-se sócio da empresa Marlin, fez vestibular, entrou e concluiu a faculdade de Direito e diz que esse vai ser esse o maior exemplo de vida que deixará para os seus filhos gêmeos, Lucas e Mateus.
A advogada Ivete Ivo Barros estava grávida, sensível, e muitas vezes a encontrei deprimida. Ela estava esperando o seu segundo filho, o Onete Júnior. Eu, na época, também tinha crises de depressão e nós nos ajudávamos mutuamente.
Fui contratado dias depois e passei quatro anos seguidos na empresa. Durante esse período, convidado, por ofício, pelo Secretário de Saúde do Governo Amazonino Mendes, Humberto Figlioulo, para assessorá-lo. Fui liberado para compor um Grupo Tarefa de Reestruturação Administrativa da Sesau.
Estava almoçando junto com o Secretário Figlioulo quando o telefone tocou. Era o Governador Amazonino Mendes, convidando-o para ir ao Palácio. Foi mas voltou de lá demitido pelo governador
Retornou à Sesau o ex-Secretário Euler Ribeiro, com quem diariamente eu despachava. Fiz isso durante 30 dias. Já próximo ao final do ano, comunico a ele que o Dr. Theomário Pinto da Costa, amigo dele e ex-deputado estadual e ex-Secretário de Saúde, tinha entrado em coma na Bahia.
Olhando-me de cima para baixo, respondeu:
- Tu não és filho adotivo dele, por que ainda continuas por aqui? Eu te demiti no dia em que assumi a Sesau.
- Mas, doutor Euler, eu todos os dias despacho em seu gabinete com o senhor e de nada fiquei sabendo!
- Isso é problema do Departamento de Pessoal. Resolva lá!
Demitido da Sesau, voltei para a Mineração Taboca. Tive novamente a carteira assinada, mas como relações públicas, que nunca fui, com as mesmas atribuições de antes.
Durante essa nova fase, recebi um engenheiro alemão no staff da empresa, que tinha vindo montar as turbinas da hidrelétrica do Pitinga. Ficou o geólogo “Arapiraca” encarregado de ensinar algumas palavras em português para o alemão, pelo menos o básico.
No dia em que estavam almoçando na mina do Pitinga o presidente José Sarney, sua esposa Marli Sarney e toda a sua comitiva, com o dono da empresa, Octávio Lacombe, o engenheiro pede licença, põe sua mão na cabeça, levanta da mesa e diz:
- Me dão licença, por favor. Eu estou com muita dor na minha boc...
Todos riram ao mesmo tempo, menos o Sr. Lacombe, já que sabia que o “Arapiraca” tinha ensinado tudo errado para o engenheiro. Depois do almoço, foi conversar com o “Arapiraca”.
ASSESSOR DE COMUNICAÇÃO NA ACA
Iniciei prestando serviços na centenária Associação Comercial do Amazonas, na administração do empresário José Lopes da Silva. Era o diretor de comunicações na época, o jornalista e empresário Milton de Magalhães Cordeiro.
Ele foi um dos primeiros a criticar a implantação da fábrica de cimento em Manaus na época em que só vendiam na cidade o cimento Poty. Ele dizia que, depois de implantada a fábrica em Manaus, a empresa faria dumping, vendendo cimento ao preço menor do que o de mercado. Quando a representação da Poty falisse, ela subiria seus preços. E foi exatamente isso que aconteceu.
O empresário Francisco Garcia Rodrigues chegou a importar cimento da Turquia, que era reembalado com o nome de cimento Garcia e vendido no comércio de Manaus. Mas também fechou, não agüentando a concorrência da Fábrica de Cimento Nassau.
No lugar de José Lopes, assumiu a presidência da ACA o empresário Jorge Loureiro. Ele criticava muito o Governo Federal em todo e qualquer assunto que ferisse os interesses do comércio da Zona Franca.
De tanto mandar ofícios para o Governo Federal, um dia o presidente da República, João Figueiredo, veio ao Amazonas e o chargista de “A Crítica”, Miranda, desenhou a caricatura do presidente e dos seguranças dele e pedia:
- Primeiro, dêem uma olhada para ver se esse Jorge Loureiro não está no aeroporto me esperando também!
Rimos muito dessa charge de “A Critica”, pois ela refletia muito o grau de importância que o Governo Federal estava dando para os assuntos relacionados ao nosso modelo de desenvolvimento.
Deixei a ACA ao final do mandato do senhor Jorge Loureiro, mas sempre trabalhei por contrato de prestação de serviços autônomos.
Também fui assessor de comunicação na LBA, já extinta, fui ser repórter entrevistador na Rádio Baré, comandada pela empresária Dra. Celma, em que apresentávamos um jornalismo dinâmico, que veiculava o fato no momento de sua ocorrência. Por pouco tempo, apresentei um programa musical com Augusto Cláudio Pantoja, à meia, mas gravado às 19H00, com relógio e tudo para informarmos a hora certa a cada intervalo do programa. Depois, fui trabalhar na TV Baré, como repórter entrevistador.
