Literatura Africana

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Unive

rsidade Católica de Moçambique


Centro de Ensino à Distância

Tema

A Literatura e a Afirmação Cultural de Cabo-Verde: Contributos de Jorge Barbosa e


Baltazar Lopes na Construção de Identidade Cabo Verdiana

Nome do estudante:
Alfredo Tomás Salomão Chave
Código:
708207683

Curso: Licenciatura em Língua Portuguesa


Disciplina: Literatura Africana em Lingua Portuguesa
Turma: A
Ano de Frequência: 4⁰ Ano

Beira, Maio de 2024


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Estrutura
Aspectos
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organizacionais
 Conclusão 0.5
 Bibliografia 0.5
 Contextualização
(Indicação clara do 1.0
problema
 Descrição dos
Introdução 1.0
objectivos
 Metodologia
adequada ao objecto 2.0
do trabalho
 Articulação e
domínio do discurso
académico
2.0
(expressão escrita
cuidada, coerência /
coesão textual)
 Revisão
Análise e bibliográfica
discussão. nacional e
Conteúdo 2.0
internacionais
relevantes na área
de estudo.
 Exploração dos
2.0
dados.
 Contributos teóricos
Conclusão 2.0
práticos.
 Paginação, tipo e
Aspectos tamanho de letra,
Formatação
gerais parágrafo, 1.0
espaçamento entre
linhas
Normas APA 6ª  Rigor e coerência
Referências edição em das
Bibliográficas 4.0
citações e citações/referências
bibliografia. bibliográficas
Recomendações de melhoria:

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CAPITULO I. Introdução
Esta pesquisa procura investigar o contributo da formação identitária da população de Cabo
Verde nas obras literárias produzidas naquele país, bem como possíveis influências da
literatura na formação da identidade cultural do povo cabo-verdiano. A intenção é analisar
algumas produções literárias tendo como pano de fundo os processos históricos e políticos
vivenciados pelo arquipélago, principalmente ao longo do século XX, época de grandes
alterações nas dinâmicas sociais no mundo como um todo e em especial em Cabo Verde,
que viu surgir diferentes abordagens a respeito do indivíduo caboverdiano no longo processo
que levou as ilhas à independência, com consequente formação de uma nova identidade
nacional. Por essa razão será dada uma certa centralidade ao desenvolvimento histórico de
Cabo Verde no decorrer dessa dissertação, a fim de clarificar determinadas noções que
fizeram e ainda fazem parte do imaginário coletivo cabo-verdiano.

Desde a descoberta das ilhas até o início do século XX, os intelectuais caboverdianos tinham
a África como uma espécie de potência adormecida, pelo que vigorou no arquipélago,
durante os primeiros séculos a partir do descobrimento, uma identidade cultural referenciada
basicamente em Portugal, a despeito da posição geográfica do arquipélago. Posteriormente,
uma identidade atlântica, sob os pressupostos da ideia de mestiçagem, tomou forma e
ganhou força na década de 1930, mesmo período em que uma nova literatura, com
características mais marcadamente cabo-verdianas, desabrochava no encalço da revista
Claridade, sob forte influência do modernismo nordestino que na mesma época crescia em
importância no Brasil. Após essa tendência liderada pela Claridade, o panorama político em
meio aos movimentos de descolonização da África favoreceu uma busca por referências
dentro do próprio continente africano, procurando bases em suas tradições e em sua
realidade singular frente ao mundo.

1.2. Contextualização

A literatura, assim como as demais manifestações culturais das nações que outrora foram
colônias europeias, por muito tempo sofreu com as influências coloniais deformando o
modo de identificação com sua origem e sua ancestralidade, sob um olhar deturpado,
silenciado e anulado dos bens culturais, a partir do contato com os europeus. Em Cabo
Verde, colônia portuguesa entre 1460 e meados dos anos de 1970, houve uma influência
muito forte da cultura portuguesa sobre a ideia identitária e cultural da nação, especialmente
sobre sua literatura. Segundo Romano (1984), a Literatura caboverdiana possui registros
desde o século XVIII, ainda que incompletos. A produção literária caboverdiana passou por
algumas fases em que as obras representavam, através de seus versos, rimas e estrofes, os
sentimentos e os pensamentos latentes de cada um dos períodos.

