domingo, 28 de abril de 2013

Sobre ¨Os últimos¨

Autor: Carlos A  Lopes

Quando li o conto ¨Os últimos¨, de Augusto N. Sampaio Angelim, escritor pernambucano, percebi ter em mãos algo precioso e sem relação de conteúdo, veio-me à mente a peça de teatro ¨A última Estação¨. Em seguida recebi e-mail do autor me atentando para o fato de que o seu texto fora ambientado no lugar de nome Brejo Santo.

O lugarejo faz divisa territorial com minha cidade, razão pela qual, se estou indo visitar meus pais não tenho tempo para percebê-lo; se estou voltando à Olinda, estou apressado demais para presenciar os avanços, quase sempre negativos, ocorridos durante décadas. 

Entretanto, ¨Os últimos¨ provocou uma vontade exacerbada de ver as entranhas do lugar e não tão somente as construções visíveis a quem passa pela BR 232, após Riacho das Almas, também conhecida como Verdejantes.

Imaginava que por detrás das ruínas visíveis, havia edificações recentes e moradores remanescentes. Só encontrei um antigo bueiro e uma prensa de madeira, que insiste em ficar de pé. No mais, a caatinga avançava sobre vestígios de moradias e sonhos de vida.

- Olá, como faço pra falar com alguém mais velho?  Perguntei a um garoto que brincava com bolas de gude. Ele inteligentemente apontou o irmão, dois anos mais velho que ele. Ri da minha própria ignorância. Fui apresentado a Márcia, de trinta e dois anos. Enquanto ouvia suas explicações, ouvi: ¨Ô de casa¨, um chamado vindo do lado. Concluí: ¨Pelo menos umas seis famílias residem aqui¨.

Enquanto Márcia ¨passava¨um café, disse: ¨Aqui é apenas um sítio, cujo proprietário é da mesma família de outros tempos.¨ Sábia Márcia! Segundo ela me disse, há muita curiosidade quanto a aparência do lugar, por parte dos viajantes que às vezes passam por ali. Brejo Santo foi sim, o resultado de uma fazenda próspera no tempo do caroá, planta com um tipo de fibra usada para a produção de cordas e têxtil, que depois perdeu a importância, por conta da febre do agave, também um tipo de fibra mais conhecida como sisal. Somado a isso, Caiçara dos Órfãos, a cidade próxima, privilegiou mais os povoados de Algaroba e Riacho Doce. Além de outros fatores veio a decadência de forma tão cruel, que finalmente pude valorizar mais ainda o texto ¨Os últimos¨, cujo autor é de mente privilegiada e uma das pérolas do ¨Recanto das Letras¨.

Durante décadas Brejo Santo se beneficiou do caroá e da dádiva de um rio correndo em seu entorno. Mais tarde o lugar viveu a sua fase mais próxima do desenvolvimento, na direção de tornar-se um distrito. Lá funcionou um posto de gasolina, vendiam-se veículos, havia cultos em uma bela capela e a criançada tinha onde estudar e ainda havia o funcionamento de uma feira livre semanal, o que deixa a dúvida sobre o que faltou para consumar-se a emancipação política.

Já em Caiçara dos Órfãos, eu soube de uma história curiosa, envolvendo o fundador de Brejo Santo. Como o dinheiro corria solto por lá, Lampião certa vez mandou recado que iria buscar uma parte para si. A resposta veio na ponta da língua e pelo mesmo portador: ¨Aqui ele só vai encontrar com quem brigar¨, disse o senhor do lugar. Recado dado. Tempos depois com a intenção de ir a Ibimirim, o Senhor do caruá encontrou dois jagunços, logo após o rio, vindo em sua procura. Perguntado se ele conhecia o tal fazendeiro, respondeu: ¨Não só o conheço como vou mostrar onde ele mora.¨ Minutos depois aponta: ¨A casa dele é aquela, não vou levá-los até lá, não quero ficar marcado.¨ Deu meia volta e fugiu para Placas e depois rumou ao Recife de onde nunca mais voltou. Então eu lhes pergunto: Será que a derrocada de Brejo Santo começou ali? Se assim foi, então esse é mais um pecado nas costas de Lampião.


