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sábado, julho 21, 2007

A NOSSA FALA - XCI - (t) CHINCA

Comecemos por uma lenga lenga: à morte ninguém escapa/nem o bispo, nem o Rei nem o Papa.../Mas hei-de escapar eu: compro uma panela/ meto-me dentro dela/ e quando a morte vier/ Digo-lhe assim: aqui não há homem nem mulher/ Aqui não mora ninguém/ Passe Vexa muito bem.
O ser humano é mesmo um artolas. É o ser mais maligno à superfície da Terra.
Na distribuição dos espaços a cada um dos seres vivos ficaram para últimos o peixe, o lobo e o homem. Perguntou o Demiurgo: «Que queres tu, peixe? » "Quero o fundo mar"; « para ti será»... E tu, lobo, de que espaço queres usufruir»? ; "Do alto das montanhas, Senhor!" «Ficam-te desde já concedidos»; e «e tu, macaco pelado, que queres?»; " Eu só quero arte e manha"; «São tuas». E foi assim que a partir daquele momento nem o peixe escapa no fundo mar nem o lobo no alto das montanhas ao detentor da arte e da manha.
Mné Gaguela era cunhado de TonhoZÉi. Rivalizavam entre si a ver qual fazia menos. A velha Menas, mãe de Mné e sogra de Tonho é que se desunhava na acadeja da lenha e, mesmo já velhinha, ainda ia para os quintos para dar de "mamar" a estes dois.
Só queriam era candonga, andar na moinice, viver na gosmia, mas, o que era indubitável, era que lá iam bebendo sempre o seu copinho a ponto de irem borrachinhos de todo, estrada acima, até ao Mnel Ferreiro, altura em que viravam até ao recôndito lar.
Para se ver a sabujice e a lambugueirice destas duas prendas veja-se que Mné, para não ter o trabalho de se casar, pediu a própria mãe em casamento. Nem Freud no se melhor teria imaginado uma destas!
Tonho Zéi, esse, andava sempre "co reumático". De Verão e de Inverno calçava sempre umas alpergatas espanholas, 'que os pés não me cabem nas botas por mor dos ginetes (=joanetes) e de inverno atolo e ando sempre molhado e o reumático no quer húmido, de Verão em qualquer lado espeto um crapeto (carapeto) ou umas unhas de gato (v.g.-abre olhos ou abrolhos), inté mesmo uma palha de restolho me fura a sola da alpargata (alpergata)', e, por via disso, Tonho Zéi, nem ia à azeitona, que, não sendo trabalho pesado, exigia que os pés andassem todo o dia no degrau da escada e a finura da borracha até fazia parecer que andava descalço, e, de Verão, não ia à ceifa porque podia espetar alguma seta nos pés.
Do que ele gostava era da vindima.... aí é que era... Andava sempre a ver de quem o convidasse para esmagar as uvas. As grainhas não o apoquentavam, podia fumar o seu cigarrinho e matava a sede com tinto do outro ano. Mné Gaguela, nem isso.
Tenho pena que as palavras não reproduzam a fala entoada de Mnel. Mas é assim...
Sócrates (o grego, que não este basófias...) nunca esceveu, porque, dizia, as palavras são polissémicas e quem lê pode ir para onde o locutor não queria, ao passo que o diálogo à hora, se bem que efémero, torna a palavra viva e ajustada.
