Doenças os teoarticulares degenerativas
Doenças os teoarticulares degenerativas periféricas
Peripheral degenerative joint diseases
Nilzio Antonio da Silva 1, Ana Carolina de Oliveira e Silva Montandon 2, Michelle Vasconcelos da Silva Prado Cabral3
RESUM O
A os teoartrite é uma afecção degenerativa da cartilagem hialina
articular que acomete, mais frequentemente, pes s oas acima
dos 50 anos de idade. Manifes ta-s e por dor, rigidez e prejuízo
funcional da articulação atingida. Clas s ifica-s e em primária (ou
idiopática) e s ecundária. Alguns fatores de ris co s ão genética,
etnia, idade, s exo, obes idade, atividades ocupacionais e alterações
biomecânicas articulares . Quais quer que s eja a localização e a
caus a, a patogênes e s e cons titui em mudanças catabólicas , com
inibição da s íntes e e tentativa de reparo da matriz cartilaginos a.
Ações de metaloproteinas es e de citocinas (IL-1, IL-6 e TNF-α)
s ão res pons áveis pelos s inais inflamatórios que ocorrem e pela
degradação da cartilagem. As formas mais freqüentes de os teoartrite
periférica ocorrem em joelho, coxofemoral e mão, s endo a dor o
s intoma mais importante, quas e s empre des proporcional aos
achados radiológicos . O diagnós tico s e fundamenta nos as pectos
clínicos , laboratoriais e de imagem. As as s ociações científicas
recomendam um roteiro de tratamento que envolve recurs os não
farmacológicos (educação, fis ioterapia, órtes es ), farmacológicos
(analgés icos , antiinflamatórios , infiltrações de corticóides ,
vis cos s uplementação, medicamentos de ação lenta) e cirurgia. A
artroplas tia parece s er a mais efetiva das medidas , mas é res trita a
cas os que não res ponderam às outras ações .
Descritores: Os teoartrite/terapia; Os teoartrite/etiologia; Os teoartrite/
quimioterapia; Injeções intra-articulares ; Glucocorticóides /us o
terapêutico; Idos o
ABSTRACT
Os teoarthritis , a degenerative joint dis eas e, is the mos t common
rheumatic dis order mainly in a geriatric population. Manifes tations
are pain, s tiffnes s and functional los s in the affected joint.
According to etiology it is clas s ified as primary (or idiopathic)
and s econdary. Some ris k factors for dis eas e development are
genetics , race, age, s ex, obes ity, occupational activities and
articular biomechanics . Pathogenes is is the s ame for any caus e or
localization, being catabolic alterations , w ith s ynthes is , inhibition
and reparing intent of the cartilage matrix. Metalloproteinas es and
cytokines (IL-1,IL-6,TNF-α) actions promote inflammatory reaction
and cartilage degradation. Pain, the mos t important s ymptom,
does not correlate w ith radiologic findings . Peripheral os teoarthritis
occurs predominantly in the knee, hip and hand. Diagnos is is bas ed
on clinical features , laboratorial tes ts and radiological changes .
Rheumatological as s ociations ’ guidelines for treatment include
non-pharmacologic (education, phys iotherapy, as s is tive devices ),
and pharmacologic (analges ics , anti-inflammatory drugs ) therapy
and s urgery. Arthroplas ty s eems to w ork better than medicines , but
s hould be us ed if other treatments have failed.
Keyw ords: Osteoarthritis/therapy; Osteoarthritis/etiology; Osteoarthritis/
drug therapy; Injections, intra-articular; Glucocorticoids/therapeutic use;
Aged
INTRODUÇÃO
O conceito de doença osteoarticular degenerativa
pressupõe anormalidade na cartilagem hialina, que
determina sintomatologia de variável intensidade e
comprometimento da função. O quadro clínico recebe a designação de artrose, osteoartrose ou, como é
preferido atualmente, osteoartrite (OA). O processo
degenerativo ou degradativo da cartilagem articular
pode ser primário ou secundário a diferentes causas,
tais como: doenças hereditárias, doenças endócrinas, desarranjos articulares e doenças inflamatórias(1)
(Quadro 1).
