OSTEOTOMIA DE CHIARI NA DOENÇA DE PERTHES
Osteotomia de Chiari na doença de Perthes*
A KIRA ISHIDA 1, SERGIO S. KUWAJIM A 2, CARLO M ILANI3,
HENRIQUE SODRÉ4, M ÁRIO K. A DAM ES5, J OSÉ R. BENBASSAT6
RESUMO
Os autores avaliaram nove pacientes com doença de
Legg-Calvé-Perthes (DLCP) unilateral, submetidos à osteotomia de Chiari(5,6). A idade média foi de nove anos e
quatro meses. Todos os pacientes encontravam-se nos grupos IV e V da classificação artrográfica de Laredo, com
quadris dolorosos ao exame clínico e subluxação ao estudo radiológico. Dos oito pacientes na fase de fragmentação, seis (66,66%) estavam no grupo 3 e dois (22,22%) no
grupo 4 de Catterall(4); um (11,12%) encontrava-se na fase
de reossificação. Na avaliação artrográfica segundo a classificação de Laredo(12), houve cinco (55,55%) quadris do
grupo IV e quatro (44,45%) no grupo V. O ângulo centroborda de Wiberg(22) mediu, pré-operatoriamente, 17º (média), com variação de 7º a 26º; seis semanas após a cirurgia, o ângulo variou de 26º a 48º (média de 34,33º) e, na
última avaliação, de 14º a 60º (média de 34,00º). O tempo médio de acompanhamento foi de quatro anos e nove
meses (variação de um ano e cinco meses a oito anos e
cinco meses). A esfericidade da cabeça femoral, avaliada
segundo o método dos círculos concêntricos de Mose(14,15),
revelou um (11,12%) quadril com bom resultado, dois
(22,22%) quadris com resultado regular e seis (66,66%)
* Trab. realiz. no Dep. de Ortop. e Traumatol. da Univ. Fed. de São Paulo –
Esc. Paul. de Med. (Serv. do Prof. Dr. José Laredo Filho).
1. Prof. Adjunto Doutor; Chefe da Disc. de Ortop. e Traumatol. do Dep. de
Ortop. e Traumatol. da Unifesp-Esc. Paul. de Med.
2. Doutor em Ortop. e Traumatol. pela Unifesp-Esc. Paul. de Med.
3. Prof. Orient. do Curso de Pós-Grad. em Ortop. e Traumatol. da UnifespEsc. Paul. de Med.; Doutor do Dep. de Ortop. e Traumatol. da UnifespEsc. Paul. de Med.; Chefe do Setor de Quadril Infantil da Disc. de Ortop.
Pediátr. do Dep. de Ortop. e Traumatol. da Unifesp-Esc. Paul. de Med.
4. Livre-Doc.; Prof. Adjunto; Chefe da Disc. de Ortop. Pediátr. do Dep. de
Ortop. e Traumatol. da Unifesp-Esc. Paul. de Med.
5. Pós-graduando em Mestrado no Dep. de Ortop. e Traumatol. da UnifespEsc. Paul. de Med.
6. Resid. do 3º ano do Dep. de Ortop. e Traumatol. da Unifesp-Esc. Paul. de
Med.
Endereço para correspondência: Mono
Rev Bras Ortop _ Vol. 33, Nº 1 – Janeiro, 1998
com mau resultado. O resultado radiográfico final, segundo a classificação de Stulberg(20), mostrou três (33,33%)
quadris na classe II, três (33,33%) na classe III e três
(33,34%) na classe IV. A avaliação clínica final foi realizada em seis pacientes (66,66%), os quais não tiveram
queixa de dor ou instabilidade dos quadris. De acordo com
a classificação de Robinson et al.(17), houve três (33,33%)
quadris com bom resultado, três (33,33%) com resultado
regular e nenhum com mau resultado.
Unitermos – Doença de Legg-Calvé-Perthes; osteotomia de Chiari
SUMMARY
Chiari’s osteotomy in Perthes disease
The authors analyzed 9 children with unilateral LeggCalvé-Perthes disease treated by Chiari’s osteotomy(5,6). Mean
age was 9 years and 4 months. Follow-up varied from one
year and five months to eight years and five months. The
disease was in the fragmentation stage in 8 patients, and
assessment using Catterall’s classification (4) showed six
(66.66%) in group three and two (22.22%) in group 4. Arthrographic assessment revealed 5 (55.55%) hips in group
IV and four (44.45%) in group V of Laredo’s classification(12).
