Desmilitarizar: Segurança pública e direitos humanos
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Desmilitarizar - Luiz Eduardo Soares
I. Polícia
Polícia Militar e Justiça Criminal como promotoras de desigualdades
[1]
A sociedade brasileira logrou reduzir a pobreza ao longo dos governos do Partido dos Trabalhadores (PT) e aprofundar a experiência cidadã da participação democrática, a despeito de inúmeras contradições e da crise profunda que afetou a representatividade política, evidenciada em 2013, ano de grandes mobilizações populares. Desde 2015, iniciou-se um processo ruinoso de crise, recessão e contrarreforma de inspiração neoliberal, que fez o desemprego explodir e corroeu as conquistas. As desigualdades, que persistiram ao longo dos anos dourados
, embora amenizadas, voltaram a se aprofundar – e em escala dramática. Além disso, havia e há desigualdades no interior das desigualdades. Marcelo Neri afirmou que
a probabilidade de uma pessoa que se diz branca ser pobre é 49% menor que a de um negro e 56% menor que a de um pardo. […] Mesmo quando comparamos pessoas com os mesmos atributos, exceto raça, digamos, analfabeta de meia-idade, que mora numa favela de Salvador, a probabilidade de uma branca ser pobre é 29,4% menor do que a de uma não branca.[2]
Antes de Neri, o Censo de 2010 deixara evidente a cor da desigualdade econômica, indicando que 70% dos brasileiros extremamente pobres são negros[3].
Uma das esferas menos pesquisadas é exatamente aquela em que não tem havido avanços: a segurança pública, as ações policiais, as políticas criminais e o funcionamento das instituições inscritas no espaço da Justiça Criminal, que se estende até o sistema penitenciário. Os dados são precários, mas suficientes para fundamentar essa conclusão. Em 2016, houve 62.517 homicídios dolosos no país; ou seja, 30,3 vítimas a cada 100 mil habitantes. A taxa de jovens mortos atingiu 65,5 a cada 100 mil jovens. Foram assassinados 33.590 (7,4% mais do que em 2015), sendo 94,6% do sexo masculino. Considerando apenas a faixa entre 15 e 29 anos, a taxa foi de 280,6 vítimas a cada 100 mil pessoas da mesma idade. O racismo estrutural se evidencia na crueza dos dados: a taxa de homicídios de negros (40,2 a cada 100 mil) equivale a 2,5 vezes à de não negros (16 a cada 100 mil). E a curva da violência marcada pela cor se elevou: de 2006 a 2016, a taxa de vitimização letal de negros aumentou 23,1%, enquanto a de não negros decresceu 6,8%. O mesmo se verifica se focalizarmos apenas o universo feminino: em 2016, foram assassinadas no país 4.645 mulheres – isso corresponde a um crescimento de 6,4%, em dez anos. A taxa de homicídios dolosos vitimando mulheres foi de 4,5 a cada 100 mil, mas de 5,3 quando as vítimas eram mulheres negras e de 3,1 quando eram brancas. A diferença é de 71%. Em dez anos, até 2016, a vitimização letal de negras cresceu 15,4%, enquanto a de não negras decresceu 8%. Observando o conjunto das informações, constata-se que, no Brasil, em 2016, confirmando o padrão anteriormente detectado, 71,5% das vítimas de homicídios dolosos eram negras (pretas ou pardas, segundo as categorias do IBGE), o que provavelmente ajuda a explicar a negligência com que se vem tratando a questão da insegurança pública. Fosse branca de classe média ou de elite a maioria das vítimas, governos teriam caído, instituições teriam sido transformadas, e essa realidade brutal já teria mudado[4].
Os dados trazidos pelo Atlas da Violência 2018 vêm complementar e atualizar o cenário de desigualdade racial em termos de violência letal no Brasil já descrito por outras publicações. É o caso do Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência, ano base 2015, que demonstrou que o risco de um jovem negro ser vítima de homicídio no Brasil é 2,7 vezes maior que o de um jovem branco. Já o Anuário Brasileiro de Segurança Pública analisou 5.896 boletins de ocorrência de mortes decorrentes de intervenções policiais entre 2015 e 2016, o que representa 78% do universo das mortes no período, e, ao descontar as vítimas cuja informação de raça/cor não estava disponível, identificou que 76,2% das vítimas de atuação da polícia são negras.[5]
Essa realidade não é nova: o Mapa da Violência publicado em 2011[6] revela que, de 2002 a 2008, o número de negros assassinados elevou-se em 20,2%, enquanto o número de brancos vítimas do mesmo tipo de crime diminuiu em 22,3%.
