Visibilidade e Ambiencia
Visibilidade e Ambiencia
Visibilidade e Ambiencia
Resumo
O artigo tem como objeto a proteo do contexto paisagstico do outeiro e convento
da Penha na baa de Vitria, situado no Esprito Santo- Brasil, numa perspectiva de
integrao dos valores materiais e imateriais do patrimnio cultural. Explora como
estudo de caso a experincia do IPHAN, rgo brasileiro responsvel pela proteo
do patrimnio nacional, com a delimitao e normatizao do entorno deste
monumento. Apresenta a problemtica da proteo dos entornos e a evoluo
terico-conceitual do tema atravs das cartas patrimoniais e de novos instrumentos
legais decorrentes, incorporados tutela federal do patrimnio. Destacam-se as
noes de patrimnio imaterial e paisagem cultural brasileira e os instrumentos
especficos de sua proteo dentro de uma perspectiva de conservao integrada.
Por meio da observao direta e do dilogo entre as fontes arquivsticas e
bibliogrficas, analisam-se os valores pelos quais o monumento foi reconhecido
como patrimnio nacional, destacando seus valores contemporneos frente aos
novos instrumentos de proteo. Abordam-se tambm as anlises feitas pelo
IPHAN-ES sobre os impactos de dois empreendimentos imobilirios projetados para
a capital, Vitria, na vizinhana do outeiro e convento da Penha, entre 2005 e 2011,
a fim de evidenciar o procedimento metodolgico e os critrios de proteo do
entorno do monumento. Ento, se delineia a proposta de delimitao e normatizao
do entorno do conjunto, fruto do caminho metodolgico traado pela reviso terica
e conceitual, leitura do territrio e as anlises dos impactos destes dois
empreendimentos, a partir de abordagens interdisciplinares.
Introduo
Estes valores so lidos nos seus aspectos fsicos, visuais, no ambiente natural,
e na sua interao com as prticas sociais passadas ou presentes e com o contexto
atual e dinmico, de natureza cultural, social e econmico, como recomenda a
Declarao de Xi An, a mais recente referncia internacional sobre o tema do
entorno (Tompson, Motta, 2007: 18).
A identificao e caracterizao de um lugar tambm foram tratadas por Kevin
Lynch (1997) em a Imagem da Cidade e, particularmente, quanto aos marcos, se
adequa perfeitamente percepo deste papel que o outeiro e convento da Penha
exercem na paisagem da baa de Vitria:
..a principal caracterstica dessa classe [os marcos] a singularidade, algum
aspecto que seja nico ou memorvel no contexto. Os marcos se tornam mais fceis
de identificar e mais passveis de ser escolhidos por sua importncia quando
possuem uma forma clara, isto , se contrastam com seu plano de fundo e se existe
alguma proeminncia em termos de sua localizao espacial. O contraste entre figura
e pano de fundo parece ser o fator principal.. O pano de fundo contra o qual o
elemento sobressai no precisa estar restrito aos seus arredores imediatos (...) so
marcos nicos contra o pano de fundo da cidade toda. (Mauar, 2011).
Figura 1- Vista do Outeiro e Convento a partir da Enseada do Su, em Vitria, com Vila Velha ao
fundo. esquerda, ponte de ligao entre as duas cidades sobre o canal de mar que as delimita.
No centro, no sop do morro: sede do Exrcito Brasileiro, em Vila Velha. Autor:
Diva Figueiredo; 2011; 4.16 x 15.94 cm.
parque e praias, que hoje configuram a orla externa da baa de Vitria. Estas reas
so lugares pblicos de relevncia para a contemplao do monumento, tendo a
superfcie do mar como elemento de distanciamento, alm da ligao fsica.
Em decorrncia desta qualificada visibilidade distncia do monumento, a
altura excessiva das edificaes, de massas significativas, que possam se interpor
entre estes pontos e o outeiro/convento, provoca interferncia negativa na linha do
cu na paisagem, criando concorrncia visual com o monumento. Deduz-se que a
relao de escala a grande definidora da interferncia no monumento e, por
consequncia, o gabarito ou altura mxima das edificaes constitui-se no
parmetro urbanstico por excelncia no controle da visibilidade e ambincia a fim de
no limitar ou reduzir a viso fsica de um bem tombado ou prejudic-lo pela
comparao entre as respectivas dimenses como ensina o ministro Joo Jos de
Queirs.
