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Rev. Latino-Am.

Enfermagem
2023;31:e3949
DOI: 10.1590/1518-8345.6497.3949
www.eerp.usp.br/rlae

Artigo Original

Abandono da terapia antirretroviral entre adolescentes e jovens com


HIV/aids durante a COVID-19: estudo caso-controle*

Camila Moraes Garollo Piran1


https://orcid.org/0000-0002-9111-9992 Destaques: (1) Idade próxima de 22,8 anos aumenta
Alana Vitória Escritori Cargnin 1 as chances de abandono da terapia antirretroviral. (2) A
https://orcid.org/0000-0002-7733-2420 distância até o serviço é uma variável controle que favorece

Bianca Machado Cruz Shibukawa 1 o abandono. (3) Uso esporádico de preservativo e infecção
https://orcid.org/0000-0002-7739-7881 oportunista são fatores de proteção. (4) Adolescentes e
jovens têm comportamentos mais vulneráveis. (5) Reflexões
Natan Nascimento de Oliveira 1

https://orcid.org/0000-0001-7239-4289 acerca do abandono da terapia antirretroviral durante a


COVID-19.
Marcelo da Silva 1,2

https://orcid.org/0000-0002-0376-0430

Marcela Demitto Furtado1


Objetivo: identificar os fatores associados ao abandono da terapia
https://orcid.org/0000-0003-1427-4478
antirretroviral entre adolescentes e jovens vivendo com HIV/aids
durante a pandemia de COVID-19. Método: estudo caso-controle
realizado entre 2020 e 2021 em Maringá, Paraná. Os casos foram:
adolescentes e jovens (10 a 24 anos) diagnosticados com HIV/aids
e que abandonaram o tratamento, enquanto o grupo dos controles
foi composto por pessoas com características sociodemográficas
semelhantes, diagnosticadas com HIV/aids, sem histórico de abandono
de tratamento. O pareamento dos casos e controles foi por meio de
conveniência, sendo quatro controles para cada caso. O instrumento
de pesquisa apresentou variáveis sociodemográficas, características
clínicas e outras, cuja associação com o abandono do tratamento foi
*
Artigo extraído da dissertação de mestrado “Preditores para analisada por meio de regressão logística. Resultados: 27 casos e
o abandono da terapia antirretroviral entre adolescentes e 109 controles foram incluídos no estudo (proporção 1/4). A variável
jovens vivendo com hiv/aids”, apresentada à Universidade associada à maior chance de abandono foi idade próxima de 22,8
Estadual de Maringá, Maringá, PR, Brasil. O presente
anos (ORaj.:1,47; IC95%:1,07-2,13; p=0,024). O uso esporádico de
trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) -
preservativo (ORaj:0,22; IC95%:0,07-0,59; p=0,003) e ter infecção
Código de Financiamento 001, Brasil. oportunista (OR:0,31; IC95%:0,10-0,90; p=0,030) foram fatores de
1
Universidade Estadual de Maringá, Maringá, PR, Brasil. proteção. Conclusão: idade próxima a 23 anos na última consulta
2
Prefeitura do Município de Maringá, Ambulatório Municipal foi associada ao abandono da terapia antirretroviral. A presença de
de IST/HIV/AIDS, Maringá, PR, Brasil.
infecção oportunista e o uso de preservativo são fatores determinantes
para continuidade do tratamento durante a COVID-19.

Descritores: HIV; Síndrome de Imunodeficiência Adquirida;


COVID-19; Pacientes Desistentes do Tratamento; Adolescente;
Adulto Jovem.

Como citar este artigo

Piran CMG, Cargnin AVE, Shibukawa BMC, Oliveira NN, Silva M, Furtado MD. Antiretroviral therapy abandonment
among adolescents and young people with HIV/AIDS during COVID-19: A case-control study. Rev. Latino-Am. Enfermagem.
2023;31:e3948 [cited ]. Available from: . https://doi.org/10.1590/1518-8345.6497.3948
ano mês dia URL
2 Rev. Latino-Am. Enfermagem 2023;31:e3949.

