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AULA 1

BIODIREITO, BIODIVERSIDADE
E BIOÉTICA

Profª Vanessa Iacomini


TEMA 1 – CONCEITOS

O biodireito vem a ser um ramo novo do Direito, que engloba os direitos


de quarta geração, ou a dimensão de direitos humanos, cujas cobranças estão
agrupadas nos efeitos cada vez mais traumáticos dos progressos tecnológicos da
biotecnologia e da biomedicina, com vistas à construção de uma nova
humanidade, com mais esperança e certamente mais feliz.
Nas palavras da professora Maria Helena Diniz (2001, p. 8):

é a ciência jurídica que estuda as normas jurídicas aplicáveis à bioética


e à biogenética, tendo a vida como objeto principal, não podendo a
verdade científica sobrepor-se à ética e ao direito nem sequer acobertar,
a pretexto do progresso científico, crimes contra a dignidade humana
nem estabelecer os destinos da humanidade.

O biodireito surge da necessidade de resguardar a pessoa como ser


biológico, desde a sua percepção, ou, por que não dizer, desde o seu patrimônio
genético, à sua morte. Nasce como retorno ao agravo que a bioética remete ao
Direito, ao insistir que deve existir uma proteção ao ser humano, não apenas como
ser individual, mas também como representante da espécie humana.
Já a biodiversidade é a ampla variedade de formas de vida (animais e
vegetais), as quais são descobertas nos mais distintos ambientes. A
biodiversidade é composta por espécies vivas, que abrangem plantas, animais e
micro-organismos. É composta por uma espantosa diversidade de espécies, como
indivíduos análogos, com capacidade para se reproduzir entre si e naturalmente.

O meio ambiente é, atualmente, um dos poucos assuntos que desperta


o interesse de todas as nações, independentemente do regime político
ou sistema econômico. É que as consequências dos danos ambientais
não se confinam mais nos limites de determinados países ou regiões.
Ultrapassam as fronteiras e, costumeiramente, vêm a atingir regiões
distantes. Daí a preocupação geral no trato da matéria que, em última
análise, significa zelar pela própria sobrevivência do homem. (Freitas,
2001, p. 7)

A ideia de biodiversidade é intrínseca ao conceito de meio ambiente; por


isso, um não está em dissociação com o outro, sendo considerado como um
direito humano, do qual os indivíduos gozam direta ou indiretamente. Tem valor
em si e representa a variabilidade genética contida nos componentes vivos
ambientais:

a concepção de que embora estejamos acostumados a reivindicar


direitos que protegem nossa liberdade e igualdade, garantidos por lei,
infelizmente nem sempre eles existiram e garantiram nossa dignidade.
Por isso, faz-se necessário reivindicarmos e lutarmos por um ambiente
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desprovido de poluição e ameaças, pois não é ao meio que se agride,
mas sim a nós mesmos. É a nossa própria integridade existencial que
está em risco. Lutar pelo meio ambiente ecologicamente equilibrado é
lutar pela nossa própria vida, luta que simboliza uma das batalhas
travadas no campo dos direitos humanos. (Mondiani, 2006, p. 47)

A importância da biodiversidade reside no fato de que, dentro de um espaço


ecológico, é o que caracteriza geneticamente aquela dada região, um atributo
significativo que pertence àquele local e a mais nenhum outro; são as chamadas
espécies endêmicas, aquelas limitadas somente àquele ambiente, não sendo
mais encontrada em nenhum outro.
Por último, a bioética nasce a partir de inquietações dos biólogos que
conheceram o sentido moral da biosfera sobre as implicações extraordinárias de
suas descobertas e novidades tecnológicas:

Segundo Kant, ética, do grego ethos, foi a primeira denominação que


recebeu a questão do “correto proceder”. Está ligada à filosofia moral e
expressa a atitude do homem consigo mesmo, com o outro, e com o
mundo, transcendendo ao ideal de moralidade e justiça, objetivando um
juízo de apreciação de um determinado atuar, distinguindo o certo do
errado. “Bio” implica exigência de que se leve em consideração as
disciplinas e as implicações do conhecimento científico, de modo que se
possa entender as questões, perceber o que está em jogo e aprender a
avaliar possíveis descobertas e suas aplicações. “ética”, por seu turno,
é uma tentativa de avaliar as ações pessoais e as ações de outros de
acordo com uma determinada metodologia ou certos valores básicos.
(Pessini; Barchifontaine, 1991, p. 14).

