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quarta-feira

NOSFERATU: UMA SINFONIA DO HORROR

NOSFERATU: UMA SINFONIA DO HORROR (Nosferatu, eine symphonie des grauens, 1922, Jofa-Atelier Berlin-Johannistal, 94min) Direção: W.F. Murnau. Roteiro: Henrik Galleen, romance "Drácula", de Bram Stoker. Fotografia: Fritz Arno Wagner. Figurino: Albin Grau. Produção: Enrico Dieckmann, Albin Grau. Elenco: Max Schreck, Gustav von Wangenheim, Greta Schroder. Elenco: 17/02/22

A imagem é forte o bastante para ser reconhecida até mesmo pelos fãs de cinema que nunca tiveram a oportunidade de assistir ao filme que lhe deu origem: o assustador Conde Orlok levanta-se, rígido e cadavérico, com seus afiados dentes de coelho, orelhas de morcego, careca e dotado de gigantescas unhas, do caixão onde descansa durante os dias. A cena, envolta por uma atmosfera claustrofóbica e um tom de pesadelo, já faz parte do inconsciente coletivo há pelo menos nove décadas, mas mantém-se como um dos mais brilhantes ícones visuais jamais criados pela sétima arte. Criado em conjunto pelo cineasta F.W. Murnau e pelo ator Max Schreck, o Conde Orlok é o protagonista de “Nosferatu, uma sinfonia do horror”, um filme lançado em 1922 e que, ao mesmo tempo, fez a glória de seu estúdio, o Prana, e o levou à falência, em mais uma prova inconteste de que a ironia e o cinema caminham de mãos dadas.
            
Não que o filme tenha sido um fracasso de bilheteria ou algo parecido, muito pelo contrário. Louvado pela crítica e abraçado pelo público, ele acabou vitimado por outro inimigo, muito mais perigoso do que estacas e a luz do sol: a Justiça. Explica-se: a intenção de Murnau era filmar uma adaptação do romance “Drácula”, escrita pelo irlandês Bram Stoker, publicado em 1897, mas teve seus planos barrados pela família do escritor, que não lhe deu permissão para levar o projeto adiante. Não se dando por vencido, ele resolveu, então, fazer algumas alterações na trama central (não muitas e bem mal disfarçadas) e vender seu filme como uma história diferente. Não colou. Logicamente todo mundo percebeu que o que estava na tela era a tradução em imagens do livro de Stoker. Resultado: um processo por violação de direitos autorais e uma ordem judicial de destruição de todas as cópias da obra. O estúdio não conseguiu lidar com a dívida e decretou falência, mas para a sorte de milhares de cinéfilos o filme não desapareceu como desejavam seus detratores. Muito pelo contrário: com o passar dos anos, “Nosferatu” acabou por tornar-se um dos mais adorados e imitados produtos do gênero, tendo merecido inclusive um desnecessário remake dirigido por Werner Herzog em 1978 – estrelado por Klaus Kinski e Isabelle Adjani, que reaproveita muitas de suas ideias visuais – e uma interessante homenagem pelo diretor E. Elias Merhige e pelo roteirista Steven Katz chamada “A sombra do vampiro” – que insinuava, em tom de humor, que o ator Max Schreck era um sanguessuga de verdade contratado por Murnau para dar maior veracidade às cenas imaginadas por ele.
          
 Logicamente a hipótese levantada pela brincadeira de Merhige e Katz não passa de hipótese, mas não é difícil imaginar de onde ele tirou tal ideia: realmente a atuação de Schreck é notável, transmitindo uma sensação de repulsa e putrefação como poucas vezes o cinema foi capaz – especialmente sem contar com os recursos modernos. Contando com a ajuda providencial da fotografia de Fritz Arno Wagner, que transforma cada rua em uma armadilha e cada montanha em uma representação do mal, Murnau construiu uma narrativa de ritmo ágil e tensão crescente, que oferece ao espectador um espetáculo que mistura com precisão um clima gótico e altas doses do expressionismo alemão, movimento do qual o cineasta era um dos maiores expoentes. Sustentado por uma trama forte e personagens marcantes (ainda que criados por Stoker e não pelo roteirista Henrik Galeen), Murnau extrai o máximo efeito de seus jogos de luz e sombras, fazendo deles personagens cruciais para a série de grandes momentos do filme: da primeira aparição do Conde, quase escondido em um túnel que leva à sua propriedade até seu célebre desfecho (que foge do final do livro em que foi baseado), “Nosferatu” é uma antologia de cenas visualmente bem arquitetadas e realizadas por um diretor inteligente e de grande talento.
         

Cinco anos depois de assinar “Nosferatu”, F.W. (de Friedrich Wilhelm) Murnau chegou à Hollywood, amparado pelo sucesso de outros filmes, como “A última gargalhada” (24) e as adaptações (dessa vez autorizadas) de “Tartufo”, de Moliére (25) e “Fausto”, de Goethe (26). Seu primeiro filme fora da Alemanha, “Aurora” (27), foi produzido para um grande estúdio, a Fox, e levou 3 Oscar na primeira cerimônia de entrega das estatuetas: um prêmio especial de produção artística e única (!!), atriz (Janet Gaynor, também premiada por outros dois filmes) e fotografia (o que comprova seu talento especial em imprimir um visual único à sua filmografia – outra prova disso seria a vitória, na mesma categoria, de seu último filme, “Tabu” (31), que estreou uma semana depois de sua morte em um acidente de carro).
           
 Mas, se existe um filme que resume à perfeição todo o perfeccionismo de Murnau em contar uma história de forma visual e cinética, esse filme é, sem dúvida, “Nosferatu”. A história do famigerado Conde que abandona seu castelo nos Montes Cárpatos em busca do pescoço da pura Ellen (Greta Schroder) – esposa de seu corretor imobiliário, Hutter (Gustav von Wangenheim) – é narrada sem privar o espectador de momentos máximos na história do cinema (e de quebra mantém, quase um século depois de seu lançamento, uma atmosfera tétrica e desconfortável). Uma obra-prima à qual se deve muito.

JADE

  JADE (Jade, 1995, Paramount Pictures, 95min) Direção: William Friedkin. Roteiro: Joe Eszterhas. Fotografia: Andrzej Bartkowiak. Montagem...