THEOMÁRIO PINTO DA COSTA / DULCE PINTO DA COSTA
Eu tinha onze anos e pesava pouco mais de 30 quilos quando passei a morar com o casal Theomário Pinto da Costa e Dulce Fernandes Neves Pinto da Costa.
Fui apresentado a eles pelo pedreiro José Campos da Silva, que tinha uma micrempresa de construção e para quem datilografava os recibos. José Campos fazia uma obra na casa dos Costa
Passei a ser criado como filho. Ele não tinha filho homem, só tinha um de criação, Luiz Augusto, filho de uma cunhada dele, irmã da esposa. Tinha, também, uma filha, Thelma Fernandes Pinto da Costa que, depois, pelo casamento, passou a se chamar Thelma Castelo Branco.
Moravam na casa, além dos outros: uma índia chamada Mercedes, conhecida como “Maricota”, Maria Meirelles, cozinheira que, depois de estudar foi ser professora no município de Autazes. Reinaldo Fernandes Neves Filho, o “Nadinho”, filho do primeiro Governador do então Território de Roraima, o Carlos Alberto, o “Cacau” e a Eliane, hoje uma conceituada médica pediátrica, casada com o Francinete Teixeira, filho da tradicional família do Sr. José Leite.
Havia também a dona Zizi, também baiana, mãe de Dulce Fernandes Neves Pinto da Costa, a esposa do Dr. Theomário. Dona Zizi, como eu me acostumei a chamá-la, era uma pessoa incrível. Foi quem me deu o primeiro presente que ganhei na vida – um cavalinho feito todo em couro. Contudo, para merecê-lo, tinha que mostrar, diariamente, minhas notas da escola primária “Adalberto Valle”. Quando ela encontrava alguma nota abaixo de 10, aconselhava-me a estudar mais um pouco para tirar notas melhores porque eu era “inteligente e tinha potencial”.
O Dr. Theomário, que também era professor da Faculdade de Medicina e já tinha sido deputado estadual e Secretário de Estado da Saúde, aos sábados, sempre de bermuda branca e sandálias da mesma cor, esperava-me acordar – o que sempre era cedo, e mandava-me comprar carteira de cigarros “Carlton” – ele fumava muito, por isso talvez tenha falecido vítima de câncer nos pulmões.
Depois que eu voltava da compra, olhava de soslaio para o carro Corcel I, da Ford, amarelo, que ele usava e dizia para mim:
- Acho que meu carro está um pouco sujo na lateral. Isso era o sinal para eu pegar água, escova e ir lavá-lo. Nem sempre estava sujo, mas eu tinha que bater os tapetes também. Era um ritual de todos os sábados. Depois disso, tinha que passar cera vermelha num imenso pátio que dividia a casa principal de uma segunda casa aos fundos, onde todos comiam juntos - menos eu, que comia antes para poder ir à escola. Durante a semana, semana, dava banho na cachorra “Leika”. Aos finais de semana, terminadas as tarefas, eu recebia meu dinheiro para ir ao cinema.
O Luiz Augusto, adolescente, seperava a comida no prato e era chato para fazer suas refeições. A Dra. Dulce chegou do seu consultório trazendo um embrulho nas mãos e perguntou para a Maria Meirelles:
- O que a senhora fez para o almoço de hoje?
- Quiabada, como a senhora pediu!
O Luiz Augusto, já sabendo o que teria para o almoço naquele dia, foi chamado para comer:
- Estou sem fome, “dinha”, diminutivo carinhoso de madrinha.
- Venha, Luiz, a comida está muito gostosa.
Ele sentou-se à mesa. A Dra. Dulce colocou a comida no prato, e ele ficou olhando com cara de nojo.
- Coma, Luiz, a comida está muito gostosa!
Ele começou a comer. Logo entrou no banheiro que havia embaixo da escada e levava ao andar superior dos fundos da casa.
- Luiz, tome um pouco desse remédio que eu trouxe para você!
O Luiz tomou o remédio e começou a provocar.
- Agora, Luiz, volte para a mesa e coma mais um pouco!
Depois desse dia, o Luiz Augusto nunca mais separou comida no prato.
A casa dos Costa era sempre farta de comida, mas ninguém podia estragar.
Depois de assistir a um show em Manaus, do Festival de Wodkstok, que protestava contra a guerra americana no Vietnã e implantou a moda hippie no mundo, o Carlos Alberto entra em casa, usando tamanco de madeira, o cabelo todo penteado para cima, com escova de pregos, cantando a música de Tony Tornado, BR-3. Achei engraçado o jeito dele.
Essa convivência mudou a minha vida para sempre!
FRANCISCO SALDANHA BEZERRA, empresário.
Criou a Apetram, depois o Sinetram, mais tarde, com Aviz do Amaral Valente, fundou e passou a presidir à Federação das Empresas de Transportes Rodoviários da Região Norte – Fetranorte, ajudou a criar as instituições SEST/SENAT, que a elas preside até os dias de hoje. Fui assessor de imprensa na Apetram, assessor de imprensa do Sinetram e depois superintendente no Sinetram, substituindo o Dr. Maury de Macedo Bringel, e diretor do SEST e do SENAT, duas instituições criadas por decreto do presidente Itamar Franco e presidida pela Confederação Nacional do Transporte.