O termo bioética foi empregado por um biólogo, para mencionar a


condição de vida e sobrevivência do planeta, não fundamentalmente
tendo em vista, a compreensão da dimensão ética contida no discurso
bioético que arremessou para muito além, a concepção inicial,
delimitada inicialmente, apenas no campo da medicina. Seu objeto são
as intervenções médicas, biológicas e cientificas em geral, nos seres
vivos, desde as que atuam no processo de surgimento (fecundação in
vitro) até as que determinam sua extinção como a eutanásia por
exemplo. [...] a bioética é a resposta da ética aos novos casos e
situações originadas da ciência no campo da saúde. Poder-se-ia definir
a bioética como a expressão crítica do nosso interesse em usar
convenientemente os poderes da medicina para conseguir um
atendimento eficaz dos problemas da vida, saúde e morte do ser
humano. (Leparneur, 2000, p. 16)

A bioética estuda conflitos, polêmicas, pesquisas e métodos que apontam


questões éticas dentro da medicina e da biociência. Esses experimentos e
descobertas podem beneficiar ou não da sociedade e do planeta, e por isso esses
assuntos devem ser ponderados. A reflexão bioética nada mais é do que um
antigo esforço em reconhecer o valor ético da vida humana. Tendo por fim a
cidadania plena, ela se consolida mediante a incorporação dos direitos de quarta
geração e de quinta geração (Bobbio, 2002).

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Para melhor compreender os conceitos de biodireito, biodiversidade e
bioética, é necessário analisar e entender os objetivos gerais da bioética e sua
abrangência com relação ao direito comparado. Nesse estudo, não é possível
passar por cima dos princípios gerais, que devem ser minunciosamente
estudados.

TEMA 2 – PRINCÍPIOS GERAIS

Os princípios considerados básicos da bioética são: beneficência, não-


maleficência, autonomia, e a justiça.

2.1 Princípios da bioética

2.1.1 O princípio da beneficência e o princípio da não maleficência

São obrigações independentes e condicionais (ou não absolutas); são


princípios da ética, fundamentais e independentes. A beneficência refere-se ao
traço de caráter ou à virtude ligada à disposição de agir em benefício de outros; o
princípio de beneficência refere-se à obrigação moral de agir em benefício de
outros. Muitos atos de beneficência não são obrigatórios; ainda assim, um
princípio de beneficência sublinha a obrigação de ajudar outras pessoas,
promovendo interesses legítimos e essenciais.
O princípio da não-maleficência assegura a possibilidade mínima ou
inexistente de danos físicos aos sujeitos da pesquisa (pacientes) de ordem
psíquica, moral, intelectual, espiritual, cultural e social.

O desenvolvimento de novas tecnologias médicas, em especial os


equipamentos que visam a manutenção da vida biológica em casos em
que os pacientes encontram-se em estados dramáticos de saúde, de um
lado, e o movimento de afirmação dos direitos do paciente-
particularmente aqueles que dizem respeito à recusa de medidas
“extraordinárias” – de outro, têm trazido novas questões à máxima
primum non nocere. (Almeida, 2003, p. 10)

Esse princípio volta-se contra os dilemas morais que se apresentam para


os profissionais de saúde. Havendo conflito entre beneficência e não-
maleficência, deve prevalecer a não maleficência.