Mesmo a literatura absorvendo os ideais colonialistas portugueses, foi ela também um dos
pontos de partida para um processo de ressignificação do povo caboverdiano com as suas
raízes ancestrais, incorporando as manifestações culturais populares do povo, como lendas e
mitos, seu folclore, religiosidade e a língua crioula. Contudo, as contribuições dos
portugueses e também dos brasileiros em algumas fases do movimento literário
caboverdiano se fizeram presentes, mesmo havendo uma transformação e descolamento da
cultura de Cabo Verde em relação aos portugueses (Romano, 1984).

Nesta pesquisa, as fases literárias de Cabo Verde são explanadas dentro do contexto em que
se manifestaram, com seus principais autores e as obras de maior destaque em cada período,
problematizando assim, a relação entre literatura e identidade caboverdiana.

1.4. Objectivos do Trabalho

1.4.1. Objectivo Geral

 Compreender a Literatura e a Afirmação Cultural de Cabo-Verde e os contributos de


Jorge Barbosa e Baltazar Lopes na Construção de Identidade Cabo Verdiana

1.4.2. Objectivos Específicos

 Identificar a Constituição das Letras Caboverdianas em Fases Historicas;


 Descrever o Pré e Pós Claridosos e a Poesia Como Afirmação Nacional;
 Apresentar a Mestiçagem e a Identidade Nacional.

1.3. Metodologias
O conceito de metodologia pode variar em fução da área de aplicação. Segundo Gil (2008),
“metodologia é o estudo dos métodos que envolvem a escolha, a aplicação e a análise dos
procedimentos utilizados na pesquisa, buscando garantir sua validade e confiabilidade”.
Para Lakatos e Marconi (2010), a metodologia é o conjunto de procedimentos lógicos e
sistemáticos que orientam a pesquisa. Ela abrange desde a formulação do problema até a
interpretação dos resultados, fornecendo uma estrutura para a investigação científica.

Já Severino (2007), define a metodologia como sendo um conjunto de métodos e técnicas


utilizados na pesquisa. Ela engloba a seleção de instrumentos, a coleta e análise de dados,
bem como a elaboração de relatórios e conclusões. Portanto, para a realização deste trabalho,
foi adoptada a revisão bibliográfica sistemática de diversas obras e sites de internet.

1.4. Estrutura do Trabalho


Em termos de organização estrututal, a pesquisa está devido em 2 Capítulos, o primeiro
preocupa-se em identificar a constituição das letras caboverdianas em fases historicas; o
segundo, faz-se a descrição do pré e pós claridosos e a poesia como afirmação nacional; e,
por fim, apresenta-se a mestiçagem e a identidade nacional.
CAPITULO II. Fundamentação Teórica

2.1. A Constituição das Letras Caboverdianas em Fases Historicas


Segundo Romano (1984), o estudo em ordem cronológica da constituição das letras
caboverdianas evidenciam uma problemática devido à escassez de material acerca dos anos
iniciais. Muito do material produzido nos períodos iniciais se perdeu ou se encontra sob a
tutela de colecionadores, o que acarretou na divergência com relação às datas dos períodos.
No entanto, os registros que se têm acesso, foram produzidos pela impressa local, e datam de
1880 a 1910.

A primeira fase foi classificada por Romano (1984) como: “Herança Romântica”, devido a
influência do Romantismo então vigente em Portugal, na França e, posteriormente, no
Brasil, influenciado pelas duas potências europeias. Os livros produzidos nestes países
foram traduzidos e levados para o arquipélago para o deleite das famílias abastadas, o que
acarretou na influência da escrita produzida em Cabo Verde. Os autores que se destacam
nessa fase são Eugênio Tavares (poeta, trovador e publicista), António Januário Leite
(sonetista) e José Lopes (poeta erudito e polígrafo).

No entanto, ainda que com forte apelo colonial, tanto do ponto de vista político como sócio
identitário, alguns intelectuais do período já esboçavam a sua preocupação patriótica através
da sua produção literária:

Foi nesse período que apareceram os primeiros escritos de Eugênio Tavares,


no "Almanaque Luso-Brasileiro", a partir de 1881, e do Cónego António
Manuel da Costa Teixeira, já elaborando os primeiros passos para se dar à
língua do Arquipélago Caboverdiano uma estrutura didáctica em 1886,
Joaquim Botelho da Costa e Custódio José Duarte compõem “O Crioulo de
CABOVERDE”; e em 1887 A. de Paula Brito debruça-se sobre o mesmo
assunto e dá a lume: “Apontamentos para a Gramática do crioulo que se fala
na Ilha de Santiago” “Madeira, Cabo Verde e Guiné” – 1891, Por João
Augusto Martins e em 1899 “Subsídios para a História de CABOVERDDE e
Guiné”, por Christiano José de Senna Barcelos (ROMANO, 1984, pp. 39-40).
Ainda que raros, na primeira fase havia presença de escritos que evidenciavam a
preocupação, como afirma Romano (1984, p. p. 40), da “expressão nacional falada e escrita
em caboverdiano”.