The CE angle of Wiberg(22) averaged 17o before surgery, 34.33o
six weeks after surgery, and 34o at the final assessment. According to Mose’s concentric circles(14,15), one (11.12%) patient presented good results, two (22.22%) had fair results,
and six (66.66%) developed poor results. Radiographic results were evaluated using the five classes of Stulberg et al.(20).
At the final follow-up there were three (33.33%) hips in class
II, three (33.33%) in class III, and three (33.34%) in class
IV. Clinical evaluation was done in six patients (66.66%)
and, according to the criteria of Robinson et al.(17), three patients (33.33%) presented good results and three (33,33%)
presented fair results.
Key words – Legg-Calvé-Perthes disease; Chiari’s osteotomy
1
A. ISHIDA, S.S. KUWAJIMA, C. MILANI, H. SODRÉ, M.K. ADAMES & J.R. BENBASSAT
INTRODUÇÃO
A osteotomia de deslocamento medial foi realizada pela
primeira vez por Chiari(5), que a indicou para todos os quadris com cobertura insuficiente da cabeça femoral. Posteriormente, Chiari(6) restringiu o uso dessa cirurgia às crianças portadoras de displasia congênita do quadril com idade
acima de quatro anos. Com o surgimento de técnicas que
proporcionam o aumento da cobertura da cabeça do fêmur
pela cartilagem hialina acetabular, tais como as osteotomias
de Salter(18) e Pemberton(16), a cirurgia de Chiari(5) passou a
ser considerada um procedimento de salvação(7).
Na doença de Legg-Calvé-Perthes (DLCP), a osteotomia
de Chiari(5) tem sido indicada em pacientes com subluxação
acentuada, deformação grave da cabeça femoral e limitação
intensa dos movimentos do quadril acometido(1-3,8,10,19,20), bem
como no tratamento de seqüelas tardias(13).
O objetivo deste trabalho é analisar os resultados da osteotomia de Chiari(5) em um grupo de nove pacientes com
DLCP unilateral, com grande comprometimento da cabeça
femoral e presença de deformidades, como demonstradas pela
artrografia pré-operatória. Foram utilizados os critérios de
Mose(14,15) para a avaliação da esfericidade da cabeça femoral e as classificações de Robinson et al.(17) e de Stulberg et
al.(20) para a análise dos resultados clínico e radiográfico, respectivamente.
MATERIAL E MÉTODO
Durante o período de janeiro de 1987 a abril de 1994, nove
pacientes portadores de DLCP foram submetidos à osteotomia de Chiari(5,6), no Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Federal de São Paulo-Escola Paulista de Medicina (Serviço do Prof. Dr. José Laredo Filho). Todos os pacientes eram do sexo masculino. A idade no momento da cirurgia variou de 6 a 14 anos e 3 meses (média de
9 anos e 6 meses). Em relação à cor, havia oito (88,88%)
pacientes brancos e um (11,12%) não branco. A doença apresentou-se unilateral em todos os casos; o lado afetado foi o
direito em quatro (44,45%) e o esquerdo em cinco (55,55%)
pacientes.
O estudo radiográfico incluiu a análise de radiografias pré
e pós-operatórias, na incidência ântero-posterior de bacia com
os quadris em posição neutra e de Lauenstein, para a determinação da fase evolutiva da doença e o grau de lesão.
O estadiamento da doença, segundo critérios de Waldenström(21) modificados por Jonsäter(9), revelou oito (88,88%)
2
quadris na fase de fragmentação e um (11,12%) na de reossificação.
Os quadris em estágio de fragmentação foram classificados segundo Catterall(4): seis (75,00%) estavam no grupo 3 e
dois (25,00%) no grupo 4; todos apresentavam dois ou mais
sinais de cabeça em risco(4).
O ângulo centro-borda de Wiberg(22) foi medido na radiografia ântero-posterior neutra antes da cirurgia, no pós-operatório à época da retirada dos fios cerca de seis semanas
após a osteotomia e no último retorno ambulatorial.
A artrografia pré-operatória, analisada segundo a classificação de Laredo(12), mostrou cinco (55,55%) quadris no grupo IV e quatro (44,45%) no grupo V.