Francisco Bezerra teve tudo para ser suplente do senador Fábio Lucena e não aceitou. Áureo Melo aceitou e terminou o mandato de Fábio no Senado, depois que ele se suicidou. Perdeu suas duas empresas de ônibus, mas não se abateu, embora tenha perdido em duas canetadas U$ 15 milhões. Costuma dizer que através do SEST e do SENAT tem maiores e melhores condições de ajudar o povo carente. Convivo com ele há mais de 25 anos.
Um dia, às vésperas do Natal, as empresas dele cassadas, fui até o escritório e lhe disse que estava sem dinheiro. Ele respondeu que tinha no bolso R$ 50 reais. Se eu quisesse a metade do valor, podia entrar no carro dele. Ele ia trocar o dinheiro. Aceitei. Nunca mais esqueci esse seu gesto e nem me sai da memória a cena daquele dia.
A HISTÓRIA DA EMPRESA SANTA LUZIA
Em fevereiro de 1978, Francisco Bezerra iniciou um trabalho de revitalização da empresa – Viação da Amazônia Ltda - VIAMA, antiga Ana Cássia, de propriedade do empresário Cassiano Cirilo Anunciação, o “Batará”. Na época, era prefeito de Manaus nomeado por Henock da Silva Reis, filho de um padeiro em Manacapuru, trazido para Manaus por André Vidal de Araújo, o coronel de Exército Jorge Teixeira de Oliveira, que tinha grandes problemas com o Cassiano, principalmente devido à gestão comportamental na condução da empresa. Eram necessárias medidas mais modernas para gerir uma empresa de transportes coletivos, coisa que o Cassiano não conseguia fazer.
A empresa Ana Cássia foi vendida para o então Deputado Federal Francisco de Oliveira Rocha, que logo colocou o nome de Viação da Amazônia Ltda. Ele mudou o nome de Ana Cássia para VIAMA. O BEA – Banco do Estado do Amazonas, o avalista do negócio, indicou Francisco Bezerra, funcionário do Banco, para a Gestão Financeira da Empresa. O já empresário convidou o senhor Cid da Veiga Soares para o auxiliar na tarefa. Depois de vários levantamentos no Grupo Rocha, decidiram vender a Viação Alvorada, do DF e a Viação Itaguaí Ltda., do Rio de Janeiro, ficando só a VIAMA, em Manaus, pois assim, teria mais credibilidade a gestão.
Depois da venda as duas empresas, foram pleiteadas junto ao BEA as linhas que tinham sido transferidas em caráter precário para a Soltur, e Francisco de Oliveira Rocha ficou com participação acionária na nova empresa: Francisco Bezerra ficou com 70% e Cid Soares, com 30%. Havia um outro sócio, Enock Bezerra, que foi devidamente indenizado por Francisco Bezerra e Cid Soares.
Depois de dezoito anos fazendo a revitalização da Empresa Santa Luzia, houve uma cisão societária na empresa, dividida por três sócios. Cid Soares havia contraído dívidas junto ao BEA e não tinha como pagar. Francisco Saldanha Bezerra indenizou-o e ele deixou a sociedade, isto ao longo de anos, após tomar várias medidas saneadoras. O outro sócio, Enoch Bezerra, foi devidamente indenizado por Francisco Bezerra e pelo Cid Veiga. Desta cisão, nasceu a nova empresa com o nome de Viação Santa Luzia Ltda., uma homenagem prestada ao bairro onde ficava a garagem. Mais tarde, convidou sua esposa, Zilmar Bezerra e seu filho, João Bezerra para comporem a sociedade da empresa.
VIAÇÃO SANTA LÚCIA
A Viação Santa Lúcia Ltda nasceu de parte adquirida da Ostur Transportes, de propriedade do senhor Osmar Vieira da Costa, em sociedade com Luiz Roberto Caldeira, Paulo Queiroz e Maury de Macedo Bringel. Maury Bringel foi convidado para comandar a nova empresa. Ela operou até o ano de 1993 quando, no mês de Abril, por motivos puramente políticos, foi cassada pelo então prefeito de Manaus, Eduardo Braga.
Além destas empresas, Francisco Saldanha Bezerra fundou a empresa Viação Amazonense de Transporte Ltda.
A VIMAM, que tinha um sócio paraense, foi vendida para José Henrique de Oliveira, que a rebatizou de Vitória Régia Ltda.
DIRETOR DO SEST/SENAT POR DOZE ANOS
Formado em Serviço Social em 1995, administrei o SEST/SENAT desde o processo de aquisição do terreno para a sua construção, fui nomeado depois diretor, quando a Unidade ficou pronta, recebi todos os móveis e, junto com o diretor financeiro da época, indicado também pelo presidente da Fetranorte, fizemos a contratação de todos os funcionários.