Introdução métodos preventivos deve ser diversificada e ampla de


modo a proporcionar uma maior abrangência entre a
No final do ano de 2019, na cidade de Wuhan, China, população. Assim, a prevenção combinada é uma estratégia
observou-se o início da transmissão do vírus Sars-CoV-2, muito eficaz visto que envolve o uso de diferentes
agente etiológico de Síndrome Respiratória Aguda Grave 2, abordagens de prevenção que podem ser utilizadas por
denominada como COVID-19. Logo, em março de 2020, vários níveis da sociedade, com a finalidade de atender às
foi declarado o estado de pandemia, tornando-se um dos necessidades dos diferentes segmentos populacionais(7).
maiores desafios sanitários da atualidade .
(1)
Dentre as estratégias de prevenção, vale destacar que
As pessoas com comorbidades crônicas, como a TARV visa reduzir a carga viral do indivíduo diagnosticado
diabetes, hipertensão, asma, doenças cardiovasculares, com HIV/aids, podendo até se tornar indetectável e
obesidade, doença pulmonar crônica, doença hepática, assim diminuir os riscos de transmissão do vírus, além de
doença renal e pessoas imunocomprometidas, dentre melhorar a qualidade e expectativa de vida das pessoas
as quais destacam-se as pessoas vivendo com o Vírus que têm HIV/aids. Porém, apesar da existência de diversas
da Imunodeficiência Humana (HIV), foram orientadas a estratégias de intervenção e prevenção para a contenção
tomarem precauções extras, por serem mais suscetíveis desse agravo, a não adesão e/ou abandono de tratamento
a quadros graves e complicações em decorrência da continua sendo um desafio global, refletindo no aumento
COVID-19, apresentando, consequentemente, maior de casos em determinados grupos etários(8-10).
risco para óbito .
(2)
Para que se tenha sucesso no tratamento, a adesão à
Mesmo transcorridas mais de três décadas após o TARV é um dos principais fatores envolvidos. Entretanto,
surgimento do HIV, o agente responsável pela Síndrome percebe-se que ainda há descontinuação e abandono da
da Imunodeficiência Adquirida (aids), a doença ainda TARV, todavia não são totalmente conhecidos os motivos
representa um sério desafio para a saúde pública no que estão associados a este desfecho(11-12), ainda mais
mundo. Cerca de 37,7 milhões de pessoas estavam diante de um período pandêmico, que impactou a vida
vivendo com HIV em 2020 e apenas 28,2 milhões de das pessoas de diversas maneiras, tanto no âmbito social
pessoas tinham acesso à terapia antirretroviral (TARV). quanto no processo de saúde e doença(13).
Além disso, estima-se que aproximadamente 5 milhões Salienta-se que os dados encontrados na literatura
eram jovens com idades entre 15 e 24 anos(3). são controversos e insuficientes, visto que há relatos de
No Brasil, na faixa etária de 15 a 24 anos, do fatores associados à idade, distância do serviço, renda
sexo feminino, houve redução na taxa de detecção do familiar, conhecimento acerca do HIV/aids e infecções
HIV, sendo que no ano de 2010 foram 18,5 por 100 oportunistas(11-12). Contudo, os estudos encontrados não
mil habitantes e em 2020 diminuiu para 9,2 por 100 coadunam entre si. Portanto, as autoras conduziram
mil habitantes. Já em relação aos indivíduos de sexo uma scoping review com o intuito de mapear os motivos
masculino, na mesma faixa etária, a taxa foi de 27,3 para para a não adesão ou o abandono do tratamento entre
33,2 por 100 mil habitantes no período de 2010 e 2020, adolescentes e jovens que vivem com HIV/aids. Tal busca
respectivamente. Além disso, o coeficiente de mortalidade ressaltou que o estado da arte da temática é incipiente
por aids também aumentou entre os jovens de 20 a 24 no contexto nacional e internacional, e que na maioria
anos do sexo masculino, em 2010 com taxa de 3,1 e em dos casos apenas estudos transversais e descritivos são
2020 com 3,4 óbitos por 100 mil habitantes . (4)
realizados, os quais não produzem evidência de alto nível
Este período de adolescência e juventude é de confiança, o que compromete avanços da área.
demarcado por intensas mudanças físicas, emocionais Logo, este estudo justifica-se pela necessidade
e comportamentais, que envolvem novas experiências, de elucidar a complexidade envolvida no abandono da
dentre as quais algumas podem acarretar riscos à saúde. TARV por métodos que possuam maior nível de evidência.
Diante disso, o sistema de saúde necessita ampliar a Por sua vez, os estudos longitudinais, como este, são
visão dos fatores associados às Infecções Sexualmente cruciais para identificação e análise dos fatores intrínsecos
Transmissíveis (ISTs), trazendo à tona discussões acerca e extrínsecos acerca do abandono da TARV, além de
da vulnerabilidade, sexualidade e ISTs, como o HIV. produzir subsídio para avanços na assistência à saúde.
Consequentemente, aumentando as informações sobre Os resultados do estudo poderão auxiliar os
o teste do HIV, diagnóstico precoce, tratamento adequado profissionais de saúde, em especial o enfermeiro,
e prevenção(5-6). na elaboração de um plano de cuidado integral e
Cada indivíduo ou grupo social possui estilos e de estratégias de adesão à TARV de acordo com as
experiências de vida, riscos e percepções distintas necessidades de cada adolescente e jovem vivendo
relacionadas ao HIV/aids e dessa forma, a oferta de com HIV/aids. Salienta-se que o período pandêmico é

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permeado por desafios para os cuidados na segurança identificar as tendências estatísticas dos agravos de
do paciente e disponibilidade de medicação atrelados ao mortalidade e morbidade em todo o mundo — referente
isolamento social. Portanto, o objetivo deste estudo foi ao HIV/aids: B20.0 a B24, com posterior abandono da
identificar os fatores associados ao abandono da TARV TARV. Definiu-se controles: adolescentes e jovens com
entre adolescentes e jovens vivendo com HIV/aids durante CID referente ao HIV/aids, em acompanhamento no SAE,
a pandemia de COVID-19. sem histórico de abandono da TARV.
Foram considerados os seguintes critérios de
Método inclusão: ter idade entre 10 e 24 anos e ser residente
em algum município vinculado à 15ª Regional de Saúde
Desenho do estudo do Estado do Paraná. Os critérios de exclusão foram:
pacientes que evoluíram para óbito (um), transferidos
Estudo caso-controle com proporção de 1 caso/4 para outros serviços de saúde (cinco) e prontuários não
controles em adolescentes e jovens. Foram utilizadas as identificados no serviço (três).
recomendações do checklist Strengthening the Reporting Salienta-se que as expressões “adolescência” e
of Observational Studies in Epidemiology (STROBE)(14) “juventude” se referem às faixas etárias dos 10 aos
para condução e apresentação do estudo. 19 anos e dos 20 aos 24, respectivamente(15).

