26 de dezembro de 2006

FALANDO DE TRABALHO

O que é um profissional bem-sucedido? Aquele cara que trabalha todos os dias de nove às seis, veste terninho, passou num concurso público para fiscal de algum tribunal e ganha rios de dinheiro para ser um burocrata? Depois chega cansado e toma seu uisquinho, mas somente para relaxar.

Alguns empregos servem de trampolim para coisas melhores. Outros são verdadeiras armadilhas: pagam muito bem, o que desencoraja as pessoas de procurar outras realizações. Conheço pessoas que passaram em concursos e que até gostam de seus empregos, mas são somente peças em uma engrenagem pós-moderna; não criam nada de novo. E passam anos, até mesmo décadas, desempenhando a mesma função, vivendo a mesma rotina. Suas vidas não mudam.

Talvez algumas pessoas até gostem de seus empregos repetitivos, mas estas, vejo com desconfiança – afinal, uma pessoa com pouco senso crítico é facilmente manobrável. Já eu, troco um bom salário por um bom projeto, algo em que criatividade e inventividade sejam os principais requisitos para se trabalhar. Desde que, é claro, isso possa me sustentar.

19 de dezembro de 2006

ESPAÇO

Relacionamentos podem sufocar. Eu sempre gostei de ficar sozinho no meu canto, estando namorando ou não. Preciso de um tempo para mim, para não fazer nada ou para pensar em outras coisas sem que haja alguém requerendo minha atenção.

O problema é que meus relacionamentos costumam ocupar esse espaço, esse meu tempo solitário. Não sei se a maioria das mulheres é assim ou se sou eu quem atrai, até porque costumo dar mais do que posso sustentar no início no namoro. Aquela empolgação da novidade faz com que esqueçamos de nós mesmos e doemos tudo, até o momento em que sentimos falta daquilo que cedemos.

Então vem o sufoco, aquela sensação de claustrofobia que me faz querer acelerar o tempo para dar a hora de ir embora. Começo a sentir falta de sentir saudade e acabo tendo de impor minhas condições para continuar o namoro. É autoritário, eu sei, mas é isso ou nada, pois eu freqüentemente desrespeito meu próprio limite.

E vem aquela velha ladainha: "você não é mais como no começo, me trata diferente...". As coisas nunca são como no começo, por que as mulheres não entendem isso? Elas mudam de forma, de cor, mas podem não mudar de intensidade. Só que isso dá trabalho e exige esforço de ambas as partes – e nem sempre vale a pena.

11 de dezembro de 2006

ENTRE AMIGOS

Eu nunca fui chegado a drogas. Não experimentei ecstasy, ácido, chá... mas até que gostei quando fumei maconha pela primeira vez. Nada que se comparasse ao efeito do álcool, mas a sensação era gostosa. Mas o interessante dessa história não é a maconha, mas as circunstâncias em que debutei na erva.

Minha primeira banda estava em vias de terminar, já que tínhamos expulsado o vocalista, que também era o compositor. O cara compunha bem, mas cantava mal e se recusava a entrar numa aula de canto. Além disso, era insuportavelmente metido (como aquela piada: quantos vocalistas são necessários para se trocar uma lâmpada? Só um, ele segura a lâmpada e espera o mundo girar em torno dele).

Bem, viajei com o baterista, sua namorada, o percussionista e alguns amigos deles para a Região dos Lagos. Era uma daquelas viagens à base de miojo e pastel de praia que hoje, sinceramente, não me vejo mais fazendo. Passávamos o dia na praia, depois ficávamos ouvindo Beatles em casa. Disse-me um amigo: "Beatlemaníaco é que nem flamenguista! Quer que todo o mundo seja também!".

Os rapazes decidiram que era meu dia de experimentar maconha. Era início de noite e acendemos um baseado. A sensação foi gostosa, mas nada muito marcante. Só a fome depois é que foi considerável. Nesse mesmo dia, comecei a reparar uns olhares vindos justamente da namorada do batera. E eu estava muito carente, ainda mais com o fim iminente da banda e sem ninguém em quem me apoiar.

No dia seguinte, preparei um daqueles macarrões prontos da Maggi. Acho que era o al pesto, um dos meus preferidos na culinária prática. Sentei-me no sofá para comer e ela se acomodou no chão, logo abaixo de mim. Tomou o garfo da minha mão e começou a me dar a comida na boca. Entre uma garfada e outra, ela alisava minha perna, sorria... e o máximo que eu conseguia fazer para resistir era pedir socorro com os olhos para o baterista.

A essa altura, meu coração já estava disparado. Eu só pensava no quão errado seria ficar com ela, ainda que fosse depois e ele não soubesse. Mais tarde, chamei-o para conversar. "Cara, me ajuda, fala pra ela parar com isso". Ele me respondeu "Seu olhar procura o dela". "Difícil evitar, né? Me ajuda". Não discutimos, não brigamos, não abalamos nossa amizade.

Naquela mesma noite, o batera brigou com ela. Disse-lhe que aquilo, além de covarde comigo, era uma falta de respeito com ele. Eu soube porque um amigo em comum ainda estava acordado no quarto quando aconteceu.

O namoro não durou muito, nem havia como. Encontrei-a quase um ano depois andando no calçadão da praia de Copacabana. Fomos conversando até sua casa e, ao se despedir de mim, ela me deu um daqueles beijos no cantinho da boca. Deixei como estava, afinal, não valia a pena ir além disso. Nunca mais ouvi falar dela.

6 de dezembro de 2006

INICIATIVA

Eu devia ter uns treze anos, não me lembro. Fomos para um hotel em Nova Friburgo que tinha um bar com piano. Eu gostava de me sentar lá com o bar vazio e tocar para mim mesmo. Mas é impressionante como a música atrai as mulheres, elas ouvem, chegam perto, querem ouvir mais, saber o que está por dentro daquela pessoa que toca.

Todos os dias eu ia lá, tirando músicas de ouvido e torcendo para que as pessoas não prestassem atenção em mim. Até que um dia, surgiu uma garota com umas revistinhas de banca, daquelas com cifras e letras que nem sempre estão corretas. Era início de tarde e estava começando a esfriar.

Conversamos sobre música, escolhemos o repertório. Eu tocaria para ela cantar, mas ela me pediu para cantar junto. Com um pouco de esforço, tentei estabilizar minha voz, que estava em franca metamorfose. Eu tocava e sentia seu cheiro, tentava não me desconcentrar. Ela chegava perto, encostava e eu nem sabia o que fazer. Iniciativa foi o que mais me faltou na adolescência e o que mais me frustrou, me deixando grandes lacunas que jamais viriam a ser preenchidas.

Já as mulheres, essas sabem desde cedo. Ela me abriu a revistinha na música Garotos, do Leoni (o nome certo é Garotos II (o outro lado)). Essa música sempre acaba comigo e, provavelmente, com vocês também, caros leitores. Aquela letra, aquele perfume e eu imaginando que seria mais uma garota que poderia ter sido e não foi por falta de coragem. Eu estava certo.