Esclarece e não dá azo a interpretações dúbias ou ambíguas...
Quer um quer outro, eram expertos no costil. A bem dizer, metade das refeições eram chicha de ave agarrada em armadilha. Tinham agúdias todo o ano e conheciam de cor os melhores agachis.
Preguiçosos a levantarem-se, não eram... Manhã cedo lá iam com os costis engudiados na noite anterior à luz da velha candeia e, por volta do meio-dia, aí apareciam com o almoço. Ainda lhes comprei alguns passarinhos. Tempos...
Tonho Zéi era mais velho e sabia mais da folha do que Mné. Os costis que custavam mais a engudiar dava-os sempre ao Mné e o monte que ele fazia era sempre maior do que o do cunhado. Daí a chamar azelha ao Mné ia um passo e, como cada um sabia os costis que punha, o dinheiro de alguma venda era correspondente aos passarinhos agarrados e nestas coisas, quem mais tem, mais agarra. Mné ficava sempre a perder. Não era raro que andasse dever cigarros a Tonho ZÉi:"ó cunhado, eu pago, eu pago, pró Verão eu pago..." Tonho Zéi tinha uma espécie de régua no bolso e com a navalha acentava cada um dos cigarros que o cunhado lhe pedia. «Contas são contas, mainada»; também os costis que eram mais difíceis de armar porque o arame que segurava a tensão da mola estava muito aguçado para ser mais sensível, também esse, tonho Zéi passava ao Gaguela. Ouviam-se cá fora os praguejos de Mné quando se entalava a experimentar o costil, que (t)chincava facilmente.
O. S. Bartolomeu vem aí. Numa noite dessa festa, já lá vão uns anitos, Mné tinha arranjado umas coroas e comprou cigarros com "cu de cortiça" = (cigarros com filtro). Tinha agarrado um alacrário (escorpião) e meteu-o numa caixa de fósforos dos grandes...
Chega-se a mim, lá lhe paguei um copinho servido pelo meu amigo Zé Cadete que até foi a Nova Iorque na SAGRES, no tempo da vida barata, e :« Ó primo, queres ver que eu vou a (t)chapar o meu cunhado Tonho Zéi!?, queres ver, queres?» " Então como? "« espera aqui que já vês..." Chamou o Tonho Zéi, lá tive que pagar mais três copitos, e Gaguela:´«Ó cunhado queres um cu de cortiça, queres?» "ôia! hoje tens cu de cortiça!? dá cá, homem". «Toma, Toma»! Tonho Zéi agarra no maço tira o cigarro CT e Mné Gaguela, solícito, apresenta-lhe a caixa grande dos fósforos...: «Toma tamém lume, toma »; "cum filha da puta até tens palitos dos grandes...festa é festa...; abre a caixa e mete a mão a pensar que ia tirar os fósforos mas saíu-lhe uma ferroada do alacrário... O que a seguir se passou não pode ser transcrito. Imaginai!
Gaguela no entanto sempre ia dizendo: Toma. toma, é por causa de não me dares sempre os costis que se (t)chincam fácil, toma, bem feita; prá outra vez é pior! pensavas que no mas pagavas, pensavas,?; agora toma!
Não há dúvida: a arte a manha não agarram só peixes e lobos... Agarram-nos a todos.
Para a outra vez logo vos dou mais significados de (t)chincar...
XXXXXXXXXXXXIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII!