Local do estudo Amostra

O local de estudo foi o Serviço de Atenção Após análise exploratória dos prontuários dos
Especializada (SAE) pertencente ao Ambulatório de IST/ participantes prospectivos, definiu-se a utilização da
HIV/aids da 15ª Regional de Saúde, localizado no munícipio população total em detrimento a uma amostra. Desta
de Maringá- Paraná, o qual oferece mais dois serviços forma, todos os usuários do SAE foram incluídos
distintos, o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) na amostra, observando-se os critérios de seleção
e a Unidade Dispensadora de Medicamentos. O estudo foi supracitados. O pareamento de um (1) caso para quatro
realizado neste local por se tratar de serviço de referência (4) controles se deu por conveniência. Assim, foram
que presta atendimento às pessoas com ISTs residentes selecionados quatro controles (109) para cada caso (27).
em um dos 30 municípios pertencentes à 15ª Regional O pareamento ocorreu segundo as características
de Saúde, os quais são pactuados na rede de atenção. sociodemográficas dos participantes, consideradas como
fatores intrínsecos não modificáveis, sendo sexo, idade e
Participantes desfecho do abandono. Ainda, o pareamento considerou
a área de residência dos usuários do serviço, a fim de
Os casos foram definidos como: adolescentes e garantir a homogeneidade entre os grupos. A Figura 1
jovens (entre 10 e 24 anos de idade), com Classificação apresenta um fluxograma elaborado para evidenciar a
Internacional de Doenças (CID) — serve de base para seleção dos pacientes.

Adolescentes e jovens
vivendo com HIV/aids
avaliado para elegibilidade
em 2020-2021 (n=144)
Seleção

Pacientes excluídos (n=9):


- Pacientes que evoluíram para óbito (n=1);
- Transferidos para outros serviços de saúde (n=5);
- Prontuários não identificados no serviço (n=3).

Pacientes para parear os


Pareamento

grupos de caso e controle


(n=136)

Grupo de Casos Grupo de Controles


(n=27) (n=109)

Figura 1 - Fluxograma de síntese da seleção dos pacientes que compuseram os grupos caso e controle de adolescentes
e jovens vivendo com HIV/aids na 15ª Regional de Saúde. Maringá, PR, Brasil, 2022

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O período de recrutamento, exposição e Viés


acompanhamento foi entre março de 2020 e dezembro de
2021, sendo marcado pelo advento da pandemia COVID-19. O viés de seleção foi abordado a partir da utilização
A coleta de dados foi realizada entre março e maio de 2022. dos números de registro dos prontuários, que foram
checados por dois pesquisadores independentes.
Variáveis Durante o tratamento dos dados, foram removidos
outliers, de forma que se mantivesse a integridade da
Todas as variáveis foram coletadas dos prontuários de base de dados e dos resultados, diminuindo a chance
saúde. Uma variável dependente (abandono da TARV) foi de viés de análise. Ademais, as análises consideraram
adotada para a regressão logística, verificando-se a influência nulo valores faltantes, retirando os participantes que não
de variáveis independentes na variável dependente. apresentassem todas as variáveis elencadas, mitigando
a ação dos fatores de confusão.
Variável dependente O estudo contou com validação dos dados e
Como variável dependente (desfecho), foi considerado resultados por parte de especialistas no método, como
o abandono da TARV. A definição de abandono da TARV, forma de evitar um viés de interpretação. Contudo,
conforme a Nota técnica n° 208/09 do Ministério da Saúde, destaca-se a possibilidade da ocorrência de vieses e de
é a não retirada de medicações antirretrovirais junto à fatores de confusão, sendo elencados como limitações
farmácia do serviço, a partir de três meses após a data do estudo.
prevista e o não retorno às consultas em seis meses(16).
Análise de dados
Variáveis independentes
Foram selecionadas variáveis voltadas às características Os dados foram tabulados em planilhas eletrônicas,
sociodemográficas [idade do diagnóstico, idade da última importados e analisados no software R, versão 4.2.0.
consulta, estado civil, orientação sexual, raça/cor, A análise descritiva ficou condicionada à natureza da
escolaridade, ocupação, zona de moradia, moradia, variável, dessa forma as variáveis categóricas foram
distância do serviço até a residência em minutos (min) descritas por meio de frequência absoluta e relativa,
e quilômetros (km)]; características epidemiológicas e com uso dos Teste de Qui-Quadrado de Pearson e Teste
comportamentais [uso de tabaco, uso de álcool, drogas Exato de Fisher, conforme pressupostos do uso de cada
ilícitas, uso de preservativo, tipo de parceiro (a) sexual, teste. Para variáveis quantitativas, foi testada normalidade
parceiro (a) é HIV+, comorbidades, diagnóstico de pelo teste de Shapiro-Wilk e avaliação dos histogramas,
transtornos mentais, uso de psicotrópicos, antecedentes com posterior uso dos testes T de Student ou Wilcoxon,
criminais, morador de rua]; e características do teste paramétrico e sua contraparte não paramétrica,
diagnóstico e acompanhamento (meio de transmissão, respectivamente.
local de encaminhamento, primeiro resultado de carga Para identificação dos fatores associados ao
viral, último resultado de carga viral, primeiro resultado abandono da TARV, foi utilizado modelo de regressão
de CD4+, último resultado de CD4+). Com a finalidade logística, sendo a variável dependente o abandono ou
de garantir a comparabilidade dos dados, o instrumento não da TARV, classificada como abandono (1) e não
foi utilizado tanto para os casos quanto para os controles. abandono (0). Cada variável explicativa foi testada
individualmente e aquelas que apresentaram valor-p <
Fonte de dados 0,20 foram incluídas no modelo múltiplo inicial. Utilizou-
se também a metodologia de stepwise para encontrar
Os dados foram colhidos de fontes secundárias por o melhor ajuste do modelo final e adotou-se, para
meio dos prontuários disponibilizados no ambulatório permanência no modelo final, nível de significância de
pelo pesquisador principal. O instrumento de coleta de 5% ou controle dos parâmetros de teste. A metodologia
dados foi elaborado com base nas recomendações do stepwise utiliza o critério de informação de Akaike (AIC)
Ministério da Saúde com relação à ficha de notificação, para identificar o modelo que se ajusta adequadamente.
TARV e seguimento ambulatorial de casos de HIV/aids. A adequação do modelo de regressão foi avaliada
O instrumento passou por análise de conteúdo e semântica a partir dos pressupostos de heterocedasticidade e
durante o processo avaliativo do projeto de pesquisa para normalidade dos resíduos, além dos testes de máximo
verificar se o mesmo estava apto para ser utilizado e verossimilhança para estimação dos coeficientes. Para
responder ao objetivo do estudo, mesmo tratando-se de identificação de possível multicolinearidade das variáveis
uma coleta de dados secundários. foram testadas a covariância, por meio de matrizes

