12 Biodiv 12 Caps6e7
12 Biodiv 12 Caps6e7
12 Biodiv 12 Caps6e7
Diversidade de anfíbios
e répteis em áreas
prioritárias para a
conservação da Caatinga
Cristina Arzabe
(organizadores)
Resumo
1. Introdução geral
228
esse bioma uma região climática única no mundo, explicando em par-
te a escassez de informações naturalísticas sobre os anfíbios e répteis
(RODRIGUES, 2003).
As pesquisas sobre a herpetofauna do bioma caatinga são pontu-
ais, tais como os trabalhos com a anurofauna de Pernambuco realizados
por Miranda (1983) ou na Paraíba, por Cascon (1987) e Arzabe (1999), e
expressam uma situação particular. Mesmo os resultados apresentados
por Vanzolini et al. (1980), são voltados exclusivamente aos répteis. O
mais expressivo desses exemplos, mas também restrito aos répteis, é
o estudo da herpetofauna das dunas do Rio São Francisco realizado por
Rodrigues (1991a, 1991b, 1991c, 1991d, 1993a, 1993b, 1996), que apresen-
ta uma composição exclusiva e diferenciada de qualquer outro local da
caatinga, com mais de 10 espécies endêmicas até o momento. Em alguns
trabalhos mais amplos sobre padrões de distribuição também se discute
a caatinga (HEYER, 1988; VITT, 1980, 1985, 1995; VITT; GOLDBERG, 1983;
VITT; VANGILDER, 1993). Assim, estudos nessa área devem ser motiva-
dos em caráter urgente, para que, caracterizada a sua diversidade e dis-
tribuição, se possam recomendar ações prioritárias para a sua efetiva
proteção e conservação.
Nas áreas de vegetação xeromórfica, são encontradas 167 espécies
de anfíbios e répteis. Dentre as 51 espécies de anfíbios, 48 são anuros
(Bufonidae, Hylidae, Leptodactylidae, Microhylidae e Pipidae) e três são
cecílias (Caeciliidae). Dentre as 116 espécies de répteis, 47 são lagartos
(Anguidae, Gekkonidae, Gymnophthalmidae, Iguanidae, Polychrotidae,
Teiidae, Tropiduridae e Scincidae), 10 são anfisbenídeos (Amphisbaeni-
dae), 52 são serpentes (Boidae, Colubridae, Elapidae, Leptotyphlopidae,
Typhlopidae e Viperidae), quatro são quelônios (Chelidae, Kinosternidae e
Testudinidae) e três são crocodilianos (Alligatoridae) (RODRIGUES, 2003).
Dessas, aproximadamente 15% são endêmicas (MMA, 2002), como o la-
garto Tropidurus cocorobensis e a cobra-de-duas-cabeças Amphisbaena
arenaria. Todavia, até o momento, nenhuma delas consta da lista de espé-
cies ameaçadas (MMA, 2004).
Considerando a fauna presente nos fragmentos residuais de flores-
tas, como os brejos-de-altitude, enclaves de outras paisagens sem a face
típica das caatingas, os números de espécies endêmicas e a riqueza au-
mentam consideravelmente (BORGES, 1991; LIMA, 1999; BORGES-NOJO-
SA; CARAMASCHI, 2003).
Três áreas de diferentes estados do Nordeste brasileiro foram esco-
lhidas para a realização simultânea de estudos da diversidade da herpeto-
fauna: a área Reserva Serra das Almas, no município de Crateús (estado do
Ceará); a região de Curimataú, incluindo o Parque Estadual Pedra da Boca,
no município de Araruna, e a Fazenda Cachoeira da Capivara, no município
de Cacimba de Dentro (estado da Paraíba); e a área de Betânia, incluindo as
RPPNs Maurício Dantas, no município de Betânia, e Cantidiano Valgueiro,
no município de Floresta (estado de Pernambuco). Todas estão incluídas
no bioma Caatinga, embora apresentem características fitofisionômicas
diferentes e particulares. Os estudos possibilitaram verificar o padrão de
distribuição das espécies localmente e entre os três estados, permitindo
uma discussão quanto à similaridade das biotas e possíveis ocorrências de
espécies raras e/ou ameçadas. Os resultados detalhados de cada área serão
apresentados e discutidos em separado na forma de subcapítulos.
229
2. Material e métodos
230
dopaludicola sp. 1 e Adenomera sp., no Ceará, a cecília Siphonops paulensis
e os anuros Ceratophrys joazeirensis, Physalaemus kroyeri e Leptodactylus
siphax apenas na Paraíba e Hyla soaresi, Physalaemus albifrons, Pseudo-
paludicola sp. 2 e Trachycephalus atlas apenas em Pernambuco. Dessas es-
pécies, consideramos Trachycephalus atlas e Ceratophrys joazeirensis como
espécies cuja distribuição tem caráter relictual. Das demais espécies, cinco
foram registradas em dois estados e doze tiveram ampla distribuição, ocor-
rendo nos três estados (Tabela 1).
Foram registradas 26 espécies de lagartos, sendo seis com ocorrência
apenas na Paraíba (Diploglossus cf. lessonae, Phyllopezus periosus, Anoto-
saura sp.,, Colobosaura mentalis, Enyalius catenatus e Mabuya agmosticha) e
quatro apenas no Ceará (Colobosaura modesta, Enyalius bibronii, Polychrus
acutirostris e Mabuya aff. arajara). Enquanto P. pollicaris, C. mentalis, M. ag-
mosticha e P. acutirostris são amplamente registrados nos biomas Caatin-
ga e Cerrado, em áreas abertas, outras, como C. modesta e M. aff. arajara,
aparentemente apresentam distribuição relictual, restritas a ambientes mais
mésicos interligados à caatinga, como as regiões adjacentes secas das serras
úmidas do estado do Ceará. Das demais espécies, oito foram registradas em
dois estados e oito nos três estados, sendo espécies consideradas de ampla
distribuição em áreas abertas, como geckonídeos, tropidurídeos e teiídeos.
De todos os resultados, os menos confiáveis são aqueles para serpen-
tes, pois as amostras contêm um número baixo de espécies e de indivíduos
esperados. Um pouco mais de 50% das 15 espécies de serpentes foi regis-
trado em apenas uma das três localidades de estudo. Quatro espécies foram
registradas apenas na Paraíba (Epicrates cenchria, Taeniophallus occipitalis,
Waglerophis merremii e Leptotyphlops borapeliotes), duas apenas no Ceará
(Bothrops erythromelas e Bothrops lutzi
lutzi) e mais duas apenas em Pernambuco
(Boa constrictor e Tantilla melanocephala). A presença de B. lutzi
lutzi, registrada
para enclaves de cerrado no nordeste, em áreas com vegetação do tipo caatin-
ga, enfatiza sua adaptação a áreas abertas e a integração dessas faunas.
A ausência de quelônios (com exceção de Pernambuco) e crocodilia-
nos (com exceção do Ceará) pode indicar tanto a falta de corpos d’água ade-
quados para a sobrevivência e reprodução desses animais aquáticos, como
a pressão antrópica sobre as áreas de estudo.
Por outro lado, muitas outras espécies não foram registradas, apesar
de apresentarem ampla distribuição no bioma, o que pode indicar um es-
forço de coleta insuficiente, podendo a ausência dessas espécies nas áreas
estudadas ser corrigida a qualquer momento.
Relação do número de espécies registradas nos pontos amostrados nos estados do Ceará, Paraíba e Pernambuco,
Figura 1
nos períodos seco e chuvoso, considerando todos os tipos de metodologia.
231
Tabela 2 - Matriz de similaridade entre as faunas de anfíbios encontradas nas diferentes fitofisionomias dos estados do Ceará,
Paraíba e Pernambuco utilizando o coeficiente de Jaccard.
São Cavalo Rio
Croatá Tucuns Grajáu Estreito Açudinho Angico PEPB FCC
Luiz Morto Pajeú
Croatá 1
São Luiz 0,182 1
Tucuns 0,25 0,273 1
Grajáu 0,143 0,471 0,063 1
Estreito 0 0,2 0,111 0,313 1
Açudinho 0,056 0,273 0,053 0,409 0,412 1
Cavalo Morto 0,077 0,353 0,071 0,368 0,357 0,611 1
Angico 0,091 0,313 0,083 0,263 0,417 0,5 0,467 1
Rio Pajeú 0,077 0,353 0,071 0,444 0,462 0,611 0,6 0,692 1
PEPB 0,095 0,391 0,091 0,458 0,333 0,583 0,5 0,348 0,435 1
FCC 0,222 0,25 0,2 0,278 0,231 0,3 0,313 0,118 0,235 0,429 1
Tabela 3 - Matriz de similaridade entre as faunas de répteis encontradas nas diferentes fitofisionomias dos estados do Ceará,
Paraíba e Pernambuco utilizando o coeficiente de Jaccard.
São Cavalo Rio
Croatá Tucuns Grajáu Estreito Açudinho Angico PEPB FCC
Luís Morto Pajeú
Croatá 1
São Luiz 0,375 1
Tucuns 0,333 0,176 1
Grajáu 0,267 0,227 0,133 1
Estreito 0,182 0,167 0,1 0,2 1
Açudinho 0,1 0,304 0,111 0,174 0,105 1
Cavalo Morto 0,25 0,353 0,182 0,176 0,167 0,438 1
Angico 0,2 0,368 0,143 0,211 0,133 0,368 0,462 1
Rio Pajeú 0,214 0,389 0,154 0,222 0,143 0,316 0,5 0,5 1
PEPB 0,133 0,273 0,067 0,3 0,138 0,355 0,207 0,31 0,194 1
FCC 0,211 0,409 0,167 0,167 0,294 0,292 0,333 0,35 0,3 0,387 1
Tabela 4 - Matriz de similaridade entre as herpetofaunas encontradas nas diferentes fitofisionomias dos estados do Ceará, Paraíba
e Pernambuco utilizando o coeficiente de Jaccard.
São Cavalo Rio
Croatá Luís Tucuns Grajáu Estreito Açudinho Morto Angico Pajeú PEPB FCC
Croatá 1
Diversidade de anfíbios e répteis
232
Os três estados somaram 11 pontos amostrados: cinco na Reserva Ser-
ra das Almas (Ceará), um no Parque Estadual Pedra da Boca e outro na Fazen-
da Cachoeira da Capivara (Paraíba), dois na Reserva Maurício Dantas e dois
na Reserva Cantidiano Valgueiro (Pernambuco). Cerca de 32% das espécies
foram registrados em apenas um dos pontos (Figura 1). Portanto, a maioria
foi coletada em dois ou mais pontos (68%), com poucas espécies sendo re-
gistradas em mais de três pontos. Apenas uma espécie, Tropidurus hispidus,
foi registrada em todos os pontos amostrados, seguida de Cnemidophorus
ocellifer, registrada em dez pontos e, embora esteja sendo tratada como uma
ocellifer
unidade taxonômica, pode ser um grupo de espécies (RODRIGUES, 2003).
Esses índices refletiram diretamente nas medidas de similaridade que
permitiram realizar a comparação da composição faunística entre os diferen-
tes pontos através do coeficiente de similaridade de Jaccard. Usando as ma-
trizes resultantes (Tabelas 2, 3 e 4), foi feita uma análise de agrupamento pelo
método UPGMA, utilizando o programa MVSP 3.11 nos cálculos das medidas
de similaridade e análise de agrupamento (Figuras 2, 3 e 4).
Os diferentes fenogramas apresentados tratam primeiro os grupos se-
paradamente (Figuras 2 e 3) e, depois, a herpetofauna como um todo (Figura
4). Percebe-se que o fenograma dos anfíbios tem maior influência no feno-
grama geral, possivelmente porque foi o grupo mais bem amostrado. Esses
dados revelam dois subgrupos: o primeiro formado por Tucuns e Croatá, no
estado do Ceará, e o segundo, pelos demais pontos. A similaridade entre Tu-
cuns e Croatá, sítios reunidos num subgrupo à parte, dá-se pela ausência de
anfíbios nos registros, talvez pela carência de corpos d’água nesses pontos.
O subgrupo maior inclui quatro subgrupos menores. Um deles engloba as
áreas da Paraíba (FCC e PEPB), que mostram certa similaridade com o sub-
grupo envolvendo as áreas do estado de Pernambuco (Rio Pajeú e Angicos,
Cavalo Morto e Açudinho). Um terceiro subgrupo, separado dos agrupamen-
tos de Pernambuco e Paraíba, engloba as demais áreas do estado do Ceará
(São Luís e Grajáu), e outro, externo a todos esses, inclui a área de Estreito
(estado do Ceará), isolada de todas as outras possivelmente por suas con-
dições ambientais fortemente antropizadas. Esses agrupamentos, portanto,
ligam pontos próximos geograficamente, sugerindo que a composição das
herpetofaunas é tão mais similar quanto mais próximas elas se encontram
geograficamente.
Concluindo, os dados sugerem que cada estado apresenta uma her-
petofauna com composição própria e que estas aparentemente são mais si-
Análise de agrupamento (UPGMA) realizada a partir da matriz dos coeficientes de similaridade de Jaccard para a
Figura 2
fauna de anfíbios dos estados do Ceará, Paraíba e Pernambuco.
233
milares entre Pernambuco e Paraíba do que entre esses estados e o Ceará, e
que, portanto, a diversidade de espécies varia numa escala regional, caracte-
rizando o aspecto multifacetado do bioma Caatinga.
Análise de agrupamento (UPGMA) realizada a partir da matriz dos coeficientes de similaridade de Jaccard para a
Figura 3
fauna de répteis dos estados do Ceará, Paraíba e Pernambuco.
Análise de agrupamento (UPGMA) realizada a partir da matriz dos coeficientes de similaridade de Jaccard para a
Figura 3
herpetofauna dos estados do Ceará, Paraíba e Pernambuco.
Diversidade de anfíbios e répteis
234
4. Recomendações e oportunidades para conservação
Agradecimentos
Aos alunos de graduação de Ciências Biológicas Fabiana Oliveira Amo-
rim (UFRPE), Igor Joventino Roberto (UFC), Júlio César Lima Melo (UFC) e
Lucas Bezerra de Mattos Brito (UFC), pela indispensável e valorosa colabora-
ção nos trabalhos de campo; ao Sr. Aureliano, pelos serviços de mateiro; ao
Dr. Ulisses Caramaschi (MNRJ), Dra. Luciana Barreto do Nascimento (PUCMi-
nas) e Dr. Vinícius Xavier da Silva (EFOA MG), pela colaboração na identifica-
ção do material; ao Dr. Guarino Colli (UnB), Dr. Rogério Pereira Bastos (UFG)
235
e Dra. Débora Leite Silvano (SETE- Soluções e Tecnologia Ambiental), pelas
revisões e valiosas sugestões; às Dra. Takako Watanabe e Cristina Crispim
(UFPB), por terem auxiliado na logística das excursões ao estado da Paraíba;
à Dra. Maria Pinheiro, chefe geral da Embrapa Meio-Norte (1999-2003), pelo
apoio e incentivo, e ao IBAMA, pelas licenças de coleta.
5. Referências bibliográficas
236
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da Caatinga. Brasília: MMA/SBF. 36p., 2002.
