Educação Patrimonial
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Educação Patrimonial - Daniele Lopes Oliveira
Apresentação
Esta coleção aborda o tema do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural, e se propõe a trazer elementos de reflexão para a atividade da Educação Ambiental. Este Volume 2 é composto de seis Capítulos.
O primeiro Capítulo mergulha nos festejos do Divino Espírito Santo em Pirenópolis, Goiás, incorporada à história do lugar a mais de dois séculos, com uma dinâmica própria de produção e reprodução cultural que faz desta um bem de valor inestimável manifestada na religiosidade e na manutenção das tradições pirenopolinas.
O segundo Capítulo traz uma proposta de ação educativa para as Casas de Patrimônio do Iphan para além da função como escritório técnico, ocupado em sua maioria pelas demandas de fiscalização e conservação de bens materiais que, por sua vez, provocam mais conflitos do órgão com a comunidade local que diálogo e participação social na preservação do patrimônio cultural.
O terceiro Capítulo busca perceber a cidade e a relação das pessoas com os espaços públicos que Camillo Sitte identificou princípios artísticos, os quais, aplicados na forma urbana viriam conferir qualidade e vitalidade ao espaço. Sua lição ainda é atual no que se refere a aprender com a história das cidades para projetar espaços mais aprazíveis ao cotidiano.
No quarto Capítulo analisa a proposta de criação de um Estaleiro Escola do Museu da Vila, integra o Projeto Matriz do Programa de Pós-graduação, Mestrado Profissional, em Artes, Patrimônio e Museologia (PPGAPM) da Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar): o Ecomuseu Delta do Parnaíba – ECOMUDE e o Museu da Vila seu primeiro Polo.
O quinto Capítulo os resultados de uma atividade realizada, em situação de aulas remotas , com alunos(as) do curso de Licenciatura em História da UEG, na qual foi solicitado que apresentassem, na forma de um pequeno dossiê, um elemento do seu cotidiano pessoal como um bem cultural passível de ser defendido e reconhecido como Patrimônio Cultural.
E no sexto Capítulo é apresentado um mapeamento das produções acadêmicas em história da educação que tiveram o patrimônio histórico educativo como tema de pesquisa.
Sumário
Apresentação 1
Sumário 3
Festa do Divino Espírito Santo em Pirenópolis 5
Introdução 6
Tradição de Festa - Preservar e Educar 11
Novos Enfrentamentos – Como Salvaguadar? 16
Considerações finais 28
Referências 31
Como Construir Projetos de Ações Educativas para o Patrimônio 35
Introdução 36
Materiais e Métodos 40
Discussão 45
Considerações 50
Referências 52
O Mercado Municipal de Goiás Segundo os Princípios Artísticos da Cidade e Camillo Sitte 53
Introdução 54
Os Princípios Artísticos da Cidade de Camillo Sitte 54
Histórico do Mercado Municipal 59
Intervenção 2014-2016 72
Mercado Municipal e Camillo Sitte 80
Considerações Finais 91
Referências 94
Uso Social de Edificações Públicas 97
Introdução 98
O Estaleiro Escola do Museu da Vila 103
Gentrificação e vazios urbanos 119
Museus, educação e interpretação patrimonial 124
Museologia, Inovação social e Acupuntura Urbana 129
Considerações Finais 134
Referências 140
O PATRIMÔNIO QUE NOS CERCA 143
Introdução 144
Considerações Finais 162
Referências 163
Patrimônio Histórico Educativo nas Pesquisas em História da Educação 165
Introdução 168
A Memória dos Patrimônios: a necessidade de rememorar por meio dos monumentos 169
Identidade Coletiva do Patrimônio Educacional 174
Considerações Finais 182
Referências 183
Festa do Divino Espírito Santo em Pirenópolis
ANTIGAS TRADIÇÕES, NOVOS ENFRENTAMENTOS
Tereza Caroline Lôbo
Isis Lôbo Oliveira
João Guilherme da Trindade Curado
Os festejos do Divino Espírito Santo em Pirenópolis, Goiás, compõem o Livro de Registro das Celebrações, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), desde 2010, sendo a segunda celebração reconhecida por esta autarquia. Incorporada à história do lugar a mais de dois séculos, a Festa do Divino tem uma dinâmica própria de produção e reprodução cultural que faz desta um bem de valor inestimável manifestada na religiosidade e na manutenção das tradições pirenopolinas.
Com uma infinidade de rituais e personagens que concorrem para sua perpetuação propõem-se discutir, utilizando-se de pesquisa bibliográfica e observações participativas, aspectos do enfrentamento desta festividade para evitar as rupturas no ciclo festivo diante de novos padrões de sociabilidades impostos neste ano de 2020.
Em todo o mundo, entre todas as inúmeras culturas do passado e de agora, sempre a vida das pessoas e das comunidades esteve e está dividida entre trabalho e convivência, entre dever e prazer, entre rotina e festa (BRANDÃO, 2015, p. 29).
Introdução
Desde a década de 70 o conceito de patrimônio cultural de conteúdo mais dinâmico, vivo e popular vinha sendo construído por grupos de intelectuais, influenciando a construção do conceito na Constituinte Brasileira, em 1988 (RODRIGUES, 2006).
