Fauna de Calliphoridae, Muscidae E Sarcophagidae (Ordem Diptera) Associada A Decomposic Ao de Carcac A de Rattus Novergicus (BERKENHOUT, 1769)

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FAUNA DE CALLIPHORIDAE, MUSCIDAE E SARCOPHAGIDAE (ORDEM DIPTERA)

ASSOCIADA A DECOMPOSIÇÃO DE CARCAÇA DE RATTUS NOVERGICUS


(BERKENHOUT, 1769)

Márcio Cleib Pereira1

Alysson Rodrigo Fonseca2 ; Geiziane Ferreira Silva1 ; Natália Ribeiro Alves1 ; Débora Silva Teixeira Borges1
1Alunos(as) do curso de Ciências Biológicas da Fundação Educacional de Divinópolis FUNEDI/UEMG; 2Professor orientador
da FUNEDI/UEMG. [email protected]

INTRODUÇÃO sawa & Cassino, 2006). Portanto este é um dos fatores pos-
itivos da existência das moscas, sem elas a decomposição das
Estudos faunı́sticos e ecológicos visando o estudo da ento- fezes e cadáveres seria realizada lentamente pelas bactérias
mofauna associada à decomposição de carcaças de verte- e outros artrópodes (Paiva, 1994).
brados são fundamentais para se conhecer a dinâmica de A famı́lia Sarcophagidae, juntamente com Calliphoridae e
ciclagem de nutrientes nos ecossistemas, assim como para Muscidae, é de grande importância para a Entomologia
se conhecer a biodiversidade relacionada a estes processos. Forense (Early & Goff 1986; Catts & Goff 1992). Os sar-
Esta decomposição pode variar segundo a ação de fatores cofagı́deos são insetos vivı́paros, raramente ovovivı́paros,
abióticos, como temperatura, umidade, precipitação ou in- sendo que a maioria das fêmeas deposita larvas em primeiro
solação, além de fatores bióticos, representados pela fauna instar. A maior parte é saprófaga na fase larval, mas algu-
e flora decompositoras. Dentre esta fauna destacam - se mas parasitam outros insetos, como caracóis, minhocas ou
fungos, bactérias e vários artrópodos, principalmente inse- outros invertebrados (Marchiori et al., , 2003).
tos (Classe Insecta), cujo acréscimo ou substituição seqüen- A famı́lia Calliphoridae é composta por mosca com tamanho
cial de suas espécies ao longo do processo de decomposição semelhante ao da mosca doméstica ou um pouco maior.
é chamado sucessão entomológica (Bornemissza, 1957). A Muitos apresentam cor metálica, azul ou verde. A maioria
referida sucessão ocorre, portanto, a cada etapa do processo é saprófaga, alimentando - se de larvas de carniça, excre-
de decomposição e oferece condições ideais para o desen- mentos e substâncias semelhantes, as espécies mais comuns
volvimento de determinados grupos de organismos (Oliveira são as necrófagas. Estas põem os ovos nos cadáveres de ani-
- Costa, 2003). mais e as larvas se alimentam de material em decomposição
Os principais grupos de insetos relacionados à decomposição (Costa, 2003).
cadavérica pertencem às ordens Diptera, Coleoptera, Lep- De acordo com Greenberg (1971), a famı́lia Muscidae é im-
idoptera, Himenoptera, Blattodea, Hemiptera, Isoptera e portante pelo seu papel no campo da entomologia Forense,
Dermaptera (Goff e Catts, 1990; Oliveira - Costa, 2003). como hematófagas ou lambedoras de secreções ou mesmo
No que se refere aos dı́pteros (Ordem Diptera), constituem sangue, podendo atuar como vetores de patógenos. De
uma das maiores ordens de insetos, seus representantes são acordo com Costa (2003), as espécies associadas à carcaças
cosmopolitas, sendo encontrados em quase todos os locais do geralmente são pequenas e de cor escura. Entretanto, oca-
globo terrestre, com exceção das regiões árticas e antárticas. sionalmente, espécies de cor verde metálica podem ocorrer,
São insetos que ocorrem em grande diversidade nos climas podendo ser confundidas com Calliphoridae.
tropicais e subtropicais, a região neotropical é a mais rica em Embora já exista no exterior um grande banco de dados so-
espécies. Conhecem - se aproximadamente 120.000 espécies bre a entomofauna cadavérica e o padrão de sucessão nos
de dı́pteros e estima - se que existam mais de um milhão de corpos, esse conhecimento não pode ser seguramente uti-
espécies viventes (Carreira, 1991). lizado para os padrões latino - americanos, especialmente
Os dı́pteros da Superfamı́lia Muscoidea, compostos pelas devido a diversidade diferenciada das espécies, aliada às
famı́lias Calliphoridae, Muscidae, Sarcophagidae e Faniidae, condições climáticas e à grande extensão territorial. As-
apresentam grande importância ecológica, uma vez que as sim, no Brasil, o destino do vasto número de carcaças de
suas larvas apresentam a capacidade atuarem como decom- animais grandes e pequenos em alguns habitats, bem como
positores de matéria orgânica, inclusive cadáveres (Fura- os parâmetros que conduzem este processo, ainda são pouco