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RODRIGUES, M. T. Herpetofauna das dunas interiores do Rio São Francisco:
Bahia: Brasil. II. Psilophthalmus: um novo genero de microteiídeos sem pálpebra
(Sauria: Teiidae). Papéis Avulsos de Zoologia, v. 37, n. (20), p.321-327, 1991b.
RODRIGUES, M. T. Herpetofauna das dunas interiores do Rio São Francis-
co: Bahia: Brasil. III. Procellosaurinus: um novo gênero de microteiídeo sem
pálpebra, com a redefinição do gênero Gymnophthalmus (Sauria: Teiidae).
Papéis Avulsos de Zoologia, v. 37, n. (21), p.329-342, 1991c.
RODRIGUES, M. T. Herpetofauna das dunas interiores do Rio São Francisco:
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péis Avulsos de Zoologia, v. 37, n. (22), p.343-346, 1991d.
RODRIGUES, M. T. Herpetofauna das dunas interiores do Rio São Francisco:
Bahia: Brasil. V. Duas novas espécies de Apostolepis (Ophidia, Typhlopidae).
Memórias do Instituto Butantan, v. 54, n. (2), 53-59, 1993a.
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RODRIGUES, M. T. Lizards, snakes and amphisbaenians of the quaternary
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VITT, L. J.; L. D. VANGILDER. Ecology of a snake community in northeastern
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237
Apêndice 1: Fotos
Diversidade de anfíbios e répteis
238
Anfíbios e répteis da caatinga: a) Pleurodema diplolistris ; b) Proceratophrys cristiceps; c) Pseudopaludicola
sp. ; d) Dermatonotus muelleri ; e) Pipa carvalhoi ; f) Siphonops paulensis ; g) Amphisbaena alba; h) Diploglossus
lessonae; i) Briba brasiliana ; j) Coleodactylus meridionalis; k) Gymnodactylus geckoides ; l) Hemidactylus agrius; m)
Prancha 2 Hemidactylus mabouia ; n) Lygodactylus klugei ; o) Phyllopezus periosus ; p) Phyllopezus pollicaris ; q) Anotosaura
sp. ; r) Colobosaura mentalis. Fotos: Adão Cardoso : e; Cristina Arzabe: c; Edelmo Gonçalves : h, i, m, o, r ; Fagner
Ribeiro : r ; Gabriel Skuk: j, k, n, p, q ; Lucas B. M. Brito: l ; Yuri Lima : a, b, d, f, g.
239
Diversidade de anfíbios e répteis
240
Répteis da caatinga: a) Tantilla melanocephala; b) Taeniophalus occiptalis; c) Thamnodynastes strigilis; d)
Micrurus ibiboboca; e) Leptotyphlops borapeliotes; f) Bothrops erythromelas; g) Bothrops lutzi lutzi; h) Geochelonae
Prancha 4 carbonaria; i) Caiman crocodilus. Fotos: Edelmo Gonçalves : f, h ; Gabriel Skuk : a, b, i ; Lucas B. M. Brito: g; Yuri
Lima : c, d, e.
241
242
6.1
Herpetofauna da
área Reserva da
Serra das Almas, Ceará
Paulo Cascon
Resumo
1. Introdução
2. Levantamento bibliográfico
244
algumas espécies endêmicas (REBOUÇAS-SPIEKER, 1981; CUNHA, LIMA-VERDE;
LIMA, 1991; HOOGMOED et. al., 1994; RODRIGUES; BORGES, 1997). O EIA/RIMA
da Reserva Serra das Almas foi o primeiro estudo conduzido na área (ANDRADE
et. al., 2000).
3. Material e métodos
A – Área de trabalho
Tabela 1: Listagem dos pontos de coleta na área Serra das Almas, Ceará.
Coordenadas
Ponto
B – Trabalhos de campo
245
pontos Croatá, São Luís e Sítio/Tucuns, e os últimos dias na parte infe-
rior, nos pontos Grajaú e Estreito. No laboratório, os exemplares foram
identificados através de chaves dicotômicas gerais ou específicas para
determinados grupos, por comparação com outros exemplares tom-
bados nas coleções herpetológicas da UFC, Museu Nacional - Rio de
Janeiro / UFRJ e da PUC - Minas, ou por confirmação de especialistas
em determinados grupos taxonômicos. As séries coletadas nos traba-
lhos de campo encontram-se depositadas na Coleção de Herpetologia
da Universidade Federal do Ceará (UFC).
4. Resultados
Período
Nome
246
Tabela 2 (continuação)
popular
Período
Nome
Ponto Forma de coleta
Família Espécie
1 2 3 4 5 Extra CAQ CM OBS
Chuv. -- -- 2 -- -- -- 2 -- --
Adenomera sp. Rãzinha
Seco -- 1 -- -- -- -- -- 1 --
Leptodactylus fuscus Chuv. -- -- -- 2 -- B 2 -- X
Jia
(Schneider, 1799) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Leptodactylus Chuv. -- 1 -- 2 -- -- -- 3 --
labyrinthicus Jia
(Spix, 1824) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Leptodactylus gr. Chuv. -- -- -- -- -- B -- -- X
ocellatus Jia
(Linnaeus, 1758) Seco -- 3 -- 2 -- -- -- 5 --
Leptodactylus Chuv. -- 2 -- 25 -- -- 26 2 --
Leptodactyli-
troglodytes Jia
dae (9 spp.) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
(Lutz, 1926)
Physalaemus gr. Chuv. 1 18 7 10 -- -- 30 6 X
Caçote
cuvieri (Fitzinger, 1826) Seco -- 1 -- -- -- -- -- 1 --
Pleurodema Chuv. -- -- -- 2 -- B, C -- 2 X
diplolistris Sapo
(Peters, 1870) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Proceratophrys Chuv. -- 5 -- 14 -- C 13 6 --
cristiceps Sapo-boi
(Muller, 1884) Seco -- 1 -- -- -- -- -- 1 --
Pseudopaludicola Chuv. -- -- -- -- -- B -- 4 --
-----
sp. 1 Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Dermatonotus Chuv. -- -- -- 9 -- -- 9 -- --
Microhylidae
muelleri Sapo-boi
(1 sp.) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
(Boettger, 1885)
Total– 18
2 11 3 14 0 8 8 14 8
espécies
Lagartos
Briba brasiliana Briba, Chuv. -- -- -- -- -- -- -- -- --
(Amaral, 1935) lagartixa Seco 1 1 -- -- -- D -- 2 --
Coleodactylus Chuv. 1 OBS -- 3 -- -- 4 -- X
meridionalis -----
Seco 1 1 -- 1 -- -- 1 2 --
(Boulenger, 1888)
Gymnodactylus Chuv. -- -- -- 1 -- -- 1 -- --
Briba
geckoides (Spix, 1825) Seco -- -- -- 1 -- -- 1 -- --
Briba, Chuv. 1 2 -- 1 -- -- -- 4 --
Hemidactylus agrius
Gekkonidae víbora,
(Vanzolini, 1978) Seco -- 2 -- 1 1 -- -- 4 X
(7 spp.) lagartixa
Hemidactylus Briba, Chuv. -- -- -- -- -- B -- 1 --
mabouia (Moreau de víbora,
Jonnès, 1818) lagartixa Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Lygodactylus klugei Chuv. -- OBS -- -- -- -- -- -- X
(Smith, Martin & -----
Swain, 1977) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Briba, Chuv. -- 1 -- -- -- A,B 1 X
Phyllopezus pollicaris
víbora,
(Spix, 1825) Seco -- 1 -- -- -- -- -- 1 --
lagartixa
247
Tabela 2 (continuação)
popular
Período
Nome
Ponto Forma de coleta
Família Espécie
1 2 3 4 5 Extra CAQ CM OBS
Colobosaura Chuv. -- 2 -- -- -- -- 1 1 --
modesta (Reinhardt -----
& Lütken, 1862) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Micrablepharus
Calango- Chuv. 1 -- -- -- -- -- 1 -- --
Gymnophthal- maximiliani
do-rabo
midae (3 spp.) (Reinhardt & Lütken,
azul Seco 1 4 2 -- -- -- 7 -- --
1862)
Vanzosaura Calango- Chuv. -- -- -- -- -- -- -- -- --
rubricauda rabo-
(Boulenger, 1902) vermelho Seco -- -- -- -- 1 -- 1 -- --
Iguanidae Iguana iguana Chuv. -- -- -- -- -- C -- 1 --
Camaleão
(1 sp.) (Linnaeus, 1758) Seco -- OBS -- -- -- -- -- -- X
Enyalius bibronii Papa- Chuv. -- -- 1 -- -- -- 1 -- --
Polychrotidae (Boulenger, 1885) vento Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
(2 spp.) Polychrus acutirostris Calango- Chuv. -- -- -- 1 -- -- 1 -- --
(Spix, 1825) cego Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Mabuya aff. arajara Chuv. -- -- -- -- -- -- -- -- --
Scincidae Calango-
(Rebouças-Spieker,
(1 sp.) liso Seco -- -- 1 -- -- -- -- 1 --
1981)
Ameiva ameiva Chuv. -- -- -- 1 -- -- 1 -- --
Tijubina
(Linnaeus, 1758) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Cnemidophorus Calango- Chuv. 3 1 -- 6 -- -- 10 -- --
Teiidae
ocellifer (Spix, 1825) verde Seco 6 -- 1 -- -- -- 6 1 --
(3 spp.)
Tupinambis merianae Chuv. -- OBS -- -- -- -- -- -- X
(Duméril & Bibron, Tejo
1839) Seco -- OBS -- -- -- -- -- -- X
Tropidurus hispidus Chuv. 1 OBS 1 5 -- -- 7 -- X
Calango
(Spix, 1825) Seco -- OBS -- 7 1 -- 8 -- X
Tropiduridae
(2 spp.) Tropidurus Chuv. -- OBS -- -- -- -- -- -- X
Calango-
semitaeniatus
de-lajedo Seco -- OBS -- -- -- -- -- -- X
(Spix, 1825)
Total – 19
Herpetofauna da área Reserva Serra das Almas, Ceará
6 11 5 7 3 3 11 9 8
espécies
Anfisbenídeos
Cobra- Chuv. -- -- -- -- -- C -- 1 --
Amphisbaeni- Amphisbaena alba
de-duas-
dae (1 sp.) (Linnaeus, 1758) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
cabeças
Total – 1 espécie 0 0 0 0 0 1 0 1 0
Serpentes
Oxyrhopus
Chuv. -- 1 -- -- -- -- -- 1 --
trigeminus Duméril, Cobra-
Colubridae (Bibron & Duméril, coral
Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
(2 spp.) 1854 )
Philodryas nattereri Cobra- Chuv. -- -- -- 2 -- -- -- 2 --
(Steindachner), 1870 cipó Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
248
Tabela 2 (continuação)
popular
Período
Nome
Ponto Forma de coleta
Família Espécie
1 2 3 4 5 Extra CAQ CM OBS
Bothrops Chuv. -- 1 -- -- -- -- -- 1 --
erythromelas Jararaca
((Amaral, 1923) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Viperidae Bothrops lutzi Chuv. -- -- -- -- -- -- -- -- --
(3 spp.) (Miranda-Ribeiro, Jararaca
1915) Seco 1 -- -- -- -- -- -- 1 --
Crotalus durissus Chuv. -- -- -- -- -- -- -- -- --
Cascavel
(Linnaeus, 1758) Seco -- OBS -- -- -- -- -- -- X
Micrurus ibiboboca Cobra- Chuv. -- -- -- -- -- -- -- -- --
Elapidae (1 sp.)
(Merrem, 1820) coral Seco -- -- -- -- -- C -- 1 --
Total – 6
1 3 0 1 0 1 -- 5 1
espécies
Jacaré
Alligatoridae (1 Caiman crocodilus Chuv. -- -- -- -- -- B,C -- 1 --
Jacaré
sp.) (Linnaeus, 1758) Seco -- -- -- -- -- -- -- -- --
Total – 1
0 0 0 0 0 1 0 1 0
espécie
Total Geral – 45
9 25 8 22 3 14 19 24 17
espécies
Riqueza de espécies
Riqueza de espécies de anfíbios e répteis na área Serra das Almas, através de busca ativa e armadilhas de queda,
Figura 1
nos períodos chuvoso e seco.
249
lhas também registraram acentuada diferença na riqueza de espécies en-
tre as estações. No período chuvoso, foram capturadas mais espécies de
anfíbios e de lagartos do que no seco (Figura 1), porém sem registros de
serpentes, mesmo as fossoriais.
Comparando os esforços por período, as coletas de anfíbios foram
bem mais eficientes na estação chuvosa (Figura 2), registrando-se todas
as quatro famílias e as 18 espécies do total de anfíbios, inclusive espécies
com reprodução explosiva, como Dermatonotus muelleri. Para os répteis,
também foi obtida maior riqueza de espécies nesse período, com registro
de 21 espécies, representando 10 das 12 famílias registradas durante todo o
período de estudo. Leptodatylidae foi a família com maior número de espé-
cies e mais abundante em espécimes. Pelos índices de captura das armadi-
Tabela 3. Áreas de amostragem, esforço de captura manual por busca ativa e listagem das espécies observadas da herpetofauna
da área Serra das Almas, Ceará, nos períodos chuvoso e seco.
Esforço de captura
Área Período Espécies observadas e/ou capturadas
(homem X horas X dias)
3 pessoas X (3+3+3 h) X Bufo paracnemis, Physalaemus gr. cuvieri,
Chuvoso
4,5 dias = 121 h 30’ Hemidactylus agrius.
3 pessoas X (3+3+3 h) X
Croatá Seco Briba brasiliana, Bothrops lutzi.
4,5 dias = 121 h 30’
Bufo paracnemis, Corythomantis greeningi,
Hyla raniceps, Leptodactylus labyrinthicus, L.
troglodytes, Phyllomedusa gr. hyponchondrialis,
P. gr. cuvieri, Proceratophrys cristiceps, Scinax x-
Chuvoso 3 pessoas X (3+3+3 h) X
signatus; Coleodactylus meridionalis, Colobosaura
4,5 dias = 121 h 30’
modesta, Hemidactylus agrius, Lygodactylus klugei,
Phyllopezus pollicaris, Tropidurus semitaeniatus,
Tupinambis merianae; Brothrops erythromelas;
Crotalus durissus, Oxyrhopus trigeminus.
Adenomera sp., Scinax x-signatus, Leptodactylus
São Luís
gr. ocellatus, P. gr. cuvieri, Proceratophrys cristiceps;
Seco 3 pessoas X (3+3+3 h) X
Coleodactylus meridionalis, Hemidactylus agrius,
4,5 dias = 121 h 30’
Phyllopezus pollicaris, Tropidurus semitaeniatus,
Tupinambis merianae.
3 pessoas X (3+3+3 h) X
Chuvoso Physalaemus gr. cuvieri, Scinax x-signatus.
3 dias = 81 horas
Sítio/Tucuns
Herpetofauna da área Reserva Serra das Almas, Ceará
250
Tabela 4 - Captura de anfíbios e répteis nas armadilhas de queda (pitfall) aplicadas na área Serra das Almas durante os períodos
chuvoso e seco.
