Aline Ramos Barbosa
Aline Ramos Barbosa
Aline Ramos Barbosa
São Cristóvão-SE
2017
ALINE RAMOS BARBOSA
São Cristóvão-SE
2017
ALINE RAMOS BARBOSA
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Profa. Dra. Josalba Fabiana dos Santos (UFS)
Orientadora
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Prof. Dr. Afonso Henrique Fávero (UFS)
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Profª. Drª. Vera Lúcia da Rocha Maquêa (UNEMAT)
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
CDU 808
AGRADECIMENTOS
De forma inicial, agradeço ao meu Pai Soberano e Supremo, ao meu Deus que sempre está
presente em minha vida em todas as situações. Sem essa presença Divina, nada seria possível.
Agradeço a minha família, por toda compreensão em entender esse momento único e corrido
da minha vida. Aos meus pais, em especial a minha mãe, que sempre esteve atenta, cuidando
dos detalhes, sofrendo e vibrando a cada vitória! Aos meus irmãos Jaqueline, Tuca, Gel e
Roberto (estes mesmo distantes, sempre estão torcendo para que tudo dê certo). Aos meus
sobrinhos Roberta, Yan e Jean. Ao meu namorado por toda paciência, incentivo e por estar
presente em todos os momentos. Amo você, amor!
A minha Titia (Zefinha) por cuidar e sempre se preocupar comigo, por ser uma amiga sempre
presente. A todos os meus amigos que estiveram comigo durante essa caminhada longa e árdua,
que partilham comigo angústias e alegrias. Quero externar também a minha gratidão aos amigos
que fiz na academia: Michele, Euler e Amanda. Obrigada turma!
Sou imensamente grata aos amigos do “Brigadeiro com Cerveja”, pois todos os momentos de
descontração e festividades me fazem muito bem e me ajudam a caminhar de forma mais leve.
Aos meus amigos e parceiros do trabalho, a “Equipe Power Rangers”, por toda compreensão,
ajuda, companheirismo. Muito obrigada, amigos. Vocês são meus exemplos de profissionais
comprometidos com um futuro melhor para a educação do nosso país.
Agradeço a professora Josalba por acreditar em meu potencial e me incentivar a chegar até aqui.
Aos professores participantes das bancas de qualificação e defesa, por toda orientação e apoio.
GRATIDÃO, enfim, a todos que contribuíram de forma direta ou indireta para que este trabalho
fosse possível!
“Mis libros (que no saben que yo existo)
son tan parte de mí como este rostro
de sienes grises y de grises ojos
que vanamente busco en los cristales
y que recorro con la mano cóncava.
No sin alguna lógica amargura
pienso que las palabras esenciales
que me expresan están en esas hojas
que no saben quién soy, no en las que he escrito.
Mejor así. Las voces de los muertos
me dirán para siempre”.
Tendo em vista que a subjetividade é um aspecto pouco discutido nas pesquisas que tratam da
leitura, este trabalho tem como objetivo central analisar como ela – a subjetividade – se
apresenta nas dissertações defendidas pelos mestrandos vinculados ao Programa de Pós-
Graduação em Letras da Universidade Federal de Sergipe, no período entre 2010 e 2016. Para
tanto, nos valemos de uma bibliografia que discute, sobretudo, o processo de leitura e as
questões pertinentes ao leitor. A fim de alcançar tal objetivo, trouxemos para o cerne da
discussão alguns posicionamentos e conceitos de Compagnon (1999; 2009), mostrando que a
literatura ocupa um lugar bem mais abrangente do que se imagina e todo questionamento que a
permeia; Candido (1988; 2006), que nos ajuda a compreender a literatura sob uma perspectiva
mais social; Todorov (2010), fazendo com que pensemos a respeito da literatura em si e do que
representa para a sociedade; Bloom (2001), que se concentra mais no processo de leitura
literária, uma vez que, para ele, a leitura nos apresenta mundos inimagináveis. Além das
citações desses teóricos, as quais aparecem com mais recorrência no corpo do texto, elencamos
também alguns posicionamentos de Iser (1979) e Jauss (1999), responsáveis pela Estética da
Recepção, corrente bastante pertinente para a valorização do leitor. Além disso, Jouve (2012),
Rouxel (2013) e Langlade (2013), que trazem discussões a respeito do caráter subjetivo da
leitura literária. Para abranger os demais aspectos concernentes à figura do leitor, nos utilizamos
dos pressupostos trazidos por Eagleton (2006), Eco (1988), Culler (1997) e Barthes (2008).
Considering that subjectivity is a little discussed aspect in academic researches that deal with
reading, this work has as its central objective to analyze how it – the subjectivity – is presented
in the dissertations defended by the master's degree students linked to the Postgraduate Program
in Letters from Federal University of Sergipe in the period between 2010 and 2016. For this,
we use a bibliography that discusses, above all, the reading process and the questions related to
the reader. In order to achieve this goal, we have brought to the center of the discussion some
positions and concepts of Compagnon (1999; 2009), showing that the literature occupies a place
that is much more encompassing than it is imagined and all questioning that permeates it;
Candido (1988, 2006), who helps us to understand literature from a more social perspective;
Todorov (2010), making us think about the literature itself and what it represents for society;
Bloom (2001), who focuses more on the process of literary reading, since, for him, reading
presents us unimaginable worlds. In addition to the citations of these theorists, which appears
with more recurrence in the body of the text, we also list some positions of Iser (1979) and
Jauss (1999). They are responsible for the Aesthetics of Reception, current of thought quite
pertinent for the reader's appreciation. In addition, Jouve (2012), Rouxel (2013) and Langlade
(2013) bring discussions about the subjective character of literary reading. To encompass other
aspects concerning the figure of the reader, we use the assumptions brought by Eagleton (2006),
Eco (1988), Culler (1997) and Barthes (2008).
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 10
INTRODUÇÃO
(Manuel Bandeira)
O leitor é um elemento na literatura que tem nos chamado bastante a atenção. As poucas
pesquisas mais consistentes nessa área também são um fator relevante que impulsiona a nossa
escrita. Nesse sentido, a figura do leitor e a subjetividade que carrega são de grande relevância
em nossa pesquisa. Stierle, em “Que significa a recepção dos textos ficcionais”, mostra que “o
significado da obra literária é apreensível não pela análise isolada da obra, nem pela relação da
obra com a realidade, mas tão só pela análise do processo de recepção, em que a obra se expõe,
por assim dizer, na multiplicidade de seus aspectos” (1979, p. 134). Assim, verificamos que o
texto literário é uma porta de entrada para várias discussões que envolvem, sobretudo, o
processo de leitura e o leitor. É justamente esse processo que nos interessa.
Em Literatura para quê?, Compagnon nos diz que “A realização de si, julgava Proust,
acontece não na vida mundana, mas pela literatura, não somente para o escritor que se consagra
a ela inteiramente, mas também para o leitor que ela emociona durante o tempo em que ele se
dá a ela” (2009, p. 21). A emoção, o gosto e as escolhas são pontos relevantes a serem discutidos
aqui, pois é por meio desses pontos que verificamos os indícios de subjetividade. Nesse
entremeio, há um fator importante a respeito do processo de leitura que tem despertado nosso
interesse: o processo de apreensão do texto literário. Alguns autores como Jouve, Rouxel e
Langlade trazem discussões que tocam na subjetividade do leitor, porém esse ainda é um campo
recente de pesquisas.
Foi pensando, nessa perspectiva, que analisar como o estudante do Programa de Pós-
Graduação em Letras da Universidade Federal de Sergipe escolhe seu corpus de pesquisa, quais
os critérios, os interesses, o que deixa evidente a partir de sua escrita nos motivou e sobretudo
nos direcionou para um caminho trilhado por poucos pesquisadores. Para isso, selecionamos as
dissertações concentradas nas pesquisas que envolvem o texto literário, situadas entre 2010 e
2016, dentro da área dos Estudos Literários.
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Levar em conta as experiências subjetivas dos leitores reais — que sejam estes alunos,
professores ou escritores — é fundamental para dar sentido a um ensino de literatura
que se limita com muita frequência à aquisição de objetos de saber e de competências
formais ou modelares.
O estudo da literatura, na maior parte dos casos, é um trabalho com conceitos. Não
fugiremos completamente a essa generalidade, pois nossa pesquisa será desenvolvida mediante
a relação entre o objeto de estudo (as dissertações dos mestrandos em Letras) e uma pesquisa
de cunho bibliográfico, enfocando, principalmente, a figura do leitor.
O leitor foi, durante muito tempo, um ser “esquecido” pelas abordagens literárias. Com
o advento da Estética da Recepção, ele passou a ser alvo de discussões. Assim, “estudos da
recepção interessaram-se pela maneira como uma obra afeta o leitor” (COMPAGNON, 1999,
p. 147). Isso porque o processo de recepção é capaz de revitalizar a obra, uma vez que alguém,
a partir de sua leitura, movimenta o texto. Os leitores são afetados e afetam por aquilo que leem.
Harold Bloom (2001, p. 19) aponta que “[...] a maneira como lemos depende, em parte,
da distância em que nos encontramos das universidades, onde a leitura não é ensinada como
algo que proporciona prazer, segundo os significados mais profundos da estética do prazer”.
Isso quer dizer que a afetação literária ocorre independentemente de inserções teóricas que
circulam sobre a literatura.
pela leitura, o texto não tem de modo algum – ou ao menos totalmente – o sentido que lhe
atribui seu autor, seu editor ou seus comentadores” (1998, p. 77).
Verifica-se, com isso, que o leitor é a peça fundamental para que o processo de leitura
seja difundido e a obra, revitalizada. O que se fundamenta aqui é que a leitura não pode ser um
processo mecanizado, no qual se reproduz algo já existente. A leitura, principalmente a de
textos literários, não pode girar em torno de discussões já prontas, ainda que esse viés seja
importante, principalmente para a crítica literária. Se formos analisar os livros didáticos que
tratam do texto literário, quase sempre ficamos diante de discussões direcionadas, contribuindo,
assim, para a exclusão da individualidade/gosto/perspectiva de cada leitor. Logo, o intuito é
pensar como o leitor recebe o texto literário, como é o processo de recepção, quais pontos o
afetam, quais autores são foco de suas pesquisas. Conforme expõem Rouxel e Langlade (2013,
p. 20),
[..] em uma atitude de leitura “normal” — quando leio “um livro em minha poltrona
para meu prazer” —, minha atenção não está focalizada exclusivamente nesses traços
estéticos, nesses índices da referência literária, o que não significa que sejam
ignorados por mim, que os apague artificialmente de meu espírito; estão, entretanto,
associados a outros elementos que remetem a minha personalidade global.
Portanto, é preciso dar subsídios para que haja em nossa sociedade leitores que leem
não por imposições, mas por vontade própria. É necessário haver uma sensibilidade acerca da
literatura, uma vez que ela pode ressignificar, por exemplo, a formação humana. Candido (1988,
p. 186) expõe que “[...] a literatura corresponde a uma necessidade universal que deve ser
satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, pelo fato de dar forma aos sentimentos e à visão
do mundo que os organiza [...]”. Pensar as relações existentes entre o leitor e o texto literário
talvez seja o caminho mais inteligente para a formação de um leitor.
O universo da leitura é um espaço habitado somente por aqueles que leem. Sendo assim,
é um espaço individualizado, peculiar àquele que efetivamente leu o texto. Como aponta
Manguel (1997, p. 20), “todos lemos a nós e ao mundo à nossa volta para vislumbrar o que
somos e onde estamos. Lemos para compreender, ou para começar a compreender. Não
podemos deixar de ler. Ler, quase como respirar, é nossa função essencial”.
O segundo capítulo mostra discussões concernentes ao leitor de forma geral. Para isso,
utilizamos os pressupostos da Estética da Recepção de Jauss, Iser, Roman Ingarden, Stierle,
bem como textos pertencentes a Jouve, Rouxel e Langlade, entre outros. Cada teórico citado
traz uma contribuição significativa para os estudos que colocam o leitor como o centro das
discussões. Nesse sentido, algumas questões relacionadas à subjetividade literária serão
discutidas aqui.
O terceiro capítulo traz um apanhado das análises feitas a partir das dissertações dos
mestrandos vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Letras. Por isso, tentaremos mostrar
como a subjetividade e o gosto pessoal estão alinhados às escolhas desses pesquisadores.
Assim, pensar como um leitor escolhe seus objetos de pesquisa e tentar averiguar como
se dão essas escolhas são os nossos principais objetivos. As dissertações, conforme mencionado
acima, foram escolhidas a partir do recorte temporal. Todas elas estão situadas entre 2010 e
2016. Escolhemos esse recorte pela facilidade em poder tê-las em mãos de forma concreta. A
informatização dos textos nos ajudou a tornar a pesquisa mais dinâmica e eficaz, uma vez que,
a partir de 2010, as dissertações passaram a ter versão digital disponível na rede.
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e na mesma solidão...
(Hilda Hilst)
Antes de partirmos para as discussões que centralizam a figura do leitor, achamos por
bem fazer algumas reflexões a respeito da literatura. Acreditamos que há uma relação intrínseca
entre ela, o texto literário e a afetação do leitor. Nesse sentido, tomamos como ponto de
referência, principalmente, os textos de Todorov, Candido, Eagleton e Barthes. Como esse não
é o tema central da nossa pesquisa, nos concentraremos em pontos específicos. No entanto,
consideramos essa discussão fundamental, porque nosso corpus está relacionado tão somente
ao texto literário, assim discutir a respeito e analisar o seu lugar, hoje, em nossa sociedade é
uma questão relevante.
Em se tratando de definições, não é nada fácil limitar todo apanhado crítico e teórico
predisposto sobre a literatura. Entretanto, discutir o seu conceito, o papel do leitor e alguns
questionamentos que os cercam é de suma importância, principalmente por estarmos tratando
do leitor literário.