Quadro 1. Caus as de os teoartrite
Causas
hereditárias
Ocronose, hemoglobinopatias, doença de Gaucher,
hemocromatose, doença de W ilson, hemofi lia,
displasias ósteo-articulares, hiperelasticidade
e síndrome de Ehler-Danlos
Causas endócrinas
e adquiridas
Fratura articular, meniscectomia, osteonecrose,
neuroartropatia, enregelamento, obesidade, doença de
Paget, acromegalia, hipotireoidismo e hiperparatiroidismo
Causas
inflamatórias
Artrite séptica, artrite reumatóide, gota, condrocalcinose,
artrite reativa
1
Professor Titular de Reumatologia da Faculdade de M edicina da Universidade Federal de Goiás – UFG, Goiânia (GO), Brasil.
2
M édica Reumatologista do Centro de Reabilitação e Readaptação – CRER Dr. Henrique Santillo, Goiânia (GO), Brasil.
3
Residente do Serviço de Reumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de M edicina da Universidade Federal de Goiás – UFG, Goiânia, (GO), Brasil.
Autor correspondente: Nilzio Antonio da Silva – Rua 115, 690 – Setor Sul – CEP 74085-240 – Goiânia (GO), Brasil – Tel.: 62 3241-5553 – e-mail: nasilva@ terra.com.br
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Silva NA, M ontandon ACOS, Cabral M VSP
A cartilagem hialina articular é um gel, em que estão incluídos os condrócitos, fibras colágenas e a matriz,
que é formada por ácido hialurônico, proteoglicanos,
agrecanos, água e eletrólitos.
É a mais freqüente doença articular e tem a prevalência aumentada com a idade mais avançada, afetando
mais de 75% de pessoas acima de 65 anos de idade, e
10% dos que têm mais de 60 anos possuem limitação
física por OA. Acima dos 50 anos de idade, incide mais
em mulheres, em mãos, joelhos e pés. No Brasil, a prevalência da OA é estimada em 16% (2).
Com o crescente aumento da população de idosos,
a expectativa é da ocorrência de maior número de casos
de OA e, conseqüentemente, maior impacto socioeconômico.
Esses dados justificam o interesse na busca de novos conhecimentos sobre os mecanismos que levam ao
distúrbio da homeostase da matriz cartilaginosa e de
recursos eficazes que possam contribuir para combater
a dor e a disfunção das articulações, principalmente as
que suportam o peso corporal.
ETIOPATOGENIA
A osteoartrite resulta de um processo bioquímico mais
reparador do que degenerativo. Fatores de risco sistêmicos e locais são considerados importantes na ativação da predominante ação catabólica na cartilagem (3)
(Quadro 2).
Quadro 2. Fatores de ris cos s is têmicos e locais
Sistêmicos
Locais
Idade
Lesão articular
Etnia
Obesidade
Sexo e características hormonais
Ocupação
Genética
Esportes
Densidade óssea
Biomecânica da articulação
Fatores nutricionais
Força muscular
Os fatores de risco sistêmicos cooperam para a
predisposição de uma articulação vulnerável à osteoartrite. As diferenças étnicas que revelam que a osteoartrite de quadril e mãos é menos freqüente entre
chineses do que em norte-americanos, por exemplo,
e podem ser justificadas tanto por aspectos genéticos como também pela diferença de massa corpórea,
nutrição e estilo de vida entre esses grupos. A idade
favorece a prevalência da doença, pois no envelhecimento fisiológico se perdem os mecanismos protetores
da articulação, tais como: a capacidade dos condrócitos responderem aos fatores de crescimento; acúmulo
de produtos de degradação da cartilagem que inibem
a síntese e reparação por parte dos condrócitos; propriocepção afetada pela diminuição da força muscular
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e da lentidão aos estímulos neurológicos; cartilagem
mais fina, com maior predisposição a microfraturas
e à aceleração da degeneração articular. Quanto ao
sexo, os homens têm maior incidência de OA de quadril, enquanto nas mulheres, as mãos, joelhos e pés
são mais afetados, podendo justificar essas diferenças
as manifestações de desordens articulares da infância,
mais associadas com determinado grupo de doenças
(Legg-Calvé-Perthes) e o tipo de atividade física e laborativa exercidas. A função hormonal nas mulheres
relacionando o estrógeno com osteoartrite revela-se,
até o momento, ambígua. Ora é assinalada ação protetora, uma vez que a reposição de estrógeno está associada com uma progressão mais lenta e menos grave
da doença, ora com ação deletéria, já que a mesma
reposição está envolvida com risco aumentado de OA
em mãos e joelhos. A predisposição genética está bem
estabelecida na manifestação da OA primária com característica poligênica, porém de forma associada, pois
os fatores ambientais estão envolvidos fortemente na
expressão gênica. A principal alteração genética relacionada é a mutação dominante autossômica do gene
do procolágeno tipo II, que é responsável pela expressão do colágeno tipo II (principal componente da cartilagem articular). Fatores nutricionais possivelmente
relacionados com OA seriam agentes antioxidantes
que, por sua vez, são condroprotetores. Foi observado que pacientes com baixa concentração de vitamina
D apresentam três vezes mais chance de desenvolver
OA do que aqueles com concentração de vitamina D
normal(4-5) . Estudos recentes têm demonstrado que
pacientes com concentração diminuída de vitamina K
sérica têm maior incidência de formação de osteófitos
em mãos e joelhos(6) .