Ponto
Espécie Estação Total Sítio/
Croatá São Luís Grajáu Grajáu II Estreito
Tucuns
Chuv. --- 5 x 4= 20 5 x 4=20 5 x 4=20 5 x 4=20 5 x 3=15 ------
Esforço Amostral
Seco --- 5 x 4= 20 5 x 4=20 5 x 4=20 5 x 4=20 ------ 5 x 4=20
No. Total de Espécimes Chuv. 116 7 17 12 39 41 0
Capturados Seco 26 7 4 5 8 0 2
Chuv. 2 --- --- 2 --- --- ---
Adenomera sp.
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 5 --- --- --- 4 1 ---
Bufo granulosus
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 1 --- --- --- 1 --- ---
Bufo paracnemis
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 9 --- --- --- 8 1 ---
Dermatonotus muelleri
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 2 --- --- --- 2 --- ---
Leptodactylus fuscus
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 26 --- 1 --- 7 18 ---
Leptodactylus troglodytes
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 30 1 12 7 4 6 ---
Physalaemus gr. cuvieri
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 13 --- 2 --- 3 8 ---
Proceratophrys cristiceps
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 1 --- --- 1 --- --- ---
Anuros não-identificados
Seco 2 --- --- 2 --- --- ---
Chuv. 1 --- --- --- --- 1 ---
Ameiva ameiva
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 10 3 1 --- 1 5 ---
Cnemidophorus ocellifer
Seco 6 5 --- 1 --- --- ---
Chuv. 4 1 --- --- 3 --- ---
Coleodactylus meridionalis
Seco 1 1 --- --- --- --- ---
Chuv. 1 --- 1 --- --- --- ---
Colobosaura modesta
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 1 --- --- 1 --- --- ---
Enyalius bibronii
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 1 --- --- --- 1 --- ---
Gymnodactylus geckoides
Seco 1 --- --- --- 1 --- ---
Chuv. 1 1 --- --- --- --- ---
Micrablepharus maximiliani
Seco 7 1 4 2 --- --- ---
Chuv. 1 --- --- --- 1 --- ---
Polychrus acutirostris
Seco 0 --- --- --- --- --- ---
Chuv. 7 1 --- 1 4 1 ---
Tropidurus hispidus
Seco 8 --- --- --- 7 --- 1
Chuv. 0 --- --- --- --- --- ---
Vanzosaura rubricauda
Seco 1 --- --- --- --- --- 1
TOTAL 142 14 21 17 47 41 2
Legenda: Os números representam a abundância absoluta de cada espécie por ponto de amostragem e estação; números totais de animais capturados na armadilha
(sacrificados + soltos).
251
lhas (Tabela 4), Physalaemus gr. cuvieri (30 ex.), Leptodactylus troglodytes
(26 ex.), Proceratophrys cristiceps (13 ex.) e Dermatonotus muelleri (9 ex.)
foram as espécies mais abundantes no período chuvoso (Figura 3). Exceto
no ponto 5 (Estreito), Physalaemus gr. cuvieri foi facilmente observada nos
demais pontos de coleta.
Entre os lagartos, Cnemidophorus ocellifer (16 ex.) e Tropidurus hispi-
dus (15 ex.) foram considerados os mais bem distribuídos e abundantes na
análise conjunta dos dois períodos. Porém, Tropidurus hispidus e Micrable-
pharus maximiliani tiveram maior abundância no período seco (Figura 3). Os
gecos Hemidactylus agrius e Coleodactylus meridionalis foram igualmente
abundantes durante os períodos chuvoso e seco, embora apenas em alguns
lugares da reserva. As serpentes foram registradas em encontros casuais du-
rante as buscas, tanto no período chuvoso como no seco, e indicadas nas
entrevistas, nas quais alguns entrevistados citaram a “jibóia” (que pode ser
Boa constrictor ou Epicrates cenchria) como espécie mais freqüente. Devido
Figura 2 Abundância de anfíbios e répteis coletados na área Serra das Almas, nos períodos chuvoso e seco.
Herpetofauna da área Reserva Serra das Almas, Ceará
Abundância das espécies de anfíbios e répteis capturados mediante armadilhas de queda na área Serra das
Figura 3
Almas nos períodos chuvoso e seco.
252
à sobreposição do nome popular para espécies diferentes, os dados das en-
trevistas não estão sendo considerados no levantamento atual. O crânio e a
pele de um jacaré (Caiman crocodilus) coletado por moradores nas margens
do Rio Poty (Ponto B), próximo à cidade de Ibiapaba, foi doado à equipe e
constituiu um novo registro para a reserva e o estado do Ceará.
No período seco, a área da parte superior da reserva, o São Luís, conti-
nuou sendo abastecida pelo córrego do Olho d’água, que mantém umidade
durante todo o ano, servindo de refúgio e habitat para os poucos anfíbios
presentes, entre eles Physalaemus gr. cuvieri, Scinax x-signatus, Leptodac-
tylus gr. ocellatus e Adenomera sp., e várias espécies de lagartos, como
Colobosaura modesta, Coleodactylus meridionalis, Phyllopezus pollicaris e
Tropidurus semitaeniatus. Na parte inferior, no Grajáu, alguns açudes (Gra-
jáu e Bom Sossego) permaneciam com água, servindo como refúgio.
O ponto de coleta 4-1, que representa oficialmente a localidade Gra-
jáu, obteve o maior índice de captura (47 ex.) e também a maior riqueza
(12 espécies). Durante o período chuvoso, devido às estradas interditadas,
não foram aplicadas armadilhas no ponto Estreito, e Grajáu foi duplicado,
constando Grajáu I e II. Talvez por esse fato, o Estreito tenha surpreendido
pelos baixos índices: apenas 2 espécies (Vanzosaura rubricauda e Tropidu-
rus hispidus), com um exemplar de cada. Nas análises, apenas Grajáu I está
sendo considerada.
A composição da herpetofauna nos pontos amostrais (Tabela 2) foi
comparada pelo coeficiente de similaridade de Jaccard (Sa,b = x / (a + b
– x), onde x= número de espécies em comum nas duas áreas, a= número
de espécies da área A e b= número de espécies da área B). Os resultados
constam das Tabelas 5, 6 e 7, apresentadas a seguir.
253
Para comparar a similaridade entre a herpetofauna dos diferentes pon-
tos, foi feita uma análise de agrupamento pelo método UPGMA, utilizando o
programa MVSP 3.11 nos cálculos das medidas de similaridade e análise de
agrupamento (Figuras 4, 5 e 6).
É possível observar que, das 45 espécies registradas nos dois períodos,
apenas Tropidurus hispidus ocorreu nos cinco pontos de amostragem quan-
titativamente, enquanto que Physalaemus gr. cuvieri, Hemidactylus agrius e
Cnemidophorus ocellifer ocorreram em quatro pontos. O ponto 4, Grajáu, na
caatinga arbórea, apresentou a maior riqueza de espécies (26), seguido do
ponto 2, São Luís, na mata-seca conservada, que também engloba as áreas
próximas ao alojamento e as mangueiras do córrego do Olho d’água (cole-
tas extras no ponto A), com 25 espécies. Para as análises, as coletas extras
realizadas no ponto B, na localidade próxima às margens do Rio Poty (Bufo
granulosus, Hyla raniceps, Scinax x-signatus, Leptodactylus fuscus, L. gr.
Análise de agrupamento (UPGMA) realizada a partir da matriz dos coeficientes de similaridade de Jaccard
Figura 4
para a fauna de anfíbios da área Serra das Almas.
Herpetofauna da área Reserva Serra das Almas, Ceará
Análise de agrupamento (UPGMA) realizada a partir da matriz dos coeficientes de similaridade de Jaccard
Figura 5
para a fauna de répteis da área Serra das Almas.
Análise de agrupamento (UPGMA) realizada a partir da matriz dos coeficientes de similaridade de Jaccard
Figura 6
para a herpetofauna da área Serra das Almas.
254
ocellatus, Pleurodema diplolistris, Pseudopaludicola sp. 1, Phyllopezus polli-
caris, Hemidactylus mabouia e Caiman crocodilus), foram consideradas no
ponto 5, Estreito, e as realizadas no ponto C, entre Ibiapaba e Crateús (Iguana
iguana, Amphisbaena alba, Micrurus ibiboboca e Caiman crocodilus), consi-
deradas no ponto 4, Grajáu. O ponto 3, Sítio/Tucuns, localizado na mata seca
em recuperação, apresentou a menor riqueza, com oito espécies.
5. Discussão
255
faz parte do grupo neuwiedi, com ocorrência ligada a manchas de cerrado no
Piauí, Bahia, oeste de Pernambuco, leste de Goiás, norte de Minas e prova-
velmente em São Paulo, sendo a primeira ocorrência para o estado do Ceará.
Na reserva, essa espécie muito provavelmente vive em simpatria com Bo-
throps erythromelas, outra espécie de jararaca, de menor porte e endêmica
de caatinga, que foi coletada na mata seca do São Luís, localidade vizinha ao
Croatá.
Em recente publicação, Rodrigues (2003) comenta a diversidade fau-
nística da caatinga, registrando 116 espécies de répteis e 51 de anfíbios. Na
Reserva Serra das Almas, foram registradas 42 dessas espécies (18 anfíbios
e 24 répteis) e três novos registros para caatinga: Colobosaura modesta, Ma-
buya aff. arajara e Bothrops lutzi. A primeira espécie citada também ocorre
em Ubajara, em um enclave de mata atlântica localizado na parte norte do
planalto da Ibiapaba (BORGES-NOJOSA; CARAMASCHI, 2003), e sua presen-
ça indica que provavelmente a mata úmida atual do Parque Nacional de Uba-
jara já foi mais ampla e ocupou a Serra das Almas. A segunda espécie era até
então considerada endêmica da chapada do Araripe (REBOUÇAS-SPIEKER,
1981; RODRIGUES, 2003), tendo sido registrada apenas na localidade de Ara-
jara, na parte úmida do sopé.
Andrade et al. (2000) apresentaram o primeiro levantamento realizado
na Serra das Almas, registrando 57 espécies (22 anfíbios, 34 lepidosauros
e 1 jacaré). O levantamento atual acrescenta mais oito espécies (HylaHyla sp.,
Gymnodactylus geckoides, Hemidactylus mabouia, Polychrus acutirostris,
Mabuya aff. arajara, Amphisbaena alba, Bothrops lutzi e Caiman crocodilus).
Por outro lado, 19 espécies (Hyla
Hyla minuta, Scinax aff. eurydice, Adenomera
sp.2, Siphonops cf. annulatus, Aulura anomala, Leposternon polystegum,
Diploglossus lessonae, Colobosauroides cearensis, Mabuya heathi, M. nigro-
punctata, Corallus hortulanus, Apostolepis cearensis, Boiruna sertaneja, Lio-
phis poecilogyrus, Leptodeira annulata, Oxybelis aeneus, Philodryas olfersii,
Thamnodynastes strigilis e Caiman latirostris) não foram registradas no pre-
sente estudo. Os novos registros fortalecem a idéia de que os esforços com a
herpetofauna dessa área ainda não foram suficientes e devem continuar.
Conforme a lista nacional das espécies ameaçadas de extinção da
fauna brasileira, revisada recentemente pelo MMA / IBAMA / FUNDAÇÃO
BIODIVERSITAS (MMA, 2004), e a lista internacional, que se encontra em
Herpetofauna da área Reserva Serra das Almas, Ceará
256
6. Conclusões
7. Referências bibliográficas
257
IPLANCE. Atlas do Ceará. Fortaleza: Fundação Instituto de Planejamento do
Ceará. 1997. CD Rom.
LIMA, D. C. Aspectos Sistemáticos, Zoogeográficos e Ecológicos da Herpeto-
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Monografia de Graduação - Curso de Graduação em Ciências Biológicas,
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da do Apodi, Estados do Ceará e Rio Grande do Norte (Brasil). Caatinga I n.
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do Ceará. Fortaleza: UFC, 1991, 209 p. Tese de Professor Titular, Departamento
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do Ceará. Caatinga, v. 7, n. (1), p.158-163, 1990.
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ROCHA, F. D. da. Subsídios para o estudo da fauna cearense (catálogo das
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---------- . Subsídios para o estudo da fauna cearense (catálogo das espécies
por mim coligidas e notadas). Rev. Inst. Ceará, 64, p. 284-313, 1950.
---------- . Subsídios para o estudo da fauna cearense (catálogo das espécies
por mim coligidas e notadas). Rev. Inst. Ceará, 68, p.185-204, 1954.
RODRIGUES, M. T. Herpetofauna da Caatinga. In: LEAL, I. R.; TABARELLI, M.;
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– USP, vol. 1 e 2, p. 134 + 241p, 2000. Tese de Doutorado – Programa de Pós-
Graduação em Ciências Biológicas – Zoologia, USP.
258
6.2
Herpetofauna da área
de Curimataú, Paraíba
Cristina Arzabe
Gabriel Skuk
1. Introdução
260
2. Levantamento bibliográfico
3. Material e métodos
A – Métodos de coleta
261
estudada, sendo uma linha de dez estações na Pedra da Boca e outra linha
semelhante na Fazenda Cachoeira da Capivara. Na primeira viagem, ambas
as linhas permaneceram no campo por nove dias e, na segunda, instaladas
no mesmo local, permaneceram no campo por onze dias. As linhas de ar-
madilhas encontram-se caracterizadas a seguir.
4. Resultados
A – Anfíbios
Herpetofauna da área de Curimataú, Paraíba
262
Tabela 1: Anfíbios do Parque Estadual da Pedra da Boca (mata seca) e da Fazenda Cachoeira da Capivara (caatinga arbustiva/
arbórea) nos períodos chuvoso e seco. Local: PEPB - Parque Estadual da Pedra da Boca; FCC - Fazenda Cachoeira da Capivara; CM
– Coleta manual; CAQ – Coleta por armadilha de queda.
