ARTIGO
Tecnologias digitais e
formação de professores:
implicações para as práticas
de ensino de professores de
cursos de licenciatura em
Letras
Digital technologies and teacher education: implications
to the teaching practices of teacher educators from
Letras courses
Linguagem
em Foco
Revista do Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada da UECE
FLUXO DA SUBMISSÃO
Submissão do trabalho: 30/07/2020
Aprovação do trabalho: 27/08/2020
Publicação do trabalho: 25/09/2020
10.46230/2674-8266-12-4054
COMO CITAR
DE SOUSA JÚNIOR, Michael Gouveia; DA SILVA, Francisco Gabriel
Cordeiro; COSTA, Marco Antônio
Margarido. Tecnologias digitais e
formação de professores: implicações para as práticas de ensino de
professores de cursos de licenciatura em Letras. Revista Linguagem
em Foco, v.12, n.2, 2020. p. 150 - 169.
Disponível em: https://revistas.uece.
br/index.php/linguagememfoco/article/view/4054.
Michael Gouveia de Sousa Júnior
[email protected]
Universidade Federal de Campina Grande - UFCG
Francisco Gabriel Cordeiro da Silva
[email protected]
Universidade Federal de Campina Grande - UFCG
Marco Antônio Margarido Costa
[email protected]
Universidade Federal de Campina Grande - UFCG
Resumo
Este artigo objetiva investigar as implicações das tecnologias digitais
em práticas de ensino de professores de cursos de licenciatura em Letras. Para isso, esta pesquisa é de abordagem qualitativa e tem como
corpus informações oriundas da aplicação de uma entrevista estruturada com docentes que lecionam em cursos de licenciatura em Letras
de uma universidade pública do interior da Paraíba. A fim de ancorar
nossas análises, recorremos às discussões acerca da formação docente na contemporaneidade (BEHERENS, 2007; CELANI, 2002; FREIRE;
LEFFA, 2013; PERRENOUD, 2002, dentre outros), e às reflexões sobre a
formação de professores de línguas frente às novas tecnologias digitais (BALADELI, 2013; BOERES, 2018; IMBERNÓN, 2011; MARZARI, 2014;
MARZARI; LEFFA, 2013). Este estudo evidencia que o uso de tecnologias digitais nas práticas de ensino dos docentes em questão implica
mudanças em suas atuações pedagógicas e no processo de ensino-aprendizagem de línguas. Evidencia-se também a necessidade de
utilizar tais tecnologias com objetivos específicos para tornar o ensino
mais promissor, bem como a compreensão de que os dispositivos tecnológicos são ferramentas que auxiliam o trabalho docente.
Palavras-chave
Formação docente; Tecnologias digitais; Professores de cursos de Letras.
Distribuído sob
Abstract
This article aims to investigate the implications of digital technologies
in teaching practices of teacher educators from Letras courses. This research, then, has a qualitative approach and has as corpus information
from the application of a structured interview with educators who tea-
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ch undergraduate Letras courses at a public university in the countryside of Paraiba. In order to anchor the
discussions and analyses proposed, we weave some ideas about contemporary teacher education (BEHERENS, 2007; CELANI, 2002; FREIRE; LEFFA, 2013; PERRENOUD, 2002, among others), and about the language
teacher education in the face of new digital technologies (BALADELI, 2013; BOERES, 2018; IMBERNÓN, 2011;
MARZARI, 2014; MARZARI; LEFFA, 2013). The research brings evidences that the use of digital technologies
in their teaching practices implies changes in their pedagogical actions and in the process of teaching and
learning languages. It also highlights the need to use such technologies for specific purposes to make teaching more promising alongside with the understanding that technological devices are tools that help
teaching work.
Keywords
Teacher education; Digital technologies; Teacher educators in Letras courses.
Considerações iniciais
A sociedade contemporânea tem sido caracterizada por amplas mudanças nos mais diversos âmbitos e cenários. Muitas delas são proporcionadas pelo
avanço tecnológico, por exemplo, nos meios de acesso à informação e de comunicação, como computadores, celulares, tablets, dentre outros. Um dos setores
que também estão sob influência de tais mudanças e transformações é o da educação, visto que as informações, das mais variadas, e o conhecimento, antes monopolizados pelas instituições de ensino, estão amplamente acessíveis por meio
de dispositivos tecnológicos digitais.
Ao serem impactadas pelas novas tecnologias, as instituições de ensino,
como as escolas, as universidades e os institutos, passam a demandar profissionais cada vez mais capacitados a lidar com as tecnologias digitais. Entre esses
profissionais, estão os professores, que precisam ser formados em consonância
com a realidade na qual estão inseridos. Dessa forma, faz-se necessário que o
processo de formação docente seja repensado de acordo com o contexto no qual
ele ocorre e passe a englobar as novas tecnologias como ferramentas que trazem
novas possibilidades para o fazer pedagógico (MARZARI, 2014).
Nesse sentido, a formação de professores de línguas passa a ser um processo contínuo que acompanha as constantes mudanças que a sociedade atravessa. Segundo Imbernón (2011), a formação docente precisa dispor de melhores
estratégias que proporcionem o desenvolvimento da capacidade de reconhecer
as transformações, de tomar decisões em função delas e de expansão de conhecimento numa sociedade cada vez mais perpassada por meios tecnológicos digitais.
Assim, este estudo focaliza professores dos cursos de licenciatura em Letras (Português, Inglês e Francês) de uma universidade pública do interior da Paraíba, e busca investigar as implicações das tecnologias digitais em suas práticas
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de ensino. No tocante aos aspectos metodológicos, esta pesquisa alinha-se ao
paradigma interpretativista, de abordagem qualitativa (ANDRÉ, 1995; WILLIAMS;
CHESTERMAN, 2009), a qual tem como corpus de análise as respostas de tais
professores em relação às implicações das novas tecnologias no processo de formação continuada em cursos de licenciatura em Letras.
