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sexta-feira, 4 de julho de 2008

Excepção

Não gosto de segundas oportunidades, mas esta regra, para o ser, segundo a outra, a do adágio, a propísito do Condestável encontra a sua excepção. O reconhecimento da Santidade aí vem, ultrapassando o falhanço inglório dos Anos Quarenta. Mas não é só, ontem mesmo adquiri um exemplar desta importante brochura que tivera já e, que, emprestada, nunca voltou. Com vantagem agora a substituí, pois vem dedicada e autografada pelo próprio Autor. Augusto Casimiro, combatente meritório, a propósito de outra homenagem fracassada, a do célebre monumento do alto do Parque Eduardo VII, defendia que a estátua imortalizasse um Guerreiro Apeado, relegando para consagrações secundárias as vertentes de Cavaleiro e de Frade. Não repugna a quem, como este pobre réprobo, fez a instrução militar numa Infantaria que o tornou menos mau homem, que a Arma a que nos devemos viesse a ser a inspiração escolhida da postura. Tanto mais que, com a decisão eclesial agora tornada pública, o reconhecimento do valor religioso vem de forma mais ribombante do que a pedra.
Não há duas sem três, dizem. D. Nuno Álvares Pereira deu o nome ao movimento aglutinador anti-jacobino, que se quis Cruzada Dele e nos livrou dos desmandos da I República. Possa este reforço sobrenatural do Seu prestígio enformar a libertação da opressiva predominância da mediocridade insensível da República de Terceira em que nos atolamos. Outra segunda oportunidade de que não desdenho. Casimiro escreveu que o Herói salvou o País em obediência ao Futuro. Eminentemente invocável, depois de atestada a Sua miraculosa capacidade, será demais pedir-Lhe que nos inspire, pela mesma via, para evitarmos a perdição?

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Capismo de Génio

Stuart era nome de Rei nas Ilhas Britânicas, como entre os cartonistas portugueses. Mas há uma lição a tirar - testemunhar as acções comprometedoras cabe nas mais das vezes àqueles que nunca verão considerado o seu depoimento.

terça-feira, 1 de julho de 2008

Regresso (d)a Partida

A Torre do Relógio de Christopher Scott

Um poderoso Marajá, Dabchelim, tinha tantos livros que precisava de mil dromedários para o transporte deles e cem brâmanes como bibliotecários. Desencorajado perante tanta leitura, ordenou a estes que sintetizassem o que a livralhada dizia. Obedecido, conseguiram reduzir o essencial a doze mil volumes, transportáveis por apenas 30 camelos, para tanto tendo gasto cem anos. Não satisfizeram, pelo que foram reduzindo os calhamaços à carga de 15, depois à de 2 e, por fim à de uma simples mula, altura em que o Senhor verificou, pelo envelhecimento concorrente com a condensação, ter ficado desprovido de tempo para os absorver.
Salvou-o o Grão Vizir Pilpai, dizendo tudo se resumir em quatro pontos. Nas ciências à palavra talvez, e na História à tríade nascer, sofrer, morrer. Amar apenas o honesto e fazer então tudo o que deleite. Pensar só o verdadeiro e não o dizer por inteiro. Dominar-se, que daí se aprende a governar o Mundo. E enquadrar toda a virtude no respeito por Deus, em querendo a felicidade.
Claro que a simples tenção de resumir os livros que se tem é sinal seguro de entrada numa parte da vida dominada pelo espectro do fim, pois a que a antecede é muito melhor representada pela tentativa de expandir a biblioteca. Mas essa mesma vizinhança, ordenando um exame de conciência, não conduzirá a um beco sem saída? Se o tempo tivesse sido gasto em apreender estes princípios, dificilmente poderia sobejar algum para pô-los em prática. Havendo esta surgido naturalmente, todas aquelas páginas eram supérfluas.
Não, o que se busca lendo não é a essencialidade ética, mas os revestimentos e sofisticações que evitem o desdém dela. E nessa demanda o que menos sentido faria era reduzir os textos. A própria alea da ordem por que chegassem à vista do decifrador constituiria acicate maior, nesse sentido.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