Utilizamos a radiografia simples da bacia em incidência
ântero-posterior realizada em torno de seis semanas após a
cirurgia, para a mensuração do ângulo formado entre a osteotomia e a linha imaginária que passa pela cartilagem trirradiada de ambos os quadris. Esse ângulo foi definido como
sendo a inclinação da osteotomia, que foi dividida em dois
tipos: tipo I abaixo de 15º e tipo II acima de 15º.
O tratamento cirúrgico consistiu na realização da osteotomia de Chiari(5,6); três (33,34%) pacientes permaneceram com
imobilização gessada pós-operatória e em seis (66,66%) pacientes a osteotomia foi fixada por meio de pinos rosqueados ou parafusos, dispensando a imobilização após a cirurgia.
A avaliação dos resultados clínicos levou em conta a presença de dor, limitação funcional e dismetria. Utilizamos a
classificação de Robinson et al.(17): o quadril sem dor e com
arco de movimento normal é classificado como bom resultado; o resultado é regular quando o quadril está sem dor e
com arco de movimento limitado; o mau resultado é aquele
em que ocorre limitação de movimento no quadril, associada à dor após atividade ou em repouso.
O resultado radiográfico incluiu a análise da esfericidade
da cabeça femoral, segundo os círculos concêntricos de Mose(14,15), em que a ausência de desvio do contorno da epífise
nas radiografias nas incidências frente e perfil é considerada
como bom resultado. Havendo desvio de até 2mm em uma
ou ambas as incidências, o resultado é considerado regular.
Se o desvio for maior que 2mm, o resultado é considerado
mau.
O resultado radiográfico anatômico foi baseado nas classes de Stulberg et al.(20): na classe I o quadril é normal; na
classe II a cabeça femoral é esférica, porém aumentada de
tamanho, com ou sem encurtamento do colo e aumento da
inclinação do teto acetabular; na classe III a cabeça está ovóiRev Bras Ortop _ Vol. 33, Nº 1 – Janeiro, 1998
OSTEOTOMIA DE CHIARI NA DOENÇA DE PERTHES
de e sem achatamento, acompanhada de alterações no colo e
acetábulo; na classe IV a cabeça femoral encontra-se achatada e existem alterações no colo e acetábulo; na classe V a
cabeça femoral está achatada, sem alterações do colo e acetábulo.
A avaliação clínica segundo os critérios de Robinson et
al.(17) foi boa em três (50%) pacientes e regular nos outros
três (50%) pacientes. Nas tabelas 2 e 3, podemos observar a
correlação entre o resultado clínico(17) e as classificações de
Laredo(12) e de Stulberg et al.(20).
RESULTADOS
O tempo médio de acompanhamento dos pacientes no pósoperatório foi de quatro anos e nove meses, com variação de
um ano e cinco meses a oito anos e cinco meses.
A avaliação clínica foi realizada em seis pacientes
(66,66%): em relação à marcha, dois pacientes (33,33%) apresentavam marcha claudicante e quatro (66,67%) deambulavam normalmente. A discrepância de comprimento entre os
membros inferiores apresentou média de 1,42cm, com variação de 0,5 a 3cm. O sinal de Trendelenburg foi positivo em
três (42,85%) pacientes.
Ao estudo radiológico, o ângulo centro-borda de Wiberg(22),
medido no pré-operatório, teve variação de 7º a 26º, com
média de 17º. À época da retirada dos pinos, cerca de seis
semanas após a cirurgia, o ângulo aumentou para média de
34,33º (variação 26º a 48º). Na avaliação final, a medida
variou de 14º a 60º, com média de 34,00º.
Em relação ao ângulo de inclinação da osteotomia (tabela
4), encontramos quatro osteotomias do tipo I, todas apresentando diminuição do ângulo de Wiberg no seguimento pósoperatório. Dentre cinco osteotomias incluídas no tipo II,
quatro apresentaram aumento do ângulo na avaliação final.
À avaliação da esfericidade da cabeça femoral pelo método de Mose(14,15), encontramos um (11,12%) paciente com
bom resultado, cuja artrografia pré-operatória pertencia ao
grupo IV de Laredo(12); dois (22,22%) pacientes evoluíram
com resultado regular, um deles com artrografia classificada
no grupo IV e outro no grupo V de Laredo(12); oito (66,66%)
pacientes apresentaram mau resultado, dos quais cinco estavam no grupo IV e três no grupo V de Laredo(12).