Autor: Carlos A Lopes

Olinda/PE

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Meu encontro com a morte

Autor: Geraldinho do Engenho
 
Noite dessas tive um sonho que me deixou encabulado por vários dias, aliás, nem foi sonho, de fato foi pesadelo. Sonhei que morri. De repente estava eu na porta de um condomínio numa ilhota que flutuava no espaço, o local e era tão alto que tanto para cima como para baixo via-se o mesmo azul infinito.  La estava eu assistindo os julgamentos feitos pela própria morte, e aguardando meu momento de ser atendido. Ela uma mulata magricela e desdentada, sentada na portaria com uma vestimenta preta brilhante com o logotipo usado nas embalagens de veneno e similares.
Analisava detalhadamente o histórico de cada falecido que lá chegava, e o ordenava adentrar a portaria. Ao mesmo tempo em que era um condomínio passava a ser um estádio de futebol já com as arquibancadas lotadas, aguardando o resultado para que cada um recebesse sua sentença.  Eu já impaciente com a demora, fiquei imaginando:- - puxa vida enfrentei tanta fila na terra quando era vivo, agora chego aqui tenho que enfrentar fila de novo?
Mal sabia eu que a coisa ainda ia alongar muito mais, quase chegou minha vez, o danado que estava em minha frente era um cara até bem falante, mas arrumou uma bruta confusão e acabou embananando tudo, por sorte a morte até que foi bem paciente. Primeiro perguntou a ele:
- Causa da morte?
– Afogamento!
– Como, no Rio?
- Não São Paulo mesmo!
- Eu não to lá quereno saber nome de santo-, Para mim tanto faz. São Paulo S. André, S. Caetano, ou S. Bernardo é mesma merda de bueiros entupidos ruas alagadas, basta chuviscar morre gente mesmo! Eu quero saber se tu caíste no rio?
- Minhas desculpas, dona morte, eu entendi que a senhora falava das inundações do Rio de janeiro!
Tinha um velhinho com uma vestimenta de peles de animais, curtidas, palpitando como ele só, passando dum lado há outro todo o tempo. Era ouvir a palavra referente à chuva ou inundação ele logo dizia:
- Ah enchente que nada! Enchorradinha! Se o assunto era tempestade o homem falava:
Ah chuvisqueirazinha! Vocês não conhecem chuva nada! Na seqüência, a morte disse:
- Agora me fale um pouco de sua família!
- Não dá pra falarmos de outra coisa dona morte?
– Tem jeito não, o assunto agora é família mesmo! Ele coçou a cabeça e disse:
- ah qui vá-, vou tentar! A senhora não tem idéia da confusão que eu aprontei na minha vida. Eu casei com uma viúva, meu pai, também viúvo, se casou com outra viúva, filha da viúva minha esposa.
A mulher de meu pai que era minha enteada passou a ser minha madrasta, minha esposa nora de meu pai, passou a ser sua sogra.
Senhora teve sogra? Alias, acho improvável porque se tivesse a teria matado com certeza!  Pois bem minha esposa, quis me convencer que meu pai e eu, éramos genro um do outro, e que sua filha era também sogra da própria mãe!  E eu sogro do meu pai!
Ai eu entrei em parafuso, e para piorar a situação nasceu meu irmão, filho de minha enteada, que também era minha madrasta, e neto de minha esposa, e ao mesmo tempo cunhado de sua avó!
Quando eu comecei a botar a cabeça no lugar, nasceu meu filho. Irmão de minha madrasta, neto e ao mesmo tempo cunhado de meu pai, e tio e sobrinho do meu irmão!
Ai não teve jeito, pirei de vez; pulei do segundo andar do prédio na hora de uma tempestade e morri afogado!
- Veio passando o velhinho!
- Povo mole! Morre com qualquer chuvinha! 
- Oh velho chato, homem das cavernas-, vai dar palpite na confusão da tua vò!
- Quem é este velho chato dona morte?  Perguntou o indivíduo!
- Acalme–se senhor! Respeite o velho meu filho-, ele tem razão e tem carta branca pra falar o que bem entender-, este é o Noé o homem do dilúvio! 
Acometido por uma crise de riso eu acordei, e louvei a Deus por ter sido apenas sonho!


Geraldinho do Engenho - Bom Despacho/MG

Publicações autorizadas pelos autores


segunda-feira, 22 de abril de 2013

Do lado avesso

Autora: Ana Soares
 
Tenho medo pelo simples tempo que não tenho.
Sinto um medo terrível de me encaixar tão perfeitamente neste mundo imediatista, a ponto de me perder...