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2.1.2 O princípio da autonomia

O princípio da autonomia visa garantir que o profissional respeite as


crenças, a vontade e os valores morais do sujeito e do paciente. Segundo
doutrinadores, tem-se que o princípio de autonomia,

refere-se à capacidade de autogoverno do homem, de tomar suas


próprias decisões, de o cientista saber ponderar, avaliar e decidir sobre
qual método ou qual rumo deve dar a suas pesquisas para atingir os fins
desejados, sobre o delineamento dos valores morais aceitos e de o
paciente se sujeitar àquelas experiências, ser objeto de estudo, utilizar
uma nova droga em fase de testes, por exemplo. O centro das decisões
deve deixar de ser apenas o médico, e passar a ser o médico em
conjunto com o paciente, relativizando as relações existentes entre os
sujeitos participantes. (Almeida, 2012, p. 228)

E ainda, conforme Maria Celeste Cordeiro Leite Santos (2001, p. 58),

abrange ao menos duas convicções éticas: os indivíduos devem ser


tratados como agentes autônomos e as pessoas com autonomia
diminuída têm direito à proteção. Salientando que pessoa autônoma é
aquela ‘capaz de deliberar sobre seus objetivos pessoais e agir sob a
orientação dessa deliberação’, reconheceu a comissão que nem todo ser
humano é capaz de se autodeterminar, necessitando de maior proteção.
Foi considerando que, na maioria das pesquisas envolvendo seres
humanos, tal princípio determina que esses entrem na pesquisa
“voluntariamente e com informação adequada”.

Assim, pelo princípio da autonomia, o indivíduo tem o direito de decidir


sobre as atividades que impliquem alterações em sua condição de saúde física
e/ou mental, impondo-se, de outro lado, para que sua opinião seja adequada, o
dever de os envolvidos prestarem todas as informações relevantes sobre o
tratamento/pesquisa que se irá realizar.

2.1.3 O princípio de justiça

É o princípio da justiça que conduz à distribuição equitativa e universal dos


serviços de saúde. Esse princípio é de difícil conceituação. Sem dúvida, as
perversidades, os absurdos no acesso aos serviços de saúde, públicos ou mesmo
privados, e o crescente aumento dos custos de assistência médica, têm colocado
o princípio da justiça no cerne da bioética.
As principais teorias da justiça são (Pessini; Barchifontaine, 1991, p. 45-6):

a) A justiça como essência natural. Teve início na antiga Grécia (séc. VI


a.C) e gozou de supremacia no Ocidente até o séc. XVII. Nessa visão, a
“justiça é a propriedade natural das coisas que o homem e não tem
senão de conhecer e respeitar.
b) A justiça como liberdade contratual. Seu autor é John Locke, que
escreveu, em 1690, o quadro dos direitos primários do ser humano, os

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chamados direitos civis e políticos: direito à vida, à saúde ou à
integridade física, à liberdade e à propriedade, além do direito a defendê-
las quando as considerar ameaçadas.
c) A justiça como igualdade social. Surge aqui a importância da proposta
marxista. Ao negar a propriedade privada dos bens de produção, o
marxismo permite uma nova definição da justiça distributiva: o que deve
ser equitativamente.
d) A justiça como bem-estar coletivo. É o resultado dos movimentos
pelos direitos civis e políticos, mas também sociais. Na área da saúde
levou à concepção da assistência sanitária como direito e saúde a ser
tratada como questão pública e política. O estado de justiça social, que
nos países ocidentais chegou a identificar-se com o Estado do bem-estar
(ou benfeitor), há de ter entre suas máximas prioridades a proteção do
direito à assistência sanitária.
e) a justiça é definida não como proporcionalidade natural, nem como
liberdade contratual, nem como igualdade social, mas sim como
equidade.

Além do princípio de justiça, alguns doutrinadores, sem muito


reconhecimento, indicam o princípio da proporcionalidade, como mais um
princípio a ser estudado na presente área. Tal princípio que defende o equilíbrio
entre os benefícios e os riscos, sendo maior o benefício às pessoas.