Analisando o resultado radiográfico segundo a classificação de Stulberg et al.(20) (tabela 1), encontramos três quadris
(33,34%) na classe II, dos quais dois eram do grupo IV e um
do grupo V de Laredo(12); três (33,33%) quadris foram incluídos na classe III, sendo dois do grupo IV e um do grupo
V de Laredo(12); e na classe IV de Stulberg et al.(20) tivemos
três (33,33%) quadris, com um quadril do grupo IV e dois do
grupo V de Laredo(12).
Nenhum paciente apresentou dor no membro acometido
após atividade; a rotação interna foi o movimento mais freqüentemente limitado (três pacientes – 42,85%).
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TABELA 1
Distribuição do resultado radiográfico de Stulberg(20),
segundo os grupos de Laredo(12)
Stulberg
Classe II
Classe III
Classe IV
Total
Laredo IV
Laredo V
2 (40,00%)
1 (25,00%)
2 (40,00%)
1 (25,00%)
1 (20,00%)
2 (50,00%)
5 (100%)
4 (100%)
Total
3 (33,34%)
3 (33,34%)
3 (33,33%)
9 (100%)
TABELA 2
Distribuição do resultado clínico,
segundo a classificação de Laredo(12)
Robinson
Bom
Regular
Ruim
Total
Laredo IV
Laredo V
2 (50,00%)
1 (50,00%)
2 (50,00%)
1 (50,00%)
–
–
4 (100%)
2 (100%)
Total
3 (50,00%)
3 (50,00%)
–
6 (100%)
TABELA 3
Distribuição do resultado clínico,
segundo a classificação de Stulberg(20)
Stulberg
Classe II
Classe IV
Total
Robinson bom
1 (33,34%) 1 (33,33%)
Robinson regular
–
1 (33,33%)
Robinson ruim
–
–
1 (33,33%)
2 (66,67%)
–
3 (100%)
3 (100%)
–
Total
3 (50,00%)
6 (100%)
1 (16,67%)
Classe III
2 (33,33%)
TABELA 4
Ângulo da osteotomia e sua relação com a alteração
do ângulo de Wiberg no segmento pós-operatório
Iniciais
Wiberg POI
Wiberg FINAL
Ângulo da osteotomia
A.F.P.
F.M .B.
M .F.T.
J.R.V.P.
E.M .A.
E.G.
L.L.M .
E.R.S.O.
E.M .F.
28º
30º
35º
32º
32º
26º
48º
30º
48º
14º
24º
30º
25º
33º
36º
60º
36º
48º
8º
12º
7º
10º
26º
16º
23º
24º
22º
3
A. ISHIDA, S.S. KUWAJIMA, C. MILANI, H. SODRÉ, M.K. ADAMES & J.R. BENBASSAT
Fig. 1 – F.M.B., masculino, dez anos, doença de Perthes à esquerda. A) Radiografia pré-operatória em AP neutro,
mostrando ângulo de cobertura de 11º. B) Radiografia pré-operatória em perfil. C) Artrografia pré-operatória em AP
neutro, mostrando achatamento acentuado da cabeça femoral esquerda (grupo IV de Laredo). D) Artrografia em AP
com 30º de abdução, evidenciando extrusão e abdução em dobradiça. E) Radiografia pós-operatória cerca de seis
semanas após a osteotomia de Chiari, mostrando aumento da cobertura para 38º. F) Radiografia pós-operatória cerca
de seis semanas após a cirurgia, mostrando a osteotomia com inclinação de 12º. G) Radiografia em AP neutro, cinco
anos e dez meses após a cirurgia, mostrando diminuição do ângulo de Wiberg para 24º. H) Radiografia em perfil, cinco
anos e dez meses após a osteotomia.
4
Rev Bras Ortop _ Vol. 33, Nº 1 – Janeiro, 1998
OSTEOTOMIA DE CHIARI NA DOENÇA DE PERTHES
Fig. 2 – E.R.S.O., masculino, sete anos e sete meses, doença de Perthes à direita. A) Radiografia pré-operatória em AP
neutro, mostrando ângulo de Wiberg de 8º. B) Radiografia pré-operatória em abdução e rotação interna evidenciando
extrusão da cabeça femoral direita. C) Artrografia em AP neutro, mostrando a cabeça femoral com deformidade em sela
(grupo V de Laredo). D) Artrografia em AP em 30º, na qual podemos observar a não centralização da cabeça e a
presença de acúmulo de contraste na porção medial da articulação. E) Radiografia pós-operatória em AP neutro, seis
semanas após a osteotomia de Chiari, mostrando aumento do ângulo de Wiberg para 32º. F) Radiografia em AP com
seis semanas de pós-operatório, mostrando a osteotomia com inclinação de 20º. G) Radiografia em AP neutro mostrando que o ângulo de Wiberg aumentou para 40º, três anos e seis meses após a cirurgia. H) Radiografia em posição de
Lauenstein, com três anos e seis meses de pós-operatório.