A música do Nando Reis, por vezes, ecoa em meus ouvidos:

O mundo está ao contrário e ninguém reparou:
O que está acontecendo?

 
Estamos do lado avesso.
É assim: ligamos o piloto automático e prosseguimos... 
Não paramos, porém, somos paralisados em um dado momento, seja por uma frustração, uma fatalidade, ou outro problema qualquer, desde que o consideremos maior e pior do que os nossos péssimos hábitos adquiridos ao longo do tempo.
Estamos em evolução. Perfeito! 
Buscamos incessantemente pela felicidade. Temos tempo? Temos tempo para sermos felizes?
Antes havia maior proximidade entre as pessoas: Não tínhamos celular, TV a cabo, internet, controles remotos... Hoje temos e somos controlados por eles.
As facilidades imediatistas e consumistas que temos, são as mesmas que nos desintegram, que nos abstrai de nós mesmos... 
Nos distanciamos uns dos outros. Não temos tempo para os nossos pais, para os nossos filhos, para o amor, e nem para os nossos verdadeiros amigos,mas estamos conectados com o mundo, o tempo todo. 
Mascaramos nossa solidão e alimentamos nossa rede social.
Afastamos nossos filhos do nosso convívio e os deixamos à mercê de baladas, de amigos mal intencionados, de um mundo sombrio, sem que haja um"colo" para lhes acolher, pelo simples fato de  não termos tempo! 
E quando não mais houver tempo para tantas opções e escolhas erradas?
Temos tantas opções e escolhemos mal... 
Queremos muito o tempo todo e temos pouco na maior parte do tempo... Se continuarmos nesta pressa desenfreada, logo, não teremos nada.
Tento não me adaptar a esta loucura toda e ainda faço uso de alguns bons costumes. Não abro mão do almoço em família, com todos sentados a mesa, sem pressa... Esta hora, cada vez mais rara nos nossos dias, continua sendo sagrada para mim! Mas isto ainda é pouco. Precisamos mais... As nossas necessidades estão muito além dos nossos genuínos almoços aos domingos!
Andamos distraídos.
Distraídos em relação a nossa família, aos nossos amores verdadeiros, aos nossos sonhos!
Vivemos o agora vidrados no passado ou vislumbrando um futuro que talvez nem aconteça! Raramente, estamos aqui, agora!
O que nos restará desta agonia - pressa cinzenta que forja uma necessidade absoluta, se na verdade tudo que precisamos é de desacelerar, respirar fundo e simplesmente deixar-nos ir... Em paz!
A vida segue, e seguirá ainda melhor, sem pressa!
 