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estudados, especialmente na região centro - oeste mineira, RESULTADOS
onde praticamente não foram detectados trabalhos dessa
natureza. Nas quatro estações avaliadas (outono, inverno, primavera e
verão) foram coletados no total 2.313 dı́pteros pertencentes
às famı́lias Calliphoridae (n = 967), Sarcophagidae (n =
698) e Muscidae (n = 648), com freqüências de 41,8; 30,2 e
OBJETIVOS 28 %, respectivamente.
Na primeira coleta (outono), que ocorreu de 09 a
O presente estudo tem por finalidade relatar a ocorrência 16/04/2008, foi capturado um montante de 278 dı́pteros,
de dı́pteros adultos das famı́lias Calliphoridae, Muscidae e sendo a famı́lia Sarcophagidae a mais representativa, com
Sarcophagidae associados aos estágios de decomposição de 117 (42,1 %) espécimes coletados, seguido por Muscidae e
carcaças de Rattus norvegicus (Berkenhout, 1769) em uma Calliphoridae com 98 (35,2 %) e 63 (22,7 %) espécimes, re-
área de reserva ambiental, localizada no municı́pio de Di- spectivamente.
vinópolis - MG. No que se refere às fases de decomposição, observou - se que
o estágio inicial durou um dia, assim como o de putrefação,
enquanto que o de putrefação escura foi o mais longo, per-
manecendo por três dias. O estágio de fermentação durou
MATERIAL E MÉTODOS
um dia e o seco dois dias, totalizando oito dias. A temper-
atura média observada durante o perı́odo de decomposição
O experimento foi desenvolvido no Parque do Gafanhoto,
foi de 24,1 ± 0,1oC.
uma área de preservação ambiental de 19,2 ha, composta
Observou - se que os estágios de putrefação escura (Mus-
por vegetação remanescente de cerrado stritu senso, local-
cidae = 74, Calliphoridae = 49 e Sarcophagidae = 62)
izado na periferia da cidade de Divinópolis, MG. As coletas
e fermentação (M = 17, C = 10 e S = 27) foram os
foram realizadas durante o perı́odo de março de de 2008 a
que mostraram número mais acentuado de indivı́duos. Os
março de 2009.
estágios de decomposição inicial (M = 7, C = 1 e S = 12)
Uma carcaça de Rattus norvegicus (Berkenhout, 1769), foi e putrefação (M = 0, C = 3 e S = 13) mostraram valores
disponibilizada a cada estação do ano (primavera, verão, ou- intermediários. Por fim, o estágio seco mostrou um menor
tono e inverno) em uma área de cerrado, em gaiola metálica número de indivı́duos, com somente três representantes da
disposta dentro de uma bandeja plástica e recoberta por famı́lia Sarcophagidae. Acredita - se que o menor número
armadilha Shannon modificada. Esta armadilha (1,5 met- de moscas nesse estágio se deu em função do esgotamento
ros de diâmetro na base e 1,5 metros de altura) foi confec- do recurso (carcaça), que já não consegue oferecer condições
cionada em voal, com alças nas extremidades para fixação suficientes para suprir adultos e larvas.
de cordas elásticas no solo. Na parte superior foi acoplada Na coleta de inverno (29/06 a 16/07/2008), foi constatado
uma estrutura em cone com um tubo contendo álcool para um total de 1.127 indivı́duos, sendo a famı́lia Calliphoridae
coleta das moscas adultas. a mais abundante, com 662 (58,7 %) representantes, seguida
A avaliação das fases de decomposição cadavérica foi real- por Sarcophagidae e Muscidae, com 329 (29,2 %) e 136 (12,0
izada tendo como base o trabalho de Bornemissza (1957), %) moscas, respectivamente.
que divide o processo em cinco estágios, sendo: 1º) Estágio No experimento de inverno, o perı́odo de decomposição foi
de decomposição inicial: a carcaça apresenta - se fresca mais longo em comparação com o de outono, possivelmente
externamente e em decomposição interna, propı́cia para a em função da temperatura média (19,3 ± 0,2oC), que foi
atividade de bactérias, protozoários e nematódeos, presentes cerca de 5,1 oC inferior. Assim, o estágio de decomposição
no animal antes da morte. 2º) Estágio de putrefação: a inicial durou cinco dias e o de putrefação três dias, sendo
carcaça acumula gases produzidos internamente, acompan- a fase mais longa o de putrefação escura, correspondendo a
hado por odor de putrefação fresca. 3º) Estágio de pu- oito dias. O estágio de fermentação durou apenas um dia e
trefação escuro: a carcaça rompe - se com escape de gases, o seco dois, totalizando 19 dias.
consistência cremosa com partes expostas pretas e odor Observou - se que os estágios de putrefação (Muscidae = 39,
de putrefação muito forte. 4º) Estágio de fermentação: a Calliphoridae = 156 e Sarcophagidae = 57) e putrefação es-
carcaça seca por fora com alguns restos frescos, estando a cura (M = 94, C = 458 e S = 213) foram os que mostraram
superfı́cie ventral coberta por fungos, sugerindo a ocorrência uma maior abundância de moscas, seguidos pelo de fer-
de alguma fermentação e 5º) Estágio seco: a carcaça apre- mentação (M = 0, C = 12 e S = 29), que mostrou val-
senta - se quase seca, diminuindo a velocidade de decom- ores intermediários. Os estágios de decomposição inicial (M
posição. = 1, C = 6 e S = 11) e seco (M = 2, C = 30 e S = 19)
Os adultos coletados foram sacrificados em vidro letal para foram os que evidenciaram um menor número de indivı́duos
posterior montagem e identificação. Os espécimes foram coletados.
montados em alfinete entomológico, devidamente etiqueta- Na coleta referente à estação da primavera (21 a
dos e a identificação foi realizada em laboratório com auxı́lio 28/11/2008), foi coletado um total de 521 indivı́duos, sendo
de chaves ou em alguns casos por especialistas. O ma- as famı́lias Calliphoridae e Sarcophagidae e as mais rep-
terial testemunha encontra - se depositado na Coleção de resentativas, com 198 (38,0%) e 196 (37,6 %) espécimes,
Entomologia da Fundação Educacional de Divinópolis, FU- respectivamente. Muscidae apresentou 127 (24,4 %) repre-
NEDI/UEMG. sentantes. Torna - se importante ressaltar que nesta coleta
houve dois dias de chuva, o que pode ter influenciado no