Dando aula na Faculdade Nilton Lins, no curso de Serviço Social, em uma sexta-feira à noite, perdi totalmente minha audição. Na segunda-feira, ainda sem ouvir, procurei um médico que me recomendou procurar um cardiologista e receitou os remédios que não comprei. Fui ao escritório da Fetranorte e comuniquei meu problema ao presidente Francisco Bezerra. No expediente da tarde, procurei o cardiologista Edward Costa Júnior. Após os exames, disse que:
- No coração você também não tem nada, mas por via das dúvidas, vou lhe passar um pedido de tomografia computadorizada. Caso o seu Plano de Saúde não aceite a requisição e não a autorize, você procura um neurologista e pede para ele te pedir uma nova tomografia.
Não foi necessário. O Plano de Saúde aceitou, autorizou e fui para casa almoçar. Depois do almoço, procurei a empresa para realizar a tomografia. Saí da MAGISCAM direto para a internação. Eu tinha um coágulo na minha cabeça, de mais ou menos dois centímetros e meio. Ao ver minha tomografia, o médico pensou que eu tinha tido um derrame cerebral, mas como eu movimentava e falava normalmente, pediu uma ressonância magnética para ter um diagnóstico mais preciso. Mas o resultado não foi nada animador e o médico disse que não sabia o que eu tinha e recomendou uma cirurgia de emergência.
Na condição de representante da Fetranorte, tinha presidido por duas vezes a Comissão Estadual de Emprego, que administrava os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, no Amazonas. Só deixei a direção do SEST/SENAT para fazer uma cirurgia de craniotomia para drenagem de um empieme subdural bilateral, inicialmente pelo médico Dr. José Vieira. Depois, o médico peruano Dr. Dante Luis Garcia Rivera prosseguiu meus atendimentos e cirurgias posteriores. Já operei por sete vezes, sendo cinco vezes em Manaus e duas em São Paulo, no Hospital São Joaquim, da Beneficiência Portuguesa. Na quarta crâniotomia a que foi submetido, mandei realizar um exame histoquímico, realizado somente em São Paulo, na clínica do Dr. Carlos Bacchi, em do material recolhido em Botucatu. Recebi como resposta que eu estava com leiomiossarcoma de alto grau (câncer). Não acreditei no resultado do exame do médico especialista, Carlos Bacchi, consultor de faculdades internacionais, mas viajei para São Paulo para fazer revisão de lâmina. O resultado deu negativo em três laboratórios diferentes. No Hospital Português São Joaquim, fui atendido pelos médicos Drs. Antonio Almeida e Dra. Valéria. Môio.
Como diretor do SEST-SENAT, formei uma equipe profissional comandada pela psicóloga Vera Lúcia, mais tarde substituída pela pedagoga Ana Quadros da Silva. Durante esse período, fazíamos muitos convênios com órgãos públicos, inclusive com a Secretaria de Estado do Trabalho e Bem-Estar-Social, administrada pela assistente social Maryse Mendes, para desenvolver o projeto “Serviço Civil Voluntário”. Com esse trabalho, Unidade Manaus do SEST/SENAT recebeu vários prêmios, um a nível nacional.
Depois, tendo por prefeito Alfredo Nascimento, voltamos a ter um convênio com a Prefeitura para desenvolver o programa “Criança Urgente”, que retirava meninos das ruas e os levava para a instituição onde eles tomavam café, lanchavam e depois voltavam para as ruas. Antes, recebiam toda uma proteção, com palestras e aulas de formação profissional para as suas “inserções” na sociedade. Desse período, lembro-me bem das assistentes sociais, Rosalina Maués e Graça Prola, subsecretária de Ação Social do Município.
Tive a oportunidade de ir a Brasília, levando uma aluna do Projeto Serviço Civil Voluntário, para receber um prêmio nacional sobre Direitos Humanos, das mãos do presidente Fernando Henrique Cardoso. Depois, com a mesma aluna, viajei para a Bahia, onde ela se apresentou aos alunos de outros projetos iguais ao que eu desenvolvia em Manaus.
BAIRRO DA BETÂNIA, ONDE MOREI
Antes de mudar-me para a residência da família Costa, residi alguns anos no bairro da Betânia. Era um bairro tranqüilo, cheio de areais, cajueiros, buritizeiros. Não havia luz elétrica, ainda. Mas havia ônibus, que nem sempre conseguiam entrar pela rua principal do bairro, o que nem sempre era possível. Também não tinha água no bairro. O progresso só chegou ao bairro na administração dinâmica do prefeito Jorge Teixeira de Oliveira.
Havia uma área que era chamada de “as cacimbas”, em que todos os moradores tinham uma. Depois de aberta, a cacimba no meio da areia branca, tinha que ser colocada uma tampa de madeira com cadeado para evitar que estranhos toldassem a água.
Terminávamos a partida de futebol na rua e depois íamos tomar banho nas cacimbas. Mas era necessário levar a chave para abrir o cadeado. Um não podia tomar banho na cacimba do outro.
Havia um frigorífico da empresa Bordom, onde existe hoje o Supermercado DB, na Avenida Costa e Silva. Atrás do frigorífico, tinha uma fazenda de gado e um cajual, além do pasto para os bois. Também tinha o Igarapé do 40, com suas águas cristalinas, sem qualquer tipo de poluição, no qual nadávamos à vontade. No início da abertura da Avenida Costa e Silva e antes de construírem a ponte por cima do Igarapé do 40, havia uma grande árvore no local.
