30 de julho de 2007

CAFÉ-COM-LEITE

"Ele é café-com-leite!" – a expressão foi muito ouvida quando eu era criança. Menor, mais fraco e perna-de-pau. Continuei café-com-leite, achando que não tinha nenhuma chance com as garotas, que só atrapalhava no futebol e que todo o mundo tinha pena de mim.

Veio a adolescência, e as coisas mudavam muito devagar. Passei a entender que a mesma imagem que eu tinha de mim era a que os outros teriam. Comecei a me esforçar para vencer aquela timidez que me fazia sentir fechado em um casulo, mas o caminho era árduo. Fiz muitos amigos, era admirado por algumas pessoas; não demorou para ganhar a fama de maluco na escola, o que me garantiu alguma popularidade. Saí da linha e fui agarrar, o que me garantiu lugar em todos as partidas. Mas quando se tratava de garotas, continuava me sentindo café-com-leite.

Passei dos dezoito, vinte, vinte e cinco... amadureci, tive relacionamentos que alternaram o melhor e o pior que a vida a dois pode oferecer, transitei do amor pleno à mais absoluta indiferença, comecei a sair sozinho e voltar acompanhado sempre que queria. Mas e daí?

Hoje ainda me sinto um pouco à parte. Em alguns momentos, me vejo como uma fraude que as pessoas simplesmente escolhem comprar. Aprendi a nem sempre me projetar como me vejo. Continuo conquistando quase tudo por que eu luto, na vida pessoal, profissional e afetiva, mas quando estou sozinho, num canto, vejo que ainda sou aquela mesma criança tímida e acanhada. Café-com-leite.

23 de julho de 2007

A PIOR MENTIRA DE TODAS

Começo a entender por que meus relacionamentos terminam mal e, quando não, minha relação com a ex passa de hostil a inexistente. Além de alguns problemas sobre os quais eu já falei, existem algumas mentiras absolutamente necessárias para manter o bom funcionamento do casal. Mas há quem prefira levar uma vida sem mentiras, falando tudo o que pensa e sente sem se preocupar com as conseqüências a que isso pode levar.

Não concordo com essa atitude; nossa mente pervertida tem vida própria e passeia por onde não deveria. Fantasiamos situações, pessoas, sonhamos e, muitas vezes, não temos o menor controle sobre isso. E essas verdades fazem sofrer.

Eu sempre optei por mentir para não machucar, pois a versão da verdade pode parecer muito pior do que ela em si. Também nunca cometi algo tão grave que me deixasse culpado a ponto de não conseguir esconder. Era mais algo para proteção, uma das inúmeras formas que eu arrumava para proteger quem estivesse namorando comigo.

Existem também as verdades do momento, que podem ser muito sinceras na hora em que são ditas, mas dependem de uma série de circunstâncias e conjunturas para poderem ser levadas em conta, pois elas porque envolvem sentimento, e sentimentos mudam. Mas nem sempre as pessoas compreendem isso.

Assim, quando soube que uma ex-namorada tinha muita raiva de mim, mesmo eu não a tendo traído, mesmo eu não a tendo tratado mal, finalmente entendi que eu havia contado a maior de todas as mentiras. Essa, maior do que qualquer traição, pior do que qualquer humilhação e de que tudo aquilo que poderia deixá-la triste e que eu sempre tomara um cuidado extremo para evitar. A única mentira irreversível: o "para sempre".

16 de julho de 2007

YOUNG LUST

Entre os catorze e os vinte e poucos anos, especialmente no final da escola e da minha adolescência, eu me tornei uma pessoa bem underground. As músicas que ouvia, bares, boates, as pessoas com quem andava não tinham nada de convencional e, nessa época, ser alternativo ainda não era mainstream e a moda passava longe de roupas pretas e piercings.

Como na música do Pink Floyd, eu não precisava de uma namorada, muito menos de uma garota que eu pudesse apresentar para os meus pais. Num dos primeiros porres da minha vida, fiquei atraído por uma mulher que meus amigos apelidaram de "Suja". Nessa mesma época, eu queria pegar a irmã de um conhecido que era gordinha e vivia com uma camisa xadrez amarrada na cintura, bebia mais do que eu e fumava como uma chaminé. Algumas vezes, poucos anos depois, fiquei com uma amiga que era um pouco mais do que cheinha e que se encaixava nos moldes acima.

Esse tempo se foi há alguns anos, não tenho mais resistência para estragar meu corpo como fazia com tanta cerveja e vodca e tenho responsabilidades que não me permitem passar as manhãs de ressaca e as noites bêbado. Mas nunca me adaptei a essa vida padrão nem aos padrões internacionais de beleza. Na verdade, não me adaptei a nenhum padrão. Passei por períodos em que estava namorando, mas nunca consegui ser tão feliz como sozinho. Mas sei que, cedo ou tarde, isso acaba, nem que seja para recomeçar o ciclo. Pois, como disse Paul McCartney, "Jojo was a man who thought he was a loner, but he knew it could'n last".