A Bíblia e as Gralhas

Com a Reforma de Lutero a Bíblia veio a ser feita em língua vulgar e viu crescer a cifra dos volumes postos a circular de forma a não se poder evitar certos erros no texto impresso, uns por vontade, outros não. Parece ter sido inadvertidamente que saiu a omissão do not no sétimo mandamento, durante o reinado de Carlos I, fazendo correr a consequente incitação o adultério. O caso resolveu-se com uma multa pesadíssima e apreensão de todos os exemplares que se conseguiu apanhar da que veio a ser conhecida como Wicked Bible, mas seria interessante saber mais da vida particular do impressor e se não se trataria de um acto falhado que exprimisse a respectiva preocupação com culpas no cartório...
Já parece não haver dúvida de que foi um protesto consciente que levou a Mulher de um dos primeiros mestres da Imprensa alemã dos primórdios, insatisfeita com a ordem de Deus a Eva contida em Genesis 31, 16, fazendo-a aproveitar uma distracção marital para alterar a palavra Herr para Narr, transformando a submissão contida em Ele será o teu senhor num muito realista Ele será o teu joguete, acepção que a História confirmou ao longo de séculos. No entanto, as feministas são hostis a este episódio inconformista, porque nunca aceitaram a supremacia que as demais Senhoras souberam exercer, apenas reconhecem "libertações" no progressivo aumento da semelhança com o homem. O que transforma essa parte do Belo Sexo num espantalho, semelhante ao de A Mulher e o Fantoche, de Maud Fily, que se dá em ilustração.

terça-feira, 17 de junho de 2008

Memória Desfolhada

Ao devorar este magnífico postal da Cristina fiquei cheio de problemas de consciência por me não lembrar do primeiro livro que li, autonomamente. Tal como o Nuno Castelo-Branco, também fui ensinado a ler pela minha Avó, aos cinco anos, depois de me ter indignado por ter de esperar que Ela me descodificasse as legendas da série «Uncle Bill/Os Meus Sobrinhos», que dava na TV à hora do almoço. Mil vezes ouvi repetida a frase lapidar que terei largado então, talento que entretanto me abandonou:
- Oh Michão (petit nom familiar), é uma vergonha, com cinco anos, não saber ler!
A Pedagoga aproveitou:
- Pois é, meu filho.
E ensinou-me.

Mas voltemos à questão por dilucidar. Fui confrontar a mente materna, ainda muito apta a reproduzir lembranças, desde que antigas. E ambos concordámos que teria sido um dos livros de aventuras da série do Pimpão, um cãozinho simpático que, com o seu amigo maior, o Plutão, vivia as várias experiências e ofícios humanos.
Assim, «Pimpão Bombeiro», «Pimpão Electricista», «Pimpão Mergulhador»...
Aquele de que me ficou impressão primeira foi o «Pimpão Chefe de Orquestra» Deve ter sido o precursor.
Leio em Sousa Bastos que as primeiras letras oitocentistas eram ministradas pela carta do ABC, pelos traslados do Godinho, pela tabuada, pela cartilha do Pe. Inácio e pelo Método facílimo do Conselheiro Aquiles Monteverde, até que surgiram os expedientes inovadores e entre si inimigos de João de Deus e Castilho. Nunca a minha aprendizagem passou por aí, embora haja conhecido, mais tarde, a obra do Autor de «Campo de Flores», para matar a curiosidade.
Comecei por juntar uns cubos com letras e fizeram-me saltar logo para estas imaginativas aventuras com ilustrações sedutoras, onde as mais vulgares circunstâncias da vida eram apresentadas como maravilhosas aplicações de cada um, não se dando olhos, ouvidos ou eco aos males do Mundo, o que, escapando à fantasia alienante dos contos de fadas era a própria definição de Sabedoria dos três macacos nipónicos.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Camões, Modo de Usar