Dentre os fatores locais que estão associados com
o desenvolvimento da OA, podemos citar alterações
articulares ou periarticulares prévias como fraturas de
superfície articular, lesão de ligamentos e de meniscos. A obesidade está duplamente associada à OA de
joelhos, tanto como fator predisponente quanto uma
constatação de que pacientes que apresentam OA de
joelhos ganham peso posteriormente e pioram clínica e radiologicamente. Outra associação é obesidade
com OA de quadril bilateral e com OA da trapéziometacarpiana (rizartrose), o que faz supor que seria
também um fator de risco sistêmico. Existe risco aumentado de OA de joelhos em pacientes que realizam
atividades laborativas que exigem ajoelhar e agacharse freqüentemente, como nos operários de intenso
trabalho braçal (mineradores, trabalhadores de doca,
trabalhadores de estaleiro). A prevalência de OA de
quadril aumenta em duas a oito vezes em lavradores
devido ao uso de cargas e longas caminhadas em terrenos irregulares. Práticas desportivas que resultam em
Doenças osteoarticulares degenerativas periféricas
lesões ligamentares, meniscais ou fraturas aumentam
o risco de desenvolver OA. Alterações na biomecânica
articular tais como frouxidão ligamentar, displasia articular, instabilidade, distúrbios na inervação articular
ou de músculos, assim como força e condicionamento
inadequado favorecem o aparecimento de OA. A ação
da carga sobre a articulação, quando moderada, mostra-se benéfica por aumentar a síntese de proteoglicanos e tornar a cartilagem mais espessa, porém carga
excessiva e contínua age suprimindo a ação metabólica
da cartilagem, inibindo síntese de proteoglicanos e favorecendo o dano tecidual(4) .
Na fase inicial da OA, ocorre fibrilação e irregularidades da camada superficial da cartilagem articular,
que se estende para demais camadas com posterior desenvolvimento de microfissuras. Em estágio mais avançado, com a perda da cartilagem e exposição do osso
subcondral com microfraturas trabeculares, há ativação
osteoblástica, que determina esclerose óssea, formação
de cistos subcondrais e osteófitos, sendo que estes geralmente estão na periferia articular. Estudos recentes
têm sugerido que o envolvimento inicial ocorre no osso
subcondral e que este favorece a liberação de citocinas
e outros mediadores inflamatórios que atingiriam a cartilagem promovendo a sua degradação (3-5).
A degeneração da cartilagem articular causa alterações secundárias na membrana sinovial, ligamentos e
músculos. Do ponto de vista celular, a OA é resultado
do desequilíbrio entre processo de síntese e destruição
da cartilagem articular, incluindo alterações na matriz
extracelular (produção aumentada, porém de qualidade
anormal de proteoglicanos, diminuição na produção de
colágeno tipo II e, em estágios mais avançados, a concentração de proteoglicanos se torna inferior a 50% do
normal), condrócitos com pouca responsividade para a
síntese, seja pela sua senescência, ou por dano mecânico associado com morte celular (4-5).