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número de insetos coletados e na duração do perı́odo de predominância de califorı́deos (58,7 %). Nos testes realiza-
decomposição. dos na primavera, sarcofagı́deos e califorı́deos mostraram
Neste experimento de primavera, o estágio de decomposição freqüências similares, com 38,0 e 37,6 %, respectivamente.
inicial durou dois dias, o de putrefação apenas um e o de Embora a famı́lia Muscidae tenha apresentado freqüências
putrefação escura foi o mais prolongado, com três dias. As menores nos experimentos de outono (35,2 %), inverno
fases de fermentação e estágio seco duraram um dia cada, (12,0 %) e primavera (24,4 %), os resultados obtidos para
totalizando oito dias. A temperatura durante o perı́odo de o verão mostraram uma predominância de representantes
decomposição mostrou uma média de 22,6 ± 0,3oC, sendo dessa famı́lia, com 74,2 %.
esta 3,3 oC superior à média observada no experimento
de inverno, mostrando, portanto, uma menor duração do
perı́odo de decomposição. CONCLUSÃO
De forma semelhante à coleta de outono, observou - se que Nas quatro estações estudadas (outono, inverno, primavera
os estágios de putrefação escura (Muscidae = 41, Calliphori- e verão), observaram - se representantes das famı́lias Cal-
dae = 64 e Sarcophagidae = 18) e fermentação (M = 30, liphoridae, Muscidae, Sarcophagidae.
C = 113 e S = 118) foram os que mostraram número mais
O número de representantes das famı́lias estudadas variou
acentuado de indivı́duos. O de putrefação (M = 36, C =
em função das estações do ano e dos estágios de decom-
19 e S = 30) mostrou valores intermediários, seguido pelo
posição.
estágio de decomposição inicial (M = 4, C = 0 e S = 5) e
De uma maneira geral, os estágios de putrefação, putrefação
pelo seco (M = 16, C = 2 e S = 25).
escura e fermentação evidenciaram a maior abundância de
Na coleta referente à estação de Verão (04 a 11/03/2009) representantes das famı́lias coletadas.
foram capturadas 387 indivı́duos, sendo a famı́lia Muscidae A duração dos estágios de decomposição foi semelhante nas
aquela com um maior número de espécimes coletados 287 estações de outono, primavera e verão. A maior duração foi
(74,2 %), seguida por Sarcophagidae e Calliphoridae, com observada no experimento realizado no inverno.
56 (14,5 %) e 44 (11,4 %) representantes, respectivamente. Agradecimentos
De forma semelhante à duração verificada para o experi- À FAPEMIG e ao PAPq pela concessão de bolsas de ini-
mento de outono e primavera, a coleta de verão apresen- ciação cientı́fica (BIC).
tou um perı́odo de decomposição de nove dias, embora a
temperatura média observada (25,9 ± 0,3oC) tenha apre-
sentado uma elevação de 3,3 oC em relação ao perı́odo de REFERÊNCIAS
primavera. Assim, o estágio de decomposição inicial durou
dois dias, o de putrefação um dia e os de putrefação escura, Bornemissza, G.F. 1957 . An analysis of arthropod su-
de fermentação e seco, representaram cada um dois dias de cession in corion and the effect of its decomposition on the
duração. soil fauna. Australian Journal of Zoology. 5:1 - 12.