Camões. No dia Dele, uma biografia pouco vista mas bastante competente e nada enviesada, ao contrário das apropriações do Épico que, quanto a mim, ainda foi mais esplendoroso Lírico. Em baixo, o começo do martírio post mortem, com a imagem da colocação da primeira pedra no monumento da praça que Lhe tomou o nome, assemelhando-se o toldo, profeticamente, ao formato de um cadafalso. A partir do Ultimatum de 1890, transformar-se-ia, após os panos negros colocados lá pela estudantada, em local de romagem de todos os Republicanos subversivos, com campanhas para afastar das concentrações a própria Família Real que se associara à construção do Monumento. Como no Pós-Abril, se reduziu a pó a História pessoal, em tudo o que era teatro experimental transformado em revolucionário e oprimido, como hoje, celebrado pelos poderes que não quiseram morrer pela Pátria e se vão entretendo em celebrar uma universalidade sem sentido, porque desvinculada da presença auto-suficiente, com hossanas que soam a falso ao Grande que dissse ao menos morrer com a Pátria.
Pela própria perda de uma vista, aproxima-se da vidência do Poeta Cego, presente ao longo de várias fases do imaginário do Ocidente. O que celebrou foi a magia do Império e a Grandeza dos Reis. Mas do uso que Lhe deram será ele o único que não pode ser culpado.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Os Cílios e as Páginas

Um esquecido Gabriel Legouvé imaginou em verso uma anedota representativa que rezava assim.

ANECDOTE

Une Laïs perdit l´amant le plus fidele
On la disoit en pleurs: un ami court chez elle;
Il la trouve riant en face d´un miroir:
«Vous me surprenez fort, dit-il à la donzelle;
«Je vous croyois au désespoir.
«Ah! lui répond soudain la belle,
«C´est hier qu´il falloit me voir!
»

Claro que é, por sua, vez o espelho deformante da visão masculina que devolve uma certa imagem da Mulher. Mas continuando nessa impertinente vereda, detecto comparável tendência na Poesia que prende o Universo Feminino. Cada Exemplar do Belo Sexo que lê um poema é-lhe tanto mais sensível quanto apreenda a imagem da sua alma reflectida por ele, resultando essa cativação numa vulnerabilidade conforme interaja com o instante biográfico que atravesse.

Enquanto que o sentimento predominante no Espirito Feminino que se debruça sobre uma obra de ficção é diferente, o seu interesse depende de se deixar envolver por um apelo consequente e indutor da entrega, que consiga reconhecer, independentemente do desfecho, que não terá pudor em considerar ou não impossível, de acordo com o conhecimento que tenha dos sentimentos e reacções correlatas. Ao contrário da abertura masculina, sempre disposta a aceitar o acidental e o externo na conformação das sequências narrativas, buscando a adesão no nexo entre o princípio actuante e a resistência espiritual. Entre as Filhas de Eva o que leva a melhor é a dialéctica entre a latência do seu estar e a instintiva mensurabilidade do sentir que corresponda.


A pintura é de Pino Dangelico

domingo, 8 de junho de 2008

Complexo de Escritor

Leitura de uma entrevista de Borges a Jacques Chancel:
Todos os jovens são barrocos. Por timidez. Cada um pensa: "Se eu digo exactamente o que quero dizer, toda a gente vai achar isso idiota..." É preciso esconder-se um pouco, disfarçar-se. Assim tornamo-nos barrocos. E depois, mais tarde, tornamo-nos mais orgulhosos: "Não, aquilo que digo talvez seja interessante, porquê mascarar-me, porquê ser um escritor do Século XVII? Por que não ser pura e simplesmente um contemporâneo..." Finalmente tornamo-nos mais simples.
O Escritor de Michaël Thomazo

A percepção do vício de tentar escrever raro, nos alvores da redacção está bem caçada. Mas nem sempre será por táctica que se tente impingir. Muitas vezes trata-se apenas de um equívoco que, considerando bem alto a Complexidade, julga, num momento em que pouco mais se conhece do que o seu próprio ego, por vezes nem isso, que complexificar a própria forma é a maneira de se elevar no relacionamento com quem leia. À medida que se vai conhecendo mais da Realidade, percebe-se que ela é tão multifacetada que o mais difícil está em simplificá-la, explicando ou procurando esgotar-lhe o sentido. E que essa tarefa, muito mais complexa do que o artificialismo antes incensado, é a que se mostra mais capaz de prender os sentidos dos mais capazes de entre os potenciais provadores.