2.1.1. Segunda Fase

A segunda fase das letras caboverdianas, data-se de 1910 com a publicação das “Canções
Crioulas” (1910), de José Bernardo Alfama, seguido de Pedro Cardoso com “caboverdianas”
(1915) e “Ode à África” (1921). Constata-se nessa fase os iniciadores com vocação
patriótica (1910 – 1925), na qual “as figuras mais em evidência nesse período são Eugénio
Tavares com suas ‘Mornas’, escritas na modalidade da Ilha Brava, e Pedro Cardoso
seguindo a mesma linha, através da imprensa” (ROMANO, 1984, p. 42).

As revistas elaboradas nos períodos se destacam pelo patriotismo expressado através da


língua caboverdiana com o intuito de expressar as mazelas sofridas pelo povo como
resultado do abandono pela metrópole. O jornal Manduco se destaca nessa fase como
veículo transmissor na luta em favor dos interesses cabo-verdianos, evidenciando assim o
surgimento do panafricanismo com consciência libertária. As obras e os autores que se
destacam nesta fase, segundo Romano (1984), são: “Caboverdianas”, de Pedro Cardoso
(1915); “Amor que salva/satisfação do beijo”, “Mal de Amor, corôa de espinhos” e “Cartas
Caboverdianas” de Eugénio Tavares (1916); “Noli me tangere”, de Eugénio Tavares (1918);
“Ode à África”, de Pedro Cardoso (1921); “Primeiro bilhete Postal” e “Segundo Bilhete
Postal”, de Eugénio Tavares (1922); “Reflexos do meu estro”, de João Mariano (1922) e as
publicações da revista Manduco em 1923 e 1924 com a parceria de Pedro Cardoso e
Eugénio Tavares; além de, em 1924, a publicação de “Língua dos Pretos” no periódico de nº
11 da revista Manduco de Eugénio Tavares.

2.1.2. A Terceira Fase

A terceira fase, classificada por Romano (1984) como: Precursores ou Pré-Claridosos, data-
se de 1925 a 1935. Esse período é o resultado das actividades e preocupações expressadas
pelos intelectuais e suas publicações na revista Manduco que, segundo Romano, “havia já
pressentimento colectivo, de uma Realidade, em forma da espécie de transição que se
processava na Literatura e na Arte, enquanto a curiosidade e as ideias fustigavam os
diálogos e debates” (1984, p. 45). Os escritores que se destacam nessa época são: João
Lopes e Jaime de Figueiredo, os quais possibilitaram a edição e publicação do livro de
poesia realista “Diário”, de António Pedro, em 1929: obra chave escrita em lusoverdiano,
que, ao descobrir as ilhas da sua terra no seu ativismo e dinâmica do dia-a-dia, viria –
parece-nos – influenciar pela mudança, mensagem e estética, a primeira produção
modernista de Jorge Baltazar: – “ARQUIPÉLAGO” – verdadeira revolução na Poesia
Caboverdiana dessa década, quando aquele poeta iniciava sua libertação dos
condicionamentos de uma herança saturada de sensualismo romântico, já cronologicamente
superada, e torturada pelo suplício da métrica e das rimas, em detrimento da criatividade
espontânea. (ROMANO, 1984, p. 45).