Ponto / Forma
Nome
Família Espécie Período Fitofisionomia de coleta
popular
PEPB FCC CM CAQ
Ordem Anura
Bufo granulosus Chuv. 50 6 56 65
Sapo
Bufonidae (Spix, 1824) Seco 4 2 6 10
(2 spp.) Bufo paracnemis Chuv. 45 12 57 71
Sapo
(A. Lutz, 1925) Seco -- -- -- --
Corythomantis greeningi (Boulenger, Chuv. 3 1 4 --
Perereca
1896) Seco -- -- -- --
Hyla raniceps Chuv. 1 -- 1 --
Perereca
(Cope, 1862) Seco 1 -- 1 --
Hylidae Phyllomedusa gr. hypochondrialis Chuv. 4 -- 4 --
Perereca
(5 spp.) (Daudin, 1800) Seco -- -- -- --
Scinax pachychrus (Miranda-Ribeiro, Chuv. 1 1 2 --
Perereca
1937) Seco -- 4 4 --
Scinax x-signatus Chuv. 9 -- 9 --
Perereca
(Spix, 1824) Seco -- -- -- --
Ceratophrys joazeirensis (Mercadal, Sapo-boi Chuv. 1 -- 1 --
1986) Seco -- -- -- --
Leptodactylus fuscus (Schneider, Chuv. 1 -- 1 --
Caçote
1799) Seco -- -- -- --
Leptodactylus labyrinthicus (Spix, Chuv. 2 -- 2 --
Jia
1824) Seco 1 -- 1 --
Leptodactylus gr. ocellatus Chuv. 1 -- -- 1
Caçote
(Linnaeus, 1758) Seco 1 -- 1 --
Leptodactylus troglodytes (Lutz, Chuv. 7 -- 4 3
Caçote
1926) Seco -- -- -- --
Leptodactylidae Leptodactylus syphax (Bokermann, Chuv. 15 -- 7 8
Caçote
(11 spp.) 1969) Seco -- -- -- --
Physalaemus cicada (Bokermann, Chuv. 2 -- -- 2
Caçote
1966) Seco -- -- -- --
Physalaemus gr. cuvieri (Fitzinger, Chuv. 62 2 64 57
Caçote
1826) Seco -- -- -- --
Physalaemus cf. kroyeri (Reinhardt Chuv. 19 2 21 36
Caçote
and Lütken, 1862) Seco 1 -- 1 --
Chuv. 1 8 2 7
Pleurodema diplolistris (Peters, 1870) Caçote
Seco -- -- -- --
Proceratophrys cristiceps (Müller, Chuv. 67 -- 67 40
Sapo
1884) Seco 2 -- 2 --
Microhylidae Dermatonotus muelleri (Boettger, Chuv. 4 3 7 6
Sapo-boi
(1 sp.) 1885) Seco -- -- -- --
Pipidae Pipa carvalhoi Chuv. -- -- -- --
-----
(1 sp.) (Miranda-Ribeiro, 1937) Seco 7 -- 7 --
Gymnophiona
Cobra- Chuv. 1 -- 1 --
Caeciliidae
Siphonops paulensis (Boettger, 1892) de-duas-
(1 sp.) Seco -- -- -- --
cabeças
TOTAL – 21 espécies 21 8 20 11
263
seco. Observou-se também que, durante a estação chuvosa, o número de
anfíbios coletados foi bem maior na área de mata seca (PEPB), sendo essa
variação entre as localidades menos acentuada no período seco (Figura 2).
Algumas poucas espécies foram marcadamente mais abundantes no
período chuvoso. Na área de mata seca (PEPB), Bufo granulosus, Bufo parac-
nemis, Proceratophrys cristiceps e Physalaemus cuvieri foram as espécies
dominantes, representadas por mais de 50 indivíduos cada, sendo a maior
parte das outras 17 espécies representada por apenas um a dez indivíduos.
Na área de caatinga arbustiva/arbórea (FCC), a espécie mais abundante foi
Bufo paracnemis, representada por mais de 50 indivíduos, enquanto as de-
mais espécies foram representadas por um a oito indivíduos.
Riqueza de espécies de anfíbios no Parque Estadual Pedra da Boca/PPB (mata seca) no período chuvoso (c)
Figura 1 e seco (s) e na Fazenda Cachoeira da Capivara/FCC (caatinga arbustiva/arbórea) no período chuvoso (c) e
seco (s). c = 09 a 18.05.03; s = 05 a 14.11.03.
Abundância de anfíbios coletados no Parque Estadual Pedra da Boca/PPB (mata seca) no período chuvoso
Figura 2 (c) e seco (s) e de indivíduos coletados na Fazenda Cachoeira da Capivara/FCC (caatinga arbustiva/arbórea)
no período chuvoso (c) e seco (s). C = 09 a 18.05.03; S = 05 a 14.11.03.
Herpetofauna da área de Curimataú, Paraíba
B – Répteis
264
Tabela 2 - Répteis do Parque Estadual da Pedra da Boca (mata seca) e da Fazenda Cachoeira da Capivara (caatinga arbustiva-
arbórea) no período chuvoso e seco. LOCAL: PEPB - Parque Estadual da Pedra da Boca; FCC - Fazenda Cachoeira da Capivara; CM
– Coleta manual; CAQ – Coleta por armadilha de queda.
Local/
Forma de coleta
Família Espécie Nome popular Período Fitofisionomia
PEPB FCC Extra CAQ CM OBS
LAGARTOS
265
Tabela 2 (continuação)
Local/
Forma de coleta
Família Espécie Nome popular Período Fitofisionomia
PEPB FCC Extra CAQ CM OBS
TOTAL - 1 espécie 1 0 0 0 1 0
Serpentes
Boidae Epicrates cenchria Cobra-de-vea-do, Chuv. 1 -- -- -- -- --
(1 sp.) (Linnaeus, 1758) salamanta Seco -- -- -- -- -- --
Leptodeira annulata Chuv. 1 -- -- -- 1 --
Falsa-jararaca
(Linnaeus, 1758) Seco 2 -- -- -- 2 --
Oxyrhopus trigeminus Chuv. 3 -- -- -- 3 --
(Duméril, Bibron & Cobra-coral
Duméril, 1854) Seco 2 1 -- -- 2 --
TOTAL - 9 espécies 9 2 9
Riqueza de espécies de répteis no Parque Estadual da Pedra da Boca/PPB (mata seca) e na Fazenda Cachoeira
Figura 3 da Capivara/FCC (caatinga arbustiva/arbórea) nos período chuvoso (09 a 18.05.03) e seco (05 a 14.11.03).
Herpetofauna da área de Curimataú, Paraíba
Abundância (número de indivíduos) de répteis capturados mediante armadilhas de queda no Parque Estadual
Figura 4 da Pedra da Boca/PPB (mata seca) e na Fazenda Cachoeira da Capivara/FCC (caatinga arbustiva/arbórea) nos
períodos chuvoso (09 a 18.05.03) e seco (05 a 14.11.03).
266
Abundância (expressa como percentagem) das espécies de répteis capturados mediante armadilhas de queda
Figura 5 no Parque Estadual da Pedra da Boca /PPB (mata seca) e na Fazenda Cachoeira da Capivara/FCC (caatinga
arbustiva/arbórea) nos períodos chuvoso (09 a 18.05.03) e seco (05 a 14.11.03).
267
mais abundante foi um Cnemidophorus do grupo ocellifer
ocellifer, cuja freqüência
em ambos os períodos de amostragem foi próxima a 50% da amostra. Nes-
sa área, outras espécies também foram abundantes, porém, com diferença
entre os períodos de amostragem. Na estação chuvosa, a coleta de Tropidu-
rus hispidus apresentou-se incrementada, representando cerca de 40% dos
indivíduos; na estação seca, Gymnodactylus gekkoides foi a segunda espécie
mais abundante, representando 25% das capturas.
5. Discussão
A – Anfíbios
Todas as espécies identificadas constam da lista de anfíbios da caatin-
ga (RODRIGUES, 2003).
Em relação à anfibiofauna dos estados de Pernambuco e Ceará, cinco
espécies não foram registradas neste estudo: Hyla soaresi, Trachycephalus
atlas, Adenomera sp., Physalaemus albifrons e Pseudopaludicola sp. Não
se sabe sobre registros de Trachycephalus atlas, hilídeo de grande porte e
saco vocal duplo na Paraíba, mas existem registros para Hyla soaresi e para
espécies dos gêneros Adenomera e Pseudopaludicola, com dúvidas taxo-
nômicas para as duas últimas. Os registros de Adenomera sp. restringem-
se às áreas mésicas do bioma. Quanto ao Physalaemus albifrons, é possível
que essa espécie esteja sendo denominada, na Paraíba, como Physalaemus
kroyeri, sendo necessário esclarecer essa dúvida taxonômica. Physalaemus
kroyeri
kroyeri é uma espécie comum, tendo sido registrada para diferentes loca-
lidades da Paraíba. Desse modo, enquanto a ausência de Trachycephalus
atlas não chama atenção, a ausência das demais espécies pode ter ocorrido
apenas por falhas na coleta.
Em relação à anfibiofauna registrada por Arzabe (1999) para outras lo-
calidades da Paraíba, não foram registradas neste estudo Bufo marinus, Hyla
crepitans e Hyla aff. branneri. Bufo marinus foi coletado apenas em área de
altitude (830 m), próximo ao Pico do Jabre (ARZABE, 1999), e talvez haja fa-
lhas na identificação dessa espécie. Hyla crepitans, espécie de médio porte,
considerada de ampla ocorrência no domínio por Rodrigues (2003), não é
uma espécie fácil de ser encontrada e, aparentemente, é sensível à presen-
Herpetofauna da área de Curimataú, Paraíba
268
épocas do ano, caracterizando a forte sazonalidade das atividades desse gru-
po, tanto em áreas xéricas como em áreas mais mésicas. Esses dados evi-
denciam que os anfíbios estão distribuídos de forma heterogênea dentro do
bioma (ARZABE, 1999) e o relevo e a fitofisionomia das áreas, assim como o
seu grau de conservação, podem exercer importante influência para a distri-
buição desse grupo nesse domínio morfoclimático.
A maior riqueza de espécies foi registrada para a área de mata seca,
do mesmo modo que o observado para os répteis, mas certamente ocorrem
mais espécies na área de caatinga arbustiva/arbórea. Para registrá-las, é ne-
cessário que as coletas ocorram logo nas primeiras chuvas (entre fevereiro
e março, geralmente), uma vez que muitas espécies apresentam reprodução
explosiva, tornando-se crípticas após seu curto período reprodutivo. De qual-
quer modo, a área de mata seca apresenta maior heterogeneidade ambiental
que a de caatinga arbustiva/arbórea e, principalmente, um microclima mais
úmido, o que favorece a presença desses animais com pele permeável e,
portanto, bastante suscetíveis à dessecação. Segundo Primavesi e Primavesi
(2003), as árvores são um componente estratégico para a estabilização me-
soclimática de um local. Por meio do processo de transpiração, lançando
água na atmosfera, à semelhança de um vaporizador, permitem que seja re-
tirado calor do ambiente (efeito hidrotermorregulador). Esse efeito, aliado à
produção de sombra, evita o aquecimento exagerado do solo e a reflexão de
calor para a atmosfera.
A maior abundância de indivíduos também foi registrada na área de
mata seca, mas é possível que esta seja bastante incrementada na área de
caatinga arbustiva/arbórea no período das primeiras chuvas, quando muitas
espécies que permanecem enterradas no período seco, como Dermatono-
tus muelleri, Pleurodema diplolistris e diferentes espécies de Physalaemus,
desenterram-se para a reprodução, estes últimos sendo representados por
centenas de indivíduos. Esses dados diferiram daqueles encontrados para os
répteis, para os quais a maior abundância foi registrada na área de caatinga
arbustiva/arbórea.
Muitas das espécies registradas da anurofauna apresentam caracterís-
ticas próprias de outras regiões áridas, tais como: (a) são predominantemen-
te noturnas; (b) apresentam atividades fortemente relacionadas ao período
chuvoso; (c) vivem próximas a locais úmidos; (d) apresentam desovas em
ninhos de espuma e (e) podem se enterrar para sobreviver aos períodos mais
secos (ARZABE, 1999).
A presença marcante de bufonídeos e leptodactilídeos nessas áreas
pode estar relacionada ao fato de apresentarem pele grossa, menos susce-
tível à dessecação (no caso dos bufonídeos e alguns leptodactilídeos, como
Proceratophrys) e de possuírem capacidade para se enterrar por longos pe-
ríodos e desovar em ninhos de espuma (no caso de alguns leptodactilídeos).
As desovas em ninhos de espuma, características dos gêneros Leptodactylus,
Physalaemus e Pleurodema, permitem que os ovos estejam protegidos con-
tra a dessecação quando os corpos d’água utilizados por essas espécies ainda
não se estabilizaram, situação própria das poças temporárias onde a maioria
dessas espécies se reproduz, especialmente no período das primeiras chuvas
(CARDOSO; ARZABE, 1993; ARZABE; ALMEIDA, 1997; ARZABE, 1999).
A presença de Ceratophrys joazeirensis Mercadal, 1986, espécie octa-
plóide, no Parque Estadual de Pedra da Boca, amplia sua distribuição, pois
essa espécie só era conhecida na literatura para sua localidade-tipo (Juazei-
ro, Bahia).
269
Assim como sugerido por Silva (1995) para o cerrado e por Silva et al.
(2003) para aves na caatinga, os inúmeros enclaves mésicos no bioma Caatin-
ga parecem ser importantes também para a manutenção de muitas espécies
de anfíbios e de processos ecológicos regionais que envolvem esse grupo.
Sendo assim, é necessário que sejam estudados com cuidado e, principalmen-
te, que sejam considerados prioritários para a conservação, como é o caso do
Parque Estadual da Pedra da Boca. Além disso, também é importante divulgar
essas informações dentre aqueles que vivem no entorno dessas áreas e que as
visitam, de modo a sensibilizar e envolver a sociedade na conservação.
B – Répteis
270
tro (Gymnodactylus geckoides, Phyllopezus pollicaris, Micrablepharus ma-
ximiliani e Vanzosaura rubricauda) e, no grupo cuja ocorrência é centrada
principalmente na caatinga, há sete espécies (Colobosaura mentalis, Hemi-
dactylus agrius, Lygodactylus klugei, Mabuya agmosticha, Mabuya heathi,
Phyllopezus periosus e Tropidurus semitaeniatus).
Além dessas, algumas espécies podem ser consideradas como de há-
bitos florestais e com a distribuição associada principalmente com a mata
atlântica (Tabela 1). Entre essas espécies, estão os lagartos Coleodactylus
meridionalis, Anotosaura sp. e Enyalius catenatus, todos registrados apenas
no Parque Estadual da Pedra da Boca.
Rodrigues (2003) comentou a ocorrência de populações de espécies
de hábito florestal na caatinga, referindo-se especialmente a Coleodactylus
meridionalis. Essa espécie é registrada nos enclaves de floresta úmida do
bioma. Sua presença na área com vegetação de mata seca (Parque Estadual
da Pedra da Boca) pode ser atribuída ao caráter mais mésico desse local,
apresentando ambientes sombreados e com serrapilheira abundante, que
também permitem a ocorrência de Enyalius catenatus e Anatosaura sp.
As espécies mais abundantes, em ambas as áreas, foram Cnemidophorus
gr. ocellifer e Tropidurus hispidus, seguidas de T. semitaeniatus.Tropidurus hispi-
dus foi a única encontrada em todos os habitats e microhabitats, o que confirma
a sua condição generalista (RODRIGUES, 1988). Tropidurus semitaeniatus é uma
espécie com distribuição centralizada na caatinga (com enclaves de populações
em outros biomas), que se especializa em ocupar habitats rochosos.
Para a fauna de serpentes, a quantidade de espécies encontradas deve
ter sido subestimada, para ambas as localidades. Esse é um problema co-
mum para os estudos de comunidades de serpentes, uma vez que a maior
parte das espécies é composta por animais pouco abundantes e difíceis de
coletar. Na caatinga, provavelmente Exu, em Pernambuco, representa uma
localidade bem amostrada, sendo que as 18 serpentes detectadas devem es-
tar próximas do número real de espécies que a habitam.
Analisando as nove espécies encontradas no Parque Estadual da Pedra
da Boca (Tabela 1), observa-se que todas são espécies generalistas de am-
pla ocorrência em vários biomas. No entanto, a serpente Taeniophallus oc-
cipitalis, apesar de possuir distribuição ampla, ocorre no nordeste do Brasil
somente na região litorânea, em áreas florestadas, não tendo sido registrada
por Rodrigues (2003) para a caatinga. Sua presença no parque revela mais
uma vez as condições mésicas desse local, onde espécies com preferências
de habitats mais úmidos conseguem sobreviver, mesmo em face da degra-
dação da paisagem pela atividade humana. Finalmente, conclui-se que os es-
tudos da fauna de répteis revelam uma área de transição entre as duas áreas
estudadas, com uma comunidade que inclui espécies de menor tolerância à
aridez no Parque Estadual da Pedra da Boca, e com espécies generalistas ou
de ampla ocorrência na caatinga registradas apenas na área com vegetação
do tipo caatinga arbustiva/arbórea.
Em relação aos répteis coletados em Pernambuco e Ceará, 13 não
foram registrados nesse estudo. Entre os lagartos, cinco espécies (Briba
brasiliana, Colobosaura modesta, Enyalius bibronii, Polychrus acutirostris e
Mabuya aff. arajara) foram coletadas apenas no Ceará. Entre as serpentes,
duas espécies (Boa constrictor e Tantilla melanocephala) registradas para
Pernambuco e duas (Bothrops
Bothrops erythromelas e Bothrops lutzi) registradas
para o Ceará também não foram registradas para o vale do Curimataú. Nes-
se local, também não foram registrados quelônios (Phrynops geoffroanus,
271
Kinosternon scorpioides e Geochelone carbonaria), como em Pernambuco,
ou crocodilianos (Caiman latirostris), como no Ceará. É muito possível que
várias dessas ausências sejam devidas a defeitos de coleta. Algumas espé-
cies muito características como Boa constrictor
constrictor, Crotalus durissus ou uma
espécie de Polychrus foram mencionadas pelos moradores como ocorren-
do na área ou estão presentes em localidades próximas, segundo registros
da coleção herpetológica da UFPB, como Micrurus ibiboboca. Para os rép-
teis aquáticos, consideramos que é pouco provável a ocorrência de Phry-
nops geoffroanus ou Caiman latirostris, devido ao reduzido tamanho dos
corpos de água na região e à grande pressão antrópica. A ausência de Briba
brasiliana é mais significativa, pois esse geco é abundante na generalidade
das localidades da caatinga, inclusive em área próxima da Paraíba, como
Cabaceiras (RODRIGUES, 1986).
6. Conclusões
Enquanto 52% dos répteis registrados na área de mata seca foram en-
contrados também no ambiente com vegetação do tipo caatinga arbustiva/
arbórea, dentre os anfíbios, essa taxa se reduziu para apenas 38% no am-
biente mais xérico, naturalmente devido à vulnerabilidade destes à desseca-
ção, o que impele muitas espécies de anfíbios a evitar áreas com menores
taxas de umidade.
Segundo Silva et al. (2003), 60,5% das aves da caatinga são dependen-
tes ou semidependentes de florestas, demonstrando a importância dessas
áreas que, apesar de cobrirem originalmente apenas 14% da região, ajudam
a manter quase dois terços das espécies. Esse mesmo padrão é observado
no cerrado, onde a pequena área coberta por florestas de galeria e flores-
tas secas (cerca de 10%) abriga mais de 60% da avifauna regional (SILVA,
1995). Desse modo, concordamos com esses autores em relação à impor-
tância de que, em futuras estimativas de diversidade regional da caatinga,
as espécies encontradas nesses enclaves não sejam desconsideradas, pois:
(a) não há qualquer razão biogeográfica para tratar os enclaves como não
pertencentes ao bioma no qual eles estão inseridos, dado que eles são com-
ponentes importantes do mosaico de paisagens que compõem a heteroge-
Herpetofauna da área de Curimataú, Paraíba
272
7. Referências bibliográficas
273
Herpetofauna da área de Curimataú, Paraíba
274
6.3
Herpetofauna da área
de Betânia e Floresta,
Pernambuco
1. Introdução
2. Levantamento bibliográfico
276
Caatingas (VANZOLINI et al., 1980) e, a partir daí, uma série de trabalhos
com a comunidade de répteis das cidades de Ouricurí e Exu no estado de
Pernambuco (MIRANDA, 1980, 1981, 1983, MIRANDA; MIRANDA, 1981,RO-
DRIGUES, 1984, 1985, 1988; VITT, 1983a, 1983b, 1986, 1996; VITT; BLACK-
BURN, 1983).
Na década de 90, vários trabalhos foram publicados (VITT; COLLI, 1994;
DIAS; LIRA-DA-SILVA, 1998). Um fato importante para a pesquisa biológica
no semi-árido brasileiro foi a revelação de uma importante área de endemis-
mos, com alta diversidade local, no campo de dunas do Rio São Francisco,
entre as cidades de Barra (Bahia) e Petrolina (Pernambuco) (RODRIGUES,
1988, 1991a, 1991b, 1991c, 1991d, 1993a, 1993b, 1996). Nessa área, com pouco
mais de 5 mil km², foram registradas 40 espécies de lagartos e anfisbenas e
25 espécies de serpentes, das quais 35% do total são espécies endêmicas,
além de espécies de aves, mamíferos e vegetais particulares somente dessa
região (FIORAVANTI, 2000).
Com relação aos anfíbios, a situação para o semi-árido nordestino
é desapontadora pela pouca quantidade de trabalhos sobre as espécies
ocorrentes (GUIX, 1983; ARZABE; ALMEIDA, 1997; ARZABE, 1999). Cascon
(1987) e Arzabe (1999) demonstraram que a caatinga é um dos ecossiste-
mas brasileiros menos amostrados para os anuros e Rodrigues (2003),
discute que aparentemente essa condição de desconhecimento ainda per-
manece. Em Pernambuco, os anfíbios do semi-árido foram citados por
Miranda-Ribeiro (1937a, 1937b), CARVALHO (1937) e Santos e Carnaval
(2002).
Com a realização do workshop Biodiversidade da Caatinga, em Pe-
trolina/PE (2000), a fauna de anfíbios e répteis do semi-árido brasileiro foi
revisada, sendo registradas 44 espécies de lagartos, nove de anfibenídeos,
47 de serpentes, quatro de quelônios, três de crocodiliano, 47 de anfíbios
anuros e dois de gimnofionas (RODRIGUES, 2003). Esse número de espé-
cies aumenta em muito quando se consideram as ilhas relictuais de flores-
tas, como os brejos florestados e enclaves de outros tipos de paisagens
mais mésicas presentes na região do semi-árido. A revisão da literatura
revelou um total de 150 localidades amostradas, com a existência de uma
grande lacuna, com regiões geográficas pouco ou ainda não amostradas.
Das localidades amostradas, poucas contam com coleções representativas
da herpetofauna local.
3. Material e métodos
A – Área de Trabalho
277
Tabela 1: Listagem dos pontos de coleta nas RPPNs Maurício Dantas (MD) (Betânia) e
Cantidiano Valgueiro (CV) (Floresta) – PE.
Coordenadas
Ponto Denominação Fitofisionomia
(em UTM – zona 24L)
Caatinga (Estrato
Açudinho /
1 arbóreo denso com 0588291 / 9081484
Salgada (MD)
arbustos)
Caatinga (Estrato
Cavalo Morto
2 arbóreo aberto com 0592312 / 9080708
(MD)
muitos arbustos)
Caatinga (Estrato
Angico / Estrada arbóreo muito aberto
3 0555982 / 9063650
(CV) sem arbustos e com
muitos subarbustos)
Caatinga (Estrato
arbóreo muito aberto
4 Rio Pajeú (CV) 0553130 / 9066110
sem arbustos e
subarbustos)
Porteira da Caatinga (Estrato
A Reserva arbóreo denso com 0588512 / 9084828
(MD) arbustos)
Cidade de 38o11’45’’W /
B Fito extra
Betânia 08o18’43’’S
Açude da Casa Corpo d’água dentro da
C 0588787 / 9081492
(MD) Fito 1
Córrego do Caatinga (Estrato
D Cavalo Morto arbóreo aberto com 0592312 / 9080708
(MD) muitos arbustos)
Açude Olho
Corpo d’água dentro da
E d’Água 0587773 / 9083392
Fito 2
(MD)
Lagoa Grande Corpo d’água dentro da
F 0558015 / 9062964
(CV) Fito 3
Manga das Corpo d’água dentro da
G 0553383 / 9065344
Cachoeiras (CV) Fito 4
Herpetofauna da área de Betânia e Floresta, Pernambuco
B – Trabalhos de Campo
278
4. Resultados
Tabela 2 - Lista preliminar da herpetofauna das RPPNs Maurício Dantas (Betânia) e Cantidiano Valgueiro (Floresta) e área do
entorno – PE, pontos de ocorrência e metodologia de obtenção dos dados nos períodos chuvoso e seco.
Período
Legenda: Extra= Pontos complementares de coleta fora dos locais indicados (A=Portão da Reserva Maurício Dantas; B=Cidade de Betânia);
G= Coleta de um lote de girinos; CM= Captura manual (sacrificados + soltos); CAQ= Captura em armadilhas de queda (sacrificados +
soltos); OBS= Observação visual.
279
Tabela 2 (continuação)
Período
Nome Ponto Forma
Família Espécie de coleta
popular
1 2 3 4 Extra CAQ CM OBS
Leptodactylus Chuv. 2 -- 6 obs -- 8 -- X
fuscus (Schneider, Jia, Caçote
1799) Seco -- -- -- -- -- 0 -- --
Leptodactylus Chuv. -- -- -- -- -- 0 -- --
labyrinthicus Jia
(Spix, 1824) Seco -- Obs -- -- -- 0 -- X
Leptodactylus Chuv. 3 2 3 6 -- 14 -- --
gr. ocellatus Jia
(Linnaeus, 1758) Seco 10 2 -- 2 -- 14 -- --
Leptodactylus Chuv. 1 Obs -- obs -- 1 -- X
troglodytes Jia
(Lutz, 1926) Seco -- -- -- -- -- 0 -- --
Leptodactyli-dae Physalaemus Chuv. 5 1 6 3 obs 15 -- X
(9 spp.) albifrons Jia
(Spix, 1824) Seco -- -- -- -- -- 0 -- --
Physalaemus Chuv. 12 9 5 obs -- 26 -- X
cicada Caçote
(Bokermann, 1966) Seco -- -- -- -- -- 0 -- --
Pleurodema Chuv. 4 4 -- 1 -- 9 -- --
diplolistris Sapo
(Peters, 1870) Seco -- -- -- -- -- 0 -- --
Proceratophrys Chuv. 3 Obs obs -- -- 3 -- X
cristiceps Sapo-boi
(Müller, 1884) Seco -- -- -- -- -- 0 -- --
Pseudopaludicola Chuv. -- -- 3 -- -- 3 -- --
-----
sp. 2 Seco -- -- -- obs -- 0 -- X
Dermatonotus Chuv. 4 -- -- -- -- 4 -- --
Microhylidae
muelleri Sapo-boi
(1 sp.) Seco -- -- -- -- -- 0 -- --
(Boettger, 1885)
Pipa carvalhoi Chuv. 3G -- -- -- -- 3G -- --
Pipidae (1 sp.) (Miranda-Ribeiro, -----
1937) Seco -- -- -- -- -- 0 -- --
Herpetofauna da área de Betânia e Floresta, Pernambuco
Total – 19 espécies 17 12 10 12 1 19 0 11
Lagartos
Briba brasiliana Briba, víbora, Chuv. -- -- 1 -- -- 1 -- --
(Amaral, 1935) lagartixa Seco -- 2 -- 3 -- 3 2 --
Gymnodactylus Chuv. 1 1 -- obs -- 2 -- X
Briba, víbora,
geckoides
lagartixa Seco 2 2 2 4 -- 3 10 --
(Spix, 1825)
Gekkonidae Lygodactylus Chuv. 1 2 -- -- -- 3 -- --
(4 spp.) klugei
-----
(Smith, Martin & Seco Obs 4 -- -- -- 4 -- X
Swain, 1977)
Phyllopezus Chuv. 5 -- 1 2 -- 8 -- --
Briba, víbora,
pollicaris
lagartixa Seco 1 2 1 1 -- 5 -- --
(Spix, 1825)
Iguanidae Iguana iguana Chuv. Obs -- -- -- -- -- -- X
Camaleão
(1 sp.) (Linnaeus, 1758) Seco -- -- -- -- -- -- -- --
Mabuya cf. heathi Chuv. -- -- obs -- -- -- -- X
Scincidae
Schmidt & Inger, Calango-liso
(1 sp.) Seco -- -- -- -- -- -- -- --
1951
280
Tabela 2 (continuação)
Período
Nome Ponto Forma
Família Espécie de coleta
popular
1 2 3 4 Extra CAQ CM OBS
Cnemidophorus Chuv. 1 Obs obs 1 -- 2 -- X
Calango-
ocellifer
verde Seco 9 4 1 -- -- 0 30 --
Teiidae (Spix, 1825)
(2 spp.) Tupinambis Chuv. -- -- obs -- -- 0 -- X
merianae (Duméril Tejo
& Bibron, 1839) Seco -- -- -- -- -- -- -- --
Tropidurus Chuv. 2 Obs obs obs A 2 -- X
hispidus Calango
(Spix, 1825) Seco Obs 3 3 4 -- 2 13 X
Tropiduridae
(2 spp.) Tropidurus Chuv. 1 Obs obs obs -- 1 -- X
Calango-de-
semitaeniatus
lajedo Seco Obs -- 2 obs -- 1 4 X
(Spix, 1825)
Total – 10 espécies 7 7 8 6 1 7 5 8
Serpentes
Boa constrictor Cobra-de- Chuv. -- -- -- -- -- -- -- --
Boidae (1 sp.)
(Linnaeus, 1758) veado, jibóia Seco Obs -- -- -- -- -- -- X
Leptodeira Chuv. 1 -- -- -- -- 1 -- --
annulata Jararaquinha
(Linnaeus, 1758) Seco -- -- -- -- -- -- -- --
Oxyrhopus Chuv. 1 -- obs 1 -- 2 -- X
trigeminus
Cobra-coral
(Duméril, Bibron & Seco -- -- -- -- -- -- -- --
Duméril, 1854)
Philodryas Chuv. -- -- 1 -- -- 1 -- --
nattereri Cobra-cipó
Colubridae Seco -- -- -- -- -- -- -- --
(Steindachner, 1870)
(6 spp.)
Philodryas olfersi Chuv. -- -- -- -- B 1 -- --
(Litchtenstein, Cobra-verde
1826) Seco -- -- -- -- -- -- -- --
Tantilla Chuv. -- -- -- -- -- -- -- --
melanocephala Cobra-cipó
(Linnaeus, 1758) Seco 1 -- -- -- -- -- 1 --
Thamnodynastes Chuv. 1 -- 1 -- -- 2 -- --
strigilis (Thunberg, Cobra-cipó
1787) Seco -- -- -- -- -- -- -- --
Micrurus Chuv. -- -- -- 1 -- 1 -- --
Elapidae
ibiboboca Cobra-coral
(1 sp.) Seco -- -- -- -- -- -- -- --
(Merrem, 1820)
Viperidae Crotalus durissus Chuv. -- -- -- -- -- -- -- --
Cascavel
(1 sp.) Linnaeus, 1758 Seco -- -- -- obs -- -- -- X
Total – 9 espécies 5 0 3 3 1 6 1 3
Testudines
Phrynops aff. Chuv. -- -- -- -- -- -- -- X
Chelidae
geoffroanus Cágado
(1 spp.) Seco -- -- -- obs -- -- -- X
(Schweigger, 1812)
Kinosternon Chuv. -- -- -- -- -- -- -- --
Kinosternidae
scorpioides Muçuã
(1 spp.) Seco obs -- -- -- -- -- -- X
(Linnaeus, 1758)
Geochelone Chuv. -- Obs -- -- -- -- -- X
Testudinidae
carbonaria Jabuti
(1 spp.) Seco obs -- -- -- -- -- -- X
(Spix, 1824)
Total – 3 espécies 3 1 0 1 0 0 0 2
Total geral – 41 espécies 31 20 21 22 3 32 6 24
281
nus). O baixo número de captura de espécies e espécimes em Cantidiano
Valgueiro pode ser explicado pela ausência de chuvas durante os dias de
coleta, ocorrendo registro apenas de espécies mais generalistas e com
reprodução prolongada. Na Reserva de Maurício Dantas, a equipe chegou
durante as chuvas.
As coletas manuais e observações visuais possibilitaram o registro
de todas as espécies de anfíbios e 21 de répteis (Tabela 3), enquanto as
armadilhas de queda (Tabelas 2 e 4), usadas somente durante o período
seco, ajudaram na obtenção de sete espécies. A serpente Tantilla mela-
nocephala foi exclusivamente registrada pelas armadilhas e, da mesma
forma, os exemplares de Cnemidophorus ocellifer
ocellifer, coletados durante o
período seco. Houve apenas uma captura de anfíbio, não identificado
(Leptodactylus
Leptodactylus sp.).
Conforme esperado, as coletas de anfíbios foram bem mais efi-
cientes durante o período chuvoso (18 anfíbios e 18 répteis) do que no
seco (sete anfíbios e 12 répteis) embora, durante o período seco, a área de
Maurício Dantas ainda apresentasse alguns corpos d’água que serviam de
refúgio e habitat para os poucos anfíbios presentes, dentre eles o Açude
da Casa, o Açudinho e o Açude Velho (Tabela 3). Na reserva Cantidiano Val-
gueiro, durante a época seca, todas as lagoas temporárias estavam secas,
mas ainda foram registradas espécies de anfíbios ocupando as margens
do rio Pajeú (Hyla raniceps, Leptodactylus gr. ocellatus e Pseudopaludico-
la sp. 2). As lagoas temporárias são locais importantes, visto que apresen-
tam maior produtividade (MALTCHIK, 2000). Numa reserva que tem por
objetivo a manutenção da biota, esses ambientes devem ser vistos com
maior atenção.
Durante o período chuvoso, Phyllomedusa gr. hypochondrialis, Phy-
salaemus albifrons, P. cicada, Scinax x-signatus, Leptodactylus gr. ocella-
tus e Bufo paracnemis foram espécies abundantes e facilmente observadas
em todas as fitofisionomias (Tabela 3). Outras, como Dermatonotus muel-
leri e Scinax pachycrus, foram observadas em abundância, mas apenas
em determinadas fitofisionomias. Durante o período seco, ocorreu uma
maior abundância de Bufo paracnemis, observando-se uma variedade de
Herpetofauna da área de Betânia e Floresta, Pernambuco
tamanhos, desde adultos até jovens. Num breve censo realizado no açude
da casa, num intervalo de 30 min, foram observados 64 espécimes. Já no
caso do Bufo granulosus, só foram observados poucos espécimes jovens
(n=12). A espécie Scinax x-signatus só foi amostrada dentro da casa, par-
ticularmente nos banheiros. Em Cantidiano Valgueiro, a carcaça de um
B. paracnemis foi achada, suas entranhas haviam sido comidas, prova-
velmente por um guaxinim. Durante o período seco, nenhum lagarto da
família Teiidae foi observado. As serpentes foram registradas por ocasião
de encontros casuais durante as buscas, tanto no período chuvoso como
seco. Nas margens do Rio Pajeú, foram observadas 4 carcaças de Phry-
nops aff. geoffroanus, todas ressecadas e algumas ainda com esqueleto
no interior do casco, e uma de Geochelone carbonaria (animal adulto).
Avaliando os índices de captura (Tabelas 3 e 4), é possível observar
que, das 41 espécies registradas nos dois períodos, 10 (24%) ocorrem nos
quatro pontos de amostragem. Cnemidophorus ocellifer (30 ex.) e Tro-
pidurus hispidus (13 ex.) foram as espécies mais abundantes. O ponto
1, Açudinho/Salgada, obteve o maior índice de captura (18 ex.) e maior
riqueza de espécies (31) (Tabela 2). Os demais pontos apresentaram rique-
zas semelhantes, mas o ponto 3, Angico, tem melhor índice de captura (16
282
ex.) (Tabela 4). O ponto 1, Açudinho/Salgado, também apresentou o maior
número de espécies exclusivas (9): Hyla soaresi, Trachycephalus atlas,
Dermtonotus muelleri, Pipa carvalhoi, Iguana iguana, Boa constrictor,
Leptodeira annulata, Tantilla melanocephala e Kinosternon scorpioides.
Entretanto, todos os pontos também tiveram espécies exclusivas: o ponto
2, Leptodactylus labyrinthicus, o ponto 3, Mabuya heathi e Tupinambis
merianae e o ponto 4, Micrurus ibiboboca, Crotalus durissus e Phrynops
geoffroanus. Tropidurus hispidus, T. semitaeniatus (principalmente nos la-
jeiros), Cnemidophorus ocellifer, Gymnodactylus geckoides e Phyllopezus
pollicaris foram os mais bem distribuídos e abundantes, aparecendo nos
quatro pontos (Tabela 4). Os gecos Gymnodactylus geckoides e Lygodac-
tylus klugei foram igualmente abundantes durante os períodos chuvosos
e secos, embora apenas em alguns lugares da reserva Maurício Dantas.
Tabela 3: Áreas de amostragem, esforço de captura manual por busca ativa e listagem das espécies observadas da herpetofauna
das RPPNs Maurício Dantas (MD) (Betânia) e Cantidiano Valgueiro (CV) (Floresta) – PE, no período chuvoso e seco.
ESFORÇO DE CAPTURA
ÁREA PERÍODO ESPÉCIE OBSERVADAS E/OU CAPTURADAS
(homem X horas X dias)
Reserva Maurício Dantas (Município de Betânia)
Bufo granulosus, B. paracnemis, Dermatonotus
muelleri, Hyla raniceps, Hyla soaresi,
Leptodactylus fuscus, L. gr. ocellatus, L.
troglodytes, Phyllomedusa gr. hypochondrialis,
Physalaemus albifrons, P. cicada, Pleurodema
4 pessoas X (3+3+3 h) X 2,5 diplolistris, Proceratophrys cristiceps, Scinax
Chuvoso
PONTO 1 dias = 90 horas x-signatus, S. pachycrus, Trachycephalus atlas;
Cnemidophorus ocellifer, Gymnodactylus
(Açude da Casa, geckoides, Phyllopezus pollicaris, Tropidurus
Salgada, Açudinho, hispidus, T. semitaeniatus; Leptodeira annulata,
Roça de Baixo Oxyrhopus trigeminus, Thamnodynastes
e Porteira da strigilis; Kinosternon scorpioides.
Reserva) Bufo granulosus, B. paracnemis,
Leptodactylus gr. ocellatus, Scinax x-signatus;
Cnemidophorus ocellifer, Gymnodactylus
Seco 3 pessoas x (3+3+3 h) X 2,5
geckoides, Lygodactylus klugei, Phyllopezus
dias = 67h 30’
pollicaris, Tropidurus hispidus, T. semitaeniatus;
Boa constrictor, Tantilla melanocephala;
Geochelonia carbonaria.
Bufo granulosus, Leptodactylus labyrinthicus,
L. gr. ocellatus, L. troglodytes, Physalaemus
albifrons, P. cicada, Pleurodema diplolistris,
Proceratophrys cristiceps, Scinax pachycrus,
Chuvoso 4 pessoas X (3+3+3 h) X 2,5
Scinax x-signatus; Cnemidophorus ocellifer,
dias = 90 horas
PONTO 2 Gymnodactylus geckoides, Lygodactylus
klugei, Phyllopezus pollicaris, Tropidurus
(Cavalo Morto e hispidus, T. semitaeniatus; Geochelone
Olho d’água) carbonaria.
Bufo granulosus, B. paracnemis, Leptodactylus
labyrinthicus, L. gr. ocellatus, Briba brasiliana,
Seco 3 pessoas x (3+3+3 h) X 2,5
Cnemidophorus ocellifer, Gymnodactylus
dias = 67h 30’
geckoides, Lygodactylus klugei, Phyllopezus
pollicaris, Tropidurus hispidus.
283
Tabela 3 (continuação)
ESFORÇO DE CAPTURA
ÁREA PERÍODO ESPÉCIE OBSERVADAS E/OU CAPTURADAS
(homem X horas X dias)
Reserva Cantidiano Valgueiro (Município de Floresta)
Bufo paracnemis, Hyla raniceps, Leptodactylus
fuscus, L. gr. ocellatus, Phyllomedusa gr.
hypochondrialis, Physalaemus albifrons,
P. cicada, Proceratophrys cristiceps,
Pseudopaludicola sp. 2, Scinax x-signatus;
PONTO 3 3 pessoas X (3+3+3 h) X 2,5
Chuvoso Briba brasiliana, Cnemidophorus ocellifer,
dias = 67h 30’
Mabuya heathi, Phyllopezus policaris,
(Córrego do
Tropidurus hispidus, T. semitaeniatus,
Angico; Poços da
Tupinambis merianae; Oxyrhopus trigeminus,
Mônica e Lagoas)
Philodryas nattereri, Thamnodynastes strigilis,
Micrurus ibiboboca.
Bufo paracnemis; Cnemidophorus ocellifer,
Seco 3 pessoas x (3+3+3 h) X 2,5
Gymnodactylus geckoides, Phyllopezus
dias = 67h 30’
pollicaris, Tropidurus hispidus, T. semitaeniatus.
Bufo paracnemis, Hyla raniceps, Leptodactylus
fuscus, L. gr. ocellatus, L. troglodytes,
Physalaemus albifrons, P. cicada, Phyllomedusa
3 pessoas X (3+3+3 h) X 2,5
Chuvoso gr. hypochondrialis, Pleurodema diplolistris,
dias = 67h 30’
PONTO 4 Scinax x-signatus; Cnemidophorus ocellifer,
Gymnodactylus geckoides, Iguana iguana,
(Rio Pajeú e Phyllopezus pollicaris; Oxyrhopus trigeminus.
Lagoa Manga das Bufo granulosus, B. paracnemis, Hyla raniceps,
Cachoeirinhas) Leptodactylus gr. ocellatus, Pseudopaludicola
Seco 3 pessoas x (3+3+3 h) X 2,5 sp. 2, Scinax x-signatus; Briba brasiliana,
dias = 67h 30’ Gymnodactylus geckoides, Iguana iguana,
Phyllopezus pollicaris, Tropidurus hispidus, T.
semitaeniatus; Phrynops aff. geoffroanus.
Tabela 4 - Índices de captura dos anfíbios e répteis nas armadilhas de queda aplicadas
Herpetofauna da área de Betânia e Floresta, Pernambuco
nas RPPNs Maurício Dantas (Betânia) e Cantidiano Valgueiro (Floresta) – PE, durante o
período seco.
Fitofisionomia
Córrego do
Açudinho
Rio Pajeú
(Ponto 1)
(Ponto 2)
(Ponto 3)
Angico
(Fito 4)
Cavalo
Morto
Espécie Total
03 X 4 03 X 4 03 X 4 03 X 4
Esforço Amostral
= 12 = 12 = 12 = 12
Briba brasiliana 2 --- 1 --- 1
Cnemidophorus ocellifer 30 15 9 5 1
Gymnodactylus geckoides 10 2 3 1 4
Leptodactylus sp. 1 --- --- 1 ---
Tantilla melanocephala 1 1 --- --- ---
Tropidurus hispidus 13 --- 2 7 4
Tropidurus semitaeniatus 4 --- --- 2 2
Total 61 18 15 16 12
Legenda: Os números representam a abundância absoluta de cada espécie por fitofisionomia; números totais de
animais capturados na armadilha (sacrificados + soltos).
284
5. Discussão
285
mais próximo do agrupamento geral, quando anfíbios e répteis são ana-
lisados em conjunto. Entretanto, todos os fenogramas (Figuras 1, 2 e 3)
mostram coerência, unindo em um grupo os dois pontos amostrados da
Reserva Maurício Dantas, que compartilham uma caatinga semelhante com
estrato arbóreo rico em arbustos e, em outro grupo, os dois pontos da Re-
serva Cantiadiano Valgueiro, que compartilham uma caatinga com estrato
arbóreo aberto sem arbustos e com pedras.
Análise de agrupamento (UPGMA) realizada a partir da matriz dos coeficientes de similaridade de Jaccard
Figura 1
para as herpetofaunas de Maurício Dantas (Betânia) e Cantidiano Valgueiro (Floresta) – PE..
Herpetofauna da área de Betânia e Floresta, Pernambuco
Análise de agrupamento (UPGMA) realizada a partir da matriz dos coeficientes de similaridade de Jaccard
Figura 2
para a fauna de anfíbios de Maurício Dantas (Betânia) e Cantidiano Valgueiro (Floresta) – PE.
Análise de agrupamento (UPGMA) realizada a partir da matriz dos coeficientes de similaridade de Jaccard
Figura 3
para a fauna de répteis de Maurício Dantas (Betânia) e Cantidiano Valgueiro (Floresta) – PE.
286
É importante ainda comentar que as herpetofaunas encontradas nes-
sas duas áreas de Pernambuco apresentam características xéricas que as
unificam, fato confirmado pelas dez espécies comuns aos quatro pontos.
Entretanto, a composição de cada área também tem suas peculiaridades ta-
xonômicas e ecológicas. De forma geral, as espécies possuem distribuição
ampla, em áreas abertas.
Em recente publicação, Rodrigues (2003) comenta a diversidade fau-
nística do bioma Caatinga, registrando 51 espécies de anfíbios e 116 de rép-
teis. Neste levantamento, foram registradas 41 espécies (19 anfíbios e 23
répteis), todas mencionadas na referência citada. Levantamentos anteriores
realizados com a anurofauna em áreas de caatinga podem ser comparados
com os resultados aqui obtidos: Cascon (1987), para a área de Cabaceiras,
Paraíba, obteve 18 espécies (uma a menos que Maurício Dantas + Cantidiano
Valgueiro-PE), sendo 13 em comum; também na Paraíba, Arzabe (1999), em
São José do Bonfim, registra 16 espécies, 11 em comum, e 12 espécies na
área de Maturéia, 8 em comum.