Os Ócios do Ofício

De entre os muitos exemplares de ex-libris que me têm vindo parar às mãos, marcando os alfarrábios adquiridos, ao meu ofício de leitor é particulatmente caro este. Nem tanto por fundir com os livros uma figura feminina, embora esse factor também conte. Mas pela divisa. Ócio Com Dignidade; é suplantar a cobiça voraz do materialismo do negócio, o qual firma negação onde a leitura apenas faz negaças, desmentindo a condição quando nela se aplica, ou furtando-se à apetência nas vezes em que o não consegue. A disponibilidade que já os Antigos Gregos davam como imprescindível ao Pensamento pode aproveitar-se ou não. Na letargia é indigna, na problematização e incremento de sabedoria, como no intercâmbio espiritual que umas linhas d´outrem facultam, pode ser via para elevar-se, para aproximação a Deus, inclusivamente.
Como escreveu Ralph Hodgson,
God loves an idle rainbow,
No less than labourig seas.

O que é muito justo. Desde que se não caia no engano de considerar um arco-íris todo o ocioso, em simples função desse estatuto.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Tormentos da Escrita

A Árvore Livro de DaliNão concordo com o que Mário Cláudio diz, ou seja, que Quem escreve mal pensa mal. Escrever é uma técnica, mesmo nos casos em que, como dizem de Dostoievski, a inquirição das lutas interiores leva a melhor sobre a relativa imperfeição formal. Conheço muito boa gente capaz de um pensar profundo, sem capacidade de articulá-lo, por escrito. Já a inversa me parece menos problemática, pois pensar mal já implica escrever mal, na medida que uma produção bonitinha a que falte uma base de exercício psíquico que conte não despertará interesse de maior por entre os gostos mais treinados.
Já a imagem da Senhora que escreve por ociosidade ou inclinação exclusivamente pessoal e tranquila me parece falhada para ilustrar a escrita desaconselhável. Não é por um mundo ser visto ou sentido com lentes cor de rosa que é artisticamente mau, tudo dependerá do condimento espiritual e espirituoso de que venha a ser impregnado. E tanto pode ser uma nulidade redigida o produto de uma Mulher feliz como o de uma atormentada, tal o relato contentinho de um homem que se admira, ou a veraz conta dos turbilhões mentais de um rapaz que pense ser o simples facto de se descobrir sentindo uma recomendação para publicar. Plath e Espanca não foram grandes poetisas por infelicidades revolventes, vieram a sê-lo pela força artística em que conseguiram expressar-se. E nos casos menos revoltos há um pormenor que torna ainda mais despropositada a figura de estilo do Escritor Portuense: as Mulheres, com talento ou não, possuem uma certa tendência para procurar agradar, ou, ao menos, a melancolia de o não conseguirem; nos homens, ausente este tempero, nota-se mais a arrogância, que, se perdoável e até estimada nos casos de génio, é fatal nas manifestações mais chãs.
Senhora Escrevendo de Vermeer

terça-feira, 27 de maio de 2008

O Peso da História

Pedem-me a Cristina Ribeiro e o Tiago Laranjeiro que dê conta dos 57 volumes que, ontem adquiridos, terão contribuído um pouco mais para me arrasar a coluna. Fá-lo-ei, à medida que os assimile e de acordo com o merecimento que lhes ache.
Começo com o que, fisicamente, menos pesou, embora outro tanto se não possa dizer, no aspecto espiritual. Estas 11 páginas de Alberto de Monsaraz não sei se serão raridade, mas foi a primeira vez que vi um exemplar delas. O Grande António Manuel Couto Viana não as refere na sua antologia «Poesia Monárquica Portuguesa», embora inclua nela versos posteriores - e melhores - do Autor.

Trata-se de um longo poema escrito na ressaca da implantação da República, datado de Outubro de 1910, em que as quadras tocam os pontos altos de cada um dos períodos da nossa História, durante os séculos de construção, pela Coroa. Não os transcreverei, por a dimensão de um postal não comportar. Mas posso dar-Vos a primeira e última, referentes à ruína destruidora que chegara:

Reino de Portugal, cumprem-se os fados,
Filho de heroes, baqueaste no caminho;
Vivias mal, por mal dos teus pecados,
E agora, morres misero e mesquinho

(...)