Desse modo, evidenciam-se os desenvolvimentos das letras caboverdianas através das


publicações realizadas através dos periódicos e revistas, tendo destaque os seguintes autores
e suas respectivas obras: “Jardim das Hesperides”, de Pedro Cardoso (1926); “Duas
Canções”, de Pedro Cardoso (1927); “Inspirações”, de José Andrade Brigham (1927);
“Algas e Corais”, de Pedro Cardoso (1928); “Diário”, de António Pedro (1929);
“Hesperitanas”, de José Lopes (1929); “A Selva Bossana”, de Eugénio Tavares (1929); “A
Ilha Brava”, de Eugénio Tavares (1929); “Hesperides” de Pedro Cardoso (1930); “Alguns
aspectos da Ilha Brava”, de Eugénio Tavares (1931); “Mornas – cantigas crioulas”, de
Eugénio Tavares (1932); “Paul”, de Manuel Lopes (1932); “Folclore Caboverdiana”, de
Pedro Monteiro Cardoso (1933); “Dialecto Caboverdiano”, Pedro Monteiro Cardoso (1933);
“Do monogeísmo mosaico ao Sermo Vulgaris”, de Pedro Monteiro Cardoso (1934);
“Sonetos e Redotilhas”, de Pedro Cardoso (1934); “Através de Santo Antão”, de Mario Leite
(1934); “Horas Vagas”, de Manuel dos Santos Lopes e “ARQUIPÉLAGO”, de Jorge
Barbosa (1935). Os quais exerceram um papel fundamental na consciência regionalista no
que, posteriormente, viria a se firmar com a publicação da revista Claridade em 1936.

2.1.3. Fase Claridosos

A fase dos Regionalistas ou Claridosos na literatura de Cabo Verde trata a consciência


regionalista, entre os anos de 1935 a 1944, onde surge uma nova geração de intelectuais,
conhecida como “Claridosos”, em razão de terem sido os responsáveis pela fundação da
Revista Claridade (1936) que publicou, segundo Romano (1984), ao todo nove números,
assim distribuídos: 1936 = 2; 1937 = 1; 1947 = 2; 1948, 1949, 1958 e 1960 = 1 em cada ano,
respectivamente. Segundo Rivas (1989), a revista serviu como um dos principais meios de
exposição da literatura cabo-verdiana.
Para os claridosos trata-se de instaurar uma literatura de fundação onde a
procura de identidade se traduz pela importância da pesquisa etnográfica,
pelas compilações de contos e lendas populares, pela valorização do folclore,
pela elaboração, em uma palavra, de uma mitopoética nacional. (RIVAS,
1989, p. 39).

Diante desse fator, a fundação da revista Claridade possuiu como finalidade se firmar
enquanto uma revista de “fundação”, de “interpretação da realidade nacional”, de “contra-
aculturação literária e social”, de “investigação dentro do país” e, juntamente, de busca das
raízes nativas além do substrato colonial, re-enraizamento nativista – “fincar os pés na
terra”. Isto permitiria pensar um futuro para o país reconhecido como pátria, se ele ainda não
puder se enunciar como nação.” (RIVAS, 1989, p. 42).

Com isso, os claridosos assumem sua posição na terra-mãe ao revelarem a situação de


abandono por parte da metrópole em relação as ilhas do arquipélago. As temáticas desses
intelectuais repercutiam as dores, as angústias e todo o sofrimento do povo de Cabo Verde,
em virtude das moléstias que assolavam o arquipélago. Essa defesa do povo fez insurgir um
desejo de autonomia em relação à metrópole. Como afirma Romano (1984, p. 51): “A prosa
dos contos, as novelas, as narrativas e estórias não mais são que reinvindicações a favor da
dignidade humana ofendida, sobretudo do homem caboverdiano, ou dos homens cercados e
famintos, que morrem estoicamente silenciosos”. Os claridosos também defendiam, além da
autonomia em relação a Portugal, um predomínio do caráter português no comportamento
cotidiano, e a conduta do homem de Cabo Verde, sendo que a cultura dominante não seria a
africana, mas sim a portuguesa. Para eles, a origem do povo caboverdiano era mestiça,
contudo, uma supremacia dos elementos culturais portugueses estaria presente, de modo a
considerar Cabo Verde uma região europeizada.

Do ponto de vista literário, a Revista Claridade revolucionou ao trazer contemporaneidade


estética e linguística, superando o conflito entre o Romantismo oriundo de Portugal e o novo
Realismo. No âmbito político, a revista também foi importante para que os escritores
caboverdianos pudessem se afastar do cânone português para refletir sobre a consciência
coletiva caboverdiana. A revista deu notoriedade a grandes escritores cabo-verdianos.