Embora a OA seja considerada uma doença nãoinflamatória, alterações articulares estão associadas
à inflamação. A membrana sinovial, em resposta aos
fragmentos de cartilagem no líquido sinovial, produz
metaloproteinases (MMP-2 e MMP-9) e citocinas como
IL -1, IL -6 e TNF-α. A IL -1, mais do que as demais citocinas, está associada com estímulo aos sinoviócitos que
irão produzir prostaglandina E2, resultando em dor e
inflamação. Trata-se de potente interleucina causadora
de degradação cartilaginosa por meio da liberação aumentada de metaloproteinases e da inibição de síntese
de matriz extracelular (4-5).
Algumas articulações envolvidas podem permanecer
assintomáticas, apesar das alterações histológicas e
radiológicas(7) . Naquelas com manifestações clínicas,
o início é geralmente insidioso, sendo raro o paciente que consegue identificar com precisão a data de
início dos sintomas. No início do quadro, geralmente
ocorre sensação de desconforto articular relacionado
ao uso, que pode estar acompanhado de leve rigidez
articular, dor muscular e comprometimento da movimentação da articulação envolvida (8) . É o caso, por
exemplo, de um paciente que relata dificuldade para
calçar as meias ou sapatos. A doença é de evolução
lenta, sendo a procura por auxílio médico freqüentemente retardada em alguns meses e mesmo anos.
D escreveremos, então, as manifestações clínicas relacionadas à OA e geralmente comuns a todos os sítios
articulares envolvidos.
• Dor: é o sintoma mais importante na OA, com intensidade variável. Pode ser localizada na articulação
comprometida assim como pode ser referida em outra região não acometida. Apresenta pobre correlação radiológica. Tende a ser pior nas mulheres, no
final do dia e da semana e naqueles com distúrbios
afetivos (ansiedade e/ou depressão) (7). Seu início está
principalmente associado ao uso da articulação, ocorrendo segundos ou minutos após a movimentação articular e melhorando com o repouso. Nos casos mais
avançados a dor, pode permanecer por horas após a
interrupção da atividade, assim como pode ocorrer
dor noturna. A causa da dor é variável, dependendo
do estágio da doença, conforme Quadro 3.
Quadro 3. Caus as de dor na os teoartros e
Possíveis causas de dor na OA
Aumento da pressão intraóssea por congestão vascular do osso subcondral
Sinovite leve a moderada
Alterações periarticulares (deformidades articulares)
Elevação periosteal
Alterações musculares (fadiga, contratura).
Amplifi cação da dor (fi bromialgia)
•
•
QUADRO CLÍNICO
A OA compreende um grupo heterogêneo de condições com padrões variados de expressão clínica.
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R igidez: a sensação de rigidez articular é relatada
pela maioria dos pacientes com OA, principalmente após períodos de inatividade. Pode ser intensa,
porém é de curta duração (alguns minutos). Alguns
pacientes podem apresentar rigidez articular pela
manhã por um período mais prolongado, porém inferior a 30 minutos(7).
Edema articular: o edema é, geralmente, palpável
e dolorosos nas articulações periféricas. Em alguns
casos pode interferir na realização do movimento
articular. Ocorre tanto por derrame articular, quanto pela presença de sinovite (7).
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•
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Crepitações: são observadas durante a movimentação da articulação acometida. É peça chave para o
diagnóstico diferencial com outras condições que
causam dor articular (9). Pode ser tanto palpável
quanto audível ao exame físico.
Incapacidade funcional: está geralmente relacionada à dor, a redução da amplitude de movimento e
ao comprometimento da força muscular.
Deformidades: são consideradas a expressão clínica
da destruição articular, seja por dano à cartilagem,
ao osso ou a partes moles periarticulares(7). Freqüentemente, são acompanhadas de instabilidade
da articulação acometida.
Formas clínicas da osteoartrite
Embora a OA seja um processo degradativo que pode
atingir potencialmente qualquer articulação diartrodial,
algumas articulações comprometidas pela doença são
de particular importância, pela freqüência, gravidade e
incapacidade que provocam.
Osteoartrite de joelhos (gonartrose)
A gonartrose é geralmente bilateral, embora assimétrica, podendo ocorrer acometimento dos três compartimentos (medial, lateral e femoro-patelar) de forma isolada ou em combinação. Os tipos de acometimento mais
freqüente são: medial isolado, femoro-patelar isolado e
a combinação do medial com o femoro-patelar (7).