Sempre íamos brincar no local, pulando n´água e descendo até a área em frente às cacimbas, em que também parava o motor de pesca de meu pai.
Com a conclusão da Avenida Costa e Silva, teve início a construção do Conjunto Jardim Brasil, talvez a mais antiga construção de apartamentos em Manaus. Depois dessa construção, começou a poluição no Igarapé do 40.
O jogo de peladas no meio da rua, peão, cangapé, barra-bandeira, 31 alerta, kamone (como a meninada pronunciava a expressão norte-americana "Call mone, boy", que a gente ouvia nos filmes de bang-bang do Guarany, ou seja, em tradução livre "Alto lá, rapaz"), estátua e jogo com bola de gude eram as nossas brincadeiras favoritas. Em frente a minha casa, havia um terreno cheio de mato. Era o local preferido para os nossos esconderijos quando brincávamos de 31 alerta.
O Jorge Lopes da Silva, baixo, entroncado e bom de bola, era sempre o primeiro a ser escolhido no processo de formação dos times de pelada. Ele era bom de bola, driblador e não passava a bola para os seus companheiros. Pegava a bola, passava por um, por outro e geralmente terminava fazendo o gol. Tinha, também, o gol das dezoito horas. Ganhava o jogo o time que fizesse o gol antes de escurecer, mesmo que o outro time estivesse vencendo. Normalmente, as partidas começavam às 18h e terminavam quando a bola não era mais vista pelos jogadores.
A escolha dos times para as partidas era feita através do tradicional par ou impa. Quem vencesse no par ou “impa”, começava a escolher os peladeiros. Quando não tinha mais nenhum jogador a ser escolhido, começava a partida. Às vezes. havia time fora para entrar, mas nem sempre.
Um rapaz, com camisa de seda branca, todos os dias ia esperar a namorada dele no poste que usávamos em nossas brincadeiras. O Jorge bolou um plano, mas não o revelou para os amigos. Pegou uma imensa vara, colocou um chumaço de pano na ponta, foi no quintal, enviou dentro da “privada”, como eram chamados, na nossa época. os poços cavados aos fundos do quintal das casas. Quando o rapaz apareceu, o Jorge foi desafiá-lo para uma briga. Como o rapaz era grande e forte, e o Jorge era baixo, mas entroncado, viu na luta a possibilidade de vencer e estabelecer no poste o seu território. No meio do desafio, o Jorge pegou a vaga preparada e tentou cutucar o rapaz que, desavisado, segurou no chumaço de pano preparado, e o Jorge puxou: “espirrou fezes para todos os lados e encharcou a blusa do rapaz”. Ele nunca mais apareceu.
Também vivi a fase das brincadeiras em residências. Sempre freqüentávamos a casa do senhor José Maria Palmeiras, que tinha dois andares e uma ampla sala. Os filhos dele, Nathan Palmeiras e José Carlos Palmeiras eram nossos amigos. Em uma dessas festas, conheci a Cléia, com quem fiquei por muitos meses. Gostava de ir à casa de Cléia, com quem cheguei a namorar, porque sempre a mãe dela preparava “uma galinha de terreiro” e eu ouvia as músicas do cantor Chisthofer.
Minha residência foi utilizada, também, para promover festa. Mas, como eu gostava muito de ouvir música e a ouvia sempre alta, a jornalista Baby Rizzato, ao passar em frente, sempre olhava para dentro e via que era eu ouvindo música alta. Em certa oportunidade, falou:
- A tua casa era muito festeira!
Sempre procurávamos saber, ao terminar uma brincadeira regada a “leite de cabra”, “leite de tigre” e licor feito com bombom de hortelã “pipermeyte”, muito consumido na época, onde seria a próxima brincadeira. Foi assim que conheci Aparecida Chaves, filha única de um caminhoneiro. Com a “Cida” nunca namorei, mas quase todos os dias, a visitava e dormia na casa dela, durante às tardes, quando não havia aula. Seus pais me adoravam, e a mãe dela sempre fazia comida deliciosa quando eu visitava a garota.
Sobre essas brincadeiras sem armas, drogas ou bebidas alcoólicas, escrevi uma crônica chamada “Tempos de Ontem”, publicada no meu livro “Crônicas Comprometidas com a tua vida”.
A primeira televisão que chegou ao nosso bairro foi na casa da dona Raimundinha, onde a molecada fazia fila para ficar espiando a programação da TV pela janela. As primeiras televisões eram de válvulas e seletor de canais. As válvulas precisavam esquentar para depois o sinal ser recebido. Ela sempre autorizava a entrada da molecada, que ficava sentada na sala
Mais tarde, meu pai comprou a nossa. Tinha uma única retransmissora em Manaus, a TV Ajuricaba, fundada pelo casal Sadie e Kalled Hauache, que entrava no ar, com músicas, somente às 15 horas. Alguns profissionais fizeram história na televisão em Manaus: Arnaldo Santos, apresentando o seu programa “AS nos Esportes”, Célio Antunes, apresentando o jornal na TV, Luiz Eduardo, também apresentando jornal na TV. Mais tarde, com a TV Amazonas funcionando, retransmitindo o sinal da TV Bandeirantes, Patrícia Bartoloti, Luiz Almeida, o “Marron”, também fizeram história no jornalismo. Tinha também o programa infantil do “Titio Barbosa”, apresentado ao vivo com a sua filha Marília Barbosa, na extinta TV Ajuricaba, da família Hauache.