Outros parmetros urbansticos, tais como parcelamento, volume, materiais,
taxa de ocupao dos lotes, interferem muito pouco na apreciao distncia,
podendo ser totalmente desconsiderados na proposta de regulamentao deste
monumento, apontando para uma soluo bastante simplificada, em contraste com a
complexa anlise e apreenso do contexto urbano do conjunto monumental.
Da leitura da paisagem evidencia-se a heterogeneidade da morfologia da
cidade na baa de Vitria impressa pelos elementos naturais, aos quais se somam
os sucessivos aterros, e as tipologias edilcias de diversos tempos passados.
Portanto, o desenvolvimento dos estudos exigiu um levantamento minucioso das
tendncias de verticalizao dominantes e dos principais pontos de vista situados
em reas pblicas dos dois municpios, a partir dos quais se demarcaram cones
visuais focados no monumento em si e nas suas laterais, adotando-se como
referncia a cota 50, a fim de permitir a leitura de parte significativa da silhueta do
outeiro/convento tombado. Tambm foram levantados os gabaritos das edificaes
praticados e previstos nas respectivas leis municipais, que se situam entre estes
pontos e o monumento, cruzando-se estas informaes para explicitar objetivamente
a motivao dos critrios diferenciados das alturas mximas permitidas nestes
locais.
O aperfeioamento dos estudos dos pontos de vistas da orla da baia de
Vitria, tomados desde a praia de Camburi at a Praa do Papa na Enseada do Su,
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Figura 2: Mapa dos cones visuais. O crculo vermelho maior assinala a localizao do projeto do Nova
Cidade; o menor o do Fribasa Connection. Autor: Figueiredo et al. IPHAN-ES, 2012. 12,88x 8,41cm
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Figura 3- Vista a partir do ponto 4 da paisagem da baa de Vitoria, com o Outeiro e Convento ao
centro e simulao da insero da proposta do Nova Cidade, vista a partir deste ponto. Autor:
Abreu et al, 2006. IPHAN-ES, 7,35 x 16,19 cm.
caso semelhante feita por escola local, da qual participaram grupos de estudantes
de direito de vrios locais do pas.
Enfim, o carter interinstitucional, intersetorial e interdisciplinar da mobilizao
propiciada pela iminncia de impactos de grandes propores como os citados,
materializando casos concretos, teve o mrito de manter a questo na mdia por um
grande perodo e explicitar antecipadamente as razes para uma proposta de
delimitao e normatizao da amplitude apresentada neste estudo.
A adoo do parmetro nico de controle indicada pelos estudos feitos, possui
a caracterstica de facilitar a anlise e aprovao dos empreendimentos dentro do
permetro de proteo do entorno do monumento, bastando acordos de
procedimentos a serem celebrados entre o IPHAN e as prefeituras municipais de
Vitria e Vila Velha. A incorporao e compatibilizao da normativa federal s
legislaes municipais, respeitando os eventuais parmetros municipais mais
restritivos destas legislaes em resposta a outras demandas urbanas, dependem
da interlocuo interinstitucional entre o IPHAN e as prefeituras municipais de Vitria
e Vila Velha, j iniciada com as atuais administraes que assumiram no incio de
2013.
O exemplo do municpio do Rio de Janeiro, que adotou normativas
compartilhadas de proteo da ambincia de seus monumentos e apresenta
caractersticas semelhantes paisagem de Vitria, de forte interao entre ambiente
natural e construdo, viabilizou recentemente seu reconhecimento como a primeira
paisagem cultural urbana pela UNESCO.
O estudo aponta para a necessidade de evidenciar os valores dos aspectos
imateriais e intangveis deste patrimnio e obter seu reconhecimento nacional e num
futuro prximo promover a chancela de paisagem cultural brasileira, incorporando
ao conjunto monumental da Penha as duas noes e respetivos instrumentos
jurdicos mais recentes da poltica de patrimnio no Brasil.
Referncias
ABREU, Tereza Carolina Frota et al. Anlise de Impacto do Empreendimento Nova
Cidade na visibilidade do Outeiro e Convento de Nossa Senhora da Penha e na
ambincia da Baia de Vitria. Vitoria: IPHAN, 2006.