Nas duas seções seguintes, teceremos discussões teóricas referentes à
formação docente na atualidade e às tecnologias digitais na formação de professores de línguas. Logo após, detalharemos os aspectos e procedimentos metodológicos deste estudo. Em seguida, analisaremos as respostas dos professores e,
por fim, apresentaremos algumas considerações finais.
2. Formação docente na contemporaneidade
O paradigma complexo, de acordo com Morin (2000) e Lopes (2013), assegura que os diversos meios de produção de conhecimento sejam mobilizados através do reconhecimento das divergências acerca da compreensão de um
mesmo objeto de estudo, fazendo com que ele seja visto, analisado e compreendido por diferentes perspectivas. No viés proposto por esse paradigma, os conhecimentos científicos e os empíricos constituem uma cadeia de saberes inacabados que são constantemente promovidos por sujeitos que os mantêm.
Assim, o paradigma complexo, diferentemente do paradigma tradicional,
propõe uma visão pautada na reflexão, na criticidade, na transformação, na interconexão entre diferentes e múltiplas abordagens, visto que seu objetivo é tentar
transcender a ótica linear, lógica, homogênea e uniforme para abranger as interconexões e, como consequência, apresentar uma nova representação sobre o
homem, a sociedade e o mundo (BEHERENS 2007; FREIRE; LEFFA, 2013).
Recorrente deste cenário de transformações, que também perpassa o
âmbito educacional, e em específico o contexto acadêmico, a formação inicial e
continuada de professores deixa de ser compreendida como um processo uniforme e finalizado. Conforme Behrens (2007), a formação docente passa a pautar-se
no desenvolvimento da criticidade, reflexão e transformação, o que incita uma
rearticulação do fazer pedagógico a não assumir uma postura que seja dualista
e reducionista.
Diante desta conjuntura, Wallace (1991), Morin (2000), Perrenoud (2002),
Celani (2002) e Pereira (2007) apontam que a formação docente necessita preparar professores para as incertezas e as mudanças decorrentes deste cenário
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pós-moderno, a fim de que os docentes percebam as especificidades de cada
situação e reflitam acerca de suas práticas e de que forma podem desenvolver
um elo coerente entre teoria e prática ao longo da atuação pedagógica enquanto
profissionais.
A formação docente, nesse sentido, precisa possibilitar mudanças e transformações em atitudes, valores e funções que são atribuídos à imagem do professor. Imbernón (2011) ressalta que a formação de professores também precisa
proporcionar aos docentes a continuidade de seus estudos de forma constante
face às mudanças que recorrentemente perpassam a sociedade contemporânea.
Inerente a essas ideias, Imbernón (2011) disserta que a formação (e consequentemente a atuação) de professores não se limita ao caráter técnico, mas passa a
abranger concepções reflexivas, em que o sujeito professor reflete em relação à
sua prática e todos os aspectos que a compõem, o que resulta em uma contínua
autoavaliação de si e de seus valores (enquanto sujeito inserido em um mundo
contingente) e de suas práticas, ações e atitudes.
Expandindo o raciocínio acerca da reflexão na formação docente, Wallace
(1991) apresenta o modelo reflexivo que é composto por dois tipos de conhecimento: o recebido e o experienciado. O primeiro, o conhecimento recebido, é
norteado por elementos oriundos da pesquisa de teor científico que subsidiam
os conhecimentos teórico-metodológicos necessários para o exercício da profissão. O segundo, o conhecimento experienciado, é constituído pelas experiências
adquiridas durante o exercício da prática pedagógica e profissional. Segundo o
autor, ambos os conhecimentos não são sobrepostos, isto é, não há a atribuição
de maior importância a um conhecimento em detrimento de outro, como ocorre
no paradigma tradicional. Tais conhecimentos são essenciais para uma prática
reflexiva que culmina no agir pedagógico e profissional do professor.
Nesse contexto, Wallace (1991) e Nascimento (2014) sugerem que a formação de professores, em específico os programas de formação docente, considerem as experiências inseridas no contexto de atuação do professor. Para isso, a
consciência de que a sociedade e as identidades dos indivíduos estão incessantemente em (trans)formações e o fato de lidar com o desconhecido e o incerto,
entre outras questões, não podem ser negligenciados e/ou desconsiderados.
Para uma melhor visualização, compreensão e elo com o que fora abordado nesta seção, ilustramos, por meio do Quadro 1, as características da formação
docente dentro do âmbito do paradigma complexo.
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Quadro 1 – Características da formação de professores no paradigma complexo
FORMAÇÃO DOCENTE
Ausência da dicotomização entre teoria e prática
Consideração das mudanças, das incertezas e do desconhecido
Professor reflexivo que teoriza a prática e pratica a teoria
Consideração das características do contexto de atuação
Fonte: elaborado pelos autores (2020).
Desta maneira, com base em Perrenoud (2002) e Celani (2002), entendemos que a formação docente necessita ser norteada por meio de problematizações e reflexões acerca do contexto de atuação e vivência do(a) professor(a),
bem como a partir do conhecimento experienciado, conforme evidencia Wallace (1991), considerando as surpresas, sucessos, fracassos (dentre outros aspectos)
do(a) docente. Compreendemos, então, que a formação docente deve proporcionar a aproximação da teoria com a prática, dialogando com questões sociais, a
exemplo do uso de tecnologias digitais. Nessa direção, discutiremos, na próxima
seção, acerca da formação docente face às novas tecnologias digitais.
3. Formação de professores de línguas frente às novas tecnologias digitais
Por causa das constantes mudanças, entre elas a ascensão das novas tecnologias digitais na sociedade contemporânea, a formação de professores tem
passado por transformações de diversas naturezas. No contexto específico de
nossa investigação, faz-se necessário que o(a) professor(a) que atua nos cursos
de licenciatura em Letras esteja atento às diversas modificações e de que modo
elas se apresentam em seu local de trabalho e em seu fazer pedagógico.
Diante desse contexto, Marzari e Leffa (2013) afirmam que a formação docente de profissionais de línguas sempre foi uma atividade complexa e que, na
sociedade atual, a formação desses profissionais tem aumentado seu grau de
complexidade em função das frequentes transformações e da diversidade de
instrumentos de mediação didático-pedagógicos à disposição, incluindo aqueles
instrumentos que são mobilizados por meio de tecnologias digitais.
Em consonância com essas assertivas, Boeres (2018) tece a reflexão de que,
em função da era digital, faz-se essencial agregar competências tecnológicas
que proporcionem mudanças para o processo educacional e para a formação de
professores (tanto inicial como continuada), o que culmina no desenvolvimento
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de um novo perfil profissional do docente. Dessa maneira, compreendemos que
esse novo perfil é perpassado pelo letramento digital, o qual requer, a priori, uma
apropriação das várias ferramentas tecnológicas digitais, implicando diretamente o reconhecimento e as maneiras de utilizar as diversas possibilidades dessa
apropriação (MARZARI; LEFFA 2013).
Para tanto, de acordo com Boeres (2018), a formação inicial e a formação
continuada precisam de investimentos que possibilitem aos professores a oportunidade de levar as novas tecnologias digitais para seus ambientes de trabalho,
integrando suas habilidades técnicas de saber lidar com os aparatos digitais ao
que é demandado nas instituições de ensino. A autora salienta que os professores precisam estar abertos para aprender durante toda a vida, visto que o(a) docente poderá se deparar com possibilidades de adaptação e inserção em novos
contextos.
Em específico ao letramento digital do(a) professor(a), Marzari e Leffa
(2013) pontuam que o(a) docente digitalmente letrado(a) é o sujeito capaz de
reconhecer os recursos tecnológicos à sua disposição e de apropriar-se deles de
maneira coerente, ou seja, para propósitos pedagógicos, o que implica, por exemplo, o processo de leitura e escrita em ambiente digital de maneira significativa.
Compreendemos então que, para haver uma inserção no letramento digital, as ferramentas digitais devem ser (res)significadas em função das mais diversas demandas de leitura, escrita etc. Desta feita, a nosso ver, é crucial que o(a)
professor(a) da licenciatura em Letras esteja ciente do que ocorre na realidade
atual, a qual é perpassada, constantemente, por diferentes práticas letradas em
função das possibilidades tecnológicas digitais existentes, o que envolve o modo
de interação com novas formas de ensino, aprendizagem e formação proporcionadas pelo século XXI.
Nessa perspectiva, Baladeli (2013) ressalta a importância de o(a) docente apreender, ou pelo menos saber adaptar, metas, metodologias, conteúdos de
ensino e formas de avaliação, ponderando acerca dos prós e dos contras que as
possibilidades de ensino e aprendizagem viabilizadas por meio das tecnologias
digitais proporcionam, visto que instrumentos como o computador e a internet,
por exemplo, não foram desenvolvidos exclusivamente para fins pedagógicos.
Com base nessas assertivas, compreendemos o professor como um profissional capaz de participar, de forma crítica, do processo de inovação, de dinamicidade, de flexibilidade, enfim, de mudança, começando pelo seu próprio contexto de ensino. Imbernón (2011) corrobora com esse entendimento, ao sugerir
que a formação de professores proporcione ao docente possibilidades diversas a
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fim de que tal profissional possa expandir seu conhecimento e sua interpretação
diante das situações nas quais ele(a) está inserido(a) e situado(a), por exemplo,
como proceder diante de um local de atuação que tenha ou não facilidade de
acesso às tecnologias digitais, como computadores, internet, celulares, projetores etc.
O trato com as novas tecnologias digitais demanda que os professores
disponham de interesse, planejamento, autonomia e reflexão em relação aos
momentos adequados e pertinentes para incluí-las ou não nas suas práticas pedagógicas. Diante disso, Boeres (2018) e Baladeli (2013) corroboram com o entendimento de Imbernón (2011), ao afirmarem que o essencial seria uma oferta
maior de condições materiais1 e, sobretudo, de formação reflexiva ao professor,
para que este desenvolva uma postura crítica em relação às tecnologias e sua
multiplicidade de usos para fins didático-pedagógicos.
Para além da oferta dessas condições, também é necessário que o docente disponha de conhecimentos técnico-operacionais e metodológicos que
embasem a utilização de suportes tecnológicos digitais, o que resulta em uma
discussão mais ampla, que envolve a revisão de paradigmas, como os das instituições de ensino e sua função na sociedade, quanto ao que é ser professor e as
funções para o cargo que lhe são atribuídas. Nessa linha de raciocínio, Baladeli
(2013) destaca que o papel do professor precisa ser repensado, no sentido de que
ele passa, conforme esse entendimento, a ser o agente responsável pela promoção do desenvolvimento da habilidade de analisar crítica e reflexivamente as informações disponibilizadas pelos aparatos tecnológicos digitais.
Ainda segundo Baladeli (2013), mesmo não tendo sido criadas, a priori,
para finalidades educativas e/ou formativas, as novas tecnologias digitais devem
(ou deveriam), no escopo da formação docente, ser utilizadas para promover o
pensamento crítico e reflexivo, bem como para a realização de novas situações de
aprendizagem que possibilitem outras formas de interlocução e construção de
conhecimento. Sendo assim, ao fazerem uso de tecnologias digitais, os docentes
precisam se apropriar delas por meio de atitudes conscientes e coerentes com
os objetivos a serem alcançados, desenvolvendo e assumindo posturas críticas e
reflexivas sobre como utilizar e para que usar determinadas tecnologias digitais
no processo de ensino-aprendizagem (BALADELI, 2013; MARZARI, 2014).
Nesse contexto, o professor deixa de ser entendido como a única fonte
1
Por exemplo, aulas em laboratórios de dispositivos tecnológicos; trabalho na abordagem de situações
ocorridas na educação básica e superior; momentos de reflexão sobre o que poderia ou não ter sido utilizado
de tecnologias nas situações abordadas, deixando claras as consequências do uso e do não uso.
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de conhecimento, uma vez que o corpo discente dispõe de diversas fontes de
informação oriundas dos mais variados dispositivos tecnológicos que, segundo
Baladeli (2013), proporcionam-lhe o acesso a inúmeras possibilidades de acesso à
informação. Cabe, portanto, ao professor ser o agente responsável pela articulação e transformação dessas informações em conhecimento a fim de enriquecer
o processo de ensino e aprendizagem.
Diante dessas considerações, compreendemos e defendemos a concepção de um professor, nesse caso os que atuam nas licenciaturas em Letras, que
age como um problematizador e orientador, capaz de transformar as informações fornecidas, por intermédio das novas tecnologias digitais, em conhecimento de forma crítica e significativa e capaz de atribuir (res)significações aos dispositivos tecnológicos utilizados em função dos objetivos educacionais a serem
alcançados.
4. Contexto de geração de dados da pesquisa
Este estudo faz parte de uma pesquisa mais ampla, uma dissertação de
mestrado já defendida, que teve parecer2 favorável para sua realização pelo comitê de ética da universidade em que os autores deste trabalho estão vinculados.
No tocante à sua classificação, esta pesquisa está situada no paradigma
interpretativista e de abordagem qualitativa. Segundo Williams e Chesterman
(2009), uma pesquisa é concebida como qualitativa pelo fato de descrever a qualidade dos dados contidos no estudo, os quais são analisados a partir de sua interpretação. Nesse sentido, os autores ressaltam que, através desse tipo de pesquisa,
há a possibilidade de compreender o que pode acontecer em casos específicos.
Todavia, não há como obter conclusões de proporções universais, uma vez que
os resultados do trabalho dizem respeito ao ambiente e ao contexto no qual os
dados foram gerados.
Para a geração de dados, a entrevista estruturada foi utilizada como instrumento de pesquisa, pois, por meio dela, foi possível saber diretamente dos
participantes3 como eles enxergam a formação continuada frente à influência do
avanço da tecnologia. Tal entrevista foi gravada em áudio e transcrita conforme
as normas de transcrição do Projeto NURC (DIONÍSIO, 2006). Para a análise, selecionamos seis (6) excertos de seis (6) professores em resposta ao questionamento
2
Parecer de número 3.398.424.
3
Professores mestres e doutores que integram a Unidade Acadêmica de Letras de uma universidade
pública do interior da Paraíba há mais de 5 anos, pertencentes aos cursos de Português, Inglês e Francês,
respectivamente, e que aceitaram participar da pesquisa.
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exposto na próxima seção.
Esses excertos foram selecionados, pois tratam especificamente das implicações das tecnologias digitais na formação de professores que atuam no contexto de licenciatura em Letras, atendendo, dessa forma, ao objetivo deste texto.
Diante disso, ressaltamos que, para este texto, utilizamos apenas uma pergunta
da entrevista realizada que tratou especificamente da visão dos docentes entrevistados acerca das implicações das novas tecnologias em seus trabalhos formativos nos cursos em que atuam.
5. A docência e tecnologias digitais: implicações para professores de cursos
de licenciatura em Letras
Iniciamos esta seção pela abordagem das implicações das novas tecnologias na formação continuada de professores de cursos de licenciatura em Letras,
apresentando um exemplo bem representativo sobre a mudança do universo
analógico para o digital. Vejamos a seguir.
(1º) EXCERTO:
PARTICIPANTE 1: (...) teremos que lidar com possibilidades de realidades...
é para as quais nem sempre estar/estaria preparados... ou seja a gente
nem sempre a gente supostamente está preparado para o que e a gente
já conhece... eu fui muito hábil em usar a caneta agora tenho que ser hábil
em digitar tanto... É uma substituição? Bom... mas são o que é aquilo que
a nova... o que essa realidade tá me trazendo como demanda então... se
antes eu sabia usar a caneta agora eu tenho que aprender a digitar... né
então tenho que estudar tenho que aprender a fazer isso.
Em reposta ao questionamento apresentado, o participante 1 sugere
compreender as implicações dos aparatos tecnológicos no fazer pedagógico de
professores que atuam em cursos de licenciatura em Letras, no sentido de que
esses sujeitos precisam, em função disso, lidar com realidades para as quais nem
sempre estiveram preparados. Assim, é possível inferir que o participante entende os novos aparatos tecnológicos como propiciadores de novas situações/contextos, que afetam a dinâmica do trabalho e do agir docentes, que exigem cada
vez mais adaptações por parte dos professores para que esses sejam capazes de
atender às demandas da atual realidade social perpassada constantemente pelas tecnologias digitais.
Para ilustrar sua compreensão, o participante utiliza um exemplo que
aborda dois instrumentos tecnológicos – a caneta, instrumento tecnológico ana-
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lógico, e o computador, instrumento tecnológico digital, já que se refere ao ato de
digitar –, pertencentes a diferentes épocas – impresso e digital, respectivamente
–, como evidencia o seguinte trecho “... se antes eu sabia usar a caneta agora eu
tenho que aprender a digitar...”. Ao utilizar, mais especificamente, a expressão
“tenho que”, é possível entender que, para o participante, a mudança, a adaptação e a preparação para lidar com uma nova realidade não são negociáveis,
ou seja, elas são impreteríveis para que ele e os demais professores possam dar
continuidade ao seu fazer docente e, portanto, à sua formação, partindo deles a
iniciativa de ampliá-la.
Nesse contexto, percebemos que o participante 1 apresenta uma compreensão que se coaduna com as proposições de Morin (2000), Perrenoud (2002)
e Imbernón (2011), os quais defendem uma formação docente que reconhece
e prepara os professores para lidar com as incertezas e mudanças ocasionadas
pelo contexto social da atualidade que está em constante metamorfose. Além
disso, o participante reconhece a necessidade de estudar e aprender a lidar com
as novas demandas da atual realidade, corroborando Boeres (2018) que afirma
que, em função das implicações oriundas dos aparatos tecnológicos, os professores precisam estar propensos para aprender ao longo da vida, ou seja, em uma
formação contínua e inacabada que reivindica a criação e a adaptação de novos
contextos e/ou situações com base nas mudanças em ocorrência na sociedade,
por exemplo, a dinamização e democratização das informações e dos conhecimentos por meio de aparatos tecnológicos, como o computador, o celular, entre
outros.
Como será possível constatar, no segundo excerto a ser apresentado, o
participante 2 ressalta que o atual acesso a meios tecnológicos cada vez mais
avançados é diferente do que existia há alguns anos e possibilita um trabalho diferenciado com os processos de ensino e aprendizagem. Vejamos a seguir.
(2º) EXCERTO:
PARTICIPANTE 2: (...) a gente não tinha acesso à internet tão vasto como a
gente tem hoje em dia... então isso implica de uma maneira muito vertical
no processo de ensino-aprendizagem da língua estrangeira... quer dizer
se eu... consigo colocar um aprendiz em contato com essa língua através
dos meios digitais de uma maneira muito mais profícua do que com um
CD por quê que eu não posso fazer isso? não que o CD não seja tecnologia
que também é né... é um papel a tecnologia mas... se existe uma maneira
de contato mais direto e mais eficaz através de um outro meio por que
não utilizar?
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De acordo com o participante 2, o atual acesso a aparatos tecnológicos
digitais, por exemplo, a internet, proporciona uma série de diferentes possibilidades das quais o professor pode dispor para executar sua prática. Em sua opinião,
os processos de ensino e aprendizagem mediados por esses meios digitais tornam o contato com o objeto de estudo, como a língua estrangeira, mais profícuo,
isto é, mais rentável, proveitoso.
Ao fazer o seguinte questionamento “... se existe uma maneira de contato mais direto e mais eficaz através de um outro meio por que não utilizar?”, o
participante evidencia a compreensão de que a utilização de dispositivos digitais
promovem maneiras mais diretas e eficazes tanto para o ensino quanto para a
aprendizagem, além de entender que, se há algo novo e que propicia bons resultados, isso deve ser utilizado. Dessa forma, é possível entender que esse participante percebe as implicações das novas tecnologias na formação de professores
e as entende como meio para promover um ensino mais atual e um aprendizado
mais frutífero.
No que concerne às congruências entre as respostas dos participantes 1
e 2, percebemos que ambos concordam no tocante a haver influência do aparato digital na formação de professores, principalmente em questões de ensino-aprendizagem. No entanto, em sua resposta, o participante 1 foca nas implicações das tecnologias digitais, que, a nosso ver, estão mais associadas à formação
docente, no sentido de que essa passa a englobar as mudanças e as novas possibilidades que esses aparatos proporcionam para a realidade do professor e para
o seu fazer pedagógico. O participante 2, por sua vez, enfoca as implicações das
novas tecnologias do ponto de vista do processo de ensino-aprendizagem, levando em consideração a figura do aprendiz que obtém mais facilidades no contato
com o que busca aprender.
Nesse sentido, também é possível inferir que o participante 2, no seguinte
trecho de sua fala “... se eu... consigo colocar um aprendiz em contato com essa
língua através dos meios digitais de uma maneira muito mais profícua ...”, concebe os dispositivos digitais como instrumentos de mediação didático-pedagógicos, concordando com Marzari e Leffa (2013) que os entende da mesma maneira.
Além disso, os autores afirmam que um docente digitalmente letrado é
aquele capaz de reconhecer os recursos tecnológicos ao seu redor e utilizá-los
com finalidades pedagógicas, o que, na visão de Baladeli (2013), é uma prerrogativa do professor, já que esses dispositivos em sua origem não foram criados para
fins educacionais e precisam ser adaptados de acordo com os objetivos a serem
alcançados por meio deles (MARZARI, 2014).
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Sobre as implicações das tecnologias digitais, o participante 3 afirma que
a época atual, ou seja, o século XXI é um período no qual os meios tecnológicos
têm sido utilizados para fins de ensino e que é importante haver a valorização
desse uso, conforme é possível verificar em sua fala exposta a seguir.
(3º) EXCERTO:
PARTICIPANTE 3: é... exato nós vivemos numa época... em que a
tecnologia tem sido bem usada no ENSINO... então... quanto a valorizar o
uso das novas tecnologias... é eu vejo uma grande importância nisso né...
é importante que o próprio professor seja capaz de fazer um bom uso
dessas... dessas tecnologias disponíveis como também incentivar os alunos
a fazerem o mesmo né... a fazerem um BOM uso dessas novas tecnologias
e... ele mesmo como professor formador deve... deve procurar... saber
como usar né ou seja ser... ser... ter esse letramento digital né e incentivar
os alunos a também seguirem a mesma... a mesma prática né.
Diante dessa resposta, podemos afirmar que o participante 3 reconhece
estar situado em uma realidade perpassada por diferentes dispositivos tecnológicos que afetam também os processos de ensino e de aprendizagem. Segundo
esse participante, é necessária a valorização do uso de tecnologias, ou seja, é importante conhecê-las, implementá-las na prática pedagógica e divulgá-las. Além
disso, ele entende que o professor de licenciatura em Letras deve ser capaz de
fazer um bom manuseio delas, tanto em nível técnico quanto pedagógico.
Sobre essa questão de ser capaz de usar a tecnologia, podemos entender
que, na compreensão do participante, esse sujeito precisa reconhecer que a realidade atual na qual ele se situa é influenciada cada vez mais pelos novos aparatos
tecnológicos, buscar conhecê-los e aprender a manuseá-los – o que o participante denomina de “bom uso”. Com base no contexto da fala desse participante,
podemos inferir que o “bom uso” se refere à utilização das novas tecnologias na
prática pedagógica dos professores, sendo elas meios para alcançar os objetivos
pretendidos.
Além disso, segundo o participante 3, o professor que atua no curso de
Letras deve, respectivamente, buscar, procurar e saber como usar/manusear os
dispositivos tecnológicos digitais. Nessa linha de pensamento, seu posicionamento converge com o do participante 1 que, ao reconhecer as implicações da
tecnologia digital, também foca nas consequências dessas implicações no processo de formação docente. Vale ressaltar que ambos os participantes atribuem
ao professor de licenciatura em Letras a responsabilidade da busca pelo aprendi-
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zado e pelo conhecimento a respeito das tecnologias digitais e sua relação com o
ensino-aprendizagem, isto é, a ampliação da formação, nesse caso a continuada,
ocorre por decisão própria do(a) docente, sem interferências exteriores a ele(a),
ou seja, sem a necessidade de recorrer a formações pré-planejadas e a profissionais que não estão inseridos em sua realidade de ensino.
Dito isso, notamos que o entendimento do participante 3 a respeito do
incentivo ao uso das tecnologias digitais e da responsabilização do professor pela
busca e pelo aprendizado de como lidar com elas em seu fazer pedagógico corrobora o posicionamento de Baladeli (2013) e de Marzari e Leffa (2013) que defendem, na atualidade, um professor digitalmente letrado. Ou seja, um sujeito capaz
de reconhecer os aparatos tecnológicos a sua volta, de apropriar-se deles e de
utilizá-los para seus propósitos pedagógicos, o que Marzari (2014) denomina de
apropriação coerente e que também é defendido por Boeres (2018) na forma de
agregação de competências tecnológicas.
Na sequência, o participante 4 responde à pergunta que lhe foi feita reconhecendo que há influências/implicações dos aparatos tecnológicos digitais na
formação docente (tanto a inicial como a continuada) e ressalta que eles precisam ser evidenciados nas prescrições, atuação e formação dos professores, conforme é possível verificar no trecho de sua fala apresentado a seguir.
(4º) EXCERTO:
PARTICIPANTE 4: (...) essas tecnologias elas precisam aparecer no seu
programa no seu exercício na sua formação e o próprio professor tem
que estar a par dessas novas tecnologias se quiser lançar mão delas... na
hora eles [referindo-se aos alunos] disseram professora primeiro ninguém
faz mais chamada telefônica hoje em dia ponto (risos) adorei porque de
cara foi a primeira coisa é uma turma que é... né nativa digital eu não sou
mas eles são... mas na hora que eles trouxeram as MÍDIAS para essa/pra
trabalhar essa questão que a gente tava estudando... sobre a língua falada
os elementos da linguagem falada da conversação... natural espontânea
EU AMEI cê tá vendo que não tem como dissociar as tecnologias... não dá
pra você usar esses elementos de estudo no aparato antigo... entende nos...
nos instrumentos metodológicos enfim... antigos você tem que realmente
envolver as tecnologias digitais... eles mudaram totalmente a atividade (...).
De acordo com o excerto acima, podemos perceber que o participante 4
não só reconhece as implicações das novas tecnologias digitais como defende
que esses aparatos sejam visibilizados e utilizados. Para o participante, a visibilidade e a utilização precisam ser discriminadas em três eixos: no programa, isto é,
nos planejamentos de curso e de aulas; na formação que é entendida de maneira
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formal, portanto, os cursos de graduação e de pós-graduação; e no exercício da
docência, ou seja, as tecnologias precisam estar presentes e serem usadas pelos
professores em suas salas de aula.
Nesse contexto, o participante relata uma de suas experiências em sala
de aula sobre uma atividade que trabalhava a compreensão oral dos alunos, já
que se tratava de uma aula de língua estrangeira. Nessa atividade, os alunos deveriam reconhecer o gênero chamada telefônica e os elementos da oralidade
contidos na situação. Em seguida, o professor pediu que os alunos propusessem
reformulações para essa atividade, e eles sugeriram os seguintes pontos: que não
fosse uma chamada telefônica, pois, na opinião deles, esse gênero não é mais utilizado de forma recorrente; e a abordagem da oralidade por meios mais atuais de
comunicação, por exemplo, o celular e os aplicativos de mensagens.
Diante disso, o participante chegou à conclusão de que não há como dissociar as tecnologias da prática pedagógica do(a) professor(a), pois a utilização
delas é uma demanda do contexto no qual ele(a) está situado(a) e uma necessidade do público que é atendido. Dessa forma, percebemos uma concordância
entre os entendimentos dos participantes 1, 3 e 4 no que concerne ao reconhecimento de que a atual realidade os interpela com novas demandas, sendo elas
oriundas e/ou perpassadas pelas novas tecnologias, culminando na compreensão de que o professor deve buscar, estudar e aprender a lidar com essas tecnologias, agregando-as ao seu fazer docente.
Assim, ao afirmar que o professor tem que conhecer os novos aparatos
tecnológicos e aderir ao uso deles em seu exercício, pois, em sua opinião, eles
mudaram a atividade docente, as assertivas enunciadas pelo participante 4 dialogam com as proposições de Imbernón (2011) sobre uma formação docente para
as mudanças e para a aquisição de novas habilidades para lidar com elas. Especificamente a respeito das tecnologias, o participante coaduna com Boeres (2018),
que defende o desenvolvimento de competências tecnológicas a serem agregadas na formação de professores para que esses se apropriem dos aparatos digitais como ferramentas com finalidades pedagógicas (BALADELI, 2013; MARZARI;
LEFFA, 2013).
Sobre as tecnologias na formação docente, o participante 5 afirma que é
possível perceber as implicações dos novos aparatos tecnológicos principalmente no aspecto da acessibilidade de informações e conhecimento, como pode ser
verificado no excerto a seguir.
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(5º) EXCERTO:
PARTICIPANTE 5: sim eu enxergo... eu enxergo sim... é... as implicações
hoje... é é muito mais acessível... o conhecimento a informação que nem
sempre informação é conhecimento... então eu tenho muito mais acesso
de como divulgar esse material para meus alunos do que antes... então
basicamente nesse sentido a rapidez da comunicação... a urgência isso
tudo é implicação tecnológica... são são pontos tecnológicos que ajudam
muito nessa disseminação.
Segundo o participante, a principal implicação dos meios tecnológicos digitais no processo de formação docente é a acessibilidade de variados tipos de
informação e de conhecimento que a geração atual possui. Em seu entendimento, a acessibilidade não favoreceu apenas o contato dos alunos com os objetos de
estudo, mas também os professores que passaram a ter diferentes maneiras para
a disponibilização de materiais que, pelo que é possível inferir, ocorria de forma
impressa apenas.
Além da acessibilidade de informações e de conhecimentos, o participante 5 ressalta mais duas implicações proporcionadas pelas tecnologias digitais. A
primeira é referente à diferença entre informação e conhecimento. A informação
hoje é disponibilizada de forma rápida e está acessível em diversas fontes e plataformas e, portanto, sujeita a diversos equívocos. Já o conhecimento configura-se
como um produto oriundo de um processo de pesquisa, de análise, de constatação e de verificação da autenticidade das informações, ou seja, demanda um
trabalho mais crítico e detalhado por parte de quem o produz.
Dessa forma, cremos ser essa a justificativa da ressalva feita pelo participante quanto à diferença estabelecida. A segunda implicação diz respeito à ocorrência de uma comunicação mais rápida, nesse caso, entre professores e alunos
que, muitas vezes, adquire um caráter de urgência, visto que as fronteiras já não
apresentam as mesmas dificuldades que antes, segundo o participante, e o ato
comunicativo tem se tornado cada vez mais instantâneo.
Nessa linha de raciocínio, percebemos que o participante 5 compartilha
do mesmo entendimento dos participantes 1, 2, 3 e 4 a respeito da percepção de
implicações das tecnologias digitais na formação de professores. Contudo, esse
participante corrobora de forma mais direta a fala do participante 2, pois ambos
trazem a acessibilidade como fator preponderante e associado à perspectiva do
processo de aprendizagem que está diretamente ligado ao aluno e não à formação docente como enfatizam os participantes 1, 3 e 4.
Diante disso, e ao conceber as tecnologias digitais como meios de acesso
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à informação e conhecimento, o participante 5 corrobora com a afirmação de
Freitas (2010) que assevera que, em função dessa variada gama de acessos mediados pela tecnologia, a figura do professor deixa de ser o monopólio do saber,
democratizando o acesso ao mesmo. Além disso, o participante afirma utilizar a
tecnologia digital como ferramenta de compartilhamento de materiais didáticos,
postura entendida por Baladeli (2013), Marzari e Leffa (2013) e Marzari (2014) como
apropriação do aparato tecnológico por parte do professor para a realização de
adaptações com finalidades pedagógicas.
Continuando a discussão, apresentamos o excerto do participante 6, o
qual afirma que não há como conceber, nos dias atuais, a formação de professores de línguas desvinculada de tecnologias digitais4 e, mais precisamente, sem
abordar questões relacionadas ao letramento digital, conforme é possível constatar no recorte de sua fala a seguir.
(6º) EXCERTO:
PARTICIPANTE 6: sem dúvida... hoje não dá pra pensar uma formação
de docentes sem tecnologias sem letramentos digitais... e eu sempre fui
uma pessoa novidadeira... eu tava sempre atrás das novidades... não tem
como acessar os alunos é... toda aquela parte/recado de sala de aula que
antigamente ficava de uma semana pra outra... hoje não tem como você
deixar de uma semana pra outra tem que ter uma forma de comunicação
rápida com os alunos... e eu passei a usar o google classes... e foi muito
bom... essa mudança porque eu acho inclusive o próprio nome google
classes ou google sala de aula conforme a gente usa... dá um caráter mais
institucional a essa comunicação com os alunos... e é uma plataforma que
ajuda a aproximar da nova geração... do que eles usam do que eles postam
do que eles comentam... eu acho que não tem como pensar a formação
sem tecnologia... inclusive os textos né que eu mudei muito que antes eu
tinha uma pasta de textos impressos na xerox e hoje a pasta às vezes tem
um texto ou dois e quando é na graduação eu ainda peço ao monitor pra
digitalizar e mandar em pdf (...).
De acordo com o excerto exposto, podemos verificar que o participante 6
organiza sua resposta em três pontos. O primeiro é referente a ele ser uma pessoa “novidadeira”, que está sempre em busca de novidades, característica essa
que reverbera em sua atuação enquanto professor. Dessa forma, podemos afirmar que se trata de um professor que busca conhecer sua realidade e os instrumentos proporcionados por ela para que sua formação seja ampliada. O segundo
4
Devido ao momento pandêmico atual em que estamos vivenciando, causado pela COVID-19,
salientamos que a escola e os professores estão, quase que totalmente, dependentes de tecnologias digitais,
necessitando utilizar diversas ferramentas digitais com as quais não estão familiarizados, a fim de manter
contato com os alunos e possibilitar um ensino remoto de caráter emergencial.
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ponto é referente ao entendimento dos aparatos tecnológicos como meio para
alcançar um objetivo, isto é, segundo esse participante, a tecnologia é um instrumento para estabelecer uma comunicação mais rápida e efetiva com os alunos.
O terceiro ponto é o entendimento, enquanto um professor formador, de
que não há como conceber a formação de professores, na atualidade, dissociada da tecnologia. Referindo-se a si mesmo, o participante 6 evidencia que seu
exercício docente/pedagógico mudou de forma significativa. Ele afirma que agia
baseado nas possibilidades proporcionadas pelos aparatos impressos, mas que
passou a utilizar e disponibilizar materiais digitalizados com a finalidade de aperfeiçoar sua prática e de aproximar-se de seus alunos.
Nesse contexto, é possível afirmar que há congruências entre as respostas
do participante 6 e dos participantes 3, 4 e 5. Os quatro reconhecem uma nova
realidade marcada pelo avanço das tecnologias digitais e suas demandas para
com os professores e seu processo de formação, característica defendida por Perrenoud (2002) e Imbernón (2011), que sugerem uma formação capaz de preparar
professores para reconhecer e lidar com as diversas mudanças.
Além disso, esses participantes convergem no entendimento de que as
tecnologias digitais funcionam como meio para a execução de suas atividades
docentes e para uma comunicação mais eficaz entre professores e alunos, o que
Marzari e Leffa (2013), Baladeli (2013) e Boeres (2018) entendem como uma apropriação dos meios tecnológicos por parte do professor, em função de seu contexto, como ferramentas com finalidades didáticas e pedagógicas.
Assim, expomos nossa concordância sobre uma realidade diferente e que
é cada vez mais perpassada por dispositivos tecnológicos. Também concordamos no tocante ao entendimento das tecnologias, independentemente de quais
sejam, como ferramentas que precisam receber sentidos e serem ressignificadas, além de servirem como meios para alcançar os objetivos pretendidos e não
como fim em si mesmas.
Algumas considerações finais
Neste estudo, objetivamos investigar as implicações das tecnologias digitais em práticas de ensino de professores de cursos de licenciatura em Letras.
Para isso, tecemos discussões teóricas referentes à formação docente na contemporaneidade e respaldamo-nos em Behrens (2007), Celani (2002), Freire e Leffa,
(2013), Imbernón (2011), Lopes (2013), Pereira (2007), Perrenoud (2002), Nascimen-
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to (2014) e Wallace (1991). Discutimos, também, acerca da formação de professores de línguas frente às novas tecnologias digitais com base em Baladeli (2013),
Boeres (2018), Marzari (2014) e Marzari e Leffa (2013).
Diante da conjuntura sócio-política-cultural que vivenciamos na contemporaneidade, e considerando que a sociedade, em todos os âmbitos, está cada
vez mais recorrendo a tecnologias digitais, compreendemos que se faz necessário que o docente contemple, com mais frequência, práticas letradas digitais em
sua prática de ensino. Destarte, a formação docente necessita preparar professores para as incertezas e mudanças decorrentes deste cenário pós-moderno, para
então possibilitar mudanças e transformações não apenas à imagem do professor de línguas, mas, sobretudo, ao seu fazer pedagógico.
Em relação à análise, selecionamos os excertos de seis (6) docentes que
lecionam em cursos de Letras vinculados a uma universidade pública no interior
da Paraíba. Diante do analisado, foi possível perceber que, de fato, as tecnologias,
especificamente as digitais, proporcionam implicações ao processo de formação
continuada de professores, já que elas modificaram a dinâmica de acesso e divulgação de informações e conhecimento.
Concordamos com os participantes sobre suas assertivas a respeito das
mudanças no cenário do século XXI e também em relação à necessidade de atender às demandas dessa era, por meio das quais os professores são cada vez mais
interpelados a reverem sua prática e a adaptarem-se enquanto profissionais formadores aos seus contextos de atuação. Gostaríamos de ressaltar que também
compreendemos todo e qualquer aparato tecnológico como meio para a execução de ações que, no caso dos professores, sejam coerentes com as finalidades
pedagógicas que devem ser alcançadas na formação de professores de línguas
e, consequentemente, em sua atuação.
Diante disso, ressaltamos que este trabalho evidencia implicações das tecnologias digitais na prática de professores, neste caso os que atuam em cursos
de licenciatura em Letras, a saber, (i) mudanças em suas atuações pedagógicas e
no processo de ensino-aprendizagem de línguas; (ii) a necessidade de utilizar tais
tecnologias com objetivos específicos para tornar o ensino mais promissor; (iii) a
compreensão de que os dispositivos tecnológicos são ferramentas que auxiliam
o trabalho docente e não uma finalidade em si mesmas.
Sinalizamos, por fim, a relevância desta pesquisa, visto que pesquisar sobre a formação docente, especificamente continuada, acarreta não apenas o desenvolvimento de pesquisas e a construção de conhecimento por si, mas impli-
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cações para a nossa própria prática docente, a qual vem sendo cada vez mais
perpassada por práticas atreladas às tecnologias digitais. Uma vez que os resultados de nossa pesquisa, que é um recorte, evidenciam um olhar direcionado à indissociabilidade da prática pedagógica e de tecnologias digitais a fim de atender
às incessantes demandas de um ensino e de uma aprendizagem mais promissores, pontuamos a necessidade da continuidade de pesquisas sobre questões
multifacetadas que perpassam o(a) professor(a) de línguas no processo de transição do universo analógico para o digital.
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Sobre os autores
Michael Gouveia de Sousa Júnior - Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em
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Campina Grande-PB. E-mail:
[email protected]. Lattes: http://lattes.cnpq.
br/3669557112684140. OrcID: https://orcid.org/0000-0002-5721-3950.
Francisco Gabriel Cordeiro da Silva - Mestrando vinculado ao Programa de PósGraduação em Linguagem e Ensino (PPGLE) da Universidade Federal de Campina
Grande (UFCG); Campina Grande-PB. E-mail:
[email protected]. Lattes: http://
lattes.cnpq.br/8843983726322812. OrcID: https://orcid.org/0000-0003-3621-1566.
Marco Antônio Margarido Costa - Doutor em Letras. Docente vinculado ao Programa de
Pós-Graduação em Linguagem e Ensino (PPGLE) da Universidade Federal de Campina
Grande (UFCG); Campina Grande-PB. E-mail:
[email protected]. Lattes:
http://lattes.cnpq.br/7215425152123749. OrcID: https://orcid.org/0000-0002-5282-2618.
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