Todorov (2010), em A literatura em perigo, expõe seu percurso intelectual até chegar a
discussões mais centrais. Nesse trajeto, nos leva à França dos anos 1960, passando por seu
encontro com Gérard Genette até as aulas com Roland Barthes, frequentadas pelo estudioso na
École des Hautes Études. No capítulo “A literatura reduzida ao absurdo”, a partir de uma
experiência com seus próprios filhos, discute a respeito do ensino de literatura no nível básico
francês e o compara a um edifício em construção que, depois de pronto, deveria se ver livre dos
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andaimes, já que o que importa mesmo é o prédio e sua arquitetura. Entretanto, o que se percebe
nos estudos literários é a manutenção dos andaimes e a transformação deles em objeto de
estudo.
A literatura foi vista por três tendências a partir da segunda metade do século XX: os
críticos formalistas, os niilistas e os solipsistas. O formalismo concentrou-se no uso da
linguagem e na estrutura da narrativa, e isso se tornou mais importante que os temas. O niilismo,
por seu turno, criou uma nova visão do mundo, a qual mostra aquilo que o humano tem de pior,
e os textos representavam, assim, o nada que embasava a vida. Já o solipsismo se voltou para o
próprio autor das histórias, que passa a enxergar a partir de seu ponto de vista, única
representação da realidade possível ao leitor. Essas tendências só mudaram de nomenclatura,
mas a ideia permanece a mesma: fazer leituras fechadas e superficiais. Com isso, a herança
crítica da literatura não permite as várias interpretações a respeito do texto.
Embora o objetivo não seja tratar de questões de ensino aqui, é interessante fazermos
uma reflexão a respeito do contexto literário, principalmente porque isso justificará a nossa
metodologia, que traçará um caminho que é feito pelo mestrando até seu corpus de pesquisa.
Outro ponto relevante é compreender que, mesmo que a literatura tenha se resumido a
uma disciplina, em sua grande maioria, há uma comunidade de leitores que valorizam o texto.
Assim, “Sem qualquer surpresa, os alunos do ensino médio aprendem o dogma segundo o qual
a literatura não tem relação com o restante do mundo, estudando apenas as relações dos
elementos da obra entre si” (TODOROV, 2010, p. 39). Antonio Candido (1988), em “O direito
à literatura”, traz a ideia de que a literatura é um bem que deve ser estendido a todos, um bem
necessário à vida. Nesse sentido, define-a da seguinte maneira:
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A literatura é concebida como arte. Em Por que estudar literatura? (2012), Jouve faz
um apanhado de como a arte foi entendida no decorrer dos séculos. A definição do que seja
arte, no geral, para muitos teóricos, não deve ser estabelecida, pois é melhor crer num conceito
aberto, o qual possa englobar, cada vez mais, variados objetos artísticos. Isso não quer dizer,
por outro lado, que não seja possível reconhecer propriedades artísticas em uma obra.
Há muito tempo, a arte está associada ao belo e, para Jouve, se ela evolui, é porque a
nossa ideia do que seja o belo está sempre em modificação. Sobre isso, quando se vincula a arte
com o belo, existem duas perspectivas: a subjetiva e a relacional. A relacional parte da crença
de que o belo depende do gosto de cada um, logo cada um atribuirá a um determinado objeto o
valor de arte ou não. E a subjetiva defende que o objeto artístico manifesta a intenção de
produzir o belo.
Aprofundando essa associação da arte como sinônimo do estético, Jouve deixa claro que
esse pensamento está datado de uma época, pois muitas obras consideradas de arte hoje, no
momento de sua criação, não tinham relação com o conceito de belo. Assim, “a arte já não é
somente, para nós, o que visa ao belo; é também aquilo que pode emocionar ou fazer pensar”
(JOUVE, 2012, p. 18). A partir dessa citação, fica claro que a noção da estética não é afastada
do objeto artístico, ela é apenas ampliada para as outras propriedades da obra de arte. Levando
em consideração que a arte é uma necessidade transcultural, que sempre existiu, mesmo quando
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ela ainda não era assim nomeada, existem três características comuns sobre esse conceito: ela
não tem utilidade, exprime alguma coisa e lhe é reconhecido um valor.
Citando Schaeffer, Jouve (2012) nos mostra três fatores que definem um objeto como
arte: a atenção estética, a pertinência genérica e a intenção estética. Esses três pontos estão,
respectivamente, para a relação que a obra literária possui entre os três elementos: o leitor, a
obra e o autor. Isso porque a atenção estética está relacionada com a recepção, que, na literatura,
é a participação do leitor. A pertinência genérica trata da obra em si, por exemplo, observando
se ela está enquadrada nas características do gênero a que se propôs. E a intenção estética trata
de quem produziu o objeto, no caso, o autor (JOUVE, 2012, p. 20). O estudioso acrescenta
também que a literatura é concebida, em muitos momentos, como a obra de arte, mas, em
contraste com outras, tem a singularidade de ter a linguagem como material básico.
Diferentemente do que se observa nos textos de Compagnon e Todorov, Jouve não trata
apenas da importância do sentido que depreendemos de um texto literário, mas também enaltece
a forma, o estético, valorizando o papel do autor e da obra. Nesse entremeio, podemos afirmar
que ler e compreender um livro é compreender o humano e toda a sua complexidade, certo que
isso não nos torna melhores, mas pode ser proporcionado um leque de informações a ponto de
fazer com que nos relacionemos melhor com o outro. A esse respeito, Candido, em Literatura
e sociedade, mostra que
A literatura é pois um sistema vivo de obras, agindo umas sobre as outras e sobre os
leitores; e só vive na medida em que estes a vivem, decifrando-a, aceitando-a,
deformando-a. A obra não é produto fixo, unívoco ante qualquer público; nem este é
passivo, homogêneo, registrando uniformemente o seu efeito. São dois termos que
atuam um sobre o outro, e aos quais se junta o autor, termo inicial desse processo de
circulação literária, para configurar a realidade da literatura atuando no tempo (2006,
p. 84).
Sendo assim, devemos considerar que a influência é uma via de mão dupla. O texto
literário é influenciado pelo meio, através de seus leitores, e, em contrapartida, os leitores
podem ser influenciados pelo texto ficcional. Apesar de considerarmos a literatura um mundo
paralelo onde há uma representação ou tentativa de um real, não podemos discordar da grande
influência que ela exerce na vida das pessoas. Segundo Terry Eagleton,
a definição de literatura fica dependendo da maneira pela qual alguém resolve ler, e
não pela natureza daquilo que é lido. Há certos tipos de escritos – poemas, peças de
teatro, romances – que, de forma claramente evidente, pretendem ser “não-
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pragmáticos” nesse sentido, mas isso não garante que serão realmente lidos dessa
maneira (2003, p. 11).
Acertadamente, esse teórico evidencia que as definições tentam limitar a arte literária.
Outro ponto bastante instigante que podemos levantar a partir dessa questão é a carga afetiva
existente no texto literário e/ou no leitor. Nesse sentido, o leitor, em alguns momentos, tem a
capacidade de decidir se ele será literário ou não. Isso dependerá, sobretudo, da sua experiência
com a leitura. Eagleton ainda foi mais além quando mostrou que
Como aponta o próprio título, nesse momento inicial, achamos relevante discutir como
o leitor é visto e construído. Para isso, recorremos a alguns teóricos que trazem à tona pontos
que evidenciam “a presença do leitor” à cena do texto literário. Iser e Jauss são os principais
nomes que darão subsídios para essa discussão. Todavia, outros teóricos, como Chartier, Jouve
e Compagnon, também irão contribuir para esta pesquisa.
Essas escolhas não são aleatórias, pois estudiosos se dedicaram a pesquisas que
envolvem a figura do leitor e trazem reflexões a respeito de algumas mudanças que a categoria
traz a algumas abordagens literárias. De forma específica, quando nos debruçamos sobre o
corpus, o caminho a ser percorrido é delimitado. A relação do leitor com o texto literário, a
presença do leitor para que o texto literário “aconteça”, é um dos pontos cruciais que nos
nortearam. Assim, nos concentramos na carga subjetiva que leva um leitor a fazer certas
escolhas literárias em detrimento de outras.
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Embora algumas teorias tratem do leitor, muito ainda precisa ser discutido sobre esse
ser que trabalha na (des)construção do texto. Ao analisarmos a sua importância no processo da
leitura literária, nos deparamos com vários papéis que são desempenhados por ele, como o de
contemplador e o de disseminador. No tocante ao contemplador, podemos fazer, mesmo que
mentalmente, um percurso percorrido pelo sujeito em sua caminhada “literária”.
No início do estágio, embora apresente sua subjetividade, ele contempla de forma menos
crítica o texto. A sua leitura permanece, quase sempre, na superficialidade. Talvez seja uma
herança excluir, de certa forma, a sua subjetividade, desconsiderá-la. Por outro lado, temos o
leitor que também é disseminador, aquele que consegue motivar outro leitor a conhecer o texto
literário a partir de suas impressões. O leitor é, mesmo que de forma inconsciente, afetado por
suas leituras, e essas mesmas leituras são, em muitos momentos, compartilhadas através de suas
emoções.
Por isso, falar desse ser que lê, que faz com que a literatura ganhe forma é entrar em um
ambiente que suscita vários questionamentos, mas que concebe uma importância extrema,
principalmente quando se trata da tríade leitor, autor e obra. Um não existe sem o outro, apesar
de que, em alguns momentos da história literária, acreditou-se no inverso dessa afirmativa.
A partir do século XIX, quando ler deixou de ser uma atividade que privilegiava apenas
o universo masculino, com o advento da imprensa e do ensino por meio de escolas, foi
proporcionada uma ampliação do público leitor, pois tanto as classes menos abastadas quanto
as mulheres foram beneficiadas, tendo como principal objeto de leitura folhetins e romances.
Essa reviravolta se deu, sobretudo, em virtude da industrialização.
Costa Lima (1979, p. 17) afirma que ela, em vez de considerar, por um lado, a obra de arte, e,
por outro, a função do receptor, parte de sua absoluta interação: enquanto estético, o valor da
arte, ainda que sustentado na materialidade da obra, se atualiza tão só na consciência do
observador.
Em virtude disso, podemos considerar que foi uma grande evolução não mais prender a
estética a uma análise imanentista do texto literário, como era praticado pela teoria da literatura
desde a Poética, de Aristóteles. Quando um leitor se debruça sobre um texto, ele leva consigo
uma história, seja ela de cunho textual ou não. A partir dessa perspectiva, é inconcebível pensar
que o leitor não é parte relevante no processo de construção de sentidos. Costa Lima (1979)
mostra que a Estética da Recepção se apresentava como alternativa a um imanentismo
burocratizante. Entenda-se aqui burocracia como uma denominação pejorativa que pode
justificar a falta de liberdade no trato com textos literários.
Dessa forma, o texto e o autor deixaram de ter o principal papel e passaram a ser um
instrumento no qual o leitor é um construtor de sentidos, pois sem ele a literatura não acontece,
é ele quem dá vida aos textos. Stierle, em “Que significa a recepção dos textos ficcionais”,
afirma que, em Jauss, a recepção é sempre o momento que se inicia pelo “horizonte de
expectativa” de um primeiro público e que, a partir daí, prossegue no movimento de uma “lógica
hermenêutica de pergunta e resposta” (1979, p. 120).
“movimentar” o texto. Sem ele, o texto é apenas um emaranhado de palavras. Wolfgang Iser,
em “A interação do texto com o leitor”, traz que:
Na visão de Iser (1979), o leitor é parte fundamental, mas não uma fonte segura, uma
vez que o texto nos convida a várias possibilidades de interpretação. Essas, por sua vez, só serão
dignas de sucesso se, de fato, o leitor conseguir preencher os espaços em branco do texto.
Embora suas contribuições tenham sido em regra a favor do leitor, Iser recebeu sérias
críticas a respeito de seus postulados, sendo que a principal delas gira em torno do leitor
implícito. Para Stierle (1979), a teoria da recepção de Iser é uma teoria das variáveis, cujas
constantes se encontram apenas no lado do próprio texto. Nesse sentido, Costa Lima afirma
que,
Costa Lima (1979) mostra ainda como Iser via a relação entre o leitor e o texto literário.
No entanto, sabemos que há também um indício de crítica, pois Iser é bastante taxativo em seus
conceitos e se assemelha, de certa forma, a correntes tradicionais que viam o leitor como um
ser totalmente passivo. O potencial do leitor é bem maior do que então se discutia na visão de
Iser, na medida em que ele é capaz de dar sentido à leitura, não é um mero coletor de dados que
irá revitalizar o texto através dos espaços em branco que o autor define. Apesar de certas
divergências em alguns pontos, a Estética da Recepção contribuiu sobremaneira para a ascensão
do leitor. Com essa ascensão, o leitor foi percebido como um ser ativo e capaz de atualizar e
revitalizar o texto literário, assim o eixo de análise de uma produção textual deixa de ser a obra
e passa a ser a sua recepção, percebendo-se, com isso, o seu impacto na sociedade.
22
Compagnon (1999) também faz menção à tríade autor, leitor e obra. Até certo momento,
a obra era o centro das discussões, e as leituras realizadas pelos seus receptores de nada valiam.
Compagnon também traz alguns autores que não consideravam o leitor enquanto tal. Brunitiére,
Lanson e Mallarmé são citados, bem como os historicistas, os formalistas e os New Critics, os
quais concordaram durante muito tempo em banir o leitor,
cuja exclusão foi mais clara e expressamente formulada pelos New Critics americanos
do entreguerras. Eles definiam a obra como uma unidade orgânica auto-suficiente, da
qual convinha praticar uma leitura fechada (close reading), isto é, uma leitura
idealmente objetiva, descritiva, atenta aos paradoxos, às ambiguidades, às tensões,
fazendo do poema um sistema fechado e estável, um monumento verbal, de estatuto
ontológico tão distanciado de sua produção e de sua recepção quanto em Mallarmé
(COMPAGNON, 1999, p. 141).