Dentre as principais obras publicadas na revista pode-se citar: Arquipélago, de Jorge


Barbosa (1935); Chiquinho, de Baltazar Lopes da Silva (1947), Chuva Braba (1956) e Os
Flagelados do Vento Leste (1959), de Manuel Lopes. Segundo Romano (1984), a fase de
afirmação nacionalista, de 1944 até 1960, foi um período de transição entre o regionalismo
pregado pelos claridosos e o nacionalismo cabo-verdiano. A geração de Amílcar Cabral
transporta o sentimento de “fincar os pés na terra-mãe” para a esfera política, sobretudo pelo
movimento vivido no período onde um projeto de emancipação político-cultural crescia na
região. As publicações e seus respectivos autores que se destacaram nesse período são:
“Poemas de longe”, de António Nunes (1945); “Missiva”, de Daniel Filipe (1946); “Bejo
Caro”, de Juvenal Cabral; “Marinheiros em terra”, de Daniel Filipe (1949); “Poemas de
quem ficou”, de Manuel Lopes (1949); “Linha do Horizonte”, de Aguinaldo Fonseca (1951);
“Lírios e Cravos”, de Pedro Cardoso (1951); “Poesias”, de Januário Leite (1952); “Cadernos
de um ilhéu”, de Jorge Barbosa (1955); “Chuva Braba”, de Manuel Lopes (1956); “Cabo
Verde visto por Gilberto Freire”, de Baltazar Lopes (1956); “O Dialecto Crioulo de Cabo
Verde”, de Baltazar Lopes (1957); “Alma Arsinária”, de José Lopes (1957); “Evocação
faialense”, de Manuel Lopes (1958); “Horas sem carne”, de João Vário (1958).

Para Romano (1984), os integrantes dessa fase nacionalista refutavam as ideias dos
claridosos, pois sustentavam a luta pela independência e afirmação de uma identidade
africana, do arquipélago de Cabo Verde, ou seja, a defesa da raiz de África e a forte ligação
do arquipélago com o continente negro. A partir da década de 50, marca-se uma nova era na
formação da identidade cultural e nacional com o resgate dessas origens. A defesa da raiz
africana e profundo laço dos caboverdianos a este continente passam a ser um dos principais
propósitos, assim como um dos mais importantes pressupostos teóricos daquilo que viria a
ser a “reafricanização dos espíritos”.

Segundo Sparemberger (2011), a “reafricanização dos espíritos”, para Amílcar Cabral,


consistia na tomada de consciência de um povo que se encontra em uma posição subalterna,
como consequência do colonialismo. Com isso, o processo de africanização dos espíritos se
daria de maneira a libertar o cabo-verdiano das amarras impostas pelo colonialismo, o que,
consequentemente, viria a devolver a organização pública do arquipélago aos seus filhos.

Os escritores da década de 50 observaram que, para a construção da identidade nacional, era


preciso reencontrar as raízes africanas e valorizar todas as suas manifestações culturais,
especialmente aquelas que foram utilizadas pelos colonizadores para diminuir os
colonizados. Esse processo de reafirmação às origens africanas implicava na rejeição da
cultura colonizadora. A produção literária, poética e nos ensaios dessa geração expõem os
sentimentos de luta contra o “assimilacionismo”, a acomodação ao sistema colonial e a
resistência contra a aculturação do homem cabo-verdiano. Amílcar Cabral, Onésimo
Silveira, Felisberto Vieira Lopes, Aguinaldo Fonseca, Ovídio Martins, Gabriel Mariano,
entre outros, foram os principais escritores, ensaístas e poetas do período nacionalista da
literatura caboverdiana.

2.2. Pré e Pós Claridosos: A Poesia Como Afirmação Nacional


Como característica comum de países colonizados por potências europeias, a produção
literária sofreu uma influência direta da literatura produzida na metrópole. Em Cabo verde,
colônia portuguesa por mais de 400 anos, a literatura produzida no arquipélago evidencia-se
como resultante dessa influência, diferenciando-se grandemente das demais produções
literárias dos demais PALOP.

No que concerne a poesia cabo-verdiana, Cabral (1952) a divide em dois períodos


principais: o que antecede a publicação da revista Claridade (1936) e após a sua publicação.
A primeira fase da poesia caboverdiana é representada por Eugénio Tavares, José Lopes,
Pedro Cardoso, Januário Leite, entre outros, que se caracterizavam pelo desprendimento
quase total do arquipélago, o pouco sentimento de nacionalismo ou exaltação da identidade
de origem. Por vezes, apenas expressões sentimentalistas, majoritariamente voltadas para a
cultura de estilo clássico, sem muita ligação com as questões sociais. A poesia deste período
teve a característica de ser reprodutora das tendências europeias.