Já entre 2002 e 2010, segundo o Mapa da Violência publicado em 2012[7], o número de vítimas brancas caiu 27,5%, enquanto a quantidade de negros vítimas de homicídio cresceu 23,4%.
Não há dúvida de que negros e pobres são as principais vítimas do crime mais grave, o homicídio doloso, além de serem as principais vítimas da brutalidade policial letal e das abordagens ilegais[8]. São os alvos prioritários das prisões em flagrante e estão super-representados nas penitenciárias.
A arquitetura institucional da segurança pública, que a sociedade brasileira herdou da ditadura e permaneceu intocada nesses trinta anos de vigência da Constituição Cidadã, impediu a democratização da área e sua modernização. Esse imobilismo contrasta com o dinamismo acelerado que vem caracterizando o país no último quarto de século. Em outras palavras, a transição democrática não se estendeu ao campo da segurança pública, até hoje confinado em estruturas organizacionais ingovernáveis, incompatíveis com as exigências de uma sociedade complexa e com os imperativos do Estado democrático de direito.
Numa democracia, a meta da instituição policial, independentemente de suas atribuições específicas, deveria ser garantir direitos dos cidadãos. Para esse fim, disporia de mandato para recorrer ao uso comedido e proporcional da força – se, quando e na medida do estritamente indispensável – e para proceder a investigações, conforme as determinações estabelecidas nos marcos legais vigentes.
No Brasil, os objetivos do aparato de segurança, na prática, têm sido, preponderantemente, sustentar a segurança do Estado, encarcerar jovens negros e pobres para atender ao clamor por produtividade policial, fazer a guerra
contra os suspeitos de envolvimento com crimes – por meio, inclusive, de execuções extrajudiciais – e criminalizar movimentos sociais, reprimindo-os de forma arbitrária. Na medida em que a realização desse objetivo inconstitucional envolve a aplicação seletiva (portanto, iníqua) das leis – as quais são refratadas por filtros de cor, classe e território, entre outros –, esse processo reproduz, aprofunda e promove desigualdades sociais.
A hipótese interpretativa que pretendo sustentar é a seguinte: o crescimento vertiginoso da população penitenciária no Brasil, a partir de 2002 e 2003, seu perfil social e de cor tão marcado, assim como a perversa seleção dos crimes privilegiados pelo foco repressivo, devem-se, prioritariamente, à arquitetura institucional da segurança pública, em especial à forma de organização das polícias, que dividem entre si o ciclo de trabalho, e ao caráter militar da polícia ostensiva[9]. Devem-se também às políticas de segurança adotadas e que não seriam possíveis, no modo em que transcorrem, se não houvesse a lei de drogas. Evidentemente, o fator mais relevante, que condiciona os demais em última instância, são as desigualdades e o racismo estrutural, mas o foco são os determinantes imediatos. Observe-se que a arquitetura institucional inscreve-se no campo mais abrangente da Justiça Criminal, o que, por sua vez, significa que o funcionamento das polícias, estruturadas nos termos ditados pelo modelo constitucionalmente estipulado, produz resultados na dupla interação: com as políticas criminais e com a linha de montagem que conecta Polícia Civil, Ministério Público (MP), Justiça e sistema penitenciário. Pretendo indicar que a falência do sistema investigativo e a inépcia preventiva – em cujos efeitos incluem-se a explosão de encarceramentos e seu viés racista e classista – são também os principais responsáveis pela insegurança, em suas duas manifestações mais dramáticas: a explosão de homicídios dolosos e a brutalidade policial letal.