Dessa maneira, percebemos que em um dado momento a leitura era tida como algo
objetivo, concreto e fechado. Compagnon (1999), citando Proust, mostra que, mesmo de uma
forma positivista, o leitor é um espírito reagindo ao livro, à proporção que aplica ao que lê a
sua própria forma de ver e de estar no mundo. No mesmo texto, o crítico citado apresenta
algumas concepções que trazem o leitor à cena literária. O início de tudo se deu com a
fenomenologia, cujo principal mentor foi Roman Ingarden, que, por sua vez, também contribuiu
para o surgimento da Estética da Recepção. Para esse crítico, o texto é um processo que imbrica
tanto normas quanto valores extraliterários e cujo significado é dado por cada leitor conforme
sua experiência.
Compagnon (1999) também apresenta as ideias do crítico e teórico que muito contribuiu
para a re(descoberta) do leitor: Iser, o qual trouxe o conceito de leitor implícito. Iser afirma que
o texto é um dispositivo potencial em que o leitor, por sua interação, constrói um objeto
coerente. Assim, a obra literária terá dois polos, “[...], o artístico e o estético. O primeiro é o
texto do autor e o segundo é a realização efetuada pelo leitor” (COMPAGNON, 1999, p. 148).
O objeto literário é, por conseguinte, a própria interação do texto com o leitor.
leitor, a cada instante, só percebe um de seus aspectos, mas relaciona tudo o que viu,
graças à sua memória, e estabelece um esquema de coerência cuja natureza e
confiabilidade dependem de seu grau de atenção (COMPAGNON, 1999, p. 152).
Para esse crítico, Iser descreve um universo literário bem controlado, semelhante a um
“jogo de papéis programado” (COMPAGNON, 1999, p. 130), assim, o leitor obedece apenas
ao que o texto lhe impõe. Na concepção da teoria do efeito de Iser, os textos literários são
distintos dos não literários, especialmente dos científicos, pela presença de vazios ou intervalos
que acabam sendo preenchidos pela disposição individual do leitor. Dessa forma, Costa Lima,
em seu livro Teoria da literatura em suas fontes, diz que:
Os textos são estímulos, portanto, para a comunicação por meio de textos ficcionais,
segundo o autor [Iser], aquelas partes de indeterminação, constitutivas dos textos de
ficção, partes que o leitor procura esclarecer por meio da atividade ideativa. E é nesse
processo de quebra da ambiguidade que o leitor desenvolve uma situação [...] e cria
as condições para a compreensão do texto [...] (1979, p. 422).
Costa Lima (1979) destaca que, mesmo com o advento da Estética da Recepção, o leitor
implícito, na verdade, só tem como escolha obedecer às instruções do autor. Nesse sentido,
percebemos que as críticas feitas por Compagnon a respeito do leitor implícito de Iser
procedem, uma vez que, mesmo com a disseminação das ideias postas pela Estética da
Recepção, essa abertura para interpretações das indeterminações acabou por gerar alguns
problemas. Apesar da consideração proveniente da Estética da Recepção para com o leitor,
ainda assim ele fica limitado aos pontos de indeterminação que são deixados pelo autor. Porém,
faz-se necessário salientarmos que, apesar das críticas, não se pode negar a contribuição que
Iser deixou para uma nova abordagem da literatura e, sobretudo, do leitor.
A respeito dos teóricos que produziram sua teoria em prol da atuação do leitor na
construção do texto, é interessante notar as linhas de pensamento que eles seguiram. Assim,
com Roman Ingarden e Iser, tem-se noção da recepção numa perspectiva individual, ou melhor,
é a fenomenologia do ato individual da leitura; já com os críticos Gadamer e Jauss, a recepção
é estudada a partir de uma hermenêutica da resposta pública ao texto, é a recepção do ponto de
vista da coletividade. Além disso, Ingarden, fundador da Estética Fenomenológica, via no texto
uma estrutura potencial concretizada pelo leitor na leitura, como um processo que põe o texto
em relação com normas e valores extraliterários.
Iser, em sua teoria, atribui um importante valor ao leitor e à sua individualidade no ato
de ler. Segundo Compagnon (1999), esse teórico estabelece o conceito de leitor implícito como
24
uma construção textual que corresponde ao papel atribuído ao leitor real pelas instruções do
texto. O leitor implícito propõe um modelo ao leitor real, define um ponto de vista que permite
a este construir sentidos, designando uma rede de estruturas que obrigam o leitor a captar o
significado da obra.
A relação entre esses dois leitores pode ser percebida no fato de o leitor implícito
fornecer esquemas, cuja concretização caberia ao leitor real. No entanto, é importante citar que,
para uma realização eficiente da leitura, é necessária uma intersecção entre o repertório do leitor
real e o repertório do texto (leitor implícito). Sobre essa perspectiva, podemos fazer um
comparativo entre a noção de leitor implícito posta por Compagnon e a que é colocada por
Eagleton em Teoria da literatura, a saber:
Vemos, então, que, independentemente da vontade do autor, ele, ao construir sua obra,
já está construindo o tipo de leitor a quem ela se destina. É algo inconsciente para quem escreve
e que não surge de maneira taxativa, isto é, com recomendações a quem se destina a obra,
constituindo, sobretudo, um processo implícito ao ato de escrever.
Em “A interação do texto com o leitor” (1979), Iser se “defende” das críticas recebidas
sobre suas postulações, pois ele impõe que o leitor, diante da indeterminação do texto, saiba
diferenciar entre o que deve ser de fato preenchido e o que deve ficar em branco. Mostra,
também, que são os vazios, a assimetria fundamental entre texto e leitor, que originam a
comunicação no processo da leitura.
Toda essa discussão em relação a Iser está ligada à leitura individual, porém a Estética
da Recepção também tem outro ângulo: a leitura coletiva, cujo formulador é Hans Robert Jauss.
Para ele, existe um conjunto de convenções que contribui para a leitura tanto de um leitor quanto
25
Stanley Fish afirma que “o leitor começa sempre por uma interpretação, não há texto
preexistente que possa controlar sua resposta: os textos são as leituras que nós fazemos deles;
nós escrevemos os poemas que lemos” (apud COMPAGNON, 2009, p. 161). O que se coloca
aqui está intrinsecamente relacionado com a capacidade subjetiva de cada leitor. A leitura só
existe porque há um leitor capaz de lhe dar vida, e, na mesma medida, o livro só existe porque
há um público que revitaliza, através de suas leituras, o texto literário.
O autor define três momentos para se chegar ao que hoje chamamos de experiência
estética, sobretudo aquela que toca o leitor. A primeira está calcada na ideia que Aristóteles tem
a respeito do prazer. Para ele, o papel mais significativo dessa experiência estética está
relacionado a uma dualidade: a experiência não precisa partir somente daquilo que seja tido
como belo, mas também daquilo que é tido como feio, deformado, pois também faz parte da
experiência vivida pelo espectador, na medida em que ele lê a obra à sua maneira. Pode, pois,
“identificar-se com as pessoas em ação, dar assim livre curso às próprias paixões”
(ARISTÓTELES apud JAUSS, 1979, p. 79). Aqui, percebemos que há uma grande evolução
acerca do prazer estético propriamente dito, pois que deixou de ser visto como algo que era
somente vinculado a uma positividade e passou a se relacionar também ao feio, ao negativo (se
é que podemos fazer essa ligação) e, consequentemente, à afetação do leitor.
Um outro ponto que Jauss (1979) destaca para a autoafirmação da experiência estética
está calcado na ideia existente entre o bom, orientado para Deus, e o mau uso do prazer dos
26
sentidos, voltado para o mundo, conforme o pensamento agostiniano. O terceiro momento que
contribuiu sobremaneira para a evolução da experiência estética se relaciona com o pensamento
de Górgias, que estava interessado na “preparação” do ouvinte de um discurso e na transposição
de seu esforço apaixonado para uma nova convicção, que, irresistivelmente, “forma a sua alma
como ela deseja”.
Nesse entremeio, Jauss (1979) nos permite imaginar a experiência estética a partir de
três ângulos: o da poiesis, o da aistheisis e o da katharsis, sendo que, o primeiro designa o
prazer ante a obra que nós mesmos realizamos; o segundo, o prazer estético da recepção
reconhecedora e do reconhecimento perceptivo; e o terceiro, aquele prazer dos afetos
provocados pelo discurso ou pela poesia, capaz de conduzir o ouvinte e o espectador tanto à
transformação de suas convicções quanto à liberação de sua psique.
Jauss (1979), ao conseguir compilar essas informações, nos mostra o quanto o processo
de leitura é dinâmico e não depende apenas de um papel. A poiesis, a aisthesis e a katharisis
funcionam como um tripé, mas não necessariamente uma dependendo da outra, pois, em face
de sua própria obra, o criador pode assumir o papel de observador ou de leitor, e a experiência,
por sua vez, será outra.
Roland Barthes questiona: “quem suporta sem nenhuma vergonha a contradição? Ora
este contra-herói existe: é o leitor de texto; no momento em que se entrega a seu prazer” (2008,
p. 08). Nessa perspectiva, o sujeito chega à fruição pela coabitação das linguagens que
trabalham lado a lado, e o prazer da leitura vem de certas rupturas (colisões): códigos antipáticos
que entram em contato. Assim, é notável como Barthes se utiliza de neologismos, de rupturas,
pois, para ele, é isso que causa um efeito de fruição e prazer em quem lê.
27
Barthes afirma ainda que o fato de o escritor escrever com prazer não quer dizer que irá
causar prazer no leitor, pois isso irá depender do espaço, da possibilidade de dialética de um
desejo. O prazer está calcado na escritura, pois essa é a ciência da fruição da linguagem, assim
o texto de prazer – aquele que contenta – enche, dá euforia, vem da cultura, não rompe com ela,
está ligado a uma prática confortável da leitura (BARTHES, 1988, p. 21). Não existe, por trás
do texto, ninguém ativo (o escritor) e, diante dele, ninguém passivo (o leitor), não há, portanto,
um sujeito e um objeto. Segundo Eagleton:
O leitor sempre foi o menos privilegiado – estranhamente, já que sem ele não haveria
textos literários. Estes textos não existem nas prateleiras das estantes: são processos
de significação que só se materializam na prática da leitura. Para que a literatura
aconteça, o leitor é tão vital quanto o autor (2006, p. 113).
Para Barthes, a experiência é individual. Essa fruição dependerá tão somente do sujeito
leitor. É nesse jogo de descontração que ele afirma que
o texto é atópico, se não no seu consumo, pelo menos em sua produção. Não é um
falar, uma ficção, nele o sistema está desbordado, desfeito (esse desbordamento, essa
defecção, é a significância.). Desta atopia ele toma e comunica a seu leitor um estado
bizarro: ao mesmo tempo excluído e pacífico (BARTHES, 2008, p. 38).
Para o estudioso, embora o leitor seja “excluído” do processo de escrita, não se pode
excluí-lo do processo de sentido, na medida em que é ele quem dá vida e faz com que o texto
circule. Como aponta Rezende, “o desejo de ler ou reler é um desejo de conhecimento que nasce
de uma vontade de compartilhar com os outros leitores, e a palavra desempenha um papel
essencial” (2013, p. 72). Considerando essas afirmações, podemos entender que o leitor tem o
poder de classificar o texto conforme sua leitura. Em suma, verificamos o quanto o leitor é parte
essencial no processo de leitura, pois é nele que a experiência estética acontece, contribuindo,
principalmente, para a revitalização do texto literário e, sem dúvidas, para a sua disseminação.
Segundo Compagnon (2009), Fish recusava a ideia do texto como um objeto autônomo,
formal, denunciando a ilusão da objetividade e de sua autonomia. Para ele, desaparece a
dicotomia texto/leitor, que são reduzidos e englobados no conceito de comunidades
interpretativas, conceito esse que designava os sistemas e as instituições de autoridade. Dessa
28
forma, quando dois leitores produzem o mesmo tipo de leitura ou têm a mesma interpretação
de um texto, em sua grande maioria, eles pertencem à mesma comunidade interpretativa.
Ainda que manifestem posições divergentes sobre a forma como o leitor interage com
o texto, Jauss e Iser e outros teóricos, como Eagleton, Proust e Fish, não ignoraram o poder
revitalizador que aquele que lê tem para com a obra. Sem a Estética da Recepção, a análise
literária permaneceria na “velha” dicotomia autor/obra. E assim compreendemos que o ato de
ler nos permite observar, refletir, transformar o espaço em que vivemos; permite-nos ser
constantes aprendizes de cultura, além de nos permitir entender que toda a literatura resulta de
uma experiência cultural, social, política, ideológica, existencial; ademais, permite-nos
valorizar as conexões entre história e cultura e vivenciar a relação dialógica entre texto e leitor,
e essa relação é essencial, uma vez que estimula o leitor em sua totalidade (sentimentos,
sensações, intelecto, imaginário, etc.) (BELLE, 2007).
29
Aqui, entramos no conceito de subjetividade, uma vez que ela está intrinsecamente
ligada à escolha e/ou ao critério. O conceito de subjetividade a que chegamos, a partir de leituras
e discussões, é o de que todo leitor carrega sentimentos consigo e, a partir desses sentimentos,
bem como de suas perspectivas, os textos são lidos/sentidos. Jouve (2013, p. 54) também
esclarece que “o modo pelo qual um leitor imagina cenário e personagens a partir de indicações,
em geral um tanto vagas do texto, remete a situações e acontecimentos que vivenciou e cuja
lembrança retorna espontaneamente durante a leitura”.
Como bem aponta Anatole France (1888), em “Sobre a subjetividade radical da crítica”,
ao criticarmos uma obra, ao fazermos o papel do crítico, estamos falando de nós mesmos. A
leitura empreendida por cada leitor reflete quase sempre o seu estado de vida. Não há como
negar nossa própria história quando estamos analisando o texto literário. De certa forma, somos
levados a conduzir as leituras a partir das nossas impressões. O mundo da literatura possibilita
uma imersão tão intensa que o leitor acaba por esquecer o mundo à sua volta. Tratar de
subjetividade é, portanto, trazer para o cerne das discussões as palavras: gosto, sentimentos,
opiniões. Nesse sentido, France mostra que “Os leitores procuram nos livros todos os tipos de
belos segredos sobre os homens e as coisas. Procuram sempre, e seu espírito nunca fica em
repouso. Se os livros trazem paz aos pacíficos, perturbam as almas dos inquietos” (1888, p.