Publicação autorizada pela autora

domingo, 21 de abril de 2013

Por acaso


Autor: Nêodo Ambrósio de Castro
 
Noite de inverno. Estava tão frio que a névoa cobria quase que totalmente a visão daqueles que se aventuravam andar pelas ruas da cidade.
Com a gola do paletó levantada, para aliviar o frio que teimava em penetrar em seu corpo, caminhava, Josemar, pela calçada quando quase tropeçou em um morador de rua que encolhido se cobria, sem muito sucesso, com folhas de jornais velhos. Se ele não tivesse quase pisado no indigente, nem o teria notado pois este se encolhera de tal forma que mais parecia um embrulho.
Não deu muita importância a essa ocorrência, continuando a sua caminhada. Mas ao atingir o cruzamento da rua, enquanto aguardava o sinal de trânsito abrir, pensou: Se ele que estava somente transitando por ali estava sentindo que o frio o incomodava tanto, imaginou como aquele morador de rua devia estar sentindo. Parou, agora com certa curiosidade, resolveu voltar para ver o que poderia fazer para amenizar o sofrimento daquele ser. Aproximou-se e tocou-lhe o corpo, para lhe chamar a atenção. Ficou surpreso, pois este estava tremendo e ao mesmo tempo seu corpo se apresentava tão quente que chegava a aquecer as mãos que o tocavam. Perguntou ao homem como estava se sentindo e o mesmo ao responder quase não se fez entender pois balbuciava qualquer coisa com a voz trêmula tamanho o frio que devia estar sentindo.
Josemar, ficou assustado e imaginou: Não posso deixar esse homem aqui, ele certamente morrerá, pois esse calor que emana de seu corpo só pode ser febre alta e ele não conseguirá sobreviver a essa temperatura durante a noite.
Tentou levantar o pobre homem, mas este de tanto frio parece que não reagia e tornando-se mais pesado. Tentou novamente, mas parecia que o morador de rua já havia perdido a esperança de sobreviver e se entregara e estava sofrendo tanto que preferia ficar ali até que sua vida abandonasse aquele corpo em brasas.
Josemar voltou até à esquina e parece que por um milagre, encontrou um policial que cumpria a sua ronda noturna. Pediu-lhe ajuda, explicando que logo ali adiante encontrava-se um indigente com febre alta e precisando de socorro médico. Logo o policial concordou em acompanhá-lo para comprovar seu relato. Chegando até o homem doente, o guarda constatou que este precisava ser removido, com urgência para um pronto socorro. Através de seu rádio, solicitou uma ambulância que socorreu o morador de rua, encaminhando-o para o pronto atendimento que indicou internamento imediato para tratar de uma pneumonia.
Após cumprir sua missão, Josemar, agora não mais sentindo tanto frio, pois ao imaginar-se na pele daquele indigente, tinha a sensação de estar, confortavelmente, agasalhado, dirigiu-se para a sua casa.
Anos se passaram desde aquela experiência e Josemar continuava sua rotina: Bem cedo se dirigia para o trabalho è pé, pois residia nas proximidades e já à noite retornava ao lar, sempre fazendo o mesmo trajeto.
Certo dia, ao retornar para casa, uma surpresa o aguardava. Um desses indivíduos que rondam as noites em busca de uma vítima para praticar assaltos o abordou. Não acreditando no que estava acontecendo, Josemar, movido por um reflexo, fez um gesto que o bandido entendeu como reação e acabou baleado. Sangrando, caiu, enquanto o agressor evadia-se do local. Um automóvel que se encontrava parado no sinal, presenciou a cena e seu ocupante correu em seu socorro. Encostou o carro e com muito esforço conseguiu colocar Josemar dentro do carro, dirigindo-se para o pronto socorro.
Ao chegar, pediu ajuda e foi atendido pelos enfermeiros do plantão que colocaram a vítima em uma maca o levaram para o centro cirúrgico, após um exame para localização do projétil que havia se alojado em seu abdome. O homem que o havia socorrido permaneceu na sala de espera, e sempre preocupado buscava notícias. Após o ato cirúrgico Josemar foi encaminhado para a enfermaria, mas o bom samaritano havia providenciado um quarto particular para o paciente e este foi devidamente alojado em um bom quarto de hospital, para recuperar-se. Acordando da anestesia, Josemar viu aquele homem em pé ao lado do seu leito e perguntou-lhe:
- Quem é você e onde eu estou?
- Calma. Você foi ferido em um assalto e eu o trouxe para esse hospital. Você foi operado, a bala removida e está fora de perigo.
Pergunta, de novo Josemar:
- Quantas horas são? Parece tarde, minha esposa e filhos devem estar preocupados com o meu atraso. Será que podia pedir a alguém que os avisasse?
- Claro! Basta me passar o número do telefone que ligo imediatamente.
O paciente, agora já quase recuperado, ditou o numero para o estranho e este fez a ligação e avisou a família que não demorou a aparecer no hospital.
Josemar contou para sua esposa o que havia acontecido e esta foi ao encontro do desconhecido para agradecer.
- Muito obrigado, senhor, por ter salvo meu marido. Não sei como posso agradecer, pois sua atitude o salvou de uma morte certa. O médico me disse que se demorasse mais algum tempo ele poderia ter morrido por causa da hemorragia. Mas felizmente o senhor o salvou removendo-o para o hospital.
O estranho respondeu:
- Eu que tenho que agradecer, pois a alguns anos atrás, seu marido salvou a minha vida, quando acometido de uma pneumonia e sem um local apropriado para passar a noite, ardia de febre, deitado em uma calçada. Ele providenciou socorro para mim e assim pude me recuperar e hoje, graças a ele, a minha vida mudou e mesmo não sabendo que se tratava dele, naquele mesmo local em que ele havia me encontrado, o encontrei sendo assaltado e ferido por um bandido de rua. Dessa forma pude retribuir, embora nunca o desejasse. Seu marido é um bom homem e certamente voltará para sua família dentro de alguns dias.
A esposa de Josemar ficou espantada com o relato e voltou-se para o marido para lhe contar. Este, então, queria agradecer pessoalmente ao estranho e pediu a esposa que o conduzisse até o quarto, mas quando ela o procurou no corredor, já não o viu mais. Dirigiu-se, então até à recepção para pedir informação, quando a recepcionista a informou que o estranho havia pago todas as despesas pedindo para não ser identificado e não havia deixado nome nem endereço.
Retornando ao quarto, relatou o acontecido ao marido que com uma lágrima rolando pela face lhe disse:
- Foi Deus quem colocou esse senhor no meu caminho. Eu tive a oportunidade de ajudá-lo, para que hoje ele pudesse retribuir. Isso significa que Deus coloca as pessoas certas em nosso caminho. Cabe a nós, no entanto, decidir de que maneira elas participarão de nossa vida.
 