Os pacientes com OA de joelhos geralmente irão
se enquadrar em duas categorias: os adultos jovens,
freqüentemente do sexo masculino, com doença restrita ao joelho, relacionada a trauma ou cirurgia (meniscectomia) prévia; os indivíduos de meia idade ou
idosos, com predominância de mulheres, algumas vezes também com sintomas relacionados a outros sítios
articulares(7-8).
Os sintomas dominantes incluem dor do tipo mecânica, que piora com a sobrecarga, e surge no início da
marcha, melhorando com o decorrer da deambulação
e com o repouso, e se intensifica no fim do dia. Outras
queixas freqüentes incluem rigidez articular e dificuldade, principalmente, para subir e descer degraus. Os
achados de exame físico dependem da distribuição e intensidade do dano articular. Assim, podem ser observados atrofia da musculatura do quadríceps femoral, dor à
palpação da interlinha articular, derrame articular leve
a moderado, crepitações e limitação dolorosa a flexão
total do joelho. As alterações do compartimento medial
geralmente resultam em deformidade em varo. Na OA
patelo-femural ocorrem dor, crepitação à palpação da
patela e rigidez. A instabilidade ligamentar pode ocorrer nos casos mais graves(9).
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O quadro clínico é dominado por crises de duração
variável (dias ou semanas), entretanto, pode ocorrer
melhora espontânea no número e intensidade das crises
em alguns casos.
Osteoartrite de quadril (coxartrose)
A OA que atinge a articulação coxofemoral é uma das
formas mais dolorosas e incapacitantes.
São considerados três padrões de distribuição na
OA de quadril, sendo o acometimento súpero-lateral o
mais comum (60% ). Os demais correspondem à doença medial (25% ) e ao comprometimento axial (15% )
(7)
. O OA de quadril é discretamente mais freqüente
nos homens, na faixa etária dos 50 anos, sendo geralmente unilateral. O principal sintoma é dor à deambulação. A localização da dor é variável, podendo ser
referida na região glútea, inguinal, face anterior da
coxa ou joelho. Pode ocorrer ainda rigidez articular
pós-inatividade e redução da amplitude de movimento do quadril. No início da doença, observa-se principalmente comprometimento da abdução do quadril,
antes mesmo que ocorra acometimento da flexão e da
rotação interna. Com a evolução da doença, a rotação
interna se torna o movimento mais acometido. Crepitações podem ser audíveis em alguns casos, porém
não são percebidas à palpação. Atrofia da musculatura
glútea e da coxa podem ser observadas, o que resulta em uma marcha típica antálgica e em incapacidade
funcional de grau variável. A fraqueza da musculatura
glútea pode ser confirmada ao exame físico pela positividade do sinal de Trendelenburg (incapacidade de
elevar a pelve quando o paciente descarrega seu peso
sobre o lado acometido). Nos casos mais avançados,
observa-se encurtamento do membro acometido, em
decorrência da migração da cabeça femoral(8) .
A evolução da doença é variável, entretanto, a sintomatologia geralmente permanece estática por um longo
período, sendo raros os casos de evolução rapidamente
progressiva.
Osteoartrite de mãos
A mão é freqüentemente comprometida pela OA. Na artrose de mãos, podem-se distinguir dois grandes grupos
ou formas de comprometimento: a OA nodal e suas variantes e OA da trapézio-metacarpiana ou rizartrose:
• OA nodal (OAN): é bem mais freqüente nas mulheres de meia idade, estando associada à obesidade
e a OA de joelhos(7). Compromete as articulações
interfalangianas proximais (IFP) e as distais (IFD),
local em que se desenvolvem saliências ósseas de
aspecto nodular facilmente identificável, na face
dorsolateral das falanges, denominadas de nódu-
Doenças osteoarticulares degenerativas periféricas
los de Heberden, quando localizados nas IFD, e de
Bouchard, quando nas IFP (8) (Figura 1). Esses nódulos são considerados a marca registrada da OA
de mãos. Os nódulos de Heberden são múltiplos e
de aparecimento gradual, quase sem dor. Contudo
em alguns casos, a evolução é mais rápida, com dor
e sinais inflamatórios locais. Já os nódulos de Bouchard são menos freqüentes, geralmente dolorosos,
e levam ao aumento da articulação. Tanto os nódulos de Heberden como os de Bouchard evoluem
com alterações de alinhamento articular, levando
ao desvio articular e/ou flexão anterior. Conseqüentemente, pode-se surgir dificuldade na realização de
movimentos finos com as mãos;
S25
nohumeral. Todas essas articulações podem ser sedes
de OA.