581).
leitura, a autora explica o que é o gênero autobiografia literária, bem como o conceito de
identidade literária (ROUXEL, 2004).
Para ela, a noção de identidade literária está voltada para o leitor que associa a si mesmo
aos textos que mais o marcaram e o representam. A autobiografia de leitor é um gênero de texto
que mistura o gênero autobiografia ao conceito de identidade literária.
Uma das características dessa identidade literária está relacionada à reflexão que o leitor
faz sobre seu papel de leitor, mencionando os textos literários que lhe foram mais importantes
e detalhando como a leitura mudou sua percepção de mundo. Nesse contexto, a subjetividade é
um fator muito importante para entendermos como os leitores apreendem o texto literário e
como suas vivências afetam a sua recepção. Assim, Bertrand Gervais, em “Três personagens
em busca de leitores: uma fábula” (2013), defende que:
Esse isolamento nos permite chegar à conclusão de que o leitor efetua sua leitura a
partir de suas perspectivas. Podemos relacionar esse pressuposto à própria interpretação dos
textos literários. Quando lemos um poema de Drummond, por exemplo, podemos apreender a
perspectiva amorosa ou a crítica social que o eu-lírico transmite por meio do texto. Isso
dependerá muito do leitor, de suas projeções e de seu repertório de leitura.
Todo leitor projeta em sua leitura suas experiências individuais, sendo assim, não lê o
texto de forma estanque, mas o associa ao seu repertório de leitura. Nesse sentido,
Enfim, Iser insiste naquilo que ele chama de repertório, isto é, o conjunto de normas
sociais, históricas, culturais trazidas pelo leitor como bagagem necessária à leitura.
Mas também o texto apela para um repertório, põe em jogo um conjunto de normas.
Para que a leitura se realize, um mínimo de interseção entre o repertório do leitor real
e o repertório do texto, isto é, o leitor implícito, é indispensável. As convenções que
constituem o repertório são reorganizadas pelo texto, que desfamiliariza e reforma os
pressupostos do leitor sobre a realidade (COMPAGNON, 2006, p. 152‐ 153).
31
É exatamente nesse ponto que a subjetividade é importante, uma vez que acaba
considerando o leitor como uma peça-chave. A multiplicidade de interpretações é excluída ao
tentarmos considerar ou valorizar apenas uma perspectiva, haja vista que ficamos sujeitos a
providenciar um espaço pequeno para a construção de identidades e o respeito às diferenças.
Por isso, a ideia de leitor forçado – o aluno que, na escola, é obrigado a ler um texto do
qual não gosta e passa muito tempo falando sobre ele – muitas vezes, infelizmente, contribui
para que os adolescentes tomem toda literatura como ruim. Isso não quer dizer que apenas as
leituras agradáveis devem ser solicitadas, mas há uma maneira muito mais eficaz de se chegar
a um possível leitor: através da própria leitura. Aqui, voltamos a questão da afetação literária,
uma vez que só conseguimos afetar o outra à medida que, de fato, lemos. Entendemos que
subjetividade é uma concepção nova para as abordagens literárias, mas que está intrinsecamente
relacionada ao leitor, faz parte da conjectura do processo de leitura. Porém, isso não significa
que seu ponto de vista e sua visão crítica de um texto estejam excluídos.
Rouxel, ao citar Michèle Petit, afirma que “a leitura é uma arte que se transmite mais do
que se ensina” (2013, p. 72). Assim, é necessário fazer sentir, motivar a partir de sensações
internas, sem descartar os conteúdos formais. Rouxel tem como foco central valorizar
32
Aqui, o que se coloca é que a literatura, em sua grande maioria, não apresenta uma
função, seja de melhorar o processo de leitura, de escrita, ou até mesmo tornar alguém melhor
por ser um sujeito leitor, como querem muitos escritores que se voltam para uma “tal”
humanização por meio do texto. Os textos literários apresentam mundos, e os leitores são os
navegadores. Sem essa abertura, sem essa legitimidade do texto literário, não pode haver
construção de sentidos. Assim, consideramos que os leitores cujas dissertações serão analisadas
se aproximam de um público especial, o dos leitores conceituais, isso porque:
Embora acreditemos nessas características, que, de alguma forma, fazem com que o
leitor literário pertencente à academia seja diferenciado ou tenha uma leitura mais especial,
principalmente aqueles que têm como objeto de pesquisa textos literários, não podemos nos
esquecer de ressaltar a importância da subjetividade, uma vez que ela está aí atrelada e talvez
de forma mais intensa do que em qualquer outro leitor comum.
Mesmo considerando que esse leitor precisa responder aos anseios academicistas, não
há como negar a presença de preferências em suas leituras, seja com relação a um escritor, seja
com relação a um conteúdo específico, ou até mesmo a um estilo. As dissertações, nesse
sentido, revelam características desses leitores.
33
Maria Helena Martins, em O que é leitura (2006), abre um capítulo para falar sobre os
processos de leitura e colocar no cerne das discussões o funcionamento do ato de ler. Para ela,
há três níveis básicos de leitura: nível sensorial, emocional e racional. A leitura sensorial é dada
através dos sentidos: primeiro o leitor se atrai por formato, cor, cheiro do livro; faz também
ligações da sua vida real com as características do exemplar. É, pois, um resgatador de
memórias. Logo, o nível emocional, por sua vez, está para os sentimentos, na medida em que o
texto é tido mais como um acontecimento do que como um objeto.
O texto é julgado pelo momento em que se encontra o leitor. A autora traz um exemplo
bastante pertinente: um texto pode suscitar gargalhadas ou revoltas no leitor. Tudo depende das
circunstâncias em que ocorre esse processo de leitura. E, por fim, o nível racional, no qual o
texto é lido de forma mais intelectual, buscando sempre respostas dentro dele. Apesar de se
importar pelo que o leitor sente, está mais interessado na relação que há entre o texto e seu
conteúdo.
Em suma, a autora nos mostra que a leitura sensorial nos acompanha por toda a vida e
que, embora esteja relacionada ao emocional, está mais envolvida com sentimentos do que com
qualquer outro aspecto. Além disso, a leitura racional entra em pontos específicos, pois, ao
resgatarmos certos conteúdos, fazemos também ligações intrínsecas ao próprio leitor.
Nesse sentido, Martins afirma que “A leitura sensorial vai, portanto, dando a conhecer
ao leitor o que ele gosta ou não, mesmo inconscientemente, sem a necessidade de
racionalização” (2006, p. 42). As experiências dos leitores ajudam, portanto, a compreender
porque um dado texto lhes fala mais que outro. Ainda para a autora,
Sob o ponto de vista da cultura letrada, e a leitura sensorial parece menor, superficial
pela sua própria natureza, a leitura emocional também tem seu teor de inferioridade: ela
lida com os sentimentos, o que necessariamente implicaria falta de objetividade,
subjetivismo. No terreno das emoções as coisas ficam ininteligíveis, escapam ao
controle do leitor, que se vê envolvido por verdadeiras armadilhas trançadas no seu
inconsciente. Não obstante, essa é a leitura mais comum de quem diz gostar de ler,
talvez a que dê maior prazer. E, mais uma contradição, é pouco revelada e muito menos
valorizada (MARTINS, 2006, p. 49).
É preciso de fato examinar o papel da escola nessa tensão entre os direitos do texto e
os direitos do leitor, o que leva a perguntar sobre o lugar, o estatuto e as formas que
podem ter as experiências de leituras subjetivas das obras, do maternal à universidade,
ao lado da necessária transmissão de conhecimentos sobre a literatura, sua história,
seus códigos, seus rituais... Como conciliar, e articular, esses dois aspectos
aparentemente antagônicos de uma mesma ambição didática: a liberdade necessária,
mas por natureza dificilmente controlável, do leitor empírico, que é mais um leitor
aprendiz, e o respeito forçado, mas também necessário, dos códigos hermenêuticos
fixados pelas obras singulares da literatura no seu conjunto enquanto monumento da
linguagem? As normas escolares coincidem necessariamente com os direitos do texto
ou são de outra ordem? Como preservar e construir a liberdade na própria consciência
dos limites dessa liberdade?
A separação entre o leitor subjetivo e o leitor experto não são tão estanques quanto
poderíamos supor, como já mostrou a proximidade entre Madeleine de Proust e as
omeletes da “série Noire”. Pierre Bayard observa de modo muito acertado, seguindo
Freud, que “todas as razões mais ou menos objetivas que nós poderíamos ser levados
a fazer valer para justificar nossa apreciação – como a qualidade estética de tal traço
formal – têm sobretudo uma função de mecanismo de defesa, com o objetivo de
dissimular que somos sensíveis, em uma obra, primeiramente àquilo que nela nos diz
respeito.
O texto literário tem uma especificidade singular que é sentida, uma vez que abrange
um nível mais amplo do que os textos racionais, embora não se possa excluir a racionalidade
dos textos literários. Jouve (2012) traz uma ressalva bastante pertinente a respeito do ensino de
literatura, porque, para ele, o ensino dessa disciplina precisa ser urgentemente (re)avaliado, pois
não há condições de tratá-la enquanto um objeto mensurável e objetivo. Não há possibilidade
de igualar seu ensino ao das demais disciplinas. A literatura, por exprimir questões diversas,
não pode ser tratada de forma superficial, como hoje a escola a trata.
Assim, em todos os textos lidos, verificamos que o mestrando traz uma carga muito
grande de subjetividade, pois quase sempre faz ligações mais concretas da realidade. O mundo
da literatura ganha vida a partir das comparações com o mundo concreto, fator esse que é
bastante recorrente nos textos.
Nesse sentido, o leitor é o ser capaz de dar sentido à leitura, não é um mero coletor de
dados que irá revitalizar o texto através dos espaços em branco que o autor define. Assim sendo,
é claro como a Estética da Recepção formulou as ideias da crítica, ao pôr em evidência o leitor
como parte integrante, privilegiando a relação autor-obra-público (ISER, 1979). Aqui,
percebemos como o mundo imaginário é capaz de instigar a percepção do leitor. É exatamente
por meio de seu imaginário e da afetação que ele tem o poder de revitalizar a obra e trazer para
a leitura suas vivências diversas. Compagnon, valendo-se da teoria de Iser, a qual põe em
evidência o valor do leitor, mostra que:
Para descrever o leitor, Iser recorre não à metáfora do caçador ou do detetive, mas à
do viajante. A leitura, como expectativa e modificação da expectativa, pelos encontros
imprevistos ao longo do caminho, parece-se com uma viagem através do texto. O
leitor, diz Iser, tem um ponto de vista móvel, errante, sobre o texto. O texto nunca está
todo simultaneamente presente diante de nossa atenção: como um viajante num carro,
o leitor, a cada instante, só percebe um de seus aspectos, mas relaciona tudo o que viu,
graças à sua memória, e estabelece um esquema de coerência cuja natureza e
confiabilidade dependem de seu grau de atenção (COMPAGNON, 2010, p. 152).
A experiência da leitura, tal como exposta por Compagnon, nos faz compreender o que
de fato está por trás da subjetividade, que em muitos momentos é subjugada. Um leitor leva
suas experiências para a leitura e traz várias outras para outros leitores. Nas dissertações, por
exemplo, encontramos leituras que talvez não imaginássemos. É nesse ponto que também
observamos o compartilhar de leituras e a disseminação do texto literário. Quando um leitor
traz a justificativa do seu texto, ele consegue tocar a comunidade acadêmica, de modo que
aquele texto, autor ou teoria analisado ganhe atração, e é exatamente aqui que acontece a
disseminação do texto literário. Alguns mestrandos, inclusive, se utilizam da justificativa de
que certo autor é pouco conhecido e/ou desvalorizado.
36
Portanto, disseminar a leitura é fazer com que o leitor tenha gosto por aquilo que lê. Ao
adentrar os textos dos mestrandos em Letras, verificamos que há uma leveza com o tratamento
dado ao texto literário, pois a leitura das dissertações é bastante fluida, e a linguagem em muitos
momentos é poética, carregada de figuras de linguagem, fazendo com que o próprio texto
científico seja carregado de traços do texto literário, como vemos no exemplo a seguir:
Dedico este trabalho a minha tia-avó, Clarice Rodrigues Guimarães (in memoriam),
taróloga, florista e amante fiel das Letras e da Filosofia. Sem as suas cartas,
curiosamente observadas ainda em minha infância, não teria guardado as imagens que
motivariam esta investigação. Aquelas mesmas intocáveis cartas de quase um século
me auxiliariam no estudo dos arquétipos. Seus livros sobre Cabala não foram lidos, o
tempo e a ignorância os tornaram inelegíveis, mas seus conteúdos se reinventariam
em outros textos. Lembrei-me muito dela na segunda parte desta pesquisa. Não deixou
filhos, apenas algumas poesias, uns livros carcomidos pelo tempo e uma caixinha
pintada à mão contendo seus preciosos “trunfos do tarô”, um punhado de tesouros que
costumam ser ignorados por não possuírem o toque frio do metal e a reluzência do
ouro. O destino me conduziu solitária aos últimos cinco, ou dez, minutos de sua longa
jornada, aprendendo ali as palavras certas da despedida. É certo que toda vida pode
deixar sementes que um dia germinam, algumas das suas eclodiram, silenciosamente,
em ideias, vertendo-se, por fim, em grandiosos frutos. Foram esses frutos que nutriram
a minha insaciável curiosidade, o embrião faminto desta pesquisa (Leitor 10, 2016, p.
04).
Isso nos mostra que a leitura não se apresenta apenas como uma obrigação. Portanto, a
leitura faz com que um indivíduo mergulhe no texto e experimente as experiências vivenciadas
pelos personagens.
Assim, é necessário que exista uma tomada de consciência para o que chamamos de
subjetividade literária. A contribuição do leitor para a disseminação da leitura é de suma
importância, pois é a partir de sua experiência com o texto literário que ele pode suscitar o
desejo em outrem. Mesmo que aqui não nos atenhamos aos benefícios da leitura, não se pode
deixar de mencioná-los, visto que, como expõe Bloom (2001, p. 24), “lemos [...] porque, na
vida real, não temos condições de ‘conhecer’ tantas pessoas, com tanta intimidade; porque
precisamos nos conhecer melhor; porque necessitamos de conhecimento, não apenas de
terceiros e de nós mesmos, mas das coisas da vida”.