Há pressupostos e implicações teóricas na hipótese que devem ser explicitados, assim como uma interlocução subjacente com a tese popularizada por Loïc Wacquant em sua influente obra As prisões da miséria[10]. O autor sugere conexões funcionais entre a adoção do receituário neoliberal nos Estados Unidos e o aumento dramático das taxas de encarceramento, sobretudo de pobres e negros. O neoliberalismo, ao promover o crescimento do desemprego, o esvaziamento de políticas sociais e a desmontagem de garantias individuais, exigiria a criminalização da pobreza para aplacar as demandas populares e evitar a eventual tradução política da exclusão em protagonismo crítico ou insurgente. Se o exército de reserva da força de trabalho não é mais necessário, dadas as peculiaridades do sistema econômico globalizado que transfere a exploração do trabalho para países dependentes, ou apresenta riscos de converter-se em fonte de instabilidade política, torna-se mais conveniente canalizar contingentes numerosos dos descartáveis para o sistema penitenciário. Não por acaso, os Estados Unidos viriam a produzir a maior população penitenciária do mundo. Certo ou errado, o diagnóstico não pode ser generalizado e não se aplica ao Brasil.
Entre nós, a epidemia do encarceramento coincide com os governos do PT, que poderiam merecer todo tipo de crítica, mas jamais seriam passíveis de classificação como neoliberais, promotores de desemprego e do desmonte de políticas e garantias sociais. Pelo contrário, não resta dúvida quanto às virtudes sociais dos mandatos do presidente Lula, durante os quais houve redução da pobreza e ampliação do emprego e da renda. Contudo, nunca antes na história deste país prendeu-se tanto. Atribuo a expansão do encarceramento à combinação entre as estruturas organizacionais das polícias, a adoção de políticas de segurança estaduais seletivas e a vigência, seguida da potencialização discricionária, da lei de drogas. Para demonstrar isso, impõe-se um percurso argumentativo.
Voracidade encarceradora enviesada e circuitos da violência letal: a perversa combinação entre modelo policial, política de segurança seletiva e política criminal fundada no proibicionismo
Em primeiro lugar, reconheçamos a gravidade do quadro nacional e a incapacidade do sistema de segurança pública para revertê-lo – esse reconhecimento, contudo, não significa que lhe devamos atribuir todas as responsabilidades pelo avanço da criminalidade violenta. A sociedade e o Estado tampouco têm sido capazes de prevenir essa tragédia. Nem mesmo a Polícia Civil tem sido competente para investigar os crimes mais graves: apenas cerca de 8% dos homicídios dolosos, em média, têm sido esclarecidos, no país, segundo declaração do professor Julio Jacobo Waiselfisz, comentando, no site Consultor Jurídico, seu Mapa da Violência relativo a 2011[11].
No entanto, não nos precipitemos a daí deduzir que o Brasil seja o país da impunidade, como o populismo penal conservador e a esquerda punitiva costumam alardear. Pelo contrário, temos uma das maiores populações prisionais do mundo, além da taxa de crescimento mais veloz. Em 1990, havia 90 mil presos; em junho de 2016, o dado mais recente, 726.712 pessoas (mais de 90%, homens) estavam presas, produzindo um déficit de vagas da ordem de 358.663. O crescimento entre 1990 e 2016 foi de 707%. As prisões de nosso país têm cor: enquanto os negros são 53% da população brasileira, representam 64% da população penitenciária. A maioria dos presos é jovem, pobre, do sexo masculino e de baixa escolaridade.
Entre os presos, apenas 13,6% cumprem pena por crimes contra a pessoa. E 40% são provisórios, isto é, estão presos sem condenação. Apenas 5,1% estão lá por transgressões ao Estatuto do Desarmamento. E 28,47% foram presos sob acusação de tráfico de drogas: entre os homens, 26%; entre as mulheres – atenção para este dado –, 62%. Considerando o conjunto da população penitenciária, 44,9% foram acusados ou são suspeitos de crimes contra o patrimônio. Fica patente que os crimes contra a vida, assim como as armas, não constituem prioridade. Os focos são outros: patrimônio e drogas. O subgrupo composto pelos que cumprem pena por tráfico
(adiante explico as aspas) é aquele que cresce mais velozmente, em um universo que aumenta depressa, como vimos.
Ou seja, além de não evitar as mortes violentas intencionais e de não as investigar, o Estado brasileiro prende muito e mal. As prioridades estão trocadas. A vida não é valorizada, e há um abuso do encarceramento. A privação de liberdade, esse atestado de falência civilizatória, tem constituído a orientação dominante do sistema de segurança e Justiça Criminal. Vamos aos números.