2.2 Princípios de biodireito

Somando aos princípios enumerados da bioética, tem-se: o princípio da


ubiquidade, o da dignidade da pessoa humana e da preservação da espécie
humana.

2.2.1 O princípio da ubiquidade

O princípio da ubiquidade está no campo do direito ambiental. Tem-se que,


pelo princípio da ubiquidade, o bem ambiental é onipresente, de forma que uma
violência ao meio ambiente em determinada localidade é capaz de trazer reflexos
negativos a todo o planeta Terra e, consequentemente, a todos os povos e a todos
os indivíduos, não só para os membros da espécie humana, mas para todas as
espécies habitantes do planeta.

2.2.2 O princípio da preservação

O princípio da preservação da espécie humana é uma transposição para o


âmbito do biodireito do princípio ambiental do desenvolvimento sustentável.
Quanto ao desenvolvimento sustentável do direito ambiental, trata-se de um duplo
direito: o direito do ser humano de desenvolver-se e de realizar as suas

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potencialidades, quer individual quer socialmente, e o direito de assegurar aos
seus pósteros as mesmas condições favoráveis.

2.2.3 O princípio da dignidade humana

Garantia e princípio constitucional fundamental, assegurando à pessoa


humana, consoante previsão do art. 1º inciso III da CF, a dignidade humana é a
base da própria existência do Estado brasileiro e, ao mesmo tempo, fim
permanente de todas as suas atividades; é a criação e manutenção das condições
para que as pessoas sejam respeitadas, resguardadas e tuteladas, em sua
integridade física e moral, assegurados o desenvolvimento e a possibilidade da
plena concretização de suas possibilidades e aptidões.

2.3 Princípios da biodiversidade

Os princípios da Biodiversidade são estabelecidos em lei, na Convenção


sobre Diversidade Biológica, e na Declaração do Rio, ambas de 1992, e na
Constituição e na legislação nacional vigente sobre a matéria. Diante da análise
da Política Nacional da Biodiversidade, têm-se os seguintes princípios
enumerados no item 2 do anexo do Decreto nº 4.339/2002:

I - a diversidade biológica tem valor intrínseco, merecendo respeito


independentemente de seu valor para o homem ou potencial para uso
humano; II - as nações têm o direito soberano de explorar seus próprios
recursos biológicos, segundo suas políticas de meio ambiente e
desenvolvimento; III - as nações são responsáveis pela conservação de
sua biodiversidade e por assegurar que atividades sob sua jurisdição ou
controle não causem dano ao meio ambiente e à biodiversidade de
outras nações ou de áreas além dos limites da jurisdição nacional; IV - a
conservação e a utilização sustentável da biodiversidade são uma
preocupação comum à humanidade, mas com responsabilidades
diferenciadas, cabendo aos países desenvolvidos o aporte de recursos
financeiros novos e adicionais e a facilitação do acesso adequado às
tecnologias pertinentes para atender às necessidades dos países em
desenvolvimento; V - todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se, ao Poder Público e à coletividade,
o dever de defendê-lo e de preservá-lo para as presentes e as futuras
gerações; VI - os objetivos de manejo de solos, águas e recursos
biológicos são uma questão de escolha da sociedade, devendo envolver
todos os setores relevantes da sociedade e todas as disciplinas
científicas e considerar todas as formas de informação relevantes,
incluindo os conhecimentos científicos, tradicionais e locais, inovações e
costumes; VII - a manutenção da biodiversidade é essencial para a
evolução e para a manutenção dos sistemas necessários à vida da
biosfera e, para tanto, é necessário garantir e promover a capacidade de
reprodução sexuada e cruzada dos organismos; VIII - onde exista
evidência científica consistente de risco sério e irreversível à diversidade
biológica, o Poder Público determinará medidas eficazes em termos de

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custo para evitar a degradação ambiental; IX - a internalização dos
custos ambientais e a utilização de instrumentos econômicos será
promovida tendo em conta o princípio de que o poluidor deverá, em
princípio, suportar o custo da poluição, com o devido respeito pelo
interesse público e sem distorcer o comércio e os investimentos
internacionais; X - a instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação do meio ambiente deverá ser
precedida de estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
publicidade; XI - o homem faz parte da natureza e está presente nos
diferentes ecossistemas brasileiros há mais de dez mil anos, e todos
estes ecossistemas foram e estão sendo alterados por ele em maior ou
menor escala; XII - a manutenção da diversidade cultural nacional é
importante para pluralidade de valores na sociedade em relação à
biodiversidade, sendo que os povos indígenas, os quilombolas e as
outras comunidades locais desempenham um papel importante na
conservação e na utilização sustentável da biodiversidade brasileira;
XIII - as ações relacionadas ao acesso ao conhecimento tradicional
associado à biodiversidade deverão transcorrer com consentimento
prévio informado dos povos indígenas, dos quilombolas e das outras
comunidades locais; XIV - o valor de uso da biodiversidade é
determinado pelos valores culturais e inclui valor de uso direto e indireto,
de opção de uso futuro e, ainda, valor intrínseco, incluindo os valores
ecológico, genético, social, econômico, científico, educacional, cultural,
recreativo e estético; XV - a conservação e a utilização sustentável da
biodiversidade devem contribuir para o desenvolvimento econômico e
social e para a erradicação da pobreza; XVI - a gestão dos ecossistemas
deve buscar o equilíbrio apropriado entre a conservação e a utilização
sustentável da biodiversidade, e os ecossistemas devem ser
administrados dentro dos limites de seu funcionamento; XVII - os
ecossistemas devem ser entendidos e manejados em um contexto
econômico, objetivando: a) reduzir distorções de mercado que afetam
negativamente a biodiversidade; b) promover incentivos para a
conservação da biodiversidade e sua utilização sustentável;
etc.) internalizar custos e benefícios em um dado ecossistema o tanto
quanto possível; XVIII - a pesquisa, a conservação ex situ e a agregação
de valor sobre componentes da biodiversidade brasileira devem ser
realizadas preferencialmente no país, sendo bem vindas as iniciativas
de cooperação internacional, respeitados os interesses e a coordenação
nacional; XIX - as ações nacionais de gestão da biodiversidade devem
estabelecer sinergias e ações integradas com convenções, tratados e
acordos internacionais relacionados ao tema da gestão da
biodiversidade; e XX - as ações de gestão da biodiversidade terão
caráter integrado, descentralizado e participativo, permitindo que todos
os setores da sociedade brasileira tenham, efetivamente, acesso aos
benefícios gerados por sua utilização.

Considerando os compromissos assumidos pelo Brasil ao assinar a


Convenção sobre Diversidade Biológica, durante a Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – CNUMAD, em 1992, que foi
aprovada pelo Decreto Legislativo n. 2, de 3 de fevereiro de 1994, e
promulgada pelo Decreto n. 2.519, de 16 de março de 1998; e considerando
também o disposto no art. 225 da Constituição, na Lei n. 6.938, de 31 de agosto
de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, na Declaração
do Rio e na Agenda 21, ambas assinadas pelo Brasil em 1992, durante a
CNUMAD, e nas demais normas vigentes relativas à biodiversidade; e
considerando que o desenvolvimento de estratégias, políticas, planos e
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programas nacionais de biodiversidade é um dos principais compromissos
assumidos pelos países membros da Convenção sobre Diversidade Biológica, é
possível dizer que os princípios de biodiversidade são muitos, são importantes e
merecem reconhecimento.

TEMA 3 – INTERRELAÇÃO ENTRE BIODIREITO, BIODIVERSIDADE E BIOÉTICA

São disciplinas que dependem uma da outra e é imprescindível que os


indivíduos tenham mais ética e consciência de suas atuações, para que possamos
ter um meio ambiente apropriado.
Ao se propor uma interrelação entre os temas, chamamos a atenção da
sociedade para não perder o sentido valorativo de suas próprias conquistas, e
também porque elas devem ser regulamentadas sob o ponto de vista de uma
perspectiva ética.
É oportuno tal advertência, em virtude da pouca maturidade cientifica e
doutrinaria da matéria. O biodireito ainda é novo, considerando sua primeira
menção na Declaração Universal do Genoma Humano e dos Direitos Humanos,
de 1997, e mesmo assim o presente assunto tem-se apresentado ainda de forma
dispersa e superficial, sem maiores aprofundamentos em sua formulação, sem
destaque para a sua importância e fundamentações, enquanto a ciência avança
rapidamente.

A sociedade passa por profundas mudanças, que se traduz em um


pluralismo jurídico, pois são necessários um conjunto de direitos novos
a serem atingidos: são novos grupos sociais, sexuais ou étnicos, novos
espaços de tutela normativa e a todo instante a sociedade reclama
regulamentação normativa resultado de uma verdadeira era dos direitos
como pedagogicamente apontou Norberto Bobbio, uma longa
caminhada da humanidade em direção a maior liberdade e maior
igualdade possível, desafio dos novos direitos, especialmente do
Biodireito. (Bobbio, 2002)

Ainda que se façam todas as advertências de caráter ético, é inexorável


que os temas sejam tratados sob os aspectos econômicos (e para o mercado é
bom que assim continue sendo), tendo em vista que devem ser realizados
investimentos para que se possa obter novos produtos ou processos.

TEMA 4 – DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E PROGRESSO CIENTÍFICO

Com o advento e o aprimoramento biotecnológico, muito se tem discutido,


tanto no âmbito científico como no jurídico, sobre as possibilidades e limites das

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pesquisas. A interdisciplinaridade entre as ciências médicas e jurídicas desvela
seu ponto de contato com a ética. Destaca-se também o amparo legal existente
no Brasil para ratificar um desenvolvimento científico sustentável em prol de uma
qualidade de vida com dignidade.
As evoluções tecnologias crescem de maneira espantosa; os avanços da
medicina são inúmeros, objetivando-se uma harmonização do ser humano com a
natureza.
No entanto, os avanços jurídicos muitas vezes não acompanham as
crescentes mudanças, e por vezes o direito acaba por ficar desatualizado e, por
consequência, a sociedade fica desprovida de soluções para os problemas
decorrentes de tais avanços.
O biodireito traz a proposta de estudar essa interrelação entre o direito e as
ciências da vida, pois há uma intercomunicação entre as áreas, e os seus efeitos
na sociedade necessitam de parâmetros reguladores.
Em se tratando das pesquisas genéticas, a ciência há tempos vem tentando
desvendar os seus mistérios, e a ciência jurídica vem se adaptando às mudanças
apresentadas com o intuito de salvaguardar o bem mais precioso do direito: a
harmonia entre o cientificamente possível e o juridicamente permissível.
O final do século XX trouxe inovações na área da biotecnologia; em
decorrência do progresso científico, a biotecnologia hoje é uma realidade, e assim
surgem debates de cunho ético, filosófico, jurídico, social, com novas áreas de
enfrentamento para a compreensão dessa nova realidade, como por exemplo a
bioética, o biodireito e também a necessidade de harmonizar esse progresso ao
desenvolvimento sustentável.
Pode-se afirmar que a biotecnologia é responsável por uma parcela
significativa da melhoria nas condições dos cuidados de saúde. Entretanto, a
biotecnologia não é neutra, porque pode trazer consigo consequências danosas,
e por isso é importante analisar o progresso científico com lastro no
desenvolvimento sustentável, sendo indissociável dessa sustentabilidade
aspectos de cunho bioético.
Assim, é preciso tratar, dentre muitos assuntos relacionados à
biotecnologia, as pesquisas genéticas, analisando aspectos da bioética, do
progresso científico e seu desenvolvimento sustentável em relação à proteção à
vida e à dignidade da pessoa humana, tendo como paralelos a Constituição da

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República de 1988 e a Declaração Universal do Genoma Humano e Direitos
Humanos.

TEMA 5 – NOSSA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA E A NOVA POSSIBILIDADE


DE CONDIÇÃO HUMANA

As pessoas, em nossa sociedade mundial, buscam sempre um juízo de


valores; tentam avaliar não apenas as coisas, mas as ações, os acontecimentos
e até mesmo as experiências, tanto que são juízos éticos normativos de valor que
determinam o dever do ser humano, segundo o critério de correto e incorreto,
limitando e controlando a violência e o abuso.
Em nossa sociedade contemporânea, são muitos os benefícios que a
tecnologia e a ciência vêm apresentando para toda a humanidade, registrando
que com a pesquisa científica deve-se estabelecer um juízo crítico que possa
determinar as verdadeiras necessidades humanas, para que tal desenvolvimento
possa caminhar em benefício da sociedade, e não com outros pressupostos.
A grande abrangência do biodireito faz despertar para problemáticas
futuras, tendo em vista que a humanidade aguarda a criação de um código moral
que possa ser compartilhado por todos aqueles que se ocupam de bioética,
biodireito, biotecnologia, entre outras áreas modernas e requisitadas atualmente
em território nacional e internacional, tentando assim evitar que qualquer abuso
ao ser humano seja cometido.
O professor Daury César Fabris (2018) prevê:

A Bioética refere-se à conduta humana no âmbito das ciências da vida,


abarcando as ciências médicas e profissões afins ou correlatas.
Compreende situações que podem ocorrer nas relações entre paciente
e médico, pesquisador e pesquisado, Estado e cidadão; os
desdobramentos sociais das investigações biomédicas e do
comportamento daqueles que se encontram inseridos em atividades
terapêuticas, englobando ainda as questões relacionadas à vida em
sentido mais amplo, indo além da saúde e vida humana, inserindo-se
nesse contexto as experiências com animais e plantas. As questões
ligadas ao campo da Bioética ainda causam grandes divergências. Um
dos motivos apontados para tal desentendimento reside no fato da
impossibilidade de se comungar, no campo da moral, uma certeza
racionalizante, visto que, em tempos de pós-modernidade, os valores
modernizantes parecem não mais encontrar ressonância no campo das
relações humanas. É aceitável a possibilidade de uma diversidade de
“bioéticas”, levando-se em consideração as peculiaridades de cada
espaço e tempo históricos e as várias éticas existentes nesses planos.

O biodireito apresenta várias surpresas; algumas dessas surpresas ainda


são imprevisíveis, destacando-se uma variedade ética e também uma

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subjetividade moral – deixando claro, contudo, que o direito deve limitar e inovar,
acompanhando os avanços biotécnicos. De qualquer forma, acima de tudo está a
ética, que deve ser observada e respeitada sempre.
Jürgen Habermas afirma (2004):

o desenvolvimento da técnica genética, no que se refere à natureza


humana, torna pouco nítida a distinção categorial e profundamente
sedimentada do ponto de vista antropológico entre o subjetivo e o
objetivo, entre o que cresceu naturalmente e o que foi fabricado. Por
essa razão, para mim, junto com a instrumentalização da vida pré-
pessoal está em jogo uma autocompreensão da ética da espécie, que
determina se ainda podemos continuar a nos compreender como seres
que agem e julgam de forma moral. Quando nos faltam razões morais
que nos forcem a uma determinada atitude, temos de nos ater aos
indicadores éticos da espécie.

A partir desse entendimento conceitual e desse princípio lógico, é possível


iniciar um estudo sobre patenteabilidade e biodireito, com aplicação para as
dificuldades da humanidade.

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