Candido (1988, p. 186) declara que “[...] a literatura corresponde a uma necessidade
universal que deve ser satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, pelo fato de dar forma
aos sentimentos e à visão do mundo que os organiza [...]”. Vemos, com isso, que a literatura se
apresenta para a sociedade por meio de seus leitores e, apesar do pouco espaço na sociedade,
37
ela contribui para que a humanidade de cada leitor seja trabalhada. No entanto, isso não quer
dizer que, ao ser leitor, a personalidade desse indivíduo é/será melhor. Barthes mostra que
Logo, por mais que o texto literário obedeça a um jogo, não podemos limitá-lo, pois o
prazer estético está em um patamar para além de definições. Sendo assim, não há um conteúdo
estabelecido, há infinitas interpretações, e o texto Por que estudar literatura? (2012), de Jouve,
é de suma importância para angariarmos conhecimento acerca do processo de subjetividade, na
medida em que as relações entre o leitor e o texto têm uma extensão bem maior do que
imaginamos.
Martins diz que “a resposta do leitor depende de inúmeros fatores presentes no ato de
ler. Estando predisposto a entregar-se passivamente ao texto, tende a se deixar envolver pela
ideologia ou ideologias nele expressas (explícitas ou não), daí sua vulnerabilidade” (2006, p.
60). O leitor carrega consigo várias experiências e, quando se debruça sobre o texto, não as
exclui, levando-as para o contexto da leitura e se utilizando delas para compor sua avaliação.
Um exemplo simples disso é que a leitura é encaminhada, em muitos momentos, a partir do
humor do leitor: caso esteja enraivecido, dificilmente irá conseguir apreender informações que
lhe façam bem.
Todo leitor carrega consigo uma história de leitura e de vida. Quando se debruça sobre
um livro, dificilmente estará diante de uma leitura tão racionalizada a ponto de descartar as
emoções, pois, a partir do momento em que se introduz em um mundo literário, é convidado a
demonstrar sua afetação.
38
Maria Thereza Fraga Rocco pontua que “o professor que não lê nunca terá a memória
povoada pelas ricas e inesquecíveis imagens fornecidas pelas diferentes formas dos textos de
arte, principalmente pelos textos literários” (1999, p. 113). Essas influências são extremamente
importantes para a disseminação e revitalização da literatura.
Barthes (2008) faz a distinção entre o texto de prazer e o texto de fruição, considerando
o primeiro como aquele que contenta, dá euforia, vem da cultura, não rompe com ela e está
ligado a uma prática confortável da leitura; já o segundo, por seu turno, é considerado como
aquele que desconforta, faz vacilar as bases históricas, culturais, psicológicas do leitor, assim
como a consistência de seus valores e suas lembranças, e faz entrar em crise sua relação com a
linguagem. Ou seja, o texto de prazer é aquele que segue uma tradição e considera o horizonte
de expectativas que um leitor possui, ao contrário do texto de fruição, o qual rompe com esse
horizonte, isto é, ignora o conjunto de experiências tanto literárias quanto sociais que o leitor
traz consigo.
Assim, “acrescentaremos, enfim, que encarar a leitura como lugar de uma elaboração
identitária, e, portanto, como uma interação, parece-nos particularmente útil em se tratando de
didáticas de leitura literária” (MAZAURIC, 2013, p. 92). Essa perspectiva é bastante relevante,
39
pois a prática desse exercício faz com que os mestrandos leitores percebam seu trabalho de
análise literária um pouco mais “materializado”, podendo haver um compartilhamento desses
dados, sem desconsiderar a afetação do leitor. O que ele sente, do que se lembra, como ele sente
e outras questões mais introspectivas são, em sua grande maioria, descartadas. Isso também está
atrelado ao ambiente em que essa leitura é realizada, como mostra Martins (2006, p. 66):
Jouve (2012) fala das emoções e de como elas podem influenciar ou não na leitura de
um texto literário. Para ele, nem todo texto de literatura emociona, pois isso dependerá de uma
questão cognitiva, uma vez que “a emoção é um índice que nos permite entender como a obra
significa” (Idem, p. 99). Sendo assim, há textos que são, em sua essência, emocionais, mas não
são classificados como literários. Essa questão dependerá muito mais do leitor do que de
qualquer outro aspecto. As formalidades acadêmicas podem excluir a essência de um trabalho
com textos literários, pois o mestrando, de certa forma, se sente preso a alguns padrões que
circundam a universidade. No entanto, é válido ressaltar que o leitor, por maior que seja o nível
de racionalidade de determinado texto, seja ele literário ou não aplica sobre ele sua
subjetividade.
40
2 INTERESSES E CRITÉRIOS
Não havia uma área voltada para a Literatura, o que só se deu a partir de novembro de
2011, por meio da Resolução nº 104, na qual o CONEPE aprovou a alteração do nome Núcleo
de Pós-Graduação em Letras para Programa de Pós-Graduação em Letras, bem como a inclusão
da área de concentração Estudos Literários. Notamos, com isso, que, em sua concepção
primeira, tínhamos uma matriz que não valorizava os conteúdos e as discussões literárias.
Somente após cinco anos de criação do núcleo, houve uma separação e independência,
contribuindo, assim, para a autonomia dos estudos literários.
Até abril de 2017, o programa contava com 187 dissertações defendidas. Há duas
grandes áreas de concentração: Estudos Literários, com as linhas de Literatura e Cultura,
Literatura e Recepção e os Estudos Linguísticos, com as linhas de Linguagem e Descrição,
leitura e escrita da Língua Portuguesa. Na área dos Estudos Literários, propriamente ditos,
temos 50 dissertações defendidas, são dados bastante discrepantes se formos comparar as duas
áreas de concentração, mas vemos que o déficit do número de dissertações defendidas dentro
da área de concentração dos Estudos Literários, vem desde o início do programa.
Atualmente, o corpo docente é formado por um total de 24 professores, sendo que uma
professora é lotada na condição de visitante. Dos 24 professores, 14 estão engajados na área
dos estudos linguísticos e 9 nos estudos literários.
O ponto que nos chamou bastante atenção, incialmente, está calcado na valorização da
literatura sergipana. Os textos traduzem o gosto peculiar dos mestrandos em demonstrar seus
interesses por textos e/ou autores que, até então, estavam no anonimato sobretudo na própria
região de origem. A seguir, temos um trecho de dissertação que teve como objeto de pesquisa
um autor sergipano:
O trecho acima destaca algumas obras de Alina Paim, autora sergipana, nascida na cidade
de Estância, romancista, com ênfase na área da literatura infantil e juvenil e professora. Ela tem
sido foco de análise de alguns mestrandos. Na Universidade Federal de Sergipe, há um grupo
de pesquisa que se dedica à autora e toda sua obra, o Gelic (Grupo de Estudos de Literatura e
Cultura), coordenado pela professora Ana Leal Cardoso e pelo professor Carlos Magno Santos
Gomes. Segundo Luciana Novais Maciel, em “As personagens femininas de Alina Paim: do lar
à militância” (2012), o Grupo desenvolve pesquisas a respeito do Imaginário sociocultural na
literatura, tendo como objetivo primeiro o resgate de obras sergipanas. Há um interesse, no
sentido dos estudos culturais, de se fazer uma investigação detalhada sobre as preocupações
representadas nos romances de Alina Paim.
um legado que não é valorizado. No entanto, nos questionamos a respeito dessa postura, pois
verificamos que há uma exclusão de pesquisas dentro do grupo, o que é visualizado em face
das diversas dissertações produzidas no PPGL, pois há um grande número de estudos
relacionados apenas à escritora Alina Paim. Logo, embora o grupo de pesquisa esteja voltado
para os estudos em literatura e cultura, em sua grande maioria, se reduz ao estudo de apenas
uma autora. Nesse sentido, consideramos que os gostos são definidos, também, a partir das
relações que o indivíduo leitor mantém ao longo de sua trajetória de leitura.
Notamos também que o leitor 28 enfatiza dois critérios que o motivaram a escolher a
obra da autora citada. Aqui, temos duas questões. A primeira se relaciona à vivência do leitor
no meio acadêmico, pois ele é engajado num grupo de pesquisa, e a segunda está relacionada
ao gosto pessoal do leitor. De uma maneira ou de outra, há sempre uma tendência do leitor em
optar por textos e autores nos quais as questões que lhe interessam possam ser exploradas. A
partir disso, começam a tecer seu texto sob a perspectiva de suas experiências, como ilustramos
a seguir:
Os mestrandos vinculados a esse grupo deixam claro que suas escolhas estão
intimamente relacionadas ao estado de origem da escritora. Porém, é válido ressaltar que a
autora citada não é a única escritora sergipana.
Embora assumir as emoções no trato com o texto literário seja um caminho um tanto
desafiador, percebemos que há justificativas claras. Não é apenas um corpus a ser analisado,
há, também, uma representação importante para o mestrando, porém sabemos que há uma
limitação que costuma separar o objeto pesquisado de seu pesquisador. Essa limitação deve
ocorrer para que as pesquisas não sejam apenas relatos de casos vividos por seus pesquisadores.
Outro exemplo é o que trazemos na sequência:
Os fatores que nos levaram a selecionar tal objeto de pesquisa, por sua vez, estão
relacionados ao desejo de não só rever o lugar de Tobias Barreto, que se projeta para
além do campo literário, mas também de ampliar as possibilidades de recepção de sua
obra, já que essa foi classificada como uma obra “menor”, sem muitas vezes
44
Ao avançarmos no texto do Leitor 10, percebemos que sua motivação se mantém, como
notamos em inserções do tipo “[...] esse escritor foi um homem atuante e preocupado com a
modernização do Brasil. No gênero ensaístico, Tobias Barreto mostra-se um intelectual
preocupado com a educação das mulheres e com o questionamento dos rumos da política
brasileira” (2016, p. 33) são facilmente encontradas. Nesse sentido, embora não tenha
acontecido nas demais dissertações, achamos por bem ler essa por completo para podermos ter
uma posição mais concreta. Assim, verificamos que a ideia inicial do leitor foi sustentada em
toda a sua escrita. O que se comprova aqui é a fidelidade aos objetivos apresentados no início
da dissertação. É interessante destacar tal feito, porque, apesar de o texto ter um caráter
acadêmico, que de certa forma limita a leitura do autor, não desconsidera o subjetivismo, uma
vez que o mestrando deixa explícitos os seus critérios.
Percebemos que o Leitor 45 abre um debate amplo que vem sendo construído pela
sociedade como um todo. Além de analisar o texto da literatura local, deixa claro o seu interesse
também em estudar textos que dialogam com a sociedade atual. O mestrando em Letras da UFS
carrega a característica de ser esse leitor que traz discussões de cunho político-social a partir
das obras literárias. O autor do texto literário estudado pelo Leitor 45, Antônio Carlos Viana,
nasceu em Aracaju, Sergipe, foi Mestre em teoria literária pela PUC-RS e Doutor em literatura
comparada pela Universidade de Nice, França, tendo lecionado na Universidade Federal de
Sergipe.
A esse respeito, temos, abaixo, mais um trecho retirado de dissertação, cuja pesquisa
versou sobre a obra de Francisco Dantas:
Obstante a uma evidente motivação pessoal, a escolha das obras Coivara da memória,
Cartilha do silêncio e Sob o peso das sombras – e não de outras da autoria de Dantas
– motivou este trabalho acadêmico porque a satisfação da linguagem e da narrativa
fragmentada colocam em cena narradores e personagens tomados pelo processo de
rememoração e envolvidos num círculo presente-passado, no qual as narrativas se
desenvolvem sem que, com isso, a palavra vulgarize (Leitor 50, 2010, p. 16).
Notamos, diante do exposto, que a Universidade Federal de Sergipe dá suporte para que
pesquisas que têm como foco os próprios autores sergipanos e suas obras sejam realizadas, com
a finalidade, talvez, de disseminar os textos locais e também a cultura local. Os incentivos por
parte da academia vêm através de pesquisas e disposição de espaços físicos. Além disso,
preserva-se a memória de autores sergipanos, que não estão mais entre nós, mas que deixaram
um legado importante para a literatura e que, apesar disso, não têm a valorização social que
merecem, muito embora outros ainda vivos sejam também estudados.
Outra constatação feita a partir da análise dos textos é a de que eles são escolhidos por
influência das temáticas socioculturais. Os debates levantados nas dissertações servem-nos de
alerta, de reflexão e, sobretudo, de reconhecimento, uma vez que enfatizam a riqueza da
46
literatura, retirando o estigma de que o texto literário é apenas um gênero textual, do qual nada
se extrai:
A menção que se faz à literatura engajada nos induz a perceber que o mestrando lê o
texto literário relacionando-o ao campo da realidade. Com isso, não é um mero reprodutor de
texto, mas um leitor que consegue interpretar a literatura e conectá-la ao mundo contemporâneo.
Talvez a motivação dos mestrandos em analisar textos desse tipo esteja relacionada a
uma herança que os estudos culturais deixaram.
Esse texto nos esclarece como os Estudos Culturais se inserem dentro da literatura, como
um aspecto plausível para a discussão concernente à reflexão social propícia para uma proposta
de crítica cultural, reconhecendo, assim, a arte como prática social. Nesse sentido, o crítico
literário consegue se posicionar e analisar grupos ideologicamente excluídos, como se propõe
o Leitor 49:
Nesse sentido, essa dissertação apresenta e discute processos de leitura através dos
quais se observam relevantes indicativos sociais, enfatizando para tal a leitura literária
que, mediante uma construção de linguagem que lhe permite transpor os limites de
tempo e espaço, projeta-se para novas gerações, angariando assim novas leituras e
diferentes atribuições de significado. Neste trabalho, a associação entre arte,
sociedade e leitura se desenvolve mediante análise de um romance do realismo
português – primo Basílio, publicado em 1878 – pois tal obra se constitui embasada
em processos de leitura de mundo realizada pelo autor Eça de Queirós e que mais
tarde é materializada esteticamente sob a forma de romance, como também através da
composição de personagens masculinas e femininas que se permitem ser lidas através
da maneira como leem dentro da trama (2010, p. 01) Um ponto importante destacado
nesta dissertação diz respeito ao poder da leitura, especialmente a literária. Tanto ela
pode realçar discursos já cristalizados, como também pô-los em discussão,
estimulando a reflexão e o olhar crítico. A literatura dialoga com questões sócio-
culturais, pois tem a capacidade de simular universos humanos e interferir nos modos
de ser e pensar do indivíduo (Leitor 49, 2010, p. 104).