O´ desditosa Patria minha amada,
Epopeia do Povo e da Realeza,
Não tens Reis, não tens Povo, não tens nada...
Quebrou-se o encanto, Patria portuguesa!

sábado, 24 de maio de 2008

Ódio Sem Estimação

Querem saber o que eu odeio, mesmo bem odiadinho? Este tenebroso objecto seiscentista do Castelo Lamothe-Fenelon, em que, invocando o refinamento, se gerou monstruosidade muito mais nauseabunda que o mero e in-ofensivo Kitsch: uma retrete simulando pilha de livros!Haveria decerto maneiras mais limpas de explicitar a atitude dos donos face à Leitura, que coisa!

terça-feira, 20 de maio de 2008

Adivinha de Algibeira

Para Todo o serviço...Quem é o Famoso Bloguista Português de quem os Franceses fizeram uma biografia, por mim ontem achada em alfarrabista?

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Raridades

Um Caso Raro de Cultura e Dedicação Monárquicas que dá pelo nome de Cristina Ribeiro apresenta-nos, directamente da biblioteca familiar, que é uma das melhores de Portugal, um raro caso de Cultura e Dedicação ao País em que casou: o da tão Maltratada Rainha D. Amélia, na vertente plástica do Seu talento artístico, em exemplares de série especialíssima. Só dou um link, por preguiça, mas serve o presente para instar-Vos a ver os vários postais que a Nossa Generosa Amiga concebeu a tão tocante propósito.
Vá, despachai-Vos!

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Estilo Manuelino

Não há muitos dias a Júlia Moura Lopes e a Equipa do Estado Sentido homenagearam D. Manuel II, a propósito da sua aclamação, nas circunstâncias trágicas em que acedeu ao Trono. A Uma e aos Outros quero dedicar esta breve evocação de Quem também foi ilustríssimo Bibliófilo, Autor de correspondência erudita sobre o tema.

Aquando do início do seu reinado, o próprio João Chagas reconheceu a coragem de um jovem, disposto a cumprir o Seu dever, não deixando que o terrorismo se transformasse em terror. Acrescentava mesmo que, no caso dele, se lhe tivessem acabado de matar o Pai e o Irmão, não teria coragem de sair à rua.
Não me custa portanto a mim, um velho miguelista, inclinar-me perante as Qualidades de um Homem, que também viriam a ser reconhecidas por Salazar, á frente de um governo Republicano, embora anti-jacobino. Mal iniciou o respectivo consulado, honrou-Lhe o patriotismo sempre reafirmado no exílio, mormente no período difícil da Grande Guerra. Pois eu quero relembrar a sua faceta de Amigo dos Livros. E, para tanto, publico cópia do Ex-Libris que adoptou.


É minha grande felicidade possuir uma obra que, não sendo rara, é importante; e que pertenceu ao Martirizado D. Carlos, conforme se vê no monograma, antes de passar para as mãos do último Rei. Sendo a Monarquia a quintessência da continuidade, ter nas mãos volumes que sei Realmente manuseados reforça toda a vinculação à Herança do meu País, para além do próprio umbigo sujo a que a nossa época cinge o olhar. Da marca pessoal Dele salientaria a paráfrase, difícil, essa, de Luís XV. Dois Manuéis, pelo que, depois do Primeiro, Ele. Não foi o dilúvio, não, esse estaria guardado para o passo seguinte.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

O Presente de Judas

Salto de Mark JustinianiTenho por ponto de honra não comentar a justiça ou injustiça da atribuição de prémios - como de condecorações, ou outras formas de distinção - por achar que ninguém tem à partida direito a elas, exprimindo meros sentimentos de quem os outorga. Ou seja, aquilo que Gracq lhes também lhes censurava, serem a válvula de escape de ódios e cumplicidades, não me perturba, pois é essa, a meu ver, a sua essência. Mais grave pareceria a crítica pelo mesmo Autor desenvolvida, assim como por Luiz Pacheco, de a promoção comercial associada restringir a liberdade criativa. Mas lá está, o meu pesssimismo enraizado leva-me a acreditar que a liberdade não é outra coisa do que a possibilidade de nos encaminharmos para esta ou aquela prisão. No fim de contas acho que escritores de categoria, ao gastarem-se no hipercriticismo dessas mediocridades humanas estão a dar ao assunto maior importância do que julgam. Se aquele não é o melhor bocado, devemos cingirmo-nos a não procurá-lo, pouco importa que outros o abocanhem.
Vem isto ao caso de Doris Lessing haver confessado ter perdido a verve, depois de laureada. Trata-se de caso diferente do das preocupações mais habituais, uma seca a posteriori, em vez de prévia. Lembrei-me deste quadro, em que o que se supõe ser um salto em frente causa a perda do balanço, com os livros a pagarem as favas. Mas, em última análise, aparece como uma boa desculpa, pois seria fácil não atender o telefone.
George Bernard Shaw disse
Eu posso perdoar a Alfred Nobel ter inventado a Dinamite. Mas só um Diabo sob forma humana poderia ter concebido o Prémio Nobel.
Falou o galardoado de 1925, que recusou.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Firme no Firmamento