TRABALHANDO NO CONSÓRCIO UNIÃO
Adolescente, em busca do meu primeiro emprego, trabalhei no Consórcio União, dirigido por Edson da Silva Massulo, depois, trabalhei no escritório jurídico do Dr. Carlos Abner de Oliveira Rodrigues com os estagiários João de Deus Gomes dos Anjos e Guilherme de Mendonça Granja.
Durante meu trabalho no Consórcio União, tinha uma visão privilegiada do estúdio de transmissão da Rádio Baré. Foi assim que passei a conhecer a radialista Jerusa Santos, uma das mulheres pioneiras na profissão. Depois, conheci José Costa de Aquino, o “Carrapeta”, que se elegeu vereador e deputado estadual com o programa de muita audiência que mantinha na rádio. Era um campeão de votos na época. Depois, o radialista da Rádio Rio Mar, Erasmo Amazonas, também foi campeão de votos para sua época.
O Dr. Carlos Abner tinha o costume de pedir para eu comprar para ele, no Lanche Ziza´s, um copo de milk-sheik e pegar uma coxinha de frango no lanche do Chang, ao lado do Edifício Cidade de Manaus. Era o almoço dele.
Descia, pedia o milk-sheik no Ziza´s e depois me dirigia ao lanche do Sr. Chang, que fazia a melhor coxinha de galinha de Manaus. Ela era feita com macaxeiras e tinha dentro uma azeitona e uma coxa de galinha, com carne e o osso.
O lanche do Sr. Chang, que trabalhava com sua esposa e os filhos Chang, hoje ortopedista e a Yamim, que os ajudavam, atendendo no balcão.
A família Chang produzia e entregava, em outros lanches, as coxinhas de galinha produzidas durante um dia inteiro de trabalho.
“PROGRAMA DEBATES”
Como repórter de “A Notícia”, sempre era convidado para participar dos debates políticos na TV Amazonas, apresentado pela jornalista Beth Azize. Quando ela não podia ir, eu apresentava sozinho o programa. Um dia, recebi um telefonema às 22h20min informando-me que a apresentadora titular não iria. O programa entraria no ar às 22h30min.
Não calcei nem o sapato, fui de sandália mesmo, mas pedi ao câmera que não desse close no meu pé. Ele abriu o programa dando um close exatamente no meu pé. Logo depois disso, deixei de fazer ou ser convidado para os programas “Debates”.
REPÓRTER ENTREVISTADOR NA TV BARÉ
Durante mais de um ano, trabalhei como repórter entrevistador na TV Baré, antes de ser adquirida pelo jornalista Umberto Calderaro. Era meu câmera o profissional Mário César Dantas e o auxiliar era Pedro.
No dia em que o primeiro jornal ia ao ar, o profissional da TV Gilberto Piranha correu pelos corredores da televisão, pedindo o sobrenome do Pedro.
Gritei:
- Coloca Pedro “Bala”.
Estávamos todos juntos eu, Mário César Dantas e o Pedro quando começaram a parecer os caracteres. Pedro leu: “Auxiliar de Câmera Pedro Bala”. Imediatamente gritou:
- Pedro Bala, não! Eu tenho nome! Pedro “Bala” é a pu...que...pariu!
O Mário César Dantas ponderou:
- Mas você agora vai ficar famoso como o nome artístico de Pedro Bala!
- Ah, esse é nome artístico?
- É...
- Então, tá, eu aceito.
Hoje, ele é um profissional competente e continua trabalhando na mesma TV A Crítica, do sistema Umberto Calderaro Filho de Rádio e Televisão.
DE VOLTA À FACULDADE
Depois de exercer o jornalismo como repórter, editor de cidade, pauteiro, cronista e editor geral de vários jornais em Manaus, decidi abandonar tudo e voltar à Faculdade para iniciar e concluir o curso de Serviço Social. Fiz vestibular, primeiro, para o curso de Direito e freqüentei regularmente até o 5º período. Tive duas grandes amigas durante o Curso de Direito, a hoje advogada Vanessa Litaiff e a bacharel em direito Marlíase. Sobre Vanessa, eu sempre lhe dizia que ela não deveria ficar só advogando, mas fazer um curso para juíza de direito ou promotora de Justiça. E ainda penso a mesma coisa sobre ela. Abandonei o curso para assumir a chefia de gabinete em Manaus do deputado federal Carlos Souza, atividade que exerci por quatro anos.
