Design e Teoria Do Objeto

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DESIGN E TEORIA

DO OBJETO
Elaboração

Rodrigo Corrêa Cardoso

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO....................................................................................................................................................................................... 4

ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA.................................................................................................. 5

INTRODUÇÃO.............................................................................................................................................................................................. 7

UNIDADE I
FUNDAMENTOS..................................................................................................................................................................................................................... 9

CAPÍTULO 1
O OBJETO ARTÍSTICO E O OBJETO UTILITÁRIO........................................................................................................................................ 9

CAPÍTULO 2
SEMIÓTICA APLICADA AO OBJETO............................................................................................................................................................... 19

CAPÍTULO 3
OBJETO E FUNÇÃO.............................................................................................................................................................................................. 25

UNIDADE II
OBJETO E SOCIEDADE....................................................................................................................................................................................................... 34

CAPÍTULO 1
O OBJETO CULTURAL......................................................................................................................................................................................... 34

CAPÍTULO 2
O KITSCH E O ANTI-KITSCH............................................................................................................................................................................ 36

CAPÍTULO 3
CULTURA E PERCEPÇÃO.................................................................................................................................................................................. 43

UNIDADE III
OBJETO E CONSUMO.......................................................................................................................................................................................................... 61

CAPÍTULO 1
RELAÇÃO DE CONSUMO................................................................................................................................................................................... 61

CAPÍTULO 2
TEORIAS ESTÉTICAS CONTEMPORÂNEAS............................................................................................................................................. 68

UNIDADE IV
APLICAÇÕES NO DESIGN................................................................................................................................................................................................ 73

CAPÍTULO 1
OBJETO E O PROCESSO CRIATIVO NO DESIGN...................................................................................................................................... 73

CAPÍTULO 2
CONSIDERAÇÕES CONTEMPORÂNEAS.................................................................................................................................................... 83

REFERÊNCIAS......................................................................................................................................................................................... 87
APRESENTAÇÃO

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como
pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia
da Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos


conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos
da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional
que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-
tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

4
ORGANIZAÇÃO DO CADERNO
DE ESTUDOS E PESQUISA

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de
textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam
tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta
para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.

Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto
antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para
o autor conteudista.

Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma
pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em
seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas
experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para
a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar


Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do
estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Atenção
Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam
para a síntese/conclusão do assunto abordado.

5
Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa

Saiba mais
Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/
conclusões sobre o assunto abordado.

Sintetizando
Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando
o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Para (não) finalizar


Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a
aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo
estudado.

6
INTRODUÇÃO

Por pelo menos um instante em sua rotina, você terá a necessidade de usar algum tipo
de objeto, ou no mínimo irá de deparar com algum. Isso porque os objetos fazem parte
da nossa vida de modo incisivo e constante. Para praticamente qualquer tipo de ação
que venham tomar, os objetos terão sua função.

Os objetos são as coisas materiais que podem ser percebidas, de alguma forma, pelos
sentidos e possuem alguma utilidade, ou seja, eles são concretos e podem ser vistos e
tocados. Ainda existem os objetos sem uma utilidade clara, muitas vezes associado a
questões psicológicas e emocionais.

Desde os primórdios da humanidade, os objetos fazem parte da vida dos seres humanos.
Na maioria das vezes, eles nascem com o objetivo de atender a alguma necessidade
humana, desde armazenar algum alimento, passando por estenderem as dimensões
humanas como ferramentas, até mesmo os que atuam como instrumento de diversão
e momentos de descontração.

A relação que temos com alguns objetos pode ser em aspectos gerais, como, por
exemplo, um copo, uma cadeira ou até mesmo um eletrodoméstico; ou em aspectos
individuais, sendo aqueles que envolvem uma grande dimensão emocional, como, por
exemplo, miniaturas, acessórios e, por que não, produtos de higiene pessoal.

Nessa disciplina, serão abordadas teorias em volta da concepção dos objetos, assim
como suas características, categorias e diferenças em relação aos usuários. Ainda serão
apresentados conceitos de necessidade humana, funções dos objetos e a forma como
eles se apresentam em relações de consumo, assim como os aspectos de consumismo
ao longo da história humana.

Ao final dessa disciplina, você será capaz de entender as diferentes maneiras de interpretar
um objeto de uso ou artístico, tanto quando proceder em um desenvolvimento de um
novo objeto, seguindo os preceitos de processos criativos no design. Perpassando por
questões conceituais derivadas da semiótica, da percepção e incluindo-as em diferentes
abordagens culturais da sociedade.

Compreender os objetos é, de certa forma, compreender onde está a atuação do design


de forma concreta e visual. Espero que a assimilação dos conceitos apresentados seja
simples e o mais clara possível.

7
Introdução

Objetivos
» Introduzir os principais conceitos que estimulam a sua capacidade de
identificar, validar, valorizar e criar objetos a partir de um contexto social
usando o design como um processo capacitador de transformações.

» Conceber um mundo que celebra as relações humanas e tudo que a humanidade


pode proporcionar em suas inúmeras possibilidades.

» Contribuir para a qualificação de profissionais com autonomia intelectual e


compromisso cultural, para a atuação nas áreas de criação e desenvolvimento
de produtos e serviços, com padrão estético e funcional.

» Estabelecer ao aluno as ligações relevantes de fatos, imagens, registros,


experiências e problemáticas para o desenvolvimento de novos objetos.

» Compreender a fundamentação teórica, pesquisa, investigação científica


e experimentação prática em design, para o aumento de competitividade
de produtos e serviços, por meio da elevação da sua qualidade estética e
funcional, da qualificação dos atuais meios e modos de produção e do acesso
a novas tecnologias.

» Contribuir para o aprimoramento da formação e educação estética e artística


dos profissionais.

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FUNDAMENTOS UNIDADE I

CAPÍTULO 1
O objeto artístico e o objeto utilitário

Definições preliminares
É possível afirmar que todos nós, como indivíduos, já tivemos alguma relação com
algum objeto. Isso é possível ao nos depararmos com a definição de objeto encontrada
em qualquer dicionário de nossa língua, que o define como “coisa material que pode
ser percebida pelos sentidos”, sendo esses: a visão, como o sentido principal, e o
tato, como sentido secundário, principalmente quando o primeiro não é possível ser
utilizado provisoriamente ou de modo definitivo. Por um aspecto mais conceitual,
ainda é possível definir o objeto como “coisa mental ou física para a qual converge o
pensamento, um sentimento ou uma ação”.

Por uma ótica do design, a relação humana com os objetos, constitui uma interação de
troca entre as partes. Isso porque nós tendemos a, primeiramente, ver os problemas,
sejam esses diretamente confrontados ou estando envolvidos, mas isso é apenas uma
parte de uma complexa estrutura que é uma sociedade. Estando em um sistema social
complexo, que tem as relações humanas e as inter-relações com as demais coisas
como um de seus fundamentos, onde o indivíduo exerce influência em seu meio com
intervenções carregadas de fatores emocionais, impulsivos e até mesmo inconscientes.

O designer e sociólogo Bernd Löbach, em seu livro “Design Industrial”, nos dá uma
definição das relações humanas.
O homem, como parte de um sistema, aprendeu que só é capaz de subsistir
cooperando com os de sua espécie, por isto busca contatos diretos ou indiretos
com os demais homens. No contexto de sua conduta social acontecem duas
formas marcadamente distintas de relações humanas: relações humanas que
se desenvolvem por meio da conduta – palavra, mímica, gesto; relações
“objetualizadas”, que se vivem com os objetos”.
(LOBACH, 2001, p. 24)

9
Unidade I | FUNDAMENTOS

Ainda segundo Löbach (2001), a comunicação, informação, interação e percepção social


são relações diretas e estudadas no âmbito da sociologia e da psicóloga. Enquanto as
relações indiretas acontecem por meio dos objetos, estudas pelos campos da percepção
visual, psicologia da forma e da semiótica. Ambos os estudos necessitariam de uma
análise bem mais abrangente, pois suas problemáticas são consideravelmente polivalentes
para serem tratadas como uma definição preliminar.

O homem modifica seu meio por diferentes motivações, isso porque a conduta do ser
humano é direcionada por necessidades múltiplas e bem variadas. Necessidades essas que
não surgem exatamente de maneira lógica e sendo muitas delas ocasionais. São oriundas
de alguma carência e responsáveis pela edição do comportamento humano.

Figura 1. Ferramentas pré-históricas (sem data definida).

Fonte: http://criarte75.blogspot.com/2015/10/arte-no-paleolitico-as-pinturas.html.

A satisfação das necessidades é a primeira motivação para a atuação do homem,


somadas aos desejos, anseios e ambições que agem como inspirações. Essas satisfações
surgem como oposição às necessidades, pois nascem de forma espontânea e podem
ser satisfeitas.

Löbach (2001) exemplifica como essas necessidades podem agir como inspirações para
a criação de objetos.
O homem que experimenta uma determinada necessidade pode satisfazê-la
mediante sua atividade pessoal e, em seguida, por meio do uso do próprio

10
FUNDAMENTOS | Unidade I

resultado, como ocorria antigamente, por exemplo, com a fabricação própria


de ferramentas.
(LOBACH, 2001, p. 27)

Consequentemente, a satisfação de determinadas necessidades realizadas pelo uso de


objetos é feita através de processos industriais nos dias de hoje. Processos esses que
têm a participação efetiva do design em diferentes níveis.

O mundo, como uma sociedade global, é movido economicamente como uma


máquina capitalista. Esta disciplina não objetiva discutir questões políticas e
sociais, que com certeza fazem parte do universo do design, mas neste momento é
necessária uma análise comportamental e econômica. Sendo assim, a sociedade
tem como um de seus objetivos a elevação do crescimento econômico que carrega
as necessidades e aspirações como motivação para a criação e aperfeiçoamento
de objetos.

Os objetos podem ser classificados em quatro categorias distintas:

» objetos naturais;

» objetos modificados da natureza;

» objetos de arte;

» objetos de uso.

Objetos naturais
Se existe um local onde a produção de produtos é ininterrupta e maciça e, principalmente,
sem a intervenção do homem, é na natureza. Georgi Borisowski, autor do livro
“Form und Uniform” (1969), diz que a natureza é como uma fábrica cósmica, que
podemos acrescentar como ilimitada e incontável, isso porque novas transformações,
ou mutações, acontecem durantes os anos e que muitas espécies da fauna e da flora
ainda nem foram descobertos. O autor, citado por Löbach (2001, p. 34), afirma que:
“Ele escreve que a natureza se apoia no princípio da produção em massa. A matéria-prima
se compõe principalmente de 12 elementos, dos quais surge a multiplicidade sem fim
de produtos da natureza”.

Podendo adotar diversas posturas diante da natureza, o homem sendo parte integrante
dela, pode manter-se passivo, sem exercer nenhuma influência no meio, sendo uma das
posturas possíveis de ser adotada diante da natureza. Podendo até mesmo se acomodar
ao meio ambiente.

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Unidade I | FUNDAMENTOS

Figura 2. Tronco de árvore fossilizado com 200 milhões de anos, no Parque Farroupilha (RS).

Fonte: https://gasometro.wordpress.com/2012/05/05/tronco-de-arvore-com-200-milhoes-de-anos/.

É possível concluir que os objetos naturais são entendidos como aqueles que foram
criados pela natureza e que mantêm sua forma original sem alteração pela ação humana.
Isso porque uma segunda relação direta com a natureza se faz com a intervenção
ativa do meio ambiente com a modificação da natureza, a fim de satisfazer as
necessidades humanas, sendo as duas de grande importância para a relação do
homem e objeto.

As duas formas de comportamento perante a natureza são importantes


para o homem já que, graças a elas, pode-se subsistir física e psiquicamente.
Para a subsistência física é importante a transformação da natureza em objetos
de uso, cujo emprego possa satisfazer as necessidades correspondentes.
Para a saúde psíquica é essencial a percepção da natureza intacta.
(LOBACH, 2001, p. 34).

Objetos modificados da natureza


Com uma sequência de ações simples e diretas, o homem com suas necessidades, através
do trabalho em forma de materialização, modifica os objetos naturais e os transforma
em objetos, a fim de alcançar uma satisfação das necessidades. Através desse processo
de transformação da natureza, é comum surgirem objetos, cuja importância, ainda
não havia sido observada pelo ser humano.

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FUNDAMENTOS | Unidade I

Figura 3. Utensílios de uso doméstico que formam concebidos por modificação da natureza.

Fonte: https://casa.abril.com.br/profissionais/arte-e-natureza-estes-objetos-cotidianos-retornam-as-suas-raizes/.

Löbach (2001) exemplifica em seu livro que os montes de feno que os agricultores
utilizam como alimentação para os animais, são decorrentes da ação desses mesmos
agricultores ao transformarem o capim. Ele ainda completa dizendo:
Esses montes de feno, como muitos outros objetos naturais modificados,
são consequência de processos criativos do homem e são consideradas mais
ou menos manifestações estéticas. Tais objetos, enquanto objetos naturais,
podem ter uma qualidade estética e assim ter um significado para o nosso
equilíbrio psíquico.
(LOBACH, 2001, p. 35)

Objetos de uso
Até aqui, foi possível compreender que os objetos, com exceção dos objetos naturais,
nascem de uma determinada necessidade do homem, sendo assim, podemos definir
que os objetos de uso são a materialização de ideias que buscam a satisfação de uma
necessidade humana. Analisando por uma ótica da relação com o homem e levando
em consideração as definições e características de cada objeto, o etnólogo Jean Poirier
(1999) nos traz a seguinte análise:
A partir do momento em que o homem fabrica o primeiro objeto, institui-se
uma relação duradoura entre eles que, consequentemente, os torna um par.
O objeto torna-se o mediador entre o homem e o meio natural desencadeando

13
Unidade I | FUNDAMENTOS

a evolução cultural humana. Os objetos são como testemunhas, pois por


meio deles é possível reconstruir a evolução das sociedades humanas.
(POIRIER, 1999, p. 14, apud CORRÊA; SILVA, 2013, p. 12)

Ao falarmos sobre objetos, a premissa de Abraham Moles (1981), descrevendo que “o


objeto nada mais é do que um instrumento fabricado pelo homem”, caracteriza o objeto
de uso como um elemento que permite que o ser humano modifique o que existe ao seu
redor, tornando em grande parte o mundo mais acessível e passível de personalização.
Assim, “o homem modela o mundo a sua volta, se relaciona e se comunica por meio
do uso do objeto” (CORRÊA; SILVA, 2013, p. 12).

Outra definição é trazida por Jean Baudrillard (2001), que aponta outro aspecto da
funcionalidade do objeto:
O objeto, segundo Baudrillard, é mediador, mas ao mesmo tempo, por ser
imanente, quebra essa mediação. Por isso, o objeto tanto possui uma utilidade
quanto ultrapassa o seu uso, decepcionando, às vezes, as expectativas de
funcionalidade que se tem dele.
(BAUDRILLARD, 2001, p. 11, apud CORRÊA; SILVA, 2013, p. 12)

As duas definições, em um primeiro momento, parecem divergir, mas ao analisarmos


as análises feitas pela filósofa Hannah Arendt (1906-1975), que define que os objetos de
uso possuem como fonte o pensamento do homem associado à economia, inicialmente
com a prática da troca e do comércio, fazem com que o objeto ganhe um fim prático
e lucrativo.

Assim, é possível o entendimento do objeto como função utilitária, concedendo


estabilidade ao homem, ao mesmo tempo que um mesmo objeto pode ter sua origem
e função social como valor de troca.

Os objetos de uso são elementos fundamentais para a constituição da estrutura econômica


de uma sociedade, onde, além de retratarem as condições sociais, eles são produzidos
de forma maciça, por meio de processos cada vez mais industriais, a fim de suprir as
necessidades que se transformam com o consumo em massa. Inicialmente fabricados
através de processos manuais, quando os objetos de uso eram fabricados para um
número de clientes reduzido e atendiam as expectativas e desejos individuais dos
usuários. Com a industrialização dos processos, os objetos eram produzidos com a
finalidade de atender a um ou mais tipos de necessidades que atingissem a um número
mais abrangente de pessoas.

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FUNDAMENTOS | Unidade I

Figura 4. Abridor de latas.

Fonte: https://revistacasaejardim.globo.com/Casa-e-Jardim/Design/noticia/2017/11/5-objetos-comuns-no-dia-dia-que-sao-icones-do-design-
mundial.html.

Observando por um aspecto econômico, quando produzidos de modo manual, os objetos


utilitários eram desenvolvidos por completo por um mesmo artesão, que mantinha todo
o controle sobre o processo de fabricação e gerava um aspecto personalizado do que
era criado. Esse meio de fabricação resultava em uma produção mais lenta, em menor
quantidade e que elevava o custo total, principalmente porque objetivavam atender às
necessidades e valores pessoais de um único cliente, que conduzem uma idealização emocional.
Já em relação aos produtos desenvolvidos pelo processo industrial, a lógica era
proporcionar com sua comercialização um maior lucro, assim, sua idealização já
considera uma produção racional e econômica. O processo busca a simplificação
máxima dos processos e materiais utilizados. Esses produtos passam a ser idênticos
uns aos outros e produzidos em grande quantidade.
Os objetos utilitários, ainda associados com as produções manuais, podem ser classificados
de duas maneiras. A primeira, como funcionais, onde os objetos são marcados por sua
função prática de uso e, na maior das vezes, integram o material e o modo de fabricação.
Já a segunda, são os objetos mais simbólicos, que podem ser utilizados da mesma
maneira que a primeira, mas que carregam consigo um aspecto mais de status social.

Figura 5. Cafeteira Moka, criada por Luigi De Ponti, em 1933.

Fonte: https://revistacasaejardim.globo.com/Casa-e-Jardim/Design/noticia/2017/11/5-objetos-comuns-no-dia-dia-que-sao-icones-do-design-
mundial.html.

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Unidade I | FUNDAMENTOS

Quando a sociedade passa a ser conduzida por aspectos industriais, principalmente em


meados da Revolução Industrial, o cotidiano das pessoas passa a receber uma enorme
gama de objetos de uso, que trazem novas funções específicas, assim como estéticas.
[...] o homem se cercou de um “invólucro de objetos”. Baudrillard afirma
que esses objetos, cujas práticas seguem a ordem moderna, demonstram uma
nova relação do homem com os objetos, em que tudo passa a ser dominado,
manipulado, controlado e adquirido. Ao contrário da ordem natural, na
qual o objeto é criado para atender às necessidades do homem, o objeto da
ordem moderna surge para atender a uma ou mais funções criando, assim,
necessidades.
(BAUDRILLARD, 200, p. 34, apud CORRÊA, e SILVA, 2013, p. 13).

Dessa forma, é possível concluirmos que o objeto de uso possui função tanto social
quanto pragmática, que passam a compor a rotina da sociedade, onde praticamente tudo
o que é utilizado pelos seres humanos, em seu cotidiano, são objetos que funcionam
como meios para subsistência e evolução da vida de modo geral.

Objetos de arte
Para falarmos de objetos artísticos é necessária uma breve introdução sobre a real
necessidade do homem de possuir tais objetos. Em relação aos objetos de uso, suas
funções estão diretamente associadas com as necessidades do ser humano, sendo, em
alguns momentos, um meio para o surgimento de uma nova necessidade. Com os
objetos artísticos, as necessidades podem alcançar um âmbito mais estético e a satisfação
das necessidades estéticas não são essenciais para a existência física humana, mas para
a saúde psíquica do homem.

O professor de ciência cognitiva Donald Norman (1935), autor do livro “Design


Emocional” (2008), associa as necessidades dos objetos de uso com as vontades pessoais.
As necessidades são determinadas pela tarefa. Um balde é necessário
para carregar água [...]. As vontades são determinadas pela cultura, pela
publicidade, pela maneira como a pessoa vê a si mesma e sua autoimagem.
(NORMAN, 2008, p. 62)

Ao mesmo tempo, Norman (2008) reforça que as necessidades emocionais podem


ficar acima das necessidades fundamentais.
Produtos podem ser mais do que a soma das funções que desempenham.
Seu valor real pode ser satisfazer as necessidades emocionais das pessoas, e uma

16
FUNDAMENTOS | Unidade I

das mais importantes de todas as necessidades é demonstrar a autoimagem


do indivíduo, seu lugar no mundo.
(NORMAN, 2008, p. 110)

Ainda sobre os objetos de uso, Norman (2008) diz que esses objetos fornecem um
contexto familiar simbólico, que assim, reafirmam a identidade do proprietário e
ainda atraem e prendem a atenção das pessoas. Muitos dos objetos de uso se reportam
à arte e permitem diferentes possibilidades de interpretação. Ao percorrer a história
da arte, os objetos veem sendo combinados, construídos e desconstruídos de diversos
modos e formas por diferentes artistas e estilos. O homem se torna dependente de tudo
aquilo que cria, de tal forma que esses objetos passam a lhe dar uma certa estabilidade,
segundo Arendt (1981).
Dentre essas produções, existem os objetos de arte e os objetos de uso
comum. Ela os diferencia quanto à origem e finalidade de ambos. A começar,
os objetos de arte, ao contrário dos funcionais, não possuem uma utilidade
e, por serem únicos, não são bens de troca.
(ARENDT, 1981, p. 181, apud CORRÊA; SILVA, 2013, p. 19)

Os objetos que não possuem uma finalidade prática, como acontece com os objetos
usuais, estão separados das necessidades cotidianas, não servindo como suportes,
aparadores, abrigo, recipientes ou assentos, por exemplo.

Figura 6. Conjunto de xícara, pires e colher cobertos de pele, criado por Meret Oppenheim, em 1936 e localizado no MOMA,
em Nova York.

Fonte: https://designculture.com.br/isto-e-arte-ou-design.

Para um melhor entendimento sobre o objeto artístico, é preciso a compreensão


de que tudo, de acordo com os objetivos e propostas, pode ser considerado arte.
O objeto artístico sempre será julgado pelo seu viés social, histórico e cultural, tendo
17
Unidade I | FUNDAMENTOS

uma expressão própria que faz sentido para quem produz, quase sempre, um artista.
Dessa forma, o objeto artístico se refere a significações, tanto para quem o produziu,
como para aquele que a recebe.

O objeto artístico é aquele que é possível ver, sentir e tocar a arte, sendo concebido em
meio a assimilações de sentimentos, emoções e idealizações. Ele ainda pode agir com
provocação ao interlocutor, a fim de fazê-lo refletir sobre o que vê, levando a busca
de significados, às vezes únicos e diferentes para o que vê, ouve ou sente. Mesmo que
tenha sido criado com um significado específico pelo artista, os objetos de arte podem
levar a novas interpretações e até mesmo a nenhuma.

Enquanto os objetos utilitários podem apresentar em grande parte uma relação


direta com o usuário, sendo ele produzido de modo artesanal ou industrial, os objetos
artísticos sempre apresentam aspectos únicos de identificação e percepção pelo
interlocutor, não importando o sentido utilizado para a assimilação da mensagem.

18
CAPÍTULO 2
Semiótica aplicada ao objeto

A ciência dos signos


Antes de iniciarmos, é importante o entendimento do significado de semiótica, que é
comumente definida como a “ciência dos signos” ou, sendo mais abrangente, a “ciência da
significação”. Analisando por uma ótica do design, também é possível definir semiótica
como uma ciência da transformação, com uso de signos que podem contribuir para a
modificação de conhecimento, valores e crenças culturais.
[...] atenção à ideia de transformação, quando penso sobre a relação entre a
semiótica e o design me vem em mente a décima primeira das Teses sobre
Feuerbach (1845), de Karl Marx, onde se diz que os filósofos se incubem
de compreender como é concebido o mundo, mas isto não é o suficiente,
diz Marx: deveriam ajudar a modificá-lo. Da mesma forma os semióticos.
Não basta dizer como é concebido o mundo dos signos. Este mundo, social
e cultural, os semióticos podem contribuir a transformá-lo: a projetá-lo.
(MORAES; DIAS; SALES, 2016, p. 14)

Sendo assim, podemos definir a semiótica como uma ciência que investiga o sistema
de signos e as formas de representação, que são utilizadas para transmitir sentimentos,
pensamentos, ideias e ideologias. Lucia Santaella (1983) defende que a fenomenologia
“observa os fenômenos, e através da análise, postula as formas ou propriedades universais
desses fenômenos. Devem nascer daí as categorias universais de toda e qualquer
experiência e pensamento” (SANTAELLA, 1983, p. 29) e inclui a semiótica como
fazendo parte da categoria de experiências e pensamento.

A autora ainda define que o nome “semiótica vem da raiz grega semeion, que quer
dizer signo. Semiótica é a ciência dos signos” (SANTAELLA, 1983, p. 7). Assim, sendo
considerada a teoria geral dos signos, a semiótica compreende a área de conhecimento
que objetiva o estudo da linguagem.

Um dos fundadores dos estudos da semiótica, Charles Peirce (1836-1914), define


que a semiótica se baseia em categorias universais de percepção e na assunção de
que todo pensamento é um signo. Dessa forma, a semiótica estuda os processos
de significação e pode revelar a potência significativa dos signos e sua capacidade
de gerar efeitos na mente.

No processo de significação, uma mensagem deve ser composta a partir da seleção


de um conjunto de signos por um emissor. Os signos têm a função de representar os
19
Unidade I | FUNDAMENTOS

objetos, e sem a utilização desses elementos, o processo de comunicação fica inviável,


já que forçaria a manipulação dos próprios objetos.

Por essa perspectiva, Santaella (2007) ainda acrescenta que a Semiótica não estuda
apenas as leis do pensamento e da transmissão de significado passado de uma mente
para uma outra, mas também as reais condições desses signos, que possuem a função
mediadora entre o objeto e o interpretante. Os signos, assim, funcionam como forma
de aproximar e relacionar o objeto e o interpretante, sendo o segundo o efeito que
o signo produz em uma mente, sendo referida a um objeto, imediato ou dinâmico.
É formado, assim, um tripé de base semiótica que relaciona o signo, o objeto e o
interpretante, que passa a ter o processo de comunicação, como tal, depende desse
movimento da potencialidade do signo até a sua interpretação efetiva em um contexto
real de transmissão de informação.
Semiótica é a ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens
possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição
de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação
e de sentido.
(SANTAELLA, 1983, p. 13)

Concluindo a definição da ciência dos signos, podemos descrever que a semiótica estuda
tudo o que é representado em uma mente, que, como conceituação de Peirce, não está
associado à mente humana, mesmo que os principais exemplos estejam relacionados
à aplicação da semiótica ao pensamento humano.

Tricotomias dos signos


O filósofo Charles Peirce (1839-1914) descreve que os signos podem ser classificados
em dez tricotomias que são desenvolvidas sob a ótica de suas pesquisas, porém, destaco
que três delas são as mais estudas e aplicadas em um aspecto mais amplo do design,
onde seu entendimento são de grande importância para a compreensão dos métodos
de percepção da semiótica.
A primeira, que relaciona o signo a ele mesmo (suas propriedades internas,
seu poder para significar); a segunda, que se refere ao signo em relação ao
seu objeto (aquilo que ele indica, se refere ou representa); e a terceira, que
diz respeito à relação do signo com o seu interpretante.
(PEREZ, 2004, p. 16).

20
FUNDAMENTOS | Unidade I

Figura 7. Tricotomias de Peirce.

Fonte: http://www.intercom.org.br/papers/regionais/sul2009/resumos/R16-0177-1.pdf.

A primeira tricotomia é a que considera o signo como ele mesmo, ou seja, sua aparência
ou seu modo de ser, podendo ser classificado em três espécies de signos: qualisigno,
sinsigno e legisigno. Nesta tricotomia, o qualisgno está relacionado a uma qualidade
e trata o primeiro nível analítico do signo, analisando suas propriedades internas e
seus elementos estruturais, como: materiais, texturas, cores e acabamentos. Sendo
necessário sempre que se dê espaço ao signo para que ele possa ser enxergado e se
tornar disponível ao que está diante dos sentidos.
Ver o que está diante dos olhos e abster-se de interpretá-las, aparentemente
um quesito simples, é em verdade um grande desafio: o de afastar de nosso
espírito, por alguns momentos que sejam, aquela espécie de intoxicação
mediativa que se interpõe entre nós e a pura presentidade do fenômeno.
(IBRI, 2001, p. 68)

Já o sinsigno analisa o signo por sua forma e dimensão, que o constitui em eventos
singulares que aparecem em uma regularidade. Enquanto o legissigno se refere ao
caráter de lei ou de convenção do signo. Esse último acontece quando, por exemplo,
as palavras obedecem a gramática, onde os sinais de trânsito estarão de acordo com o
Código Nacional de Trânsito.
21
Unidade I | FUNDAMENTOS

Em uma tentativa de simplificar a explicação das três espécies de signos, o qualisigno


está associado à qualidade, originalidade e estado, quase não podendo atuar como signo
até que esteja corporificado. O sinsigno é um evento real como signo, sendo algo que
funciona como signo de alguma coisa. Enquanto o legisigno é um signo convencional,
sendo aquela representação que foi convencionada pelos homens, como as palavras.
Exemplificando com uma relação ao objeto, o qualisigno pode ser um ícone, o sinsigno
um índice e o legisigno um símbolo.

Analisar o signo em relação ao objeto está ligado diretamente à segunda tricotomia,


que produz um ícone, um índice ou um símbolo. Pierce (1983) define que o ícone
se manifesta como um fenômeno de primeiridade, pois sua qualidade significante é
oriunda de sua qualidade. Por essa ótica, Santaella (2007) exemplifica o ícone quando
associa a pele aveludada de uma jovem mulher à leveza e delicadeza de um pêssego,
criando a metáfora “pele de pêssego”.

Enquanto o ícone sugere uma associação a um objeto, o índice sugere o objeto de


modo mais concreto, sendo um fenômeno de secundidade. Pegando um outro exemplo
apresentado por Santaella (2007), “uma foto cujo objeto imediato está no enquadramento
e ângulo específicos que aquela foto fez do objeto fotografado, tal objeto é indicado
pela foto, pois há uma relação causal entre representação e referente”, sendo assim, o
que aparece na foto é parte de algo maior, que não aparece por inteiro na fotografia,
por não ter sido possível sua captura por completo.

O terceiro dos elementos, o símbolo, participa da terceiridade e é caracterizado pela


relação entre signo e objeto, tendo o poder de representar ideias abstratas, arbitrárias
ou convencionais. Compagno (2009) exemplifica o hino nacional como símbolo que
representa o país, assim como a maçã mordida é o símbolo que representa a empresa
de tecnologia “Apple”.

A última das três tricotomias aborda a relação do signo com o seu interpretante.
Essa relação pode gerar três possibilidades, sendo o rema, o dicente (ou dicissigno)
e o argumento. Peirce define que “rema (signo singular) é um signo que, para seu
interpretante, é um signo de possibilidade qualitativa, ou seja, é entendido como
representando esta e aquela espécie de objeto possível” (PEIRCE, 2000, p. 53), como
de forma isolada a palavra “azul”. O dicente é um signo de fato, existindo de forma
real, que pode envolver as remas com descrição do fato, como, por exemplo, “este azul
está desbotado”. Enquanto o argumento está em uma relação mais simbólica e um
tanto abstrata. Este depende de um grau mais elevado de repertório do sujeito, que
irá interpretar a mensagem, como “o azul dos olhos são mais profundos que o mar”.

22
FUNDAMENTOS | Unidade I

Relacionando ao objeto
Vimos que o objeto é o segundo correlato do signo de acordo com a perspectiva
semiótica peirciana, sendo aquilo a que o signo se refere de forma que seja algo material
e perceptível do mundo ou algo inteiramente mental ou imaginado, assim sendo, “os
objetos não devem ser confundidos com ‘coisas’” (SANTAELLA, 2000, p. 39).
Os signos resguardam sempre familiaridade com seus objetos, com a finalidade
de que o signo “possa oferecer alguma informação adicional” (SANTAELLA,
2000, p. 56). Um signo, segundo Peirce, pode ter qualquer número de objetos.
Como correlato correspondente à secundidade, o objeto “sempre será um
opositor que oferecerá resistência à espontaneidade do Representâmen”
(SILVEIRA, 2007, p. 44). Sempre que o representâmen for uma mera
qualidade e/ou potencialidade, o objeto também o será (SILVEIRA, 2007).
(SANTAELLA, 2000, p. 56; SILVEIRA, 2007, p. 44, apud MING, 2017, p. 90).

Nesta ótica, o representâmen e o interpretante não podem suprir todos os aspectos


do objeto. Isso porque, ao mesmo tempo em que o interpretante é algo gerado pelo
próprio signo, esse algo recebe do signo somente o aspecto que ele mesmo carrega
na sua troca com o objeto e não os demais aspectos do objeto que o signo não pode
suprir. Assim, tanto o representâmen quanto o objeto podem criar e determinar,
respeitando sua posição e função lógica e consequentemente o interpretante. Assim,
os signos denotam os objetos. Uma dedução direta seguindo as significações expostas
até aqui, é que os objetos podem ser algo a ser criado pelo signo, mas nem sempre ser
algo distinto do signo.

Existem, então, dois tipos de objetos, segundo a percepção de Peirce, que traz primeiro
o objeto imediato, sendo correlato ao signo, fazendo parte dele ou sendo ele próprio.
O segundo seria o objeto dinâmico como o objeto real, apesar do próprio Peirce
afirmar que podem existir objetos dinâmicos fictícios. Seus estudos ainda apontam
uma metafísica da realidade.
O objeto imediato, sempre um signo, faz essa mediação do objeto dinâmico,
que é o que provoca o signo. O objeto imediato é o objeto tal como o signo
o torna conhecível.
(SANTAELLA, 2000, p. 41)

Seguindo os mesmos estudos de Peirce, o signo quanto ao objeto pode ser subdividido
em três níveis: vago, representando um objeto indefinido; singular, representando um
individual definido; e geral, representando o objeto como distributivo. O autor ainda
afirma que os signos indefinidos, cujo objeto imediato é apenas uma possibilidade, signos
23
Unidade I | FUNDAMENTOS

singulares, em que o objeto imediato denota com precisão o dinâmico, e distributivos,


intercambiáveis com outros existentes de um dado grupo.

Retornando ao objeto imediato, ele está representado no signo de três formas, que
são correlatas às três categorias, sendo uma forma sensível, uma forma física ou uma
forma intelectiva. Enquanto o objeto dinâmico é classificado com referência à sua
natureza ou ao seu modo de ser, de forma tripartite, podendo ser um abstrativo, um
concretivo ou um coletivo.

Ainda de acordo com Peirce, o contato com o objeto dinâmico se dá por meio de uma
experiência denominada colateral, que é a experiência da percepção anteriormente
mencionada. Somente no caso da ocorrência se tem um objeto delimitado, singular,
existente, uma realidade forçando a nossa percepção, e nesse caso, o objeto imediato
continua mediando o contato com o objeto dinâmico concretivo, já anteriormente
referido como percepto, o que faz do objeto, sempre um signo (PEIRCE apud
SANTAELLA, 2000, p. 43).

É possível, então, fazer uma analogia do objeto dinâmico com o percepto, e do objeto
imediato com o percipuum, sendo este segundo o que surge após o objeto atingir
nossos sentidos e que se força sobre nós de imediato, capturando os esquemas gerais
dos processos interpretativos (SANTAELLA, 2000, p. 52). Assim, a percepção começa
com o contato com o percepto, que gera um percipuum, que gera um julgamento
perceptivo, correspondendo os três conceitos a cada uma das três categorias ceno-
pitagóricas (primeiridade, secundidade e terceiridade).

Dessa forma, o objeto imediato aparece à mente de quem o percebe e interpreta


como uma qualidade de sentimento (a primeiridade), como reação a impulso externo
(a secundidade) ou como juízo de percepção, interpretação ou significação conferida
pelo julgamento perceptivo (a terceiridade) (SANTAELLA, 2000, p. 53).

24
CAPÍTULO 3
Objeto e função

Relações dos objetos


Por um aspecto essencial das relações dos usuários com os objetos, as funções destes
são perceptíveis no processo de usabilidade que possibilitam que as necessidades dos
usuários sejam satisfeitas. Cada objeto tem diferentes funções, e isso já foi evidenciado
no capítulo 1 desta unidade, ao se comparar os objetos naturais com os objetos de uso.

Mesmo que o ser humano não atue de forma efetiva, não obtendo nenhuma relação
com uma pedra, por exemplo, por um processo de percepção esta pedra atua de certa
forma sobre o observador. Dessa forma, essa pedra pode apresentar uma função
estética e simbólica. Löbach (2001) exemplifica, por um aspecto prático, um objeto
de uso comum e desenvolvido por um processo industrial, que apontam o porquê de
alguns objetos possuírem mais de uma função.
Um barbeador elétrico, por exemplo, possui as seguintes funções práticas:
por meio do motor, colocar em movimento as lâminas; por meio da
adequada configuração das lâminas, eliminar os pelos da barba; armazenar
em uma câmara os pelos cortados. Além disto, o barbeador tem também
dimensões estéticas como forma, cor, texturas de superfície etc., deste
exemplo pode-se concluir que os produtos possuem diversas funções, que
podem ser hierarquizadas pela importância. A função principal está sempre
acompanhada de outras funções secundárias, que com frequência podem
permanecer ignoradas.
(LOBACH, 2001, p. 54)

Em uma tentativa de contar a história de um objeto, ela começa quase sempre de uma
mesma maneira. O ser humano transforma o que encontra no ambiente natural em objetos
modificados, de uso ou artísticos. A partir daí, surgem as respostas para as necessidades
que acabam a determinar uma forma de vida, isso porque os objetos transformam o
cotidiano, não só por suprirem necessidades, mas por criarem novas perspectivas.

É possível, então, afirmarmos que todo e qualquer objeto pensado e criado pelo homem,
pode ser considerado como um objeto técnico. Ao utilizarmos todos os dias objetos que
podem facilitar nossas vidas, nunca paramos para analisar como eles foram pensados,
criados e desenvolvidos de forma completa. Isso porque os objetos são criados em
função de necessidades do homem, acrescentados com a função de existir a tecnologia
para se construir estes objetos.

25
Unidade I | FUNDAMENTOS

Por essas relações do homem com os objetos, são definidas três funções: prática,
estética e simbólica. De modo resumido, entende-se função prática todo o objeto
que foi pensado para atender uma utilidade prática e que deverá ser funcional. Já
a função estética está associada ao objeto que foi idealizado e concebido por sua
beleza, seu resultado visual e pelo “prazer” que pode proporcionar. Enquanto a
função simbólica é quando o objeto é visto pelo que ele pode simbolizar, associado
a sentimentos e valores específicos de um grupo ou um usuário único.

Função prática
Uma das principais necessidades que os objetos buscam atender são as fisiológicas, que
são a função básica do homem. Passar uma sensação de facilidade do uso é o que define
a função prática como função mais comum entre os objetos. Outros aspectos estão
envolvidos com as funções práticas, como a obtenção de conforto, segurança e estabilidade.
“São funções práticas todos os aspectos fisiológicos de uso” (LÖBACH, 2001, p. 58).
A palavra prática está associada à praticidade, que é a busca diária dos consumidores,
não só dos dias de hoje, mas que desde a era moderna se tornou a principal busca em
produtos. Por isso, para suprir essa necessidade oriunda da percepção do consumidor,
o produto precisa ser criado levando em conta o pensamento do seu uso e da sua
ergonomia, assim como o material de fabricação utilizado.
Para exemplificar a função prática, podemos analisar o caso da “Cadeira 1001” da
empresa de móveis “Cimo”. Originalmente, essa cadeira foi criada com o propósito
de aproveitar a madeira que restavam da fabricação de caixotes de frutas para feiras e
supermercados. Mesmo sendo criada a mais de sessenta anos, a cadeira já carregava
preocupações industriais e ecológicas que são bem comuns no século atual.
Vale o registro que a empresa representa uma referência histórica e cultural, pois teve
um papel fundamental na transição da produção artesanal para a mecanizada em série
no país, uma produção herdada do pensamento baseado na cultura alemã, trazido pelos
fundadores que imigraram para o Brasil.
Figura 8. Cadeira Cimo 1001.

Fonte: https://www.westwing.com.br/moveis/cadeiras/cadeira-1001-curve-cimo/1335534/.

26
FUNDAMENTOS | Unidade I

A “cadeira 1001” possui um design ergonômico e confortável, que auxiliaram para


a possibilidade de produzir em larga escala, pois após a definição do produto, foram
procurados maquinários que viabilizassem sua produção em âmbito comercial.
A cadeira foi vendida em lojas populares e para repartições públicas em todas as partes
do país, chegando a ser, de certa forma, um símbolo do mobiliário moderno.

Observando por um aspecto funcional do design, a cadeira nasceu para atender a uma
grande variedade de públicos, por se adaptar a diferentes ambientes e usos. Possui uma
forma derivada das tecnologias de fabricação empregadas e não tendo preocupação
com a estética.

Entendendo todas essas características, a “cadeira 1001” possui principalmente


a função prática. Essa função diz respeito à capacidade do produto em atender
a uma, ou mais, necessidades de uso.

Função estética
Entramos agora em um nível dos processos sensoriais, onde encontra-se a relação
entre produtos e usuários com a função estética. “A função estética dos produtos é o
aspecto psicológico da percepção sensorial durante o uso” (LÖBACH, 2001, p. 60).
Dessa forma, a função estética está relacionada à percepção do usuário com a beleza.

O objeto que tem como função principal a estética, é por conter essa função ligada à sensação
de prazer e de “bem-estar”, ao contemplar um determinado objeto. Alguns desses objetos
que primam pela função estética, podem ser considerados como “objetos (não) funcionais”.

Na imensa maioria das vezes, é a função que determina a criação e a forma de um


objeto, sendo o preceito comum desde o início do século XX. Uma das referências para
esse pensamento, foi a Bauhaus (1919-1933), uma escola alemã de grande importância
para o desenvolvimento do design. A escola tinha como uma de suas finalidades a
recomposição do vínculo entre a arte e a indústria, por intermédio do racionalismo,
que buscava a constituição da arte como um componente cultural da sociedade, que
se estabilizava cada vez mais como industrial.

A Bauhaus entendia que a função estética poderia andar junto com a função prática.
A escola afirmava que a qualidade estética de um objeto deveria ser a forma de sua
função, na busca de sua utilidade prática. Isso porque existia uma preocupação com
o refinamento estético do ambiente cotidiano, a fim de torná-lo propício à liberdade
individual, como uma forma de integrar o indivíduo ao espaço funcional.

27
Unidade I | FUNDAMENTOS

No início de século XX, duas vertentes de pensamento se desenvolvem e influenciam


a arte e o design. A antítese presente entre o Surrealismo e o Construtivismo reflete
a mesma visão cultural com soluções variadas para problemas similares, como analisa
Argan (1988).
Primeiramente, os construtivistas utilizam as técnicas “sociais” baseadas na
tecnologia industrial, e os surrealistas se servem de técnicas não projetadas
que permitem o surgimento de imagens do inconsciente. Apesar de as duas
terem o propósito de reestabelecer uma relação entre as atividades artísticas
e as atividades sociais, para os construtivistas, a arte é algo que se faz “para”
a sociedade, e de acordo com os surrealistas é algo que se faz “na” sociedade
(ARGAN, 1988, p. 65)).

O autor ainda nos descreve que os objetos surrealistas valem por serem meios de iludir
e, de certa forma, desmistificar tudo aquilo que tem sentido relacionado a função
racional, pelo fato de destacarem o que é irracional e inconsciente, sendo objetos com
função em um âmbito mais simbólico, em contraponto aos objetos racionalmente
projetados e utilizados pelos construtivistas, que atuam como símbolos “da eficiência
operativa da sociedade industrial” (ARGAN, 1988, p. 66).
Por influência do Construtivismo, nasce, originalmente com caráter experimental, um
movimento holandês liderado por Piet Mondrian (1872-1944), Theo Van Doesburg
(1883-1931) e Gerrit Rietveld (1888-1964), intitulado de “De Stijl”, também conhecido
como Neoplasticismo. O estilo trata as formas geométricas de modo inato e as utiliza
nas representações como um ato construtivista estético. Bons exemplos disso são
algumas obras criadas pelo arquiteto Gerrit Rietveld.
Um bom exemplo que tem como principal função a estética é criado a partir de formas
geométricas simples, com planos, linhas e cores primárias. Ressaltando as obras de
Piet Modrian, Gerrit Rietveld cria a cadeira “Red and Blue”.

Figura 9. Composição em grande plano vermelho, amarelo, preto, cinza e azul, criado por Piet Mondrian, em 1921.

Fonte: https://designandstuffsite.wordpress.com/2017/08/21/construtivismo-e-de-stijl/.

28
FUNDAMENTOS | Unidade I

O princípio básico da “The Red-Blue Chair” não é orientado para o conforto do


usuário, descartando a função prática como prioridade. É possível observar a exagerada
profundidade do assento, sendo maior que a medida interna da coxa humana,
demonstrando despreocupação com a ergonomia, assim como a excessiva inclinação
do assento, que não proporciona conforto ao sentar.

Figura 10: “The Red-Blue Chair”, criado por Gerrit Rietveld.

Fonte: https://designandstuffsite.wordpress.com/2017/08/21/construtivismo-e-de-stijl/.

Mesmo que a cadeira tenha sido idealizada para uma produção em série, o que nunca
aconteceu por razões claras, ela possui formas semelhantes a um objeto de uso. Apesar
dessas características formas semelhantes, a cadeira criada por Gerrit Rietveld se
apresenta e funciona muito mais como um objeto artístico do que utilitário. Em razão
dessas características, a cadeira tem principalmente função estética.

A função estética diz respeito à capacidade de um objeto sensibilizar pelo menos


um dos sentidos dos seres humanos. Assim, “a função estética é a relação entre
um produto e um usuário no nível dos processos sensoriais” (LÖBACH, 2001, p. 59).

Função simbólica
Como visto de forma preliminar no tópico anterior, o Surrealismo foi um movimento
artístico que propunha uma nova proposta estética, a fim de romper com a primazia da
compreensão racional, não diferenciando sonho e realidade ou entre lucidez e delírio.
Assim, os objetos surrealistas rompem com a busca pelo sentido nas representações,
sendo aquilo que está para além do real, sendo mais que o real por transcender a
compreensão racional comum do homem e relaciona-se com o inconsciente, com o
imaginário e, até mesmo, com o absurdo.
29
Unidade I | FUNDAMENTOS

Essa introdução sobre o movimento surrealista se faz necessária ao falar de função


simbólica, porque um objeto tem essa função como principal quando a espiritualidade
do homem é estimulada pela percepção deste objeto, estabelecendo ligações com suas
experiências e sensações anteriormente adquiridas. “A partir daí podemos definir:
a função simbólica dos produtos é determinada por todos os aspectos espirituais,
psíquicos e sociais do uso” (LÖBACH, 2001, p. 64).
Löbach exemplifica a função da seguinte forma:
Um símbolo é um sinal, um signo que existe para algo. A realidade (p. ex.,
o Estado) que é representada por um símbolo (a bandeira) está presente no
espírito humano pela presença deste símbolo. Uma pessoa pode lembrar-
se do Estado, apenas pela visão da bandeira, que é seu símbolo. A função
simbólica dos produtos possibilita ao homem, por meio de sua capacidade
espiritual, fazer associações com as experiências passadas.
(LOBACH, 2001, p. 64)

O autor ainda afirma que a função simbólica é oriunda de aspectos estéticos de um objeto e
pode ser manifestada por intermédio de elementos estéticos como cores, formas, texturas
etc. Assim, a função simbólica pode ser considerada a mais complexa das três funções
de um objeto, pois, enquanto por um lado se liga com a espiritualidade, experiências e
sensações anteriores do homem, por outro é determinada por todos os aspectos espirituais
e psíquicos do uso do objeto. É a função que mais envolve fatores sociais, culturais,
políticos e econômicos, além de ser associada a valores pessoais, sentimentais e emocionais.
Para exemplificar essa função, podemos analisar uma das criações dos “Irmãos Campana”.
Em 1991, Fernando Campana (1961) e Humberto Campana (1953) criaram a “Cadeira
Favela”, que, apesar do nome, é considerada um objeto de luxo pelo alto preço de
venda, que ultrapassa a quantia de seis mil reais atualmente.

Figura 11. Cadeira “Favela”, dos irmãos Campana, de 1991.

Fonte: https://www.curtamais.com.br/goiania/10-cadeiras-do-estudio-campana-que-nao-foram-feitas-para-sentar.

30
FUNDAMENTOS | Unidade I

A criação foi inspirada em favelas paulistanas, principalmente no modo como os espaços


são fechados pelos pedaços de madeira que a compõe, pois o objeto é composto por
uma estrutura metálica e fechada por pequenos sarrafos de madeira que configuram
a cadeira.

A “Cadeira Favela”, mesmo sendo concebida pelos irmãos brasileiros, tem sua fabricação
feita na Itália. Ela atende à função de sentar, mesmo que com certo desconforto por
conta da textura dos materiais e encaixes. Apesar de possuir uma aparência neutra
com formas simples, a cadeira não é um produto acessível à maioria da população.
Em razão dessas características, essa cadeira tem principalmente função simbólica.

Outras criações da dupla de designers seguem raciocínios semelhantes, como: a Poltrona


Banquete, composta por uma estrutura metálica e envolvida com diversos “bichinhos”
de pelúcia; a Poltrona Bob, um emaranhado de metal retorcido; e a Poltrona Anemona,
que também tem uma estrutura metálica envolvida com tiras de PET.

Figura 12. Poltrona Bob, dos irmãos Campana.

Fonte: https://www.curtamais.com.br/goiania/10-cadeiras-do-estudio-campana-que-nao-foram-feitas-para-sentar.

A função simbólica diz respeito ao significado cultural expresso pelo produto e que
pode ser identificado pelo usuário. “A função simbólica de produtos industriais só
será efetiva se for baseada na aparência percebida sensorialmente e na capacidade
mental da associação de ideias” (LÖBACH, 2001, p. 65).

Múltiplas funções
Nos tópicos anteriores foi possível compreender as três funções que um objeto pode
exercer, mas segundo Mukarovsky (1981, p. 151), em muitos casos, também pode
acontecer de um objeto possuir outra função além da qual ele foi produzido, ou em
certos casos, o objeto pode até perder sua função convencional e ganhar outra.
31
Unidade I | FUNDAMENTOS

Dessa forma, é possível inferir que, além de depender da coletividade social para
identificar a função ou as funções de um objeto, ele depende do homem, no uso do
objeto para fins pessoais, para determinar o seu uso e, em alguns casos, podendo ser
uma determinação de um único indivíduo. Podemos visualizar essas “múltiplas” funções
em muitos objetos, como os exemplos a seguir.

Um desses exemplos é a “Capa para Prótese Confete” criada pelo “Furf Design Studio”,
que um propósito tanto funcional quanto emocional. O objeto oferece segurança e
conforto para o usuário, devolvendo o volume da perna, ao mesmo tempo que incentiva
a sua reabilitação e autoestima. Diferentemente do exemplo apresentado na função
simbólica, esse pode ser adquirido a um custo bastante acessível.

Figura 13. Capa para prótese “Confete”, criada pelo Furf Design Studio.

Fonte: https://www.idethnos.com/produtos/confetti/.

O nome do produto é baseado nos furos que possuem um formato de confete que
podem ser utilizados para customização, o que ampliam as possibilidades de o usuário
se expressar, além de possuir uma grande gama de opções de cores. Um objetivo
do desenho é encorajar o usuário a trocar o visual sempre que achar necessário.
Essas características, fazem desse produto um objeto com as três funções do design
quase que de modo simultâneo.

Outro objeto que pode exemplificar a aplicação das três funções ao mesmo tempo é
o “Purificador de Água” da marca “Consul”. O produto possui um design compacto,
com visual bem atraente e é indicado para descomplicar a vida do usuário. Apesar de
possuir elementos mecânicos e elétricos em sua composição, o purificador é um
produto leve e que pode ser fixado na parede ou apenas disposto em bancadas.
Assim, se integra facilmente ao espaço.
32
FUNDAMENTOS | Unidade I

Figura 14. Purificador de água da marca Consul.

Fonte: https://www.leroymerlin.com.br/purificador-de-agua-consul-refrigerado-com-protecao-antibacterias-bivolt_1552588515.

Por conta destas características, o purificador se torna um objeto que possui as três
funções. A função prática, com sua facilidade de uso; a estética, pois integra-se facilmente
ao espaço; e a simbólica, por evidenciar a sensação de prazer e bem-estar.

Já no início do século XX, os objetos passaram a apresentar cada vez mais uma
melhor aplicação do design. Para Löbach, um bom design não atende apenas uma,
mas as três funções de forma simultânea. Sendo prática no seu uso, causando
uma experiência estética e simbolizando algo que remeta ao usuário uma conexão
com o objeto e suas memórias.

33
OBJETO E SOCIEDADE UNIDADE II

CAPÍTULO 1
O objeto cultural

Objetos culturais
É possível dizer que a definição de objeto cultural é uma concepção ampla e sua
conceituação poderia ser descrita como um grande abraço em todas as manifestações
culturais de uma sociedade. De fato, o termo está associado a tudo que funciona como
uma representação daquilo que uma sociedade acredita ser um item cultural. Por isso,
objeto cultural sempre, de uma maneira ou outra, evidenciará a essência de um grupo,
uma tribo ou uma sociedade, desde pinturas, música, literatura ou qualquer outra
forma que se julgue como arte, ou expressão artística.
Seguindo esses princípios preliminares, os objetos culturais apresentam um significado
que vem de um ângulo mais amplo para um ângulo mais individual, como algo que
começa por um senso comum da compreensão do que é cultura para uma percepção
individual do que se entende como representação dessa cultura.
Em uma tentativa de exemplificar essas afirmativas, o “samba” é entendido por grande
parte das pessoas como um elemento marcante e integrante da cultura nacional,
assim como o futebol. Seguindo esses exemplos, para alguns integrantes desta mesma
sociedade, respectivamente, o “Sambódromo” e o “Maracanã”, ambos localizados no
estado do Rio de Janeiro, atuam como objetos culturais que os representam, sendo
vistos com significado estético e utilitário.
Figura 15. Estádio de futebol Mário Filho, conhecido como Maracanã, localizado no Rio de Janeiro.

Fonte: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/jogada/estadio-do-maracana-templo-do-futebol-completa-70-anos-1.2955928.

34
Objeto e Sociedade | Unidade II

Muitas vezes, representações, como as descritas acima, são integrantes naturais do


cotidiano de todos nós, que podem cair em desuso ou ganhar valorização de acordo
com o tempo, o contexto e acontecimentos históricos, quando o objeto pode ter sua
classificação alterada de natural para cultural.

Os objetos culturais possuem como fundamento possuir um significado, seja ele


espiritual ou conceitual, mas que esse significado seja base ou substrato material
do objeto. Sendo assim, o objeto cultural se caracteriza por objetos produzidos
pelo homem com enfoque a um significado, podendo ser utilitário, estético ou
até mesmo possuir um outro propósito, funcionando até mesmo como objetos
artísticos como ciência, filosofia e linguagem.

Acrescenta-se, ainda, com uma definição sintética de objeto cultural, as produções


intelectuais que possuem algum grau de ressonância social. Essas produções que
são de natureza simbólica, ocupando um determinado tempo e espaço, podem ser
recuperadas por usuários a qualquer momento e possibilitam uma múltipla leitura em
aspectos filosóficos e históricos, envolvendo ainda questões políticas e sociológicas,
como antropológicas.

Por um ângulo universal, um objeto cultural se apresenta na literatura, cinema


e música, assim como as instituições se qualificam como objetos culturais, como
escolas de samba, times de futebol, lendas urbanas, folclore popular entre outros.
Alguns antropólogos e demais intelectuais explicam esses conceitos de um modo mais
simples denominando objetos culturais como cultura material. Mais à frente, veremos
mais detalhes sobre os tipos de cultura.

35
CAPÍTULO 2
O kitsch e o anti-kitsch

O kitsch
A definição de cultura pode ser descrita por meio de manifestações, comportamentos,
tradições e conhecimentos de um determinado grupo, tribo ou sociedade. Isso inclui a
língua ou dialeto, as comidas típicas da região, assim como as manifestações religiosas.
Inclui ainda as músicas, artes, indumentárias, objetos de uso, entre outros. Assim, a
qualidade da cultura é a busca para o conhecimento original e genuíno.

Se um dos aspectos da cultura é a arte original e legítima, o kitsch pode ser considerado
uma falsa arte. O kitsch é fácil de entender e usado para mero entretimento, como um
simples prazer vazio. Além de reproduzir padrões já existentes em uma sociedade, ou
seja, sem inovação ou algum aspecto original.

Por um aspecto etimológico, a origem da palavra “kitsch” não é muito clara, o que se
tem de registro é baseado no dicionário etimológico de Friedrich Kluge, que relata
que a palavra surgiu entre pintores alemães por volta dos anos de 1870. Além de ter
associado ao nome do instrumento usado para amontoar detritos nas ruas, o “kitsche”,
também tem significado ligado ao ato de fazer móveis novos a partir de velhos, no
dialeto comum no sul da Alemanha.

Outra definição associada ao aspecto etimológico e que parece fazer bastante sentido,
é a ligação com a palavra “verkitschen”, que significa trapacear, ou vender coisa no
lugar de outra, bem semelhante ao “golpe de malandro” conhecido em nosso país.
A terminação “tsch” é bastante comum em palavras alemãs que sejam referentes a coisas
vulgares ou de baixa qualidade. De qualquer forma, é importante saber que, desde sua
origem, o termo “kitsch” ficou associado a uma conotação negativa.

O Kitsch encontrou seu crescimento ao mesmo tempo que a classe média ascendia
a patamares mais altos. Com início no fim do século XIX, a produção em massa que
buscava atender um número maior de consumidores, causou o surgimento de uma
massa de trabalho extenuada e com ganhos pequenos, consequentemente, ficando cada
vez mais sem tempo para o envolvimento na cultura real. Por isso, o Kitsch aparece
cada vez mais como kult(ura) acessível a todos.

Assim, a cultura e a arte se tornam kitsch como um mero reflexo do status da sociedade.
O conceito de legitimação a ser aplicado ao kitsch é como uma falsa consciência estética.
36
Objeto e Sociedade | Unidade II

Surgem então “objetos” no mercado com forma e estética pseudoculturas, fornecidos


por uma noção de kultura industrial kitsch.

Figura 16. Telefone Lagosta, de Salvador Dali, de 1928.

Fonte: https://designculture.com.br/isto-e-arte-ou-design.

Muitas vezes, essa pseudocultura é imposta como recreação e entretimento, com


efeitos rápidos e previsíveis e com o espírito comercial de uma pseudomodernidade. O
kitsch é, portanto, um produto típico da modernização, gerado pelo desenvolvimento
econômico para o “ter” impedir a evolução para “ser”. Dessa forma, o efeito da
democracia capitalista moderna nas artes leva a uma redução dos padrões, devido
ao aumento de consumidores entediados, que tentam aparecer o que eles não são,
mas o que eles têm.

As produções artísticas passam a ser cada vez mais numerosas evidenciando o que
é considerado bonito, elegante ou comercializável, tornando as aparências mais
importantes que a Realidade. A demanda por status, exibição social e consumismo
pelo espírito de ostentação são ocasionadas pela “corrupção” do gosto artístico.

O kitsch é “repetição”, “imitação”, “falsificação” e “estética da autodecepção”, uma


espécie de farsa onde o ideal de beleza é socialmente distribuído a uma classe média
como outra mercadoria que esteja acessível aos quesitos econômicos. Sendo objetos
com pouca qualidade, muitas vezes a obra kitsch é sentimentalista ou sensacionalista.
Alguns exemplos de objetos kitsch são bibelôs, estatuetas, bichinhos de pelúcia
etc. Em sentido popular e pejorativo, seriam objetos com estética brega ou cafona.
Um dos artísticas conhecidos desse estilo é o norte-americano Jeff Koons (1954)
37
Unidade II | Objeto e Sociedade

Figura 17. Obra “Ballon Dog” Larajna, de Jeff Koons.

Fonte: https://veja.abril.com.br/cultura/jeff-koons-o-capista-de-gaga-vende-obra-por-r-135-mi /.

As principais características da arte kitsch seriam:

» uma mistura de elementos de vários movimentos artísticos distintos, sem a


preocupação com a fidelidade estética dos originais;

» a valorização estética de objetos comuns relacionados ao cotidiano da vida


urbana;

» a presença de elementos melodramáticos, sentimentais e sensacionalistas,


quase sempre em tom exagerado e irônico;

» um posicionamento crítico com certo deboche em relação ao consumo de


massa;

» a utilização de estereótipos e relação direta com tudo que é considerado


popular;

» uma ausência de senso crítico complexo ou aprofundado, dando destaque


para criação de objetos artísticos decorativos;

» uso predominante de cores fortes com certo destaque para efeitos brilhantes,
além do uso de sequências e repetições.

A arte e o kitsch
No tópico anterior, ficou claro que o estilo kitsch é interpretado como sinônimo de
brega, mas é importante frisar que uma coisa é brega quando está relacionada ao mau
gosto, e não necessariamente isso está ligado ao kitsch, como foi bastante pautado no
primeiro tópico deste capítulo. Isso porque, mesmo que muitos associem o kitsch ao
conceito de mau gosto, esse mau gosto nem sempre é evidente aos olhos do consumidor,
especialmente quando o objeto é uma réplica de um original. Um exemplo dessa
afirmação pode ser uma reprodução de um quadro de algum pintor conceituado que

38
Objeto e Sociedade | Unidade II

é vendido na loja do mesmo museu onde a original está sendo exibida, ou até mesmo
em outro lugar.
As características que devemos considerar em um objeto kitsch, são:
» a imitação de uma obra de arte ou de um outro objeto;

» o exagero na linguagem visual ou verbal;

» a ocupação do espaço errado, ou seja, um objeto que originalmente seria


para um uso estando em outro lugar;
» a perda da função original, quando se aplica uma função ao objeto diferente
da qual ele foi desenvolvido.

Quando associamos o conceito kitsch diretamente com a arte, ele ganha uma dimensão
que extrapola o próprio conceito de arte, seguindo outros caminhos e se infiltrando
em diversos segmentos de manifestações artísticas. A indústria cultural foi a grande
responsável pela propagação do kitsch que reproduz em série as obras de arte, a fim de agradar
uma classe média burguesa, mesmo que isso leve à perda da autenticidade dessas obras.
O kitsch, além de marcar presença na arte, ele perpassa pela arquitetura, música,
literatura, decoração, publicidade, moda, artes plásticas e outros. Vale o registro de duas
obras, que hoje têm valores inestimáveis e incluídas entre as obras contemporâneas
de “auras”. A primeira delas é da década de 1910, mais especificamente de 1917,
“A Fonte” do artista dadaísta Marcel Duchamp (1887-1968). A obra é uma réplica
de um mictório feito de porcelana que foi comprado pelo artista de uma firma de
materiais de encanamento, em Nova York. O artista simplesmente colocou no objeto
sua assinatura em forma do pseudônimo “R. Mutt”, e o inscreveu em uma exposição,
onde pela primeira vez o artista apresentou seu conceito “ready-made”, que desafiava
as definições tradicionais da arte.
Figura 18: “A Fonte”, de Marcel Duchamp, de 1917.

Fonte: https://www.flickr.com/photos/foto_line/2680245240.

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Unidade II | Objeto e Sociedade

A segunda obra é de anos mais tarde, na década de 1960, feita pelo artista Andy Wahrol
(1928-1987). Na verdade, assim como no caso de Duchamp, é difícil destacar uma só
obra de Wahrol, sendo assim, a segunda passa a ser “segundas” obras de destaque onde
a conceito kitsch perpassa. Em Marilyn Monroe, de 1964, e na Campbell Soup, de
1962, criadas pelo artista, em ambos os casos ele utilizava a técnica de serigrafia, muito
pouco usada para expressões artísticas, tudo feito com o intuito de admitir a crise da
arte que assolava o século XX. As obras faziam parte do movimento de Pop Art, que
tinha como conceito mostrar a massificação da cultura popular capitalista em busca
da estética das massas, em uma tentativa de encontrar uma definição do que seria a
(cultura pop), aproximando-se do que chamavam de kitsch.

Figura 19. Marilyn Monroe, de Andy Wahrol.

Fonte: https://fahrenheitmagazine.com/arte/marilyn-monroe-desde-la-perspectiva-de-tres-grandes-artistas.

Figura 20. Sopas Campbells, de Andy Wahrol.

Fonte: https://steemit.com/art/@flamingirl/artistic-space-20-andy-warhol-pop-icon.

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Objeto e Sociedade | Unidade II

Com grande apoio dos meios de comunicação de massa, o kitsch consegue atingir a
sociedade de consumo à qual se destinam os produtos que fazem parte da cultura de
massa. O kitsch tenta se encontrar na contracultura, mas passou a ser confundido com
vanguarda, sendo criticado por pensadores “frankfurtianos”, que ficaram marcados
pela influência marxista, como Theodor Adorno (1903-1969), Max Horkheimer
(1895-1973), Herbert Marcuse (1888-1979) e Walter Benjamin (1892-1940).
Esses contestavam a apropriação que certas tendências artísticas faziam da verdadeira
arte estética, única e autêntica, alegando que na sua reprodução, uma obra de arte perde
sua aura, ou seja, sua autenticidade, com exceção do cinema e da fotografia.

Caminhando ao lado da indústria cultural, o kitsch consegue se estabelecer na mídia,


através da música, dramaturgias visuais e da publicidade. Além de ser apresentado como
uma forma de democratização econômica e cultural. Calcada na indústria cultural,
a cultura de massa consegue transformar arquétipos em estereótipos, destacando
padrões e transformando em moda por meio da repetição de modelos até que esses
sejam consumidos massivamente pela sociedade.

Dessa forma, o kitsch se define como “panaceia psicossocial” quando substitui a natureza
autêntica de um objeto, na tentativa de solucionar uma frustração sócio-psicológica
do seu usuário. O problema é que, dessa maneira, ele continua sendo apenas uma
tentativa e nunca uma solução para resolver um problema psicossocial. Apesar disso,
o kitsch também tem seu lado positivo perante a sociedade, quando se torna a solução
ideal para um problema social. Um exemplo disso são os pneus velhos que são usados
para fazer balanços em “playgrounds” de praças ou em escolas públicas. Apropriações
como essa, que fazem parte do kitsch, são ótimas alternativas para baratear custos e
até mesmo evitar maiores complicações, como no caso de o balanço se chocar contra
uma criança. “O kitsch é mais uma direção do que um objetivo” e “há algo de kitsch
no fundo de cada um de nós” (MOLES, 1975, p. 28).

O anti-kitsch
Como uma forma de contraposição da proliferação do que parece inútil na arte, na arquitetura
e no design, surge o funcionalismo. Seu principal objetivo seria o desenvolvimento de
uma engenharia que fosse capaz de dominar a interação homem-ambiente, por meio da
aceitação técnica de um objeto tal como ele é. Um de seus princípios básicos é que a função
é aquilo que com caráter repetitivo e determinado funciona, dessa forma, essa atitude
atua como o oposto do kitsch. “A função é uma relação necessária entre os elementos
de um sistema” onde uma parte determina a outra (MOLES, 1981, p. 56).

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Unidade II | Objeto e Sociedade

O funcionalismo originou-se na antropologia e na sociologia, mas com aplicação em


outras áreas das ciências humanas, como na psicologia, na filosofia e fortemente no
design. Sendo um paradigma científico que busca entender uma sociedade a partir
das suas regras de funcionamento e das diferentes funções nela desempenhadas, o
funcionalismo entende que cada indivíduo em uma sociedade exerce uma função, e
o conjunto de todas as funções permite o funcionamento harmônico da sociedade.

O funcionalismo possui ideais que ganham grande disseminação na Bauhaus (1919-1933),


onde os estudos de proporções aplicadas ao desenvolvimento de produtos passam a ter
ampla aceitação. A intenção primária da Bauhaus era fazer uma escola que combinasse
arquitetura, artesanato e academia de artes. Os conceitos do funcionalismo colocavam
a beleza em um segundo plano, a serviço da praticidade.

Figura 21. Cadeira Presidente, criada por Marcel Breuer, na Bauhaus.

Fonte: https://gizmodo.uol.com.br/8-lindos-produtos-da-bauhaus-a-mais-influente-escola-de-design/.

O que é possível ser entendido como uma atitude anti-kitsch, é uma atitude
funcionalista norteada pelo racionalismo. Em um mundo completamente produzido
pelo ser humano, conforme afirma Moles (2001), o funcionalismo por meio dos
esforços de membros da Bauhaus, tornou-se como uma doutrina fundamental do
design e da arte moderna, como uma luta contra a irracionalidade e uma tentativa
de eliminar tudo que é decorativo e esteticamente sem função.

Ainda segundo Moles (2001), essa tendência funcionalista perde força diante da ética do
que é considerado supérfluo e banal, imposta pelo consumo em constante aceleração.
Surge, então, o designer kitsch que alimenta permanentemente o mercado ávido por
novidades em grande escala, com auxílio da moda, assegurando a uniformização das
necessidades e instaurando uma moral de progressismo moderado.

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CAPÍTULO 3
Cultura e percepção

Cultura
Ao iniciarmos uma definição de cultura, por si só ela já é um termo carregado de muitas
interpretações e ao procurarmos em algum dicionário, como o Houaiss, é possível
encontrar a definição de cultura como um conjunto de padrões de comportamento,
costumes, crenças, conhecimentos etc., em um sentido antropológico, que distinguem
um grupo social de outro. Essa definição do termo já havia sido construída pelo
antropólogo britânico por Edward Tyloy (1832-1917), que no século XIX já trazia a
afirmação de cultura como tudo o que é produzido pela humanidade, desde objetos
físicos, manifestações, crenças e ideais.
Um outro antropólogo estadunidense também focava seus estudos na cultura, Clifford
Geertz (1926-2006) afirma que cultura é concebida como um conceito semiótico, pois
“o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, sendo a
cultura como uma dessas teias e a sua análise” (GEERTZ, 1989, p. 15). Se aprofundarmos
essa definição, encontramos outra afirmação do autor que explica que cultura não é
composta de um único ponto de partida ou um único elemento como definição, mas
uma multiplicidade de coisas.
[...] uma multiplicidade de estruturas conceptuais complexas, muitas delas
sobrepostas ou amarradas umas às outras, que são simultaneamente estranhas,
irregulares e inexplícitas [...] A cultura é, portanto, pública, porque significa
o comportamento humano. E o comportamento humano é visto como ação
simbólica. Assim, a cultura é pública porque o significado o é, uma vez que
a cultura consiste em estruturas de significado socialmente estabelecidas.
(GEERTZ, 1989, p. 19)

Nesse sentido, podemos resumir o pensamento do autor definindo que a cultura funciona
como um “sistema entrelaçado de signos interpretáveis”, dessa forma, a cultura não
pode ser considerada um tipo de poder, ou alguma coisa que possa ser relacionada
com acontecimentos e comportamentos sociais casuais. Assim, a cultura se torna “um
contexto, algo dentro do qual eles podem ser descritos de forma inteligível – isto é,
descritos com densidade” (GEERTZ, 1989, p. 24).

Apesar de os principais pensadores e pesquisadores da cultura serem antropólogos, nem


todo pensamento relacionado à cultura vem de uma definição antropológica. Segundo
o historiador da literatura brasileira e professor emérito da Universidade de São Paulo

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Unidade II | Objeto e Sociedade

Alfredo Bosi (1936-2021), a definição de cultura pode vir a partir da linguística e da


etimologia da palavra. Essa definição nos leva à interpretação de que a cultura seria o
futuro de tal ver, ou seja, o que se vai cultivar, não somente em termos relacionados à
agricultura e ao campo, mas no aspecto de transmitir conhecimentos, crenças, ideias
e valores para as gerações seguintes.

Atribuindo a cultura aos aspectos estudados que envolvem a interpretação do design


e objetos de diferentes perspectivas, podemos acrescentar um outro sentido muito
comum, que é atribuído à cultura, associado a produções artísticas e intelectuais.
Dessa forma se pode falar de cultura popular, cultura de massa, cultura material etc.,
sendo todas expressões de atribuições específicas para determinados grupos sociais.

Cultura popular
Em uma tentativa de simplificar, ao mesmo tempo assumindo o risco de uma extrema
redução, o historiador francês atuante no campo da história cultural Roger Chartier
(1945) apresenta dois grandes modelos de interpretação de cultura popular. Um
tentando deixar de lado toda influência das culturas dominantes e outro levando em
consideração suas diferenças e posicionamentos dentro de uma sociedade.
O primeiro, no intuito de abolir toda forma de etnocentrismo cultural,
concebe a cultura popular como um sistema simbólico coerente e autônomo,
que funciona segundo uma lógica absolutamente alheia e irredutível à da
cultura letrada. O segundo, preocupado em lembrar a existência das relações
de dominação que organizam o mundo social, percebe a cultura popular em
suas dependências e carências em relação à cultura dos dominantes.
(CHARTIER, 1995, p. 181)

O autor, com essa afirmativa, ainda apresenta duas interpretações sobre um mesmo
tema, sendo que os pontos de vista também são distintos. O primeiro deles traz uma
interpretação vista de dentro da cultura em questão, onde entende-se ela mesma por
si só, ou seja, produzida, absorvida e interpretada por ela mesma. Enquanto o segundo
deles é interpretado porque quem está de fora, ou seja, é feita por espectadores, que
não necessariamente absorvem essa cultura, que estão em um mundo social “mais
amplo” e recebendo influências de todos os lados.

A cultura popular tradicional é aprendida de maneira simples, com a convivência do


indivíduo com o meio social em que está inserido. Ela resiste ao tempo e raramente
é modificada. Não é imposta por uma indústria cultural ou por uma cultura de elite,
mas pode se transformar quando seus objetivos são alterados.

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Objeto e Sociedade | Unidade II

Figura 22. Imagem de antigos carnavais no Rio de Janeiro.

Fonte: https://portaldobibliotecario.com/biblioteca/historia-do-carnaval-e-tema-de-exposicao-em-biblioteca/.

Uma perspectiva com abordagem mais romântica, contemplada pelo antropólogo


Canclini (1983), associa culturas populares em um contexto mais mercadológico.
Ainda em referência às interpretações de Chartier, a primeira é vista de um modo mais
sentimental, atento às produções culturais oriundas dos campos menos favorecidos da
sociedade de maneira isolada, “pura” e completamente independente de interferências
da sociedade de elite. Já a segunda entende as produções culturais populares como
produtos, ou seja, retifica essas produções e, de certo modo, se apropria delas.
Nesta segunda, em praticamente todos os casos, essa apropriação é acompanhada de
uma transformação, a fim de adaptar esse “produto” para a aceitação das sociedades
ditas como superiores.

Em seguida, Canclini (1983) afirma essa relação de consumo da cultura popular


como uma transformação em coisa. Ele traz uma interpretação vinda de turistas, ou
simplesmente pessoas não inseridas naquele eixo cultural.
O que vê o turista: enfeite para comprar e decorar seu apartamento, cerimônias
“selvagens”, evidências de que sua sociedade é superior, símbolos de viagens
exóticas a lugares remotos, portanto, do seu poder aquisitivo. A cultura é
tratada de modo semelhante à natureza: um espetáculo. As praias ensolaradas
e as danças indígenas são vistas de maneira igual. O passado se mistura com
o presente, as pessoas significam o mesmo que as pedras: uma cerimônia
do dia dos mortos e uma pirâmide maia são cenários a serem fotografados.
(CANCLINI, 1983, p.11)

Canclini (1983) critica o conceito de cultura oriundo do relativismo cultural, este que está
presente na antropologia cultural. Isso porque a definição de cultura é abrangente e com
dois pontos que não convergem. Os debates sobre cultura avançam positivamente no
sentindo de compreender os costumes, comportamentos e crenças de uma determinada

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Unidade II | Objeto e Sociedade

expressão cultural, porém, elas não conseguem assimilar de maneira completa no que
tange o entendimento de como as diferenças se tornam desiguais entre culturas.

Uma cultura popular é aquela que marca um povo. É toda cultura produzida e proliferada
por um povo, independente de localização territorial e que pode ser entendida e vista
por outros povos. Existem muitas culturas populares diferentes e marcantes, mesmo que
pertencentes a uma mesma sociedade. Assim acontece, por exemplo, com a religiosidade
da Bahia, os costumes e vestimentas do Rio Grande do Sul, a literatura de cordel dos
nordestinos, a gastronomia caseira dos mineiros, e o samba do Rio de Janeiro.

O aprendizado de uma cultura popular é feito por meio da convivência do indivíduo


com o meio onde ela está inserida. Na grande maioria das vezes, está ligada à tradição,
passada de pai para filho e não ensinada em instituições de ensino. Atualmente, muitas
culturas populares ditas como tradicionais resistem ao tempo e raramente são
modificadas, sendo apenas atualizadas, conforme a modernização do mundo.
Um exemplo disso é o que acontece nas escolas de samba em preparação para o
carnaval. Vários membros de uma mesma família se inserem nos barracões das
escolas de samba em comunidades das cidades. Às vezes seguindo os mesmos
caminhos dos pais ou agindo em outras tarefas, mas ainda ligadas à preparação para o
próximo carnaval.

Como característica, a cultura popular tem a participação ativa do povo na produção


e expressão artística na literatura, na arte, na dança, no folclore, na música, nos
ritos religiosos e nas demais manifestações culturais. Ela é ancorada em tradições
e construída no seio de uma comunidade que é simultaneamente sua autora e seu
público. É uma cultura enraizada na ideia de feito por nós e para nós, com uma
identificação direta e grande proximidade entre os que a concebem e os que a
absorvem.

Cultura erudita
Enquanto a cultura popular é espontânea, simples e de fácil acesso, além de ser criada
a partir das manifestações culturais típicas do povo de determinada região ou grupo,
a cultura erudita é formada a partir do estudo da técnica, de teorias, de investigações
acadêmicas, o que gera produtos culturais que visam a elites e grupos intelectualizados,
muitas vezes denominados como classe dominante.

A cultura erudita está associada ao desenvolvimento de pensamento mais elitizado,


elaborado e crítico. Talvez seja por esse motivo que ela também é conhecida como
“cultura de elite” ou “cultura superior”. Isso porque é uma cultura restrita a um grupo
46
Objeto e Sociedade | Unidade II

reduzido de pessoas, normalmente classes sociais altas ou indivíduos que possuem um


certo nível de instrução acadêmica, ou seja, uma elite mais intelectualizada.

Essa cultura erudita requer o acúmulo de um amplo conhecimento prévio por parte
do seu consumidor para que possa ser apreciada. Seu nome, vindo do termo “erudito”,
está associado a algo ou alguém que possui uma cultura vasta, sobre um determinado
assunto.

Desenvolvida no seio da nobreza europeia e, posteriormente, da sua alta burguesia, a


cultura erudita era feita por poucos e para poucos. Por muitos séculos, as produções
ditas como eruditas eram disseminadas por instituições formais de conhecimento,
como as universidades, os museus e os conservatórios. Alguns exemplos dela são a
música clássica, a literatura de cunho universal, o balé etc.

Assim como todos os aspectos que envolvem a cultura de um modo geral, é difícil
estabelecer um início da cultura erudita, mas é possível determinar suas origens.
Ela está ligada à formação dos Estados Nacionais, no período que vai do século XIII
ao século XIX, no continente europeu, especialmente na formação de países como
França, Inglaterra, Alemanha e Itália. Mesmo tendo referências em países diferentes,
com diferentes óticas, a característica comum da cultura erudita era a formação de uma
identidade nacional que carregasse as melhores manifestações culturais e artísticas e
que tivesse heróis como ícones exemplares, além de uma narrativa carregada de glórias
e positiva sobre a história de cada povo.

Durante o período renascentista e da idade barroca, entre os séculos XIII e XVI, a


valorização do acúmulo de conhecimentos intensificou-se nas sociedades europeias,
onde além de um considerável esclarecimento pessoal em volta de comportamentos
sociais específicos, era apreciado que cada um tivesse um certo desenvolvimento de
uma ampla gama de saberes, como artes, história, arquitetura e política em uma dada
coletividade, de modo a ser sua “marca” estética, moral e política.

Neste mesmo período, com ênfase no Renascimento, artistas eram financiados pela
burguesia nascente, aristocracia e nobreza, para retratarem a vida nas cortes como
um símbolo de status e elegância. Já séculos mais tarde, no século XVIII, pensadores
iluministas ligaram a ideia de cultura à ideia de civilização e progresso. Alguns filósofos
deste período, como Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e Immanuel Kant (1724-
1804), advogavam que quanto mais cultos fossem os indivíduos de uma sociedade,
mais civilizada ela seria.

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Unidade II | Objeto e Sociedade

Anos mais tarde, na transição da Idade Média para a Idade Moderna, por um aspecto
erudita, o termo cultura, do latim cultivare, que originalmente era ligado ao cultivo de
alimentos, passou a ser utilizado como cultivo da mente, do intelecto, do acúmulo
de conhecimento por meio da tradição. A decadência econômica da nobreza e ascensão
da burguesia, reconfigura o social, onde os integrantes desta burguesia passam a
buscar a diminuição da discrepância cultural que os afastava da nobreza, associada ao
florescimento de valores como a secularização, o humanismo e a valorização da arte
clássica greco-romana, a fim de propiciar o surgimento de manifestações artísticas
eruditas, como categoria profissional e aristocrática, bem como sua apresentação em
espetáculos de demonstrações públicas.

O que acontece é que, a até então chamada de “alta cultura”, de monopólio da nobreza,
associada à tradição e a laços de sanguíneos, passa a se desenvolver sobre as bases da
profissionalização, da secularização e da espetacularização.

Como características, a cultura erudita distingue certo grupo social da população


geral, isto é, confere distinção social e sua compreensão, muitas vezes, exige um
conhecimento prévio, uma familiaridade com o universo cognitivo em que ela foi
produzida. Também é caracterizada pela formalidade, tem a sua legitimidade
atribuída por instituições científicas, como universidades, escolas de artes e
conservatórios. Sua produção e recepção, em geral, demandam alto investimento
de tempo, recursos e conhecimento, além de possuir um acesso bem restrito.

Cultura de massa
Antes é necessário retomarmos o termo “indústria cultural”, que nada mais é do que
tudo que é produzido a fim de atingir uma massa popular e sempre associado aos
veículos de comunicação de massa. Esse termo, Indústria Cultural, foi criado pelos
filósofos alemães Theodor W. Adorno e Max Horkheimer, que defendem a ideia de
que cultura de massa é imposta por esses meios de comunicação de massa (hoje, os
mais comuns são a internet, televisão e rádio) à população em geral, que se entende
não ter uma classe social definida, e que apenas absorve o que é veiculado.

O termo “cultura de massa” é empregado para dar significado ao processo de produção


de bens de consumo, de diferentes tipos, que anseiam alcançar uma grande parcela da
população, com objetivos fundamentalmente lucrativos e comerciais. Assim, a cultura
de massa se refere ao processo de mercantilização da cultura por parte dos esforços de
toda uma indústria cultural que visa difundir essa cultura por meios de comunicação
de massa.

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Objeto e Sociedade | Unidade II

Diferentemente da cultura popular e da cultura erudita, que são produzidas respectivamente


pelas classes populares e de elite, a cultura de massa é produzida para as massas e não
por elas, ou seja, para as pessoas e não pelas pessoas. Nessa definição, vale ressaltar que
o termo “massa” não está relacionado com classes sociais, mas unicamente com o grupo
formado pela maioria das pessoas de uma sociedade.

Essa cultura se relaciona à criação de produtos que possam ser consumidos pela maioria
das pessoas, seguindo um padrão para o consumo imediato. Por meio de um processo
que se dá a partir da inserção de produtos/ideias/conceitos industriais no âmbito da
cultura e os esforços para que esses atinjam “em massa” a população, com o único
objetivo de gerar relações comerciais. A cultura de massa é, por isso, parte integrante
do sistema capitalista e de seus fenômenos decorrentes.

Como característica, a cultura de massa é um produto do sistema capitalista,


onde a racionalização, o tecnicismo e a divisão social baseada no trabalho a
influenciam, ao mesmo tempo em que passa a ser reproduzida em grande escala,
por conta da técnica, fragmentação em nichos e racionalidade baseada no lucro.
Apesar de possuir um forte apelo popular, a participação do público restringe-se
ao consumo, pois sua autoria e produção foi desvinculada do público, que passou
a ser visto como consumidor de um produto cultural.

Comparação e correlação das culturas


Na cultura popular, acontece uma interlocução horizontal entre quem produz e
quem participa de suas expressões artísticas, diferentemente da cultura de massa
e erudita que carregam consigo uma verticalização. A existência de uma forte
ligação com o local onde uma determinada comunidade está estabelecida faz com
que a cultura popular seja diversificada em cada região dentro um mesmo país,
claramente visto no Brasil, ao se comparar, por exemplo, objetos de barro de regiões
do Nordeste com outros produzidos no Sul do país. Isso deixa claro que não são
meios de comunicação tradicionais ou o Estado ou um grupo especializado que fazem
essa conexão.
Em uma tentativa de exemplificar mais claramente as diferenças entre os três tipos de
cultura citado nos tópicos anteriores, é possível pensar em três diferentes manifestações
culturais que envolvem diferentes tipos de objetos.
» Bonecos de barro, feitos pelos “Senhores do Barro” do bairro Alto do Moura
em Caruaru, em Pernambuco, retratam o folclore nordestino e representam
a cultura popular.

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Unidade II | Objeto e Sociedade

Figura 23. Bonecos de barro dos artesãos de Caruaru (PE) receberam da Unesco o título de Artes Figurativas da América Latina.

Fonte: https://mundoeducacao.uol.com.br/sociologia/cultura-erudita.htm.

» Fotografias expostas em uma galeria de arte ou em um outro espaço cultural,


podem ser classificadas como cultura de massa.

Figura 24. Exposição de fotografia do projeto “Os museus como espaços de comunicação”, realizado no MIS.

Fonte: https://mundoeducacao.uol.com.br/sociologia/cultura-erudita.htm.

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Objeto e Sociedade | Unidade II

» Um dos quadros mais famosos do mundo, a pintura de “Mona Lisa”, criada


por Leonardo Da Vinci, pertence à cultura erudita.

Figura 25. Pintura “Mona Lisa”, de Leonardo Da Vinci, século XVI.

Fonte: https://www.pariscityvision.com/pt/paris/museus-de-paris/museu-do-louvre/mona-lisa-historia-misterios.

Todos os três exemplos são objetos artísticos que podem ter a função estética, simbólica
ou uma múltipla função. Se pensarmos no processo de criação e produção desses
objetos, em cada um deles é possível identificar as características do tipo de cultura
correspondente.

Por um aspecto mais universalizado, tendo a ótica do mundo globalizado no período


contemporâneo mais recente, é possível que uma exposição de fotografias seja
apresentada em um grande museu tido como tradicional, assim como os bonecos
de barro dos artesãos pernambucanos poderiam ser comercializados para a Europa
com obras de arte rústica, ou até mesmo um quadro de Leonardo Da Vinci pode ser
produzido em larga escala como um souvenir. Neste último caso sendo um objeto bem
relacionado com a cultura kitsch.
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Unidade II | Objeto e Sociedade

Figura 26. “Souvenir” do quadro “Mona Lisa”.

Fonte: https://mundoeducacao.uol.com.br/sociologia/cultura-erudita.htm.

Atualmente, é perfeitamente possível e compreensível que uma mesma pessoa


possa consumir os três tipos de cultura apresentados. Isso porque em uma sociedade
contemporânea, multicultural, urbana, cada vez mais conectada ciberneticamente e com
uma hierarquização social menos rígida que nos séculos anteriores, somos indivíduos
influenciados por diferentes manifestações.

Ao mesmo tempo que hoje é possível ver uma apresentação de música funk no Teatro
Municipal do Rio de Janeiro, o Museu Histórico Nacional pode apresentar uma exposição
de artesanato e quadros de pintores expressionistas podem ser expostos em uma estação
de metrô no centro da cidade do Rio de Janeiro. As culturas hoje dialogam entre si.

Cultura material e imaterial


A cultura material se aplica a quase toda produção humana. Conectando os aspectos
culturais com os objetos, é possível definir a cultura material como nada mais do que
a importância de determinados objetos terem para determinado povo e sua cultura.
Ela ajuda a criar uma identidade comum, onde objetos fazem parte de um legado de
cada sociedade, assim, cada objeto produzido tem um contexto específico e faz parte
de determinada época da história de um país.

Essa cultura está associada aos elementos concretos de uma sociedade, representando
a cultura e história de sua população. Os bens de natureza material podem ser móveis
ou imóveis. Dentro dos bens considerados móveis, sendo aqueles que podem ser
transportados, podemos colocar as coleções arqueológicas, acervos museológicos,

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Objeto e Sociedade | Unidade II

documentais, bibliográficos, arquivísticos, videográficos, fotográficos, cinematográficos


entre outros. Já entre os bens que não podem ser transportados e intitulados como
imóveis, estão as estruturas físicas, como cidades históricas, sítios arqueológicos e
paisagísticos e bens individuais.

No nosso país, algumas das formas de proteção de bens de cultura material são o
tombamento, o registro e o inventário. Para ilustrar esses bens, podemos dar como
exemplos da cultura material brasileira, os bens classificados pelo Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Alguns deles são o Centro Histórico de Ouro
Preto no estado de Minas Geais o Museu Histórico Nacional localizado na Quinta da
Boa Vista na cidade do Rio de Janeiro, o Centro Histórico de Olinda em Pernambuco,
o Pelourinho que fica em Salvador na Bahia, e o Conjunto Arquitetônico de Paraty
também no estado do Rio de Janeiro.

Figura 27. Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto (MG).

Fonte: https://www.diferenca.com/cultural-material-e-cultura-imaterial/.

Ao mesmo tempo em que as pessoas se apegam a objetos e demais elementos físicos,


em todo povo, grupo ou sociedade existe um patrimônio que vai além do material, ou
seja, além de seus objetos. Esse patrimônio é chamado de imaterial, que funciona como
uma manifestação de elementos representativos, de hábitos, de práticas e costumes.

A melhor descrição de bens imateriais, são os elementos abstratos que fazem parte de
uma cultura, e dizem respeito às práticas e domínios da vida social de determinado
grupo. Sendo esses bens como ofícios, saberes, celebrações, formas de expressão e
também lugares, como mercados, feiras e santuários que abrigam práticas culturais
coletivas.
53
Unidade II | Objeto e Sociedade

A transmissão dessa cultura se dá muitas vezes pela tradição e é passada de geração


a geração. Dessa forma, os bens costumam ser recriados e modificados pelos grupos
e comunidades de acordo com o ambiente, por meio da interação com a natureza e
com o contexto histórico da sociedade. Inclusive um mesmo bem imaterial pode ser
retratado ou representado com algumas diferenças em relação a uma região e outra,
o que já vimos como característica da cultura popular.

No Brasil, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional tem o registro de


mais de 40 bens imateriais nacionais, que foram divididos em formas de expressão,
saberes, celebrações e lugar. Dentre esses registros, podemos citar alguns.

Dentro das “Formas de Expressão”, estão, entre muitas, as Matrizes do Samba no Rio
de Janeiro (partido alto, samba de terreiro e samba enredo); as Rodas de Capoeira em
todos os estados no país; o Jongo do Sudeste Brasileiro; a Arte Kusiwa que é a Pintura
Corporal e Arte Gráfica Wajápi do Amapá; o Frevo de Pernambuco; o Tambor de
Crioula do Maranhão; o Toque dos Sinos em Minas Gerais; e a Literatura de Cordel
encontrada em diversos estados, mas principalmente na região do Nordeste brasileiro.

Figura 28. Fotografia retratando a capoeira, um dos patrimônios imateriais brasileiros.

Fonte: https://www.diferenca.com/cultural-material-e-cultura-imaterial/.

Em meio aos “Saberes”, podemos destacar o modo artesanal de fazer Queijo de Minas
nas regiões do Serro, da Serra da Canastra e Salitre no Alto Paranaíba em Minas
Gerais; o Ofício das Baianas de Acarajé na Bahia; o Sistema Agrícola Tradicional do
Rio Negro no Amazonas; o Ofício das Paneleiras de Goiabeiras no Espírito Santo; o
modo de fazer Renda Irlandesa tendo como referência este ofício em Divina Pastora
54
Objeto e Sociedade | Unidade II

no Sergipe; o ofício de sineiro em Minas Gerais; e as tradições doceiras da Região de


Pelotas e Antiga Pelotas – Morro Redondo, Ituruçu, Capão do Leão e Arroio do Padre
no Rio Grande do Sul.
Figura 29. As paneleiras de goiabeiras (ES).

Fonte: https://www.diferenca.com/cultural-material-e-cultura-imaterial/.

Entre as “Celebrações”, alguns exemplos são o Complexo Cultural do Boi Bumbá do


Médio Amazonas e Parintins no Amazonas; o Círio de Nossa Senhora de Nazaré no
estado do Pará; o Ritual Yaokwa do povo indígena Enawenê Nawê no Mato Grosso;
o Complexo Cultural do Bumba meu boi do Maranhão; a Festa do Divino Espírito
Santo da Cidade de Paraty, no Rio de Janeiro; a Romaria de Carros de Boi da Festa do
Divino Pai Eterno de Trindade em Goiás; a Festa do Senhor Bom Jesus do Bonfim
na Bahia; a Procissão do Senhor Jesus dos Passos de Florianópolis no estado de Santa
Catarina; e a Festa do Pau de Santo Antônio de Barbalha no Ceará.

Figura 30. O Círio de Nossa Senhora de Nazaré em Belém (PA).

Fonte: https://www.diferenca.com/cultural-material-e-cultura-imaterial/.

55
Unidade II | Objeto e Sociedade

Em relação aos “Lugares”, os registrados são a Feira de Caruaru em Pernambuco; a


Tava, Lugar de Referência para o Povo Guarani no Rio Grande do Sul; a Cachoeira de
Iauaretê - Lugar Sagrado dos povos indígenas dos Rios Uaupés e Papuri no Amazonas;
e Feira de Campina Grande na Paraíba.

Figura 31. A Cachoeira de Iauaretê, considerada sagrada para os povos indígenas dos Rios Uaupés e Papuri (AM).

Fonte: https://www.diferenca.com/cultural-material-e-cultura-imaterial/.

Existem ainda os patrimônios imateriais estaduais e municipais, que são característicos


de uma região específica. Para exemplificar esses bens imateriais, temos o “Cururu”,
trovadores que se apresentam em festas de São Paulo, como Patrimônio Imaterial da
Cultura Paulista; a Torcida do Flamengo, no Rio de Janeiro, que foi escolhida para
integrar o conjunto de bens intangíveis que fazem parte do jeito carioca de ser, que
ainda integra em seu acervo imaterial a “Bossa Nova” e a “Banda de Ipanema”.

Figura 32. Torcida do Flamengo no estádio do Maracanã no Rio de Janeiro.

Fonte: https://diariodorio.com/flamengo-e-a-maior-torcida-do-brasil-vasco-esta-em-quinto-flu-e-bota-empatados/.

56
Objeto e Sociedade | Unidade II

De uma forma ou de outra, todos somos parte integrante na cultura de nosso país e por
isso devemos respeitar qualquer forma de manifestação cultural, pois a nossa riqueza
cultural e nossas belezas naturais só fazem sentido se forem para serem compartilhadas
igualmente com todos que fizeram parte dessa imensidão que é o nosso país.

Percepção
De uma maneira direta e facilmente encontrada em qualquer dicionário da língua
portuguesa, o significado de percepção seria ação ou efeito de perceber, de compreender
o sentido de algo por meio das sensações ou da inteligência. Sendo um substantivo
feminino com origem no latim perceptione e que descreve o ato, efeito ou capacidade
de perceber alguma coisa.

Dessa forma, podemos definir a percepção como ato de receber, interpretar e


compreender, através do psíquico, os sinais sensoriais oriundos dos cinco sentidos
orgânicos. Isso ocorre porque a percepção, embora recorra ao organismo e às
questões físicas, está ligada diretamente com o sistema psicológico de cada indivíduo.
Assim, essa ligação faz com que o resultado seja completamente diferente entre uma
pessoa e outra.

Sendo um dos campos mais antigos dos processos fisiológicos e cognitivos envolvidos, a
percepção é entendida pela psicologia como o primeiro momento de um processamento
cognitivo, ou seja, é o primeiro caso em que a informação recebida pode se transformar
em um elemento compreensível, às vezes também conhecido. Quando um indivíduo
percebe uma informação, ele faz um processo de assimilação e compreensão dessa
mensagem, que implica claramente em sua própria elaboração, mas sempre com base
no que é fornecido pelos sentidos da visão, do olfato, do tato, do paladar e da audição.
Para a psicologia a percepção é o processo ou resultado de se tornar consciente
de objetos, relacionamentos e eventos por meio dos sentidos, que inclui
atividades como reconhecer, observar e discriminar. Essas atividades
permitem que os organismos se organizem e interpretem os estímulos.
A percepção de figura-fundo é a capacidade de distinguir adequadamente
objeto e fundo em uma apresentação do campo visual. Um enfraquecimento
nessa capacidade pode prejudicar seriamente a capacidade de aprender de
uma criança.
(APA, 2010, p. 696)

A mente humana recorre a elementos como a memória, que age como sede de grande
parte da informação já processada, para que um indivíduo possa realizar um processo

57
Unidade II | Objeto e Sociedade

de percepção de maneira adequada. Mesmo que essa percepção humana seja mais
desenvolvida do que a dos animais, esses também realizam o processo de interpretação
que também é acompanhada dos estímulos recebidos pelos sentidos. É essa percepção,
com a possibilidade de adaptação, que permite saber que tipo de comida pode ser
considerada confiável para ser ingerida, que tipo de abrigo serve como proteção, que
comportamentos evitar etc.

Alguns fatores influenciam a percepção e esse processo inicia com a atenção no que não
é mais do que um processo de observação que seleciona, ou melhor, das observações
que são efetuadas por nós mesmos. É esse processo que faz com que nós percebamos
alguns elementos em detrimento de outros. Assim, são muitos os fatores que influenciam
a essa atenção e que se encontram de forma agrupada em duas categorias, sendo a
primeira de fatores externos, sendo próprios do meio ambiente, e a segunda de fatores
internos, sendo próprios do nosso organismo.

Em relação aos fatores externos, os mais importantes da atenção são a intensidade,


por estar ligada à nossa atenção que é particularmente despertada por estímulos que se
mostram com grande intensidade. Como exemplo disso, podemos descrever as sirenes
das ambulâncias que possuem um som insistente e alto. Outro elemento dentro dos
fatores externos é o contraste, onde a atenção será muito mais despertada quanto mais
contraste existir entre os estímulos, assim como acontece com os sinais de trânsito
pintados em cores vivas e contrastantes.

Como um elemento principal no despertar da atenção nos fatores externos, o movimento,


que pode ser ilustrado pelas crianças e pelos gatos que reagem mais facilmente a
brinquedos que se movem do que aos que estão parados e estáticos. Terminando com a
incongruência, que acontece quando prestamos muito mais atenção às coisas absurdas
e bizarras do que ao que é normal. Como exemplo dessa incongruência, podemos ver
na praia, num dia comum de verão, quando prestamos mais atenção a uma pessoa que
apanha sol usando um cachecol do que a uma pessoa usando um traje de banho normal.

Já em relação aos fatores internos, um dos elementos que mais influenciam a atenção
também é a motivação, que nesse caso acontece quando prestamos muito mais atenção
a tudo que nos motiva e nos dá prazer do que às coisas que não nos interessam, ou seja,
seu passatempo é muito mais atrativo do que suas tarefas domésticas. Acrescentamos
ainda a experiência anterior, ou seja, a força do hábito de cada indivíduo, que faz
com que prestemos mais atenção ao que já conhecemos e entendemos, trazendo
talvez questões psicológicas que esbarramos com receio ao novo e diferente. E por
último, entre os fatores internos, existe o fenômeno social que é aquele que explica

58
Objeto e Sociedade | Unidade II

que a nossa natureza social faz com que pessoas de contextos sociais diferentes não
prestem atenção igual aos mesmos objetos, por exemplo, os livros e os filmes a que
se dá mais importância na Angola, não despertam a mesma atenção no Japão, assim
como as músicas que despertam atenção nos jovens, não são as mesmas que se dão
mais importância entre os idosos.

Fazendo uma leitura da percepção por uma ótica do design, na percepção das formas, as
teorias da percepção reconhecem quatro princípios básicos que a influenciam. O primeiro
seria a tendência à estruturação ou princípio do fechamento, quando nós, como
usuários, tendemos a organizar elementos que se encontram próximos uns dos outros,
tornando-os de certa forma elementos semelhantes. O segundo está ligado à citação
feita pela APA (2010), com a segregação figura-fundo, que explica que percebemos
mais facilmente as figuras bem definidas e salientadas que são aplicadas em fundos
indefinidos e mal contornados. O terceiro é a pregnância das formas, ou como alguns
descrevem, boa forma, que define que a qualidade que determina a facilidade com
que percebemos figuras bem formadas. Isso porque percebemos de maneira mais
fácil as formas simples, regulares, simétricas e equilibradas. O quarto e último deles
é a constância perceptiva, que se traduz na estabilidade da percepção, onde os seres
humanos possuem uma resistência acentuada à mudança.

Figura 33. Ilustração do princípio de figura e fundo.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Percep%C3%A7%C3%A3o.

É possível descrever, ainda, a percepção por uma ótica de tipos de percepção, como
visual, social e musical. A percepção visual funciona como a interpretação de certos
estímulos visuais, onde um indivíduo em questão obtém algum tipo de informação
através dos seus olhos, agindo e reagindo com o ato de olhar e enxergar o que lhe
é transmitido. Já a percepção social consiste na capacidade do ser humano em ver
59
Unidade II | Objeto e Sociedade

e interpretar o comportamento de outros indivíduos, o que o torna essencial para


a interação social. Enquanto a percepção musical está ligada à capacidade de um
indivíduo em reconhecer e perceber o som, ritmo e melodia, podendo, ainda, incluir
a identificação de acordes, de intervalos, de solfejos etc.

Caso o caminho leve para uma pesquisa mais avançada da percepção, ainda existem
tipos de percepção que estão relacionados mais diretamente com os outros sentidos,
como: a percepção auditiva, através dos sinais sonoros; a percepção táctil, que absorve
a informação relativa ao tato; a percepção olfativa, relacionada diretamente ao olfato;
e a percepção gustativa, que é absorvida através do paladar.

Assim, sem dúvida nenhuma, devemos entender a percepção como um importante


elemento para a análise da psicologia dos seres humanos. Como já apresentado
anteriormente, cada indivíduo realiza um processo perceptivo extremamente
único e diferente dos demais. No universo do design, nesse sentido entra em cena a
teoria psicológica da Gestalt, interessada no estudo da percepção humana diante de
determinadas figuras, estruturas, desenhos e formas com o objetivo de compreender
os sistemas psíquicos dos usuários.

Figura 34. Ilustração dos princípios da Gestalt.

Fonte: https://www.hellerhaus.com.br/gestalt/.

60
OBJETO E CONSUMO UNIDADE III

CAPÍTULO 1
Relação de consumo

Relações de consumo
Podemos definir a relação de consumo sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor
Brasileiro, que define que essa relação funciona como um “tripé”, sendo aquela na
qual existe um consumidor, um fornecedor e um produto/serviço que ligue um ao
outro. Sendo assim, para haver uma relação de consumo, é necessário a existência
concomitantemente dos três elementos citados, como requisito objetivo de existência
dessa relação.

O primeiro elemento dessa tríplice relação é o consumidor, que é toda pessoa física
ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. É o
consumidor que tem acesso a várias opções disponíveis e que tem uma variedade de
escolhas entre quaisquer produtos ou serviços.

Sendo qualquer pessoa que seja impactada pelo produto ou processo, o consumidor
pode ser qualquer um que participe desde a sua concepção até o consumo de algo
realizado pelo processo. É essencial uma estrutura de produção e serviços compatível
com todas, ou pelo menos a maioria, das necessidades identificadas, pois uma cortesia
não sustentará por muito tempo serviços sem qualidade.

Fornecedor é o segundo dos elementos da tríade da relação de consumo, e pode ser


definida como toda e qualquer pessoa física ou jurídica, sendo pública ou privada, nacional
ou estrangeira, que desenvolvem atividade de produção, distribuição, montagem,
criação, construção, transformação, comercialização, importação ou exportação de
produtos ou de serviços.

Acrescentando a definição com uma descrição do advogado, professor e autor Nehemias


Domingos de Melo (1949), que define fornecedor como aquele que desenvolve a

61
Unidade III | Objeto e Consumo

atividade econômica e oferta produtos ou serviços ao mercado de consumo, de forma não


eventual (com habitualidade), na qualidade de fabricante, produtora, transformadora,
montadora ou, ainda, na condição de distribuidora ou simples comerciante.

Já o terceiro elemento é composto por produtos e serviços. Produto é qualquer bem,


móvel ou imóvel, material ou imaterial, ou seja, qualquer bem adquirido na relação
de consumo é considerado produto. Já o serviço pode ser qualquer atividade fornecida
no mercado de consumo, mediante alguma remuneração previamente acordada.

Consumo
Sendo o elemento-chave para que aconteça uma relação de consumo, é o ato de
adquirir produtos ou serviços por meio da realização da compra. Também pode
ser entendido como uma das etapas mais importantes das atividades econômicas,
mesmo fora do contexto capitalista, porém, com muito mais ênfase estando inserido.
Dessa forma, o consumo é o último estágio de uma atividade econômica, sendo
precedido da produção e da distribuição.
O consumidor é aquele que age em prol do consumo e irá adquirir produtos ou serviços
para satisfazer suas necessidades. Esse consumo pode ser realizado por pessoas de forma
individual, por famílias, grupos, coletivos e até mesmo pelo Estado e empresas, onde
adquirem produtos e serviços para desempenhar suas atividades.
Existem fatores que determinam o consumo, tanto no sentido de “quando”, quanto no
sentido de “o que” e “quanto”. Dessa forma, os tipos de produtos e serviços que serão
consumidos por indivíduos ou grupos, que atuam como agentes econômicos, dependem
de vários fatores, como a renda, o preço, os hábitos de consumo dos envolvidos e a
cultura onde ambos estão inseridos. Assim, o consumo pode variar consideravelmente
entre os indivíduos de diferentes regiões do mundo e entre indivíduos e famílias de
um mesmo país ou região, porém, pertencentes a classes sociais distintas, como visto
em cultura popular, erudita e de massa.
Ainda é importante registrar a diferença entre “consumo” e “consumismo”, pois, apesar
de muitas vezes serem considerados sinônimos, possuem significados diferentes. Isso
porque, enquanto o consumo está associado ao ato de comprar produtos ou serviços
com o intuito de satisfação das necessidades individuais ou coletivas, o consumismo se
caracteriza por um consumo exagerado, ou seja, uma espécie de consumo pelo consumo.

Voltando aos primórdios do consumo, antes da Revolução Industrial, os produtos eram


feitos de forma artesanal e assim, eram mais escassos e menos acessíveis à população
62
Objeto e Consumo | Unidade III

em geral. A Revolução Industrial desencadeou um crescimento produtivo e um grande


investimento em inovações e tecnologia, assim, com o advento da tecnologia e da
produção em escala, os produtos industrializados se tornaram mais baratos do que os
artesanais e o consumo começou a crescer em grande velocidade, até mesmo de forma
desordenada, já no início do século XX.

Figura 35. Consumidor em um ambiente propício para compra (supermercado).

Fonte: https://bhrecicla.com.br/blog/o-que-e-responsabilidade-do-consumidor/.

Porém, foi só a partir da segunda metade do século XX, com a existência de um sistema
capitalista consolidado no mundo, que o consumo se intensificou de forma mais
agressiva. Nos dias atuais, vivemos em uma sociedade do consumo e essa classificação
está diretamente relacionada com o consumismo.

O consumismo, por muitas vezes, pode ser caracterizado pelo investimento em produtos
que não são necessários, ou seja, itens supérfluos. Isso porque o comportamento
consumista desordenado é caracterizado pelo desenvolvimento de uma conduta
compulsiva, quando um indivíduo consome produtos ou serviços de maneira exagerada
e sem refletir sobre a real necessidade de fazê-lo.

Evolução do consumo
No mundo atual, mudanças sociais, econômicas e até mesmo culturais, atuam como
protagonistas em um cenário em constante transformação, juntamente com alguns
eventos históricos que influenciaram diretamente na mudança da realidade do mundo,
assim como as grandes Guerras Mundiais. Apesar disso, é necessário observar que
não foram apenas os acontecimentos históricos que fizeram com que acontecessem
essas grandes transformações em dimensões mundiais, pois empresas também podem

63
Unidade III | Objeto e Consumo

ser consideradas como responsáveis, mesmo que não totalmente, pelas alterações na
maneira e intensidade de consumir.

Aspectos como evolução de grandes marcas e empresas, o advento e desenvolvimento


da publicidade e marketing, a forma como empresas passaram a se posicionar junto a
clientes e consumidores, e até mesmo a democratização dos meios de comunicação,
principalmente por conta da expansão da internet.

É praticamente impossível abordar o consumo sem conectá-lo com o capitalismo,


assim como falar de capitalismo sem mencionar os Estados Unidos como o centro
do capitalismo moderno mundial. Por essa ótica, é possível analisar a evolução do
consumo através das transformações sociais e econômicas ocorridas ao longo da
história nesse país.

De início, se faz necessário perpassar pelas grandes Guerras Mundiais que o planeta
vivenciou na primeira metade do século XX e foram marcantes para as transformações
econômicas mundiais. A Primeira Guerra surgiu por conta de conflitos existentes no
sistema político vigente, mas claramente questões econômicas foram fatores de incentivo
para as ações bélicas invasivas. Já a Segunda Guerra nasce como consequência da
inabilidade política para controlar pequenos conflitos locais, que foram se acumulando
e tomando proporções mais amplas e envolvendo diversos países.

O simples fato de uma guerra não trazer apenas sofrimentos e destruições onde
ocorre, ela traz um enriquecimento para países vencedores, pois mesmo intensos e
arrasadores, conflitos são capazes de iniciar uma evolução nas formas de consumo.
Um dos principais beneficiados por esses conflitos ao longo da história mundial são
de fato os Estados Unidos, onde a economia deu salto significativo de produtividade.

O país que havia passado por uma grande crise econômica em 1929, consegue praticamente
triplicar suas exportações, entre 1941 e 1944, sendo esse último o penúltimo ano da
Segunda Guerra, o que reforça o enriquecimento por meio dos conflitos mundiais.
Neste mesmo ano de 1944, acontece a “Conferência de Bretton Woods”, que reúne
aproximadamente 700 nações a fim de discutir uma nova ordem econômica mundial,
que tinha como objetivo estabelecer regras financeiras e comerciais para evitar desgastes
políticos e crises econômicas.

Passando pelas duas grandes guerras quase sem nenhuma necessidade de reconstrução
física de cidades e somado ao crescimento acelerado das atividades industriais, o país
já no início da segunda metade do século XX, dita o rumo e a velocidade de consumo
mundial. Agregam-se a essas questões as mudanças da sociedade americana, que foram
64
Objeto e Consumo | Unidade III

empurradas por bons níveis educacionais e pelo estabelecimento dos EUA como grande
economia do mundo.

Nessa época, a produção cultural no país agia como propagador da imagem da família
bem-sucedida, que possuía automóvel, televisão colorida e eletrodomésticos modernos.
Surge, então, com cada vez mais força, a influência cultural como estímulo ao consumo,
sendo algo que transformaria totalmente os conceitos de publicidade e design em todo
o mundo. Tudo isso como instrumento fortalecedor do capitalismo como sistema
econômico vigente e atuante em todo o mundo.

Torna-se cada vez mais perceptível o movimento de influência dos americanos com
base no consumo. Ainda nos períodos de conflitos, grandes marcas norte-americanas,
sabendo que a vitória das forças armadas na Segunda Guerra era fundamental para a
soberania do país, passaram a associar seus produtos aos soldados e envolvidos nas
batalhas. A imagem desejada era de serem benfeitores que chegavam à Europa para
dizimar o nazismo. Um exemplo dessas apropriações foi a Coca-Cola, sendo das
maiores propagadoras do “American Way of Life”, iniciando seu plano de expansão
de negócios nos países do velho continente.

Figura 36. Um dos anúncios da Coca-Cola seguindo a linha “American Way of Life”.

Fonte: https://nostalgiarama.blogspot.com/2015/05/anuncios-da-coca-cola-dos-anos-50.html.

65
Unidade III | Objeto e Consumo

O desenvolvimento organizacional se estabelece junto da prosperidade do mundo


pós-guerra com a ascensão da educação executiva e a implantação de novos modelos
de comércio ao redor do planeta. As empresas começam a desenvolver um novo modo
de pensar sua atividade e protagonismo, e deixam de ter foco único e exclusivo sobre a
administração dos resultados, passando a avaliar aspectos sociais e psicológicos sobre
a atividade empresarial.

Esse conceito de desenvolvimento organizacional tem como foco a compreensão dos


ambientes internos e externos para que seja possível mudar comportamentos, padrões,
valores e atitudes profissionais, para fomentar as relações de consumo, que hoje são
muito mais baseadas no conhecimento, no conteúdo e na comunicação entre empresa
e cliente.

As mudanças sociais atuam para tirar do consumidor um papel passivo, colocando-o


como um participante ativo, ou seja, antes as empresas vendiam seus produtos para
as pessoas e isso se transforma em pessoas que procuram as empresas para comprar.
A nova realidade envolve a transformação do posicionamento empresarial para que
ele auxilie no fomento do consumo mais acelerado.

Fica possível entender que o contexto sócio-histórico, alinhado com as novas perspectivas
corporativas, se fundem como peças-chave para as mudanças no modelo de consumo.
Profissionais da Economia, Marketing e das Ciências Sociais passam a questionar
como aspectos comportamentais e psicológicos podem afetar as relações de consumo.
Esses questionamentos, somados aos estudos de pensadores como os psicólogos norte-
americanos Leon Festinger (1919-1989) e Daniel Katz (1903-1998), que estudaram
como as atitudes individuais são formadas e transformadas sob a influência da sociedade,
criam uma teoria comportamental que muda os rumos da publicidade e do marketing.

Também influenciados pelo behaviorismo, que seria o método de investigação


psicológica que procura examinar de modo mais objetivo o comportamento humano
e dos animais, com ênfase nos fatos objetivos (estímulos e reações), sem fazer recurso
à introspecção, a antiga estratégia de fazer propagandas descrevendo seus produtos,
passa a dar lugar ao estímulo de consumo, o que leva ao despertar de sentimentos que
conduzem o indivíduo até a compra.

São muitas as pesquisas feitas em diversos campos de conhecimento para analisar o


comportamento dos consumidores e é o somatório desses resultados que permitem às
marcas exercitar diversas e diferentes fórmulas para interagir com os consumidores
e aumentar o número de vendas. Essas relações ainda são bombardeadas com as

66
Objeto e Consumo | Unidade III

oportunidades de conhecer novas culturas, tendências, produtos e comportamentos


que surgem através da conectividade digital.

Nos dias de hoje, atuando como ferramentas eficazes de sedução de pessoas, as mídias
sociais possuem uma parcela de influência ao trazer os consumidores para um ambiente
interativo, no qual as marcas estão inseridas e apresentam novos produtos e serviços.
Essas mídias, diferentes das tradicionais, como televisão, rádio, jornais etc., permitem
que as marcas promovam discursos que são bem mais próximos e eficientes com os
consumidores.

67
CAPÍTULO 2
Teorias estéticas contemporâneas

Contextualizando o estético
Quando nos deparamos com as mais diversas imagens divulgadas na mídia, sendo
nos dias atuais mais evidentes e constantes nas mídias digitais, que possivelmente
conseguimos perceber novas visualidades do momento contemporâneo, são constituídas
basicamente de diferentes estilos visuais, sejam eles novos ou antigos, assim como
populares e eruditas. Isso gera uma espécie de rede com diferenciais visuais estéticos
que tem como sujeito um posicionamento variável e descentrado.

Isso define a composição estética contemporânea como um misto de referências.


Ao fazermos uma introdução ao longo da história, podemos lembrar que quando
a televisão analógica surgiu, nos anos de 1920, trouxe consigo a discussão de que
as imagens televisivas poderiam suprimir o rádio, que até então era o veículo de
comunicação de massa mais difundido.

Isso tanto não aconteceu, como a televisão e o rádio passaram a atuar em conjunto,
onde um não eliminou o outro em nenhum aspecto, passando a englobar-se dentro
de empresas que detinham o poder da comunicação. Assim aconteceu dezenas de
anos a frente com os e-books, que mesmo com muitas teorias em torno do objeto,
não eliminaram o livro impresso como os mais radicais previam. Dessa forma, pela
ótica contemporânea, as imagens estão cada vez mais entrelaçadas ao mundo visual,
virtual e imaginário.

Com o advento cada vez mais constante e veloz de novas tecnologias de comunicação,
surgem novas possibilidades de contemplação e participação dos sujeitos, onde anos
antes rejeitavam antigas estéticas em detrimento de novas, não rejeitam o que surgiu
na modernidade, além disso, inclui as tendências contemporâneas e o resgate de
antigos estilos.

De uma forma mais abrangente, a estética visual contemporânea tende à hibridação, à


mistura e à linguagem multimídia, em busca de ampliar as possibilidades conotativas,
como afirmam Rahde e Dalpizzolo (2007).
[...] ao mesmo tempo que cultiva a ambiguidade, a indefinição, a
indeterminação, a polissemia das mais diversas formas visuais busca ampliar
ao máximo as suas possibilidades conotativas, procura a participação ativa do
espectador num jogo de interpretação, ao manifestar visualidades efêmeras e

68
Objeto e Consumo | Unidade III

descartáveis, tolera a imperfeição, a imprecisão, a poluição, e as interferências


externas pós-produção, valorizando a comunicação e as emoções dos grupos
e ironizando sutilmente cânones e estereótipos visuais hegemônicos e
banalizados da alta cultura.
(RAHDE; DALPIZZOLO, 2007, p. 3)

Fica possível perceber que imagens contemporâneas não carregam a preocupação em


apresentar uma pureza estética ou mesmo algum tipo de solução visual inédita. Isso
porque elas são resultado de uma intertextualidade e da hibridação de diversos estilos
que, ao mesmo tempo que cultiva ou resgata o grosseiro, se apropria de conceitos
estruturados de beleza.

Muitos designers atuam com a preocupação centrada na estética, gerando produtos


que possuem um apelo visual de grande força, mas que, mesmo sendo objetos de uso,
têm sua usabilidade comprometida, como alguns produtos criados pelo arquiteto e
designer Philippe Starck (1949). Um bom exemplo disso é o espremedor “Juicy Salif”
criado por ele em 1990.

Figura 37. Espremedor “Juicy Salif”, de Philippe Starck, de 1990.

Fonte: http://tipografos.net/design/starck.html.

Estéticas contemporâneas
Segundo a autora e pedagoga brasileira Gisele Leite (2013), estética está ligada diretamente
ao ato de perceber e sentir, podendo ser considerado um dos ramos tradicionais da
69
Unidade III | Objeto e Consumo

filosofia, ao lado da ética, dialética e metafísica. Como vimos anteriormente, é um


exercício quase sem fim a tentativa de separar objeto de estética e estética de arte, assim
como estética do belo. A arte só não é mais antiga do que a religião em detrimento do
espírito humano que há mais de 80 mil anos já absorve a arte e, consequentemente,
inicia a distinção do que é belo ou não.

Na elaboração de uma ontologia do belo, o filósofo e educador alemão Alexander


Gottlieb Baumgarten (1714-1762) cria o termo “estética” no século XVIII, para designar
“a ciência do belo” como referência àquilo que agrada aos sentidos do homem, uma
definição que nos séculos passados funcionou como uma definição paralela da arte.

A arte e a estética sempre andaram de “mãos dadas”, mas essa ligação fica ainda mais
estreita quando consideramos que um objeto artístico é aquele a qual se oferece ao
sentimento e à percepção. Isso é possível de ser evidenciado com umas das frases mais
icônicas do arquiteto e urbanista Le Corbusier (1887-1965), considerado um dos mais
importantes arquitetos do século XX, que diz que “a arte é uma série de objetos que
provocam emoções poéticas”.

Figura 38. Clothespin, criado por Claes Oldenbug, de 1976.

Fonte: https://designculture.com.br/isto-e-arte-ou-design.

No período do Classicismo, o movimento artístico que perdurou durante o período do


Renascimento na Europa, que durou entre os séculos XIV e XVI, a estética normativa era

70
Objeto e Consumo | Unidade III

instaurada com o fazer artístico a partir do belo ideal. Antes disso, Platão definia a beleza
como a única ideia que resplandece no mundo, como uma tentativa de fundamentar
a objetividade de arte e da beleza.

Já os filósofos empiristas, durante os séculos XVI e XVIII, relativizavam a beleza como


gosto pessoal, e assim, não sendo possível de ser discutido de forma racional, levando
ao entendimento de que a beleza não está no objeto, mas no sujeito. Com um sentido
um pouco diferente, o filósofo prussiano Immanuel Kant (1724-1804) define a estética
como a ciência de todos os princípios da sensibilidade, fazendo do belo tudo aquilo
que, sem nenhuma intelectualidade, é objeto de uma satisfação do espírito.

A estética é o sentimento do sujeito e não o conceito de um objeto, e isso marca


a modernidade quando o belo deixa de ser algo em si, como fora na Era Clássica.
Dessa forma, o belo depende da contemplação do sujeito, de seus sentimentos e
entendimento, sendo esse capaz de formular juízos estéticos e avaliar os objetos como
belos ou não.

Trazendo para percepções mais atuais, o juízo subjetivo passa a ser universalizado,
porque as condições subjetivas da capacidade de julgar são as mesmas em todos os
homens, e isso faz com o belo seja uma qualidade atribuída ao objeto, em uma tentativa
de exprimir certo estado da nossa subjetividade.

De forma contingente e sensível, o belo se torna o objeto que realiza o seu destino,
sendo autêntico com particular “modo de ser”. Isso caminha em direção do significado
do belo como somente o que pode ser percebido pela sensibilidade estética e para a
experiência estética. Cada objeto singular estabelece seu próprio tipo de beleza.

A estética, então, pode se fundir aos estilos, sendo eles percebidos como um novo
caminho a ser seguido pela humanidade ou não.
Na contemporaneidade torna-se difícil falar em estilo, uma vez que o pós-
moderno vivenciado engloba praticamente todos os estilos, num processo
de inclusão e, por isso mesmo, o pós-moderno não se constitui em estilo,
mas em condição de vida.
(RAHDE; DALPIZZOLO, 2007, p. 4)

Por uma ótica contemporânea, a estética pode se enquadrar em várias categorias, como
o belo, sublime, bonito, poético, gracioso etc. Assim, a estética se torna caracterizada
por uma abundância de correntes, onde cada uma delas é constituída por teorias
particulares e distintas.

71
Unidade III | Objeto e Consumo

Figura 39. Saca-rolha Anna G, criado por Alessandro Mendino, em 1994.

Fonte: https://designculture.com.br/isto-e-arte-ou-design.

O homem contemporâneo, de alguma forma, aceita tudo o que surge em aspectos


visuais, talvez em nome da mistura de estilos, o que liga a percepção estética cada vez
mais ao sentimento, às crenças, às percepções, às emoções de um imaginário cultural
que pode levá-lo à recriação, inclusive de antigos rituais.
Hoje, homem e máquina convivem diariamente: a estética é, pois, feita de
qualidade e não apenas de quantidade. Buscamos qualidade de vida, buscamos
harmonia com a natureza, enquanto, ao mesmo tempo, nos religamos às
máquinas para interligarmo-nos por e-mail com o outro lado do mundo,
em segundos. Isso tudo nos dá a ideia de um mundo de paradoxos, de
indeterminações, um mundo que podemos chamar de mundo polissêmico.
(RAHDE; DALPIZZOLO, 2007, p. 4)

A definição da estética em um universo contemporâneo nos leva à apropriação de uma


percepção maior do mundo, num processo de reconhecimento, de compreensão e de
interpretação. A nova estética é relacional e nos permitirá expressar e viver muitas
possibilidades do nosso ser somado ao conhecimento e o espírito crítico e reflexivo
de cada sujeito, nos levando a assumir os riscos que a liberdade iconográfica nos vem
proporcionar diante das expectativas e realidades.

72
APLICAÇÕES
NO DESIGN UNIDADE IV

CAPÍTULO 1
Objeto e o processo criativo no Design

A forma das coisas e o Design


O mais curioso no momento que paramos para pensar na relação do Design com os
objetos e outras coisas é que, independentemente de onde estivermos, basta olhar
por alguns segundos em volta para nos depararmos com essa relação de imediato.
Talvez seja mais provável que você esteja em contato com esse texto por meio de uma
tela, seja de um desktop, notebook, tablete, celular etc., e o que você tem diante de seus
olhos com certeza é um objeto desenvolvido pelos preceitos de design. Até mesmo sua
cadeira, mesa, mouse, teclado, luminária, óculos, xícara de café, caneta ou qualquer
outro objeto que não seja um objeto natural.

Figura 40.

Fonte: https://www.sbie.com.br/blog/descubra-o-que-fazer-na-decoracao-da-mesa-de-trabalho-para-melhorar-motivacao/.

Cada um desses objetos possui uma relação específica com os seres humanos e, seja este
qual for, com certeza foi pensado e projetado para seu melhor uso e relação com seu
interlocutor, envolvendo um processo de criação desde sua conceituação e associação
73
Unidade IV | Aplicações no Design

com as necessidades humanas, até de desenvolvimento e concepção como objeto de


uso ou artístico.

Como foi visto na unidade três, nas relações de consumo, o indivíduo é livre para
escolher aquilo que mais o agrada, não necessariamente ligado a uma necessidade
de uso, talvez por isso que cada vez mais estamos rodeados de objetos especialmente
inventados para nos agradar. Isso porque do outro lado, existem profissionais que
pesquisam, analisam e desenvolvem produtos para atender todo e qualquer tipo de
consumidor, os designers.

A designer brasileira e professora Vera Damazio (1959) nos traz a afirmação de que
“os objetos são uma forma de interagirmos com os outros”, servindo “para que sejamos
aceitos socialmente, para nos tornar mais adequados à sociedade em que vivemos”.
E isso não se refere somente a objetos de uso comum, pois apesar de nossas vidas
estarem “entupidas” de coisas que aparentemente não têm muita razão de existir, esses
objetos têm sua importância, pois eles definem a relação que temos com o mundo,
como também exemplifica Chico Homem de Melo, designer e professor, descrevendo
que “a forma como a cadeira do chefe é posicionada, por exemplo, determina a relação
que ele mantém com sua equipe: muitas vezes ela é maior, mais confortável e fica com
o assento ligeiramente mais alto que as demais. Pronto, a relação hierárquica está
estabelecida sem que uma palavra seja pronunciada”.

Figura 41. Exemplo de cadeira do chefe e seu tamanho e porte diferenciado dos demais.

Fonte: https://pt.bestdealplus.com/product/3695598/Cadeira-de-couro-cadeira-do-chefe-cadeira-de-massagem-cadeira-de-escritorio-de-
negocios-cadeira-confortavel-cadeira-de-mesa-cadeira-do-computador-cadeira-high-end.

74
Aplicações no Design | Unidade IV

Cada vez mais, os objetos são desenvolvidos para impulsionar o consumo e fazer
com que o ato de adquirir uma coisa seja de imediato, sem muita análise e pesquisa.
Olhando por esse aspecto, quem nunca comprou um livro somente pela capa?
Ou um novo biscoito em um supermercado por conta de uma embalagem extremamente
agradável? Ou pelo menos idealizou aquele eletrodoméstico recém-lançado por ele ser
incrivelmente lindo? Isso acontece porque, como vimos no capítulo sobre consumo,
o que comanda as nossas escolhas são as emoções.

Autor do livro “O Erro de Descartes – Emoção, Razão e o Cérebro Humano”, o


neurologista português Antonio Damásio (1944) afirma que a tomada de decisões do
ser humano está diretamente ligada à capacidade de sentir, e isso acontece pelo fato
de que quando nos deparamos com algo que julgamos ser atraente, isso nos causa uma
sensação de bem-estar, que nos leva ao desejo de adquiri-lo.

Tudo conectado com a percepção da estética, como visto no capítulo três, pois a emoção
positiva de um belo objeto é imediatamente lida por nosso cérebro como sendo oriunda
de alguma coisa boa, mesmo que a funcionalidade não seja analisada. Isso explica o
fato de sempre escolhermos os objetos que nos parece mais bonito.

O fato de a beleza ser fundamental para a escolha de novos objetos e produtos, faz com
que surjam os designers para colocar o belo na nossa vida cotidiana, atuando como
responsáveis por criarem objetos que vão além de meros utensílios. Hoje, a eficiência,
durabilidade e qualidade dos produtos são semelhantes a quanto eles são capazes de
chamar a atenção do consumidor.

A relação da forma das coisas com o design começa, como também afirma Vera
Damazio, quando todos os objetos que criamos nascem de uma relação com a extensão
do que nosso corpo não é capaz de fazer sozinho, ou quando é possível, não é feito
com tanta precisão. A designer exemplifica que essa relação, como a que temos com
o carro, sendo uma extensão de nossos pés, como “as armas, da capacidade de nossas
mãos nos proteger, e assim por diante”.

Diante dessa relação, percebemos que a concepção apenas alinhada com a estética das
coisas não se faz suficiente no design, pois este está longe de ser somente a arte de
fazer coisas bonitas que seduzem. O design como processo desenvolve coisas belas,
mas somadas à funcionalidade e à utilidade, a fim de solucionar algum problema de
características físicas, visuais, tecnológicas etc.

75
Unidade IV | Aplicações no Design

Criatividade e o design de objetos


Sendo uma das mais misteriosas habilidades dos seres humanos, a criatividade sempre
mereceu a atenção de todos nós, principalmente daqueles que atuam em atividades
de criação, desde um artesão ou trabalhador manual, até grandes cientistas e artistas.
Pensar em criatividade passou a ser o objetivo de vida de muitos filósofos e psicólogos
no mundo, fazendo surgir, principalmente nas últimas décadas, diversos métodos
para estimular a criatividade humana, com uma promessa de desbloqueio da mente
em pessoas teoricamente obstruídas de criatividade.

Já foi mais do que comprovado por diversos pesquisadores que a criatividade pode
ser desenvolvida e que todos nós somos de algum modo criativos. Pensando assim, a
criatividade está na essência, ou talvez melhor dizendo, no coração do design. Vale o
registro que só ser muito criativo não te transforma em um designer, mas com certeza
é um bom caminho para tal processo.

É a criatividade que rege a direção de grandes projetos de design, pois se encontra em


todos os estágios de um projeto. Baxter (2011), salienta que a inovação está alinhada
com a criatividade e que ela deveria ser mais explorada.
O projeto mais excitante e desafiador é aquele que exige inovações de fato – a
criação de algo radicalmente novo, nada parecido com tudo que se encontra
no mercado. Infelizmente, a maior parte da vida dos designers é dedicada a
projetos menos inovadores, incluindo o redesenho de produtos existentes,
o alargamento de uma linha de produtos existentes, ou o aperfeiçoamento
de um produto para alcançar um concorrente. Mas isso não diminui a
importância da criatividade.
(BAXTER, 2011, p. 85)

O uso do design a fim de promover diferenciações de produtos, funciona como uma


“arma” contra a pouca margem de erro em uma concorrência cada vez mais acirrada
na disputa de espaço na mente dos consumidores. Pelo simples fato de o design ser o
responsável por criar diferenças em produtos e objetos.

A criatividade se faz necessária em todos os estágios de desenvolvimento de um


produto ou objeto, desde a identificação de uma oportunidade ou solução diferenciada
de um problema, até a engenharia de produção e desenvolvimento, com o intuito de
introduzir diferenças aos consumidores.

Muitas vezes confundida com inspiração, a criatividade sempre foi estudada como
potencial decisivo para o desenvolvimento de atividades que envolvem o impacto
76
Aplicações no Design | Unidade IV

visual como um dos objetos de estudo, como vemos nas artes, arquitetura, literatura,
música, publicidade, design entre outros. Por muitos anos, a criatividade era buscada
como algo que aconteceria de repente. Um exemplo disso eram os profissionais de
criação, chamados de “criativos”, nas agências de comunicação por volta dos anos
de 1940 e 1950, que eram pagos apenas para terem ideias diferenciadas que eram
construídas por outros profissionais. Esses “criativos” idealizavam a chegada da ideia
como algo que cairia do céu enquanto fumavam um cigarro encostados em suas belas
cadeiras de escritório.

Baxter (2011) diz que “uma grande ideia criativa não surge no vácuo, mas quando
houve um esforço consciente na busca da solução”, o que corrobora com a afirmação
que um dos grandes inventores de nossa história, Thomas Edison (1847-1931), fazia
a respeito da criatividade. Quando perguntado o que era criatividade para ele, Edison
dizia que “criatividade é 1% de inspiração e 99% de transpiração”, ou seja, ela acontece
durante o processo.

Muitos esperam ter um momento semelhante ao de Arquimedes (287-212 a.C.),


o conhecido momento “Eureka”, quando uma ideia surge em meio ao nada, mas
para que isso acontece é necessário que ocorra uma preparação da mente, pois a
criatividade é o resultado de diferentes associações, combinações e derivações com
ângulos diferentes sob uma ideia existente ou não. Claro que esse momento pode
ocorrer com qualquer tipo de pessoa, mas somente quando de algum modo ocorra
uma preparação prévia.
A preparação é o processo pelo qual a mente fica mergulhada nessas ideias
existentes. Mesmo quando não se trabalha no nível consciente, a mente
continua a processar essas ideias. Então, quando menos se espera, a solução
pode surgir repentinamente.
(BAXTER, 2011, p. 87)

Sendo assim, momentos “Eurekas” não ocorrem de forma aleatória a qualquer tipo de
pessoa, mas àquelas que se preparam de alguma maneira para recebê-los, isso porque
os mecanismos da criatividade ainda não são totalmente conhecidos. Apesar disso,
existem métodos que atuam em favor do seu desenvolvimento.

Nasce, então, a base de qualquer processo criativo, que após uma inspiração inicial, é
iniciada pela preparação, passando pela incubação, até a chagada da iluminação e busca
da última etapa a seguir, que atua como verificação.

77
Unidade IV | Aplicações no Design

Figura 42. Ilustração do processo criativo de 4 etapas.

1.
PREPARAÇÃO:
informação;
questionamento;
estrutura.

2. 4.
INCUBAÇÃO: VERIFICAÇÃO:
subconciente;
Processo implementação;
processamento;
Criativo ajuste;
conexões. validação.

3.
ILUMINCAÇÃO:
insights.

Fonte: adaptada de http://designstuff.com.br/bloqueio-criativo-no-design/.

Processo criativo no design de objetos


O Design é composto por uma miscelânea de referências e concepções, assim como
de teorias e conceitos. Renato de Fusco (2019) descreve que “surgido da união entre
arte, tecnologia, conhecimento e atendimento às necessidades, o design evolui a cada
dia de forma a auxiliar e otimizar o processo projetual”, processo esse que envolve a
concepção de objetos e diferentes utensílios.

Relacionando diretamente o desenvolvimento de objetos, o design abarca diferentes


linhas de atuação. Como vimos nas unidades anteriores, em um primeiro momento,
o design se direciona à qualidade e à estética, o que logo muda em direção à qualidade
de processos e aos aspectos gerenciais, em busca de uma melhor relação do usuário
com os objetos.

78
Aplicações no Design | Unidade IV

Assim, surgem esquemas para ilustrar como o processo de design atua no desenvolvimento
de objetos. Um desses processos é apresentado por Gustavo Amarante Bomfim (2015),
que ilustra um processo de design composto por três fases: a analítica, a criativa e a
executiva. Esse processo é apresentado no livro “Estética e Semiótica Aplicadas ao
Design” (AZAMBUJA, MENDES e SILVA, 2021, p. 33).
Na fase analítica, aspectos como problema e requisitos de projeto são
definidos. Nessa etapa, são realizadas pesquisas para o levantamento
de informações já existentes em projetos similares ou concorrentes. As
informações coletadas também auxiliam na definição do perfil de usuário,
da necessidade de materiais e da aplicação tecnológica. A saída dessa fase
constitui a geração do conceito de projeto. Na fase criativa, há a geração
de alternativas para o desenvolvimento do projeto, as quais são analisadas,
sendo escolhida a mais adequada e alinhada à proposta do projeto. Na fase
executiva, é realizado o detalhamento das etapas do projeto, sua execução
e seu acompanhamento de realização.
(AZAMBUJA; MENDES; SILVA, 2021, p. 33)

Löbach (2001) nos traz a afirmação de que “todo o processo de design é tanto um
processo criativo como um processo de solução de problemas”. Pois:
Existe um problema que pode ser bem definido; reúnem-se informações
sobre o problema, que são analisadas e relacionadas criativamente entre si;
criam-se alternativas de soluções para o problema, que são julgadas segundo
critérios estabelecidos; desenvolve-se a alternativa mais adequada (por
exemplo, transforma-se em produto).
(LÖBACH, 2001, p. 141)

Encontrar uma solução para o problema é o que constitui o design, acrescentando


as características que possam de algum modo satisfazer as necessidades humanas
de um modo durador e estável, independentemente da origem dessas necessidades.
Dessa forma, Löbach (2001) descreve que “o processo de design pode se desenvolver
de forma extremamente complexa (dependendo da magnitude do problema)”. Isso leva
à divisão em quatro fazes do processo, mesmo que elas sejam entrelaçadas levadas a
idas e vindas durante o desenvolvimento do processo.

A primeira delas é a fase da preparação, onde ocorre a análise do problema, talvez a


mais importante das etapas, pois o erro na definição do real problema pode acarretar
na caminhada para um mundo perdido em termos de concepção de objetos. Isso porque
é a descoberta do problema que constitui o ponto de partida para o processo, assim
como a motivação para que o processo de design ocorra.

79
Unidade IV | Aplicações no Design

Nesta etapa, ocorre a coleta de informações, cujo âmbito da análise depende da


abrangência e da importância da solução do problema. Como é de suma importância
que as informações coletadas nesta fase sejam preparadas para a fase posterior, é
essencial a coleta de conhecimentos sobre o problema de uma forma livre de censura,
pois todo e qualquer dado pode ser bastante relevante para a construção de uma
solução.

Após a análise de todas as informações coletadas na primeira fase, chega o momento


em que serão geradas as alternativas na segunda fase. A geração de alternativas é a
fase da produção de ideias apoiadas nas análises realizadas previamente. Ainda não
é o momento de focar em uma ideia de solução central ou definitiva, na verdade, é
nesta fase que de geração de ideias deve ser totalmente livre, ignorando qualquer tipo
de restrição, visando ao maior número possível de alternativas.

Na terceira fase, intitulada de fase de avaliação das alternativas, chega o momento de


afunilar as soluções propostas. Tudo que foi levantado até esse momento é comparado
e analisado em questões de aplicabilidade e se serão executáveis com os investimentos
existentes. Para isso, é necessário que no início dessa fase sejam estipulados os critérios
de aceitação do objeto ou produto.

Vindo por último e não menos importante, a quarta fase é a fase da realização
da solução do problema, onde ocorre a materialização da alternativa escolhida.
Essa materialização deve:
[...] ser revista mais de uma vez, retocada e aperfeiçoada. Muitas vezes, ela
não é nenhuma das alternativas, isoladamente, mas uma combinação das
características boas encontradas em várias alternativas. A melhor alternativa
apresentada na forma de um produto.
(LÖBACH, 2001, p. 155)

Todos os processos de design possuem uma grande semelhança entre si, pois é possível
que sempre se tem envolvido a identificação de um problema, sua análise, geração de
possíveis soluções até um resultado final. Vindo para um caminho mais atual, surge o
design thinking, que reúne as visões de processos no design de um modo que se torna
possível sua aplicação em diferentes áreas.

O design thinking é um processo estreitamente associado à inovação e ao desenvolvimento


de novos produtos. Sua base de pensamento é centrada no usuário e em toda sua
experiência em contato com a possível solução. Essa metodologia é inspirada no trabalho
dos designers e pode ser adotada por diversos tipos de profissionais em diferentes

80
Aplicações no Design | Unidade IV

áreas de atuação, com uma abordagem mais criativa e, principalmente, com foco nas
necessidades e experiências humanas.

Esse pensamento torna possível a resolução de vários tipos de problemas, de uma forma
criativa e inovadora, para algumas áreas, pois atua a partir de constantes renovações
no modo de pensar sobre um processo. Esse método basicamente consiste em entender
o usuário de um produto ou serviço. Seu desenvolvimento é como uma ferramenta
que trabalha em conjunto com o usuário, trazendo ideias que sejam as melhores para
que se agregue valor para o resultado em sua utilidade.

O processo de design thinking pode ser resumido em 5 etapas, que fazem com que
os envolvidos pelo seu desenvolvimento, utilizem métodos empíricos e estejam em
contato constante com o público que deve se beneficiar do produto. São as etapas de:
empatia, definição, ideação, prototipação e teste.

Figura 43. O processo de design thinking.

Fonte: https://vidadeproduto.com.br/processos-de-design-produto/.

Atuando como o primeiro passo, a primeira etapa de empatia é estar em contato com
os usuários e possíveis consumidores, por meio da empatia, da busca de se aprofundar
no assunto, tendo o relacionamento interpessoal como instrumento. No lançamento
de um produto ou serviço, a empatia se desenvolve quando nos colocamos no lugar do
outro, ou seja, no lugar do consumidor, para entender as necessidades e utilidades que
esse lançamento pode oferecer. Um exercício que não é tão simples, pois é necessário
que os profissionais envolvidos deixem de lado as próprias suposições, com o objetivo
de entender melhor as expectativas e necessidades dos usuários.

81
Unidade IV | Aplicações no Design

Na segunda etapa acontece o momento de definição do problema após a reunião de


todos os conhecimentos absorvidos com a empatia. Nesse momento, ocorre uma
definição da problemática sobre o que está sendo analisado. É preciso analisar aquilo
que pode ser um problema para os usuários de um produto ou algum serviço, seja
ele novo ou antigo, e que possivelmente esteja de alguma forma atrapalhando ou
reduzindo sua utilidade.

Em seguida, na terceira etapa, após o entendimento das necessidades e tendo definido


quais problemas precisam ser solucionados, acontece a ideação, caracterizado pela
criação de ideias que levam ao encontro de possíveis resultados para o desenvolvimento
do produto ou serviço. Uma das ações mais características nesta etapa é o uso de
técnicas como o brainstorming, para que, na junção e análise de ideias, sejam reunidas
as melhores ao mesmo tempo que são estimuladas no processo.

A concretização das melhores ideias, acontece na quarta etapa do processo. A prototipação


cria, em forma de protótipo, produtos com as características planejadas nas etapas
anteriores. Isso se faz necessário, porque para que seja identificando se o produto
oferece aquilo que os usuários necessitam e desejam, ou até mesmo se apresentam
outros problemas que não haviam sido pensados e analisados. É necessário o protótipo
para que seja possível o reconhecimento dessas informações de um modo prático.

A última das etapas do processo de design thinking são os testes. Nessa etapa, o protótipo
que chega até esse momento, possibilita o teste com maior rigor do produto criado,
mantendo a atenção na utilidade que ele pode oferecer ao usuário. Assim como na
etapa anterior, podem surgir problemas não identificados, o que pode levar à retomada
do processo em etapas mais iniciais.

Independentemente da estratégia usada no momento que se pensar em criar um novo


objeto, produto ou serviço, é importante entender que os processos criativos são onde
o indivíduo planeja suas atividades com criatividade, esforço e inovação. Isso gera a
construção de um produto/objeto que tenha valor, não só para quem o desenvolve,
mas para toda uma sociedade.

82
CAPÍTULO 2
Considerações contemporâneas

Transformações
A arte e o design passaram por várias mudanças no decorrer dos anos, séculos, sempre
envolvidos de algum modo com estilos bem diferentes. Talvez seja por conta disso que
demoramos um pouco para nos acostumarmos com o que, em um primeiro momento,
parece ser estranho aos nossos olhos. Muitas vezes ficamos limitados a um estilo que
temos mais afinidade e, talvez, maior aderência. Apesar disso, cada vez mais, no mundo
atual, precisamos respeitar as diferenças como coisa essencial, dessa forma, o não gostar
de um estilo não dá o direito de menosprezar o trabalho do artista ou um designer.

Sempre que é levantada a questão sobre o que seria um estilo, ou até mesmo, um design
contemporâneo, é importante que seja compreendido que isso significa simplesmente um
resultado do momento presente. Mesmo que alguém inclua o conceito de contemporâneo
ao falar de outros estilos, até quando mencionam uma mistura de moderno e clássico,
é essa livre mistura que faz parte do que atualmente é o contemporâneo.

Apesar disso, existem sim algumas características que se fazem necessárias para uma
melhor compreensão do que é contemporâneo. Vivemos um momento em que, talvez
influenciados pelo excesso de informação, buscamos uma simplificação visual, trazendo
questões de leveza, suavidade e personalidade em voga para composições artísticas e
de design.

Como o estilo contemporâneo não possui uma definição fechada, ele se torna um
conceito que é usado para falar de misturas que se encaixem dentro da personalização,
seja de objetos de uso ou artísticos, a fim de oferecer um visual mais limpo, com conforto
e funcionalidade, sendo essa a associação do belo coletivo atual.

Essa mistura é refletida pela mescla de materiais usados em móveis, objetos e acessórios,
como acrílico, metal, vidro, espelhos, ferro, cimento, tijolos à vista, madeira, pedras
e outros. Alinhados ao uso de formas geométricas e minimalistas, em busca do que
deve parecer e ser mais confortável, prático e funcional.

O design contemporâneo se refere ao que vivemos agora, e por isso reflete o jeito de ser
e pensar da nossa sociedade, refletindo tendências atuais e em constante evolução. Ele
se apropria de características do modernismo, do minimalismo e de outros estilos, sem
ter uma referência única, tornando-se múltiplo e até mesmo ambíguo, de alguma forma.

83
Unidade IV | Aplicações no Design

Para um melhor entendimento do design contemporâneo, é importante que seja


compreendido o período em que ele surge, de modo a ser constante, e as suas influências.
Basicamente, o design contemporâneo nasce como uma espécie de evolução do design
moderno, mas superando certas regras e normas, que eram muito rígidas e metódicas
durante o ápice do modernismo.

Cada vez mais o design contemporâneo aumenta sua preocupação com questões
como conforto e sustentabilidade, que não eram tão presentes no design moderno,
trazendo novas formas de analisar o contexto social e cultural onde suas produções
serão inseridas. Até mesmo a busca por produtos personalizados, com características
únicas como encontras nos períodos dos artesãos, volta como um importante elemento
do contemporâneo dentro do design.

Conclusões
Após compreender todas as questões referentes às construções do indivíduo, suas
relações de consumo e necessidades únicas, é possível chegar à definição mais próxima
do design que é feito hoje em dia, em que para projetar no mundo dos objetos, é
necessário que se levem em conta seus valores culturais, estéticos e funcionais.

Isso não significa que esses valores não possam, muitas vezes, cruzar-se ou ainda andar
separadamente, e fazer com que questões funcionais se percam em aspectos artísticos
e conceituais. O fato de ainda ser possível encontrar uma cadeira onde é impossível
se sentar, ou até mesmo um calendário, com a intenção de aquilo ser uma obra com
uma mensagem a passar e não exatamente algo para anotar uma visita ao médico, nos
leva a perceber que o entendimento das verdadeiras necessidades ainda é um aspecto
muito único do indivíduo.

Cada vez mais o design pode parecer estar em tudo, mas é importante o entendimento
de que nem tudo o que é design faz sucesso, ou até mesmo funciona para todos.
Para atingir seu ápice e funcionar, um design precisa ser único, e por meio da forma,
função e significado, conseguir se diferenciar dos demais ao mesmo tempo que se
torna atraente aos nossos olhos.

Essa busca por ser único e diferente, faz com que novos objetos tenham dificuldade
de se posicionar na mente dos consumidores, ou melhor, não viram um objeto de
desejo. Saindo da ótica tradicional de objetos de uso doméstico e objetos artísticos,
podemos exemplificar a concepção de inovação e diferenciação com a inconfundível
garrafa da Coca-Cola, que apareceu em meados de 1915. O objeto nasceu com uma
84
Aplicações no Design | Unidade IV

necessidade imediata de diferenciação entre todas as demais garrafas de diferentes


marcas de refrigerante, que eram praticamente idênticas. A garrafa traz, de forma
inovadora, um desenho ergonômico e sedutor que a transformou em um dos ícones
do design do último século.

Figura 44. Evolução do design da garrafa da Coca-Cola.

Fonte: https://g1.globo.com/economia/educacao-financeira/blog/samy-dana/post/2019/06/29/por-que-a-garrafa-faz-voce-preferir-coca-cola.
ghtml.

Talvez com uma proporção universal menor do que a garrafa da Coca-Cola, outro
exemplo de grande diferenciação acontece com o frasco do perfume da marca Chanel,
o Chanel nº 5. O frasco se tornou um ícone no universo da perfumaria, por conta de
suas linhas retas e secas que rompem uma concepção contínua de frascos curvilíneos
que se baseiam nas características formas femininas.

Figura 45. Design do Fraco do Perfume Chanel nº 5.

Fonte: https://gauchazh.clicrbs.com.br/donna/moda/noticia/2016/11/lista-top-10-perfumes-de-luxo-que-farao-voce-se-sentir-poderosa-
cjpl8tszc00awndcn7y8tmro3.html.

85
Unidade IV | Aplicações no Design

O designer e professor da ESDI, Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade


do Estado do Rio de Janeiro, João de Souza Leite (1952), nos afirma que “o ser humano
anseia por individualização”. Ninguém quer ser massa. Todo mundo quer garantir
sua identidade pessoal, sua marca, sua diferença. E assim acontece também com os
produtos que escolhemos ter em casa”.

Há ainda quem defenda, no entanto, que o diferente pelo diferente não quer
dizer nada. Assim como o bonito pelo bonito e tão pouco menos o funcional pelo
funcional. Por essa perspectiva, qual seria então o papel do design a partir de agora?
Talvez uma resposta que atenda essa questão é a que o design tem que favorecer as
relações sociais, com o objetivo de proporcionar momentos com os outros, ao mesmo
tempo que promove a sociabilidade. Desse modo, será possível que o design fique
gravado na memória do usuário.

Alguns objetos também possuem o poder de evocar boas lembranças, que normalmente
envolve mais do que uma única pessoa, o que pode explicar o sucesso de grandes
objetos. Dessa forma, talvez o grande desafio dos designers, além de se apropriar do uso
de sentimento provocados por cores, formas e texturas, seja o de provocar respostas
emocionais mais profundas.

86
REFERÊNCIAS

APA. Dicionário de Psicologia. Porto Alegre, Brasil: Artmed, 2010.


ARENDT, Hannah. A Condição humana. Rio de Janeiro: Forense-Universitária; Rio de Janeiro:
Salamandra; São Paulo: Ed. Universidade de São Paulo, 1981.
ARGAN, Giulio C. Arte e crítica de arte. Lisboa: Ed. Estampa, 1988.
AZAMBUJA, Cristina Splenger; MENDES, Giselly Santos; SILVA, Silvia Cristina da. Estética e
semiótica aplicadas ao design. Curitiba: Intersaberes, 2021.
AZEVEDO, Wilton. O que é design. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1998.
BAUDRILLARD, Jean. O sistema dos objetos. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2008.
BAXTER, Mike. Projeto de Produto. Guia prático para o desenvolvimento de novos produtos.
2. ed. São Paulo: Editora Blücher Ltda, 2011;
BOMFIM, Gustavo Amarante. Metodologia para o desenvolvimento de projetos. João Pessoa:
Editora universitária/UFPB, 1995.
BÜRDEK, B. E. História, Teoria e Prática do Design de Produtos. Tradução Freddy Van Camp.
São Paulo: Edgard Blücher, 2006.
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