Autor: Nêodo Ambrósio de Castro - Eugenópolis/MG

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terça-feira, 9 de abril de 2013

Bom dia, Gullar!

Autor: Nelson Barroso de Matos
 
Ela poderia estar passando por alguma das ruas do Centro do Rio de Janeiro e encontrar o poeta caminhando pela cidade, lépido, não no sentido ligeiro, mas, leve, tentando obter da cidade alguma inspiração para seu poema, para o "inesperado". E foi assim, inesperadamente, que Marta encontrou num chat o poeta do Poema Sujo. Para os céticos o melhor é nem continuar a ler este conto. Ora, numa sala de bate papo o que mais se encontra são Fernandos Pessoas, Guimarães Rosas, Cecílias Meirelles, por que não encontrar o Gullar!? Não vou entrar em detalhes quanto as provas da veracidade do ocorrido, fato é que Marta trocou assunto com o poeta por horas a fio. Talvez o interesse tenha surgido a partir do momento em que ela "brigou" com o poeta sobre um assunto qualquer: como se fosse algum colega cuja intimidade vem rápidamente nesses salas. Depois, como Marta demonstrava grande conhecimento da obra de Guimarães Rosa, o poeta resolveu testá-la. Mas, ela nada sabia do Poema Sujo, nem limpo de Gullar e, no entento, respondia prontamente qualquer coisa referida ao Rosa. O poeta ficou intrigado com o jeito campesino de Marta, e a prosa foi longe. Quase íntimos, passearam por outros autores de nossa literatura com bastante detalhamento, e Marta inteira. Até que chegou num ponto que o poeta diz pra Marta que ela nem precisa terminar seu curso de Letras pra dar aula de literatura, mas, que poderia dar uma olhadinha por aí na obra dele, pois, não que ele quisesse se gabar, longe disso, mas, poxa, tá acostumado com o reconhecimento nacional. Os dois se despediram indo cada qual pro seu canto...ou verso. "Será arte?" isso que o poeta fez? Sendo ou não o certo é que há uma certa Marta que conheceu o poeta numa simples sala de bate-papo, assim como se é possível encontrá-lo caminhando pela cidade. O poeta quer ficar "livre do mercado" pra chegar melhor ao poema "inesperado", "fora do esquema", mesmo que pra isso se possa encontrá-lo num simples bate-papo "sem o saber".
Autor: Nelson Barroso de Matos - Niterói/RJ
Publicação autorizada pelo autor