No caso da articulação esternoclavicular, as alterações radiológicas da OA são comuns, mas raramente
causam problemas, podendo estar associada à subluxação articular. A OA da articulação acromioclavicular
é a mais freqüente, sendo causa de ombro doloroso e
durante o exame físico, ocorre dor à palpação da articulação e à movimentação do ombro, principalmente
durante a adução forçada (7).
A OA da glenohumeral é incomum, exceto nas mulheres idosas e naqueles com lesões do manguito rotador. Manifesta-se com dor principalmente a rotação
externa e elevação do ombro, assim como limitação a
movimentação ativa e passiva (7).
Osteoartrite dos pés
É comum o desenvolvimento de processo artrósico na
primeira articulação metatarsofalangiana, o qual pode
ser secundário a um hálux valgo. É mais freqüente nas
mulheres, uma vez que nessas, a articulação está submetida a maior pressão (uso de sapatos de salto e bico
fino). O início é insidioso, com dor à deambulação e
limitação dolorosa aos movimentos de flexão e extensão
do primeiro artelho. Às vezes, acompanha-se de tumefação e dor relacionada com a inflamação da bolsa serosa da face interna da articulação.
Figura 1. Os teoartrite de interfalangianas dis tais (Nódulos de Heberden)
•
Rizartrose: é a forma mais comum da síndrome osteoartrítica da mão e ocorre frequentemente associada à OA nodal. É geralmente mais dolorosa e incapacitante do que a doença das interfalangianas(9).
A dor é geralmente referida na região do punho,
podendo ser reproduzida a palpação da primeira
carpo-metacarpiana, a qual também pode evidenciar
a presença de crepitação. Nos casos mais intensos,
ocorre quadratura da base do polegar acompanhada
de deformidade em adução, comprometendo a capacidade funcional do polegar, do qual depende praticamente a eficiência da mão, pois é responsável pelos
movimentos de pinça e preensão. A evolução da sintomatologia costuma ser marcada por episódios de
exacerbação e remissão nos primeiros anos. Após um
período variável, as crises de dor melhoram, porém
ocorre redução do movimento articular.
Osteoartrite de ombro
A região do ombro pode ser compreendida em três articulações: a esternoclavicular, acromioclavicular e gle-
Outras formas de osteoartrite
A OA do cotovelo e tornozelo são muito raras, estando ambas relacionadas a alguma injúria prévia, por
isso, geralmente consideradas OA secundárias. No caso
da articulação temporomandibular, o aparecimento das
alterações degenerativas pode estar relacionado à dor e
disfunção dessa articulação.
DIAGNÓSTICO
Clínico, laboratorial e imagem
O diagnóstico de OA periférica se baseia não somente
nas manifestações presentes, mas também na ausência
de sinais e sintomas, e de alterações laboratoriais e radiológicas de outras artropatias.
Na prática, o suporte para o diagnóstico é: hemograma e bioquímica normais; hemossedimentação (e
outras provas de atividade inflamatória) normal ou
discretamente alterada; líquido sinovial com viscosidade normal e número de células inferior a 2.000/mm 3.
Já nas alterações radiológicas ocorrem diminuição do
espaço articular, esclerose subcondral, osteofitos, erosões e luxações.
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O Colégio Americano de Reumatologia (ACR ) estabeleceu critérios de classificação e de relato de OA de
mão, joelho e quadril, considerando os vários aspectos
clínicos, laboratoriais e de imagem (10-12).
A radiologia convencional é mais empregada
para avaliação do diagnóstico, da intensidade e da
evolução da OA (13-14) . Mas a progressão da OA, que
é lenta, tem a avaliação prejudicada pela radiologia
convencional, que não capta as alterações em curtos
períodos de evolução. Nos últimos anos, com o crescente aumento de pesquisas sobre novos medicamentos, surgiram novas necessidades no diagnóstico por
imagem (15) .