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A. ISHIDA, S.S. KUWAJIMA, C. MILANI, H. SODRÉ, M.K. ADAMES & J.R. BENBASSAT
DISCUSSÃO
Em nossos pacientes o ângulo centro-borda de Wiberg(22)
apresentou valor médio pré-operatório de 16,63º, o qual está
abaixo do limite inferior dos padrões normais em relação à
idade estudada(11,22). No momento da retirada dos pinos, houve aumento para 33,36º. Após a avaliação final o ângulo mediu 31,90º em média, evoluindo para valores dentro da normalidade. Houve, portanto, aumento médio da cobertura acetabular de 15,27º, valor este semelhante ao encontrado por
Lack et al.(10) e abaixo do relatado por Bennett et al.(2). Este
último, entretanto, tratou pacientes com ângulo pré-operatório acima de nossa média.
O ângulo de inclinação da osteotomia teve influência sobre a presença ou não de reabsorção da cobertura obtida após
a cirurgia (tabela 4). Podemos observar que em todas as crianças em que a inclinação foi menor que 15º houve diminuição
do ângulo de Wiberg(22), desde o pós-operatório imediato até
a avaliação final (figura 1, A a H). Quando a inclinação foi
maior que 15º, o ângulo de Wiberg(22) permaneceu estável
em um paciente e aumentou em outros quatro (figura 2, A a
H). Nossos achados vão ao encontro do conceito original de
Chiari(5), que preconiza inclinação mínima de 15º da osteotomia, para que o novo teto obtido após a cirurgia se constitua num apoio efetivo à cabeça femoral.
Nossos resultados obtidos segundo o método de Mose(14,15)
são semelhantes aos da literatura(2). Em relação à artrografia
pré-operatória, apenas 20% dos quadris do grupo IV (achatamento da cabeça) e 25% dos quadris do grupo V (com deformidade em sela) de Laredo(12) evoluíram para forma esférica e ovóide, demonstrando que estes quadris ainda tinham
algum potencial de remodelação. Esse resultado pode ter ocorrido pela idade média avançada (nove anos e quatro meses)
de nossos pacientes no momento da cirurgia, a qual não permitiu o aproveitamento de todo o potencial de remodelação
que esses quadris poderiam apresentar em idades menores.
Na avaliação do resultado radiográfico segundo as classes
de Stulberg et al.(20), observamos que 71,42% dos quadris
pertencentes ao grupo IV de Laredo(12) evoluíram com resultados satisfatórios (classes II e III) e 50% dos pacientes que
estavam no grupo V também foram incluídos nestas classes
(tabela 1). Assim, apesar da deformidade preexistente na cabeça cartilaginosa femoral, a osteotomia de Chiari(5,6) proporcionou melhora da cobertura acetabular, com conseqüente remodelação parcial da cabeça femoral.
Em relação à classificação de Robinson et al.(17) (tabelas 2
e 3), observamos que 57,15% dos quadris avaliados evoluí6
ram com bom resultado, apesar da presença de deformidades
residuais acentuadas em 50% deles (classe IV de Stulberg et
al.(20)). Isto demonstra-nos que a avaliação clínica tem pouca
relação com o resultado radiográfico final, não descartando
a possibilidade do desenvolvimento de artrose no futuro, esperado principalmente nas classes IV e V de Stulberg et al.(20).
Nossos achados sugerem que a osteotomia de Chiari, apesar de ser considerada uma cirurgia de salvação, constitui
uma opção de tratamento em alguns casos de DLCP. Sua
realização deve ser limitada aos pacientes portadores de deformidades significativas e extrusão acentuada da cabeça femoral. Quando inclinada, deve ser feita o quanto antes possível, de maneira a aproveitar melhor o potencial de remodelação porventura existente.
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