sábado, setembro 16, 2006

A NOSSA FALA -LXVII -CANDONGA

O contrabando é um fenómeno com uma quantidade de variáveis, talvez ainda não completamente exploradas....
Eram muitos os contrabandistas pelas terras da Raia. Alguns morreram mesmo, varados por bala de Guarda Fiscal ou Carabinero. Viajavam de noite por aqueles córregos da Baságueda e, claro, tinham que evitar os caminhos mais batidos e aqueles mais próximos das herdades para não serem denunciados pelos cães. Para eles não havia nem bom nem mau tempo: apenas era importante salvar o carrêgo, senão, lá se ia parte significativa da jorna. Aqui tropeçavam, além caíam mas sempre se levantavam. Calados ,cada um fazia por si e era um alívio quando chegavam a casa já sem o peso, que esse fora antes aliviado em sítio combinado com o angariador. Ainda ajudei a descarregar alguns carrêgos que chegavam a cavalo, alta noite, ali por detrás da serra a dar vista para a Bemposta, bem perto da Carochinha e do João Ratão. Tudo às escuras, tudo calado. Cada um sabia o que fazer e onde deixar o material.
O velho comandante também andou nestas aventuras e não era raro ouvi-lo contar histórias de fugas aos Guardas Fiscais e Carabineiros. Protestava mesmo contra Deus, que, a seu ver, também não tinha feito tudo bem... Era sua convicção que Deus se teria distraído e que havia quatro coisas mal feitas no mundo. E contava:
A primeira é chover no mar - se lá há tanta água por que raio lá caía mais?
A segunda era fazer Lua de dia - se cá está o Sol a alumiar para que precisamos da lua?
A terceira é que a barriga das pernas havia de ser à frente e nunca atrás, Assim, quando vinha com os carrêgos, já não se "demazelaria" tanto por mor das "topadelas" das canelas contra os "picerros"
A quarta só a contava quando não havia mulheres por perto: aquilo que nos homens não tem osso é que havia de ter porque assim estava sempre direito e pronto para o "trabalhinho".
Contrabandista famoso na área era o velho Jonja: andava sempre na CANDONGA. Sempre com o copo, os dados e o bocadinho de cortiça no bolso,ou com as caricas aí estava ele sempre a desafiar para o pilinhas. Escondia um bocadinho de cortiça debaixo de uma das caricas ou de um dos três copos e o desafio consistia em descobrir onde estava a cortiça. Era sempre a apostar. Quem descobrisse ganhava o dobro do apostado, que pagava o Jonja. Os que perdiam ficavam sem o dinheiro da aposta. Não havia festa nem mercado onde o Jonja não aparecesse. E o mais: apesar de o Jonja levar sempre mais dinheiro do que o que trazia, nunca lhe faltavam clientes. A malta ia na candonga do velho. E se ele era artista!
São hoje outras as candongas que nos iludem. Escondidas por debaixo de outros copos que não os sebentos do velho Jonja.Basta a vergonha do que se passa no futebol (antigamente o desporto era noticiado sempre ao fim dos jornais, agora é logo no início); este povo deve andar louco: em vez de se preocupar com o que é essencial - a saúde, a paz, o trabalho, a educação, a segurança social, o pão, o preço da energia, os aumentos diários dos produtos vitais,que sei eu?... - este povo discute um penalti, um golo marcado com a mão, a questão da possível sucessão do mesmo num qualquer clube,... O povo vai na candonga do que lhe impingem e tal como os clientes do Jonja pensavam que a cortiça estava por debaixo do copo do meio e aí apostavam, também agora,tontos, continuam a apostar em cavalos (ou serão éguas?) errados.
Não se pode ensinar a virtude, já dizia o velho Platão, mas, c'os diabos, é tempo de acordarem e deixarem de pensar que o que acontece aos outros está longe de nos acontecer a nós.
Aquele que, para mim, é, de longe, o maior escritor português em prosa - o P. António Vieira - já chamava a atenção para o facto de nada, (já naquele tempo) se poder considerar seguro: "nem já o frade, dizia, tem segura a sua cela".
Nós, iludidos como andamos nesta azáfama quotidiana, embarcamos no engodo - ou será na candonga ? - do que nos querem envolver. Enredados nesta teia bem urdida pela Aracne dos poderosos, ficamos sem o fio de Ariadne que nos conduza, qual Teseu, à porta do labirinto de Dédalo. Façamos, então, as asas mas não sejamos tontos como Ícaro...
Outras candongas por aí andam mas ficam para outra oportunidade.
Para já deixo-vos o alerta de que há por aí muitos Jonjas, que na sua pequena figura, nos iludem em candongas bem camufladas a ponto de só tarde reconhecermos que apostámos no cavalo errado.
Depois não vos queixai.
Como dizia o velho comandante"um homem quer-se com génio" MAINADA!
Um XI gggrrrrrrrraaaaaaaaannnnndddde!