No Brasil, o traficante deve cumprir sentença de pelo menos cinco anos, o que praticamente elimina a possibilidade de que se lhe conceda o benefício de pena alternativa. Mesmo que não esteja envolvido com organizações criminosas nem tenha agido com violência, será privado da liberdade. Custará 1.500 reais por mês ao erário, recurso que poderia transformar sua vida e promover sua integração à sociedade, caso fosse aplicado em complementação educacional, inserção no mercado de trabalho ou no apoio efetivo para sua família, garantindo-lhe – e, nesse sentido, também à sociedade – horizontes promissores. Nos termos em vigor, segundo a Lei n. 11.343/2006, o usuário de drogas ilícitas não pode ser preso, mas deve ser conduzido à delegacia, depois a um Juizado Especial Criminal, onde poderá receber advertência verbal, pena de prestação de serviço à comunidade, medida de comparecimento obrigatório a programa educativo ou multa. O consumo ainda é considerado crime.
No Rio de Janeiro, segundo pesquisa para o Pnud[14], 80% dos presos por tráfico são jovens entre 16 e 28 anos, primários. A grande maioria foi capturada em flagrante, não portava arma, não agia com violência e não tinha qualquer vínculo com organizações criminosas.
A Lei brasileira não define a partir de que quantidade o porte de droga ilícita passa a ser tipificado como tráfico, o que amplia a liberdade interpretativa da autoridade judicial – e também da autoridade policial. Dispondo de larga margem para exercer discricionariedade, a maioria dos magistrados reproduz as desigualdades sociais. Suas avaliações subjetivas, cujos efeitos práticos são bastante objetivos, reiteram as discriminações enraizadas na cultura em que foram socializados, as quais dão o tom às iniquidades sociais brasileiras. Para a perplexidade de alguns interlocutores, os efeitos desse coquetel têm sido mais graves do que a ingestão de qualquer droga.
O resultado é o seguinte: se o suspeito for um jovem branco de classe média morador de bairro afluente, defende-se com a conversa esperta: Sou viciado, excelência, confesso que sou escravo do vício. Mas detesto ter de falar com traficante, lidar com essa gente. Quero distância do crime. Por isso, compro a maior quantidade possível para diminuir a necessidade desses encontros
. O juiz costuma abençoar o pobre moço, apiedar-se dele e indicar o suposto tratamento necessário e merecido. Para a Justiça, não há dúvida: eis um usuário. Se o suspeito tem a mesma idade do outro, mas é negro, pobre e reside numa favela, nem lhe passa pela cabeça enunciar justificativa tão engenhosa. Correria o risco de ser condenado ainda com mais severidade por desacato à autoridade. Sua explicação provavelmente seria tomada como escárnio. Para a Justiça, o jovem é traficante. O garotão branco de classe média é um viciado tratado com indulgência paternal; o rapaz negro e pobre ficará trancado cinco anos, pelo menos, treinando para a volta. Se não foi violento nem estava armado, se agia sozinho para levantar uma grana, aprenderá a organizar-se, armar-se e agir com violência, visando a alvos mais ambiciosos. A iniquidade fere a alma, humilha, deprime, degrada a autoestima. As perspectivas para o egresso nunca são positivas. A profecia pessimista quanto ao futuro do jovem delinquente tende a cumprir-se, confirmando o estigma. Não porque estivesse correta, mas porque a mediação das políticas criminais converteu o vaticínio em destino.
O que são e como funcionam as polícias militares?
[15]
Segundo a Constituição, as polícias militares (PMs) são forças auxiliares e reserva do Exército (artigo 144, parágrafo 6º), e sua identidade tem expressão institucional por intermédio do Decreto n. 88.777, de 30 de setembro de 1983, do Decreto-lei n. 667, de 2 de julho de 1969, modificado pelo Decreto-lei n. 1.406, de 24 de junho de 1975, e do Decreto-lei n. 2.010, de 12 de janeiro de 1983. Isso significa que o Exército é responsável pelo controle e pela coordenação
das polícias militares, enquanto as secretarias de Segurança dos estados têm autoridade sobre sua orientação e seu planejamento
. Em outras palavras, os comandantes gerais das PMs devem reportar-se a dois senhores. Indicá-los é prerrogativa do Exército (artigo 1º do Decreto-lei n. 2.010, de 12 de janeiro de 1983, que modifica o artigo 6º do Decreto-lei n. 667/69)[16], ao qual se subordinam, pela mediação da Inspetoria Geral das Polícias Militares (que passou a integrar o estado-maior do Exército em 1969)[17], as segundas seções (as PM2), dedicadas ao serviço de inteligência, assim como as decisões sobre estruturas organizacionais, efetivos, ensino e instrução, entre outras. As PMs obrigam-se a obedecer regulamentos disciplinares inspirados no regimento vigente no Exército (artigo 18 do Decreto-lei n. 667/69)[18] e a seguir o regulamento de administração do Exército (artigo 47 do Decreto n. 88.777/83)[19], desde que este não colida com normas estaduais.
Há, portanto, duas cadeias de comando, duas estruturas organizacionais, convivendo no interior de cada Polícia Militar (PM), em cada estado da federação. Uma delas vertebra a hierarquia ligando as praças aos oficiais, ao comandante geral da PM, ao secretário de Segurança e ao governador; a outra vincula o comandante geral da PM ao comandante do Exército, ao ministro da Defesa e ao presidente da República. Apesar da autoridade estadual sobre orientação e planejamento
, a principal cadeia de comando é a que subordina as PMs ao Exército. Não é difícil compreender o primeiro efeito da duplicidade assimétrica: as PMs estaduais constituem, potencialmente, poderes paralelos que subvertem o princípio federativo.
Nada disso foi percebido, porque o Exército tem sido parcimonioso no emprego de suas prerrogativas. Quando deixar de sê-lo e, por exemplo, vetar a nomeação de algum comandante geral, as consequências serão sérias. Não obstante as cautelas do Exército, os efeitos da subordinação estrutural a ele têm sido sentidos no cotidiano das metrópoles. Na medida em que as PMs não estão organizadas como polícias, mas como pequenos exércitos desviados de função, os resultados são, salvo honrosas exceções, os desastres que conhecemos: ineficiência no combate ao crime, incapacidade de exercer controle interno (o que implica envolvimentos criminosos em larga escala) e insensibilidade no relacionamento com os cidadãos[20].
Polícias nada têm a ver com exércitos: como foi dito anteriormente, são instituições destinadas a garantir direitos e liberdades dos cidadãos, que estejam sendo violados ou na iminência de sê-lo, por meios pacíficos ou por uso comedido de força, associado à mediação de conflitos, nos marcos da legalidade e em estrita observância dos direitos humanos. Por isso, qualquer projeto consequente de reforma das polícias militares para transformar métodos de gestão e racionalizar o sistema operacional, tornando-o menos reativo e mais preventivo (fazendo-o apoiar-se no tripé diagnóstico-planejamento-avaliação), precisa começar advogando o rompimento do cordão umbilical com o Exército e a desmilitarização.
Uma barafunda institucional como essa, gerando ambiguidades, inviabilizando mudanças estruturais urgentes e alimentando confusões, tinha de dar no que deu tantas vezes: greves selvagens, nas quais todos saem perdendo – a população, os governos e os próprios policiais, mesmo quando ganham certas vantagens residuais. A barafunda tinha de produzir esse resultado catastrófico, sobretudo quando turbinada por salários insuficientes, condições de trabalho desumanas, ausência de qualificação, falta de apoio psicológico permanente e códigos disciplinares medievais, cuja própria constitucionalidade deveria ser questionada, uma vez que afrontam direitos elementares.
Esses códigos são tão absurdos que penalizam o cabelo comprido, o coturno sujo e o atraso com a prisão do soldado, mas acabam sendo transigentes com a extorsão, a tortura, o sequestro e o assassinato. A falta disciplinar, cometida dentro do quartel, é alvo de punição draconiana. O crime perpetrado contra civis é empurrado para as gavetas kafkianas da corregedoria, de onde frequentemente é regurgitado para o labirinto burocrático, em cuja penumbra repousa, até que o esquecimento e o jeitinho corporativista o sepultem nos arquivos. Os policiais do Brasil, de norte a sul, estão aprendendo a usar o discurso dos direitos humanos a seu favor: cobram salários dignos, condições razoáveis de trabalho e um código disciplinar que os respeite, como profissionais, cidadãos e seres humanos. A imensa maioria deseja a desmilitarização e a carreira única.
Em síntese: as PMs são definidas como força reserva do Exército e submetidas a um modelo organizacional concebido a sua imagem e semelhança. Por isso, têm até treze níveis hierárquicos e uma estrutura fortemente verticalizada e rígida. A boa forma de uma organização é aquela que melhor serve ao cumprimento de suas funções. As características organizacionais do Exército atendem a sua missão constitucional, porque tornam possível o pronto emprego
, essencial às ações bélicas destinadas à defesa nacional. Nesse contexto, entende-se o veto à sindicalização.
A missão das polícias no Estado democrático de direito, como mencionado nos primeiros parágrafos, é inteiramente diferente daquela que cabe ao Exército. O dever das polícias, não é demais reiterar, é prover segurança aos cidadãos, garantindo o cumprimento da Lei, ou seja, protegendo seus direitos e suas liberdades contra eventuais transgressões que os violem. No repertório cotidiano das atividades das PMs, confrontos armados que exigem pronto emprego representam pequena parcela. Não faz sentido estruturar toda uma organização para atender a uma pequena parte de suas ações. O funcionamento usual das instituições policiais com presença uniformizada e ostensiva nas ruas, cujos propósitos são, sobretudo, preventivos, requer, dada a variedade, a complexidade e o dinamismo dos problemas a superar, os seguintes atributos: descentralização; valorização do trabalho na ponta; flexibilidade no processo decisório nos limites da legalidade, do respeito aos direitos humanos e dos princípios internacionalmente concertados que regem o uso comedido da força; plasticidade adaptativa às especificidades locais; capacidade de interlocução, liderança, mediação e diagnóstico; liberdade para adoção de iniciativas que mobilizem outros segmentos da corporação e intervenções governamentais intersetoriais. Idealmente, o(a) policial na esquina é um(a) gestor(a) da segurança em escala territorial limitada com amplo acesso à comunicação intra e extrainstitucional, de corte horizontal e transversal[21].
Engana-se quem acredita que mais rigor hierárquico, mais centralização, menos autonomia na ponta e regimentos mais duros garantem mais controle interno, menos corrupção, desmandos e brutalidade. Se fosse assim, nossas polícias militares seriam campeãs de virtude. No entanto, sacrificamos a eficiência no altar da disciplina para colher tempestades e saldos negativos em todos os fronts.
Não há nenhuma razão para que as PMs copiem o modelo organizacional do Exército. Em um novo contexto desmilitarizado, a sindicalização se tornaria legal e legítima. Quem teme sindicatos e supõe possível manter a ordem reprimindo demandas dos trabalhadores, proibindo sua organização, não compreende a história social e as lições que as lutas trabalhistas nos ensinaram. Não entende que o veto à organização provoca efeitos perversos para todos e planta uma bomba de efeito retardado sob os pés da sociedade.
Demonstrando a hipótese: estruturas organizacionais e práticas seletivas
Em primeiro lugar, é preciso deixar claro que as polícias militares são proibidas de investigar, de acordo com o artigo 144 da Constituição. Sendo as polícias mais numerosas e as que se encontram nas ruas 24 horas, em todo o país, caem sobre seus ombros imensas responsabilidades; com isso, elas são por todos – mídia, opinião pública, políticos, autoridades – cobradas, pressionadas a produzir. Com frequência, entendem por produzir prender. Não podendo investigar, só lhes cabe prender em flagrante. Eis aí a razão do fenômeno: a imensa maioria da população carcerária brasileira foi presa em flagrante delito. Esse é o retrato da aplicação de um crivo seletivo tão grave quanto evidente, além da conhecida e estudada seletividade de classe, cor e territorialidade. As prioridades estão invertidas, radicalmente, e isso independe da política de segurança adotada e, até certo ponto, da vontade dos atores envolvidos e dos gestores. Eis mais um motivo pelo qual o gradualismo incremental como perspectiva de mudança é tão limitado, na área da segurança pública, entre nós[22]. Ou seja: eis por que é indispensável a reforma estrutural das instituições, que exige alteração do artigo 144 da Constituição, no qual se estabelece o desenho da arquitetura institucional da segurança pública, que inclui o modelo policial e a distribuição de atribuições e responsabilidades entre a União, os estados e os municípios.
As estruturas organizacionais das polícias trazem consigo conteúdos políticos, metas naturalmente derivadas das formas de funcionamento, rotinas inerciais que emanam das estruturas como se lhes fossem inerentes, pela mediação de valores e tradições corporativas. É o que me cumpre demonstrar.
A PM é um corpo de servidores públicos pressionado pelo governo, pela mídia e pela sociedade a trabalhar e produzir resultados, os quais deveriam ser entendidos como a provisão da garantia de direitos e a redução da criminalidade, sobretudo violenta, estabilizando e universalizando expectativas positivas em relação à cooperação – não é outra coisa a chamada segurança pública, cuja natureza é imaginária e prospectiva e, portanto, corresponde à idealização compartilhada de que existe uma ordem. Este ente volátil e intersubjetivo, a ordem
, apenas se materializa sob a forma de profecias que se autocumprem. Entretanto, resultados não são compreendidos nesses termos, seja porque interpõe-se a opacidade dos valores da guerra contra o inimigo interno, seja porque a máquina policial apenas avança para onde aponta seu nariz, por assim dizer. Em outras palavras, a máquina, para produzir, respondendo à pressão externa, precisa mover-se, isto é, funcionar – e só o faz segundo as possibilidades oferecidas por seus mecanismos, os quais operam em sintonia com o repertório proporcionado pela tradição corporativa, repassado nas interações cotidianas, nos comandos e no processo de socialização, que incorpora e transcende a formação técnica.
A máquina funciona determinando às equipes de subalternos nas ruas, pelos canais hierárquicos do comando, ao longo dos turnos de trabalho, trajetos de patrulhamento em cujo âmbito realiza-se a vigilância. A operacionalização depende da subserviência do funcionário que atua na ponta, de quem se exige renúncia à dimensão profissional de seu ofício, à liberdade de pensar, diagnosticar, avaliar, interagir para conhecer, planejar, decidir e mobilizar recursos multissetoriais, antecipando-se aos problemas identificados como prioritários. A inexorável discricionariedade da função policial[23] será exercida nos limites impostos pela abdicação do pensamento e do protagonismo profissional. Será reduzida ao arbítrio, porque descarnada do conteúdo finalista superior, que daria sentido à sua ação e à participação de sua instituição: a busca da realização das metas superiores, indicadas à exaustão neste texto. O que restará ao policial militar na ponta, na rua? O que caberá ao soldado? Varrer a rua com os olhos e a audição, classificando personagens e biótipos, gestos e linguagens corporais, figurinos e vocabulários, intuindo dramaturgias, orientando-se pelo imperativo de funcionar e produzir, o que significa, para a PM, prender (quando não fazer a guerra).
Ad hoc, no varejo do cotidiano, só resta ao soldado procurar o flagrante, flagrar a ocorrência, capturar o suspeito. Os grupos sociais mais vulneráveis serão também, no quadro maior das desigualdades brasileiras e do racismo estrutural, os mais vulneráveis à escolha dos policiais, porque estes projetarão preconceitos no exercício de sua vigilância. O elenco escolhido pela vigilância tenderá a ser parecido com os estereótipos destacados no cardápio da cultura corporativa. Nos territórios vulneráveis, a tendência será atuar como tropa de ocupação e enfrentar inimigos. Assim se explicam as milhares de execuções extrajudiciais sob o título cínico de autos de resistência
, abençoados pelo MP sem investigação e arquivados com o aval cúmplice da Justiça e a omissão da mídia e de parte da sociedade.
Por fim, o flagrante exige um tipo penal: na ausência da antiga vadiagem, está à mão a lei de drogas (e não só). Ou seja, pressionar a PM a funcionar equivale a lhe cobrar resultados, os quais serão interpretados não como redução da violência nem resolução de problemas, mas como efetividade de sua prática, isto é, como produtividade confundida com prisões, contabilizada em prisões, as mais prováveis pelo método disponível, o flagrante. O personagem, o biótipo, o rótulo, o figurino, o território, a fala, a vigilância no varejo das ruas, a ação randômica em busca do flagra: não são necessárias grandes articulações funcionais entre macroeconomia e políticas sociais, a proporcionar sobrevida ao capitalismo. Basta a manchete do jornal, o telefonema do governador ao secretário de Segurança, a chamada deste ao comandante geral da PM, a ordem deste ao chefe do estado-maior, daí ao comandante da unidade e o grito deste aos subordinados para que produzam, aumentem a produtividade. Basta a máquina funcionar. Esta não investiga, porque a fratura do ciclo, prevista no modelo, não permite. Ela está condenada a enxergar o que se vê na deambulação vigilante, em busca de personagens previsíveis, que confirmem o estereótipo e estejam nas ruas, mostrem-se acessíveis. Ela vai à caça do personagem socialmente vulnerável, que comete determinados tipos de delito, próprios a esse tipo de personagem e ao âmbito de observação do policial ostensivo. Portanto, socialmente vulnerável torna-se sinônimo de vulnerável à abordagem policial, ao flagrante e à correspondente tipificação criminal. Assim como se diz que, na investigação, deve-se seguir o dinheiro ("follow the money"), na análise da criminalização da pobreza, no Brasil, convém seguir as etapas do funcionamento ostensivo da máquina policial militar à cata do flagrante.
