Comecemos por uma lenga lenga: à morte ninguém escapa/nem o bispo, nem o Rei nem o Papa.../Mas hei-de escapar eu: compro uma panela/ meto-me dentro dela/ e quando a morte vier/ Digo-lhe assim: aqui não há homem nem mulher/ Aqui não mora ninguém/ Passe Vexa muito bem.
O ser humano é mesmo um artolas. É o ser mais maligno à superfície da Terra.
O ser humano é mesmo um artolas. É o ser mais maligno à superfície da Terra.
Na distribuição dos espaços a cada um dos seres vivos ficaram para últimos o peixe, o lobo e o homem. Perguntou o Demiurgo: «Que queres tu, peixe? » "Quero o fundo mar"; « para ti será»... E tu, lobo, de que espaço queres usufruir»? ; "Do alto das montanhas, Senhor!" «Ficam-te desde já concedidos»; e «e tu, macaco pelado, que queres?»; " Eu só quero arte e manha"; «São tuas». E foi assim que a partir daquele momento nem o peixe escapa no fundo mar nem o lobo no alto das montanhas ao detentor da arte e da manha.
Mné Gaguela era cunhado de TonhoZÉi. Rivalizavam entre si a ver qual fazia menos. A velha Menas, mãe de Mné e sogra de Tonho é que se desunhava na acadeja da lenha e, mesmo já velhinha, ainda ia para os quintos para dar de "mamar" a estes dois.
Só queriam era candonga, andar na moinice, viver na gosmia, mas, o que era indubitável, era que lá iam bebendo sempre o seu copinho a ponto de irem borrachinhos de todo, estrada acima, até ao Mnel Ferreiro, altura em que viravam até ao recôndito lar.
Para se ver a sabujice e a lambugueirice destas duas prendas veja-se que Mné, para não ter o trabalho de se casar, pediu a própria mãe em casamento. Nem Freud no se melhor teria imaginado uma destas!
Tonho Zéi, esse, andava sempre "co reumático". De Verão e de Inverno calçava sempre umas alpergatas espanholas, 'que os pés não me cabem nas botas por mor dos ginetes (=joanetes) e de inverno atolo e ando sempre molhado e o reumático no quer húmido, de Verão em qualquer lado espeto um crapeto (carapeto) ou umas unhas de gato (v.g.-abre olhos ou abrolhos), inté mesmo uma palha de restolho me fura a sola da alpargata (alpergata)', e, por via disso, Tonho Zéi, nem ia à azeitona, que, não sendo trabalho pesado, exigia que os pés andassem todo o dia no degrau da escada e a finura da borracha até fazia parecer que andava descalço, e, de Verão, não ia à ceifa porque podia espetar alguma seta nos pés.
Do que ele gostava era da vindima.... aí é que era... Andava sempre a ver de quem o convidasse para esmagar as uvas. As grainhas não o apoquentavam, podia fumar o seu cigarrinho e matava a sede com tinto do outro ano. Mné Gaguela, nem isso.
Tenho pena que as palavras não reproduzam a fala entoada de Mnel. Mas é assim...
Sócrates (o grego, que não este basófias...) nunca esceveu, porque, dizia, as palavras são polissémicas e quem lê pode ir para onde o locutor não queria, ao passo que o diálogo à hora, se bem que efémero, torna a palavra viva e ajustada.
Esclarece e não dá azo a interpretações dúbias ou ambíguas...
Quer um quer outro, eram expertos no costil. A bem dizer, metade das refeições eram chicha de ave agarrada em armadilha. Tinham agúdias todo o ano e conheciam de cor os melhores agachis.
Preguiçosos a levantarem-se, não eram... Manhã cedo lá iam com os costis engudiados na noite anterior à luz da velha candeia e, por volta do meio-dia, aí apareciam com o almoço. Ainda lhes comprei alguns passarinhos. Tempos...
Tonho Zéi era mais velho e sabia mais da folha do que Mné. Os costis que custavam mais a engudiar dava-os sempre ao Mné e o monte que ele fazia era sempre maior do que o do cunhado. Daí a chamar azelha ao Mné ia um passo e, como cada um sabia os costis que punha, o dinheiro de alguma venda era correspondente aos passarinhos agarrados e nestas coisas, quem mais tem, mais agarra. Mné ficava sempre a perder. Não era raro que andasse dever cigarros a Tonho ZÉi:"ó cunhado, eu pago, eu pago, pró Verão eu pago..." Tonho Zéi tinha uma espécie de régua no bolso e com a navalha acentava cada um dos cigarros que o cunhado lhe pedia. «Contas são contas, mainada»; também os costis que eram mais difíceis de armar porque o arame que segurava a tensão da mola estava muito aguçado para ser mais sensível, também esse, tonho Zéi passava ao Gaguela. Ouviam-se cá fora os praguejos de Mné quando se entalava a experimentar o costil, que (t)chincava facilmente.
O. S. Bartolomeu vem aí. Numa noite dessa festa, já lá vão uns anitos, Mné tinha arranjado umas coroas e comprou cigarros com "cu de cortiça" = (cigarros com filtro). Tinha agarrado um alacrário (escorpião) e meteu-o numa caixa de fósforos dos grandes...
Chega-se a mim, lá lhe paguei um copinho servido pelo meu amigo Zé Cadete que até foi a Nova Iorque na SAGRES, no tempo da vida barata, e :« Ó primo, queres ver que eu vou a (t)chapar o meu cunhado Tonho Zéi!?, queres ver, queres?» " Então como? "« espera aqui que já vês..." Chamou o Tonho Zéi, lá tive que pagar mais três copitos, e Gaguela:´«Ó cunhado queres um cu de cortiça, queres?» "ôia! hoje tens cu de cortiça!? dá cá, homem". «Toma, Toma»! Tonho Zéi agarra no maço tira o cigarro CT e Mné Gaguela, solícito, apresenta-lhe a caixa grande dos fósforos...: «Toma tamém lume, toma »; "cum filha da puta até tens palitos dos grandes...festa é festa...; abre a caixa e mete a mão a pensar que ia tirar os fósforos mas saíu-lhe uma ferroada do alacrário... O que a seguir se passou não pode ser transcrito. Imaginai!
Gaguela no entanto sempre ia dizendo: Toma. toma, é por causa de não me dares sempre os costis que se (t)chincam fácil, toma, bem feita; prá outra vez é pior! pensavas que no mas pagavas, pensavas,?; agora toma!
Não há dúvida: a arte a manha não agarram só peixes e lobos... Agarram-nos a todos.
Para a outra vez logo vos dou mais significados de (t)chincar...
XXXXXXXXXXXXIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII!