SEMIÓTICA

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Semiótica

Brasília-DF.
Elaboração

Paulo Renato Lima

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................. 4

ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA..................................................................... 5

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7

UNIDADE I
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS....................................................................................................... 9

CAPÍTULO 1
CONCEITOS ELEMENTARES DE SEMIÓTICA................................................................................. 9

CAPÍTULO 2
SEMIÓTICA E HERMENÊUTICA ................................................................................................. 32

CAPÍTULO 3
SEMIÓTICA, FENOMENOLOGIA E MUDANÇA DE PARADIGMAS................................................. 38

UNIDADE II
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS............................................................ 51

CAPÍTULO 1
ESTRUTURALISMO, SINTAGMAS E PARADIGMAS......................................................................... 51

CAPÍTULO 2
EPISTEMOLOGIA, MECANISMOS DE LINGUAGEM E SEMIÓTICA EM SEU
CONTEXTO PRÁTICO............................................................................................................... 58

CAPÍTULO 3
ESTÉTICA, DESIGN E SEMIÓTICA............................................................................................... 78

PARA (NÃO) FINALIZAR...................................................................................................................... 92

REFERÊNCIAS................................................................................................................................... 94
Apresentação

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela
interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da
Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade


dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos
específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém
ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a
evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

4
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos
básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar
sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para
aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

5
Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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Introdução

Inicialmente tratamos os conceitos gerais da semiótica e o panorama histórico


a ela relacionado. Visualizamos brevemente a historicidade da semiótica desde
a antiguidade até a contemporaneidade. O próximo passo trata da correlação do
design de produtos com a semiótica e da importância da semiótica para o estudo
do design. Estudamos, ainda inicialmente, a semiótica peirceana e saussuriana,
com suas respectivas riquezas, porém com foco na semiótica de Peirce, visto que é
consensualmente tida como mais completa, complexa e detalhada.

Tratamos, ainda na primeira unidade, da importante relação entre semiótica e


hermenêutica. Vemos também como ela se entrelaçam com a questão do design
de produtos. Feito isso, tomamos os mesmos procedimentos para trabalhar a
fenomenologia e sua correlação com as nossas áreas de interesse: semiótica
e design. Antes de finalizar a unidade, ainda nos focamos em questões que
correlacionam os temas semiótica, mudança de paradigmas, design de produtos e
concepções pós-estruturalistas.

Na segunda unidade, damos maior foco à questão estruturalista, sintagmática e


paradigmática, com especial atenção à linguagem e à epistemologia. Não finalizamos
sem antes trabalhar alguns aspectos práticos e importantes de serem mencionados.

Desse modo, sugerimos que não sejam negligenciadas as leituras complementares


e o bom senso da busca em caráter proativo no que tange às leituras de modo
independente baseadas nos conteúdos aqui relacionados. Para um material denso
que envolve diversas áreas do conhecimento, faz-se necessária essa dedicação.
Veja também com atenção o item “Para (não) finalizar”, ao final deste material; ali
também há diversos temas e figuras importantíssimos para a semiótica, os quais
não foram contemplados, mas que poderão ser úteis para futuros estudos.

Objetivos
» Conceituar questões elementares da semiótica e sua correlação com o
design de produtos.

» Demonstrar a relevância da semiótica para o design.


7
» Correlacionar diferentes temáticas com a semiótica e design de
produtos, tais como hermenêutica, fenomenologia.

» Tratar de questões ligadas à epistemologia, estruturalismo e


linguagem no contexto semiótico e do design.

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SEMIÓTICA E DESIGN UNIDADE I
DE PRODUTOS

CAPÍTULO 1
Conceitos elementares de semiótica

Conceitos gerais da semiótica e abordagens


históricas
Os signos estão em todos os lugares da existência humana. Signo pode ser a
interpretação da expressão facial de alguém, da crença no valor da nota de um
dólar, do sinal vermelho como símbolo universal de parar o carro no semáforo,
enquanto sua cor oposta (verde ou azul, no caso de alguns lugares do Japão) indica
que é possível seguir.

Podemos chamar essas crenças de “meras” convenções também, como o caso de


acreditar que o dia acaba à meia-noite, pois foi algo convencionado somente após
1925 – antes, em geral, se seguiam os princípios bíblicos, os quais diziam que o dia
acabava quando o Sol se punha e iniciava quando ele nascia.

Por esses motivos é que Charles Sanders Peirce (1839-1914), o mais expressivo
filósofo que trabalhou a questão da semiótica – embora Ferdinand de Saussure
(1857-1913) seja considerado o pai da semiótica –, enxergava signo em tudo, sem
exceções (importante mencionar que semiótica para Peirce era sinônimo de lógica
e vice-versa).

O termo semiótica, cunhado por Johannes Schulteus, é oriundo do grego semeîon


(“signo”) e sêma (“sinal” ou “signo”), e acabou se tornando a área de estudo do
signo, do significado das coisas e de todas as suas correlações. Há também diversas
denominações de antigamente que remetiam à semiótica, tal como semântica,
semasiologia, sematologia, semologia e semiologia, mas atualmente cada uma delas é
curso de estudos diferentes (CAMPOS; ARAÚJO, 2017).

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UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

Esse campo do saber humano tomou forma oficial em meados do século XVII,
porém somente no século XX foi que o termo semiologia foi relacionado à
tradição semiótica por Ferdinand de Saussure (1857-1913), com as sequências
conferidas por Louis Hjelmslev (1899-1965) e Roland Barthes (1915-1980). Os
países românicos foram os que mais se apropriaram desse campo, visto que,
concernente à palavra semiótica, os autores alemães e anglófonos deram maior
preferência a ela.

Com efeito, semiótica não pode ser confundida com semiologia, que possui uma
tradição saussureana. Campos e Araújo (2017, p. 12) jogam luz sobre os termos:

» Semiótica é abordada como uma ciência mais ampla dos signos,


incluindo os signos dos animais e da natureza.

» Semiologia se referiria apenas à teoria dos signos humanos, portanto


culturais, com foco textual.

» Hjelmslev, seguido por Greimas, definiram a semiótica como um


sistema de signos hierárquicos relacionados à linguagem, como a
língua, o código de trânsito, a arte, a música, ou a literatura.

» Semiologia é compreendida como a teoria geral, isto é, a metassemiótica


desses sistemas (metalíngua). Apenas em 1969 é que se deu o fim da
disputa entre os dois termos no campo científico. Isso ocorreu de modo
oficial por meio da Associação Internacional de Semiótica, que “definiu
o uso da denominação Semiótica como termo geral para o campo
de investigação nas tradições da semiologia e da semiótica geral.”
(CAMPOS; ARAÚJO, 2017, p.12)

» Semiótica, segundo Pietroforte (2004, p. 11), sob o aspecto textual,


estuda a significação, que é definida no conceito de texto. Dessarte,
o plano de expressão, por sua vez, refere-se à manifestação de um
plano de conteúdo, que se refere ao significado de algo e o que esse
algo faz para dizer o que diz, em um sistema de significação verbal,
não verbal ou sincrético.

› Sistemas verbais: são as línguas naturais; e os não verbais, os


demais sistemas, como a música e as artes plásticas.

› Sistemas sincréticos: são aqueles que acionam várias linguagens


de manifestação, como ocorre entre um sistema verbal e um não
verbal nas canções e nas histórias em quadrinhos.

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SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

Assim sendo, um mesmo conteúdo “pode ser expresso por meio de planos de
expressão de ordens diferentes, ou seja, pode-se manifestar em um plano de
expressão de ordem verbal, não-verbal ou sincrética”. O conteúdo, como dito, pode
se manifestar, por exemplo, no sistema verbal de um romance e, com isso, pode ser
“adaptado para o cinema em um plano de expressão sincrético, ou inspirar uma
sinfonia ou uma tela em planos de expressão não-verbais” (PIETROFORTE, 2004,
p. 11).

O processo de formação da ciência geral dos signos se deu por meio das reflexões
provenientes do período greco-romano, especialmente em Platão e Aristóteles –
que desenvolveram uma semiótica avant la lettre (à frente da letra) ao estudar
tanto os signos, quanto a significação e a comunicação (CAMPOS; ARAÚJO, 2017).
O Quadro 1 traça um panorama histórico da semiótica na antiguidade.

Quadro 1. Semiótica na antiguidade.

Investigou os signos a partir de vários aspectos, apontando que o signo apresentava


elementos verbais e de significação. O modelo platônico do signo foi definido em três
componentes: o nome (noma, nómos), a noção ou ideia (eîdos, lógos, dianóema) e a
Platão (427-347 a.C.)
coisa (prágma, ousía). No diálogo Crátilo, Platão investigou a relação entre esses três
componentes a fim de apontar se a relação ocorria de forma natural ou a partir das
convenções sociais.
Propôs uma nova abordagem na questão do signo. Em seus estudos, o filósofo elaborou
uma teoria dos signos a partir da lógica e da retórica, definindo o signo com base em um
Aristóteles (383-322 a.C.) modelo igualmente triádico: o convencional (symbolon), as afecções da alma (phathémata)
e o retrato das coisas (prágmata). Também restringiu o signo ao sentido verbal, utilizando
a indução para o processo de significação desses signos.
Criaram a teoria da significação utilizando o modelo triádico, a mais elaborada da
antiguidade. Consideraram que o signo é composto por três componentes: semaínon,
que é o significante, a entidade percebida como signo; semainómenon, ou lékton, que
Estoicos (300 a.C. – 200 d.C.) corresponde à significação, ou significado; e tygchánon, o evento ou o objeto ao qual o
signo se refere. Referem-se ao semaínon e ao tygchánon como entidades, e não como
nomes, ou palavras, porque as consideram materiais, enquanto identificam o lékton como
imaterial.
Em oposição aos estoicos, desenvolveram um modelo diádico do signo, em que tratam
apenas do significante (semaínon) e do objeto referido (tygchánon), definindo o signo
como um fato perceptivo que representa algo não perceptível. O modelo segue uma
Epicuristas (300 a.C.) epistemologia materialista. A maior contribuição dos epicuristas foi a zoossemiótica,
estudos sobre a linguagem animal, a partir das suas formas primitivas de comunicação à
base de sinais. Essa linha não pressupõe combinações lógicas, porque se utiliza de pistas
para interpretação dos signos.
Considerado o fundador da semiótica, suas ideias sobre foram abordadas nos tratados De
Magistro (389), De Doctrina Christina (397) e Principia (d.C. 384). Não desconsiderou a
teoria epicurista, mas seguiu mais os princípios estoicos sobre a semiótica, afirmando a
interferência mental no processo de semiose. Também propôs distinguir os signos naturais
Agostinho de Hipona (354-430 d.C.) dos convencionais. Os signos naturais significam involuntariamente algo. Um exemplo é a
fumaça, que mostra sinal de fogo. Os convencionais são criados pelos homens, como as
palavras e a lei. Agostinho deu continuidade aos estudos dos signos semióticos verbais
e não verbais. Seus estudos projetaram a abordagem escolástica que marcaria a Idade
Média.
Fonte: adaptado de Campos e Araújo (2017, pp. 13-14).

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UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

A Idade Média viu a Semiótica se desenvolver no contexto clássico da escolástica


(teologia e filosofia) e, como não poderia ser diferente, do trivium das artes liberais
(gramática, retórica e dialética/lógica). A Semiótica na Idade Média teve como
ponto central as doutrinas do realismo e do nominalismo.

Segundo Campos e Araújo (2017, p. 15), a “primeira premissa corresponde às


suposições, e a segunda aos modos de significação. Tanto uma quanto a outra
estavam voltadas para existência de universais”. Foi nesse período, ainda de
acordo com as informações trazidas pelos autores, que “surgiu a distinção entre
denotação e conotação, além da teoria da representação, com estudos voltados
para semiótica de signos, símbolos e imagens”.

Na Idade Média e mesmo na Renascença, utilizavam-se diversos vários modelos de


semiótica para a interpretação de signos humanos, animais e naturais. Campos e
Araújo (2017, p. 13) diferenciam melhor:

» Na Idade Média, eram calcados nos sentidos exegéticos.

» Na Renascença, baseavam-se nas assinaturas das coisas.

Com efeito, o sentido exegético baseia-se na hermenêutica bíblica que busca quatro
níveis diferentes de explicação do mesmo texto:

» Literal ou histórico: tal como é.

» Tropológico: refere-se à vida do homem.

» Alegórico: propósito de Deus e da Igreja.

» Anagógico: os mistérios celestes.

Destarte, a doutrina das assinaturas das coisas foi apresentada pelo médico suíço
Paracelso (1493-1541), que “apresentou um sistema de códigos para interpretação
de todos os signos naturais. No sistema, Deus não está só como autor das
mensagens. O homem, archaeus – o princípio interior do desenvolvimento –, e
astros também os produzem” (CAMPOS; ARAÚJO, 2017, pp. 13-14).

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SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

Quadro 2. Semiótica no Medievo e na Modernidade.

Roger Bacon Voltado para a teoria geral dos signos, Bacon escreveu o tratado De Signis, no qual trata
(1215-1294) especificamente dos signos, buscando classificar todos os tipos de signos existentes.

Escolástica
Também voltado para a teoria geral dos signos, Poinsot escreveu o Tractatus de Signis
Jean Poinsot (1589- (1632), em que apresentou os estudos do signo a partir do campo da lógica, definindo
1644) os instrumentos utilizados para cognição e para falar dos signos. A perspectiva da lógica
do autor será importante para os estudos desenvolvidos a partir do século XVI.

Desenvolveu sua teoria das ideias, propondo que o signo parte de três elementos
mentais: as ideias adventícias, que chegam à mente a partir dos sentidos; as ideias
Racionalismo René Descartes fictícias, produzidas pela imaginação; e as ideias inatas, que existem por si só na mente
francês (1596-1650) e não precisam da experiência para se realizar. Em sua teoria, o signo não tem caráter
referencial, porque não precisa existir a partir do contato com o mundo real. Dessa
maneira, é a ideia da coisa que representa e da coisa representada.
Considerado o principal pensador sobre a história da semiótica, seus estudos definiram
os signos como instrumentos de conhecimento e distinguiu-os em duas classes, das
ideias e das palavras. As ideias são elaboradas a partir das sensações (experiências),
John Locke (1632-
seguida de reflexão. As ideias complexas são construídas pela operação mental
Empirismo 1704)
(pensamento), relacionadas com as ideias simples. Esse estudo foi abordado em An
inglês Essay on Human Understanding (Ensaio sobre o entendimento humano), de 1960,
quando utiliza o termo semiótica.

Thomas Hobbes (1588-1639), George Berkeley (1685-1753) e David Hume (1711-1776) também foram
autores dessa corrente filosófica que se preocuparam com Semiótica.
Contribuiu para os estudos de semiótica em sua obra Scienza Nuova, de 1875,
Giambattista Vico abordando o estudo dos mitos, das metáforas, da língua e da evolução dos signos da
Pré-iluminismo
(1668-1774) humanidade. Nessa última premissa, observou três etapas no desenvolvimento dos
signos da humanidade: era divina, era heroica e era dos homens.
Aprofundou os estudos sobre a origem da linguagem a partir dos signos aplicados na
cognição humana. Na obra Essai sur l’origine des connaissances humaines (Ensaio sobre
Etienne de Condillac a origem da consciência humana), apresenta a semiose como um processo genético
(1715-1780) que se inicia em níveis primitivos, como a sensação, e vai até os níveis mais complexos,
como a reflexão. A partir disso, classificou três tipos de signos: os causais ou acidentais,
os naturais e os convencionais.
Nas obras Lettres sur les aveugles (1749) e Lettre sur les sourds et muets (1751),
Diderot (1713-
Iluminismo evidenciou os estudos genéticos de semiose humana, estabelecendo onde há diferença
1784)
entre comunicação verbal e não verbal.

A semiótica do Iluminismo teve ainda os dois expoentes alemães: Christian Wolff (1679-1754) e Heinrich
Lambert (1728-1777).

Foi um dos principais filósofos que definiu as fronteiras semióticas, abordando a


Hegel (1770-1831) diferença entre signos e símbolos. Definindo o signo como representação de alguma
coisa; e o símbolo, a manifestação de algo.
Fonte: adaptado de Campos e Araújo (2017, pp. 15-17).

Peirce definiu a semiose como ação ou influência, que é, ou envolve, uma cooperação
de três sujeitos, como um sinal, seu objeto e seu interpretante; essa influência
tri-relativa não é, de forma alguma, resolvível em ações entre pares. O linguista
Ferdinand Saussure (1857-1915), por sua vez, iniciou uma corrente pensando a partir
das estruturas da linguagem. Para ele, a Semiologia “investiga todos os sistemas
de signos, a partir do contexto social, sendo a Linguística uma vertente. Parte da

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UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

análise da linguagem natural para os outros sistemas de significação, com enfoque


estruturalista”. Com efeito, o “sistema proposto por Saussure desvincula a língua e
a linguagem, buscando a constituição de um modelo geral para o estudo de todas as
linguagens” (CAMPOS; ARAÚJO, 2017, pp. 17-18).

Antes de prosseguirmos nos voltando para como a disciplina é entendida


atualmente – especialmente em Peirce e Saussure –, vale a pena ressaltar a
correlação existente e as implicações da semiótica no design de produtos nas
especificidades da semiótica.

Design de produtos e a semiótica


Oriundo do verbo latino designare, que literalmente significa determinar – ou
“demonstrar de cima”, denota aquilo que transforma o vago em determinação
progressiva. Sendo compreendido de modo geral e abstrato, o termo design
(designatio) é algo que se determina por meio de uma apresentação (BÜRDEK, 2010).

Bürdek (2010) afirma que design é uma atividade cujo teor está diretamente
relacionado a conceitos de:

» criatividade;

» fantasia cerebral;

» senso de invenção; e

» inovação técnica.

Em virtude disso, uma expectativa é gerada mediante o processo de design ser


considerado, por conseguinte, uma espécie de ato cerebral. Muito se diz que
um designer não é senão um desenvolvedor da interface do produto. Em outras
palavras, trata-se de um designer que desenvolve a interface do produto, não desde
a aparência do produto, mas após o lançamento, pelo menos em modo de teste.

O designer do produto não possui o conhecimento da outra ponta (o “ponto


B”), isto é, o ponto de extremidade, quando o trabalho pode ser considerado
concluído. Ele é aquele que está do outro lado (no “ponto A”) e que precisa
enxergar o que ninguém ou poucos estão enxergando após a produção do
produto.

A interface do produto – que significa qualquer informação na tela ou interface


interativa – começa sempre com um conceito. Um conceito não significa apenas

14
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

projetar, mas também atribuir funcionalidade, prototipagem e estrutura da interface.


O conceito de interface do produto é uma referência a partir da qual o produto inicia
sua vida.

Na maioria das vezes, o trabalho na interface do produto é apresentado em duas


etapas finais:

» design de conceitos – por exemplo, de páginas principais;

» design de todas as outras partes – as demais páginas.

Bürdek (2010) comenta que questões históricas, socioeconômicas, tecnológicas,


e, em especial, as culturais, influenciam diretamente no design do produto. E
não é somente isso. Aspectos ergonômicos, políticos, artísticos-experimentais e, em
grande medida – especialmente por se tratar de um tema demasiadamente atual –,
ecológicos estão em voga, embora, é claro, não se limite a atender somente a esses
requisitos – ainda que não sejam poucos. Destarte, lidar com design “significa
sempre refletir as condições sob as quais ele foi estabelecido e visualizá-las em
seus produtos” (BÜRDEK, 2010, p. 225).

À luz do contexto semiótico, o design não necessariamente produz realidades


materiais apenas, mas, em especial, dá conta de funções comunicativas. Ou
seja, o atendimento de funções práticas é um dos cernes da disciplina, isto é, as
capacidades “funcionais e técnicas dos produtos, questões do uso ou aspectos do
atendimento de necessidades, as funções sociais” (BÜRDEK, 2010, p. 229).

O semioticista Umberto Eco (1932-2016) se destacou na elaboração de uma


perspectiva semiótica para o estudo da cultura. Campos e Araújo (2017) afirmam
que a semiótica é capaz de estudar todos os objetos culturais, que vão desde
práticas religiosas até filmes de Hollywood. Nada que faz parte da cultura escapa
ao campo da imagética humana. E, como a questão do design, como mencionado,
está diretamente relacionada com a cultura, Eco possui um papel importante.

Semiótica e cognição na perspectiva histórico-cultural. Disponível


em: pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
389X1995000200005.

Bürdek (2010) nos informa, na exemplificação de Eco, que trabalhar com uma
cadeira pensada como trono não significa apenas fazer um objeto para alguém se
sentar. Essa função – somente uma entre muitas outras – não é bem compreendida
em grande parte dos casos. O trono, a seu ver, também deve transmitir majestade,
representar o poder, despertar receio. Esses significados serão também transferidos
para outras cadeiras, a depender do contexto em que estiverem.

15
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

Com efeito, uma cadeira de escritório não deve senão atender muito bem a
premissas ergonômicas, mas também é importante transmitir por meio dela
qual a posição hierárquica do usuário – ainda que muitas empresas modernas
procurem nivelar o pessoal por técnicas como: não adotar divisórias, não
diferenciar acentos para cargos de chefia, adotar ambiente colorido, com jogos de
mesa espalhados pela empresa etc., a exemplo de muitas empresas de tecnologia
hoje em dia.

Uma abordagem semiótica para o estudo do


design
O problema do estudo do design é que a construção virtual, seu produto pretendido,
não é visível. Obviamente, o design geralmente está associado às coisas que somente
podem ser feitas por meio do auxílio de artefatos materiais, como desenhos. Mas
isso não é o design, como enfatizam Medway e Clark (2003).

O design, em seus estados emergentes e finais, é um complexo de ideias. Existe na


consciência um objeto de cognição, o que significa dizer que não é precisamente
um fenômeno material, embora esteja indubitavelmente “acoplado”, como
dizem os teóricos dos sistemas, “vagamente” ou “firmemente”, com processos
neurofisiológicos. Uma abordagem semioticamente inspirada pode ser útil na
medida em que aborda sinais, que são, por definição, bilaterais, compreendendo
uma forma material ou quase material e um significado ou efeito na consciência
(MEDWAY; CLARK, 2003).

Os signos, ainda de acordo com esses autores:

» Pertencem ao mundo exterior dos fenômenos fisicamente detectáveis e


ao mundo interior da mente.

» É uma coisa ou processo material, como uma palavra falada ou


chamas subindo de um prédio.

» Algo não é considerado um signo a menos que seja acompanhado


por um significado ou efeito, algo que acontece na mente como
resultado de tratarmos a coisa ou processo como um sinal, e não
apenas como meras coisas físicas.

» É nosso ato de interpretar ou ler que faz de um sinal um sinal.

» Uma abordagem semiótica enfoca, portanto, sinais, não mentes.

16
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

No modelo Medway e Clark (2003), a ideia simplesmente muda ou permanece a


mesma ao longo do tempo como resultado das atividades semióticas às quais está
sujeita. Para eles não é uma prioridade discriminar entre processos cognitivos
individuais e sociais, que, de qualquer forma, estão inextricavelmente entrelaçados.

Os autores, nós e a maior parte dos estudiosos no tema, consideram a semiótica


de Peirce mais relevante do que a semiologia de Ferdinand de Saussure. Para
Peirce, o sinal, uma vez que o reconhecemos como um sinal, tem um efeito em
nossas mentes, de modo que lembramos o que está sendo referido, mesmo que
essa coisa não esteja presente na percepção ou que associações particulares de
emoção, modo ou tom sejam evocados.

Trabalharemos mais adiante a semiótica peirceana, por ora é importante ressaltar o


que os autores mencionados estão comentando, que é entender esse evento na mente
dando-se como resultado do “disparo” do signo, cuja denominação dada por Peirce é
de interpretante. O signo não é necessariamente uma coisa ou um processo material
externo, mas pode ocorrer como um evento ou estado mental (MEDWAY; CLARK,
2003).

Medway e Clark (2003), quando imersos em contextos práticos de produção de


produtos, tomam como certo que o design não é o desenho, mas a ideia que o
desenho (sempre parcialmente) representa. Tratam essa concepção como um sinal
complexo e notam o caráter específico e os processos (transformação, conexões,
separações etc.) por que ela passa, tudo com base, ainda, no que se pode observar
e no que os participantes podem nos dizer.

A semiótica de Saussure e de Peirce


Como mencionado anteriormente, temos em Ferdinand de Saussure (1857-1913)
o nascimento da Semiologia propriamente dita; e em Charles S. Peirce (1839-1914),
seu maior expoente, embora denominada semiótica por ele. É salutar não confundir.
O objetivo do modelo semiológico de Saussure é o da análise da natureza no signo
linguístico.

Tratemos de ambos por alguns itens adiante.

Semiótica saussuriana

Saussure explicava os conceitos de significante e significado, em que aquele nada


mais é do que a palavra; e esse, por sua vez, o mesmo que as “coisas” do mundo.

17
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

Desse modo, para ele é incorreto usar a palavra “árvore” na lousa, por exemplo,
e ao mesmo tempo apontar para uma árvore fora do prédio, pois a primeira seria
entendida como significante; enquanto a segunda, como significado. Lopes e
Hernandes (2015) dizem que o signo é uma relação entre um significante e um
significado em Saussure, e não entre uma palavra e uma coisa.

Para Saussure (2006), o signo é uma entidade entre a representação


mental do som (significante) e a ideia (significado). Nesse modelo,
não existe nada fora do sistema de significado e significante, ou
seja, fora da Linguagem. Compreende que tanto o significante
quanto o significado são de ordem linguística e se unem em nosso
cérebro por associação, independentemente de qualquer objeto
externo, porque não há objeto de referência. O pensamento antes
da língua é uma massa amorfa (CAMPOS; ARAÚJO, 2017, p. 46).

Quando Saussure define uma relação existente entre o significante, o significado


e a imagem acústica do signo, o sentido do signo passa a não mais depender de
um referente fora da língua – como a árvore da paisagem supracitada – passando
a ser determinado por uma relação entre dois pontos importantes da linguística,
quais sejam, (I) uma imagem acústica, de ordem fonológica, e (II) um conceito,
cuja ordem é semântica (LOPES; HERNANDES, 2005).

Na concepção de linguagem, em que existe uma relação entre palavras e “coisas”,


o sentido está nas “coisas do mundo” e é refletido pela linguagem. Conforme
apontam Lopes e Hernandes (2015, p. 156), na proposta de Saussure, o sentido
de um signo é determinado a partir das relações que ele contrai com os demais
signos do sistema linguístico do qual ele faz parte, de modo que o sentido é
construído não por referência a “coisas reais”, mas por meio dessas relações entre
signos. Com isso, o sentido emana da língua e se projeta no mundo, invertendo
o vetor da primeira concepção.

Nos informam os autores ainda que essa concepção de língua como princípio de
classificação, por meio do qual é construída uma visão de mundo, vai de encontro
à noção de grau zero da linguagem, o qual, por sua vez, é suportado pela relação
entre palavras e “coisas” (LOPES; HERNANDES, 2005). Eles nos conferem mais
detalhes acerca do pensamento saussureano:

» A linguagem em estado de grau zero está relacionada às “coisas” com


objetividade.

» É por meio da chamada linguagem denotativa, de modo que há uma


relação direta entre as palavras e as coisas, o que faz com que, nesse
ponto de vista, a linguagem reflita o mundo objetivo.

18
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

» Ao lado da ordem direta, existe uma utilização da linguagem


denominada linguagem figurativa ou conotativa, em que existem
desvios da ordem.

» Existe uma linguagem própria, que é usada fundamentalmente em


discursos objetivos – como o científico.

» Existe uma linguagem figurada, que, por sua vez, é usada naqueles
discursos conhecidos como subjetivos, como o literário, de maneira
que a linguagem própria ganha o estatuto de “verdadeira” e a figurada
de “inventada”.

» A concepção de Saussure acerca de significante/significado – que


anteriormente eram tratados como acústica/conceito em seu modo
de pensar – propõe deixar a oposição mais clara e coerente, bem
como a aplicação mais correta quando o signo não é vocalizado
(falado).

Saussure entende o significado como sendo o valor de um conceito dentro do


sistema semiológico. Ele alega que na língua tudo é negativo pelo fato de o
significado ser construído pela diferença ou, ainda, pela oposição de outros
significados – por exemplo, o azul só é azul porque não é vermelho (CAMPOS;
ARAÚJO, 2017).

Estruturalismo e semiótica: aproximações entre Saussure e Greimas.


Disponível em: www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/
article/view/9325.

De que leitura de Saussure parte Halliday: um rastreamento na Linguística


Sistêmico-Funcional. Disponível em: https://proceedings.science/ciel-2017/
papers/de-que-leitura-de-saussure-parte-halliday%3A-um-rastreamento-na-
linguistica-sistemico-funcional?lang=pt-br.

Semiologia e semiótica: o mundo cultural dos símbolos. Disponível em:


https://www.tribunapr.com.br/noticias/semiologia-e-semiotica-o-mundo-
cultural-dos-simbolos/.

Semiótica peirceana

Em Peirce, o entendimento é bastante amplo, especialmente pelo fato – já


comentado – de que, para ele, é não é nada mais senão sinônimo de lógica.

19
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

Em Peirce, segundo Campos e Araújo (2017, p. 47):

[...] o signo é global e não segmentado porque evoca referentes e


suscita interpretações. É justamente por isso que na visão de Peirce o
signo é triádico e não diádico, como o de Saussure. Se o interpretante
não existisse nesse modelo, o representamen não apareceria como
representação do objeto. Para Peirce, o signo só é signo por ser
interpretado como tal. O signo, dessa maneira, representa um objeto
e todo objeto pode vir a ser um signo. Essa correlação entre os três
elementos é dinâmica porque o representamen representa o objeto e
o interpretante faz com que ele seja percebido, e, concomitantemente,
o que é interpretado é a representação do objeto e pode se tornar um
novo representamen reiniciando o processo.

Em Peirce, o interpretante – a resposta mental ao signo – não é necessariamente


um ato único, mas é mais tipicamente uma cadeia de eventos ou a ativação
simultânea de redes de conhecimento e afeto associados. Assim, a interpretação
que é ativada pela palavra árvore age como um sinal, provocando outros eventos
mentais, como lembranças, associações e definições, e eles, por sua vez, agem
como sinais de que fazem outras coisas acontecerem – e assim continua até algo
parar. Então, Peirce fala de “semiose sem fim” (MEDWAY; CLARK, 2003).

Segundo Atkin (2013), é possível pensar o signo peirciano, por um lado, como
o significante, como exemplo, uma palavra escrita, um enunciado. O objeto,
por outro lado, é mais bem pensado como o que se quer que seja significado,
por exemplo, o objeto ao qual a palavra escrita ou pronunciada se anexa.
Enquanto houver tempo, o signo vai incorporando e desenvolvendo suas
potencialidades. A árvore, conforme comentado acima, também é um signo
que está se mostrando.

Outro exemplo ainda é a palavra pássaro que, segundo Campos e Araújo


(2017, p. 47), quando associada a uma representação imagética, pode significar
matrimônio ou paz. O signo, nesse caso, estabelece uma relação simbólica e só
existe por causa dessa relação estabelecida por convenção com o seu objeto, ou
seja, a ideia peirceana da “mente-que-usa-o-símbolo”.

Vale ressaltar que todo signo pode tornar-se um símbolo desde que sua significação
esteja ligada a uma convenção aceita socialmente, conforme demostrado na
Figura 1.

20
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

Figura 1. Exemplos de signos simbólicos: (a) balança, símbolo da Justiça; (b) logotipos de grandes mídias sociais;

(c) quatro operações matemáticas, (d) Pi.

Fonte: Pixabay (2016; 2017).

Peirce entende os signos como três partes interrelacionadas:

» Um signo: que pode ser um significante (representamen), por


exemplo, uma palavra escrita, um enunciado, a fumaça como um
sinal de fogo etc.

» Um objeto: pensado como o que se quer que seja significado, por


exemplo, o objeto ao qual a palavra escrita ou pronunciada se anexa –
o fogo representado pela fumaça.

» Um interpretante: de característica inovadora em Peirce, é mais


bem compreendido como o entendimento que temos da relação
sinal/objeto. Aqui a significação não é uma simples relação diádica
entre signo e objeto: um signo significa somente ao ser interpretado.
Isso torna o interpretante central para o conteúdo do sinal, uma vez
que o significado de um sinal é manifesto na interpretação que gera nos
usuários do sinal.

A Figura 2 nos traz a relação dos elementos que compõem o signo, que a seguir
exemplificaremos como bandeira, nos ajudando a compreender esse conceito
tricotômico dos signos em Peirce.

21
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

Figura 2. A correlação entre os três elementos do signo.

Fonte: Campos e Araújo (2017, p. 47).

Para efeitos de exemplificação, pensando no caso de uma bandeira (não


apresentada, mas se fácil percepção mental, pode ser a do Brasil, por exemplo)
portanto, o objeto seria a bandeira: o representamen é entendido como o que
a bandeira representa e o interpretante como a ideia da bandeira. O que gera
dúvida e o mais original seria o representamen, que seria somente aquilo que
representa algo para alguém, seja objeto, seja uma qualidade do objeto. Ele
endereça a alguém, isto é, cria na mente da pessoa um signo equivalente ou mais
desenvolvido. Os signos têm vida própria. O importante é que no processo de
semiose o representamen fique no lugar do objeto e dê a ideia de uma concepção
desenvolvida.

O representamen também possui características triádicas, quais sejam:

1. qualidade, característica e possibilidade;

2. relação real existente, relação existente e fato; e

3. lei geral, interpretante e razão.

As três características do interpretante, são:

1. qualisign: qualidade de um signo;

2. sinsign: ser unicamente ele mesmo; e

3. legisign: lei de um signo. É a réplica do signo.

O objeto, por sua vez, possui:

1. Rheme: signo de qualidade, icônico, qualisign. Pura possibilidade,


fluído. Relação de um, pois expressa uma qualidade.

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SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

2. Dicent Sign: é um signo de existência real. O que o constitui é uma


relação de dois. Uma relação física.

3. Argument: é compreendido na medida em que ele é um signo


propriamente dito. Relação geral, uma relação de três.

Com efeito, o signo é aquilo que é em si mesmo quando ele pode ficar no lugar do
objeto. Ou seja, o signo nele mesmo pode expressar também três características:
(1) qualidade (se tiver algo aqui, haverá uma relação com objeto); (2) relação real
existente; e (3) lei geral.

Vale lembrar que a réplica somente é significativa se existe uma regra/lei que
a ratifica. Com efeito, quando, no trânsito, o motorista para diante da placa
“Pare” porque existe uma lei (ou convenção) que assim aduz. Dessarte, a placa
de velocidade, da mesma forma, é um signo porque é uma lei geral. Com efeito,
somente pode ser signo se o objeto, de fato, existir; mas não há uma relação direta
entre a existência do objeto e o signo. Isso se dá somente em função da qualidade
dele que o torna signo.

Peirce, em seu texto O que é um signo?, 1894, afirma que é preciso reconhecer
três estados mentais diferentes para iniciar a compreensão acerca do assunto. Para
ele, existem três tipos de interesses que podemos ter em uma coisa. O primeiro
é que podemos ter um interesse primário na coisa por si só, ou seja, por ela
mesma. O segundo é que podemos ter um interesse secundário nela por causa
de suas reações a outras coisas. Por último, podemos ter um interesse mediador
enquanto transmitimos à mente uma ideia sobre uma coisa. Ao fazê-lo, é um sinal
ou representação. Sinal este que, para o nosso pensador, também é caracterizado
em três diferentes tipos, conforme esboçado no Quadro 3.

Quadro 3. Três caracterizações do sinal.

Semelhanças ou ícones que servem para transmitir ideias das coisas que elas representam simplesmente imitando-as
que mostram algo sobre as coisas por estar fisicamente conectado a elas. Essa é uma placa de sinalização,
que indica o caminho a seguir, ou um pronome relativo, localizado logo após o nome da coisa que pretende
Indicações ou índices
denotar, ou uma exclamação profissional, como “Ei! Ei!”, que atua sobre os nervos da pessoa a quem ele é
direcionado e o força a prestar atenção.
que foram associados ao seu significado pelo uso. Constitui a maioria das palavras e frases, fala, livros e
Símbolos ou sinais gerais
bibliotecas.
Fonte: adaptado de CP 2, 281, 298.

Em Peirce, sinal não é algo senão um objeto perceptível ou apenas imaginável.


Aqui surge o contexto a priori e a posteriori. A palavra banco, por exemplo, possui
diversos significados – agência bancária, banco para sentar-se –, assim como
manga (fruta, da camisa etc.), rosa (flor, nome próprio, adjetivo a uma pessoa

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UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

doce e gentil) etc. Todavia, para que algo seja considerado um signo, este deve
representar algo diferente chamado objeto, embora a condição de que um signo
seja algo diferente de seu objeto possa ser arbitrária, uma exceção pode se dar no
caso de um sinal que faz parte de um sinal.

Com efeito, como nos diz Peirce, um sinal pode ter mais de um objeto. Portanto,
o exemplo “Caim matou Abel” é um signo, porquanto refere-se, ao menos, a Abel
e Caim, mesmo que não seja tomado como deveria, ou seja, tendo “assassinato”
como um terceiro objeto. Contudo, “o conjunto de objetos pode ser considerado
como compondo um objeto complexo. No que se segue, e frequentemente em
outros lugares, os Sinais serão tratados como tendo apenas um objeto cada um
para eliminar as dificuldades de seu estudo” (CP 2, 230-232).

Desse modo, se um signo não representa outra coisa senão seu objeto, é necessário
que haja, em pensamento ou expressão, alguma explicação ou argumento,
ou ainda outro contexto que mostre como em qual sistema ou por que motivo
o signo representa o objeto ou o conjunto de objetos que representa. O sinal
pode representar apenas o objeto. Não pode oferecer um relacionamento ou
reconhecimento de tal objeto, isto é, aquilo com que pressupõe conhecimento
para poder fornecer algumas informações adicionais que o interessam.

Não há dúvida, segundo Peirce, “de que haverá leitores que dirão que não
conseguem entender isso. Eles acham que um Signo não precisa se relacionar com
algo conhecido de outra forma e não veem pés nem cabeça para a afirmação de que
cada Sign deve se relacionar com esse Objeto”. Entretanto, ainda segundo ele, “se
houver algo que forneça informações e ainda não tenha nenhum relacionamento
ou referência a algo com o qual a pessoa a quem ela fornece informações tenha,
quando entender essas informações, adquirirá conhecimento” (CP 2, 230-232).

A fim de finalizar esse ponto, Peirce nos traz um exemplo que facilita a compreensão:

Dois homens estão em uma praia, olhando para o mar. Um diz ao


outro: “Esse navio não tem carga, apenas passageiros”. Agora, se o
outro por si só não vê o navio, as primeiras informações que ele extrai
do comentário têm como objeto a parte do oceano que ele bmjhque
informa que uma pessoa com olhos mais nítidos que os seus ou mais
treinada para procurar essas coisas, consegue enxergar o navio; e
então, tendo introduzido a existência de um navio desse tipo, o que
enxerga menos passa a estar preparado para receber informações
referentes ao navio que transporta exclusivamente passageiros.
Porém algo é certo, a frase como um todo não possui, para a pessoa
que enxerga pouco, nenhum outro Objeto além daquele sobre o qual
já possui algum conhecimento (CP 2, 230-232).

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SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

Nos cabe debruçar doravante mais um pouco sobre a questão semiótica dos
signos, porém com foco em índice, ícone e símbolo.

Ícone, índice e símbolo


Em Peirce, ícones são sinais que têm semelhança ou proximidade com seus
objetos; os índices que têm conexões factuais com seus objetos e os símbolos têm
conexões racionais com seus objetos. O Quadro 4 contém informações de modo
mais didático.

Quadro 4. Conceitos básicos sobre ícone, índice e símbolo em Charles S. Peirce.

Tem uma semelhança física com o significado, isto é, com a coisa sendo representada. Uma fotografia é um bom
exemplo, pois certamente se parece com o que representa.
Proveniente de index, em latim, tal como o próprio termo latino instrui, ele é aquele que indica algo. Aqui as relações
com a hermenêutica se entrelaçam. Serve para ser interpretado por aquele que o vê, o qual interpretará a partir de suas
experiências pessoais. Serve de sinal ou indicador a ser interpretado.
Nada mais é senão a âncora da realidade e o símbolo, a generalização que permite e controla tal conduta.
Está fisicamente conectado ao seu objeto que lhe é próprio; eles fazem um par orgânico. Mas a mente que interpreta
não tem nada a ver com essa conexão, exceto observá-la depois de estabelecida.
Não tem semelhança entre o significante e o significado. A conexão entre eles deve ser aprendida culturalmente.
Índice

“Bater à porta”. Bater é um índice, ou seja, não é algo criado para ele, não se trata também de
nenhuma semelhança, é simplesmente o aqui e o agora acontecendo e em pleno desenvolvimento.
Quem bate não necessariamente quer entrar.
Exemplos de
índice

Números e alfabetos também são bons exemplos. Não há nada inerente ao número 9 para indicar o
que ele representa. Deve ser aprendido culturalmente.

São os signos totalmente motivados, pois mantêm uma relação de contiguidade com o objeto representado. A exemplo
de um desenho de uma casa, este é um ícone, uma vez que representa graficamente aspectos visuais do objeto casa.
Proveniente do grego eikón (imagem), com inclinação religiosa, especialmente em função da religião cristã, é entendido
como possibilidade de algo. Seria uma semelhança que não tem uma conexão dinâmica (conexão energética) com
o objeto que ela representa. Uma cor, por exemplo, é pura possibilidade. O ícone possui uma característica que o
torna significativo. O ícone apenas é considerado ícone quando fica no lugar de alguma coisa segundo a qualidade do
outro; isso não está na própria qualidade, mas é uma característica de generalidade. O fato de serem semelhantes não
necessariamente representa o outro, como é o caso da cor.
Mostra evidências do que está sendo representado.
É o único que pode gerar algo novo.
Ícone
Para Peirce “toda asserção deve conter um ícone ou conjunto de ícones, ou ainda deve conter signos cujo significado
seja explicável apenas por meio de ícones. A ideia que o conjunto de ícones contido em uma asserção significa pode
ser chamada o predicado da asserção” (CP 2, 278).
Entendê-lo como a possibilidade é uma boa alternativa.

Um bom exemplo é usar uma imagem de fumaça para indicar fogo.


Exemplos de
Ícone Signo qualitativo (tem por base uma qualidade), ou seja, vermelho pode remeter a sangue, enquanto
mapa, que também é um ícone, representa a forma de um país.

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UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

O símbolo é a semiótica propriamente dita pelo fato de abarcar os demais, ou seja, a própria representação de algo que,
por sua vez, é interpretado.
Representa uma ideia genérica, como a pomba branca que representa a paz ou uma balança que representa a justiça.
Símbolos são constituídos socialmente, juntando uma representação a um conceito genérico.
Tem uma relação convencional.
Está conectado ao seu objeto em virtude da ideia da mente que usa símbolos, sem a qual essa conexão não existiria.
Símbolo
O símbolo nunca denota uma causa particular.
Um sorvete: o símbolo é o próprio sorvete, isto é, qualquer sorvete. Com efeito, o sorvete de uva,
daquela lanchonete etc., é particular, portanto, não é um símbolo. Ele perderia a característica que o
Exemplos de torna um signo se não houvesse um interpretante.
símbolo Um círculo, losango, o verde etc.: não têm relação direta com a coisa em si. O verde é um bom
exemplo, pois ele pode representar a floresta na bandeira do Brasil que por si só já um signo. Ou
seja, é a representação da representação.
Fonte: adaptado de Peirce (1958).

Para efeitos ainda didáticos, em resumo e se adaptarmos os pensamentos de


Peirce acerca de ícone, índice e símbolo à luz de uma abordagem contemporânea,
teríamos o seguinte exemplo: o ícone seria o mapa de um país ou uma região, o
qual representa o próprio território físico; o índice seria o ponto atual no GPS,
ou seja, o que mostra onde se está; o símbolo pode ser a própria fronteira, sendo
isso algo puramente simbólico uma vez que somos nós mesmos que limitamos os
espaços.

Figura 3. GPS: exemplo didático de ícone, índice e símbolo.

Fonte: Pixabay (2018).

Primeiridade, secundidade e terceiridade


Peirce entende como primeiridade a primeira sensação, algo como quando Adão
abriu os olhos pela primeira vez. Ou seja, nesse caso, Adão e o mundo seriam
uma coisa só. Uma definição pura de ícone seria a possibilidade que representa a
primeiridade. Esta ainda apresenta as seguintes características:

» Sensação é uma só.

» Sem nome.

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SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

» Não há uma relação de dois.

» Não é o sujeito que percebe, mas se trata de uma dissociação do eu


com a qualidade percebida.

» Simplesmente é.

Secundidade, por sua vez, pode ser compreendida como reação. Dessarte, está
relacionada com:

» contraste de qualidades;

» ação e reação;

» causa e efeito (estado de dois; resistência e ação);

» possibilidade daquilo que se fez universo, isto é, de um signo que vai


se determinando com a lei;

» contínuo, é um contínuo de possibilidades;

» geral, que é a concentração do geral na generalidade.

Por fim, terceiridade, que pode estar diretamente relacionada ao pensamento,


seria a ação como um meio para produzir o resultado. A secundidade relaciona-se
com a força bruta, como a batida de um carro, por exemplo; já a terceiridade é
caracterizada por uma regra geral.

» Duas coisas estão implicadas na reação, mas no estar governado há


uma terceira coisa que é um meio para um fim, isto é, pensamento,
estado de uma relação de três.

» O universo existe porque tem secundidade e é real porque tem uma


terceiridade.

» Tempo é um exemplo de terceiridade.

» Possibilidades que se realizaram é uma terceiridade, sendo que o


tempo é uma possibilidade que se realizou.

» Tudo o que é expectativa é da ordem da terceiridade.

» Quanto menos mediado por conceitos, mais próximo da terceiridade.

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UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

O passado está na terceiridade, pois nela está incorporada a relação de dois, que é
uma regra geral. Em suma:

» acaso = primeiridade;

» existência Bruta = secundidade; e

» leis = terceiridade.

Esses três tipos de signos podem ser exemplificados como uma fotografia, pois são
exatamente iguais aos objetos que elas representam. Porém essa semelhança se
deve ao fato de as fotografias serem produzidas sob determinadas circunstâncias,
sendo fisicamente obrigadas a corresponder à natureza do original. Nesse sentido,
elas pertencem à segunda classe de sinais, ou seja, da conexão física.

Peirce diz que se se supuser que as zebras provavelmente sejam animais


obstinados ou desagradáveis de alguma outra maneira, é porque parecem ter uma
semelhança geral com burros, e burros são teimosos. Nesse caso, “o burro funciona
exatamente como uma provável semelhança com a zebra”. Com efeito, é verdade
que assumimos que a semelhança tem uma causa física na herança; contudo,
“essa afinidade herdada é, em si mesma, apenas uma inferência da semelhança
entre os dois animais, e não temos (como no caso da fotografia) conhecimento
independente das circunstâncias de produção das duas espécies” (CP 2, 281, 299).

Indicações

No que concerne às indicações, Peirce diz que desenhos – semelhanças puras


– não podem transmitir a menor informação. Assim, o desenho de uma roda,
por exemplo, deixa o espectador na incerteza sobre se ela é uma cópia de algo
realmente existente ou um mero jogo de imaginação. O mesmo pode ser aplicado
à linguagem geral e a todos os símbolos.

Com isso, não há combinação de palavras – desconsiderando nomes próprios


e ausência de gestos ou outros concomitantes indicativos de fala – que transmita
alguma informação.

Peirce explica que, para identificar um objeto, geralmente indicamos seu lugar
e determinamos uma hora; e, em qualquer caso, deve ser mostrado como uma
experiência sua pode ser conectada à experiência anterior do ouvinte. Para
determinar um tempo, devemos calculá-lo a partir de um tempo conhecido – seja
o momento presente, seja o suposto nascimento de Cristo, seja algo semelhante.
Quando dizemos que o tempo deve ser conhecido, queremos dizer que ele deve
28
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

estar conectado à experiência do ouvinte. Também temos que calcular em unidades


de tempo; e não há como saber qual unidade pretendemos usar, a menos que
apelemos para a experiência do ouvinte. Da mesma forma, nenhum lugar pode
ser descrito exceto por referência a um lugar conhecido; e a unidade de distância
usada deve ser definida por referência a alguma barra ou objeto que as pessoas
possam realmente usar, direta ou indiretamente, para medir (CP 2, 281, 300).

Peirce comenta que o mapa (muito útil também para compreendermos as diferenças
de ícone, índice e símbolo) é bastante útil para designar um local e, para ele, como
é para o senso comum, um mapa é um tipo de desenho. Entretanto, “a menos que
o mapa tenha a marca de uma localidade conhecida, a escala de milhas e os pontos
da bússola, ele não mostraria melhor onde está um lugar do que o mapa mostra a
situação de Brobdingnag nas Viagens de Gulliver” (CP 2, 281, 300).

Nosso filósofo nos convida a refletir sobre a possibilidade de ser encontrada uma
nova ilha no Oceano Ártico, por exemplo. A situação poderia ser aproximada em
um mapa que não tivesse letras, meridianos ou paralelos; desde os caminhos
familiares da Islândia em terras árticas. Nesse caso, segundo Peirce, usaríamos
nosso conhecimento de que não há outro lugar em que algum ser neste mundo
seja capaz de mapear o que se traçou. Tal experiência do “mundo em que vivemos
torna o mapa mais do que um mero ícone e fornece os caracteres adicionados de
um índice. Desse modo, é verdade que um e o mesmo sinal pode ser tanto uma
semelhança quanto uma indicação. Mesmo assim, as funções desses tipos de signos
são totalmente diferentes” (CP 2, 281, 301).

Pode-se objetar, segundo Peirce, que as semelhanças e os índices são baseados na


experiência: a imagem de vermelho não tem sentido para uma pessoa cega, bem
como a imagem da paixão erótica não faz sentido para a criança. Mas essas são
realmente objeções que ajudam na distinção; uma vez que não é a experiência,
mas a capacidade da experiência, o que mostra que é um requisito para uma
similaridade; e esse requisito não é para a semelhança ser interpretada, mas para
ser apresentada aos sentidos. Muito diferente é o caso de uma pessoa sem uma
experiência anterior e de outra com experiência prévia: elas encontram o mesmo
homem e percebem as mesmas peculiaridades, as quais indicam uma história
completa para o homem com experiência anterior, porém não revelam nada ao
homem experiente (CP 2, 281, 301).

Com efeito, de acordo com Peirce, tudo o que focaliza a atenção é uma indicação.
Isto é, “tudo o que nos surpreende é uma indicação, na medida em que marca a
união de duas partes da experiência”. Dessarte, “um raio tremendo indica que algo

29
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

considerável aconteceu, embora não possamos saber de maneira precisa qual foi o
evento. Mas você pode esperar se conectar com alguma outra experiência” (CP 2,
281, 301).

Símbolos

A palavra símbolo tem tantos significados que, de acordo com Peirce, seria uma
ofensa para o idioma adicionar um novo. Ele nos diz que não acredita que o
significado que ele dá a símbolo esteja no âmbito de um signo convencional ou de
um que dependa de um hábito (adquirido ou inato), seja um significado novo ou um
retorno ao significado original.

Peirce busca na filosofia grega a terminologia. Ele afirma ser comum dizer que, na
palavra símbolo, é necessário entender a união no sentido de conjectura; mas, se
fosse esse o caso, deveríamos descobrir que, às vezes, pelo menos isso significava
uma conjectura, um significado que pode ser pesquisado em vão na literatura. Os
gregos costumavam “unir” (sumballein) com significado de fazer um “contrato”
ou “acordo”. Então, encontramos o símbolo (sumbolon) usado no passado com
o sentido geral de acordo ou contrato. Aristóteles, por exemplo, chama o nome
símbolo, isto é, signo convencional (CP 2, 281, 302).

Na Grécia, um relógio de fogo é um símbolo, isto é, um sinal convencionado;


uma bandeira ou bandeira é um símbolo; uma senha é um símbolo; um logotipo
é um símbolo; o credo de uma igreja é chamado de símbolo, porque serve como
distintivo ou lema; uma entrada de teatro é um símbolo; todo bilhete ou cheque
que dá direito a receber algo é um símbolo. Além disso, toda expressão de
sentimento era chamada de símbolo (CP 2, 281, 302).

Toda palavra comum para Peirce é um símbolo, como dar, pássaro, casamento etc.
Com efeito, é aplicável a tudo o que pode ser encontrado e realiza a ideia conectada
com a palavra; o símbolo não identifica, por si só, essas coisas.

Uma reflexão sobre a filosofia de C. S. Peirce. Disponível em: books.scielo.


org/id/296z5/pdf/wanner-9788523208837-03.pdf.

A “virada espacial” e a semiótica: uma proposta alternativa ao


pensamento binário. Disponível em: https://casperlibero.edu.br/wp-
content/uploads/2015/12/Juliana-Franco.pdf.

Charles Sanders Peirce: ciência enquanto semiótica. Disponível em: www.


scielo.br/pdf/trans/v12/v12a06.pdf.

30
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

Charles Sanders Peirce: a lógica considerada como semiótica. Disponível


em: https://repository.globethics.net/handle/20.500.12424/3726.

Semiótica y acción comunicativa: una ruta entre Pierce, Apel y Habermas.


Disponível em: www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S1870-00632005000300008.

Estudos da semiótica na ciência da informação: relatos de


interdisciplinaridades. Disponível em: portaldeperiodicos.eci.ufmg.br/index.
php/pci/article/view/1501.

31
CAPÍTULO 2
Semiótica e hermenêutica

Semiótica, hermenêutica e design


Semiótica, hermenêutica e design possuem estreitas relações. Enquanto a
semiótica é a disciplina que estuda os signos, a hermenêutica é aquela que estuda
sua interpretação, isto é, como (how?) serão interpretados, o que (what?) será
interpretado, por quem (who?), quando (when?), onde será interpretado (where?),
o porquê (why?) e qual o custo de tal intepretação (how much?). Egiptólogos,
por exemplo, pagam literalmente um alto custo para interpretar dizeres
demasiadamente antigos, o que dirá de astrônomos que residem na antártica e
precisam interpretar o clima, movimentos solares etc.

Para quem conhece coaching e questões relacionadas às ferramentas de gestão, o


que expusemos no parágrafo anterior é bastante próximo da ferramenta 5W2H,
porém com escopo diferente.

Figura 4. 5W2H.

Fonte: adaptado de Paula (2015).

Em outros termos, quem escreveu (personalidade, formação etc.); como escreveu


(de que modo por exemplo, um texto filosófico pode ser escrito de modo retórico,
dialético etc.); quando (época que o autor está inserido); e onde (obviamente, o
local). Por fim, qual o motivo/objetivo da escrita e a qual leitor/público-alvo.

Bürdek (2010) em seu famoso Design: história, teoria e prática do design de


produtos, afirma que a hermenêutica – a arte de interpretar – pode ser aplicada a
praticamente tudo na vida; no design não poderia ser diferente. O autor se escora
32
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

em Wilhelm Dilthey (1833-1911), o grande hermeneuta pós-Schleiermacher (1768-


1834), para nos informar que Dilthey demonstrou o que havia de diferente entre as
ciências esclarecedoras (isto é, natural) e as descritivas (isto é, as humanas).

O ponto de contato com o design aqui se trata de os produtos possuírem sempre tal
caráter dual, ou seja, tanto uma realidade que é matéria, quanto uma imaterial, a
saber, o significado que eles possuem (BÜRDEK, 2010).

Bürdek (2010) se debruça sobre os aspectos fundamentais da hermenêutica para


nos fazer compreender melhor sua relação com a semiótica e com o design. Daí a
necessidade de comentarmos mais acerca dela de modo específico.

Vale lembrar que se credita o termo hermenêutica ao deus grego Hermes, que era o
responsável por interpretar aquilo que os demais deuses gregos diziam e, com isso,
repassava a mensagem para a humanidade. A hermenêutica não é nada mais do que
a arte da interpretação. Embora ela seja vastíssima e muito maior do que um mero
índice, ela o abarca.

Importante mencionar que muito se confunde acerca da compreensão dos termos


dizer, explicar e traduzir. O Quadro 5 trabalha melhor tais diferenças.

Quadro 5. Diferença entre dizer, explicar e traduzir.

O primeiro sentido de hermenêutica é exprimir, ou dizer. Tal função está estritamente relacionada com a tarefa de Hermes em
transmitir aos homens as mensagens do Olimpo. Importante notar que dizer uma palavra não é o mesmo que explica-la ou
debate-la. A tarefa sacerdotal era nitidamente a de utilizar-se da vivacidade da linguagem oral para proferir belos e emocionados
Dizer
sermões a fim de provocar adesão das massas aos dogmas da fé cristã. Não se deve olvidar que, segundo os ditames da Igreja
Católica, a própria razão divina era vista como inacessível aos olhos dos mortais, cabendo a estes o papel de meros ouvintes
dos sermões proferidos pelos homens estimados por Deus.
Essa é a utilização moderna e mais usual da palavra hermeneuein, que se refere ao ato de determinar e clarificar o sentido de
algo. É sabido que antigamente a Igreja Católica, para bem organizar e auxiliar na difusão do Texto Sagrado, escrevia obras
bíblica de exegese nas quais se inseriam comentários sobre suas passagens, determinando explicitamente quais eram as
Explicar verdades divinas de cada uma delas.
Não cabe à hermenêutica determinar o que é verdade e o que é equívoco. O sentido encontrado deve ser justificado ora pela
intenção do autor, ora pela forma como o intérprete entende o conteúdo. Há quem se refira ainda à força própria do texto, como
se esse possuísse vida autônoma perante os sujeitos criadores e interpretativos, conferindo significado a si mesmo.
A função de traduzir um texto torna-se explícita quando se trata da compreensão de uma língua estrangeira. É o que Hermes
fazia quando traduzia as mensagens divinas para a linguagem dos homens. Entretanto, pode-se dizer que há tradução mesmo
quando texto e intérprete dominam o mesmo idioma. Não há diferença estrutural de apreensão do conteúdo de um discurso
Traduzir quando ele é escrito em língua materna ou em língua estrangeira.
Todo idioma, independentemente de sua denominação, é um repositório cultural que nos remete a certas qualificações, por
exemplo, históricas e regionais. Entender o substrato de determinado idioma, seus vocábulos e suas expressões próprias é
essencial na tarefa da compreensão.
Fonte: adaptado de Mazotti (2010, pp. 3-8).

Assim como toda a história do conhecimento é moldada por pequenas junções de


blocos, com a hermenêutica não poderia ser diferente. Dessa forma, vemos, ao longo
do tempo, as linhas diferentes de metodologias e abordagens do entendimento da
interpretação e a forma de aplicação dela nos diversos estudos exegéticos.

33
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

O Quadro 6 contém tais divisões ao longo do tempo.

Quadro 6. Escolas hermenêuticas.

Os estudos de interpretação da Bíblia foram os primeiros a utilizar o termo hermenêutica para descrever atividade de
investigação de sentido a partir do estudo de um texto. Não se deve olvidar, todavia, que os clássicos já haviam pensado
em formas de se apreender o sentido de um discurso, a isto se dava o nome de interpretação, a qual, muitas vezes, era
estudada junto com a poesia e a retórica.
Escola Bíblica A diferença entre a exegese bíblica e a hermenêutica moderna se origina somente com o Iluminismo. O intérprete sacro
estava então totalmente desprovido de liberdade para descobrir os sentidos das passagens bíblicas. A Escola da Exegese
Bíblica, rigorosamente falando, não criou um método hermenêutico propriamente dito, tomado aqui no sentido de um
sistema de regras e procedimentos para a interpretação de um texto. Entretanto, revelou a necessidade de tornar claras
passagens textuais consideradas obscuras.
As portas abertas pela teologia bíblica permitiram que inúmeros intelectuais do período racionalista-iluminista buscassem
em um método que permitiria maior entendimento das obras clássicas, relidas avidamente naquela época. Não era
conveniente tratar a hermenêutica de uma forma universal, já que os próprios teólogos consideravam que a prática
Escola Filológica
interpretativa deveria ser reservada aos textos sacros. Sendo assim, para esses intelectuais sedentos de interpretação, o
estudo da filologia passou a ser a chave-mestra, a ciência das línguas, semântica dos vocábulos, das regras gramaticais,
morfologia etc. Se demonstrou como a forma mais racional possível de se alcançar o sentido de um texto.
Somente com Friedrich Daniel Ernst Schleiermacher, filósofo alemão do século XVIII e início do XIX, a hermenêutica é
concebida como um procedimento universal que visa interpretar qualquer tipo de texto, independentemente da ciência
a que está adstrito seu conteúdo. Sua ideia é de que, no diálogo entre os homens, a estranheza (Fremdheit) é uma
constante, na medida em que a carga de vida e as experiências particulares constroem os seres humanos diversos um
Schleiermacher (1768- dos outros. Contrariando a ordem iluminista da existência de uma razão pura e superior, considera o discurso à luz da sua
1834) subjetividade e do psicologismo de seu autor.
Para Schleiermacher, a compreensão deve mover-se dentro desse círculo formado por uma relação dialética entre o
todo e as partes. O retorno de uma parte a outra é fundamental para que se ampliem cada vez mais este círculo e
aprofunde-se a compreensão.
Com o desenvolvimento da filologia e da hermenêutica romântica, a historiografia encontrou bases sólidas para trabalhar
metodologicamente o seu tema central: a história universal. Seus estudos se alicerçam na pesquisa das correlações
existentes entre os fatos históricos individuais, de forma que estes viabilizem uma compreensão integral da história. A
historiografia assume uma posição hermenêutica na medida em que realiza essa mediação entre o passado factual-
individual e o todo-histórico, descrevendo e interpretando suas relações dialéticas. A partir de tal concepção, o estudo
de um texto não pode mais ser compreendido unicamente por meio de seus vocábulos, que acabam por limitar
Escola Histórica semanticamente os sentidos possíveis, nem ao menos como uma investigação psicológica da produção originária do autor.
O sentido do texto deverá ser extraído por meio de sua análise metodológica, com os nexos históricos mais amplos que
justificaram as razões de seu existir como tal. O texto é visto como uma parte, deve ser lida em razão de um todo (história),
dada a relação de concordância e coerência que os permeia.
Wilhelm Dilthey (1833-1911) é importante figura para compreender melhor os meandros da escola histórica
hermenêutica. Ele traz consigo uma grande ruptura com o método puramente bíblico e traça um contexto material e
antropológico, especialmente voltado para as ciências humanas, das quais é fundador.
As ações propostas pela historiografia filosofia, em termos de uma hermenêutica de alta compreensão e superação das
contradições do tempo, somente poderão ser mais bem elaboradas com o surgimento da fenomenologia. A investigação
fenomenológica é ontológica, pois busca responder à questão do sentido do ser visto em sua própria existencialidade, não
como sinônimo de realidade, de uma coisa que está no mundo e pode ser empiricamente constatável. Na fenomenologia,
o sentido do ser não é trabalhado como sentido de algo que é, mas sim o próprio é. Portanto, o compreender do sujeito
Escola Fenomenológica se torna um compreender-se, pois o homem vê o seu ato de compreensão simplesmente “sendo”. O compreender volta
sobre si mesmo para realizar a sua própria compreensão. É como se sujeito e objeto se fundissem em uma relação
original em que um sujeito para ser também é objeto e se autointerpreta.
Husserl (1859-1938), Martin Heidegger (1889-1976) e Hans-Georg Gadamer (1900-2002) são importantes figuras que
nos ajudam a compreender melhor a escola fenomenológica.
Se afasta da escola fenomenológica. Ele resgata uma definição hermenêutica mais próxima de sua intenção originária.
Ricoeur efetua um profundo estudo da fenomenologia e das teorias modernas da linguagem (com imersões na
psicanálise), partindo do ponto que existem dois polos dialéticos nas manifestações linguísticas: a referência (acerca do
Paul Ricoeur (1913-
quê do discurso) e o sentido (o quê do discurso). Essa investigação conduz Ricoeur aos ensinamentos de Nietzsche, Marx
2005) e Freud. Ricoeur utiliza uma lógica de probabilidades, subjetiva, não empírica, essencialmente argumentativa para realizar
um arbitramento dos sentidos e alcançar um acordo sobre eles. Logo, o círculo hermenêutico será sempre progressivo,
nunca vicioso, pois os sentidos inválidos são retirados de seu campo de dialeticismos, e o solipsismo infinito não ocorre.
Fonte: adaptado de Mazotti (2010, pp. 17-43).

34
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

Fundamentos de la filosofía hermenéutica: Heidegger y Gadamer.


Disponível em: http://dx.doi.org/10.4067/S0049-34492005000100006.

Hermenêutica e anti-hermenêutica. Friedrich Schlegel e Schleiermacher.


Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S1982-88372010000100003.

O paradigma hermenêutico como fundamentação das pesquisas


etnográficas e fenomenológicas. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/
S0104-11691998000200006.

Paul Ricouer e a hermenêutica de si no espelho das palavras.


Disponível em: http://www.scielo.org.ve/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S1315-52162009000400004.

Bürdek (2010) comenta conosco que a hermenêutica desenvolveu uma série


de conceitos que são muitíssimos úteis ao design. Exemplo disso é o triângulo
hermenêutico (Figura 5 e 6), composto por um trabalho executado, um produtor
(deste trabalho) e um receptor. Isto é, trata-se de um designer, um objeto e um
usuário.

Figura 5. Triângulo hermenêutico.

Receptor

Trabalho Produtor

Usuário

Designer Produto

Fonte: Bürdek (2010, p. 247).

35
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

Metodologia, semiótica e hermenêutica


A hermenêutica bíblica da Idade Média – período agostiniano – era responsável
pela interpretação das coisas pela vertente bíblica. Isso atualmente fica restrito
a um seleto grupo de pessoas – geralmente cristãos e judeus –, mas naquela
época praticamente 99% de toda a população conduzia seus assuntos e seu
comportamento pelo viés religioso; portanto, toda a interpretação dos signos era
dada por meio da ótica religiosa.

Com efeito, tudo o que remetia a chifre, fogo, secularismo, libido etc. era prontamente
posto na categoria pecado e, portanto, deveria ser evitado a todo o custo. Ou seja,
toda a interpretação estava envolta em significados cujo teor era puramente religioso
e sacro. Isso se deu há pouco tempo atrás, até a grande ruptura com o medieval e a
mudança de paradigmas provocada pela Renascença começar e atingir seu ápice no
Iluminismo.

Segundo Bürdek (2010, p. 256), os escritos de Paul Feyerabend (1924-1994) foram


decisivos para essa quebra de paradigma. Ele se opunha às concepções de que “um
método determinado (por exemplo, o cartesiano) deveria ser aceito de forma geral:
‘uma única opinião pode ser útil para uma religião, para uma vítima tímida e ávida de
um (novo ou velho) mito ou para os fracos e subjugados por um tirano”.

O autor prossegue conciliando os diferentes temas que estamos abordando com


cautela nesse tópico:

Para o conhecimento objetivo são necessárias muitas e diversas ideias.


Para isso, é necessário um método que privilegie a variedade como
único compatível com uma concepção humanística. No design, esta
concepção só ganhou significado nos anos 1980, quando por meio
dos pós-modernos novas tendências de design foram propagadas.
Neste momento, uma mudança de paradigma na metodologia
do design também ficou evidente: até os anos 1970 os métodos
empregados eram orientados na sua maioria dedutivamente, isto
é, era desenvolvida para um problema geral uma solução especial
(de fora para dentro). No novo design, trabalha-se de forma mais
indutiva, isto significa se perguntar para quem (para que grupo
específico) um projeto especial deva ser colocado no mercado (de
dentro para fora) (BÜRDEK, 2010, pp. 256-257).

Daí a necessidade de dedicar uma atenção especial à abordagem da mudança de


paradigmas, a qual será mais bem trabalhada no capítulo subsequente.

36
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

Acerca do que trabalhamos até aqui, a leitura dos artigos abaixo listadas são
recomendadas:

» Design de moda e semiótica da cultura. A moda como sistema


modelizante no estudo do caso da coleção The Guarden Collection
da grife H&M. Disponível em: www.intercom.org.br/papers/
regionais/nordeste2012/resumos/R32-0961-1.pdf.

» A superficie, o tato e as ações comunicacionais no design de


superficie. Disponível em: www.scielo.org.bo/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S2306-86712016000100003.

» Gestão do Design: A Percepção da Imagem da Marca. Disponível


em: https://www.eed.emnuvens.com.br/design/article/view/130.

» Da comunicação à arte: a McDonald’s e o flat design. Disponível


em: www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S2183-35752017000100013.

» A forma: sua importância semiótica e psicanalítica. Disponível em:


pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-3
1062009000100012.

» Design de Superfície: reflexões sobre simbologias e análise


de imagem de uma padronagem. Disponível em: https://www.
uniritter.edu.br/uploads/eventos/sepesq/x_sepesq/arquivos_
trabalhos/2968/348/648.pdf.

37
CAPÍTULO 3
Semiótica, fenomenologia e mudança
de paradigmas

Fenomenologia e design
A fenomenologia, segundo Bürdek (2010), se considerar o desenrolar histórico,
aproxima-se muito da hermenêutica. Segundo o autor, Edmund Husserl (1859-
1939), o grande filósofo, matemático e lógico que fundou a escola fenomenológica,
foi um grande representante do subjetivismo transcendental. Isto é, cada objeto é
examinado por meio de sua imagem ou aspecto, podendo ser:

» uma visão de mundo da sensibilidade;

» explícito na esfera da existência;

» uma formação mental visível simbolicamente; ou

» que possa lidar com fenômenos.

O conceito-chave mundo da vida estabeleceu que, para se analisar objetos, é


necessário que seja feito sempre uma conexão com o contexto determinado
(incluindo tempo). Como método fenomenológico, Bürdek (2010, p. 240) nos
informa que “pode ser designado um procedimento onde se procura entender a
vida das pessoas de forma integral, com a inclusão do dia a dia e do ambiente”.
É somente por meio do aprofundamento no mundo da vida diária que se pode
compreender os objetos do cotidiano.

Bürdek (2010, p. 240) trabalha a questão fenomenológica sob o ponto de vista do


design de produtos:

O significado então é a interpretação hermenêutica, ou seja, um


procedimento das ciências humanas. Cada afirmação fenomenológica
só pode ter validade dentro de um horizonte limitado no tempo e no
espaço. Com a exigência ampla da fenomenologia pode – com outras
palavras e se referindo ao design – ser descrito e analisado o horizonte
completo de um produto.

38
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

Conceitos básicos de fenomenologia

Segundo Ribeiro Jr. (2003, pp. 3-4) “a fenomenologia ensina, desta forma,
como conseguir a vivência da realidade, por meio da descrição dos fenômenos
que a experiência nos oferece, para chegar à sua essência”. Ela, como revelação
de mundo, acaba por repousar “sobre si mesma, ou melhor, fundamenta-se em
si mesma; assim, é um diálogo ou uma reflexão infinita e, na medida mesma
em que se mantém fiel a uma intenção, ela não saberá jamais para onde vai. A
fenomenologia é inacabada”.

A fenomenologia […] não se interessa pela descrição empírica


dos fatos, excluindo, assim, tal conhecimento, pois pretende
ultrapassá-lo com todo rigor científico. A fenomenologia de que
falo nada mais é do que o estudo daquilo, daquela coisa, daquele
algo, daquele objeto que é dado à consciência, que nos faz pensar
nele(a) e do(a) qual falamos [...]. A fenomenologia é uma filosofia
que reflete sobre o conhecimento do conhecimento, e que pretende
substituir a abordagem empírica e sensualista do psicologismo (que
reduz o conceito à condição de um produto de um ato psicológico),
por meio da análise dos processos subjetivos em que se moldam os
fenômenos externos. É uma prática científica nascida da reflexão
sobre a crise das ciências (RIBEIRO JR., 2003, p. 4).

De acordo com Ribeiro Jr. (2003, pp. 17-18), a expressão retorno às coisas mesmas,
ou seja, retornar a uma intuição originária, tem como intuito apreender a essência
de algo, analisando de um modo atento os fenômenos, descrevendo-os de modo
autêntico (é preciso considerar que a descrição fenomenológica é diferente das
ciências naturais).

Na relação de intencionalidade, em fenomenologia, explora-se a relação entre o


pensamento e o próprio pensar. E por meio da vivência a análise fenomenológica
parte de uma situação concreta, parte do ponto de vista do ser que vive determinada
situação.

De acordo com Ribeiro Jr. (2003), são características básicas da fenomenologia:

» É uma ciência rigorosa, uma vez que se questiona pelos fundamentos


absolutos do conhecimento em voga.

» É uma ciência das significações, ou seja, é aquilo que dá realidade


a um determinado objeto (dada a imagem do objeto). Porém ela está
preocupada não com a realidade psíquica dos objetos, seu interesse é
nos objetos ideais.
39
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

» É uma ciência intuitiva, buscando apreender a essência das coisas


mesmas. Ela parte dos significados puros.

» É uma ciência que busca a origem e o fundamento dos primeiros


princípios.

» É uma ciência da subjetividade, uma vez que a análise da consciência


dirige-se para um “eu” cheio de intencionalidade; no entanto, o que
impulsa a ciência como tal são sempre as coisas mesmas, mas não “um
eu que possui todas as representações”.

Por volta do fim do século XIX, todo prestígio era dado à psicologia e,
consequentemente, todo conhecimento filosófico (como a lógica, a ética e a
estética) se reduzia a um fato psicológico. Diante disso, Husserl pensou essa
questão afirmando ser impossível ter a universalidade e a necessidade, isto é, a
apoditicidade da verdade sem se perguntar pela real significação do conhecimento
(HUSSERL, 1996).

Husserl mostra que a unidade da ciência, mais especificadamente da psicologia –


que é uma ciência empírica – não pode ser fundamentada sob as leis da lógica sem
que antes se possa precisar as regras dessa lógica. Uma vez que sua preocupação
será com a descrição dos fenômenos propondo um retorno às coisas mesmas, ele
então se mostra como um crítico do psicologismo.

Nesse sentido, a primeira questão que Husserl coloca é: qual seria o método da
fenomenologia e quais são os seus problemas fundamentais. Em seu livro A ideia da
Fenomenologia, ele trata da oposição entre o método fenomenológico e o método
das ciências naturais, distinguindo essa nova corrente filosófica pensada agora no
âmbito da transcendentalidade, em oposição ao das ciências naturais, como é o caso
da psicologia da época (HUSSERL, 1996).

Conforme o filósofo: “Em lições anteriores, distingui a ciência natural e a ciência


filosófica; a primeira promana da atitude espiritual natural, e a segunda, da atitude
espiritual filosófica”. (HUSSERL, 1996, p. 17). Essa distinção é feita uma vez que a
intenção de Husserl é fazer uma crítica do conhecimento.

Quanto ao primeiro, a ciência natural, ele afirma que ela não está preocupada em
fazer uma crítica do conhecimento, tal como é seu objetivo. Esta preocupa-se mais
em descrever o processo do conhecimento, parte de um conhecimento dado sem
questioná-lo (e por isso, acaba tornando-se dogmático), como é o caso da percepção
(que é dada, e seu conhecimento não é questionado). O mecanismo lógico por detrás

40
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

desse processo epistemológico é visível nas ciências naturais, mais especificadamente


nos processos científicos, em que a observação, por exemplo, é parte fundamental em
um avanço. Mas deve-se atentar ao fato de que, nesse nível empírico, é possível que
haja erros, equívocos, paralogismos, interpretações erradas ou cálculos incertos.

Com efeito, para Husserl, é assim que progride o pensamento natural. Isto é,
“apodera-se num âmbito sempre cada vez maior do que de antemão e obviamente
existe e está dado e apenas segundo o âmbito e o conteúdo, segundo os elementos,
as relações e leis da realidade a investigar de mais perto” (HUSSERL, 1996, p. 18).
As ciências naturais são consideradas, entre elas, a matemática e as de natureza
psíquica.

Husserl contrasta essa atitude naturalista da atitude filosófica, esta nada mais
é do que a atitude fenomenológica, que, por sua vez, começa por uma reflexão
quanto ao modo de conhecer. Nesse sentido, o filósofo critica as ciências naturais
por partirem de “algo dado” sem tematizarem o modo de conhecimento. Com
efeito, Husserl afirma que o conhecimento é “uma vivência psíquica” do sujeito
que conhece.

Husserl, em seus escritos, tomou como ponto de partida uma ligação


intencional entre espírito e mundo, tentando explicar a situação da
consciência, do sujeito humano. Por meio do método da “epoché” e
da redução fenomenológica encontra um instrumento esclarecedor
da consciência, capaz de ultrapassar o psicologismo e o historicismo
reinantes na época. Husserl ao tentar encaixar a problemática da
consciência individual em um contexto mais amplo verificou que
era possível “fundamentar idéias conscientes, recorrendo a uma
experiência pré-consciente, não articulada” (JESUS et al., 1998).

Na medida em que se faz uma crítica ao conhecimento natural, surgem os problemas


fenomenológicos. Contudo, pergunta Husserl: “como pode o conhecimento estar
certo da sua consonância com os objetos conhecidos, como pode ir além de si e
atingir fidedignamente os objetos?” Dessarte, os “dados dos objetos cognitivos no
conhecimento, óbvio para o pensamento natural, tornam-se um enigma” (HUSSERL,
1996, p. 20).

Em outras palavras, aquilo que é “dado” não é um problema para os naturalistas.


Mas é justamente esse “dado” que se torna objeto de investigação. Assim, se
questionar como o conhecimento é dado, como ele é possível e como ele se torna o
que é são os problemas que preocupam os estudiosos.
41
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

A fenomenologia afirma que “só os fenômenos são verdadeiramente dados ao


cognoscente” (HUSSERL, 1996, p. 20). Aqui, o ponto de partida é a certeza, e é
justamente a certeza que é objeto de investigação na fenomenologia, colocando-se a
questão: “como o dado é possível?”. Portanto, para a fenomenologia, a tarefa da teoria
do conhecimento é: fazer uma crítica do conhecimento natural, denunciando os
problemas que nela são encontrados.

Quanto à sua definição, portanto, a fenomenologia designa uma ciência, uma


conexão de disciplinas científicas, mas também e, principalmente, designa um
método e uma atitude intelectual, que, diferentemente das ciências naturais, é
denominado de método intelectual ou atitude filosófica.

Segundo Merleau-Ponty (1908-1961), a liberdade deve ser interpretada sob a


perspectiva do “sujeito encarnado”, isto é, aquele sujeito situado, um ser capaz
de relacionar-se com si próprio e com o mundo. Merleau-Ponty tem por intuito
relacionar a liberdade com o corpo – arcabouço para a experiência no mundo. Com
isso, a ideia tradicional de que há, de um lado, o mundo dos objetos, ou seja, da pura
facticidade, e, de outro, o mundo da consciência, não é mais digna de tanto crédito
(MERLEAU-PONTY, 1999).

É justamente o ponto que une as oposições facticidade e transcendência que


permite o estudioso pensar algo que vai além do dualismo sujeito e objeto no
conhecimento. Em suas palavras, “a verdade não ’habita’ apenas o homem interior”
ou, antes, “não existe homem interior, o homem está no mundo, é no mundo que
ele se conhece” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 6).

As possibilidades de objetos naturais, ferramentas, roupas


e superfícies de exibição

Algo breve sobre os objetos vale a pena ser mencionado antes de prosseguirmos
na empreitada fenomenológica. Krampen (2012) afirma que os objetos são de
substância persistente com superfícies fechadas ou quase fechadas. Eles podem
ser anexados ou desanexados.

» Objeto anexado: exemplo pode ser um galho de árvore que permite a


subida, assim como uma escada.

» Objeto destacado: pode ser transportado e, se tiver um peso


apropriado, ele pode ser arremessado.

» Objetos ocos: podem ser usados como contêineres.

42
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

As ferramentas são objetos de diferentes possibilidades e podem ser consideradas


extensões de membros humanos, especialmente da mão. Da mesma forma, as roupas
fazem parte do corpo humano enquanto são usadas (KRAMPEN, 2012).

O autor supracitado nos informa que existem pelo menos cinco classes de layouts de
superfície de objetos destacados feitos pelo homem e que constituem ferramentas
básicas:

» Objetos alongados: permitem bater, ajuntar, levantar e perfurar:


paus, martelos, ancinhos, alavancas, lanças, agulhas, furadores etc.

» Objetos cortantes: facas, machados etc.

» Objetos elásticos: alongados permitem amarrar: fibras, fios, cordas


etc.

» Objetos que permitem arremessar: mísseis, bolas, fundas, arcos


etc.

» Objetos para tracejo: formões, pincéis etc.

Os seres humanos desenvolveram a superfícies de exibição, como imagens que


fornecem informações visuais. Essa informação é “de segunda mão”, pois permite
ao espectador ver como substituto o que o criador da imagem viu no original. Todo
um conjunto de recursos típicos para uma determinada espécie pode ser chamado
de nicho ecológico. Enquanto o termo habitat se refere ao conjunto de lugares
onde uma espécie vive, o termo nicho significa como ela vive (KRAMPEN, 2012).

Análises fenomenológicas no design e na semiótica

O Quadro 7, a seguir, contém informações didáticas e práticas dos principais temas


deste tópico,, que visa convergir fenomenologia, design de produto e semiótica.

Quadro 7. Pensadores que correlacionaram semiótica, fenomenologia e design de produto.

Podem ser encontradas fortes ligações com a fenomenologia especialmente em sua obra acerca da arte, fazendo
Martin Heidegger
menção à importância do estudo dos objetos.
Refere-se explicitamente a posições onde os estudos fenomenológicos dos objetos podem ser entendidos no
Peter Zumthor
contexto do projeto.
Dirigiu seu ensaio sobre o legendário produto walkman e sua relação com o ambiente urbano. Ali ele faz uso das
funções primárias (prática) e secundária (imaterial). Ainda, ele faz menos uso do objeto em si do que do objeto
Shuhei Hosokawa
em uso, ou seja, o que tal objeto significa para seu usuário; isto é, como ele é percebido no ambiente em que
está. Estes mundos – do usuário e o objeto em si – estão relacionados entre si.

43
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

Descreve como o walkman se insere no mundo de vida de seu usuário. Chama atenção ao estudo como um
flagrante da história cultural das experiências sensórias. Para ele, este produto traz um descolamento entre o
Schönhammer
sujeito e o mundo, trata-se de um símbolo permanente de possibilidade de fusão de experiências. Nada mais é
do que uma experiência de alienação.
Torna claro que a Teoria da Linguagem do Produto é demasiadamente orientada pela semiótica e será continuada
pelo formato fenomenológico, uma vez que para ele a semiótica é uma opção teórica, que tem muitas vantagens,
mas também desvantagens, uma vez que é necessário se dar a abrangência dos signos, e o que não pode
ser evidenciado como signo é descartado. Soentgen também difere seus métodos das ciências humanas. A
“descrição fenomenológica significa descrever algo como se apresenta, sem relação com conhecimento prévio,
Jens Soentgen
sem relação com hipóteses, sem relação a tudo que não tenha relação com a percepção sensorial direta ou
com a coisa em si. Os signos, em contrapartida, são sempre mediados, ou por experiência ou por convenção; a
semiótica se ocupa com o mediador ou com o que pode ser pensado como mediado; a fenomenologia, com o
não mediado, com o direito. Soentgen tem o hábito de trabalhar diversos produtos como exemplo de orientação
para como as ciências humanas podem ser utilizadas no design.
Em seu ensaio Uma Fenomenologia dos “Devices” Eletrônicos, ele não somente discute exemplos individuais de
design de produtos, mas também questões ligadas aos ”mundos de vida”, que atingem, em especial, as crianças
Volker Fischer e adolescentes no notório relacionamento contemporâneo com esses objetos eletrônicos. Como resultado de
tal análise à luz de princípios fenomenológicos, é possível perceber que os comportamentos dos usuários têm
desdobramentos diferentes dos antes considerados, em grande parte, casos banais no desenho de produtos.

Fonte: adaptado de Bürdek (2010, p. 241-244).

Mudança de paradigma: design de produtos,


semiótica e filosofia da ciência kuhniana

Visto que a questão do design de produto está diretamente relacionada com a


cultura, que por sua vez é alterada conforme o tempo passa, a região geográfica
muda, a religião se difere, estamos imbricados à vasta metamorfose do tecido
social, o que significa dizer que há mudanças constantes de paradigmas, que ora
vigentes, não são mais no contexto alterado.

Bürdek (2010, p. 256) nos informa que foi no final dos anos 1970 que se deu início
a uma nova orientação metodológica no setor de design de produtos. O autor se
apropria do termo “mudança de paradigmas” do famoso filósofo da ciência chamado
Thomas S. Kuhn (1922-1996).

O conceito foi tornado conhecido por Thomas S. Kuhn, que como


paradigma entendi aquelas partes existentes das disciplinas
científicas, aceitas por uma maioria de pesquisadores como
normalmente válidas. Com o termo mudanças de paradigma
deveria se tornar claro que a ciência não avança ou coleta mais
conhecimento de forma uniforme, mas que de tempos em tempos
ela vive de quebras revolucionárias ou de modificações radicais que
mudam o pensamento vigente (BÜRDEK, 2010, p. 256).

Dessarte, está claro que tal contexto está diretamente ligado à semiótica, pois a
sociedade como um todo, assim como a comunidade científica em geral, para Kuhn,
está regrada de escolhas subjetivas que são moldadas por ambiente, prestígio,

44
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

ideologia, interesses e gostos pessoais, bem como pelo modo de interpretar a questão,
pois, como já aprendemos, os signos podem se dar por meio de convenção, como
também podem ser completamente subjetivos, diferenciando de pessoa para pessoa.

Como todo designer sabe bem, forte resistência à mudança ocorre o tempo todo
na ciência e na sociedade. O grande fundamento é permanecer na normalidade
das pesquisas (e dos pensamentos) a fim de que tudo corra normalmente, ou seja,
pensando em Kuhn, na ciência normal – patamar em que os cientistas estão –, pode
ser aplicado completamente ao contexto social.

Se algo sai errado, instaura-se uma anomalia no sistema – a questão ambiental,


por exemplo: não é possível usar o mesmo combustível por mais séculos como
aquele que era usado no século XIX, ou até mesmo nos dias de hoje. Será buscada
então a solução dessas anomalias (casos problemáticos) através de hipóteses
externas que possam solucionar o problema, sendo este momento denominado
por Kuhn de crise (ambiental, por exemplo), isto é, um período em que existe um
acúmulo de anomalias. Na crise, procura-se a solução dessas anomalias, clama-se
por novas teorias.

Se elas não forem solucionadas, ocorre o que ele chama de ciência extraordinária,
uma condição anormal, isto é, considerando nosso exemplo, as próprias mudanças
climáticas. Este é um momento em que o pensamento (ou paradigma) anterior está
sendo atacado de todas as formas.

Neste momento de crise, o novo paradigma está sendo instaurado – portanto, novo
conceito, novo produto, aceite de novo design –, totalmente diferente do anterior
(que é o polêmico conceito de incomensurabilidade de Thomas Kuhn), promovendo
uma revolução científica, de modo gestáltico imediato, isto é, não dura muito tempo,
aceita-se o novo paradigma, que, por sua vez, é responsável por equilibrar o sistema
novamente, implicando regresso à ciência normal.

Schopenhauer (1788-1860) dizia que esse processo, que pode ser aplicado ao setor
de design de produtos ou não, isto é, uma nova ideia, um novo design, um novo
produto, segue as seguintes etapas:

» Primeiramente é ridicularizada: que, em Kuhn, é o passo onde está em


curso a ciência normal, que não aceita a anomalia.

» Depois é combatida: em Kuhn, aqui se tenta, como vimos, propor


soluções para resolver a crise.

45
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

» Vencidas as etapas anteriores, a questão não é mais passível de


polêmica/discussão: ou seja, em Kuhn, ocorre a retomada da ciência
normal por meio da instauração do novo paradigma.

Para efetivar a revolução científica, inicia-se um “sentimento crescente, também


seguidamente restrito a uma pequena subdivisão da comunidade científica”, e
também da comunidade em geral, “de que o paradigma anterior deixou de funcionar
adequadamente na exploração de um aspecto da natureza, cuja exploração fora
anteriormente dirigida pelo paradigma” (KUHN, 1962, p. 125).

Quando se abandona um paradigma, significa dizer que “é deixar de praticar a


ciência que este define” (KUHN, 1962, p. 56). Ou seja, se pensarmos um carro
elétrico por exemplo, a despeito de ele guardar forte semelhança com os carros
atuais, a forma de utilização de energia é completamente diferente da que
utilizamos atualmente a partir de combustíveis fósseis.

Kuhn (1962, p. 58) afirma que “a ciência normal não tem como objetivo descobrir
novidades substantivas”, mas significa que, da forma como ela visa à normalidade
e à manutenção do sistema, os “resultados obtidos pela pesquisa normal são
significativos porque contribuem para aumentar o alcance e precisão com os quais o
paradigma pode ser aplicado” (KUHN, 1962, p. 58).

Com efeito, para Kuhn, quando nos deparamos com um momento de crise, os
cientistas – leia-se também designer de produtos, embora estes procedam dessa
forma sem a necessidade de crise em si – voltam-se para a filosofia (KUHN, 1962).
Para Kuhn (1962), temos três formas distintas de consentir com o término das
crises. A primeira é onde a ciência normal passa a ser capaz de tratar do problema
que provoca a crise. O segundo é quando o problema resiste e é posto de lado
para futuras gerações. O terceiro ocorre quando emergem um novo candidato a
paradigma e uma nova batalha por sua aceitação.

O candidato a novo paradigma é, para nós, a uma nova concepção de mundo, novas
tecnologias, novos saberes, novos produtos – que estejam, em especial, ligados às
questões sustentáveis –, porém com utilidade, com fins que justifiquem a escolha etc.
O novo candidato deve ser capaz de propor soluções e efetivamente solucioná-las;
portanto, reitera-se, somente o apelo emocional à consciência do consumidor não irá
mudar muita coisa.

Abandonar o paradigma anterior por um novo incorre ainda em mais uma expressão
que nos é importante, a incomensurabilidade do paradigma. Isso é o mesmo que
dizer que a percepção paradigmática anterior – como dissemos anteriormente –

46
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

não guarda nenhuma relação com o novo. Este novo paradigma, portanto, precisa
atender às seguintes condições primordiais para que sejam aceitos.

» O novo candidato deve ser capaz de solucionar algum problema


extraordinário, reconhecido como tal pela comunidade e que não
possa ser analisado de nenhuma outra maneira.

» O novo paradigma deve garantir a preservação de uma parte


relativamente grande da capacidade objetiva de resolver problemas,
conquistada pela ciência com o auxílio dos paradigmas anteriores
(KUHN, 1962, pp. 213-214).

Aqui temos alguns conflitos, pois a criação de produtos que se utilizam de energias
limpas – considerando o exemplo que estamos trabalhando – não implica
necessariamente que as energias consideradas não renováveis não possam ser
utilizadas em uma determinada porcentagem sustentável. Dessa forma, é importante
ressaltar que qualquer teoria – como a principal que trabalhamos até agora, a de
Kuhn – complementa uma à outra e não é trabalhada de forma isolada/exclusiva,
pois isso seria possivelmente prejudicial.

Imre Lakatos (1922-1974), por sua vez, afirma que, em Kuhn, tudo o que
trabalhamos até agora possui ligações psicológicas, considerando que há uma
espécie de “continuidade da crença”, isto é, devem-se corrigir as anomalias quando
existe “fé” no paradigma em vigor, e então ele é rejeitado. Kuhn parece defender a
tese de que é impossível justificar racionalmente nossa preferência por uma entre
várias teorias. E esta é a sua tese da incomensurabilidade.

Lakatos (1979, p. 112) afirma que os pensamentos de Kuhn têm “implicações não
só para a física teórica mas também para as Ciências Sociais subdesenvolvidas
e até para a filosofia moral e política”, o que automaticamente envolve a
sustentabilidade, que não se limita somente ao aspecto ambiental. Argumenta
o autor: “nem mesmo na ciência há outro modo de julgar uma teoria senão
calculando o número, a fé e a energia vocal dos apoiadores, isso terá de ocorrer
principalmente nas Ciências Sociais: a verdade está no poder” (LAKATOS, 1979,
p. 112).

Kuhn (1962, p. 215) finaliza: “temos que aprender a substituir evolução-a-partir-do-


que-sabemos pela evolução-em-direção-ao-que-queremos-saber”.

Progresso científico e incomensurabilidade em Thomas Kuhn. Scientiae


Studia, São Paulo, v. 5, n. 2, pp. 169-183, jun. 2007. Disponível em: http://www.
scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-31662007000200003&lng=e
n&nrm=iso.

47
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

O legado de Thomas Kuhn após cinquenta anos. Scientiae Studia, São


Paulo, v. 10, n. 3, pp. 535-560, 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/
scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-31662012000300006&lng=en&nr
m=iso.

Semiótica, paradigma, design de produtos e


as concepções pós-estruturalistas
De acordo com Sawaragi (2010), baseando-se nas concepções de Peirce, a essência
da semiose de Peirce abordada anteriormente é a seguinte:

» Primeiro, existe uma relação entre um agente cognitivo e objetos no


ambiente que é mediada por sinais visíveis.

» Segundo, o significado de um sinal não está contido nele, mas surge na


interpretação de seu agente cognitivo de várias maneiras; não existe
uma conexão absolutamente fixa entre o signo e seu objeto.

Figura 6. Conexão entre o ambiente externo e o agente cognitivo por meio de sinais.

Agentes cognitivos de adaptabilidade

Sinal

Ambiente reconfigurável

Fonte: Sawaragi (2010).

O autor nos informa ainda que a outra propriedade essencial da semiose é que ela
analisa os tipos de contextos nos quais colocamos coisas e eventos, e os tipos de
relacionamentos que construímos entre essas coisas e esses eventos e seus contextos.

O design não é algo fechado e restrito a certos significados, mas deveríamos


enxergar o design cujas configurações são irredutivelmente múltiplas e plurais de
significantes que nunca podem ser finalmente fixados em um único significado. Ao
fazer isso, o significado é ”desterritorializado” e “reterritorializado” ao longo do
tempo.

48
SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE I

Essa ideia trabalha o design como uma espécie de interface entre um designer
nômade que é visto como "morto" e um usuário/leitor/receptor (destinatário)
como "tornando-se" temporário. O design é criado como meio de comunicação
configurado por elementos de design que estão canalizando significantes para o
resto do mundo; portanto, quase todo tipo de produto do design se torna realidade
por meio da qual o destinatário e o designer se comunicam.

O design se beneficia de todo tipo de representação, evidentemente semiótica


por natureza, de uma maneira que é considerado um sistema de várias camadas
e montado com relações paradigmáticas e sintagmáticas, terminando com uma
criação que torna a invenção de novas formas de expressão uma condição prévia
de si mesma.

Baseando-se na literatura do segmento, Sawaragi (2010) nos informa –


corroborando com o que acabamos de tratar – que há dois tipos diferentes de
contextos, quais sejam:

» Contexto sintagmático: organizado por meio de relações de parte


para todo entre os elementos que compõem o ambiente: os conjuntos
nos quais qualquer ação (ou coisa, evento, palavra) é colocada como
parte.

» Contexto paradigmático: organizado por meio de relacionamentos


instância-classe: as pessoas entendem algo de maneira diferente
substituindo o conteúdo em um elemento de um gênero diferente.

Sobre isso trataremos mais na segunda unidade, contudo é válido ressaltar ainda
que esses dois tipos de contextos sempre existem universalmente, sendo que
artefatos artificiais e atividades humanas são organizados ao longo desses dois
eixos; linguagens, arquiteturas, paisagens urbanas, tarefas, narrativas, gestos
(movimentos corporais) etc. Devido a essa estrutura, é permitida a produção
contínua de variabilidade de significados por meio das redes de semelhança e
diferença (SAWARAGI, 2010).

Dessarte, o design de artefatos ligados ao ser humano pode ser considerado como
uma “mensagem” coerente e coesa, de tal maneira que se esforça para maximizar
as chances de a mensagem ser interpretada pelos usuários como sendo o projetista
de tais artefatos (SAWARAGI, 2010).

49
UNIDADE I │ SEMIÓTICA E DESIGN DE PRODUTOS

Figura 7. Dois tipos de contextos para organizar uma estrutura semiótica.

Fonte: Sawaragi (2010).

Com efeito, possivelmente aproximando-nos da incomensurabilidade de Kuhn, cada


interpretação de um design é uma nova configuração de significado(s) articulado por
um novo sistema de relações decorrente da diversidade humana, e o significado é
liberado de suas formas pré-estabelecidas.

Consequentemente, o significado é reconhecido por meio da articulação. Deleuze


argumentava, de maneira enfática, que as coisas não devem ser definidas de acordo
com as formas atualizadas. Ou seja, não devemos, por exemplo, explicar projetos
com base em como o significado é geralmente ou realmente dado a eles.

Um olhar pós-estruturalista argumenta que, para entender um objeto, é necessário


estudar tanto o próprio objeto quanto os sistemas de conhecimento que o
produzem. Este ponto de vista não propõe se concentrar em entender como os
conceitos foram entendidos pelo designer na época, mas sim compreender como
esses mesmos conceitos são entendidos pelo destinatário do design no presente,
optando por estudar como os conceitos culturais mudaram a sociedade.

Ainda sobre isto, um olhar diacrônico para as realidades tenta descobrir como
os sistemas de relacionamentos mudaram ao longo do tempo. Umberto Eco,
por exemplo, em seu The Open Work, afirma que particularmente a arte
contemporânea tem um significado indefinido, na medida em que a vontade do
artista era exatamente a de produzir essa “indeterminação ou abertura”, uma vez
também que abre caminho para um ponto de vista diacrônico que visa entender a
realidade que desenha com aquela que medeia um diálogo em constante mudança,
um conceito que já é desafiador entre os chamados pós-estruturalistas.

Mas esse é um tema para a próxima unidade.

50
ESTÉTICA, AMBIENTE
E A SEMIÓTICA UNIDADE II
NO DESIGN DE
PRODUTOS

CAPÍTULO 1
Estruturalismo, sintagmas e paradigmas

Conceitos introdutórios
Design é tanto verbo e quanto substantivo em português. Como substantivo,
segundo Medway e Clark (2003), ele assume duas formas:

» Um substantivo sem contagem que se refere ao processo (“design é uma


atividade oportunista’): “design”, nesse caso, pode ser mencionado no
plural.

» Um substantivo de contagem referente aos produtos do processo (“o


design não era adequado”, “vários designs foram considerados”). Isso
é comumente mais utilizado (embora não necessariamente nesses
termos linguísticos).

O que foi dado como certo, no entanto, é o que é o design, o produto do processo
de design. Medway e Clark (2003) acreditam que o entendimento típico é a
representação construída antecipadamente que determinará as características
essenciais do artefato que será construído.

Pensemos, por exemplo, na representação proveniente de produtos da


engenharia/arquitetura. Em geral, serão desenhos e especificações feitas no papel
e que depois serão transformadas em edificações. Contudo, as representações,
simplesmente por serem representações, trazem objetos (objetos de cognição,
entidades ideacionais etc.) à existência, sem qualquer referência necessária a
situações reais ou futuras no mundo (MEDWAY; CLARK, 2003).

51
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

Ressaltam os autores supracitados que os desenhos também podem ser


considerados como representando um edifício existente – que não existe na forma
construída, mas que ainda possui muitas características dos edifícios –, isto é,
suas formas, configurações, dimensões, seus materiais e assim por diante.

Claramente, este artefato simbólico ou semiótico é, juntamente com suas


representações, o produto do processo de design e pode apropriadamente ser
chamado de design. Mas esse não é o produto inteiro.

Ele é uma soma de fatores que envolvem questões culturais, convenções, crenças
e desejos que são próprios a cada indivíduo etc. É uma conta que contém uma
quantidade tão alta de variáveis que não são todas previamente identificadas pelo
designer, em que pese que o grau de aceite pelo cliente, por exemplo, pode estar
diretamente relacionado a quantas variáveis diferentes foram consideradas no
processo de planejamento do produto.

Estruturalismo, semiologia em Saussure,


sintagmas e paradigmas em Barthes
A semiótica inicial fazia parte do movimento estruturalista. Quem trabalha com
ele se envolve na busca de estruturas profundas subjacentes às características da
superfície dos fenômenos. Em termos de semiologia, criada no início do século
XX por Saussure, é algo proposto por ele como uma ciência geral dos signos que
buscava descobrir os sentidos contidos nas diferentes linguagens do homem. Tais
sentidos formariam sistemas de signos que mostrariam a estrutura inconsciente
que ordenava o comportamento humano.

O estruturalismo é um tanto generalizante e um pouco impreciso, exatamente


por se propor uma compreensão ampla da realidade social – a visão do fato social
total –, vale também para a avaliação das várias abordagens. Exigir mais dele
é pedir mais do que ele pode dar. Ao contrário, a escola americana pode descer
às particularidades da cultura, porque a ela interessa explicar a sociedade ou
a cultura particular e simples [...]. Torna-se perigosa a mistura de modelos de
abordagem antropológica. Tal mistura resultará, com certeza, num verdadeiro
pandemônio teórico. O pesquisador há de ter a sensibilidade de não misturar as
várias abordagens. O valor de cada abordagem está no seu conjunto. O que vale
dizer, o funcionalismo, o estruturalismo, a escola americana e o evolucionismo
são bons quando considerados como um sistema de análise. Contudo, todos
deixam a desejar, quando se tenta tomar categorias de cada um numa mesma
análise ou pesquisa (MELLO, 2014, pp. 276-277).

52
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

» Pós-estruturalismo e a crítica como repetição. Disponível em:


https://www.researchgate.net/publication/283882264_Post-
Structuralism_and_criticism_as_repetition/fulltext/5ada3b37a6fd
cc2935884881/Post-Structuralism-and-criticism-as-repetition.pdf.

» O processo criador no ensino da arte e do design paradigma da


representação e paradigma da diferença. Disponível em: books.
scielo.org/id/jhfsj/pdf/fiorin-9788579836244-04.pdf.

» O estruturalismo dialético, psicanálise e o nascimento da


psicoterapia de grupo. Disponível em: pepsic.bvsalud.org/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1677-11682016000100003.

» Cognição, cultura e funções sígnicas: uma análise da mediação


semiótica no desenvolvimento histórico, social e linguístico
do sujeito surdo. Disponível em: pepsic.bvsalud.org/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1806-58212011000200005.

» O fundamento estrutural do pensamento de Umberto Eco.


Disponível em: www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S1982-25532016000200005.

Veja também:

» O primeiro estruturalismo: método de pesquisa para as ciências da


gestão. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_art
text&pid=S1415-65552006000200008.

» O problema do método. Disponível em: http://books.scielo.org/


id/3vxfc/pdf/sampaio-9788575412602-05.pdf.

» Simetria e entropia: sobre a noção de estrutura de Lévi-Strauss.


Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&
pid=S0034-77011999000100010&lng=pt&nrm=iso.

» O sentir das estruturas e as estruturas do sentir: a poesia


que lévistrouxe. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0034-77011999000100006.

» Pós-estruturalismo e análise organizacional. Disponível em:


http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-
75902002000200015&lng=pt&nrm=iso.

53
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

» Estrutura e temporalidade na psicologia e na psicanálise.


Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext
&pid=S1516-14982006000200003&lng=pt&nrm=iso.

» Passagem da compreensão à verdade: contribuição do


estruturalismo à teoria lacaniana da psicose. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-
14982007000200005&lng=pt&nrm=iso.

» Michel Foucault: filosofia, linguística e estruturalismo.


Disponível em: http://www.scielo.org.ar/scielo.php?script=sci_artte
xt&pid=S1852-73532013000200003.

O estruturalismo, segundo Hjelm (2002), tenta descrever a organização geral


dos sistemas de signos como “linguagens” – semelhante às regras de totemismo
e parentesco de Levi-Strauss. O estruturalismo enfatiza diferenças e oposição
nos sistemas de signos “em uma linguagem, como em qualquer outro sistema
semiológico, o que distingue um signo é o que o constitui”.

A propaganda é um bom exemplo disso, pois o que importa em “posicionamento”


é que um produto não é a relação de significantes de publicidade com referências
do mundo real, mas a diferenciação de cada sinal dos outros com os quais está
relacionado. Isso também é válido em todos os tipos de design em que o objeto é feito
para diferir-se de outros produtos similares na mesma categoria (HJELM, 2002).

Saussure enfatizou que o significado surge das diferenças entre significantes. Essas
diferenças são de dois tipos, como falamos na unidade anterior: sintagmáticas
(em relação ao posicionamento) e paradigmáticas (em relação à substituição).
Essas duas dimensões são representadas em dois eixos, em que o horizontal é o
sintagmático e o vertical, paradigmático (HJELM, 2002).

JOÃO
MENINO- MORREU Eixo paradigmático
O HOMEM CHOROU

Os signos entram em uma relação paradigmática quando é possível substituir um pelo


outro. Assim, eles podem aparecer no mesmo contexto, mas não ao mesmo tempo. No
cinema e na televisão, os paradigmas incluem maneiras de alterar as tomadas, como
cortar, dissolver e limpar. O meio ou gênero também são paradigmas, ou seja, rádio,
jornal, Internet e textos específicos derivam significado da mídia usada.

Um sintagma é uma combinação ordenada de significantes em interação, que


formam um todo significativo dentro de um texto. Na linguagem, uma frase é

54
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

um sintagma da palavra, assim como parágrafos e capítulos. Um sintagma maior


é composto de sintagma menor com interdependência entre ambos. Relações
sintagmáticas são as várias maneiras pelas quais elementos dentro do mesmo texto
podem estar relacionados entre si. A relação sintagmática destaca a importância dos
relacionamentos parte-todo.

Saussure enfatizou que o todo depende das partes e a parte depende do todo.
Roland Barthes – o qual mencionamos no início de nosso material – descreveu os
elementos paradigmáticos e sintagmáticos no sistema “o vestuário”. Os elementos
paradigmáticos são os itens que não podem ser usados na mesma parte do corpo
ao mesmo tempo, como chapéus, sapatos, calças etc. A dimensão sintagmática é a
justaposição dos diferentes elementos em um conjunto completo.

De acordo com Campos e Araújo (2017, p. 29), para Barthes, essa distinção tem
função classificatória e não fenomenológica. Sintagma, para ele, apresenta-se
de uma forma encadeada, ou seja, contínua entre grupos de signos funcionais e
sempre binários numa relação recíproca na língua, na fala e em outras linguagens,
lembrando de Barthes nos aspectos não verbais. Já sistema se constitui a partir
de campos associativos determinados por afinidade no nível da memória (lápis,
caderno), no nível fônico (gato, pato) ou do sentido (educação, ensino), os quais
também contêm oposições bilaterais e múltiplas. O Quadro 8 apresenta esses
diferentes tipos de relações.

Quadro 8. Sintagma e Sistema.

Sistema Sintagma
Grupo de peças, encaixes ou pormenores que podemos usar ao mesmo tempo e
Justaposição num mesmo conjunto de
Vestuário em um mesmo ponto do corpo e cuja variação corresponde a uma mudança do
elementos diferentes: saia-blusa-casaco.
sentido indumentário: touca/gorro/capelina etc.
Grupo de alimentos afins e dessemelhantes no qual escolhemos um prato em Encadeamento real dos pratos escolhidos
Comida
função de certo sentido: as variedades de entradas, assados ou sobremesas. ao longo da refeição: é o cardápio.
Justaposição dos móveis diferentes num
Mobiliário Grupo das variedades “estilísticas” de um mesmo móvel (uma cama).
mesmo espaço (cama-armário-mesa etc.).
Variações de estilo de um mesmo elemento de um edifício, diferentes formas de Encadeamento dos pormenores do
Arquitetura
telhados, sacadas, entradas etc. conjunto do edifício.
Fonte: adaptado de Campos e Araújo (2017, p. 31).

Os produtos que pertencem ao mesmo paradigma desempenham a mesma função


em um determinado contexto. Se precisarmos nos sentar, podemos usar um sofá,
uma cadeira, um banquinho ou um banco. Se tivermos sede, podemos beber
água, suco, refrigerante etc. Qual produto escolhemos é modelado por sistemas
de classificação compartilhados e definidos socialmente, alguns deles com gosto
pessoal, como a abstenção ao álcool, por exemplo.

55
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

O nível paradigmático, portanto, pertence ao posicionamento do produto. Quando


estamos comprando um novo telefone celular, comparamos telefones diferentes da
mesma categoria de produto que podem ter apenas pequenas diferenças de preço,
desempenho e design.

Um celular, por exemplo, pertence ao nível sintagmático de produtos eletrônicos


pessoais e outros produtos nesse sintagma podem ser um iPod, um Walkman ou um
rádio. Mas esse sintagma, por sua vez, faz parte de um sintagma maior com todos os
produtos pertencentes a essa pessoa.

Se descermos os níveis sintagmáticos para o telefone celular individual, é importante


lembrarmo-nos que o telefone em si é um sintagma com um conjunto especial
de elementos paradigmáticos. Existem botões, interface, cor, baterias, viva-voz,
tela etc. Esses elementos devem ser selecionados e combinados com um produto
satisfatório.

Esse é o nível em que a maioria dos designers de produtos opera, selecionando e


projetando cuidadosamente as peças para um todo.

Quando concebemos nossa casa, por exemplo, escolhemos itens que pertencem
ao sintagma de “uma casa”, como uma cama, um sofá, uma mesa de cozinha,
um aparelho de televisão etc. Quando temos uma TV na sala, não é provável que
compremos outra para a mesma sala, mas consideramos colocar uma menor na
cozinha.

Combinamos os sinais selecionados por meio de regras. Podemos substituir ou


selecionar, uma lâmpada fosforescente por uma lâmpada de LED, enviando assim
uma mensagem diferente. O sintagma é formado por regras e convenções dentro
desse gênero específico. É provável que o arquiteto/designer selecione uma lâmpada
LED, enquanto outra família pode querer um raio mais “acolhedor”. Essas convenções
podem ser muito fortes ou sujeitas a mudanças.

Para uma etnoterminologia: recortes epistemológicos. Disponível em:


cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0009-6725200600
0200018.

Hacia una semiótica de la comunicación. Disponível em: www.scielo.org.


mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0188-252X2008000100003.

Sobre a aplicação da semiótica à comunicação visual: algumas questões


epistemológicas e metodológicas. Disponível em: www.revistas.unisinos.br/
index.php/fronteiras/article/viewFile/fem.2014.162.07/4197.

56
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Da semântica estrutural à semiótica das culturas. Disponível em: www.


scielo.br/scielo.php?pid=S1982-25532019000500015&script=sci_arttext.

Paradigma e sintagma. Disponível em: https://pt.slideshare.net/Joao


HenriqueFerreira/paradigma-e-sintagma.

A Linguística de Saussure e a ideia de Semiologia. Disponível em: www.


bocc.ubi.pt/pag/fidalgo_logica_com_p2.html.

57
CAPÍTULO 2
Epistemologia, mecanismos de
linguagem e semiótica em seu
contexto prático

Semântica, linguística e epistemologia


Enquanto uma abordagem linguística do significado é genuinamente semiótica, a
semiótica é mais ampla que a linguística. De fato, o significado de sinais verbais e
outros sinais de comunicação pode vir a ser apenas uma subclasse do significado
dos instrumentos humanos em geral, ou seja, a subclasse de instrumentos que
servem à comunicação (KRAMPEN, 1989).

Para estudar seus significados, Krampen (1989) destaca em toda a ecologia dos
instrumentos humanos os chamados “edifícios” e “artefatos projetados”. O autor
chama essa abordagem de “semiótica ecológica” e defende que essa perspectiva
ecológica reflete mais adequadamente na relação recíproca dos seres humanos
em seus ambientes construídos e mais com seus respectivos artefatos do que
no tratamento de edifícios ou coisas que são projetadas como objetos abstratos
destacados de nossos corpos.

Para resolver esse problema, nesse estudo clássico de Krampen (1989), vemos
definidos alguns conceitos fundamentais da abordagem ecológica. Depois disso, ele
esboça uma semiótica ecológica com especial atenção às superfícies e layouts de
superfície de edifícios e artefatos, e finalmente aponta algumas diferenças entre o
significado de edifícios e de produtos projetados como resultado da escala humana.

Não adentrando a esses pontos imbricados do conteúdo complexo do texto, nos


interessa trabalhar a questão epistemológica acerca do objeto, mas nos cabe ainda
mencionar que as informações ópticas disponíveis ao organismo servem para
perceber contra-habilidades ou recursos. De fato, perceber nunca tem a ver com
objetos sem valor aos quais o significado está associado em uma segunda fase
(KRAMPEN, 1989).

O autor supracitado ainda nos informa que as superfícies, seus layouts e as


substâncias que delimitam sempre exibem recursos para alguém. Os preços podem
ser positivos ou negativos. Uma escada convida a descer por sua pequena altura,
um penhasco adverte para não descer por causa do abismo abaixo de sua borda.

58
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

As informações que especificam a disponibilidade positiva ou negativa são sempre


acompanhadas de informações que especificam o próprio organismo que percebe:
corpo, pernas, mãos, nariz e assim por diante (KRAMPEN, 1989).

Como mencionado acima, não podemos perceber o ambiente sem perceber nosso
eu dentro dele. Em casos especiais, pode haver informações incorretas emitidas por
certos objetos, como grandes portas de vidro que podem enganar a muitos de nós,
que com pressa, batemos a cabeça contra elas, confundindo-a com uma abertura
(KRAMPEN, 1989).

Uma das pessoas que ajudaram na pesquisa de Medway e Clark (2003) comentou
que a filosofia é um mundo de lacunas: entre aparência e realidade na metafísica,
entre subjetivo e objetivo na ética, entre epistemologia do conhecimento e da
opinião e entre verdade e falsidade na lógica.

A impressão é de que as questões que relacionam semiótica e design trata de uma


lacuna existente entre o pensamento de design, por um lado, e como representamos
o pensamento de design – que pode ser feito por meio de diagrama e da linguagem
escrita. Isto é, está voltado para como mapeamos o processo de pensamento,
porque o processo de pensamento é fluido; é diferente de um resultado.

É possível querer fazer uma distinção entre pensamento trivial, que é muito difícil
de abordar, e pensamento lógico. Como mapeamos esse processo de pensamento
no design, que é bem diferente de um processo lógico formal é um problema nesse
contexto. Dessarte, voltando às lacunas, pensemos na diferença que há entre um
edifício virtual e um real, entre o pensamento metafórico e o literal, entre “o que
não é” e “o que é”, entre a representação e o real, e entre o abstrato e o concreto;
ou seja, na maneira como podemos ter metáforas verbais e metáforas de imagem
(MEDWAY; CLARK, 2003).

Se temos a metáfora que se está construindo um barco, podemos interpretar


isso como pensamento ou imagem. Se o interpretarmos visualmente, talvez
tenhamos um barco arquetípico de uma sociedade e cultura em particular. Se
o interpretarmos por meio da linguagem, temos três coisas: o termo barco, os
tipos de barcos (balsas, transatlânticos, contratorpedeiros, barcos a remos etc.)
e propriedades dos barcos (proa e popa, mastro, convés, âncora etc.) (MEDWAY;
CLARK, 2003).

Um outro elemento da pesquisa de Medway e Clark (2003) entende que o discurso


arquitetônico é permeado por metáforas e muitas metáforas vêm da linguagem.
Metáforas como “barco” e “cadinho” parecem transmitir uma espécie de neblina

59
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

poética, uma penugem, um brilho de associações em torno do que, na verdade, são


desenhos técnicos bastante rígidos. Quando o arquiteto atravessa o escritório, abre a
gaveta e puxa o que parece uma planta, o que o arquiteto vê é “ousadia” ou “fragilidade”.

Além disso, cada desenho tem uma carga afetiva. Trata-se de diversas camadas
semióticas que são colocadas, como um palimpsesto, em cima uma da outra,
isto é, poderíamos afirmar que se trata de um acúmulo de traços semióticos. A
alternância entre imagem e linguagem é gerada, em grande medida, no design. O
que normalmente acontece é que alguém primeiro especifica uma ideia de design
em palavras ou em um esboço, e um interlocutor pega essa representação e a traduz
no outro meio dizendo algo como “oh, então você quer dizer isso...” e depois a
pessoa que desenhou o esboço dirá “não, não é nada disso, o que eu tinha em mente
era isso...” (MEDWAY; CLARK, 2003).

Em outras palavras, cada meio, cada modo semiótico tem seus próprios
desempenhos, possibilidades e requisitos. Pode-se dizer que você terá uma porta
nessa parede, mas quando você a desenha, precisa escolher uma posição específica
na parede, ou seja, não é possível simplesmente tê-la. Há também o modo de gesto:
os arquitetos conduzem os edifícios enquanto desenham, enquanto conversam
sobre desenhos, encenam o edifício no espaço tridimensional. Muitas vezes o lápis
está se movendo acima do papel, ou o lápis está desenhando no papel, e isso não
parece fazer muita diferença (MEDWAY; CLARK, 2003).

A questão de “é” versus “não é” tem uma resposta que se inclina à saussuriana. O
que surge é que o design parece ser um processo de construção de um sistema de
diferenças. Sempre que um positivo é declarado no design, por exemplo, “vai ser
assim”, sempre há um negativo implícito, por exemplo, “e não assim” (MEDWAY;
CLARK, 2003).

Linguagem, significado e significante


As imagens também representam o mundo, as pessoas e os eventos, e, portanto, sob
a ótica da linguística sistêmico-funcional, possuem uma metafunção ideacional. A
imagem causada pela palavra não seria diferente, pois há muito o que se abstrair.
No que concerne ao desenvolvimento teórico da semiótica, o objeto de estudo
da relação entre significado e significante ganha força, pois confere ao fato uma
relação na forma de expressão e uma forma de conteúdo.

Segundo Campos e Araújo (2017, p. 23), Saussure sistematizou dois modos distintos
de investigação dos fenômenos linguísticos: a sincrônica e a diacrônica. A primeira

60
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

analisa o estado da língua, o aspecto estático, ou seja, como ela existe naquele
determinado momento; parte apenas da perspectiva “dos falantes”. A segunda analisa
as mudanças na língua ao longo do tempo, utilizando conjuntamente a perspectiva
prospectiva e a perspectiva retrospectiva. Com isso, pode-se estudar uma língua a
partir dos documentos mais antigos e constatar sua evolução ao longo do tempo.

Campos e Araújo (2017) ainda nos revelam que a formação da língua portuguesa –
como todas as demais – passou por diversas transformações, desde o latim vulgar até a
sua forma moderna padrão. Em Saussure aparecem também dois eixos da linguagem.

O primeiro é o que temos comentado até agora com certa frequência, as


relações sintagmáticas, que são combinações de palavras ou grupos de
palavras (palavras-compostas, derivadas, membros de frases, frases inteiras)
de maneira linear da língua e se alinham na fala. Ele é representado por frases
transmitidas por meio da fala ou da escrita. Já o segundo é o eixo das relações
associativas que são um conjunto de palavras formadas por uma associação
mental que se ligam pelo radical, pelo sufixo, por analogia do significado ou
ainda por imagens acústicas.

Com efeito, ainda de acordo com os autores supracitados, a proposição teórica


é composta por diferentes dicotomias, quais sejam, língua e fala; imagem
acústica e conceito (significante/significado); sincronia/diacronia; e relações
sintagmática/associativas. Tais conceitos linguísticos foram estudados e trabalhadas
por outros semioticistas, dos quais Louis Trolle Hjelmslev (1899-1965) e Roland
Barthes (1915-1980) são os que mais se destacam e que aplicaram os princípios
saussurianos em diversos outros sistemas sígnicos.

As terminologias significado e significação possuem diferentes entendimentos


em Barthes. Por exemplo, conforme nos informam Campos e Araújo (2017),
o significado é um conceito e está no domínio da língua; já a significação é o
processo, ou seja, é a união entre significado e significante cujo resultado é o signo.

No âmbito ainda do significado/significante, vale mencionar Barthes novamente.


Ele foi um estruturalista que seguiu com rigor a teoria saussuriana, “reconheceu
que todos os sistemas de signos têm como objetivo a comunicação entre os homens,
não só a linguagem”. Ademais, ele definiu “como objeto semiológico qualquer
sistema de signos, imagens, gestos, os sons melódicos, os objetos e os complexos
como os ritos, os protocolos ou os espetáculos, quando não são linguagens, são
sistemas de significação” (CAMPOS; ARAÚJO, 2017, p. 29).

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UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

O Quadro 9 a seguir apresenta alguns dos pensamentos de Barthes voltados para


essa temática .

Quadro 9. Concepções e modelo de Roland Barthes.

Sobre seu modelo Sobre a fala Sobre a língua Sobre significado/significante


Semiologia é parte da linguística, A fala é um ato individual A língua é um conjunto O significado e o significante são de ordem
ao contrário de Saussure, que via a e momentâneo de de convenções da linguística e estão unidos no nosso cérebro
linguística como um ramo da Semiologia. seleção, atualização e uso comunicação humana de forma associativa. É com a união desses
da língua. que faz parte de um dois elementos que se forma o signo e esse
corpo social. É um processo é denominado significação.
sistema preexistente,
heterogêneo e de
natureza concreta.
O modelo linguístico de Saussure foi A fala é a parte de A língua é um sistema O signo é tudo aquilo que representa alguma
utilizado por ele para a compreensão de uso da fonação, da de signos que expressa coisa, que tem um conceito e uma imagem.
outros sistemas de signos, como visuais realização das regras ideias. O indivíduo não O significante é de natureza auditiva, a parte
e sonoros. e das combinações pode criá-lo e muito material no plano da expressão, por exemplo:
contingentes de signos. menos modificá-lo c-a-d-e-i-r-a.
sozinho, pois se trata de
um contrato coletivo.
Barthes, partindo de Saussure, A fala é o momento em A língua é a linguagem O significado é a imagem mental que está
estabeleceu em seu modelo elementos que o indivíduo coloca menos a fala. relacionada ao significante. É o conteúdo do
de Semiologia, os quais dividiu em em prática os códigos material no plano da expressão, não é a coisa
quatro grandes grupos: (i) língua/fala, da língua com intuito si, mas a imagem psíquica.
(ii) significado/significante, (iii) sintagma/ de expor o pensamento
sistema e (iv) denotação/conotação, pessoal.
mantendo a lógica diádica.
Fonte: adaptado de Campos e Araújo (2017, p. 29).

O meme como linguagem da internet: uma perspectiva semiótica.


Disponível em: https://repositorio.unb.br/bitstream/10482/18420/1/2015_
NataliaBotelhoHorta.pdf.

A Semiótica: A Base para a Linguagem Visual. Disponível em: www.portcom.


intercom.org.br/pdfs/73655737924032966186108606362373237573.pdf.

A semiótica do discurso e a fonética acústica: possíveis convergências.


Disponível em: simelp.fflch.usp.br/sites/simelp.fflch.usp.br/files/inline-files/
S4203.pdf.

A linguagem científica como uma modalidade da linguagem semiótica


no contexto da formação interdisciplinar online de professores de
Ciências. Disponível em: http://periodicos.claec.org/index.php/relacult/
article/view/1146 6.

Registros de representação semiótica e geometria analítica: Uma


experiência com futuros professores. Disponível em: www.scielo.org.mx/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1665-24362014000200002.

62
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Significar para se instaurar na língua materna: vestígios da reflexão da


criança na linguagem. Disponível em: http://www.scielo.edu.uy/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S2079-312X2019000200059&lng=es&nrm=iso&t
lng=pt.

Semiótica: da imanência à transcendência (questões sobre o estilo). Disponível


em: https://periodicos.fclar.unesp.br/alfa/article/view/2133/1751.

Mecanismos de linguagem
Denotação e Conotação são dois conceitos básicos em semiótica que são muito
úteis e são muito caros ao design. Hjelm (2002) nos ajuda a diferenciá-las:

» Denotação: refere-se ao significado literal e real de um sinal – qual é


o produto, isto é, uma cadeira, um telefone, um livro etc. A Denotação
também adiciona a função óbvia de um objeto: como lidar com ele. Ou
seja, sentamos na cadeira, usamos o telefone para fazer chamadas etc.
Isso parece bastante direto, mas em um mundo de desenvolvimento
tecnológico e de produto, reconhecer o que é e como lidar com isso
pode ser muito difícil. Esse também é o domínio em que reside a maior
parte da semiótica de produtos.

Os produtos devem ser inequívocos e fáceis de usar, comunicando claramente sua


função. De preferência, não é preciso de um manual para usar produtos simples
ou programas de computador. Um produto simples como um posto de gasolina ou
estacionamento devem ser reconhecidos facilmente e utilizados sem problemas
(HJELM, 2002).

Cientistas cognitivos como Donald Norman e vários designers ajudaram a


desenvolver esse campo durante a última década. Hoje, projetar produtos
autoevidentes é uma questão de permitir que os designers façam parte do ciclo de
produção desde o início. O conhecimento está aí, a questão é como trazê-lo para
dentro (HJELM, 2002).

» Conotação: é como se faz isso de que tratamos acima, como se escolhe


palavras ou mídia para a circulação.

Na Figura 8, vemos duas cadeiras, a primeira feita em 1934 por Bruno Mattson; e a
segunda, em 1987 por Jonas Bohlin.

63
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

Figura 8. Cadeiras de 1934 e 1987.

Fonte: Hjelm (2002).

A Denotação é semelhante, ambas são cadeiras e costumavam ser usadas para


sentar, são feitas pelo designer sueco e se tornaram ícones do design de seu tempo.

Mas a conotação é radicalmente diferente. Um é feito de material natural, madeira


de bétula dobrada e tecido cru, o outro é feito de concreto e aço. Utilizam-se
formas orgânicas, parece seguir o corpo do usuário, apoiando silenciosamente e
proporcionando um descanso confortável, sem se impor. O outro é feito de dois
blocos planos de concreto e uma forma geométrica muito simples da estrutura de
aço que forma a alça do braço. Ele usa os sinais básicos de uma cadeira, uma área
de estar, um encosto e uma maçaneta, sem realmente parecer que seria feito para
descansar (HJELM, 2002).

De muitas maneiras, uma cadeira vermelha/azul experimental da década de 1920


serve como exemplo de provocação estética. Empurra a estética modernista para
frente no tempo até onde chega e sinaliza sua morte no pós-modernismo.

Denotação e Conotação são frequentemente descritas como diferentes níveis de


significado. Barthes – novamente ele – introduz a ideia de diferentes ordens de
significação.

» A primeira ordem de significação é a de denotação, esse é o signo que


consiste em significante e significado.

» A anotação é a segunda ordem de significação, que usa o sinal denotativo


como seu significante e anexa a ele um sentido adicional.
64
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Assim, segundo Lopes e Hernandes (2005, pp. 157-164), além desses mecanismos de
linguagem voltados para a semiótica, ainda temos:

» Comparação: ao lado da denotação, é caracterizada pela afirmação


na concentração em um sentido unívoco. Há um processo discursivo
em que essa concentração pode ser negada. Quando dois ou mais
significados são comparados em torno de uma relação de similaridade,
o sentido denotado é negado e caminha para sua difusão em outros
sentidos, gerando, assim, conotações. Esse efeito é denominado
comparação (a conjunção como é um exemplo de comparação).

» Metáfora: aqui o sentido unívoco da denotação é negado e afirma-se


a sua difusão em outros sentidos. Desse modo, a metáfora é a
afirmação de um processo que decorre da negação da denotação, que
implica a construção de comparações. Na metáfora, a comparação que
constrói sentidos semelhantes não está mais separada em dois termos
comparados, como a batalha e o degelo discursivizado no texto de
Homero.

» Metonímia: estabelece relações de contiguidade, como as da parte


com o todo ou da causa com a consequência, pode realizar a negação
da difusão do sentido em direto à sua concentração.

Ainda de acordo com Lopes e Hernandes (2005), é possível notar o processo de


construção de efeitos de sentido, que parte de sua concentração para a difusão,
conforme Figura 9.

Figura 9. Denotação, comparação e metáfora.

Afirmação da Negação da
Afirmação da difusão
concentração de concentração de
de sentido:
sentido: sentido:
Metáfora
Denotação Comparação

Fonte: próprio autor, 2020.

Também é perceptível que na dedução existe um processo que seguiria o caminho


contrário, visto que esta nega a difusão do sentido em direção à sua concentração.
Demonstra, nas concepções de Lopes e Hernandes (2005, p. 163) que “tanto
a denotação quanto as conotações comparativas, metáforas e metonímias são
produtos de mecanismos do discurso que ora afirmam a concentração de sentido
univocamente, ora sua difusão, de modo plurívoco”.

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UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

Figura 10. Denotação, comparação e metonímia.

Não concentração
Comparação
Concentração Difusão
Denotação Metonímia

Não difusão
Metonímia

Fonte: próprio autor, 2020.

Com efeito, no percurso que vai da “não concentração para a difusão de sentido,
ou seja, nos domínios da comparação e da metáfora, geram-se efeitos de sentido
subjetivos, já que, por meio das semelhanças que orientam as comparações e as
metáforas, transparecem as escolhas do enunciador” (LOPES; HERMANDES,
2005, p. 163).

Desse modo, no percurso contrário, no que concerne aos domínios da metonímia


e da denotação, “geram-se efeitos de sentido objetivos, já que as escolhas do
enunciador estão minimizadas pela concentração de sentido, seja ela restrita
à definição de termos técnicos, seja relacionada ao discurso lexicográfico
dos dicionários”. Isso explicaria o frequente uso desses em discursos como os
científicos e jurídicos (LOPES; HERMANDES, 2005, pp. 163-164).

Ainda, considerando a metáfora e a metonímia, figuras de palavras básicas na


construção da linguagem, “o uso estilístico da primeira em escolas literárias de
enfoque subjetivo, como o Romantismo, e da segunda em escolas de enfoque objetivo,
como o Realismo e o Naturalismo”. Dessarte, “por meio de mecanismos discursivos,
demonstra-se que tanto a denotação quanto a conotação podem ser descritas como
produtos da linguagem, constituindo efeitos de sentido, e não reflexos e desvios de
um mundo de coisas reais” (LOPES; HERMANDES, 2005, p. 164).

Importância do mito para o design e o


simbólico
Na realidade, é difícil separar os dois níveis que vimos acima, o próprio Barthes
mais tarde deu prioridade ao nível conotativo e observava que não é mais fácil
separar o ideológico do literal. Denotação e conotação se combinam na terceira
ordem de significação – que Barthes chama de Mito. Para Ele, os mitos eram as
ideologias dominantes do nosso tempo. Sinais e códigos são gerados por mitos
e estes, por sua vez, servem para mantê-los – os sinais, os códigos e os próprios
mitos (HJELM, 2002).

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ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Os mitos também podem ser vistos como metáforas estendidas. Como as metáforas,
os mitos nos ajudam a entender nossa experiência dentro de uma cultura. Para
Barthes, os mitos servem à função ideológica da naturalização. Sua função é criar
valores históricos e culturais dominantes; atitudes e crenças parecem inteiramente
“naturais”, “normais”, óbvias e senso comum – e, portanto, reflexões objetivas e
verdadeiras de “como as coisas são” (HJELM, 2002).

Os sociólogos contemporâneos argumentam que os grupos sociais tendem a


considerar “natural” tudo o que lhes confere privilégio e poder. Diferentemente da
mídia mais ou menos efêmera, o design tem a capacidade de transformar mitos
em formas duradouras, sólidas e tangíveis, de modo que pareçam ser a própria
realidade (HJELM, 2002).

Com efeito, é possível verificar que existe um estatuto complexo do mito que
coincide com diversas questões ligadas à semiótica, que vão desde a poesia até
mesmo o design de produtos. Pietroforte (2004, p. 158) destaca que em “uma das
formas de projeção do eixo paradigmático no sintagmático, o texto poético realiza
termos complexos”. Tal identidade semiótica trabalha a questão tanto relacionada
ao estatuto poético dos mitos, quanto o estatuto mitológico da poesia.

Saussure distinguiu três tipos de signos convencionais, os quais, segundo


Campos e Araújo (2017, p. 73), seriam basicamente signos linguísticos, que se
trata daqueles arbitrários, em que a relação entre o significante e o significado
não possuem uma correlação imediata. Os signos linguísticos “seriam aqueles
arbitrários, em que a relação entre o significante e o significado não possuem
uma correlação imediata”. Ou seja, o “significante/casa/ não tem nenhum vínculo
com o significado de casa, é uma relação arbitrária e imotivada”.

No que concerne aos ícones, esses são, em Saussure, signos totalmente motivados,
uma vez que mantêm certa relação de contiguidade com o objeto representado.
Ainda outro exemplo, o desenho de uma casa é um ícone, visto que representa
graficamente aspectos visuais do objeto casa. Por fim, os símbolos “são signos
relativamente motivados e relativamente arbitrários. Diferentemente do ícone, o
símbolo representa uma ideia genérica, como a pomba branca que representa a paz
ou uma balança que representa a justiça” (CAMPOS; ARAÚJO 2017, p. 73).

Não há uma semelhança absoluta, o que faz do símbolo ser


relativamente arbitrário, assim como não há uma arbitrariedade
absoluta, pois iconicamente o símbolo representa alguns conceitos
visualmente de seu significado. Símbolos são constituídos
socialmente, juntando uma representação a um conceito genérico.

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UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

Após essa junção ter sido feita, eles se cristalizam e acabam


confundindo até mesmo a ideia que representam com a sua
representação, como acontece no caso da balança como símbolo da
justiça (CAMPOS; ARAÚJO 2017, p. 73).

Voltando às duas cadeiras (Figura 8), Hjelm (2002) revela quais mitos ou valores
dominantes elas refletem. A cadeira de Bruno Mattson foi projetada em 1934, por
exemplo, é confortável, moderna, natural e incorpora, de todas as formas, as ideias
modernistas da honestidade na forma, função e material. A cadeira segue o corpo
humano em um design elegante e funcional.

Algirdas Julius Greimas (1917-1992) fez uso de três grandes sistemas para agrupar
o modo como funcionam os signos dentro de suas respectivas capacidades
representativas de conteúdo. Campos e Araújo (2017, p. 74) afirmam que há o sistema
simbólico: cujo elemento do Plano de Expressão possui apenas um correspondente
no Plano de Conteúdo. É exemplo desse sistema as linguagens científicas, como a
matemática. Na linguagem matemática, um signo como “%” só pode representar
uma única coisa: uma operação de porcentagem. Também são sistemas Simbólicos
códigos visuais de trânsito, como o semáforo por exemplo.

Nos Sistemas Semióticos existem uma conformidade relativa entre os planos


de expressão e conteúdo. Os signos nos sistemas semióticos não se relacionam
necessariamente a apenas um elemento, mas sim a universos semânticos distintos.
O exemplo de sistemas Semióticos são as línguas naturais, como o Português ou
o Francês. As palavras ou significantes dessas línguas não são limitadas a apenas
uma intepretação e os seus planos podem ser separados para propósitos de análise
(CAMPOS; ARAÚJO 2017, p. 74).

Sistema Semissimbólico é “um tipo de articulação que diz respeito a uma


homologação não entre elementos isolados do plano de expressão e de conteúdo,
mas que relaciona categorias de ambos os planos”. Os sistemas semissimbólicos
“são os sistemas da arte, da poesia, da música. Encontramos aqui um tipo de
elaboração expressiva que corresponde a um tipo de categoria de conteúdo”
(CAMPOS; ARAÚJO 2017, p. 75).

Como nosso viés é artístico, nos voltemos para esse último sistema. Acerca do
que foi dito acima significa que existe uma relação no semissimbólico a qual, no
ambiente tipológico de Saussure, emerge entre o motivado do ícone e do símbolo e
o arbitrário do signo.

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ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Ou seja, segundo os autores “os sistemas semissimbólicos são aqueles que


elaboram as características da língua, das imagens, dos sons para produzir
conteúdos que se relacionem com esses modos expressivos”. Com efeito, a
descoberta de Greimas é a de que, de fato, há categorias gerais de expressão
que se relacionam a categorias de conteúdo. A semiótica discursiva de Greimas
contribui na análise de textos de cunho semissimbólico, utilizando as categorias
do percurso gerativo de sentido (CAMPOS; ARAÚJO, 2017, p. 75).

A linguagem híbrida do design: um estudo sobre as manifestações


contemporâneas. Disponível em: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.
br/21841/21841.PDF.

Aplicação prática e função da semiótica no


design
Façamos uso, em especial, do artigo de Jean-Marie Floch, intitulado A contribuição
da semiótica estrutural para o design de um hipermercado, a fim de verificarmos
abordagem mais prática do que tratamos até aqui.

Oliveira (2014) nos diz que os empreendimentos comerciais nasceram e


desenvolveram-se baseados em pesquisas e estudos das mais variadas áreas do
conhecimento. Ao lado do conjunto de campos envolvidos, segundo a autora,
“encontra-se no foco das pesquisas mercadológicas a teoria semiótica tanto para
realizar análises quantitativas como, e principalmente, para realizar análises
qualitativas do mercado”.

Antes mesmo de um empreendimento ter um endereço para vir


a existir em uma cidade, os estudiosos se ocupam em conceber a
sua localidade e ocupação espacial a fim de que essas escolhas já
contribuam para despertar a atenção do público e atraí-lo para o
interior do ponto de venda. Este procedimento se situa aquém da
gama de produtos comercializados e além da própria ambiência
criada para a loja existir enquanto um sujeito de ação. Desde as
primeiras lojas, os investidores privados compreenderam que
atuavam na criação de lugares para o consumidor alvo estar, de
modo que não bastava somente atraí-los à frequentação desses, mas
precisavam transformá-los em lugar público de sociabilidade e de
partilha e que também fossem dotados de atributos conferidores de
visibilidade social (OLIVEIRA, 2014).

69
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

A autora nos conta que aprendemos, na atual sociedade ocidental, que é vantajosa
a produção de espaços projetados que objetivam se tornar locais onde o consumo
seja efetuado de fato. A fim de alcançar tamanha complexidade, aqueles que
são estudiosos do assunto semiótico, em conjunto com aqueles que estiverem
no estabelecimento, uma vez que envolve questões arquitetônicas, estruturais,
utilização de diferentes tipos de materiais, suas respectivas formas, cores etc., são
responsáveis por criar estratégias que visem a lucratividade do ponto de venda de
algum produto.

Com efeito, “as bases do contrato de adesão estão fincadas e, pelas reiterações dos
modos de presença da loja, desenvolve-se um gosto por nela o consumidor querer
estar o que torna a sua frequentação um degustar do gosto de seu gosto”. As
razões que levam a uma dada implementação financeira, ainda segundo Oliveira
(2014), “se somam ao conhecimento levantado do que deseja a população para
que o ponto de venda venha a ser um sucesso de público com aceitação e adesão”.

Entrevistas, questionários de sondagem dos anseios dos


consumidores são aplicados a fim de quantificar, mas, sobretudo,
qualificar o modo de estar da loja em uma dada espacialidade de
compra e venda. As lojas são, pois, entendidas como muito mais do
que relações de troca econômica e grandes somas são destinadas
na formação de equipes integradas por sociólogos, etnólogos,
antropólogos, psicólogos e semioticistas para que trabalhem juntos
sobre a compreensão da volição dos destinatários com o propósito
de arquitetarem uma configuração do espaço comercial que produza
sentidos para os que nele adentram visando, principalmente, a
transformá-los em clientes fidelizados (OLIVEIRA, 2014).

O exemplo prático de Jean-Marie Floch (1947-2001) é de um supermercado da


cadeia Mammouth que foi aberto pela Cofradel de Lyon, em 1o de outubro de 1986.
Trata-se de um hipermercado de 7 mil m2, abrigado por um shopping center, que
atende uma necessidade ignorada em um subúrbio de Lyon, na França, cuja oferta
de mercados desse porte era algo raro.

Floch (2014, n.p.) nos fornece mais informações a respeito de sua pesquisa em
campo cujo teor nos interessa de modo direto:

Esse hipermercado tem sido mencionado como uma ilustração


concreta do tipo de contribuição que a semiótica pode oferecer
para a definição de um novo tipo de hipermercado. A abordagem
utilizada no desenho do seu conceito foi baseada no princípio da

70
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

conciliação entre os desejos expressos pelos consumidores, nas suas


falas nos grupos de discussão, as preconizações formuladas pelos
responsáveis técnicos e comerciais da companhia e, sobretudo, na
abordagem semiótica do discurso dos consumidores e a definição do
arranjo da planta geral do hipermercado.

Aponta o autor ainda que:

A semiótica, portanto, desempenhou um duplo papel, estando


presente tanto na concepção, quanto no desenho do hipermercado de
Lyon. No primeiro, a semiótica forneceu um modelo interpretativo
para as representações dos consumidores e suas expectativas sobre
o hipermercado. O uso desse modelo permitiu a identificação de
diferentes valores atribuídos a ele, bem como a revelação da lógica
subjacente às rejeições ou expectativas associadas a certos tipos de
plantas, ambientes etc. No segundo, contribuiu para a concretização
do desenho do conceito do hipermercado, entregando informações
concretas e precisas sobre a natureza formal da iluminação,
zoneamento, sinalética e itinerários, de forma a prover uma planta
interna que correspondesse aos desejos dos consumidores (FLOCH,
2014, n. p.).

Os resultados dos grupos de discussão que foram analisados por Floch (2014),
cujo embasamento é uma abordagem semiótica estrutural, a qual foi desenhada
e desenvolvida por um Grupo de Pesquisas que residiu em Paris, chamado
SemioLinguísticas – e uma das coisas mais interessantes é que ele foi encabeçado
por Greimas, que mencionamos no tópico anterior.

Tal abordagem, ainda segundo Floch (2014, n. p.), tem por intuito esclarecer as
condições nas quais o sentido é produzido e apreendido. Com efeito, “sua extensão
excede os signos isolados, de modo a dar conta do reconhecimento de sistemas de
significação manifestos por linguagens verbais e não verbais.”

[...] esteja o discurso em sua forma expandida (longas descrições,


narrativas detalhadas) ou em forma concisa (um adjetivo, um
verbo, uma comparação breve), a análise semiótica se faz a partir
do reconhecimento das várias formas de programas narrativos
e dos “objetos de valor” que são neles recorrentes e os definem,
um em relação ao outro. Há uma categoria fundamental que aqui
articula o campo dos vários valores recorrentes presentes no
discurso dos consumidores: o supermercado pode ser um lugar para

71
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

abastecimento rápido, de maneira eficiente e econômica ou, pelo


contrário, pode ser um espaço que representa uma nova maneira
de viver, uma visão ultramoderna do mercado ou feira, ambos,
símbolos míticos de uma forma de sociabilidade “amigável”. De
outro modo, em termos reais ou potenciais, o hipermercado pode
ser dotado de valores práticos (velocidade, funcionalidade etc.) ou,
pelo contrário, de valores de “vida” fundamentais: sociabilidade
“amigável”, modernidade ou o equilíbrio (pelo menos o possível)
entre natureza e cultura (um grupo de consumidores, na verdade,
imaginou o hipermercado do futuro como uma grande estufa com
diferentes áreas, espaços culturais e exposição de produtos definidos
e conectados por córregos e bosques).

O fato de a categoria acima apresentada ser “capaz de organizar todos esses


discursos assegura a organização mínima de seus elementos comuns e provê a
base para uma potencial tipologia do consumidor”, e isso se dá “de acordo com a
ênfase que os consumidores dão a algum termo em particular, ou para qualquer
valor particular com o qual o hipermercado é dotado” (FLOCH, 2014, n.p.).

O exemplo que autor nos traz é que alguns consumidores – queiram, ou amem,
ou ainda odeiem – definem um hipermercado como algo exclusivamente utilitário,
outros dizem que isso permite e promove um modo de vida particular; e outros,
ainda, avaliam que visitá-lo é um compromisso entre o utilitário e o aprazível, entre
a necessidade e o prazer (FLOCH, 2014, n.p.).

Há basicamente três aspectos dessa abordagem que o autor supracitado nos traz, os
quais provaram seu valor, quais sejam:

» Sendo a abordagem de natureza estrutural, os próprios termos


importam menos que as relações que os interdefinem. Assim,
é menos no estudo dos próprios signos e mais no estudo dos seus
valores contextuais que a abordagem faz emergir as relações entre
as várias representações e expectativas dos consumidores com
relação a hipermercados. Dessa forma, uma descrição semiótica
passa do registro das várias diferenças observáveis em plantas de
supermercados e da maneira que os consumidores falam sobre como
a usam, para a definição das relações que apontam compatibilidades
lógicas ou contradições existentes entre valores atribuídos a esse tipo
de espaço.

72
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

» A abordagem também é de natureza gerativa: em outras palavras,


ela primeiramente identifica diferentes camadas constituintes do
sentido, organiza-as hierarquicamente e, então, enriquece o sentido
ao demonstrar articulação e complexidade crescentes. A produção
de sentido pode, portanto, ser concebida como um “caminho” que
começa com relações abstratas que, por sua vez, asseguram condições
mínimas para a significação, e evoluem para os padrões complexos,
os quais constituem a base de qualquer manifestação discursiva, seja
ela verbal ou de qualquer outra espécie. Juntamente com essas linhas,
é possível estabelecer uma relação estrutural entre os serviços que
foram esperados pelos consumidores, a organização do tempo e espaço
e o “aprofundamento” do sistema de elementos mais importantes do
design do hipermercado.

» Finalmente, a abordagem semiótica estruturalista, com seu foco


na expressão da lógica do discurso, sempre teve um interesse
particular nas formas das narrativas que a regem, indo muito além da
segmentação textual em parágrafos ou frases. O trabalho semiótico,
que tem sido realizado no campo da narratologia, será amplamente
explorado nesse estudo na análise dos relatos das “expedições” dos
consumidores ao hipermercado, que são narrativas de como “terminar
as compras o mais rápido possível” ou “levar o tempo que precisar”,
“esperar na fila do caixa”, “pagar”, “colocar as compras no carro” ou,
ainda, “ficar para almoçar” ou “passear no departamento de roupas”...
Tantas micronarrativas com estruturas e sequências que se prestam
à análise semiótica como programas complexos de ações realizadas
em função de sistemas de valores. A condição necessária para que os
sistemas de valores sejam absorvidos conscientemente é imaterial.

O autor fazer forte uso do quadrado semiótico é “uma representação visual das
relações que existem entre as características distinguíveis que constituem uma
dada categoria semântica”. A construção desse quadrado irá depender de uma
das “descobertas fundamentais que a semiótica toma emprestada da linguística
estrutural, a identificação de dois diferentes tipos de oposição em operação nas
linguagens”, quais, sejam:

» relações privativas;

» relações qualitativas (contradição e contrariedade).

73
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

Isso pode ser mais bem esclarecido por um exemplo que o autor nos fornece, que é
voltado para uma oposição entre homem e mulher.

Essa relação pode ser tomada como um eixo semântico em que


um termo pressupõe o outro, o que quer dizer que os dois termos
estão numa relação qualitativa, ou em contrariedade. Mas,
individualmente, qualquer um dos termos da categoria também
pode ser envolvido numa relação privativa: cada termo, marcado
pela presença de um traço distintivo, contradiz o termo que pode
ser definido pela ausência desse traço. Nesse exemplo, fêmea/não
fêmea e macho/não macho, há duas contradições. No estágio final
da composição do quadrado semiótico, depois da definição de
termos contraditórios por uma operação de negação, voltamo-nos
a uma operação de afirmação: o que acontece quando um dos dois
termos contraditórios é mantido em oposição ao contrário do qual
fora projetado? Nesse caso, o outro contrário é considerado uma
pressuposição não-recíproca: a proposição de que um ser não é
fêmea implica sua potencial masculinidade, e a proposição de que
um ser não macho implica sua potencial feminilidade. As relações
fêmea/não macho e macho/não fêmea são chamadas relação de
complementaridade, e a operação que as constitui é conhecida como
implicação (FLOCH, 2014).

A figura a seguir ilustra o exemplo supracitado:

Figura 11. Exemplo de quadrado semiótico.

“HOMEM” “MULHER”

macho “hermafrodita” fêmea

Não fêmea Anjo Não macho

Relações Operações

Contrariedade
Negação

Contradição
Fonte: Floch (2014).

74
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

O quadrado semiótico desenhado pelo autor serve de representação de uma


organização relacional que existe entre várias “situações sexuais”, ou, como é
chamado pelo autor, “a categoria cultural da sexualidade, relativa a épocas e
sociedades”. Com efeito, ela permite “posicionar” desde homem e mulher, como
hermafroditas e até anjos – que, ao invés de serem pensados como um ou outro
ou até mesmo como seres andrógenos, para título de exemplo, são considerados
assexuados.

O interesse do quadrado semiótico, diz o autor, está inserido em um viés


cultural coerente, mesmo quando não é considerado “racional”. Com efeito,
acaba por permitir “a antecipação de ambos os caminhos que o sentido pode
tomar e posições de sentido que são logicamente presentes, mas ainda não
se encontram em vigor”. Mormente, “os temas, as imagens, os conceitos e as
expressões ‘posicionados’ no quadrado semiótico sempre existem em definições
lógico-semânticas” (FLOCH, 2014, n.p.).

A fim de não prolongarmos em demasia, cabe tratar dos resultados da pesquisa.


Conclui Floch (2014, n.p.) que foi a primeira vez em que certa “articulação foi
experimentada para a concepção de um dispositivo de vendas rápidas, envolvendo
tantos produtos. Essa também foi a primeira vez em que tanta distinção foi
atribuída às reflexões e propostas de consumidores em potencial.”

Em termos semióticos, o princípio de uma semiose, isto é, a


relação entre significado (conteúdo) e significante (expressão)
foi estabelecida. A principal função do semioticista, durante os
encontros realizados em todo o período de definição do conceito
do design, foi assegurar as características da expressão e conteúdo
que dotariam o hipermercado com um grau de originalidade a
ser efetivamente implementado, além de garantir que qualquer
modificação que tivesse de ser feita devido a considerações técnicas
não seriam fundamentalmente debilitantes do projeto. Portanto,
coube ao semioticista distinguir claramente o que relacionou a
“forma de expressão” à “forma do conteúdo” do hipermercado (as
invariantes do projeto, que determinaram a base de sua planta e a
parte essencial de seu apelo) e que relacionaram à “substância” de
cada plano (o que constituiu as variáveis de expressão e conteúdo do
projeto) (FLOCH, 2014, n.p.).

A semiótica plástica, é válido mencionar como um importante trabalho


desempenhado por Floch (2014, n.p.), “toma como seu objeto visual linguagens
constituídas pela correlação denominada ‘semissimbólica’ entre uma categoria
75
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

da expressão e uma categoria do conteúdo”. Tais linguagens “atuam de modo a


reorganizar a dimensão figurativa de pinturas, pôsteres e filmes, ‘corrompendo-a’
para produzir um discurso diferente, tanto de maneira mais abstrata, como, mais
frequentemente, de natureza ideológica.”

Uma quantidade considerável de provas pôde ser produzida – derivada de análises


de pinturas, arquiteturas e filmes –, de modo a demonstrar que o sentido não
foi transmitido pelas cores isoladamente, mas por figuras cromáticas; em outras
palavras, por conjuntos de figuras distintivas (por exemplo: cores saturadas +
claras + foscas, ou não saturadas + escuras + foscas), cada uma podendo ser
produzida em cores diferentes ou combinações de acordo com os materiais,
superfícies e iluminação da zona em questão.

O fato de um estudo semiótico ter sido conduzido por meio da definição e do


processo criativo do hipermercado de Lyon claramente teve o efeito benéfico de
permitir a integração das expectativas da área de captação dos consumidores
potenciais, na medida em que a lógica deles foi investigada e formalizada, e uma
vez que essa lógica pode conferir sentido para indicações muito completas ou
notações referentes a ambientes, itinerários, mobiliário da loja, serviços etc.

Ainda outro efeito benéfico do estudo foi que ele “permitiu tanto à equipe de
gestão de projetos da Cofradel quanto à equipe de designers trabalhar com o
mesmo modelo de referência e o mesmo esquema de reflexão, numa base em que
todas as partes puderam explicitar”, bem como “formular e comunicar suas ideias,
preocupações e experiências” (FLOCH, 2014, n.p.).

Floch (2014) entende também que seu estudo “contribuiu para uma melhor
elucidação de uma problemática comum às habilidades e aos níveis de
responsabilidade de diferentes especialistas envolvidos no grupo desse projeto”.

Todavia, ele levanta dois pontos importantes ressaltados pelo autor, a fim de
finalizar este tópico:

» A incorporação dos quatro maiores tipos de valores deveria ser restrita


somente ao próprio hipermercado ou expandida para todo o centro
de compras (shopping)? Essa questão é, talvez, mais relevante pelo
fato de que a forma original do supermercado permaneceu como a
tradicional forma de “caixa” (o paralelepípedo). No futuro, esse tipo
de estudo não deveria ser tomado como pesquisa para a projeção
de futuros shoppings centers, e o resultado comunicado aos seus
desenvolvedores? Dessa maneira, todo o prédio, ou talvez o grupo
de prédios, que constituiriam o shopping center, poderia refletir os
quatro tipos de valores e estimular a sua coexistência.
76
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

» Com o seu design, especificamente direcionado para realizar novas


distribuições espaciais da maneira mais facilmente identificável,
poderia o Mammouth de Lyon requerer um esforço “semiótico”
particular, por assim dizer, de consumidores locais que estão
demasiado acostumados com o “código do hipermercado”,
poderosamente representado pelo hipermercado Carrefour no
subúrbio de Ecully? Deixe-nos supor que mais e mais consumidores
locais estarão dispostos a “aprender” o código do novo hipermercado,
que é particularmente novo, principalmente porque ele corresponde
intimamente a uma lógica que eles seguirão somente se a realidade
dos serviços e preços propostos não for desqualificada em comparação
aos hipermercados tradicionais, e se a publicidade, que ele recebeu,
possuir um efeito duradouro sobre sua originalidade e no seu futuro.

Semiótica aplicada. Disponível em: www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttex


t&pid=S0034-75902009000300011.

77
CAPÍTULO 3
Estética, design e semiótica

Estética e a busca pelo belo


A estética, proveniente da Filosofia, “refere-se à qualidade visual do objeto, que,
consequentemente, trata da expressividade, comunicabilidade, agradabilidade,
atratividade, afetividade e valor contemplativo que o objeto apresenta ao usuário”
(TAI, 2018, p. 88-89).

Quem fundou o termo estética, como disciplina, no século XVIII foi Alexander
Baumgarten (1714-1762) com o intuito de designar “um tipo de conhecimento
que não é empírico nem racional, mas que advém dos sentidos – o conhecimento
sensitivo ou sensível. Questões ligadas à beleza e à arte teriam aí seu lugar de
discussão” (MOSER et al., 2019, p. 199).

Os primeiros registros que tratam da influência da arte na formação do caráter


humano datam dessa época. Vejamos o panorama histórico que Moser et al. (2019,
pp. 200-203) nos traz acerca de tal contexto, em quea questão do objeto, que
também é foco do design, está sempre – direta ou indiretamente – presente:

» Pitagóricos: mediante as proporções numéricas, construíram as


escalas musicais, por meio das quais acreditavam ser capazes de
induzir determinados estados de espírito.

» Platão (427 a.C. – 347 a.C.): reconhecia a influência dos poetas


imitadores sobre a audiência – lembrando que a poesia era feita para
ser declarada.

» Aristóteles (348 a.C. – 322 a.C.): entendia a tragédia – um tipo de


poesia imitativa – como uma forma de provocar catarse na audiência.

» Plotino (205 d.C. – 270 d.C.): via a beleza inserida dentro da alma,
divina. Inicia pelos sentidos, passa pelas ações virtuosas até chegar ao
entendimento, à razão, à beleza por ela mesma.

» Agostinho (354-430): os sentidos humanos são secundários e a beleza


tem um viés espiritual e racional, podendo ser percebida nos números
constantes nas músicas, isto é, nas proporções musicais – desde que
participem dos números eternos.

78
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

» Tomás de Aquino (1225-1274): o belo e o bom são a mesma coisa


nas pessoas, e a beleza das criaturas nada mais é que a imitação da
beleza divina que pode ser percebida nelas.

» David Hume (1711-1776): reflete sobre a questão buscando definir


padrão de gosto, dado por um conjunto de pessoas com determinadas
características de personalidade.

» Immanuel Kant (1724-1804): ao refletir sobre o trabalho de


Hume, Kant afirma que ao se contemplar um objeto para se obter
um verdadeiro juízo de gosto, de forma isenta, a tarefa deve ser feita
desinteressadamente.

» Friedrich Schiller (1759-1805): viu na educação estética a


possibilidade de harmonizar duas tendências naturais do homem: a
tendência material e a formal, visto que concebia, como Kant, que
o homem é tanto natureza quanto razão. Para Schiller, somente
a educação estética poderia harmonizar essas duas tendências e,
portanto, libertar o homem do domínio da natureza ou da razão.

» Arthur Schopenhauer (1788-1860): a arte pode ser um elixir para as


dores existenciais.

» Martin Heidegger (1889-1976): compreendia que a verdade também


está na obra de arte.

» Gilles Deleuze (1925-1995): em termos de pensamento, afirmava que


a arte está no mesmo patamar da Filosofia e das ciências, pois pensar é
criar.

» Friedrich Nietzsche (1844-1900): pensou a arte sob a ótica do


criador, estabelecendo a relação entre duas forças criadoras: a apolínea
e a dionisíaca.

Formas de representação no design


A estética, conforme nos informa Tai (2018), está diretamente relacionada à
utilização de materiais e ao processo de sua produção.

O velho Platão já trabalhava as questões estéticas como pura representação,


porém sob o efeito negativo, uma vez que a escultura de um cachorro está

79
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

triplamente distante da realidade (leia-se a realidade que está no mundo das


ideias). Ou seja, o cão já é uma cópia daquilo que verdadeiramente é, sua imagem
(fotografia, pintura, escultura etc.) nada mais é do que a cópia da cópia.

[...] os belos sons e cores que percebemos por meio de nossos


sentidos são meras imitações da verdadeira beleza a que temos
acesso somente via conhecimento. Portanto, tanto a natureza como
as coisas produzidas pelo homem são imitações de formas ideais.
A arte seria uma imitação da imitação, visto que parte de formas
existentes na natureza, percebidas pelos sentidos humanos. A
natureza que observamos no dia a dia seria uma representação
da verdadeira realidade. Para Platão, a beleza está fundamentada
na verdade – e a verdade está no mundo das formas (MOSER et al.,
2019, pp. 209-210, grifo do autor).

Moser et al. (2019, p. 210) prosseguem nos informando que a beleza e a verdade
em si mesmas são eternas e imutáveis para Platão, e traz ainda mais algumas
concepções do filósofo, especialmente voltadas para a questão dos objetos, que
muito interessa ao design de produtos:

» Beleza, portanto, não está associada à imagem, à representação,


mas à razão pura, podendo ser alcançada somente por meio do
conhecimento.

» Prazer em si não é um bem, pois está no âmbito dos sentidos humanos,


ao passo que a razão possibilita a aproximação com o bem.

» A realidade sensível deve ser observada pelos sentidos, porém o


observador, se quiser realmente acessar a verdadeira beleza, deve
abstrair o objeto observado, não se fixando em sua aparência, mas
extraindo as múltiplas qualidades desse objeto.

» O conhecimento é a beleza e o bem, porque ele é o conhecimento


dessas verdades ideais que compreendem a verdadeira realidade
das coisas.

O termo imitação também está presente em Plotino. Em Schopenhauer nós não


podemos conhecer as coisas em si mesmas, mas somente quando nos baseamos
em dados externos que permitem intuir objetos.

80
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Desse modo, ainda em Schopenhauer,

[...] construímos uma realidade com base em sua aparência, submetida


a um princípio de razão que contempla não somente o espaço e o
tempo – responsáveis pela individualização e sucessão dos eventos
–, mas também a causalidade, capaz de explicar o aparecimento de
um fenômeno no espaço-tempo como resultado de certas causas –
razão pela qual este se manifesta de um jeito e não de outro. Esse
mundo que se apresenta a nós é um mundo de aparências, o qual
Schopenhauer chama de mundo como representação. Como ter
acesso ao mundo que se esconde por trás das aparências, à coisa em
si, portanto, fora do espaço-tempo e da causalidade? (MOSER et al.,
2019, pp. 233-234, grifo do autor)

Moser et al. (2019, p. 210) nos trazem ainda outras concepções importantes
deste importante pensador, incluindo questões diretamente ligadas à questão dos
objetos e de seu desejo (vontade) por eles, ou seja, basicamente trabalha com o
caminho para se chegar até à consumação (uso do produto) da vontade.

Schopenhauer, segundo os autores, identifica algo capaz de agir na natureza e mover


o homem, um impulso indivisível e atemporal chamado vontade. É a vontade que,
em última instância, se objetiva em diferentes tipos de fenômenos e indivíduos.
Tempo, espaço e causalidade estão todos à mercê da vontade (MOSER et al., 2019).

É ela que está por trás das aparências, é a coisa em si. A vontade, antes de se
manifestar de forma espaço-temporal e causal, consistem em ideia, em formas
eternas atemporais e, posteriormente, em objetos com causalidade e localizados
no tempo, no espaço – os fenômenos. No homem, tal vontade está diretamente
relacionada ao querer, ao desejo, a um impulso que o move em direção às coisas, ao
mundo (MOSER et al., 2019).

Com efeito:

» Querer: nasce da necessidade, porém toda necessidade é uma carência


sentida, a qual é forçosamente um sofrimento.

» Desejo saciado: momento em que acaba um desejo para, na


sequência, surgir outro, tornando o processo circular.

Desse modo, ainda conforme nos informam Moser et al. (2019, pp. 234-235) “a
vida humana está associada à necessidade e à dor originária na existência do ser

81
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

humano. Quando estas são satisfeitas, temos a saciedade e o tédio. Esse processo é
inerente à vida humana e faz parte do sofrimento existencial”.

Schopenhauer considera que a arte é capaz de neutralizar o


sofrimento na medida em que nos possibilita assumir um modo
de conhecimento estético, no qual a consciência se entrega por
inteiro ao conhecimento intuitivo, libertando-nos do querer e,
portanto, do sofrimento existencial. Para ele, o belo atua sobre
nós no momento em que nos coloca em estado de contemplação,
tornando-nos puros sujeitos do conhecer, destituído de vontade
(MOSER et al., 2019, p. 235).

Assim, o que foi apresentado estimula o cursista a entender a estética não somente
como algo exterior ao indivíduo, mas que é regido por uma série de complexas teias
que são preocupações primeiras dos designers de produtos, especialmente no que
tange à real vontade e ao real desejo daquele que irá consumir o produto.

O papel da estética na semiótica


Até o momento, segundo Holt (2017), apesar dos estudos de Beyaert-Geslin, a
estética teve um papel limitado na semiótica e, de fato, na semiótica social. Em vez
de estar associada a um significado concreto, descreve o domínio do paladar, da
sensibilidade ou da predileção pessoal. Assim, a estética aparece totalmente em
liberdade condicional – parte do momento e, na verdade, arbitrariedade da escolha
individual de uma linguagem mais ampla (digamos, itens de vestuário individuais
selecionados a partir da linguagem ou gramática do figurino) – ou totalmente de
linguagem, como o sistema autônomo de relações de cores, por exemplo, ou as
relações formais entre tipologia espacial, a variedade de texturas ou conjuntos de
sons etc., ou seja, sistema de usuário nos termos de Krippendorff.

Não obstante, Holt (2017) acredita que a estética é o discurso que pode ser o
mais adequado para a conceituação do artificial precisamente porque nunca
foi um discurso estritamente dedicado à análise (nem à geração de conceitos
que simplesmente categorizam fenômenos); mas, antes, um discurso dedicado à
articulação.

A estética explora as relações entre as coisas, como elas são organizadas, como elas
“se encaixam”, como elas conversam materialmente. Ela também é o domínio no
qual os conceitos são experimentados, elaborados, transformados de dentro para
fora e expostos ao contrafactual. Atividade estética é o processo de “comunicação”
contrafactual (HOLT, 2017).
82
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Em termos de estudos de design, esse é o ponto em que arte e design se cruzam –


não no artefato produzido sobre quais afirmações podem ser feitas sobre beleza ou
valor relativo (embora isso possa ocorrer), mas no espaço proposicional, para fala,
do modelo, isto é, do espaço em que o futuro do artefato, serviço ou experiência não
foi totalmente atualizado (HOLT, 2017).

O modelo é, antes de tudo, um “recurso” para experimentação, disputa e


reorganização, não um protótipo para ampliar e construir. Para empregar outro
termo semiótico social, a estética – ou “pensamento” estético – está alinhada com
a metafunção “organizacional”. Isso significa não apenas como um interior real
é organizado, por exemplo, mas sua possível disposição. O pensamento estético,
a pesquisa estética, é o “redesenho do design” (un redessin du dessin), e a arte
assume a forma de um “metadiscurso do design“ (un metadiscours du design)
(HOLT, 2017).

Estética, imagem, esquema e semiótica


cognitiva
O conceito de esquema de imagem não é de forma alguma novo na pesquisa e na
teoria do design. De fato, já era antecipado pelo conceito de “espaço semântico”.
No entanto, ainda não está claro como os esquemas de imagem se encaixam em
uma estrutura semiótica. E, para entender melhor esse contexto, Markussen
(2007) desenvolve com maior contundência o que é conhecido como “semiótica
cognitiva”.

A semiótica cognitiva baseia-se no pressuposto de uma semelhança estrutural ou


iconicidade entre nosso mundo fenomenológico e a maneira como concebemos
ou expressamos, em pensamento, linguagem e arte, nossas experiências nesse
mundo. É absolutamente legítimo usar o termo iconicidade nesse forte sentido
estrutural. Mesmo se estamos acostumados a pensar na iconicidade como algo
completamente vago ou indeterminado (uma qualidade de sentimento, um mero
tom de cognição), a iconicidade para Peirce também pode significar um “diagrama
estrutural” ou “plano esquelético” aplicado ao receptor da sensação por meio do
julgamento perceptivo, formando assim o objeto imediato.

Na concepção de Markussen (2007), os esquemas de imagem são idênticos


ao segundo significado de iconicidade acima exposto. Semelhante a Peirce,
a semiótica cognitiva também considera os esquemas de imagem como sendo
aplicados ou projetados em processos inferenciais mais abstratos.

83
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

No entanto, para entender sua natureza icônica, é necessário examinar mais de perto
como elas emergem de nossa interação perceptiva e sensório-motora com o mundo
exterior. Interação é o termo chave aqui. Como a semiótica cognitiva não está de
forma alguma subscrevendo a ontologia dualística ou mesmo “esquizofrênica” de que
a semiótica foi acusada, mas em vez disso, o princípio prototípico ativo na formação
de esquemas de imagem é identificado precisamente no limiar entre o objetivo e o
subjetivo (MARKUSSEN, 2007).

Ao explicar, por exemplo, como o esquema de entrada e saída surge da interação


do espaço corporal, há uma lista dos primeiros passos de nossas rotinas diárias,
trazidas pelo o autor. Segundo ele, acordamos de um sono profundo e espiamos
debaixo das cobertas para o quarto. Nós nos puxamos para fora das cobertas,
vestimos sua túnica, esticamos seus membros etc. (MARKUSSEN, 2007)

Esses são exemplos da maneira como um esquema de imagem surge da localização


fenomenológica no espaço. O problema central da semiótica cognitiva é,
obviamente, demonstrar como as estruturas icônicas resultantes da interação
nesse espaço base restringem a construção de significados em níveis simbólicos
de ordem superior. Essa tarefa consiste basicamente em fornecer evidências para
a chamada hipótese de espacialização da forma (MARKUSSEN, 2007).

A rigor, a hipótese de espacialização da forma requer um mapeamento metafórico


do espaço físico para um “espaço conceitual”. Sob esse mapeamento, a estrutura
espacial é desenhada na estrutura conceitual. Mais especificamente, os esquemas
de imagens (que estruturam o espaço) são mapeados nas configurações abstratas
correspondentes (que estruturam os conceitos). A hipótese de espacialização
da forma sustenta, assim, que a estrutura conceitual é entendida em termos de
esquemas de imagem mais um mapeamento metafórico (MARKUSSEN, 2007).

Os esquemas de imagem e o mapeamento metafórico parecem tão difundidos


que mal os notamos. A menos que, é claro, em situações em que a ancoragem
do significado conceitual seja bloqueada ou frustrada. Há um exemplo claro e
particular disso, que são as consequências imprevistas do espaço de mídia RAVE,
que Dourish e seus colegas criaram no EuroPARC em Cambridge, Inglaterra.

O RAVE era um sistema de videoconferência audiovisual projetado para criar um


ambiente de trabalho virtual colaborativo além dos limites de tempo e espaço.
No entanto, os escritórios conectados pela conexão de vídeo tinham orientações
diferentes, ou seja, o equipamento de vídeo era orientado de forma assimétrica
(Figura 12). Consequentemente, como Dourisch explica, “a orientação da minha
imagem virtual no monitor do meu colega não era a mesma que a minha própria
orientação física; portanto, quando eu apontava para uma direção, minha imagem
apontava para outra” (MARKUSSEN, 2007).

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ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Veja a Figura 12, ali estão presentes P e V, que possuem layouts de escritório
assimétricos. Quando P aponta para A, como indicado pela seta, a câmera transmite
sua imagem ao monitor de V. No escritório de V, a imagem de P parece apontar na
direção mostrada pela seta sólida, ao invés de na direção desejada mostrada pela
seta pontilhada.

Figura 12. Layouts de escritório assimétricos.

Fonte: Markussen (2007).

Esse exemplo é interessante porque chama a atenção para a validade potencial da


hipótese de espacialização da forma. Devido a sua estrutura assimétrica, o RAVE
separa quadros básicos de orientação do significado comunicado e interfere no
relacionamento motivado entre ação e significado corporificados. Com efeito, a
semiótica cognitiva poderia servir como uma poderosa ferramenta analítica para
entender como a percepção e o movimento do corpo moldam a maneira como
concebemos e projetamos ambientes responsivos (MARKUSSEN, 2007).

Produto, estética e semiótica


Bhushan e Banwet (2013) nos contam que o sucesso do produto só pode ser
alcançado se o produto atender às necessidades e oferecer benefícios percebidos
ao cliente. No contexto do design industrial, os designers devem ter uma boa visão
das necessidades do cliente e do consumidor final, pois não têm o luxo de lidar
pessoalmente com um único cliente.

Como parte integrante do processo de desenvolvimento de produtos, o


gerenciamento de produtos e o conhecimento de marketing são essenciais para
identificar usuários em potencial. Nesse contexto, argumenta-se que a crescente
aliança entre design, produção em massa e consumo em massa é o fator mais
poderoso e constrangedor dos últimos dois séculos.

85
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

Uma interação complexa de fatores surge de três aspectos principais do design


industrial, conforme já demos alguns esboços ao longo de nosso conteúdo:

» função;

» marketing e

» manufatura.

Esses fatores, que são ocasionalmente conflitantes, ainda de acordo com Bhushan
e Banwet (2013), sempre competem entre si, porém, frequentemente, é esperada
alguma forma de conciliação entre eles no produto final.

O problema de design é altamente influenciado pelo usuário desde o início. Como


os designers tentam redefinir o problema de design durante o processo, é bastante
difícil para eles identificar as necessidades do usuário. Assim, a perspectiva
ambiental é de alta relevância, conforme podemos ver na Figura 13, que trata de
um estudo detalhado do ambiente geral e específico, em que o produto deve ser
feito para compreendê-lo (BHUSHAN; BANWET, 2013).

Figura 13. Design funcional pragmático: relação entre usuário, produto e ambiente.

Ambiente geral

Ambiente
específico

Objeto

Usuário

Fonte: Bhushan e Banwet (2013).

Com efeito, a estética é a ciência da percepção sensual. Aristóteles tentou


definir a relação entre o artista, a obra de arte e o consumidor de arte. Ele entendeu
a percepção sensual como a interação entre ordem, equilíbrio e limitação. Ele usou
os termos Poiesis, Mimesis e Katharsis.

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ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Kant entendia que um objeto que agrada aos sentidos é percebido como “delicioso”
e provoca interesse na existência do objeto. A Semântica de Produtos
facilitará a geração de projetos de produtos com melhor entendimento funcional
e tecnológico. Assim, por exemplo, o designer pode usar ícones, índices ou
símbolos inspirando-se na trifurcação de sinais de Charles S. Peirce (BHUSHAN;
BANWET, 2013).

Vale a pena sempre relembrar-se: ícone é um sinal que se assemelha a algo, como
fotografia de pessoas. Um ícone também pode ser ilustrativo ou diagramático,
por exemplo, um sinal de “não fumantes”. O índice é um sinal em que existe
um link direto entre o sinal e o objeto. A maioria dos sinais de trânsito são
indicadores de índice, pois representam informações relacionadas a um local
(por exemplo, um sinal de “superfície escorregadia da estrada” colocada em uma
estrada propensa a inundações). O símbolo, por sua vez, não tem significado
lógico entre ele e o objeto. As bandeiras são símbolos que representam países,
organizações ou quaisquer tipos de instituições (BHUSHAN; BANWET, 2013).

Um estudo pragmático (a doutrina de que consequências práticas são os critérios


de conhecimento, significado e valor) pode ser realizado tendo em mente a
orientação do consumir com o ambiente, considerando como eles respondem à
ampla gama de sinais usados pelos designers de produtos no setor de TI, como o
design de ícones para telas de dispositivos móveis.

Sob o ponto de vista do Design Centrado no Usuário, se um objeto, um ambiente


ou um sistema é destinado ao uso humano, então seu design deve considerar as
características de seus usuários inseridas naquele ambiente. O papel da ergonomia
como ciência é central aqui.

Já o principal papel da análise contextual no design é a aquisição de conhecimento


sobre o local antes do início das atividades de design, para que o pensamento inicial
sobre o edifício possa incorporar respostas significativas a condições externas.
Alguns atributos funcionais podem ser:

» eficiente/ineficiente;

» atrasado/simplificado;

» vívido/maçante;

» poderoso/fraco;

» ágil/rígido;

87
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

» simples/complexo ou complicado;

» ocioso/ativo etc.

Na Índia, por exemplo, os designers precisam embelezar os designs de produtos,


mantendo em mente seus recursos tecnológicos e funcionais. A Apple, em dado
momento, processou seu fornecedor de componentes Samsung, alegando – em
uma reclamação federal de 38 páginas, em 15 de abril de 2011, no Tribunal
Distrital dos Estados Unidos do Distrito Norte da Califórnia – que vários
telefones e tablets Android da Samsung, incluindo o Nexus S, Epic 4G, O Galaxy
S 4G e o Samsung Galaxy Tab, violaram a propriedade intelectual da Apple
(suas patentes, marcas comerciais, interface do usuário e estilo) (BHUSHAN;
BANWET, 2013).

Portanto, é necessário fazer uma análise pragmática do design funcional e


tecnológico-estético do produto antes de colocá-lo na plataforma de lançamento.
A semântica do produto pode garantir a originalidade, autenticidade e
autenticidade dos produtos. Pode ajudar a distinguir não apenas entre design de
marca concorrente, mas também práticas imitativas feitas por jogadores menos
conhecidos. A Índia é um mercado crescente para agentes locais e estrangeiros.
Assim, a taxonomia e a criação de significado de diferentes signos são imperativas
(BHUSHAN; BANWET, 2013).

Não são encontrados muitos estudos sobre a articulação de projetos de produtos


estético-funcional e tecnologicamente estético, facilitados pela semântica do
produto. A literatura existente mostra-nos a facilitação da semântica do produto
na produção de um design estético de produto ou podemos encontrar aspectos
funcionais e tecnológicos sendo levados em consideração (BHUSHAN; BANWET,
2013).

Com efeito, se for discutido como o esteticismo deve reduzir a função e a tecnologia,
é preciso estudar acerca do assunto. Consequentemente, duas hipóteses podem ser
levantadas, de acordo com Bhushan e Banwet (2013):

» A Semântica do Produto facilita um design de produto funcionalmente


estético.

» A Semântica do Produto facilita um design de produto tecnologicamente


estético.

88
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Mas há também outras hipóteses importantes:

» A semântica do produto leva a uma maior consciência semiótica dos


designers.

» Maior consciência semiótica dos designers leva a melhores decisões de


design.

» A semântica do produto leva a uma maior consciência semiótica dos


usuários do produto.

» A Semântica do Produto facilita um design de produto sustentável/verde.

É acerca dessa última que trataremos a fim de finalizar o nosso conteúdo.

Design sustentável: design e estética


O design sustentável é uma ramificação dos estudos ambientais e das teorias
econômicas. A semântica emergente do design sustentável sugere que os designers
devem se tornar “ecologicamente inteligentes”, exigindo que eles obtenham um
conhecimento substancial de design sustentável e apliquem os princípios de “bom
design” com “design ecológico” em seus trabalhos (BHUSHAN; BANWET, 2013).

Um bom design resistirá ao teste do tempo e, com sorte, será mantido por muito
mais tempo, reduzindo assim a necessidade constante de criação de novos
produtos e utilização de materiais e energia necessários para produzi-los.

Um conceito que atraiu muito interesse na profissão de design foi o “biomimetismo”.


Nos últimos dois séculos, testemunhamos muitos movimentos de design que se
concentravam nas formas naturais. A bioimitação, por outro lado, é muito mais
sofisticada e exigente do que a mera imitação de formas na natureza.

Ela exige que os designers tirem inspirações da anatomia, fisiologia e do


comportamento dos sistemas vivos que se desenvolveram há milhões de anos. Às
vezes, essas características biológicas podem ser difíceis de transmitir em formas
físicas, porque elas existem no nível microscópico. Por exemplo, os designers
precisam encontrar maneiras engenhosas de comunicar aos usuários uma estrutura
biomimética da superfície de um novo material adesivo inspirado nas solas dos
pés de répteis que aderem naturalmente ao vidro e a outros materiais não porosos
(BHUSHAN; BANWET, 2013).

89
UNIDADE II │ ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS

A natureza trabalha a partir de um método de baixo para cima, para não


produzir resíduos, diferentemente do processo humano, que geralmente é de
baixo para cima, começando com a extração do material e continuando até a
fabricação e distribuição. Embora seja impossível remover ou transformar todos
os nossos processos, é certamente possível torná-los mais eficientes, reparáveis
e personalizáveis, para que os indivíduos tenham um grande interesse em se
apegar a produtos pelos quais eram parcialmente responsáveis (BHUSHAN;
BANWET, 2013).

A Semântica de Produtos fornece uma abordagem holística para examinar


como a natureza tem sido buscada para inspiração. Design ecológico e projetos
sustentáveis podem ser significados por meio de projetos de produtos. A análise
pode ser feita a partir do uso de materiais, dinâmica de formas, inspiração
da natureza, cores usadas etc. Muitos estudos nos mostram a relação entre
semiótica e biologia, ou seja, a biossemiose, mas continua sendo motivo de
séria preocupação que a maior parte dos países do mundo não tenha esse foco
(BHUSHAN; BANWET, 2013).

Como grande parte dos textos – de qualidade – dessa área estão em inglês,
julgamos pertinente incrementá-los, visto que todos os demais conteúdos
extras já estão em português.

Applying Semiotic Theories to Graphic Design Education: An Empirical


Study on Poster Design Teaching. Disponível em: https://files.eric.ed.gov/
fulltext/EJ1083918.pdf.

Aesthetics, semiotics & design. Disponível em: http://www.michael-hardt.


com/PDF/research/Aesthetics_semiotics_and_visual_communication.pdf.

Semiotics and design: Towards an aesthetics of the artificial. Disponível


em: tandfonline.com/doi/pdf/10.1080/14606925.2017.1352860?needAccess=
true.

Role of design in society. Disponível em: ncert.nic.in/textbook/pdf/legd101.


pdf.

Exploring aesthetics, design, and experience in the age of semiotic


technology. Disponível em: https://pdfs.semanticscholar.org/418b/8d20b9b78
1e491306121efa6d2ad8dce2634.pdf.

90
ESTÉTICA, AMBIENTE E A SEMIÓTICA NO DESIGN DE PRODUTOS │ UNIDADE II

Semiotics + art and design = experience. Disponível em: https://


humantechnology.jyu.fi/archive/vol-14/issue-1/vol14_iss1_ht_full_issue_
may2018.pdf.

Semiotics and design: Towards an aesthetics of the artificial. Disponível


em: https://opus.lib.uts.edu.au/bitstream/10453/125712/1/6_25_2018_
Semiotics%20.pdf.

Aesthetics, semiotics & design. Disponível em: www.michael-hardt.com/PDF/


research/Aesthetics_semiotics_and_visual_communication.pdf.

91
Para (não) finalizar

Ingenuidade é acreditar que um assunto se encontra esgotado sempre ao final de


algum livro, material ou estudo. Este é um meio de pesquisa para que seus estudos
continuem e prossigam sempre avançando.

E é dessa maneira, para enriquecer os conhecimentos do aluno dedicado, que nos


esforçamos em oferecer conteúdo de grande valia para aprimoramento de seu
curso e disciplina. Claramente não é uma forma de esgotar o assunto, já que o
conteúdo e os artigos aqui citados estão baseados em outros, aos quais tomaram
por consulta outros e assim sucessivamente.

Indicamos, portanto os conteúdos para dar cadência aos seus estudos de temáticas
para pesquisas (não tratadas ou não necessariamente aprofundadas neste Material
de Apoio):

Indicação de livro com mais de 600 páginas:

» A contribuição da Semiótica no Ensino & na Pesquisa. Disponível


em: www.dialogarts.uerj.br/arquivos/livro_coloquio_online.pdf.

Os artigos indicados são:

» A relação entre Semiótica e Design. Disponível em: https://www.


udesc.br/arquivos/ceart/id_cpmenu/5925/A_rela__o_entre_Semi_
tica_e_Design_15505100065997_5925.pdf.

» Introdução à Semiótica. Disponível em: http://www.cchla.ufpb.br/


clv/images/docs/modulos/p8/p8_4.pdf.

» Imagem como símbolo acústico: a semiótica aplicada à prática da


audiodescrição. Disponível em: www.biblioteca.pucminas.br/teses/
Comunicacao_MayerFA_1.pdf.

» Sobre a aplicação da semiótica à comunicação visual:


algumas questões epistemológicas e metodológicas. Disponível em:
revistas.unisinos.br/index.php/fronteiras/article/viewFile/
fem.2014.162.07/4197.

92
PARA (NÃO) FINALIZAR

» Design e designer. Disponível em: books.scielo.org/id/vtxgm/pdf/


landim-9788579830938-02.pdf.

» A influência da estética na usabilidade aparente aspectos para


a criatividade e inovação no design de sistemas e produtos.
Disponível em: books.scielo.org/id/jhfsj/pdf/fiorin-9788579836244-06.
pdf.

» Incursão pelos modelos de análise da imagem publicitária.


Disponível em: www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S2183-54622019000100008.

» Levantamento bibliográfico sobre as metodologias para o


design de interfaces digitais e produtos midiáticos. Disponível
em: www.cesumar.br/prppge/pesquisa/epcc2013/oit_mostra/aline_
cardoso_militao.pdf.

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