sexta-feira, 5 de abril de 2013

O anjo de Altamira

Autor: Jailson Vital de Sousa
 
Cheguei à cidade de Altamira, no Pará, no princípio do ano de 1974. Fui trabalhar na manutenção da Rodovia Transamazônica, recém construída, e o contrato do DNER com a empresa em que eu trabalhava, ainda tinha 18 meses para serem cumpridos. Fui morar em uma casa construída em madeira, no acampamento dos engenheiros, que distava 1,5 km da periferia, e ficava à margem da rodovia. As casas eram bem feitas e confortáveis para o padrão das demais construções da cidade. De negativo, tinha a cor escura da madeira que, não refletia a luz natural, tornando o ambiente pouco iluminado, e as telas nas janelas para impedir a entrada dos mosquitos Carapanã que infestavam a selva amazônica e cuja picada deixava o local da pele esbranquiçado e com uma coceira dos diabos. Incomodava também, a solidão. No acampamento, que durante a construção da rodovia devia ser bastante movimentado, restavam eu e a família de outro engenheiro que trabalhava em projeto diferente, e assim tínhamos pouco contato. A distância de Altamira para outras cidades pela rodovia Transamazônica era: para o leste, a cidade de Marabá e para oeste, Itaituba, ambas a 500 km.  Como essa rodovia não era pavimentada, uma viagem de Altamira para qualquer uma delas levava um dia inteiro se não fosse  época de chuvas, quando então tornava-se imprevisível uma viagem dessa. Para Belém, somente de barco a partir do porto de Belomonte pelo rio Xingu, ou de avião. Portanto, a não ser por esses dois meios era impossível sair de Altamira. Para não ter problemas causados pela “clausura”, pelo menos de 3 em 3 meses, eu pegava um avião para Belém e ficava por lá durante uma semana. Eu gostava da Belém daquela época. Apesar do forte calor potencializado pela umidade elevada, o ar me parecia ter um odor agradável, a gente que habitava aquela cidade era simpática e amigável. Enfim, eu gostava de estar em Belém. Aprendi a gostar e também a dançar, ou tentar dançar, o carimbó, ritmo regional apressado que, tem passos próprios para se dançar. Encantava-me também, sendo sertanejo, como sou, a imensidão de água da Baia de Guajará, que cerca Belém.
Não posso dizer que a minha estada em Altamira não foi proveitosa em termos profissionais e pessoais. Fiz grandes amizades com pessoas locais e colegas de profissão, aprendi a trabalhar em ambiente de clima adverso. O Rio Xingu que margeia a cidade, o qual fazia parte das minhas quimeras de adolescente, quando ainda no curso ginasial, no estudo de geografia, estudava os rios afluentes do Rio Amazonas, tornou-se objetivo dos meus sonhos de descobrimentos. Enfim, banhei-me, alimentei-me dele e naveguei no rio dos meus sonhos da adolescência. Mas a paisagem nem sempre é bela como desejamos. A vida tem seus truques.
Certa vez fui ao hospital local, não me lembro do motivo. Na sala de recepção encontrei uma garota que aguardava atendimento. Tinha cerca de 7 a 8 anos de idade, vestia um vestidinho simples que ia pouco abaixo dos joelhos, nos pés uma chinela empoeirada, os cabelos alourados e pouco cuidados desciam sobre os ombros magros. O seu olhar cruzou com o meu e seus olhos azuis me fitaram. Olhei fixamente para aquele rosto sem expressão e fiquei emocionado com o que vi. Pareceu-me que alguém a tinha maquilado fazendo enormes círculos arroxeadas no entorno de seus olhos. Naquele momento eu era só indagação, enquanto aquela garota parecia que pedia-me socorro, sem no entanto fazer qualquer movimento com os lábios ou com os olhos. Talvez, não entendesse porque estava ali, nem da gravidade da sua situação. Então abaixou a cabeça como que resignada com o seu destino. Soube depois que ela tinha leucemia. A imagem daquela menina desde aquele momento, impregnou-se em minha mente. É horrível o sentimento de impotência diante da fatalidade.
Deduzi, pelo tipo físico que, ela era filha de algum das centenas de colonos que teriam vindos do sul do país para morar nas agrovilas, que eram conjuntos de casas pequenas, feitas de madeira, agregadas a um lote de terras doadas pelo governo federal e situadas à margem e ao longo da Rodovia Transamazônica com o objetivo de cultivar o solo e povoar a região. Esse projeto não deu certo e os lotes acabaram sendo abandonados pelos colonos.
A manutenção da rodovia, não exigia diretamente a minha intervenção constante. Havia uma equipe de operários, com um encarregado que comandava a realização dos serviços, usando máquinas e caminhões. Essa equipe adentrava a rodovia, cujo trecho sob nossa responsabilidade media mais de 200 km, toda segunda feira e só retornava aos sábados. Levavam os mantimentos necessários para uma semana e dormiam em barracas armadas por eles ou nas casas abandonadas das agrovilas.
Certa feita, um caminhão retornou em um dia no meio da semana, fato que só acontecia quando alguma máquina quebrava e era necessário vir buscar alguma peça, ou outra emergência séria. Aproximei-me para conversar com o motorista e indaguei o motivo da vinda. Ele apontou para a carroceria e mostrou-me um caixão funerário. Disse que era o corpo de uma menina que havia morrido de leucemia e o pai havia pedido a caridade de trazê-la para ser sepultada em Altamira. Eu não sei por que uma garota de quem eu não sabia o nome, causou-me tanta comoção naquele instante. Era a garota do hospital. Ela havia se tornado anjo.
Finalmente chegou o dia da minha partida de Altamira. Dentro do avião, enquanto eu tirava as últimas fotografias da cidade, através da janela, uma confusão de sentimentos tomava conta de mim. A alegria por sair enfim de uma cidade que me sufocava, a tristeza por deixar pessoas queridas e saber que nunca mais as veria, a satisfação pelo dever cumprido e a impressão que ainda carrego comigo de que um dia eu vi um anjo de olhos azuis e olheiras roxas. O meu anjo de Altamira.