Assim, surgiu na referida Constituição um conceito mais alargado de Patrimônio Cultural, disposto no artigo 216, in verbis:
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I - As formas de expressão;
II - Os modos de criar, fazer e viver;
III - As criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - As obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;
V - Os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico (www.senado.leg.br).
Desse modo, se estendeu a proteção constitucional não apenas ao aspecto patrimonial material, mas ao aspecto imaterial/incorpóreo do patrimônio cultural. Afinado com as políticas internacionais que instituía o patrimônio imaterial cultural como as práticas, representações, expressões, conhecimento e técnicas que as comunidades, os grupos e indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural (UNESCO, 2006).
A Constituição Federal previu, no §1º do artigo 216, os instrumentos de proteção do patrimônio cultural brasileiro, atribuindo ao Poder Público e à comunidade sua proteção e promoção, elencando, como formas de proteção do patrimônio cultural imaterial, os inventários, registros e vigilância (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2013).
O dispositivo constitucional careceu de autoexecutoriedade, ou seja, para sua efetiva aplicação, fez-se necessária sua regulamentação através de legislação infraconstitucional. Isso só ocorreu doze anos após a promulgação da Constituição Federal, com a edição do Decreto n.º 3.551, de 04 de agosto de 2000, que instituiu o registro de bens culturais de natureza imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, criando, ainda, o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (IPHAN, 2006), que passou a gerenciar o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC).
O percurso para consolidação da legislação hoje em vigor, o Decreto n.º 3551/2000, foi influenciado por pelo menos três instrumentos: a recomendação sobre a salvaguarda da cultura tradicional e popular da Unesco; o advento do artigo 216 da Constituição de 1988; e a Carta de Fortaleza (TELLES, 2007).
Fruto da 25ª reunião da Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para educação, a ciência e a cultura, a recomendação sobre a salvaguarda da Unesco, sugeriu aos Estados-membros que adotasse medidas legislativas, dentre outras, para salvaguardar a cultura tradicional e popular, como patrimônio universal (portal.iphan.gov.br).
Com o caráter de generalidade do conceito trazido pelo artigo 216 da Constituição Federal e no intuito de dar efetiva aplicação ao dispositivo é que no evento de comemoração dos 60 anos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional — IPHAN, promovido no Ceará, em novembro de 1997, surgiu a Carta de Fortaleza, no Seminário Patrimônio Imaterial: Estratégias e Formas de Proteção
, onde se elencou propostas e recomendações, para tal finalidade (IPHAN, 2000a).
Dentre as recomendações estava a necessidade de reconhecer a diversidade cultural do Brasil e erradicar as políticas públicas voltadas para a exclusão social, pois, até então os bens protegidos pela União não expressavam a cultura dos diferentes grupos formadores da nacionalidade, entendo que a singularidade da cultura passa pelo reconhecimento da pluralidade das manifestações que a produz.
Programa Nacional do Patrimônio Imaterial, instituído pelo Decreto n.º 3551/2000, é realizado pela inscrição dos bens de natureza imateriais nos livros elencados nos incisos de I a IV, do artigo 1º, sendo eles: dos Saberes, das Celebrações, das Formas de Expressão e dos Lugares. A Festa do Divino Espírito Santo de Pirenópolis foi o segundo bem imaterial registrado no Livro das Celebrações, volume I, folhas 2, verso, no ano de 2010 (IPHAN, 2017).
Para chegar ao reconhecimento como patrimônio nacional, o processo de registro da Festa do Divino Espírito Santo de Pirenópolis cumpriu um longo e cuidadoso percurso que envolveu pesquisa e análise, foram nove meses, ao longo do ano de 2008, de levantamento bibliográfico, pesquisas de campo, entrevistas, registros áudio visuais, relatórios somados aos pareceres técnicos e cumprimentos de todas as normas metodológicas (IPHAN, 2000b) e processuais.
No Dossiê Iphan (2017), que fez uma síntese deste processo, a Festa do Divino Espírito Santo foi definida como um amplo sistema de celebrações, uma festa que se confunde com a história e a dinâmica de Pirenópolis, como uma das tradicionais, expressivas e principais manifestações da religiosidade do país ligadas à devoção ao Espírito Santo, constituidora das identidades locais, e, um festejo capaz de aglutinar pessoas, envolver gerações e interferir na vida social da comunidade, sendo fato social total
(MAUSS, 2003). Portanto, dada sua complexidade, consistência, amplitude foi reconhecida como patrimônio cultural imaterial brasileiro, estando enraizada no cotidiano e determinando padrões de sociabilidades.
Uma festa conhecida pela grandiosidade, reconhecida como patrimônio nacional pela representatividade cultural, tem pela frente o desafio de salvaguardar suas manifestações.
Tradição de Festa - Preservar e Educar
Todos os anos, em pelo menos dois séculos, a população de Pirenópolis, cidade goiana, vive e revive os tradicionais festejos do Divino Espírito Santo. Festa de origem medieval que por intermédios da colonização portuguesa adentrou o Brasil e se incorporou à cultura local, é [...] a ideia de que a festa é um ciclo que percorre ao longo do tempo, paralelamente e de modo simbólico, o próprio ciclo de rotina e trabalho da sociedade [...]
(BRANDÃO, 1978, p. 16), ou ainda, é "[...] um longo e demorado