No dia da matrícula no curso de Serviço Social, encontrei a professora Magela Andrade. Como repórter, conheci a professora participando de movimentos sociais. Ela me interrogou:
- Você, por aqui? Vem fazer entrevista comigo ou sua matrícula?
- Vim fazer minha matrícula.
- Vai terminar, ou só começar?
- Desejo terminar porque, com o jornalismo, só ganhei gastrite, úlcera e outras doenças.
Concluí a matrícula.
A professora tinha razão em sua pergunta. Junto comigo, passaram mais três homens. Eu era o quarto homem em uma sala de 36 mulheres. Um do município de Parintins, só começou; o outro, abandonou logo depois. Só eu e o Odenias Raimundo, o “ODD”, conseguimos concluir o curso, em turmas diferentes. Conclui o curso com média bem acima de todos.
Depois, em sala de aula, a professora Magela Andrade começou a produzir esquemas que eu apelidei de “magelíticos”, uma vez que tudo era feito com setas de um lado para outro e poucos entendiam.
Tivemos outros bons professores: o Carlos Humberto, de Metodologia do Estudo, Maria do Socorro Chaves, Heloisa Helena, Terezinha Praia, Cristiane Bonfim, Marinez, Iraildes Caldas (Torres), Rita de Cássia Montenegro e muitas outras.
No 5º período, quando começamos a fazer promoções para a formatura, a nossa sala estava dividida: de um lado, a Telma da Conceição comandava um grupo e do outro, eu comandava outro grupo. No centro da sala, não sentava ninguém. Isso tudo aconteceu porque uma professora de Antropologia, defensora intransigente do índio Paulinho Paiakã, que tinha violentado uma professora na cidade de Belém e foi se refugiar na aldeia para fugir da justiça. Como não aceitava a maneira que ele tinha praticado o crime, uma vez que ele era piloto de avião, tinha vivido entre os brancos e possuía identidade e CPF, não deixei a professora dar aula. Com isso, houve a divisão porque um grupo apoiava os argumentos da professora, e outros não a apoiavam.
Identificando nitidamente a divisão que havia, chegou uma professora para ministrar aula de psicologia. Ela conseguiu a paz entre os dois grupos. Acabei dando uma flor vermelha de presente para minha rival.
Depois disso, conseguimos concluir o curso sem brigas e com muitas amigas inesquecíveis: Ruinaltina Moraes Pires, Paula Francinete Batista, Rosaney Ramos de Assis, Adriana Evangelista, Graciete e muitas outras. O meu livro “O Caminho não percorrido – a trajetória dos assistentes sociais masculinos em Manaus”, resultado da monografia que produzi durante o curso, foi dedicado à Ruinaltina Moraes Pires, a Tina.
Convidamos a professora Rita de Cássia Montenegro para ministrar a “Aula da Saudade”, para matar a “saudade das aulas que ela não deu”, por viajar muito para Belém. Foi uma aula magnífica.
Com relação às viagens da professora Rita, devota da padroeira da cidade de Belém, sempre que ela retornava, trazia a receita de uma dieta milagrosa.
Entrando em sala, após uma de suas viagens para participar do Sírio de Nazaré, macérrima, com uma bolsa no braço, uma saia bem justinha; a aluna Rosaney não resistiu e, sem pensar, disse:
- Professora, a senhora com essa bolsa, essa saia e macérrima do modo que está, parece uma puta!
- Rosa, você sempre diz tudo o que pensa?
- Sou assim. Se eu penso, ponho para fora na hora.
Todos riram da situação.
A Rosaney era tão desligada, tão desligada, que se apresentava assim na hora da chamada: “Rosaney Ramos de Assis, que já foi “Cardoso”. Todos riam! Ela era muito espontânea em sala de aula.
REPRESENTAÇÃO DO DEPUTADO FEDERAL CARLOS SOUZA
Indicado por Nicácio da Silva, chefe de gabinete em Brasília e aceito pelo deputado federal Carlos Souza, que saiu direto da Câmara Municipal para a Câmara Federal, trabalhei por quatro anos seguidos no escritório da representação de Manaus, como chefe de gabinete. Hoje, Nicácio da Silva, ex-colega de Dom Bosco, é escritor e membro da UBE – União Brasileira de Escritores e da ANE – Associação Nacional de Escritores.
Tinha a missão de administrar o trabalho de vários profissionais que prestavam serviços para o deputado Carlos Souza, em Manaus.
Para trabalhar com Carlos Souza, tive que pedir permissão do presidente do Conselho Regional Norte do SEST/SENAT, administrador Francisco Saldanha Bezerra.
Chegava ao Escritório de Manaus do deputado Carlos Souza às 7 horas da manhã, despachava os assuntos e seguia para o SEST/SENAT. Também quando decidi ser professor na Faculdade Nilton Lins, já que tinha feito Curso de Especialização em Docência de Terceiro Grau pela Faculdade Cândido Mendes, do Rio de Janeiro, novamente pedi autorização para Francisco Bezerra. Não tive problemas com ele.