“Portugal! Pátria caríssima!

A ti, pois, as minhas trovas,

Sentidas e ardentes provas

De filial afeição!

Salve, pois, Pátria Lendária

A que voto amor profundo!

Tu és, das nações do mundo,

A mais ilustre nação”.

Segundo Cabral (1952), com o início da publicação da revista Claridade em 1936, a


produção literária possibilitou aos intelectuais do período que “fincassem os pés na terra”:
A poesia Cabo-Verdiana abre os olhos, descobre-se a si própria, – e é o
romper duma nova aurora. É a claridade que surge, dando forma as coisas,
apontando o mar, as rochas escalvadas, o povo a debaterse nas crises, a luta
do cabo-verdiano “anónimo”, enfim, a terra e o povo de Cabo Verde. Por
isso, o carácter intencional – e felizmente intencional – do nome da revista
que revela essa profunda modificação na Poesia Cabo-Verdiana: Claridade.
(CABRAL, 1952, p. 115).

Na segunda fase da poesia produzida em Cabo Verde, a paisagem local e os problemas


enfrentados pelo povo cabo-verdiano ganham espaço além da origem mestiça, assim como a
defesa e afirmação da especificidade cultural de Cabo Verde. Desse modo, a poesia do
período assume a responsabilidade de tratar das questões sociais ocasionadas pela metrópole
em Cabo Verde.

CASEBRE

Foi a estiagem

E o silêncio depois

Nem sinal de planta

nem restos de árvore

no cenário ressequido da planície.

O casebre apenas

de pedra solta

e uma lembrança aflitiva

O teto de palha

levou-o

a fúria do sueste.

Sem batentes

as portas e as janelas
ficaram escancaradas

2.2.1. A Mestiçagem e a Identidade Nacional

As fases em que se dividem a produção das letras caboverdianas evidenciaram a necessidade


de edificação da identidade nacional. No entanto, a constituição da sociedade tornou-se
problemática devido aos fatores já mencionados, os quais, caracterizaram a sociedade
caboverdiana como fragmentada. Para Ramos:

Em Cabo Verde encontraram-se dois grupos humanos já muito misturados,


onde a questão da pureza racial já não se colocava. Na base da sociedade
crioula cabo-verdiana estão, numa primeira fase, escravos e negros africanos
– foram muitas e diversas as etnias que participaram nesse processo – e
Portugueses, sobretudo da região da Madeira, do Minho e do Alentejo, que
forneceram o maior contingente de emigrantes portugueses para o
Arquipélago. (RAMOS, 2009, p. 21).

Desse modo, a sociedade cabo-verdiana estruturou-se a partir da sua afirmação enquanto


mestiça. A construção da identidade cabo-verdiana evidencia-se como problemática ao se
afirmar como uma cultura mestiça. Anjos (2003) discorre sobre a concepção da mestiçagem
caboverdiana e como as elites intelectuais do arquipélago exerceram uma influência
negativa no processo de assimilação da cultura local, como resultado da junção entre
europeus e africanos, sendo essa concepção caracterizada como “morabeza”, isto é:

A categoria cabo-verdiana “morabeza”, correspondente à “cordialidade


brasileira”, pode ser analisada enquanto inserida numa estratégia de
dominação, tomando a conotação moral da “abertura em relação ao
estrangeiro”. (ANJOS, 2003, p. 584).

Essa abertura ao estrangeiro possibilitou à configuração cultural uma mescla entre as duas
culturas em questão, a europeia e a africana. No entanto, segundo Anjos (2003), estruturou-
se com base nas distinções raciais desenvolvidas pela ciência produzida no século XIX a
partir de uma distinção hierárquica entre os dois polos. Desse modo, a cultura africana do
arquipélago se manteve distanciada do continente africano de maneira a estruturar-se com
base nos preceitos eurocêntricos.
O arquipélago de ilhas que formam a república do Cabo Verde encontrase a 650 km de
distância da costa africana. Com isso, evidencia-se uma problemática ao que se refere a
relação do arquipélago com o continente africano, como afirma Anjos (2003): “todo o
processo de construção da identidade nacional cabo-verdiana tem o Continente africano
como referência, seja para uma afirmação de distanciamento, ou para uma firmação de
proximidade ou de pertencimento”. No entanto, o processo de assimilação da cultura
africana provocou o direcionamento da cultural local para a metrópole, como maneira de se
firmar enquanto cidadãos africanos de comportamentos europeu. Sendo assim, a sociedade
cabo-verdiana é vista a partir do processo de mestiçagem como:

Uma sociedade cujas estruturas estatais são exteriores à cultura da maioria da população é
uma sociedade fraturada entre a elite, que tem acesso aos códigos ocidentais, e o resto.
Nesse sentido, a mestiçagem aparece não apenas como a ideologia que alivia as tensões
internas propondo uma imagem de coletividade homogênea, mas é também um modelo de
(Geertz, 1978) encompassamento de diferenças, que operacionaliza a forma como modelos
simbólicos exteriores podem ser integrados e, por fim, justifica essa importação. (ANJOS,
2003, p. 584).

Para Anjos (2003), o processo de construção da identidade do povo cabo-verdiano foi sendo
desenvolvido juntamente com a manifestação da sua produção literária, sendo que um
movimento foi importante para o avanço do outro dentro do contexto em que o povo cabo-
verdiano se encontrava, sendo colônia portuguesa por mais de 400 anos, sofrendo todas as
influências europeias nesse período, de maneira impositiva, o que provocou o afastamento
do povo com suas origens.

Num primeiro momento, os movimentos realizados pela elite de Cabo Verde dentro da
produção literária consistiam em absorver os traços europeus na formação linguística e
textual, entretanto, a cultura materna do povo caboverdiano era introduzida para demonstrar
as características regionais da colônia portuguesa. Sobre isso, Secco (1999, p.13) cita: “Nas
primeiras décadas do século XX, surgiu uma poesia que procurava as raízes regionais de
Cabo Verde, mas havia ainda nessa fase ambivalência entre ‘pátria portuguesa’ e a ‘mátria
crioula’ traduzindo o desenraizamento dos sujeitos poéticos”.
Conclusão
A cultura de um povo se manifesta de diversas maneiras, seja nos costumes, no cotidiano,
nas artes plásticas, literárias, entre outras. Algumas nações foram colonizadas
principalmente por nações europeias entre os séculos XV e XX e, por esse fato, os povos
colonizados sofreram diversas influências dos seus colonizadores, o que modificou e até
suprimiu, em alguns casos, a identidade cultural dos povos.

Em Cabo Verde, os portugueses ocuparam as terras do arquipélago por quase 400 anos,
contribuindo impositivamente na formação cultural dos caboverdianos. A literatura foi um
meio pelo qual os nativos, ao longo do período de colonização, puderam enfrentar a
dominação cultural portuguesa e, desta forma, ressignificar a identidade da sociedade cabo-
verdiana.

A literatura em Cabo Verde passou por fases distintas ao longo dos séculos XIX e XX, ao
menos onde se tem registros acessíveis. No início, os cabo-verdianos tinham como
referência o romantismo presente na Europa, especialmente em Portugal e França. As obras
lá produzidas eram traduzidas e importadas para Cabo Verde, e eram consumidas pela elite
abastada.

Na segunda fase, as produções literárias dos escritores cabo-verdianos começaram a evocar


um sentimento patriótico e também as questões sociais que envolviam a sociedade de Cabo
Verde também eram instrumentalizadas nos poemas e nos textos produzidos. Os problemas
sociais, como a fome, as doenças que assolavam o arquipélago entre outras mazelas, eram

manifestados. A fase dos pré-claridosos trouxe o sentimento regionalista para a sociedade


caboverdiana, as preocupações dos intelectuais desse período. As publicações em revistas
como a Manduco e depois com o periódico Claridade (1936) buscavam estabelecer as ideias
regionais do povo cabo-verdiano, em oposição à predominância europeia no arquipélago.

Por fim, com os claridosos, a questão regional é amplificada pelo discurso nacionalista, onde
a negligência de Portugal com sua colônia se tornava um dos principais motivos para o
afastamento de Cabo Verde em relação à dominação portuguesa. As contribuições dos
principais nomes das letras em Cabo Verde expandiram para o campo político,
acompanhando a onda de revolução das nações colonizadas pelos europeus na região em que
buscavam a independência.
Referências Bibliográficas

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