47
O mestrando demonstra que o texto foi escolhido para entender como a população era
reprimida e como a religião tratava aqueles que não se adequavam aos preceitos estabelecidos
pela igreja e, ainda, como isso afetava a visão de espiritualidade daquele povo. Assim, são
trazidas, por meio do texto, representações de violências sociais. A partir desse exemplo, temos
uma visão mais concreta da perspectiva individual do leitor a respeito do texto literário. É nesse
momento que ele não consegue separar vida real de ficção, uma vez que é tomado pela
subjetividade ao se deparar com a cena apresentada pelo texto literário, haja vista que faz
referências e traz memórias para a análise literária.
Através da sua escrita, verificamos que o mestrando deixa explícito em seu texto que a
nossa sociedade e a nossa vida são constituídas de violências, as quais vamos colecionando, e,
quando a literatura as apresenta, os sentimentos e as emoções afloram, como mostra Ana Maria
Machado, em Silenciosa algazarra, “na leitura de literatura se estabelece um pacto inconsciente
entre o texto e o leitor, em que este é levado a suspender sua descrença e a embarcar num mundo
de outro tipo, numa outra dimensão, que não é a sua realidade cotidiana [...]” (2011, p. 20). Por
mais que a subjetividade esteja clara, sabemos que há um limite também muito claro acerca do
que se é permitido analisar diante da academia.
Nesse sentido, as entrelinhas do texto nos dão muitas possibilidades, mas é necessário
compreender que existe essa limitação, principalmente porque estamos diante de um objeto de
48
pesquisa e não de um texto apenas para o deleite. Abaixo segue outro exemplo, cuja leitura está
calcada na particularidade do texto literário enquanto suporte de análise de uma sociedade:
Neste ponto, surge uma pergunta: qual a influência exercida pelo meio social sobre a
obra de arte? Digamos que ela deve ser imediatamente completada por outra: qual a
influência exercida pela obra de arte sobre o meio? Assim poderemos chegar mais
perto de uma interpretação dialética, superando o caráter mecanicista das que
geralmente predominam. Algumas das tendências mais vivas da estética moderna
estão empenhadas em estudar como a obra de arte plasma o meio, cria o seu público
e as suas vias de penetração, agindo em sentido inverso ao das influências externas
(2006, p. 28).
49
Diante disso, podemos considerar que as escolhas são justificadas quase que
sumariamente pela importância literária que os escritores têm e através de um debate de cunho
social que é envolvido pelo texto. Giorgio Agamben, em O que é o contemporâneo (2009), abre
uma discussão sobre o que vem a ser contemporâneo e sobre quem somos dentro dessa
contemporaneidade. Assim, vários conceitos são discutidos para se chegar à concepção desse
termo, que é definido como “aquele que mantém fixo o olhar no seu tempo, para nele perceber
não as luzes, mas o escuro” (Idem, p. 56). Complementando o significado, o estudioso diz que:
Verifica-se que, para esse autor, o tempo e o modo de nos relacionarmos com ele são
decisivos para saber/entender em que lugar estamos. A complexidade nessa forma de ver o
contemporâneo não está justamente no pertencimento, de forma empírica, na sociedade atual,
mas na forma de analisar o mundo, a partir de uma visão mais centrada no contexto. Não
pertencemos a lugar/tempo algum. Somos frutos da relatividade. Nesse contexto, os textos
analisados pelos mestrandos em sua grande maioria pertencem ao seu tempo, e isso mostra que
a literatura que dialoga com o momento em que estão vivendo é valorizada. O leitor carrega
suas experiências de mundo, suas perspectivas de vida e adentra o texto literário, contribuindo,
assim, para a disseminação do texto com um caráter mais social.
Talvez isso seja motivado pelo fato de vivermos em uma sociedade que, de certa forma,
nos dá possibilidades de discutir várias temáticas socioculturais. Um exemplo claro disso são
as redes sociais e outros veículos de comunicação, os quais abrem as portas para que outras
vozes sejam ouvidas/lidas e possam propagar seus pontos de vista, conforme expõe Iser: “O
texto é composto por um mundo que ainda há de ser identificado e que é esboçado de modo a
incitar o leitor a imaginá-lo e, por fim a interpretá-lo” (1979, p. 107). Sendo assim, ao nos
depararmos com textos, principalmente literários, pressupomos que há um mundo a ser
explorado.
50
Ao mencionar que o trabalho tem como objetivo fazer a ampliação de uma pesquisa que
se iniciou na graduação e permitir que ela se estenda, isso se coloca, no contexto, de suma
importância, pois verificamos que as escolhas do Leitor 22 continuaram sendo as mesmas,
embora passando por momentos diferentes de sua vida. Assim, percebemos que a subjetividade
presente em cada indivíduo é manifestada, em muitos momentos, por influências externas. Por
conseguinte, podemos pensar que a escolha do mestrando teve muito mais influência do
orientador do que uma escolha individual. Vejamos mais um exemplo:
Isto posto, é necessário destacar que nossa proposta de estudo é analisar a presença e
algumas representações do suicídio no conto contemporâneo, valendo-se, quando
possível, de determinadas concepções acerca da pós-modernidade, afinal nem tudo
que é contemporâneo é pós-moderno. Além desse objetivo geral, há pontos mais
específicos que tratam do suicídio como um elemento estético-crítico capaz de
dinamizar a relação estabelecida entre esse signo e o mundo por meio da literatura.
Nessa esteira de debate, estudamos o suicídio/suicida como um fenômeno social
relacionado à ritualização, à espetacularização e ao estranhamento do ato, bem como
ao destratamento do corpo e às aberturas para reflexão sobre o presente. (2015, p. 10).
A escolha do gênero se justifica pela quantidade e qualidade de escritores contistas no
período, significando também que há mais leitores para esse mercado, sem descartar,
dentro disso, o gosto pessoal (2015, p. 12). A pretensão de estudar as representações
do suicídio no conto contemporâneo brasileiro nasceu, de certa forma, de um
engajamento pessoal por conta da experiência no Programa de Iniciação Científica
(PIBIC), bem como da participação em grupo de pesquisa atuando na linha de estudos
sobre a memória cultural e o mal na literatura, sob orientação da professora Josalba
Fabiana dos Santos (Leitor 19, 2015, p. 15).
É válido ressaltar que todo leitor possui subjetividade em potencial, é, pois, uma
subjetividade. Porém, somente aqueles que se deixam levar pelo imaginário da leitura
conseguem ultrapassar as barreiras e sentir, literalmente, o texto. Além disso, o leitor tem
grande potencial de disseminação do texto literário. Alguns teóricos mostram que somente
poderemos compreender a obra se compreendermos as questões formais que estão contidas
nela. É através desse caminho que podemos destrinchar a semântica de um texto.
Além dos tópicos já destacados, ainda temos as dissertações em que seus autores as
analisam sob a influência da memória.
Quando escolhi o sertão por objeto de pesquisa tinha cristalizada em mim a ideia de
um sertão romântico, estático em seus estereótipos. O sertão que minha memória
registrava em paisagens congeladas era semelhante a instantâneos que os apaixonados
recolhem das gavetas no momento da saudade. Nas aulas da disciplina Memória,
História e Literatura e nas reflexões com o professor Antônio Sá percebi que o sertão
que eu tentava resgatar já não existia, que assim como sua filha que envelheceu e se
transformou, ele também se metamorfoseara em outro. É este sertão que busco retratar
aqui (Leitor 34, 2013, p. 11).
verificamos que, mesmo que tentemos excluir a subjetividade que é inerente ao leitor, ela
sempre se fará presente, uma vez que ele é um ser dinâmico, que está em constante mudança, e
as experiências contribuem de forma intensa para a construção da leitura de cada indivíduo,
principalmente quando estamos no campo da literatura.
Notamos também que o Leitor 34, embora esteja produzindo um texto acadêmico, se
sente à vontade para demonstrar suas experiências íntimas relacionadas à leitura. Esse aspecto
nos faz compreender que o Programa de Pós-Graduação em Letras da UFS não limita os campos
de pesquisa, para que o leitor seja o autor de sua própria leitura e não fique engajado em leituras
totalmente “acadêmicas”, com o objetivo de cumprir um preceito.
A seguir, temos um outro exemplo que, embora já tenha sido utilizado em outro
momento, é bastante elucidativo para o que se coloca aqui:
Dedico este trabalho a minha tia-avó, Clarice Rodrigues Guimarães (in memoriam),
taróloga, florista e amante fiel das Letras e da Filosofia. Sem as suas cartas,
curiosamente observadas ainda em minha infância, não teria guardado as imagens que
54
Não há como separar a nossa vida real das leituras que fazemos. O texto literário nos
faz adentrar nas variadas temáticas socioculturais existentes, que fazem parte da vida humana.
A seguir, temos exemplos que evidenciam o gosto pessoal do mestrando, mostrando que os
fatores externos à leitura são facilmente comparados quando o leitor se deixa tocar pelo texto,
evidenciando um leitor que consegue construir mapas mentais a partir do contexto de leitura,
ao escolher o seu objeto de pesquisa:
Nos exemplos, percebemos que os mestrandos deixam explícitos os sentimentos que são
aflorados a partir do texto que analisam, dialogando com determinada situação histórica, e essa
questão exerce forte influência em suas escolhas, haja vista que a visão de mundo deles está
atrelada às leituras que fizeram da obra. Ao fazer certas ligações com a vida pessoal, o leitor
demonstra que o texto corresponde, a certo modo, a sua perspectiva de vida. O envolvimento
entre o objeto de estudo deixa de ser apenas acadêmico e vai muito além de pesquisas. Em
seguida, vemos outro exemplo:
Portanto, este trabalho visa ao estudo do processo de leitura de um texto literário, para
isso segue uma posição contrária às pesquisas tradicionais, que procuram essa
resposta exclusivamente no texto. Contudo, não busco aqui responder a todos os
questionamentos sobre a interpretação, muito menos uma resposta definitiva sobre
esta problemática, pois a complexidade em analisar este tema envolveria um corpus
muito maior, e, mesmo assim, não asseguraria um resultado conclusivo,
principalmente devido à subjetividade envolvida. O objetivo, assim, é muito mais
compreender como ocorre este processo de leitura, sem a pretensão de definir um
modelo, como um primeiro passo, para tentar entender o que pode, por sua vez,
ocorrer com outros/as leitores/as (2016, p. 13). A escolha deste romance de Carvalho
também leva em consideração aspectos da minha individualidade, os quais pretendo
investigar a partir das bases teóricas que desenvolvo neste trabalho. Por isso, no
primeiro capítulo, faço um percurso sobre importantes pesquisas que envolvem a
leitura e o leitor e a abordagem autoetnográfica. Quero com isso fazer uma trajetória
teórica que justifique as análises que farei nos outros capítulos (Leitor 03, 2016, p.
12).
Seguindo a mesma linha de raciocínio, alguns teóricos mostram que somente poderemos
compreender a obra se compreendermos as questões formais que estão contidas nela. É através
desse caminho que podemos destrinchar a semântica de um texto. Abaixo, como poderemos
analisar, segue um exemplo de texto que apresenta os aspectos mais formais, para que se possa
fazer uma análise mais aprofundada. Isso se explica pelo fato de que, quando o leitor tem um
grande repertório de leitura, essa sensibilidade é aguçada, o que demonstramos no excerto do
Leitor 02:
A partir desse exemplo, percebemos que o discurso que envolve o mestrando está
relacionado à própria análise do poema em si e à sua representatividade. Apesar disso, a
linguagem utilizada para compor a sua dissertação é carregada de subjetivismos que atravessam
a análise do texto sob o viés estético. Nesse percurso, o mestrando adentra o texto literário e
conduz sua leitura de forma totalmente subjetiva.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim, como bem aponta Candido (1988, p. 176), “a função da literatura está ligada à
complexidade da sua natureza, que explica inclusive o papel contraditório mas humanizador
(talvez humanizador porque contraditório)”. Em meio a essas contradições, verificamos que a
subjetividade é inerente ao leitor e abre o caminho para diversos debates, e, sobretudo, lhe
atribui um valor especial. Não há possibilidade de excluir o que move um leitor a querer analisar
um texto literário.
Além disso, verificamos que os debates que são levantados a partir da escrita desses
mestrandos mostram que esses leitores conseguem fazer uma ligação da literatura, seja ela
contemporânea ou não, a temas que dialogam intrinsecamente com questões atuais. Além disso,
no Programa de Pós-Graduação em Letras, temos a abrangência das variadas abordagens e
críticas literárias. É válido, pois, ressaltar que levantamos, aqui, os pontos que mais se destacam
quando analisamos as dissertações defendidas.
58
Em face do exposto, o estudo das leituras feitas por mestrandos, partindo da análise de
suas respectivas dissertações, foi o ponto crucial sobre o qual esta dissertação se circunscreveu.
Atentar-se para a formação desse leitor é, evidentemente, de nosso interesse, haja vista que o
principal ponto observado é o que motiva a escrita desses mestrandos, como eles consideram o
texto literário e quais seus principais interesses. Nesse sentido, o texto visou também elaborar
um manual de critérios estabelecidos pelos estudantes de mestrado em Letras da UFS, mesmo
de forma inconsciente.