Também fazia a divulgação dos assuntos do deputado na imprensa, em Manaus. O jornalista Freitas, do Jornal Amazonas em Tempo, publicou uma matéria quase de página inteira, com perguntas e respostas, escrita por mim e só lida pelo deputado, que, no estúdio do seu programa diário “Canal Livre” que apresentava com seu irmão, Wallace Souza, pela TV A Crítica, autorizou a publicação.
“EMPIEMA BILATERAL SUBDURAL CRÔNICO”
Trabalhando ao mesmo tempo como Diretor do SEST e do SENAT, por 12 anos, professor do Curso de Serviço Social da Faculdade Nilton Lins, por oito meses, membro da Junta Administrativa de Recursos Infracionais – Jari da EMTU – Empresa Municipal de Transportes Urbanos, por quatro anos, presidente da Comissão Estadual de Emprego, por dois anos intercalados e em rodízio, membro da comissão nacional de reestruturação das Políticas Sociais de Trabalho, Emprego e Renda, em duas oportunidades, membro da Jari do DNIT – Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes, e ex-membro da Jari da Polícia Rodoviária Federal por um ano, uma simples perda de audição me fez largar tudo e cuidar da minha saúde.
Construí uma sólida e verdadeira amizade com a diretora geral do SEST/SENAT, Lucimar Coutinho, ao ponto de, sempre que ela, sempre que lhe sobrava tempo, telefonar para mim e conversar sobre os problemas administrativos que tinha na condução da administração, perguntar sobre projetos em andamento e elogiar-me pelos bons resultados obtidos no processo de gestão financeira e de resultados operacionais. Também fiz muitas outras amizades em Brasília: Liliam Carla de Souza, Tereza Pantoja, Nilson Souza, Aristides França Neto, Ilmara Chaves e tantos outros que também os deixei pelo caminho, ou passaram pela minha vida. Mas, Lucimar Coutinho foi a que mais marcou minha vida, pela sua objetividade, espontaneidade e firmeza e pela autonomia que ela deu aos diretores, “mas com responsabilidade”. Produzi muito nessa fase, e sempre que viajava a Brasília, fazia questão de ir visitá-la, mesmo quando viajava a convite do Ministério do Trabalho, nos anos em que presidia à Comissão Estadual de Emprego ou que coordenei o Projeto Serviço Civil Voluntário.
Depois de ser submetido a um exame de tomografia computadorizada, que acusou a presença de líquido, já fui submetido a sete cirurgias para a drenagem de um empiema cerebral bilateral, subdural, crônico, – uma infecção que se manifesta entre o crânio e o cérebro -. Durante os quatro anos de seguidas internações de emergências e eletivas, contei com o apoio do presidente do SEST/SENAT, administrador Francisco Saldanha Bezerra, o empresário e amigo e membro do Conselho do SEST/SENAT, Flávio Willer Cândido, do empresário Reginaldo Murilo e sua esposa Ana, do deputado estadual Luiz Castro e sua esposa Ana. Sempre que podiam, faziam visitas em hospitais em que eu estava internado. O deputado Luiz Castro e o presidente do SEST/SENAT foram me visitar até em São Paulo. Fui operado inicialmente, em duas oportunidades, pelo Dr. José Vieira e, em seguida, fui submetido a mais três cirurgias de craniotomia pelo médico Dr. Dante Luis Garcia Rivera, em Manaus, e duas em São Paulo, no Hospital São Joaquim, da Beneficiência Portuguesa, pelos médicos, Drs. Antonio Almeida e Valéria Moio. Em Manaus, ainda fiz tratamentos complementares com a reumatologista Rosana Barros de Souza, devido a uma paralisia do lado esquerdo que sofri em São Paulo, o Dr. Júlio da Luz, médico especialista em tratamento de calcificação óssea e a Dra. Silvana de Lima e Silva, infectologista.
Durante os sete dias em que fiquei em coma induzido no Hospital Santa Júlia, tive a companhia constante da minha esposa, Yara Queiroz e do amigo Flávio Willer Cândido. Quando despertei, Flávio Cândido estava ao meu lado e perguntou:
- Se você estiver me ouvindo bem, cruze suas pernas. Cruzei as pernas, e ele veio para o meu lado. Disse-me que nem os médicos acreditavam que eu retornaria do processo de coma induzido:
- Ele vai resistir, sim. Meu marido “é um touro”, dizia minha esposa.
Yara Marília, minha esposa, pessoa decidida em suas convicções, mas terna como a brisa, depois de alguns contratempos, deu-me novamente a vontade de viver e ser feliz e resgatou-me mais uma vez, do precipício em que estava desabando, concretizando, novamente, o significado do sonho de criança que tinha seguidamente. Com ela aprendi que, com a perseverança em Deus, tudo alcançamos, inclusive o resgate de uma vida calcada em alicerces firmes e sólidos, recheada de solidariedade, compreensão, amor e tolerância, como a que vivo ao lado dela.
Acredito que meus sonhos de infância foram todos realizados. Mergulhei em um rio de águas profundas, nadei muito, mas cheguei a uma margem tranquila em que deitei e sonhei na relva de um campo verde que só existe na minha imaginação e em meu coração, que nunca deixou de sonhar e acreditar que um dia eu venceria na vida.
FIM