Autor: Jailson Vital de Sousa - Custódia/PE
Publicação autorizada pelo autor
Crédito da ilustração: Edmar Sales (veja o marcador deste artista neste blog)

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Casamento. Uma armadilha?

Dizem que casamento é uma armadilha e traz surpresas não muito agradáveis.
Talvez seja. Mas obriga os cônjuges ao envolvimento com pequenos detalhes. Aqueles, que não haviam sido bem discutidos antes. Não estavam implícitos ou acordados.
O namoro vai bem, obrigado. Temos vontade de casar, quero dizer morar juntos, entende?
Perfeitamente normal e previamente entendido e acordado que casar é morar junto.
Não precisa cartório, testemunhas e escrivão. Certidão? Só papel e formalidade desnecessária. Igreja, então, é “pagar mico”, “caretice”. Isso é coisa de antigamente.
Hoje, juntamos nossos livros, CDs, DVDs, roupas e as escovas de dente. Se ficar faltando algo se compra depois.
Muito pratico, não acham?   Nos dias de hoje, a vida tem que ser prática. Casamos, se não acertarmos dentro de certo período, cada um procura seu canto e novamente.  Novo namoro,  um pouco de intimidade até resultar em outro “morar juntos”. Quem sabe desta vez tudo dá certo?
Vida a dois, requer ajustes e adaptações que vão desde divisão de responsabilidades, de espaço e tarefas, ausentes na vida de solteiro, ao compartilhamento na vida cotidiana. Deixar copos sujos sobre a pia, deixar o banheiro molhado após o banho, roupas sujas espalhadas pelo chão, toalha molhada sobre a cama, sapatos e outros objetos espalhados pela casa, esquecer de dar descarga ou deixar a tampa do vaso sanitário levantada. Urinar no chão, pia suja de pasta de dente, cabelos agarrados no sifão e outros pequenos detalhes que não são observados antes do casamento, principalmente se moram sós ou em casa dos pais, tornam-se importantes na vida conjugal.
Assim começam as queixas e cobranças. Descobrem os cônjuges, que nem tudo são flores, existem detalhes que vão se apresentando no dia a dia e que são verdadeiras armadilhas e surpresas que não podiam imaginar antes do casamento. As tarefas são dividas, assim como a responsabilidade da casa, pagamento de contas, serviços domésticos em geral. Tudo é normalmente partilhado. Aprender a dividir espaços e esquecer as manias de solteiro, como deixar o guarda roupas e gavetas desarrumadas.
Por que não descobrem isso antes? A namorada, hoje, freqüenta a casa do namorado e vice-versa. Ela, certamente se sente importante arrumando o guarda roupa do namorado, mas só para implicar ou se firmar diante da sogra, o que após o casamento já não tem o mesmo significado. 
As pequenas “rusgas” entre o casal, acaba esfriando o lado íntimo e amoroso. O romantismo desce ladeira e desaparece. Acabam-se os gestos de carinho, de compreensão e solidariedade. Cada qual quer que o outro cumpra sua parte nas tarefas e esquecem que estão juntos para construir uma vida a dois com base no amor e compreensão, necessitando portando de um diálogo maduro e tranquilo.
Se essa fase for suportada por ambos, é quase certo que não haverá nenhum tipo de divergência no futuro e que dali surgirá uma família que trará novos problemas e desafios que deixarão esquecida a primeira fase do relacionamento. Quando aparece o primeiro filho, normalmente as coisas engrenam.
A fase do recém-nascido muda o panorama do lar. São mamadeiras de madrugada, a troca de fraldas, banhos e corridas ao pediatra, etc.
A realidade falará alto.
Uma vez casados, juntados morando junto, é diferente da vida na casa dos pais. Vão descobrindo isso com muita lentidão e certa sensação de perda, pois o que nos proporcionava essa condição foi perdido. Ficou para trás.
- Levanta, meu bem, o júnior está chorando.
- Troca a fralda e dê-lhe a mamadeira.