59
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TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Trad. Caio Meira. 3ª ed. Rio de Janeiro: DIFEL,
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Leitor 01
Leitor 02
Leitor 03
Portanto, este trabalho visa ao estudo do processo de leitura de um texto literário, para
isso segue uma posição contrária às pesquisas tradicionais, que procuram essa resposta
exclusivamente no texto. Contudo, não busco aqui responder a todos os questionamentos sobre
a interpretação, muito menos uma resposta definitiva sobre esta problemática, pois a
complexidade em analisar este tema envolveria um corpus muito maior, e, mesmo assim, não
asseguraria um resultado conclusivo, principalmente devido à subjetividade envolvida. O
objetivo, assim, é muito mais compreender como ocorre este processo de leitura, sem a
pretensão de definir um modelo, como um primeiro passo, para tentar entender o que pode, por
sua vez, ocorrer com outros/as leitores/as (2016, p. 13). Nove Noites foi escrito por Bernardo
Carvalho, um autor jovem, que publicou vários livros, entretanto sua crítica acadêmica ainda
não é tão vasta, até porque continua produzindo. Seus textos recebem críticas muitas vezes de
63
resenhas publicadas em jornais e revistas, que atestam o seu potencial e suas realizações como
escritor. O livro estudado aqui é o que possui mais trabalhos, até pela repercussão em ter
recebido alguns prêmios e ter sido considerado o melhor escrito até aquele momento. A escolha
deste romance de Carvalho também leva em consideração aspectos da minha individualidade,
os quais pretendo investigar a partir das bases teóricas que desenvolvo neste trabalho. Por isso,
no primeiro capítulo, faço um percurso sobre importantes pesquisas que envolvem a leitura e o
leitor e a abordagem autoetnográfica. Quero com isso fazer uma trajetória teórica que justifique
as análises que farei nos outros capítulos (2016, p. 12).
Leitor 04
A escolha das duas obras como corpus dessa dissertação se deu, de um lado, pelo fato
de Os Lusíadas já terem sido objeto de estudo no trabalho de conclusão de curso na graduação,
de outro, por existir o desejo de produzirmos uma pesquisa que associasse ambas as línguas da
formação em Letras Português-Inglês, analisadas no campo da literatura, sendo escolhida para
este propósito a epopeia inglesa Paraíso Perdido (2016, p. 10). O objetivo específico desta
dissertação foi a comparação entre as obras quanto à permanência da mitologia clássica no
plano literário das obras. Ambas apresentam influência do pensamento clássico, seja através da
manutenção de uma estrutura tradicional (invocação às Musas), menção de epopeias clássicas
ou recursos de poetas épicos clássicos, como Virgílio, e alusão a deuses greco-romanos. Em
outras palavras, são obras impregnadas pelo pensamento clássico, cuja presença no corpo dos
poemas varia em força, importância e penetração (2016, p. 94).
Leitor 05
Assim sendo, neste trabalho pretende-se fazer uma leitura comparativa entre duas obras
literárias, uma do século XVIII, O Uraguai, e outra do XX, Sepé – o morubixaba rebelde, e, a
partir dessa leitura, analisar e explorar o perfil do herói nesses dois poemas épicos, observando
como o épico moderno dialoga com o épico neoclássico, seja para reescrevê-lo, seja para
superá-lo. Isso evidencia o caráter mimético, no sentido de emulação, do texto literário. Isto é,
quando um escritor é motivado a imitar outro, seja para igualar-se ou superá-lo. No caso
estudado, Fernandes imita Gama, escrever seu poema épico baseado na história de Sepé Tiaraju,
a fim de superá-lo. Com sua tentativa ele acaba inserindo seu poema na tradição épica nacional.
Tendo em vista que esse trabalho parte de Sepé Tiaraju, a escolha desses dois poemas se
justifica por se tratarem de dois textos literários que se assemelham tanto pelo gênero, como
64
pela temática desenvolvida na obra, e por serem duas versões que ao mesmo tempo em que se
aproximam, pela temática e gênero, distanciam-se pela representação do herói. São duas obras
que estão relacionadas à ideologia ou à visão de mundo de seus criadores, além dos claros
vínculos com seus próprios tempos (2016, p. 11).
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Esta pesquisa surgiu a partir do desejo de ampliar o conhecimento sobre o homem de teatro
Artur Azevedo, cujas obras provocaram divergência de opiniões entre a crítica. Das diversas
peças escritas por Artur Azevedo, escolhemos trabalhar com O Dote (1906) e A Capital Federal
(1897). Escolhemos essas comédias porque são dois textos representativos de cada subgênero
cômico, assim o nosso estudo desenvolve-se não só com a finalidade de observar as funções e
os procedimentos cômicos, mas também os vários estágios da produção artística do autor. Em
contato com o nosso contexto o gênero dramático sofre transformações que irão refletir na obra
dramática. Tendo em vista tais transformações, teremos como um dos objetivos observar como
essas características se projetam na dramaturgia de Azevedo.
seu projeto principal era o de fincar o teatro nas raízes culturais brasileiras, corroborando com
a ideia já proposta por seus pares de que a arte teatral deveria ser usada na formação e educação
do homem. Azevedo encarnava o teatro nacional em sua dupla condição de autor e crítico. Ele
manteve conduta ambígua, uma vez que lucrava ao escrever o teatro ligeiro e ao mesmo tempo
se alinhava em consonância com seus pares, pois tinha sonhos de trabalhar com a comédia séria
sem se preocupar com o retorno financeiro. Daí que surge a campanha para a construção de um
teatro municipal que beneficiasse o teatro nacional. Observação que pode ser notada através do
estudo da peça O Mambembe, que trazemos como exemplo no segundo capítulo, e na qual ele
se dedica a falar do teatro no próprio teatro (2016, p. 09).
Leitor 08
O interesse pela obra surge durante as aulas da disciplina História, Literatura e Memória,
ministrada pela professora Jeane de Cássia Nascimento Santos, no curso do mestrado. As
considerações feitas à literatura africana despertaram o interesse de ler a obra do moçambicano
Mia Couto, consequentemente, o gosto por sua escrita. De modo que, durante esse tempo de
estudo, amadurecemos as impressões, investigamos as críticas em torno da obra,
desenvolvemos alguns artigos, participamos de alguns eventos, para assim desenvolver e
apresentar neste trabalho.
Leitor 09
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Dos trabalhos na área das letras de Cyro dos Anjos, o foco de estudo desta pesquisa será
concentrado nos três romances do autor: O amanuense Belmiro, Abdias e Montanha, os dois
primeiros narrados em primeira pessoa e o último em terceira. Tendo como foco de estudo
apenas as narrativas com feição diarística do escritor mineiro, descartaremos A menina do
sobrado, haja vista essa obra é voltada para as memórias de Cyro dos Anjos, narrando as fases
da vida do escritor, desde a infância até a mocidade (2016, p. 13). Em resumo, o objetivo central
da pesquisa é colocar em relevo o uso do diário nos três romances de Cyro dos Anjos, como
técnica utilizada para a manifestação lírica dos seus respectivos personagens. Em vista disso,
faremos um estudo das três obras separadamente, em capítulos e na ordem de publicação de
cada um. Dentro de cada capítulo haverá, a priori, uma sinopse de cada romance, com um
apanhado geral de contextualização e apresentação dos mesmos. Além disso, abordaremos a
tipologia e o foco narrativo de cada obra, fazendo a relação com o gênero diarístico,
esclarecendo também através de fragmentos das prosas como tal gênero é utilizado nos três
romances, assim como destacaremos seu papel em cada obra para o desnudamento dos
personagens através da manifestação do lirismo, nos pautando no conceito de diário de Lejeune
(2008) (2016, p.15).
Leitor 10
encontramos vários desafios. Um dos principais foi a escassez de estudos confiáveis referentes
a Tobias Barreto e à sua única obra poética. Além desse, também tivemos o desafio de
contemplar em nossa análise os elementos estéticos dos poemas patrióticos, enquanto os
relacionávamos às informações históricas sobre a Guerra do Paraguai. Portanto, almejamos
valorizar os elementos estéticos e os aspectos culturais simultaneamente, pois, assim, teremos
uma dimensão do valor estético-cultural dos poemas patrióticos de Tobias Barreto. Apesar de
ter atuado de forma engajada em vários momentos de sua vida, Tobias Barreto não teve tanta
visibilidade quanto os intelectuais que se situaram no Rio de Janeiro, o que não minimiza a sua
importância dentro do cenário nacional, uma vez que produziu obras diversas (2016, p. 11).
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Leitor 12
Dedico este trabalho a minha tia-avó, Clarice Rodrigues Guimarães (in memoriam),
taróloga, florista e amante fiel das Letras e da Filosofia. Sem as suas cartas, curiosamente
observadas ainda em minha infância, não teria guardado as imagens que motivariam esta
investigação. Aquelas mesmas intocáveis cartas de quase um século me auxiliariam no estudo
dos arquétipos. Seus livros sobre Cabala não foram lidos, o tempo e a ignorância os tornaram
inelegíveis, mas seus conteúdos se reinventariam em outros textos. Lembrei-me muito dela na
segunda parte desta pesquisa. Não deixou filhos, apenas algumas poesias, uns livros carcomidos
pelo tempo e uma caixinha pintada à mão contendo seus preciosos “trunfos do tarô”, um
punhado de tesouros que costumam ser ignorados por não possuírem o toque frio do metal e a
reluzência do ouro. O destino me conduziu solitária aos últimos cinco, ou dez, minutos de sua
longa jornada, aprendendo ali as palavras certas da despedida. É certo que toda vida pode deixar
sementes que um dia germinam, algumas das suas eclodiram, silenciosamente, em ideias,
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vertendo-se, por fim, em grandiosos frutos. Foram esses frutos que nutriram a minha insaciável
curiosidade, o embrião faminto desta pesquisa (2016, p. 04).
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Para fundamentar nossa hipótese de que a temática do duplo tal qual se efetiva na obra
em estudo provém da inserção do indivíduo numa sociedade capitalista, e nela se envolve em
práticas corruptas, utilizaremos o conceito de alienação do ponto de vista de Marx e Lacan,
estudado pelos autores Mészáros (1981) e Funk (1998), respectivamente (2016, p. 12).
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Caminhos inesperados nos permitem investir no desconhecido, caminhar em meio ao
escuro, abandonar o planejado e se aventurar no novo. Os clássicos infalíveis não me valeram
e pareceram tão exauridos que, em pouco ou nada, poderiam contribuir. Buscando uma obra
que estivesse inserida no contexto das lutas sociais, deparei-me com A hora próxima, e assim
foi o encontro com Alina Paim-escritora conterrânea, cuja obra eu desconhecia. O desafio
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muitas vezes parecia intransponível. Foi mergulhando na história de vida da escritora que pude
compreender seu compromisso com a arte e com as lutas sociais, articulando militância política
e literatura engajada, que fazem de suas obras oportunidades de se abrir o debate sobre o sistema
patriarcal que se sustenta na exploração e subordinação da mulher (2016, p. 09).
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Estudar o teatro de Machado de Assis é deparar-se com uma bibliografia enorme que vê
em suas peças cômicas frieza e artificialidade. Nós, no entanto, assim como alguns estudiosos
do teatro de Machado, vimos opção dramática. Machado de Assis elege a ironia e a paródia
como princípios de composição. Muito embora falar em ironia e paródia em sua obra pareça
lugar comum, poucos se ocuparam dos procedimentos cômicos utilizados por ele em suas peças.
Nesse sentido, enfocamos neste trabalho a análise da função e dos procedimentos cômicos em
duas peças de Machado de Assis: Hoje avental, amanhã luva (1860) e O caminho da porta
(1862). Analisar a comicidade em suas peças parece-nos um caminho bastante profícuo na
tentativa de reverter certas perspectivas instauradas na literatura brasileira sobre a obra teatral
machadiana, que a relegou a um lugar de menor destaque (2015, p. 08).
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Isto posto, é necessário destacar que nossa proposta de estudo é analisar a presença e
algumas representações do suicídio no conto contemporâneo, valendo-se, quando possível, de
determinadas concepções acerca da pós-modernidade, afinal nem tudo que é contemporâneo é
pós-moderno. Além desse objetivo geral, há pontos mais específicos que tratam do suicídio
como um elemento estético-crítico capaz de dinamizar a relação estabelecida entre esse signo
70
e o mundo por meio da literatura. Nessa esteira de debate, estudamos o suicídio/suicida como
um fenômeno social relacionado à ritualização, à espetacularização e ao estranhamento do ato,
bem como ao destratamento do corpo e às aberturas para reflexão sobre o presente (2015, p.
10). A escolha do gênero se justifica pela quantidade e qualidade de escritores contistas no
período, significando também que há mais leitores para esse mercado, sem descartar, dentro
disso, o gosto pessoal (2015, p. 12). A pretensão de estudar as representações do suicídio no
conto contemporâneo brasileiro nasceu, de certa forma, de um engajamento pessoal por conta
da experiência no Programa de Iniciação Científica (PIBIC), bem como da participação em
grupo de pesquisa atuando na linha de estudos sobre a memória cultural e o mal na literatura,
sob orientação da professora Josalba Fabiana dos Santos (2015, p. 15).
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Enfim, em linhas gerais, o objetivo da nossa pesquisa é uma leitura da Crônica da casa
assassinada que leve em consideração o fenômeno do duplo como uma porta de entrada para
as possíveis interpretações que a obra proporciona. Mais especificamente, pretendemos analisar
as relações que Nina desenvolve com os demais personagens da narrativa. Em que medida a
chegada de Nina à casa dos Meneses causa uma ruína já iminente? Que representações para a
sociedade as relações de Nina com os outros simbolizam? Assim perquiriremos como se
desenvolvem os duplos da narrativa cardosiana e o que eles figuram (2015, p. 17).
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Entretanto, por muito tempo, durante a leitura e releitura do material que tínhamos em
mãos, ficamos em sincera dúvida sobre o caminho a seguir. E se fosse possível cobrir as duas
faces, cômica e trágica, dentro do romance? Entretanto, cobrir tão ampla gama de possibilidades
poderia nos conduzir, arriscadamente, a uma análise apenas lateral do assunto, o que seria
lastimável, pois precisamos de um ponto de vista que faça jus ao talento do escritor mineiro,
nascido em Belo Horizonte a 12 de outubro de 1923, autor de alguns renomados sucessos
literários, como os romances O encontro marcado (1956) e O grande mentecapto (1979) e na
área do conto, O homem nu (1960). A solução técnica que encontramos não é a única e pesquisas
complementares se fazem necessárias, mas assim, pelo menos, está oferecida a oportunidade
de começar já pelas penúltimas palavras do romance: “Donde leese por la fuerza de las cosas,
lease: por la debilidade de los hombres” (SABINO, 1979, p. 232) (2015, p. 11).