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de covariância, e o fator inflacionário da variância Resultados


(VIF), considerando o valor maior ou igual a 2,5 como
indicativo positivo. Foram registradas 144 entradas de pacientes
De forma a facilitar a interpretação dos coeficientes adolescentes e jovens (10 a 24 anos) vivendo com HIV/
(β), procedeu-se à exponenciação para estimação de Odds aids no SAE durante a COVID-19, sendo elegíveis para
Ratio (OR) e Intervalos de Confiança (IC95%). Ainda, foi o estudo 136 adolescentes e jovens, sendo 24 casos
feita avaliação preditiva do modelo a partir da estimação (abandono) e 109 controles (não abandono). Em relação ao
da Receiver Operating Characteristic Curve (Curva ROC) e perfil sociodemográfico dos adolescentes e jovens vivendo
de uma Matrix de Confusão, com estimação de acurácia, com HIV/aids dos casos e controles, 89% apresentaram
sensibilidade e especificidade, com aplicação do Teste de diagnóstico entre 20 e 24 anos de idade, sexo masculino e
McNemar para identificação da significância, com nível de sem companheiro, respectivamente. Notou-se que 81% dos
significância de 95%. casos e 89% dos controles eram homossexual/bissexual,
70% da cor/raça branca abandonaram o tratamento e
Aspectos éticos 47,3% não abandonaram a TARV. Em ambos grupos 90%
apresentaram até 12 anos de escolaridade, 59% eram
Apesar de não ter havido contato direto com os desempregados/do lar, além disso, no grupo de casos
pacientes, os prontuários apresentam informações 96% residiam na zona urbana e no grupo de controles,
individuais que são sigilosas. Deste modo, o estudo foi 98%. Diante disso, esses achados permitem verificar o
desenvolvido seguindo todos os preceitos éticos e legais quanto os dados dos grupos apresentam homogeneidade.
das Resoluções n 466/12 e 510/16 do Conselho Nacional
o
Identificou-se associação estatisticamente significante entre
de Saúde (CNS), sendo aprovado no Comitê Permanente o abandono da TARV e a variável “idade na última consulta”,
de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da “ter idade próxima da média de 22,8 anos” (p=0,132) e
Universidade Estadual de Maringá/PR sob parecer “distância do serviço até a residência do paciente em km”,
n 5.202.623 (CAAE: 52331221.3.0000.0104).
º
sendo 17,3 km (p=0,012) (Tabela 1).

Tabela 1 - Distribuição das características sociodemográficas dos adolescentes e jovens vivendo com HIV/aids na 15ª
Regional de Saúde. Maringá, PR, Brasil, 2022
Abandono Não Abandono Total
Características sociodemográficas n=27 n=109 N=136 p valor*
n(%)† n(%)† N(%)†
Idade no diagnóstico (anos) 0,764‡
15 a 19 3 (11,0) 17 (16,0) 20 (14,7)
20 a 24 24 (89,0) 92 (84,0) 116 (85,3)
Idade na última consulta 0,132§
22,8 (1,2) ||
22 (2,8) ||
22,1(2,6) ||

Gênero >0,999‡
Feminino 3 (11,0) 12 (11,0) 15 (11,0)
Masculino 24 (89,0) 97 (89,0) 121 (71,3)
Estado civil >0,999‡
Sem companheiro 24 (89,0) 97 (89,0) 121 (89,0)
Com companheiro 3 (11,0) 12 (11,0) 15 (11,0)
Orientação sexual 0,330‡
Heterossexual 5 (19,0) 12 (11,0) 17 (12,5)
Homossexual/bissexual 22 (81,0) 97 (89,0) 119 (87,5)
Cor/Raça 0,233‡
Amarela 0 (0,0) 1 (1,8) 1 (1,2)
Branca 19 (70,0) 26 (47,3) 45 (54,9)
Parda 7 (26,0) 23 (41,8) 30 (36,6)
Preta 1 (3,7) 5 (9,1) 6 (7,3)
Escolaridade >0,999‡
< 12 anos 19 (90,0) 81 (90,0) 100 (90,1)
12 anos ou mais 2 (9,5) 9 (10,0) 11 (9,9)
(continua na próxima página...)

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6 Rev. Latino-Am. Enfermagem 2023;31:e3949.

(continuação...)