Como vimos, a política criminal, aqui analisada por meio da lei de drogas, é decisiva. A política de segurança, com suas escolhas de fundo, é fundamental. No entanto, é indiscutível que cumprem papel determinante a militarização e a ruptura do ciclo do trabalho policial. A divisão do ciclo, no contexto da cultura corporativa belicista – herdada da ditadura e do autoritarismo onipresente na história brasileira –, cria uma polícia exclusivamente ostensiva, cuja natureza militar – fortemente centralizada e hierarquizada – inibe o pensamento na ponta, obsta a valorização do policial e de sua autonomia profissional e mutila a responsabilidade do agente, degradando a discricionariedade hermenêutica em arbitrariedade subjetiva. Contando com o contexto social marcado por iniquidades, apoiada pela autorização tácita de considerável parcela da sociedade, estimulada pela omissão cúmplice ou pela condução explícita de autoridades políticas, a dinâmica acionada pelo desempenho policial reproduz, aprofunda e amplia desigualdades sociais. A máquina policial militar ávida por flagrantes funciona na inércia, repetindo sua sina discriminatória no piloto automático, ou impelida, em espasmos reativos e voluntaristas, à produtividade: palavra-senha decodificada como demanda por encarceramento. O mecanismo perverso atua por pequenos gestos, abordagens cotidianas, aplicação seletiva das leis, pela via da fatídica lei de drogas – cuja função é estratégica e decisiva – ou por ações espetaculares e performances midiáticas. Manifesta-se também no silêncio passivo e omisso ante o dever constitucional de garantir o direito de todos, o que inclui, e com destaque, os grupos mais vulneráveis.
[1] Paper apresentado no Seminário Internacional Emancipação, Inclusão e Exclusão. Desafios do Passado e do Presente, realizado de 28 a 30 de outubro de 2013, na Universidade de São Paulo, sob a coordenação das professoras Lilia Schwarcz e Maria Helena P. T. Machado, no âmbito do programa Conferência USP Humanidades 2013. O paper, naquela primeira versão, foi publicado no livro Emancipação, inclusão e exclusão: desafios do passado e do presente (São Paulo, Edusp, 2018), organizado pelas promotoras do evento citado. Versões modificadas e reduzidas, tematizando prioritariamente a Proposta de Emenda Constitucional para a reforma da arquitetura institucional da segurança pública (PEC-51), apresentada pelo senador Lindbergh Farias, foram publicadas no Boletim IBCCrim, n. 252, nov. 2013, e em Le Monde Diplomatique, mesmos mês e ano. Como disse na última nota da Introdução a este volume, a versão que aqui se apresenta foi reescrita com dados atualizados.
[2] Marcelo Neri, A nova classe média (São Paulo, Saraiva, 2011), p. 227.
[3] Dados completos sobre a situação da população negra no Brasil, assim como uma análise sensível e profunda sobre os preconceitos à brasileira e a persistência das desigualdades, encontram-se em Lilia Moritz Schwarcz, Nem preto nem branco, muito pelo contrário (São Paulo, Claro Enigma, 2012).
[4] Daniel Cerqueira et al., Atlas da Violência 2018 (Fórum Brasileiro de Segurança Pública/Ipea, 2018).
[5] Idem.
[6] Julio Jacobo Waiselfisz, Mapa da Violência (Brasília, Ministério da Justiça, 2011).
[7] Idem, Mapa da Violência (Brasília, Ministério da Justiça, 2012).
[8] Leonarda Musumeci e Silvia Ramos, Elemento suspeito: abordagem policial e discriminação na cidade (Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2005).
[9] Pode parecer injusto destacar a