Das espécies encontradas neste levantamento, 11 (28%) possuem dis-
tribuição restrita ao Nordeste brasileiro ou chegam até as manchas de caa-
tinga na região norte de Minas Gerais: Leptodactylus troglodytes, Pipa carva-
lhoi, Pleurodema diplolistris, Proceratophrys cristiceps, Trachycephalus atlas,
Scinax pachycrus, Briba brasiliana, Gymnodactylus geckoides, Lygodactylus
klugei, Mabuya aff. heathi e Micrurus ibiboboca.
Conforme os levantamentos apresentados por Santos e Carnaval
(2002), as espécies Trachycephalus atlas, Physalaemus albifrons e Procera-
throphrys cristiceps ainda não foram registradas no estado de Pernambuco,
constando aqui como novos registros.
Nenhuma espécie aqui citada consta na lista nacional de espécies ame-
açadas, elaborada recentemente pelo MMA/IBAMA/FUNDAÇÃO BIODIVER-
SITAS (2003) (MMA, 2004), e na internacional elaborada pelo IUCN (2003).
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289
290
7 Diversidade de peixes
(Ictiofauna) da bacia do
rio Curimataú, Paraíba.
Fernando Groth
Resumo
1. Introdução
292
Characiformes, Siluriformes e Gymnotiformes, com um predomínio de Si-
luriformes em número de espécies (REIS et al., 2003), além de raras espécies
das ordens Gonorhinchiformes e Cypriniformes (NELSON, 1994). Além dos
Ostariophysi citados acima, os Cichlidae (Perciformes) e os Cyprinodontifor-
mes têm também uma participação importante na composição da ictiofauna
de água doce da região neotropical. As familias Lepidosirenidae, Osteoglos-
sidae, Atherinopsidae, Percichthyidae, Potamotrygonidae, Synbranchidae,
Nandidae, Gobiidae, Scaenidae, entre outras, são grupos neotropicais de
menor diversidade, mas que formam um conjunto que agrega um grande
número de espécies (VARI; MALABARBA, 1998). Algumas espécies de lin-
guados da família Achiridae (Pleuronectiformes) têm ocorrência exclusiva
dentro das bacias do Amazonas e Orinoco e de rios das Guianas, e algumas
espécies marinhas entram nos rios das Américas do Sul e Central (RAMOS,
1998, 2003). Uma espécie de ocorrência rara da família Bothidae (Pleuronec-
tiformes) foi registrada em água doce na bacia do Amazonas (Robson T. C.
Ramos, observação pessoal).
Agostinho (1993) chamou a atenção para o fato de que o conhecimento
que temos da diversidade ictiofaunística das grandes bacias hidrográficas
brasileiras encontrava-se em estado incipiente. O mesmo acontece com as
bacias menores, especialmente aquelas do Nordeste brasileiro. Reis et al.
(2003), tratando da Ictiofauna neotropical, demonstram que, embora tenha
havido progressos, a sistemática dos peixes dessa região permanece ainda
com um grande número de questões a serem resolvidas.
Os primeiros registros da ictiofauna de água doce do Nordeste brasilei-
ro datam do século XVII, coincidindo com o começo dos estudos da ictiofau-
na do Novo Mundo. Durante o século XX, foram retomados estudos acerca
da diversidade de peixes de água doce da região Nordeste e, ao longo de
todo o século, foram desenvolvidos estudos que ampliaram o conhecimento
dessa ictiofauna, como historiado por Rosa (2004), vários deles, no entanto,
pontuais ou representativos de grupos de ampla distribuição na América do
Sul e que incluem componentes da fauna dos rios que correm no bioma
caatinga. Dessa forma, o conhecimento que se tem da ictiofauna nordestina
é ainda insuficiente. Segundo Rosa (2004), o quadro atual de conhecimento
dessa ictiofauna somente poderá ser modificado com a realização de progra-
mas de amostragens nas diversas bacias e seu resultado analisado a partir
de novas revisões sistemáticas.
Afinidades entre a ictiofauna do Nordeste médio-oriental (área que
compreende as bacias hidrográficas localizadas entre os rios Parnaíba e
São Francisco, definida por Rosa et al. (2003)) e da região guiano-ama-
zônica são citadas na literatura (GERY, 1969; PAIVA, 1978). A composição
atual dessa fauna parece ser resultante de uma gama de processos histó-
ricos que reduziram sua diversidade ao longo do tempo, entre eles trans-
gressões marinhas e expansão do clima semi-árido, processos ecológicos
decorrentes dessas alterações ambientais e, finalmente, fatores antrópi-
cos que podem ter levado à exclusão de elementos autóctones (ROSA et
al., 2003). Segundo Paiva (1974), a ictiofauna da região Nordeste médio-
oriental é muito pobre e com pouco endemismo registrado. O mesmo
autor afirma que existem em torno de 50 espécies de peixes nessa região,
podendo ser encontradas entre 10 e 20 espécies por sistema hidrográ-
fico. Rosa (2004), no entanto, registrou 81 espécies na mesma área, 31
delas endêmicas. O número de espécies por sistema hidrográfico também
é maior que o considerado por Paiva (1974). Segundo Rosa (2004), o nú-
293
mero de espécies registradas nos sistemas considerados na mesma área
varia entre 22 e 45.
No estado da Paraíba, o conhecimento que se tem da ictiofauna de
águas continentais permanece ainda restrito. Gomes-Filho (1999) fez o in-
ventário das espécies de peixes da ordem Characiformes das bacias dos
rios Abiaí, Camaratuba, Gramame, Jaguaribe, Paraíba do Norte e Maman-
guape. Como resultado, foram identificadas 18 espécies distribuídas em
13 gêneros e 7 famílias. Groth (2002) realizou o levantamento ictiofaunísti-
co dos brejos de altitude dos estados de Pernambuco e Paraíba, registran-
do 27 espécies pertencentes a 23 gêneros de 12 famílias. Uma compilação
recente não publicada registrou um total de 44 espécies distribuídas em
16 famílias de peixes de água doce nas bacias hidrográficas do estado da
Paraíba (F. Groth, observação pessoal). Os dados citados indicam um pre-
domínio numérico da ordem Characiformes, que representa mais de 50%
das espécies registradas.
Este trabalho visa inventariar a ictiofauna da bacia do rio Curimataú,
relatando as espécies presentes e discutindo a diversidade observada em
relação às perturbações hidrológicas ou antrópicas. Tais ações são consi-
deradas um passo inicial para a elaboração de políticas de conservação e
sustentabilidade da biota aquática no Nordeste.
B. Rios intermitentes
Os rios de regime intermitente estão distribuídos em várias regiões
do mundo, apresentando ciclo hidrológico com períodos de cheia e perío-
dos de seca total devido à irregularidade do regime de chuvas nas regiões
onde ocorrem. Os rios intermitentes brasileiros estão em sua maioria locali-
zados na caatinga, a qual possui vegetação composta por espécies xerófilas
e espinhosas, de substrato herbáceo, e gramíneas raras ou ausentes. Essa
vegetação não protege os rios da região contra a evaporação. As altas taxas
de evaporação e escoamentos superficiais de suas águas contribuem para o
regime temporário desses rios, sendo a região caracterizada por situações
extremas de seca e de cheia. Durante a cheia, os rios tornam-se enormes
corredores de comunicação entre os diferentes ecossistemas aquáticos da
região, permitindo a disseminação de peixes por toda a área do sistema. A
reprodução da maioria das espécies coincide com essa época. A cheia do
semi-árido é classificada, segundo Graf (1988), em quatro tipos: cheias esta-
cionais (seasonal flood), de múltiplos picos (multiple
multiple peak event
event), de um pico
só (single
single peak event
event) e as cheias rápidas (flash flood). A seca é caracterizada
pelo desaparecimento da maior parte das águas de superfície, restando ape-
nas alguns corpos naturais de água represada e os açudes, que funcionam
como o principal refúgio das espécies que ocorrem nesses ecossistemas du-
rante os picos de estresse ambiental.
Segundo classificação de Stanley e Fisher (1992), as secas em bacias de
regiões semi-áridas estão caracterizadas por três fases hidrológicas ao longo
do ano: fase secando (drying), fase seca (dryness) e fase cheia ou de reinun-
dação (rewetting). Essas diferentes fases impõem um desafio à capacidade
de adaptação das espécies que ali ocorrem. Entretanto, estudos a respeito
dos efeitos das perturbações hidrológicas sobre as comunidades de peixes
de água doce e das implicações sobre essa diversidade são ainda escassos
(MALTCHIK, 1999). Alguns estudos têm sido realizados sobre a influência da
intermitência desses rios no comportamento alimentar e no hábito reprodu-
Peixes
294
2. Área de estudo
Figura 1 Mapa do estado da Paraíba com destaque para a bacia do rio Curimataú.
3. Material e métodos
295
O material foi coletado com o uso de redes de arrasto, redes de emalhe,
tarrafas, puçás e anzóis, de acordo com as características físicas do ambiente.
O procedimento geral de coleta foi chegar ao local escolhido no final da tarde,
lançar as redes de emalhe ao anoitecer e recolher os espécimes coletados no
dia seguinte. Durante o tempo de permanência das redes e ao longo do dia se-
guinte até o meio da tarde, outros apetrechos de pesca foram utilizados. Desse
modo, o tempo médio dispendido em cada ponto de coleta foi de 24 horas.
Tais procedimentos não se aplicaram completamente aos pontos 1, durante a
segunda coleta, 3 e 8 (ver explicação no item IV B, a seguir).
Os espécimes obtidos foram fixados em solução de formalina a 10% e
tratados de acordo com as normas de curadoria científica, segundo Malabar-
ba e Reis (1987). A triagem e a identificação dos espécimes foram feitas no
Laboratório de Ictiologia da Universidade Federal da Paraíba e depositados
na Coleção Ictiológica do Departamento de Sistemática e Ecologia da mesma
universidade (ver lista de material examinado no Apêndice I). A coleta de da-
dos merísticos e morfométricos foi realizada seguindo os métodos de Hubbs
e Lagler (1964).
296
na época chuvosa fosse registrado aumento no volume de água dos açudes,
o que não foi o caso dos açudes de Cacimba da Várzea e Poleiros, nos quais
houve redução de volume devido à liberação de água por parte da companhia
de água do estado. Foi realizada coleta no açude do Timbofe apenas durante
a primeira expedição, visto que, durante a segunda, o açude encontrava-se
com sinais evidentes de poluição (ver descrição do ambiente à frente), o que
levou a equipe à decisão de não realizar coleta naquela ocasião. No açude Al-
godão, município de Algodão de Jandaíra (PB), foi realizada coleta apenas na
segunda expedição, pois o açude encontrava-se completamente sem água
durante a época da primeira expedição.
A área da bacia que compreende a região da Pedra da Boca, município
de Araruna (PB), onde corre o rio Calabouço, e a porção baixa da bacia (pon-
tos 6 a 9) foram amostradas durante a segunda expedição.
Tabela 1. Capacidade máxima dos açudes visitados em novembro de 2002 e maio de 2003 e os volumes registrados nesses meses,
quando se realizaram as coletas (dados cedidos pelo SEMARH/LMRS-PB).
4. Resultados e discussão
297
estado da Paraíba durante o ano de 2002, seu volume foi pequeno na bacia
do Curimataú, correspondendo a uma precipitação abaixo da média histórica
durante o período que antecedeu o início do estudo (Figura 2). Em decorrên-
cia, a região exibiu feição de extrema seca.
De fevereiro a maio de 2003, no período chuvoso, ocorreu precipitação
em torno dos 100 mm nas cabeceiras e de 400 mm na porção média da bacia
(Figura 3), sendo esta uma precipitação aproximadamente 50% abaixo da
média histórica (Figura 4), como registrado no mês de maio. Com esse nível
de precipitação, a região exibiu as mesmas condições do período seco.
Regime de chuvas do estado da Paraíba durante o período de janeiro a setembro de 2002 em relação à sua média
Figura 2
histórica (fonte: SEMARH/RMLS-PB/Emater).
Peixes
Precipitação acumulada no estado da Paraíba entre os meses de fevereiro a maio de 2003 (fonte: SEMARH/RMLS-
Figura 3
PB/Emater).
298
Regime de chuvas do estado da Paraíba durante o mês de maio de 2003 em relação à sua média histórica (fonte:
Figura 4
SEMARH/RMLS-PB/Emater).
299
2. Várzea a jusante do açude Cacimba da Várzea (Apêndice II, Figura 3)
Este é um ambiente lêntico que recebe água do sangradouro do
açude Cacimba de Várzea, mantendo-se perene mesmo na estação seca.
Apresenta águas transparentes e seu leito é predominantemente rochoso
na área amostrada. No seu curso, existem desde ambientes onde a água
corre em um fluxo lento a outros onde se acumula, formando poças largas
e fundas ou pequenas e rasas. Na segunda expedição, o volume de água
do açude estava reduzido (48% contra 61%). Em conseqüência, a várzea a
jusante apresentou um volume de água maior que o registrado na primei-
ra expedição e a quantidade de vegetação aquática também aumentou. O
desenvolvimento dessa vegetação ocasionou alguma dificuldade na ati-
vidade de coleta. Por outro lado, as populações de algumas espécies es-
tavam visivelmente maiores em relação ao observado durante a primeira
expedição, o que resultou na captura de um maior número de espécimes
dessas populações.
300
é um riacho raso e estreito, com pequenas porções mais alargadas e com
correnteza fraca. Ao longo de seu curso, o riacho é margeado por uma vege-
tação rasteira com a ocorrência esparsa de árvores de pequeno porte. Plantas
aquáticas, como as das famílias Ninfeacea, Ciperacea, entre outras, foram
observadas. A pequena largura desse afluente facilitou o uso de rede de ar-
rasto e puçás, sendo realizadas coletas em três pontos distintos.
301
Classe Actinopterygii
Subclasse Neopterygii
Divisão Teleostei
Subdivisão Euteleostei
Ordem Characiformes
Família Parodontidae
Apareiodon davisi Fowler,1941
Família Curimatidae
Steindachnerina notonota (Miranda – Ribeiro, 1937)
Família Prochilontidae
Prochilodus brevis Steindachner 1874
Família Crenuchidae
Subfamilia Characidiinae
Characidium bimaculatum Fowler,1941
Família Characidae
Subfamília Tetragonopterinae
Astyanax cf. bimaculatus (Linnaeus, 1758)
Astyanax fasciatus (Cuvier, 1819)
Hemigrammus marginatus Ellis, 1911
Hemigrammus sp. (A)
Hemigrammus sp. (B)
Subfamília Cheirodontinae
Serrapinnus heterodon (Eigenmann, 1915)
Serrapinnus piaba (Luetken, 1874)
Família Erythrinidae
Hoplias malabaricus (Bloch, 1794)
Ordem Siluriformes
Família Loricariidae
Subfamília Hypostominae
Hypostomus pusarum (Starks, 1913)
Ordem Cyprinodontiformes
Subordem Cyprinodontoidei
Família Poeciliidae
Subfamília Poeciliinae
Poecilia vivipara Bloch & Schneider, 1801
Poecilia reticulata Peters, 1860
Ordem Synbranchiformes
Subordem Synbranchoidei
Família Synbranchidae
Synbranchus marmoratus (Bloch, 1795)
Ordem Perciformes
Subordem Labroidei
Família Cichlidae
Cichla ocellaris Bloch & Schneider, 1801
Cichlasoma orientale Kullander, 1983
Crenicichla menezesi Ploeg, 1991
Geophagus brasiliensis (Quoy & Gaimard, 1824)
Oreochromis niloticus (Linnaeus, 1758)
Subordem Gobiodei
Família Gobiidae
Subfamilia Sicydiinae
Peixes
302
2. Diversidade ictiofaunística das porções alta e média da bacia do Curimataú
Foram coletados na primeira expedição 186 exemplares pertencentes a
12 espécies, de 11 gêneros e oito famílias, conforme Tabela 2. A segunda ex-
pedição, realizada em época chuvosa, resultou na captura de 744 espécimes
de peixes. Os espécimes coletados nesta etapa correspondem a 11 espécies,
de dez gêneros, pertencentes a oito famílias (Tabela 2).