A ressonância magnética e o ultra-som são os métodos que podem acrescentar sensibilidade às alterações
mínimas num curto período na OA. Até aqui os dados
obtidos resultam de estudos em OA de joelho (15-16).
A ultra-sonografia tem sensibilidade maior do que o
raio X e comparável à da ressonância magnética (R M)
para detectar erosões nas articulações dos dedos. Já
teve comprovada sensibilidade para diagnosticar alterações cartilaginosas no côndilo femoral e sinovite em
OA de joelho (16).
A R M visualiza diretamente as mais importantes
estruturas anatômicas nas articulações, incluindo os
tecidos moles, sendo capaz de revelar perda de cartilagem, sem as preocupações com posições para obtenção de imagens do raio X convencional. Além disso,
visualiza lesões de menisco, medula óssea e membrana sinovial, as quais podem contribuir para sintomas
associados(17) .
TRATAM ENTO
Mesmo sendo a mais freqüente das doenças reumatológicas, e não tendo a gravidade das doenças autoimunes, como lúpus, artrite reumatóide, a definição do
tratamento destas últimas nos parece ter menor dificuldade do que na OA.
O tratamento da OA periférica tem três objetivos:
aliviar a dor; reduzir a incapacidade funcional; deter a
progressão da doença.
Propõe-se para atingir esses objetivos medidas não
farmacológicas, farmacológicas e cirurgia, que em geral devem obedecer à individualidade e à localização da
OA (18-19). Os seguintes princípios devem ser considerados ao planejar o tratamento:
• o tratamento deve se basear na intensidade dos sintomas e no grau de incapacidade e não na intensidade das alterações radiológicas;
• deve ser priorizado o estilo de vida e aspectos biomecânicos;
• adotar medidas mais complexas somente se as mais
simples falharem.
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As medidas não farmacológicas compreendem:
educação do paciente e dos familiares, fisioterapia e
órteses.
A educação, como parte do tratamento de AO,
consiste em orientar o paciente sobre do que se trata essa doença, motivá-lo para os diversos aspectos do
tratamento, pois é fundamental a aderência para o sucesso do programa. As diferentes localizações da OA
devem merecer instruções especificadas sobre economia articular, como por exemplo, uso racional de objetos domésticos, automação de atividades, cuidados
com rampas e escadas e se conscientizar das limitações
impostas pela doença. Medidas educativas para OA
de joelho têm eficácia comparável a tratamento com
analgésicos ou antiinflamatórios tradicionais (AINH )
e redução do peso.
A Fisioterapia emprega a termoterapia e eletroterapia como coadjuvantes no tratamento da dor. Mas,
consideramos como mais importante auxílio da fisioterapia os exercícios terapêuticos, pois os artrósicos têm
diminuição da mobilidade articular e perda de força,
principalmente dos grupos musculares da região da articulação afetada. Os idosos vivem abaixo ou no limiar
da capacidade física e a mínima interferência pode levar à dependência completa. Devem ser programados
exercícios de alongamento, flexibilidade, fortalecimento muscular e melhora do condicionamento físico.
As órteses são empregadas para estabilizar e poupar esforços de uma articulação. Dessa forma, o uso de
goteiras, palmilhas, bengalas, são úteis para diminuir a
dor e melhorar a função (13-14).
A acupuntura, mesmo não fazendo parte das recomendações do ACR e da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR ), deve ser medida a ser considerada no
tratamento da dor. O suporte para o seu uso é dado por
estudo multicêntrico de 26 semanas, coordenado pelos
Institutos de Saúde dos Estados Unidos (NIH), utilizando como instrumento de avaliação o Western Ontário and McMasters Osteoarthritis Index (WOMAC)
para dor e função, que ao final mostrou um desempenho favorável da acupuntura tradicional chinesa contra
acupuntura simulada (20).
