O Mito Arturiano e Sua Cristianizacao No
O Mito Arturiano e Sua Cristianizacao No
O Mito Arturiano e Sua Cristianizacao No
Resumo: A imagem de Artur, um chefe guerreiro bretão (dux bellorum) que derrotou os
saxões antes que seu povo fosse finalmente conquistado pelos inimigos no século VI,
foi apropriada inicialmente pelos anglo-normandos que encomendaram a Geoffroy de
Monmouth a Historia Regum Britanniae (1135-1138), na qual os normandos, os novos
conquistadores da Grã-Bretanha, estão ligados a Artur. Na Historia, Artur se torna um
rei cristão que luta contra os pagãos que queriam invadir a Bretanha. A partir da Baixa
Idade Média, sua figura foi utilizada no Ocidente por diferentes grupos para fortalecer
a monarquia, os nobres e as ordens militares. No século XIII, por influência da Igreja
Católica, os escritores cristianizaram a busca pelo Graal, um dos elementos do mito
arturiano. O Graal, que está relacionado com o caldeirão céltico da abundância, foi
transformado no cálice que Cristo bebeu na Última Ceia e no qual estava contido o seu
sangue, que foi recolhido por José de Arimatéia. Somente o cavaleiro perfeito Galahad
(ou Galaaz), que não possuía pecados, poderia atingir o Santo Graal.
Palavras-chave: Rei Artur. Baixa Idade Média. Mito. Cristianização. Graal.
Abstract: The image of Arthur, a Britannic dux bellorum (military leader) who defeated
the Saxons before his people were finally conquered by those enemies in the 6th century
has been appropriated initially by the Anglo-Normans who ordered Geoffroy of
Monmouth to write the Historia Regum Britanniae (1135-1138) in which the Normans,
the new conquerors of the Great Britain, were connected to Arthur. In the Historia,
Arthur becomes a Christian king who fights against the pagans who wanted to invade
Britain. From the Low Middle Ages on, his figure has been utilized in the West by
different groups to fortify the monarch, the nobles and the chivalry orders. In the 13th
century, influenced by the Catholic Church, the writers Christianized the search of the
Grail, one of the elements of the Arthurian myth. The Grail, which is connected with the
Celtic cauldron of abundance, has been transformed in the cup in which Christ has
drunk in the Last Supper and in which was contained his sang from the Crucifixion,
collected by Joseph of Arimathea. Only the perfect knight, Galahad, who had no sins,
could reach the Holy Grail.
Keywords: King Arthur. Low Middle Ages. Myth. Christianization. Grail
*
Profa. de História Medieval da Universidade Estadual do Maranhão. Departamento de
História e Geografia. Doutora em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
- Ai donzela! Quem vos mandou aqui certamente mau conselho vos deu; e eu
cuidava que de outra natureza éreis vós. E rogo-vos por cortesia e por vossa
honra, que vos vades daqui, porque, com certeza, o vosso louco pensar não
entenderei eu, se Deus quiser, porque mais devo recear perigo de minha
alma do que fazer vossa vontade. (A DEMANDA..., 1988, p. 100, grifo nosso)
Dos três sem mancha, voltará um e dois outros ficarão; assim se entende que
dos três bons cavaleiros, um voltará à corte para o bom pasto que perderam
aqueles que estavam em pecado mortal. Os outros dois ficarão, porque acharão
tão grande prazer no manjar do Santo Graal, que não o deixarão de modo algum,
pois que o tiveram à vontade (A DEMANDA..., 1988, p. 134, grifo nosso).
Além destes três, durante a demanda, só mais nove poderão ver de novo
Ciências Humanas em Revista - São Luís, v. 3, n. 1, julho 2005 149
o Santo Vaso, uma analogia aos doze apóstolos de Cristo, na cidade de Sarras, no
Oriente. O fim da narrativa segue a linha da Historia Regum Britanniae; o rei,
ferido de morte por Morderete (ou Mordred), é levado para Avalon. Mais tarde
seu túmulo é encontrado, porém estava vazio. Os inimigos destroem o reino de
Logres (a Inglaterra) e os últimos cavaleiros vivos tornam-se ermitãos. A última
palavra do texto é amen, reforçando o sentido religioso e o fim da aventura
arturiana, com a morte do rei Artur e o retorno do objeto sagrado ao Céu.
6. Considerações finais
Quadro 1: ARTUR
HISTORIA BRITTONUM (História Guerreiro invencível. Vence os inimigos com
dos Bretões) (Ano 800) (Anônimo) ajuda do escudo com imagem da Virgem Maria
HISTORIA REGUM BRITANNIAE Rei cristão invencível. Vence com a ajuda da
(História dos Reis da Bretanha) (1135- Virgem no seu escudo. Derrota os "pagãos" e
1138) (Geoffroy de Monmouth) 30 reinos não- cristãos.
LA QUESTE DEL SAINT GRAAL Re i c r is t ã o p e c a d o r. A ind a c o m t r a ç o s d e
(A Demanda do Santo Graal) (1215- guerreiro invencível. Graal dá prosperidade ao
1250) (Anônimo) reino.
Significado: alimentos que nunca se esgotam num Significado: objeto capaz de garantir plenitude material e
recipiente com traços mágicos. espiritual.
PREIDEU ANNWVYN (os despojos do outro PERCEVAL, de Chrétien de Troyes (século XII): escudela
mundo) (anônimo, século x): artur e seus homens que alimentava o pai do rei pescador, tio de perceval. o
tentam pegar o caldeirão no outro mundo céltico e cavaleiro puro deve desvendar a aventura.
fracassam.
PWILL, PRÍNCIPE DE DYVET (conto celta da LA QUESTE DEL SAINT GRAAL, de Robert de Boron
obra anônima M abinogion - remonta ao fim do (fim do século XII): cálice bebido por cristo na última ceia e
século XI): um saco não se enchia de comida por com seu sangue recolhido na cruz por José de Arimatéia,
mais alimentos que se colocasse ali. encontrado por Perceval.