No aniversário da morte de Marlene Dietrich passo os olhos pelo livro que, na sua crueldade programática, lhe prolongou o mito, a forma de vida... póstuma das Estrelas de Cinema. Escrito pela filha dá-nos uma visão muito pouco azul de um anjo que não era dos melhores. Mas se a primeira condição de uma Star reside no egoísmo de acreditar sê-lo, a profusão dessa fé em si dispensaria qualquer outro requisito.
Ali o Eu é muito maior do que o vulto imaginado pelos idólatras e temos sempre a sensação e que a Actriz pensa que os testemunhos deles eram uma palidíssima ideia do que merecia. Desde a preocupação em não usar lingerie outra que a cosida à roupa em modelos únicos, à preocupação exclusiva com a sua solidão aquando da morte de Gilbert, sem mais palavra de pena. Como da oferta profissional para salvar o Trono de Edward VIII, depois de haver diagnosticado Mrs. Simpson como muito maligna para o fascinar, ou muito especializada, para o satisfazer em tudo, ao ponto de se oferecer ao Duque de Kent para o "salvamento" com esta frase que ninguém mais poderia proferir:
Vou ver o Rei. Mandai-me lá. Eu posso fazer melhor do que Wallis Simpson - e eu - podeis estar seguro de que não tentarei ser Rainha de Inglaterra.
Como a recusa no fim da vida, em voltar a Berlim de muro caído, com um aparato próprio a condizer, por não suportar a ideia de enfrentar as objectivas numa cadeira de rodas ou a sair de um taxi.
Mas o ponto forte destas 862 páginas é, sem sombra de dúvida, o mal que dizia dos "amigos" que tivessem sucesso na tela, expulsando-os do nível galáctico que imaginaria sua propriedade exclusiva. Só Garbo é tratada com respeito. Cooper e Wayne são arrumados com cowboys que só sabem saltar para os cavalos, Melvyn Douglas nunca poderia, mesmo com talento, aspirar ao estrelato, por carecido de appeal, Merle Oberon resume-se a uma p. de Singapura, Cary Grant corria na direcção de qualquer fotógrafo que visse, James Stewart era ridículo, imaginado como astro... e a minha favorita, sobre Loretta Young, atribuindo a abundância de igrejas católicas em Hollywood ao hábito de ela mandar construir uma de cada vez que tinha um filho natural...
Num filme célebre a personagem por ela interpretada dizia que tinha sido preciso mais de um homem para mudar-lhe o nome para Shanghai Lilly. Podemos bem dizer que não carecia de nenhuma outra opinião para ser para sempre Marlene Dietrich.

Perdas Humanas

Fico sempre assim como que piurso, quando tenho notícia de acidentes em acervos de livralhada. Salta-me a tampa! O incêndio de ontem, na Universidade do Porto, em vez de ocorrer num qualquer bar vazio, carbonizando sandes ou croquetes, tinha de atacar uma biblioteca, danificando livros raros! Aguns dificilmente voltarão a falar, sabendo-se, como deixou claro André Maurois, que
A leitura de um bom livro é um diálogo incessante: o livro fala e a alma responde.
Um pensamento especial para o TSantos, tributário desse Estabelecimento, sabendo-se que foi a Zoologia a área mais afectada.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Refúgios e "Balu-artes"