Os estágios de putrefação (Muscidae = 18, Calliphoridae = Carreira, M. 1991 . Insetos de Interesse Médico e Vet-
20 e Sarcophagidae = 26) e putrefação escura (M = 190, C erinário. Curitiba: Ed. UFRP.
= 18 e S = 19) foram os que evidenciaram uma coleta mais Catts, E.P., Goff, M.L. 1992. Forensic entomology in
representativa. O estágio de fermentação mostrou valores criminal investigations. Annual Review of Entomology, 27:
intermediários (M = 63, C = 0 e S = 8), ficando os estágios 253–272.
de decomposição inicial (M = 7, C = 6 e S = 1) e seco (M Chapman, R.F. 1982. Temperature and humidity. In:
= 9, C = 0 e S = 2) com menores valores de captura. Chapman, R.F. The Insects: structure and function. Cam-
Considerando - se o número de moscas capturadas em bridge: Harvard University Press.
cada estação, independente da famı́lia, observou - se um Early, M., Goff, M.L. 1986. Arthropod succession pat-
maior número de coletas no inverno (n = 1.127 indivı́duos) terns in exposed carrion on the island of O’ahu, Hawaiian
em relação aos experimentos de outono (n = 278), pri- Islands, USA. Journal of Medical Entomology, 23: 520 - 531.
mavera (521) e verão (n = 387). Embora temperaturas Furusawa, G.P., Cassino, P. 2006. Ocorrência e Dis-
mais altas estejam diretamente relacionadas ao aumento na tribuição de Calliphoridae (Diptera, Oestroidea) em um
taxa de desenvolvimento dos insetos (Chapman, 1982), o Fragmento de Mata Atlântica Secundária no Municı́pio de
maior número de coletas no inverno possivelmente ocor- Engenheiro Paulo de Frontin, Médio Paraı́ba, RJ. Revista
reu em função do maior perı́odo de decomposição (19 dias) de biologia e Ciências da terra, 6: 152 - 164.
observado para esta estação, ficando o recurso (carcaça) Goff, M.L. & Catts, E.P. 1990. Arthropods basic struc-
disponı́vel por um maior tempo aos organismos necrófagos. ture and biology. In: Catts, E. P. & N. H. Haskel. Entomol-
Este mesmo raciocı́nio pode ser apontado para as coletas ogy & Death: a procedure guide. South Carolina. Joyce’s
de outono, primavera e verão, que apresentaram um menor Print Shop.
perı́odo de decomposição (oito dias) e conseqüentemente Greenberg, B. 1971. Flies and disease. Ecology, classifi-
menor número de espécimes coletados. cation and biotic associations. Princeton University Press,
O número de representantes das famı́lias estudadas var- I: 856p.
iou em função das estações do ano. Enquanto no experi- Marchiori, C.H.; Silva, M.H.O.; Brito, B.M.C; Silva
mento de outono foi constatada uma maior freqüência de Filho, O.M.; Pereira, L.A. 2003. Levantamento de
sarcofagı́deos (42,1 %), a coleta de inverno evidenciou uma famı́lias de parasitóides coletadas em Araporã - MG usando

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armadilhas de bacias amarelas e Malaise. Semina: Ciências os insetos são vestı́gios. Campinas. Ed. Millennium.
Agrárias, Londrina, 24: 317 - 320. Paiva, D.P. de. 1994. Suinocultura Dinâmica. Periódico
técnico - informativo elaborado pela EMBRAPA - CNPSA.
Oliveira - Costa, J. 2003. Entomologia forense: quando II: 12p.

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