Tabela 2: Espécies de peixes coletados nas porções alta e média da bacia do rio
Curimataú, durante os períodos seco e chuvoso (1ª e 2ª expedição), com os respectivos
números de espécimes distribuídos por ponto de coleta.
Espécies 1ª Expedição 2ª Expedição Total
Apareiodon davisi Ponto 2:03 ex. Ponto 4:109 ex. 112
Ponto 1:03 ex.
Characidium bimaculatum Ponto 2:01 ex. 05
Ponto 2:01 ex.
Ponto 1:21 ex. Ponto 1:65 ex.
Astyanax cf. bimaculatus Ponto 2:14 ex. Ponto 2:13 ex. 184
Ponto 3:28 ex. Ponto 4:43 ex.
Ponto 1:03 ex.
Ponto 1:05 ex.
Astyanax fasciatus Ponto 2:02 ex. 56
Ponto 2:29 ex.
Ponto 4:17 ex.
Hemigrammus marginatus Ponto 3:09 ex. 09
Ponto 1:91 ex.
Serrapinnus heterodon Ponto 2:03 ex. 156
Ponto 2:62 ex.
Ponto 1:05 ex.
Ponto 1:01 ex.
Hoplias malabaricus Ponto 2:02 ex. 26
Ponto 2:13 ex.
Ponto 3:05 ex.
Ponto 2:12 ex.
Hypostomus pusarum Ponto 2:02 ex. 22
Ponto 4:08 ex.
Ponto 1:47 ex.
Ponto 1:10 ex.
Poecilia vivipara Ponto 2:41 ex. 284
Ponto 2:23 ex.
Ponto 4:163ex
Synbranchus marmoratus Ponto 3:01 ex. 01
Ponto 2:02 ex.
Cichlasoma orientale Ponto 3:07 ex. 13
Ponto 4:04 ex.
Ponto 1:11 ex. Ponto 1:03 ex.
Geophagus brasiliensis 61
Ponto 2:04 ex. Ponto 4:43 ex.
Awaous tajasica Ponto 2:01 ex. 01
Total de espécimes 186 744 930
Total de Espécies 12 11 13
303
Tabela 3. Freqüência relativa das espécies de peixes coletadas nas porções alta e média
da bacia do rio Curimataú, durante os períodos seco e chuvoso (1ª e 2ª expedição).
Espécies 1ª Expedição % 2ª Expedição % Total %
Apareiodon davisi 1,6 14,6 12,0
Characidium bimaculatum 2,2 0,13 0,5
Astyanax cf. bimaculatus 33,9 16,3 19,8
Astyanax fasciatus 18,3 2,9 6,0
Hemigrammus marginatus 2,2 0,9
Serrapinnus heterodon 1,6 20,5 16,8
Hoplias malabaricus 6,5 1,9 2,8
Hypostomus pusarum 1,1 2,7 2,4
Poecilia vivipara 17,7 33,7 30,1
Synbranchus marmoratus 0,5 0,1
Cichlasoma orientale 3,8 0,8 1,4
Geophagus brasiliensis 8,1 6,2 6,5
Awaous tajasica 0,1 0,1
304
ros), a facilidade de acesso permitiu a coleta de 91 espécimes (S. heterodon
não foi capturada na primeira expedição). O aumento considerável do núme-
ro de espécimes coletados no ponto 2 (Cacimba da Várzea, três espécimes
coletados na primeira expedição, 62 na segunda) pode estar associado ao
enriquecimento das condições ambientais (ver descrição do ambiente amos-
trado no item IV B e argumentação no parágrafo anterior ao presente), o
que pode também ser a explicação para o aumento no número absoluto de
praticamente todas as espécies, exceto Astyanax cf. bimaculatus e Astyanax
fasciatus (Tabelas 2 e 3). É possível que exista competição entre Astyanax
fasciatus e Serrapinus heterodon. Embora as condições sejam obviamente
similares para todas as espécies, uma delas teve sua abundância visivelmen-
te aumentada na segunda expedição (Serrapinus heterodon) e uma outra,
reduzida (Astyanax fasciatus) (Tabelas 2 e 3), situação oposta à registrada
na primeira expedição. É possível que a diferença nas condições ambientais
registradas nas duas expedições seja a explicação para a variação visível do
número de indivíduos nas duas espécies, em particular Astyanax fasciatus.
Uma avaliação segura dessa questão, no entanto, demanda um novo acesso
ao ambiente, seguindo metodologia adequada para responder a essa ques-
tão. A representação importante de Apareiodon davisi deveu-se ao grande
número de espécimes coletados no ponto 4 (109 espécimes coletados na
segunda expedição contra três na primeira)
A abundância relativa da ictiofauna ao longo do tempo de amostra-
gem foi claramente influenciada por fatores antrópicos, já que as mudanças
ambientais foram provocadas por restrição ou ampliação da quantidade de
água disponível. Essa interferência humana é comum na região do semi-ári-
do nordestino devido ao represamento de água, em razão do regime de chu-
vas da região, e à necessidade de liberação da água represada para suprir as
necessidades das populações humanas associadas. O controle da abertura
temporária de comportas não leva em consideração as flutuações estacio-
nais das comunidades aquáticas e ribeirinhas a jusante. Antes do estabeleci-
mento do regime de perenização dos rios, praticado no Nordeste brasileiro,
essas comunidades estavam submetidas periodicamente a situações de
estresse hídrico, tendo evoluído adaptações que garantiram resistência e re-
siliência, permitindo-lhes retomar as condições ótimas de desenvolvimento,
quando da cessação do estresse ambiental. Com a abertura das comportas,
as comunidades da região de influência recebem sinais ambientais de cessa-
ção de estresse e retomam seu desenvolvimento, desencadeando processos
reprodutivos e de crescimento que iniciam o seu restabelecimento. No en-
tanto, como as comportas são em seguida fechadas, a nova privação de água
desencadeia o início dos processos de reação ao estresse hídrico. Antes,
porém, que esses processos sejam finalizados, o ambiente é invadido por
um aporte de água inesperado que pode estar influenciando negativamente
essas comunidades, visto que o retorno da água se dá em um período muito
reduzido em relação ao ciclo natural e pode levar os organismos a um fracas-
so das estratégias de resistência e/ou resiliência. A repetição desse processo
de perenização em “espasmos” curtos pode ter conseqüências imprevisíveis
em relação à sobrevivência dessas comunidades e, obviamente, pode estar
influenciando também negativamente a ictiofauna ali residente. Finalmente,
o aspecto temporal envolvido no plano de coletas, decorrente do próprio
escopo do subprojeto (a realização de coletas dentro do período de um ano),
limita a avaliação que se pode fazer da ictiofauna estudada. Em ambientes
que sofrem restrição periódica durante o ciclo hidrológico, como é o caso
305
do Nordeste brasileiro, é necessário ampliar o esforço de coleta para vários
anos, na tentativa de amostrar um ciclo ambiental natural mais amplo.
Tabela 4: Espécies de peixes coletados na porção baixa da bacia do rio Curimataú (no
Rio Grande do Norte), durante o período chuvoso (extensão da 2ª expedição), com os
respectivos números de espécimes distribuídos por ponto de coleta.
Espécies Número de espécimes Total
Apareiodon davisi Ponto 9: 06 ex. 06
Steindachnerina notonota Ponto 7: 02 ex. 02
Prochilodus brevis Ponto 9: 06 ex. 06
Ponto 6: 16 ex.
Characidium bimaculatum 22
Ponto 7: 06 ex.
Ponto 6: 05 ex.
Ponto 7: 26 ex.
Astyanax cf. bimaculatus 164
Ponto 8: 03 ex.
Ponto 9: 130ex.
Astyanax fasciatus Ponto 9: 24 ex. 24
Ponto 6: 99 ex.
Hemigrammus marginatus 187
Ponto 7: 88 ex.
Hemigrammus sp. A Ponto 6: 13 ex. 67
Hemigrammus sp. B Ponto 7: 24 ex. 24
Serrapinnus heterodon Ponto 9: 41 ex. 41
Ponto 6: 28 ex.
Serrapinnus piaba 40
Ponto 7: 12 ex.
Hoplias malabaricus Ponto 9: 03 ex. 03
Hypostomus pusarum Ponto 9: 13 ex. 13
Ponto 6: 14 ex.
Poecilia vivipara Ponto 8: 16 ex. 32
Ponto 9: 02 ex.
Ponto 8: 01 ex.
Synbranchus marmoratus 02
Ponto 9: 01 ex.
Ponto 7: 01 ex.
Cichlasoma orientale 03
Ponto 8: 02 ex.
Crenicichla menezesi Ponto 7: 04 ex. 04
Ponto 6: 22 ex.
Geophagus brasiliensis Ponto 7: 03 ex. 34
Ponto 9: 09 ex.
Total de espécimes 674
Peixes
Total de Espécies 18
306
de mata atlântica, na direção leste. A região tem maior disponibilidade de
água de superfície (rios perenes e açudes vazando), o que não foi registrado
nas outras duas porções da bacia.
307
Tabela 6: Freqüência relativa das espécies de peixes coletadas nas porções alta e média
da bacia do rio Curimataú e freqüência total na bacia.
Freqüência relativa nas Freqüência
Espécies
porções alta e média (%) relativa total (%)
Apareiodon davisi 12,0 7,4
Steindachnerina notonota − 0.1
Prochilodus brevis − 0.4
Characidium bimaculatum 0,5 1,7
Astyanax bimaculatus 19,8 22,0
Astyanax fasciatus 6,0 5,0
Hemigrammus marginatus 0,9 12,2
Hemigrammus sp. A − 4,2
Hemigrammus sp. B − 1,5
Serrapinnus heterodon 16,8 14,0
Serrapinnus piaba − 2,5
Hoplias malabaricus 2,8 1,8
Hypostomus pusarum 2,4 2,2
Poecilia vivipara 30,1 19,7
Synbranchus marmoratus 0,1 0.2
Cichlasoma orientale 1,4 1,0
Crenicichla menezesi - 0.3
Geophagus brasiliensis 6,5 5,9
Awaous tajasica 0,1 0.1
Total de espécimes 674 1.604
Total de espécies 18 19
308
Tabela 7: Número de espécimes de peixes exóticos coletados na bacia do rio Curimataú
Espécies 1ª 2ª 3ª Total
Expedição Expedição Expedição
Poecilia reticulata − 11 − 11
Cichla ocellaris 03 − − 03
Oreochromis niloticus 05 109 07 121
Total de espécimes 135
D. Considerações finais
Com o material e informações obtidos durante o presente estudo, foi
possível agregar dados preliminares acerca da diversidade ictiofaunística da
bacia do Curimataú, sobre a qual inexistiam informações publicadas, sendo
este estudo a primeira abordagem sistematizada da ictiofauna da bacia.
A amostragem realizada neste estudo, embora importante, não é su-
ficiente para refletir adequadamente a diversidade da bacia estudada. Em
primeiro lugar, porque as expedições foram realizadas dentro de um mesmo
ciclo de estiagem. Isso significa dizer que, embora tenha havido chuvas, elas
não foram suficientes para provocar um impacto significativo, já que não pôs
em contato os diversos açudes ou outros corpos d’água através de corren-
tes de água de superfície – a precipitação média na bacia esteve abaixo da
média histórica nos últimos dois anos (Figuras 2, 3 e 4). Em épocas de maior
precipitação, as águas de superfícies mantidas por um tempo maior, além
de oferecerem uma diversidade maior de ambientes para reprodução, prote-
ção e recursos alimentares, permitem a migração ativa ou passiva de adul-
tos e juvenis, o que possibilita o repovoamento de áreas temporariamente
desabitadas pela morte generalizada, provocada pela seca prolongada. Em
segundo lugar, a metodologia adotada limitou-se ao uso de puçás, arrastos
e redes de emalhe, equipamentos que exigem diversas tentativas para que
as chances de captura sejam aumentadas. Esse tipo de procedimento exige
a permanência da equipe de coleta por um tempo prolongado. Comumente,
o tempo disponível para permanência em um determinado ponto é limitado
(como foi o caso neste estudo), o que resulta em subamostragem, especial-
mente de espécies crípticas. Um levantamento efetivo e extensivo da ictio-
fauna da bacia dependeria de esforços adicionais e do acesso a tecnologias
309
mais avançadas para a realização de tais levantamentos, como a utilização de
aparelho de eletrochoque que, em condições de condutividade adequadas,
tem um efeito de amplo espectro na ação de coleta e de baixa duração sobre
o ambiente.
Esforços continuados deverão ser desenvolvidos na direção de se obter
uma avaliação progressivamente mais confiável da diversidade ictiofaunís-
tica das bacias hidrográficas nordestinas, o que poderá servir de base para
estudos de biologia e manejo dessa importante porção da biodiversidade. A
forma eficiente de preservar é produzir conhecimento que leve à descrição,
ao entendimento e ao uso adequado da biodiversidade, permitindo às gera-
ções de hoje e às futuras o direito de usufruí-la e o prazer de admirá-la.
6. Referências bibliográficas
310
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312
Apêndice II: Locais visitados durante as expedições de coleta.
Foto 3 Várzea a Jusante do Açude Cacimba da Várzea, município de Cacimba de Dentro – PB. (Foto: F. Groth)
313
Rio Calabouço, município de Araruna – PB, em sua área mais larga e profunda, entre as amostradas.
Foto 5
(Foto: F. Groth)
Foto 6 Açude Algodão, município de Algodão de Jandaíra – PB. (Foto: R.T.C. Ramos)
Peixes
Foto 7 Afluente do rio Pequiri, localidade Macacaú, município de Canguaretama – RN. (Foto: R.T.C. Ramos)
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Foto 8 Barragem do Rio Pequiri, município de Pedro Velho – RN. (Foto: R.T.C. Ramos)
Foto 9 Barragem de Trincheira, Sítio Primeira Lagoa, município de Nova Cruz – RN. (Foto: R.T.C. Ramos)
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Apêndice III: Fotos das espécies autóctones coletadas
(Fotos: F. Groth)
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Hemigrammus sp. (B) Hoplias malabaricus
Synbranchus marmoratus
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