O alívio dos sintomas da OA pode ser obtido com
tratamento farmacológico por via oral, tópica e intraarticular (18-19) . Por via oral são prescritos AINH ou inibidores seletivos de COX-2 (Coxibs). Em virtude do
maior risco de eventos gastrintestinais dos AINH , uma
diretriz da Organização Mundial da Saúde, de 1993,
recomendava a utilização de analgésicos comuns antes daqueles, mas na prática ambas as classes de medicamentos são empregadas como primeira opção e,
às vezes, em associação (21) . Estudos comparativos de
curta duração concluem o benefício similar dos mesmos. Os Coxibs, com menor risco de causar eventos
Doenças osteoarticulares degenerativas periféricas
gastrintestinais, de eficácia comprovada em diversos
e consistentes estudos, e no momento devem obedecer a judiciosa indicação em idoso que apresente
risco de eventos vasculares cardíacos, cerebrais ou
periféricos(22-23) . Estudos comparativos entre AINH e
inibidores COX-2, demonstram eficácia comparável,
mas também revelam que os AINH têm também riscos
cardiovasculares(22-24) .
Para uso tópico, são disponíveis produtos de capsaicina e AINH, de agrado popular, e com respaldo de
associações reumatológicas(18-19).
Injeções intra-articulares ou infiltrações são indicadas quando não se obtém melhora com os analgésicos
e AINH, ou quando há impedimento para o uso desses.
Podem ser feitas com corticóides ou derivados de ácido
hialurônico (viscosuplementação). As infiltrações articulares com corticóides promovem rápido alívio (17,25).
Contudo, seu efeito dura apenas algumas semanas, e
repetições do procedimento podem ser necessárias, o
que pode ser realizado até três vezes por ano na mesma
articulação. A viscossuplementação articular tem indicação controversa: alguns estudos controlados e comparativos com infiltrações de corticóides mostram eficácia e em outros sua ação é comparável à de placebo (26).
A maior parte dos estudos é em OA de joelhos, mas
a viscossuplementação é também realizada em OA de
quadril, ombro e primeira carpo-metacarpiana.
Nos casos de OA tratados com AINH e infiltrações,
com persistentes sinais inflamatórios, indica-se a prescrição de colchicina. A fundamentação dessa conduta é
a possível presença de cristais de pirofosfato de cálcio
na articulação (27).
Além do tratamento sintomático, busca-se a interferência nos mecanismos patogenéticos da OA, com
agentes que possam modificar o curso da doença, denominados drogas ou fármacos modificadores de OA
(DMOA ou Famoa), ou drogas sintomáticas de ação
duradoura. Nessa classe existem os seguintes medicamentos: antimaláricos, glucosamina/condroitina, insaponificáveis de soja e abacate, diacerreina e doxaciclina. Todas essas substâncias têm suporte para uso, obtido em modelos experimentais de OA e estudos randomizados e controlados (ERC) em humanos(19,28-29) , e
atuariam inibindo ações proteolíticas, ou estimulando
o reparo da matriz cartilaginosa. Mas, para ser considerado uma DMOA, um medicamento além de ser
avaliado em ERC, deve ser testado em modelos reprodutíveis de detecção de dano inicial e das progressivas
alterações que ocorrem na cartilagem. A OMS, a OA
Research Society e a Liga Internacional contra o Reumatismo, conjuntamente, deliberaram que o estabelecimento de modificação da doença em OA requer a
constatação de alterações da anatomia articular e não
variações bioquímicas ou de marcadores imunoquími-
S27
cos de lesão ou reparo articular nos líquidos orgânicos.
Adota-se, no momento, a medida do espaço articular
por raio X convencional ou por R M e a quantificação
da cartilagem por R M. Na atualidade, em estudos de
médio prazo, a glucosamina e a doxiciclina demonstraram ação quanto a essa exigência (28-29) .
As técnicas cirúrgicas para tratar a OA compreendem as osteotomias, artrodeses e as artroplastias
parciais ou totais. As osteotomias são indicadas para
correção dos desvios articulares. As artroplastias e as
artrodeses devem ser indicadas em pacientes com sintomas intensos, sem resposta ao tratamento farmacológico, ou com efeitos colaterais que impeçam o uso de
medicamentos(13-14,17-19).
Muitas opções de tratamento fazem supor resultados insatisfatórios, mas no caso da OA, em virtude dos
aspectos multifatoriais envolvidos e da variabilidade
individual, é positivo haver diversas formas de cuidar,
enquanto não aparecer uma cura definitiva. As perspectivas para atingir esse objetivo dizem respeito ao aparecimento de um novo medicamento, ao transplante de
condrócitos ou de células-tronco e à terapia gênica.
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