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Sendo assim, esta pesquisa centra-se na trilogia de Lúcio Cardoso chamada de O mundo
sem Deus, que é composta por Inácio (1944), O enfeitiçado (1945) e Baltazar (inacabada). Tais
narrativas fazem parte de um espaço caracterizado pelo crime, violência, danação, transgressão,
loucura, vícios e desespero. Segundo Antônio Cândido, na melhor das hipóteses os personagens
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ficcionais nascem justamente desse paradoxo: o do não existir os que parecem existir. Eles não
existem de fato a não ser no papel, como já é sabido (2014, p. 12). Por falar que a literatura
comparada surge das relações possíveis entre duas literaturas de nacionalidades diferentes, ou
de uma mesma, é que se busca neste trabalho tais possibilidades de leituras, ou seja, relacionar
a trilogia de Lúcio Cardoso com o romance de Stoker a partir do rompimento de suas fronteiras
(2014, p. 28).
Leitor 25
Foi uma missão difícil estabelecer o corpus. O processo mais viável que encontrei foi
começar a ler as obras completas de Carlos Viana, pois ele era o que menos tinha livros
publicados. Ao término de seus cinco livros, fui à busca dos livros de Trevisan. Ao ler uma
imensidão de contos, surgiu a pergunta: como escolher? Então, o que Julio Cortázar havia
falado antes sobre o tema escolher o escritor também chegou até a mim. De tanto perceber as
relações de violências contidas no conto, fui induzida a escolhê-las. Desse modo, recortei de
cada escritor contos que abordavam a mesma temática para poder estudá-los em conjunto, pois
era impossível analisar as obras por completo. Não seria adequado falar da literatura sem
mostrá-la, seria o mesmo que descrever um objeto palpável sem apresentá-lo, pois “nenhuma
resenha teórica pode substituir a obra em si” (CORTÁZAR, 1993, p. 148). O capítulo referente
à leitura interpretativa do corpus poderá, de certo modo, ajudar a concretizar o objeto literário.
Sei que essa é a minha primeira prática de violência contra a literatura, já que descrever uma
obra é totalmente parcial, visto que somos condicionados a recortar a nossa visão. Para este
trabalho, escolhemos três contos de cada escritor para traçar uma linha de pensamento. Os
textos escolhidos são “Das Dores”, “Barba de Arame” e “Olhos de Fogo”, de Viana, e “O
grande deflorador”, “A culpada” e “Ezequiel”, de Dalton Trevisan. O nosso trabalho está
dividido em duas partes principais. A primeira se refere aos aparatos teóricos para entender o
gênero conto e suas relações, como também sobre a violência e suas relações com a sociedade;
e a segunda parte se refere ao capítulo de análise desses contos dialogando com os aspectos
teóricos a respeito da violência (2014, p. 39).
Leitor 26
oculares da violência e, quem sabe assim, haja alguma esperança de que esta não volte a se
repetir (2014, p. 101).
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Selecionamos como corpus para análise sua produção da década de 1970 e 1980 por se
constituírem as décadas de maior produção do poeta. Investigaremos as obras Caprichos e
relaxos (1983) e La vie em close (1994), ambas primordiais na representação do corte
epistemológico. Neste ponto de chegada, selecionaremos haikais em que há uma homenagem
aos seus ídolos do Oriente, e que trazem uma grande representação textual no mundo nipônico
além de trazer o tema do nada. [...] nossa tese é que a palavra poética de Leminski funda-se do
nada (2014, p. 13). O que buscamos nesta pesquisa foi abrir alguns destes encontros e de seguir
a trilha de Leminski que aprendeu com o Oriente novos caminhos para a poesia. Um Leminski
que aprendeu com Mishima a ser um experimentador da linguagem (2014, p. 93).
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Para Elomar Figueiredo Mello, a quem academicamente devo dizer ser parte do meu
objeto de estudo, mas deixando de lado a objetividade a que, enquanto pesquisadora, terá que
me portar adiante, fez-me adentrar neste mundo sertanejo com mais vigor e sentimento que
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jamais eu poderia supor quando trabalhei uma de suas canções, ainda na graduação. E, também,
por ter me recebido em um domingo cheio de prosa filosófica, religiosa e literária com um “me
arreceba” um enaltecer do amor para com o próximo e um café à janela da Casa dos Carneiros
(p. 07). A preferência pelo escritor para desenvolver nosso trabalho também está relacionada a
seu domínio da linguagem, como consequência da sua vertente conceptista, baseada na agudeza
do engenho e no aproveitamento da capacidade expressiva do idioma, ambos os aspectos
importantes na hora de trabalhar comicidade (2014, p. 10).
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Antes de adentrarmos na fortuna crítica, cabe uma breve apresentação do nosso contato
com a obra de Cornélio Penna. Embora já fosse do nosso conhecimento o conteúdo sumário do
romance, mediante conversas, palestras e comunicações da Professora Josalba Fabiana dos
Santos, a leitura efetiva ocorreu em 2009. A oportunidade surgiu com a participação em um
projeto de pesquisa de iniciação científica, também foi desenvolvido com o apoio do CNPq. O
objetivo foi estudar a questão do mal e A menina morta e na Crônica da casa assassinada, de
Lúcio Cardoso. De modo que, durante esse tempo de estudos, amadurecemos as impressões
sobre o romance de Cornélio e o gosto pela sua escrita. Investigando a crítica em torno da obra,
debatendo no grupo de pesquisa, produzindo artigos e participando de eventos, fomos nos
aprofundando e percebendo as diversas possibilidades de análises. Após esses anos de preparo,
dentre outras incursões, o passo adiante é o mestrado. Dentro das diversas possibilidades de
análise e leituras já empreendidas, percebemos que já havia margem para trabalharmos uma
ligação entre os possíveis traços barrocos do autor, juntamente com a questão dos labirintos e
o medo premente das personagens. E assim, o resultado será desenvolvido e apresentado neste
trabalho (2013, p. 18).
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Quando escolhi o sertão por objeto de pesquisa tinha cristalizada em mim a ideia de um
sertão romântico, estático em seus estereótipos. O sertão que minha memória registrava em
paisagens congeladas era semelhante a instantâneos que os apaixonados recolhem das gavetas
no momento da saudade. Nas aulas da disciplina Memória, História e Literatura e nas reflexões
com o professor Antônio Sá percebi que o sertão que eu tentava resgatar já não existia, que
assim como sua filha que envelheceu e se transformou, ele também se metamorfoseara em
outro. É este sertão que busco retratar aqui (2013, p. 11).
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Nosso interesse principal neste trabalho é analisar como a história de Caldeirão foi
transformada em ficção, ampliando os significados daquele evento e possibilitando ao leitor
apreendê-lo sob outra ótica. Pretendemos também pensar em como a memória foi uma
ferramenta primordial nas mãos do autor. Ponto influente na escolha do livro foi o fato deste
fazer parte das obras que releem o sertão e lhe dão uma nova face. O autor ter um trabalho
relevante no meio literário e, apesar disso, não ter a mesma visibilidade das obras de autores
consagrados no mercado editorial, também foi motivo de peso na decisão por Cláudio Aguiar.
Levamos em conta o movimento de colocar na vitrine autores menos conhecidos dando aos
leitores mais oportunidades e atualizando-os em relação aos escritores contemporâneos (2012,
p. 6).
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Nesse sentido, vale ressaltar que este trabalho propõe uma investigação das articulações
entre os aspectos culturais, exteriores ao texto, e literários, inerentes à forma da obra, por meio
do que Antonio Candido sugere como metodologia no livro O discurso e a cidade. Para o
crítico, “o alvo é analisar o comportamento ou o modo de ser que se manifestam dentro do
texto, porque foram criados nele a partir dos dados da realidade exterior” (CANDIDO, 1993,
p. 10). O caráter interdisciplinar deste trabalho se fundamenta na necessidade de abranger ao
máximo o campo de análise ao adotar uma perspectiva mais geral do problema de pesquisa. O
foco mostra as diversas nuances possíveis de análise da questão da teoria do monstro, revelando
o conflito e/ou as convergências de ideias, comum ao conhecimento científico contemporâneo.
Acrescenta-se ainda a esta abordagem a leitura da fortuna crítica da obra da autora, incluindo
estudos biográficos produzidos por leitores e americanos (2012, p. 06).
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Vale ressaltar que, ainda que aparentemente inovador, essa nova tradição interpretativa
surgiu da necessidade de abordar outros aspectos que não foram tratados detidamente pela
crítica tradicional, o que não implica dizer que as questões relativas ao mal, às monstruosidades
e aos crimes não tenham sido abordados pontualmente em trabalhos anteriores. Assim, não se
pretende destacar aqui, o caráter supostamente inovador no sentido de excepcionalidade do
tema, uma vez que o diferencial dessa perspectiva se impõe pela mudança no foco prioritário
da análise. Explicando de outro modo: não é a originalidade das questões, mas o ponto de vista
teórico adotado que elege essas mesmas questões, antes tocadas apenas ocasionalmente, como
prioritárias (2012, p. 28).
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Dada a amplitude que a noção de cotidiano assume na obra da nossa autora, decidimos
tomar como obra central para esta análise, mas não única, Casos para um vitral, publicada em
1980, sem, no entanto, desconsiderarmos alguns poemas que serão decisivos e que citamos ao
longo do texto (2012, p. 10).
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Vale ressaltar que o indispensável passeio pela Filosofia, Literatura e Religião não deve
ser tomado como sinônimo de generalidade ou superficialidade, mas de esforço por entender,
nos limites investigativos de uma dissertação, as bases do pensamento de um homem, que, além
de poeta, estudou profundamente Filosofia e Teologia (2011, p. 13).
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Escolhemos como objeto de estudo as obras de Antônio Carlos Viana porque suas
narrativas realizam um bom diálogo com o espaço social ao darem visibilidade a seres
marginalizados, e excluídos pela sociedade patriarcal e capitalista. Através da sua contística,
conceitos tradicionais podem ser revisados e a voz do outro e a de si mesmo podem ser ouvidas.
Suas histórias, normalmente, nos colocam em contato com temas inquietantes e desafiadores.
Nesta pesquisa, daremos visibilidade a corpos estranhos observados nas obras de Viana. É
importante destacarmos que a palavra estranho aparece nesse estudo em vários contextos e com
distintas finalidades, podendo ser vislumbrada como sinônimo de diferença, de transgressão, de
anormalidade ou mesmo de monstruosidade (2011, p. 10).
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[...] O objetivo desta pesquisa é compreender como o cangaço aparece expresso no estilo
literário elaborado por Francisco J. C. Dantas no sertão d’Os desvalidos a partir da concepção
humanista fomentada pelos estudos culturais. E, a partir do estudo destas representações,
entender as diferentes identidades culturais protagonizadas por alguns personagens desse
romance e como estes agiram diante dos códigos e assimetrias sociais existentes no cronotopo
em que se desenrola o enredo da obra em tela (2010, p. 15).
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Neste trabalho, que faz parte da linha dois do Mestrado em Letras da UFS: Língua,
Cultura, Identidade e Ensino, priorizaremos as questões identitárias referentes à personagem
feminina. Dentro desse debate, analisaremos as representações femininas a partir das
personagens de Nélida Piñon e de Francisco Dantas nas obras A doce canção de Caetana
(1987) e Cartilha do silêncio (1997), respectivamente. A pesquisa se propõe a investigar como
a personagem feminina subalterna é construída na literatura desses autores. Além disso,
investigaremos como as questões socioculturais perpassam as categorias da identidade, do
discurso e do espaço nos romances selecionados. Destacamos que o propósito de estudar autores
com perfis díspares é um modo de descontruir mitos a respeito da representação da mulher feita
por autores masculinos ou femininos (2010, p. 12).
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Nesse sentido, essa dissertação apresenta e discute processos de leitura através dos quais
se observam relevantes indicativos sociais, enfatizando para tal a leitura literária que, mediante
uma construção de linguagem que lhe permite transpor os limites de tempo e espaço, projeta-
se para novas gerações, angariando assim novas leituras e diferentes atribuições de significado.
Neste trabalho, a associação entre arte, sociedade e leitura se desenvolve mediante análise de
um romance do realismo português- O primo Basílio, publicado em 1878 – pois tal obra se
constitui embasada em processos de leitura de mundo realizada pelo autor Eça de Queirós e que
mais tarde é materializada esteticamente sob a forma de romance, como também através da
composição de personagens masculinas e femininas que se permitem ser lidas através da
maneira como leem dentro da trama. (2010, p. 01) Um ponto importante destacado nesta
dissertação diz respeito ao poder da leitura, especialmente a literária. Tanto ela pode realçar
discursos já cristalizados, como também pô-los em discussão, estimulando a reflexão e o olhar
crítico. A literatura dialoga com questões sócio-culturais, pois tem a capacidade de simular
universos humanos e interferir nos modos de ser e pensar do indivíduo (2010, p. 104).
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Obstante a uma evidente motivação pessoal, a escolha das obras Coivara da memória,
Cartilha do silêncio e Sob o peso das sombras - e não de outras da autoria de Dantas- motivou
este trabalho acadêmico porque a satisfação da linguagem e da narrativa fragmentada colocam
em cena narradores e personagens tomados pelo processo de rememoração e envolvidos num
círculo presente-passado, no qual as narrativas se desenvolvem sem que, com isso, a palavra
vulgarize (2010, p. 15). Ao analisar a memória, ou melhor, a rememoração em três dos
romances de Dantas, o objetivo deste trabalho é, portanto, compreender como, nos textos de
Dantas a própria memória é construída e representada, a partir de ruínas ou fragmentos, como
essa memória espelha e metaforiza a tradição (2010, p. 16).