Abandono Não Abandono Total


Características sociodemográficas n=27 n=109 N=136 p valor*
n(%)† n(%)† N(%)†
Ocupação 0,793‡
Serviços 5 (19,0) 16 (15,0) 21 (15,4)
Ocupação de Nível Técnico/Superior 6 (22,0) 29 (27,0) 35 (25,7)
Outros (desempregado/do lar) 16 (59,0) 64 (59,0) 80 (58,8)
Zona de moradia 0,488‡
Rural 1(3,7) 2(1,8) 3 (2,2)
Urbana 26(96,0) 107(98,0) 133 (97,8)
Moradia 0,952¶
Mora sozinho 9 (33,0) 40(37,0) 49 (36,3)
Mora com familiares/parceiro 15(56,0) 56(52,0) 71 (52,6)
Mora com amigos/conhecidos 3(11,0) 12(11,0) 15 (11,1)
Distância do serviço (em km**) 0,012§
17,3(20)|| 10,9(13,3)|| 12,2(15)||
Distância do serviço (em min ) ††
0,052§
66,8(33,5)|| 56,1(38)|| 58,2(37,3)||
*Significativo quando <0,20; †Número absoluto e percentual = (Totais podem diferir devido a possibilidade de não resposta encontrada ou não preenchimento
no prontuário do paciente); ‡Teste Exato de Fisher; §Teste de normalidade pelo teste de Shapiro-Wilk e avaliação dos histogramas, com posterior uso dos
testes T de Student ou Wilcoxon, teste paramétrico e sua contraparte não paramétrica; ||Média (Desvio Padrão); ¶Teste de Qui-Quadrado de Pearson;
**km = Quilômetro; ††min = Minutos

Ressalta-se que foi escolhida a variável “Distância do 71,1% uso de outras drogas. Mostraram-se associadas ao
Serviço em quilômetros” como preferível a ser incluída no abandono da TARV as variáveis: uso de tabaco (p=0,092)
modelo múltiplo por ser uma distância fixa, enquanto a e uso de preservativo (p=0,006). Entre os jovens que
distância em minutos é uma estimativa e sofre influência de abandonaram a TARV havia proporcionalmente menos
outros fatores externos. A inserção das duas variáveis no fumantes e mais pessoas que não usam o preservativo
modelo geraria multicolinearidade, inabilitando a regressão. sempre. Quanto ao uso de preservativo, apenas 12,5%
Dentre as características epidemiológicas e afirmaram que usam sempre. Com relação ao tipo de
comportamentais, nenhum adolescente ou jovem parceiro(a) sexual, 58,1% tinham parceiros eventuais.
apresentava antecedentes criminais e nem foi morador A minoria apresentava comorbidades (4,4%), transtornos
de rua no período de estudo. Apesar de 60% não fazerem mentais (17,7%) e fazia uso de psicotrópicos (14,7%)
uso de álcool, houve 62,2% que faziam uso de tabaco e (Tabela 2).

Tabela 2 - Distribuição das características epidemiológicas e comportamentais dos adolescentes e jovens vivendo com
HIV/aids na 15ª Regional de Saúde. Maringá, PR, Brasil, 2022
Abandono Não Abandono Total
Características epidemiológicas e comportamentais n=27 n=109 N=136 p valor*
n(%)† n(%)† N(%)†
Uso de álcool 0,334‡
Sim 13 (48,0) 41 (38,0) 54 (40,0)
Não 14 (52,0) 67 (62,0) 81 (60,0)
Uso de tabaco 0,092‡
Sim 13 (48,0) 71 (66,0) 84 (62,2)
Não 14 (52,0) 37 (34,0) 51 (37,8)
Drogas ilícitas 0,296‡
Sim 17 (63,0) 79 (73,0) 96 (71,1)
Não 10 (37,0) 29 (27,0) 39 (28,9)
Uso de preservativo 0,006§
Nunca usa 15 (56,0) 29 (27,0) 44 (32,4)
Usa às vezes 8 (30,0) 67 (61,0) 75 (55,1)
Usa sempre 4 (15,0) 13 (12,0) 17 (12,5)
(continua na próxima página...)

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(continuação...)

Abandono Não Abandono Total


Características epidemiológicas e comportamentais n=27 n=109 N=136 p valor*
n(%)† n(%)† N(%)†
Tipo de parceiro (a) sexual 0,463‡

Eventual 14 (52,0) 65 (60,0) 79 (58,1)

Fixo 13 (48,0) 44 (40,0) 57 (41,9)

Parceiro (a) é HIV+ 0,523§

Não 2 (7,4) 17 (16,0) 19 (14,0)

Sim 8 (30,0) 25 (23,0) 33 (24,3)

Não sei 17 (63,0) 67 (61,0) 84 (61,8)

Comorbidades > 0,999§

Sim 1 (3,7) 5 (4,6) 6 (4,4)

Não 26 (96,0) 104 (95,0) 130 (95,6)

Diagnóstico de transtornos mentais 0,784§

Sim 4 (15,0) 20 (18,0) 24 (17,7)

Não 23 (85,0) 89 (82,0) 112 (82,3)

Uso de psicotrópico 0,764§

Sim 3 (11,0) 17 (16,0) 20 (14,7)

Não 24 (89,0) 92 (84,0) 116 (85,3)


*Significativo quando <0,20; †Número absoluto e percentual = (Totais podem diferir devido a possibilidade de não resposta encontrada ou não preenchimento
no prontuário do paciente); ‡Teste de Qui-Quadrado de Pearson; §Teste Exato de Fisher

Quanto às características do diagnóstico e primeiro resultado de carga viral e último resultado do


acompanhamento, as variáveis infecção oportunista, CD4+ apresentaram significância estatística (Tabela 3).

Tabela 3 - Distribuição das características do diagnóstico, tratamento e acompanhamento de adolescentes e jovens


vivendo com HIV/aids na 15ª Regional de Saúde. Maringá, PR, Brasil, 2022

Abandono Não Abandono Total


Características do diagnóstico e
n=27 n=109 N=136 p valor*
acompanhamento
n(%) †
n(%) †
N(%) †

Local de encaminhamento 0,301‡


CTA§ 12 (44,0) 66 (61,0) 78 (57,4)
Hospital/Hemocentro 1 (3,7) 7 (6,4) 8 (5,9)
Transferência de outro SAE|| 10 (37,0) 26 (24,0) 36 (26,5)
UBS¶ 4 (15,0) 10 (9,2) 14 (10,3)
Infecção Oportunista 0,065**
Sim 17 (63,0) 87 (80,0) 104 (76,5)
Não 10 (37,0) 22 (20,0) 32 (23,5)
Primeiro resultado de carga viral 0,047††
83,537.6 (244,813.8)‡‡ 115,807.7 (196,625.6)‡‡ 110,253.0 (204,958.0)‡‡
Último resultado de carga viral 0,538††
11,801.5 (18,348.1)‡‡ 83,612.6 (204,373.0)‡‡ 64,804.9 (177,948.0)‡‡
Primeiro resultado de CD4+ §§
0,113††
605.9 (296.3) ‡‡
589.2 (743.4) ‡‡
592.1 (684.9) ‡‡

Último resultado de CD4+ §§


0,004††
1,499.2 (3,038.8) ‡‡
1,105.6 (3,620.2) ‡‡
1,174.2 (3,516.0) ‡‡

*Significativo quando <0,20; †Número absoluto e percentual = (Totais podem diferir devido a possibilidade de não resposta encontrada ou não preenchimento
no prontuário do paciente); ‡Teste Exato de Fisher; §CTA = Centro de Testagem e Aconselhamento; ||SAE = Serviço de Atenção Especializada; ¶UBS =
Unidade Básica de Saúde; **Teste de Qui-Quadrado de Pearson; ††Teste de normalidade pelo teste de Shapiro-Wilk e avaliação dos histogramas, com
posterior uso dos testes T de Student ou Wilcoxon, teste paramétrico e sua contraparte não paramétrica; ‡‡Média (Desvio Padrão); §§CD4+ = Células do
sistema imunológico (linfócitos)

O melhor modelo da análise de regressão logística ajustada que quanto maior a idade, maiores as chances de
foi composto por cinco variáveis. Verificou-se na análise abandono do tratamento (ORaj.: 1,47; IC95%: 1,07-2,13;

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8 Rev. Latino-Am. Enfermagem 2023;31:e3949.

p= 0,024). Adolescentes e jovens que usaram às vezes o curva ROC, verificou-se acuraria geral com área 0,63
preservativo (ORaj: 0,22; IC95%: 0,07-0,59; p= 0,003) (IC95%: 0,47-0,78) apresentando-se estatisticamente
e aqueles que apresentaram infecção oportunista (OR: significativo (p=0,001), com sensibilidade de 83%
0,31; IC95%: 0,10-0,90; p= 0,030) obtiveram menos que corresponde a capacidade de classificar o modelo
chances para o abandono da TARV, sendo consideradas com boa capacidade preditiva (verdadeiro positivo)
fatores de proteção. No modelo logístico preditivo pela (Tabela 4).

Tabela 4 - Regressão logística e Curva ROC* de acordo com as variáveis com significância estatística do abandono
da TARV entre adolescentes e jovens vivendo com HIV/aids na 15ª Regional de Saúde. Maringá, PR, Brasil, 2022

Estimação dos Parâmetros do Modelo por Regressão Logística

Variáveis OR† IC‡ 95% ORaj§ IC‡ 95% p||

Idade na última consulta

Média 22,8 1,27 [0,99-1,71] 1,47 [1,07-2,13] 0,024

Distância do serviço (em km¶)

Média 17,3 1,02 [0,99-1,04] 1,02 [0,99-1,05] 0,101

Uso de preservativos

Nunca usa 1 - 1 - -

Usa às vezes 0,23 [0,08-0,59] 0,22 [0,07-0,59] 0,003

Usa sempre 0,59 [0,14-2,02] 0,41 [0,08-1,56] 0,217

Infecção oportunista

Não 1 - 1 - -

Sim 0,42 [0,17-1,09] 0,31 [0,10-0,90] 0,030

Adequação do Modelo Logístico Preditivo pela Curva ROC*

Acurácia Geral 0,63 [0,47-0,78] 0,001

Sensibilidade 0,83

Especificidade 0,60
*ROC = Receiver Operating Characteristic Curve; †OR = Odds Ratio não-ajustada; ‡IC = Intervalo de Confiança; §ORaj = Odds Ratio ajustada; ||Significativo
quando <0,05; ¶km = quilômetro

Discussão com faltas de informações cruciais para classificação do


caso e controle, o prontuário foi excluído.
Com a identificação dos fatores associados ao Dentre as características sociodemográficas, ter
abandono da TARV entre adolescentes e jovens vivendo com idade próxima da média de 22,8 anos na última consulta
HIV/aids durante a pandemia de COVID-19, observou-se dentro do período de acompanhamento apresentou
que ter idade próxima da média de 22,8 anos na última maiores chances para o abandono da TARV. Deste modo,
consulta foi um fator que indicou maiores chances para o o fato de estar em período de transição de cuidados de
abandono da TARV. Residir a mais de 17,3 km de distância jovem para adulto configura-se como um elemento que
do serviço permaneceu como variável controle para as predispõe a interrupção do seguimento ambulatorial, ainda
demais, considerando a influência que tem na assistência mais durante uma pandemia que restringe o contato social
à saúde. O uso de preservativo esporadicamente e ter e o acesso aos serviços de saúde em decorrência da
infecção oportunista foram fatores de proteção para emergência sanitária com foco na COVID-19(17).
abandono da TARV. Esses achados possibilitam reflexões Corroborando os achados, estudo realizado na Uganda
acerca das implicações que transpõem o diagnóstico e com adolescentes e jovens vivendo com HIV, selecionados
o acompanhamento clínico dos adolescentes e jovens em clínicas especializadas, mostrou que a transição de
vivendo com HIV/aids durante a pandemia da COVID-19, cuidados ocorre geralmente entre 22 e 24 anos de idade,
em interface com questões individuais, do estilo de vida uma vez que maturidade cognitiva, sexual, psicológica
e voltada à infecção. e física podem influenciar nesse processo(18). Estudo de
Considerando que o estudo partiu de uma análise coorte retrospectivo, realizado com adolescentes e jovens
retrospectiva, reconhece-se como limitação o viés de na Tanzânia, também identificou que ter idade entre 20
informação devido a deficiências nos registros por conta da e 24 anos foi associado à redução da adesão, mostrando
utilização de fontes secundárias. No entanto, em situações que um a cada três jovens abandonam à TARV(19).

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Ainda nesse contexto de transição de cuidados, A probabilidade de supressão viral está relacionada
diante da fragilidade do sistema imunológico desde o à adesão as consultas e a TARV, assim os resultados em
diagnóstico juntamente com o cenário pandêmico, houve saúde melhoram a longo prazo. Entretanto no período de
muitos desafios e mudanças, tanto de ordem psicológica pandemia, adolescentes e jovens mostraram-se vulneráveis
e social quanto de ordem biológica. Contexto que retratou às interrupções no acompanhamento e tratamento da
um maior risco de infecção e complicações relacionadas à doença. O isolamento e/ou distanciamento social foi a
COVID-19 e à progressão da aids, ainda mais em pessoas principal medida de prevenção durante a pandemia, assim,
que não realizam o tratamento .
(20)
as interações com os profissionais de saúde do serviço
Salienta-se que uma transição fragilizada pode colocar de atenção especializada, o monitoramento semestral de
o paciente em risco por conta do estigma enfrentado, CD4 e Carga Viral, o acesso aos medicamentos destinados
consequentemente, ocorrendo a perda de continuidade ao tratamento do HIV e de doenças oportunistas foram
do acompanhamento, refletindo na diminuição da adesão prejudicados, uma vez que muitos dos pacientes utilizam
aos cuidados e à TARV. Desse modo, há um aumento de transporte coletivo para chegar ao serviço de saúde e com
resistência aos medicamentos, diminuição da imunidade, medo de se contaminar com a COVID-19 acabaram não
logo, acarretando morbidade por infecções oportunistas aderindo ao tratamento(20,24).
e risco de transmissão do vírus, especialmente quando No que concerne às características epidemiológicas
os adolescentes e jovens são sexualmente ativos(17-18). e comportamentais, identificou-se no presente estudo
Para que não haja o abandono de cuidados e da que o uso eventual do preservativo é um fator de
TARV torna-se importante que a transição de cuidados proteção para abandono do tratamento de adolescentes
seja bem-sucedida, com destaque quando se vivencia um e jovens que vivem com HIV/aids. Estudo desenvolvido
período pandêmico em que o dia a dia passa ser permeado na Uganda identificou altas taxas de jovens em TARV
por desafios. Porém, sabe-se que muitos adolescentes e que estão sexualmente ativos e fazem o uso eventual do
jovens deixam de participar dos serviços de saúde durante preservativo(25). Pesquisa realizada de forma on-line com
essa fase da vida por não saber a verdadeira necessidade 148 pessoas vivendo com HIV/aids durante a pandemia
do tratamento, assim, o processo de transição ainda é apontou que 12,2% reduziram o uso de preservativos
uma dificuldade na cascata de cuidados do HIV (21)
. nas relações sexuais(26).
A variável distância do serviço em km, residir a mais Os pacientes que fazem uso do preservativo, mesmo
de 17,3 km do serviço, permaneceu como controle das que eventualmente, são mais suscetíveis a manter adesão
outras variáveis, estando associada ao abandono da TARV, à TARV. Entretanto, há necessidade de incentivar o uso
o que corrobora com o outro estudo que mostrou que do preservativo e adesão à TARV, pois nos casos de
residir a mais de 5 km da unidade de saúde tem sido um uso inconsistente do preservativo entre os pacientes
preditor para não adesão da TARV .
(22)
com o HIV e o risco de não adesão à TARV, pode-se
A interferência do acesso geográfico, da distância aumentar os casos de superinfecção por HIV (infecção
e o deslocamento da residência do paciente até o de um indivíduo HIV positivo com outra cepa do vírus),
serviço de saúde, é um grande obstáculo, sobretudo resistência às medicações, além da disseminação de cepas
em decorrência do serviço ofertado para as pessoas que resistentes aos antirretrovirais para seus parceiros fixos
vivem com HIV/aids estar centralizado num único espaço ou eventuais(27-29).
físico (23)
. É importante considerar que, durante a rota Nesse sentido, os profissionais de saúde necessitam
geográfica, alguns necessitam de um tempo maior para fortalecer ainda mais as ações de autocuidado(25,30),
o deslocamento até o serviço de atenção especializada, com incentivo da prevenção combinada, uma vez que
e, consequentemente, enfrentam maiores obstáculos de adolescentes e jovens são uma população prioritária
acessibilidade para o cuidado e acesso à TARV . (9)
para acessos às intervenções biomédicas: distribuição
Destaca-se que o acesso ao serviço de atenção de preservativos externos e internos, lubrificantes, uso
especializada em saúde é um fator influente na adesão de antirretrovirais proporcionando acesso ao tratamento
ao cuidado em HIV/aids e a TARV, principalmente por sua para todas a pessoas (TTP), a Profilaxia Pós-Exposição
cronicidade. Com isso, a falta de integração com outros (PEP) e a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP); intervenções
serviços de saúde, sobretudo os que estão integrados a comportamentais: incentivo ao uso dos preservativos,
atenção primária, associada à centralização da assistência testagem, adesão às intervenções biomédicas,
especializada, pode favorecer a fragmentação do aconselhamento sobre HIV/aids, redução de danos para
desenvolvimento de ações e estratégias de promoção e as pessoas que usam álcool e outras drogas ilícitas, como
prevenção a saúde(23). também comunicação e educação em saúde entre pares;

