quarta-feira, setembro 26, 2007

Alexandre O'Neill, esse propagandista!



O poeta Alexandre O'Neill sabia muito bem que poesia não enche a barriga. Por isso, a sua principal actividade (a que lhe dava dinheiro) era a criação publicitária. Só que, às vezes, as "liberdades poéticas" não compensavam, nem mesmo nesse mundo da publicidade.
Neste caso, temos uma frase (um "slogan" publicitário), elaborada para o Metropolitano de Lisboa... mas recusada pela empresa (vá-se lá saber porquê!...).
Agora, nesta época de grafitis, alguém se lembrou de a recuperar, e de a colocar no devido local, digamos assim.
(Imagem retirada do blogue O Nadir dos Tempos)

Vejam também, e a propósito, um site sobre o metropolitano de São Paulo. Como está em português do Brasil, só se podia chamar...
Guia Vá de Metrô

Poesia e propaganda

Hei-de mandar arrastar com muito orgulho,
Pelo pequeno avião da propaganda
E no céu inocente de Lisboa,
Um dos meus versos, um dos meus
Mais sonoros e compridos versos:

E será um verso de amor...

Alexandre O’Neill

Mais poemas de Alexandre O’ Neill neste blogue, com “links” para outros artigos sobre o mesmo autor: cliquem aqui!

segunda-feira, setembro 24, 2007

Pedras na calçada

Caminhei sempre, sem parar...
Sem parar... não... agoro me recordo, talvez parasse uma ou duas vezes, talvez...!
Tudo dei, e nada dei.
Tudo tive, e nada tive.
Talvez o meu olhar fosse tão apático... até... demasiado apático...!
Ao longe, alguém me seguia com o olhar... no olhar!
Alguém, algo, que me perseguia na monotonia, dos dias, das noites.
Sozinha...
Mas eu nunca estive sozinha...
Tu estiveste sempre comigo!
Triste... disseram-me um dia!
Como...? Possível como...?
Se eu não quero!
Morte... medo, como?
Se eu não a temo...!
Medo...? Não...!!!
Dor...! Só dor!
Pensar que um dia te destruirão...
Destruirão, as minhas pedras na calçada... as minhas
companheiras, as minhas confidentes...
Pisadas por tanta ignorância...
Demasiada ignorância!!!

Lélé

Debaixo do Bulcão poezine
Número 10 – Almada, Setembro 1998

sexta-feira, setembro 21, 2007

Ó sole mio


Raios te partam
Que não és espelho, vidro de algum,
Massa em espasmos, força!
A lua esconde-te, sem paralelum.

Luz, disse Goethe
Devorando o teu astro
Como um navio sem medo
Deixando no oceano o lastro.

O meu corpo recupera do teu
A alma infinita
Brilho, cor, suor, o calor
Sem que agora o sinta.

Nas horas longínquas em que te possuo
Comovo-me com a tua bondade
São horas permitidas
Aquelas em que tenho mais saudade

De ti, brasa e candeia dos dias
Fazes mover as vidas
Perpétuas de dor
Lágrimas cometidas.

Teu signo é leão
Ó esfera que nos cega
O destino é sempre este
Errar como ele erra.

“Errante é tanto aquele
que se engana como
aquele que deambula.”

Rui Rocha
Debaixo do Bulcão poezine
Número 10 – Almada, Setembro 1998

terça-feira, setembro 18, 2007


Provei do cálice o líquido insano
de amargo sabor e estranhas visões
de realidades incertas
de definições macabras
e jogos desprovidos de amor.
Que realidade é esta
que em meus olhos não vejo,
em meu corpo não sinto
e a alma me aperta,
o espírito fere,
esse sabor amargo
que me aflora à boca
e despedaça o sonho.

António Boieiro
Debaixo do Bulcão poezine
Número 5 – Almada, Setembro 1997

O sol brilha

Será que o sol brilha?

Não sei
Só sei que o sol talvez brilhe
Se é que o sol brilha, porque
É que não vemos o sol brilhar?

Porque talvez o brilho do sol
Não seja para todos

Porque será que só quando bebo
Eu vejo o brilho do sol?
Porque se calhar só fora da
Realidade
O sol brilha...

João Parente
Debaixo do Bulcão poezine
Número 5 – Almada, Setembro 1997

sábado, setembro 15, 2007

Duas variações sobre quase o mesmo tema, por Miguel Nuno

Ah ah esta bota não me cabe no pé!



Leiam este poema em

Eh he esta bota não me cabe no pé!


E este em

wiguelnuno.blogspot.com/2007/01/eh-he-esta-bota-no-me-cabe-no-p.html

E ainda mais do mesmo autor em
wiguelnuno.blogspot.com

(Explicação? É mais um daqueles manuscritos que, ao longo dos anos, foram entregues para publicar no Debaixo do Bulcão poezine... aos quais, entretanto, os respectivos autores foram fazendo alterações. Nós publicamos agora os originais!...)

sexta-feira, setembro 14, 2007


Tempo

O tempo segue o sol depois a turva
opacidade e o escuro: e depois?
Ó minha avozinha que enterraram
há muito tempo (em quarenta e dois)
num dia de chuva!

Ao tempo segue o nada e o som do vento
varre sem nome (e perto) o estendal
Ó minha avozinha que hás-de ir
em breve para a terra enquanto a cal
me come por dentro!

O grande fio a prumo do que existe
oscila no vazio a íngreme rua
Ó meus mortos todos concentrados
a vigiar sem olhos à luz nua
a minha vida triste!

Perto contudo o incerto movimento
dos risos luminosos que tu dás
Ó minha infância morta: tu ali estavas
sentada nesse círculo onde estás
num vestígio cinzento!

Quem sou? Seja eu o fado antigo
da casa velha e o bafio na escada
Ó minha vida antiga a descer
a eterna rampa larga e apertada
sozinha comigo!

Que mais? Vegetação no fosso e pó
onde uma música vem a subir
Ó minha vida triste eu vou chorar
esta esquina que ando a perseguir
no vento de ser só!

António José Coutinho

(Estas duas versões do poema “Tempo” foram entregues pelo autor, António José Coutinho, ao editor do Debaixo do Bulcão poezine, António Vitorino - algures em Almada, durante as noites de boémia da década passada. Nunca foram publicadas na edição em papel. Portanto, aproveitamos para as divulgar agora, no reinício deste blogue, após as férias de Verão...)