Autor: Nêodo Ambrósio de Castro - Eugenópolis/MG

http://www.recantodasletras.com.br/autor.php?id=101881


Publicação autorizada pelo autor




Fala Maria Mineira


Escritora: Maria Mineira

P - Converso aqui com Maria Mineira, colaboradora do Blog Gândavos - Contadores de Histórias. A sua sugestão quase nem era enviada e terminou na frente. Feliz com a escolha?
R: Fiquei muito contente e nem acreditei quando soube do empate.
P – Como surgiu a ideia?
R: Foi algo muito repentino, um estalo me dizendo que o nome teria que ser aquele. A ideia me veio quando abri o e-mail com a mensagem sobre a escolha do título do livro 3. No momento bati o olho na estante e vi "Primeiras Estórias" e “Tutameia- terceiras estórias.” Ambos de Guimarães Rosa. Não tive dúvidas ao enviar sugestão, nosso livro de número três poderia ser: Gandavos- Terceiros Contos. 
P – Suas palavras finais?
R: Acredito que esse terceiro livro vem reforçar ainda mais a brilhante ideia do Carlos Lopes de reunir essa turma em prol da boa literatura. Sou grata pela acolhida de todos os colegas. Sou apenas uma contadora de causos em meio a tanta gente que sabe escrever bonito. Parabenizo Carlos Lopes pela honestidade e imparcialidade em todos os momentos.
 Obrigada e um abraço a todos os amigos e colegas!

Já temos o título do livro: GANDAVOS - TERCEIROS CONTOS



Soma das 5 (cinco) dezenas:

02+09+15+46+62=134

Vencedor:

Gandavos - Terceiros contos
Parabéns a
MARIA  MINEIRA
e a todos nós

Um abraço
Carlos A Lopes
Blog Gândavos

Comentários:

Legal,
Parabéns para todos nós.
Dermeval

O mais importante é o grande círculo de amizade que vem se solidificando a cada lançamento. Carlos você está fazendo com que eu me sinta também um pernambucano. Obrigado amigo.
Geraldinho do Engenho







Comentário de Carlos Costa


Companheiros, já estou quase concluindo a leitura do excelente livro GANDAVOS. Estou lendo-o com calma porque quero apreender dentro de mim, contos/crônicas de todos os companheiros. Como o namorado de minha enteada cantora da noite Bella Queiroz, tenho me divertido muito com os textos da Maria Mineira porque Bella namora um comissário de bordo de MG, mas estou gostando de todos os os textos de outros autores também. Parabéns a todos vocês e, por favor, amigos, leiam e repassem essa nova crônica que publiquei. Quando terminar toda a leitura, farei um comentário coletivo e não individual. Comerei a ler hoje o texto da página 185, pois tomo remédios e durmo todos os dias às 8 hs da manhã, acordo às 10 e escrevo crônicas (uma por dia para manter minha mente ativa e não entrar em depressão. Isso me obrigada a alternar crônicas sociais e outras criações vividas na minha infância) e devido a isso, leio muito devagar. Um abraço a todos os companheiros e, obrigado ao companheiro Carlos Lopes, por me manter sempre ativo, vivendo e criando...Um abraço no coração de todos os companheiros. Repassem, por favor porque é graças a todos vocês amigos virtuais, que estou sendo lido hoje em 36 países diferentes, nas crônicas de meu blog, com um acesso diário em média de 150 pessoas todos os dias, uns dias mais, outros dias menos, mas essa é uma média:

 

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Autor: Carlos Costa - Manaus/AM

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Comentários:

Maria Mineira deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Comentário de Carlos Costa": 

Obrigada, Carlos Costa. Tenho grande admiração pelo seu trabalho, sua força de vontade e sua luta em prol das causas sociais. Parabéns!