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10 Rev. Latino-Am. Enfermagem 2023;31:e3949.

e por fim, intervenções estruturais: ações voltadas aos estudo atender ao objetivo proposto e a hipótese, este
fatores socioculturais que influenciam diretamente na foi realizado em uma realidade local e não nacional,
vulnerabilidade de indivíduos ou de grupos sociais ao consequentemente impedindo a generalização dos
HIV; destaca-se que todas as intervenções podem ser achados em outros contextos. Tal fato sugere a realização
utilizadas em conjunto, a fim de reduzir a transmissão de pesquisas com populações maiores.
do HIV entre os pares (7,30)
. No entanto, no âmbito da área de saúde e
Acredita-se que o abandono da TARV durante a enfermagem, este estudo proporcionou conhecimento
pandemia também possa ser um reflexo de pessoas que teórico e operacional, por meio da identificação de fatores
ainda não compreenderam totalmente a importância associados ao abandono da TARV entre adolescente
de se cuidar e de cuidar do próximo (25)
. Porém, é e jovens durante um período pandêmico, o qual pode
importante considerar que, no contexto do estudo subsidiar as políticas públicas de saúde para o planejamento
durante a COVID-19, muitos pacientes acabam se e gestão do cuidado aos adolescentes e jovens vivendo
tornando indetectáveis (pessoa com HIV e com carga com HIV/aids. No mais, deve-se investir no suporte
viral indetectável que não transmite o HIV sexualmente) social para esses pacientes, seus familiares e a equipe
e em alguns casos seus parceiros faziam uso da PrEP, de saúde, especialmente a equipe de enfermagem, pois
assim nem sempre faziam o uso do preservativo. o trabalho deve envolver todos que saibam da sorologia
Com relação às características do diagnóstico e do adolescente e jovem com a finalidade de melhorar a
acompanhamento, a presença de uma ou mais infecções qualidade de vida e sobrevida a partir da adesão à TARV.
oportunistas mostrou-se como fator de proteção para o
abandono. Os pacientes que desenvolvem a aids apresentam Conclusão
uma baixa contagem de CD4, assim têm imunidade reduzida,
consequentemente, ficam mais doentes e propensos A idade próxima a 23 anos na última consulta foi
a infecções oportunistas. Estudo realizado na Tanzânia, associada ao abandono da terapia antirretroviral. Já a
evidenciou que pacientes sintomáticos ou que percebem presença de infecção oportunista e uso esporádico de
algum risco a saúde são mais propensos a aderir à TARV a preservativo são fatores determinantes para o abandono
fim de melhorar sua condição de saúde (19)
. da TARV durante a pandemia da COVID-19, evidenciando
O serviço de saúde, local desta pesquisa, sofreu que tanto características sociodemográficas, quanto
mudanças substanciais no período de pandemia, epidemiológicas e comportamentais exercem influência
como diminuição no número de consultas por dia e na cessação do tratamento.
receitas médicas com maior tempo para aquisição dos Portanto, este e futuros estudos permitem elencar
medicamentos a fim de evitar aglomeração e contaminação possibilidades de mudanças no cenário do atendimento de
por COVID-19, o que acabou por limitar as atividades já adolescentes e jovens no enfrentamento do HIV/aids, visto
programadas. Observou-se em estudo que municípios com que se elucidaram os motivos geradores do abandono e
maior demanda com a COVID-19 têm uma estimativa de seguimento da TARV. Isso viabiliza a revisão de políticas
mortes por HIV em cinco anos com acréscimo de 10%, públicas e a atuação efetiva do enfermeiro na construção
comparadas à períodos sem pandemia (31)
. de um plano de cuidados que sejam coerentes com as
No Brasil, o combate ao HIV tem sido considerado necessidades e demandas apresentada pelos sujeitos
exemplar, porém muitas pessoas vivendo com o HIV ainda que vivem neste contexto e têm predisposição para o
não têm acesso ao tratamento e durante os últimos dois abandono do tratamento.
anos, com o reflexo da COVID-19, o progresso contra o
HIV enfraqueceu, assim muitas vidas ficaram em risco. Referências
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Editor Associado:
https://unaids.org.br/2022/07/unaids-lanca-relatorio- Ricardo Alexandre Arcêncio
global-2022-em-perigo/ Copyright © 2023 Revista Latino-Americana de Enfermagem
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