Dia do Livro, na precisa altura em que leio a magnânima referência a esta casa feita pelo Meu Amigo João Marchante. Elege ele as «Afinidades...» como o blogue que levaria para a ilha deserta, imagem que se costuma aplicar aos livros. Uma ilha ligada à net poderia continuar a ser considerada deserta? Não fará parte da definição dela o conceito de "isolada"? Pus-me a pensar na diferença que o bloguismo encarna, face à Literatura. Mas cheguei à conclusão de que não é tanta asim. Se a companhia blogosférica vive da actualidade, o convívio com os grandes espíritos redactores dos volumes estimáveis prescinde bem dela, uma vez que no isolamento insular o tempo como que se suspende. Sem contar com o facto de que quem preza muito as páginas impressas e encadernadas acaba por lhes encontrar a vida própria como viu Max Benheim, à esquerda.
Mas não é tudo, com a agressão continuada contra o indivíduo, visível ou informe, também os homenageados de hoje podem constituir a barricada em que nos entrincheiremos, último reduto da nossa sanidade, à maneira da construída por Buz Spector.

Uma tradição catalã estendida a toda a Espanha quer que a 23 de Abril se ofereça um livro e uma flor. Os primeiros estão nas imagens. Às minhas Leitoras suplico que aceitem este post como metáfora da segunda. Mesmo que, pela imperícia de quem a colheu, ela se apresente um tanto murcha.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Sem Anos de Solidão

Fiquei ciente de um cento de anos que me é tudo menos indiferente, graças ao Meu Muito Caro João Villalobos. Não me sentindo com estatura religiosa ou capacidade crítica para comentar uma revelação como a aniversariante, «O Homem Que era Quinta-Feira», cinjo-me a deixar-Vos umas linhas sobre a minha vida em redor desse pequeno grande livro.
Entre os 17 e os 20 anos tinha perdido a Fé em Cristo, com a dor de não ter prescindido de um Deus da Criação. Revoltado contra a esterilidade de um curso de Direito demasiado arredio do sonho da Justiça absoluta, não concebia o Sofrimento Divino. Tinha passado a odiar-me o suficiente para detestar o Amor como uma fraqueza, fosse o da Redenção, ou o da pureza pessoal. Demasiado orgulhoso para me deixar cair em drogas ou grupos, passei a jogar-me nas leituras e nas cargas e descargas mais duvidosas que as noites e o sórdido me ofereciam.
Até que li e pensei este livrinho. Uma história policial, decerto, mas em que era um Polícia que vinha a ser apanhado. Sem a ter conhecido, também eu me apaixonei pela Rapariga do cabelo castanho-dourado que o detective-poeta Gabriel Syme encontra ao fim da caminhada, a irmã desse Lucian Gregory que se fazia muito mais inadaptado do que a Rectidão lhe permitia.
G.K. Chesterton, o Autor, tinha, numa entrevista, revelado o segredo escancarado que o guiara: em vez de fazer uma ficção em que alguém cheio de qualidades aparentes fosse culpado de crimes horríveis, contar a descoberta de um Ente Suspeito a que fosse atribuível Bondade.
Era Domingo.
Noutro escrito, por mim mencionado em ensaio medíocre que me atrevi a publicar, o Grande Escritor explica em que sentido a Divindade pode ser vista como Anarquista, coisa que caiu que nem ginjas na ebulição que vivia contra as ordens e (in)justiças que me rodeavam. Mais tarde soube também por ele que a Democracia que importa é a dos Mortos, a ligação ao Que permanece, não às maiorias actuais, mutantes e periódicas cuja face horrenda é a voragem das substituições e do esquecimento.
Mas voltemos a Domingo, no gigantismo e Mistério benignos com que surgia aos personagens, fez-me passar a gostar da Polícia, abstractamente idealizada como a que não desistia da Procura e assim conferia a capacidade de agarrar o Que não procurava fugir e pousava mesmo junto a nós, ainda que momentaneamente inconstatado. Estava pronto a reciclar-me, de modo a, se não amar exemplarmente, ao menos exemplarmente passar a prezar o Amor. Nos dois grandes sentidos que rivalizam com o que se acrescenta por um hífen do adjectivo próprio.
Numa atrocidade apressada, algumas traduções portuguesas não incluem o subtítulo da obra, Um Pesadelo. Para mim a intuição dele impôs-se logo. Mas para me reconciliar com um muito maior, que é a Vida.