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Cadernos de Literatura Comparada

Ana Luísa Amaral*


Universidade do Porto / ILCML

“A outra que eu não sei, por não ter


voz, ficou na escuridão por inventar”.
Travestir o mundo1

Resumo:
Neste ensaio publicado a título póstumo, Ana Luísa Amaral reflete sobre o travestimento da voz – algo que
sempre acontece em poesia, enquanto processo que passa pela criação de um eu/eus descoincidentes (em-
bora tangentes) daquela ou daquele que os criou. Revisitando algumas das preocupações críticas já presentes
em Arder a Palavra, a autora cruza-as aqui com a sua prática poética.

Palavras-chave:
voz, travestimento, poesia

Abstract:
In this essay published posthumously, Ana Luísa Amaral reflects on the transvestism of the voice – a process
that always happens in poetry as it involves the creation of disconnected selves (however tangent they may
be) from the one who has created them. Revisiting some of her essays from Arder a Palavra, the poet uses her
own poetry to illustrate her critical reasoning.

Keywords:
voice, tranvestism, poetry

N.o 47 – 12/ 2022 | 13-31 – ISSN 2183-2242 | https:/doi.org/10.21747/21832242/litcomp47p1


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Eu não sou eu nem sou o outro:


Sou qualquer coisa de intermédio

Se eu fosse o outro,
o do chapéu macio e do bigode
eternizado em cúbico arremedo,
angústia dividida em tantas partes
e óculos redondos,
podia-te contar: eu guardador e sonhos

Se eu fosse o outro,
o delicado e bêbedo génio de nós todos,
o que amou estranho e sabia dizer
coisas enormes numa pequena língua
e fraco império,
se eu fosse aquele inteiro
ditado de exageros e exclusões,
falava-te de tudo em ingleses versos

E mesmo se não foi ele quem disse


(e podia até ser, que eram amigos
e o século a nascer arrepiava como já não
o fim) há razão nessa história do pilar
e do tédio a escorrer de um
para o outro

(Amaral 2022: 17)

Este poema, que se chama “Qualquer coisa de intermédio”, está no meu primeiro livro,
Minha Senhora de Quê, publicado em 1990. Esse poema usa “Recreio” (1914), de Mário de Sá-
-Carneiro como epígrafe, sendo que “o outro” de que o poema depois fala é, naturalmente,
Fernando Pessoa. Todo o Fernando Pessoa: o Pessoa/Alberto Caeiro, de “O Guardador de Re-
banhos” (a que eu haveria de voltar, anos depois, num poema de Às Vezes o Paraíso, chamado
“Revisitações” e noutro, de Entre Dois Rios e Outras Noites, chamado “De sonhos e além: o guar-
dador”), o Pessoa/Ricardo Reis, das “Odes”, o Pessoa/Alexander Search, dos versos ingleses,
o Pessoa/Álvaro de Campos, de poemas como “A Tabacaria”, e ainda o Pessoa ortónimo, de A
Mensagem.
Ou seja, Pessoa, que se travestira já em vários, aqui emerge re-travestido em vários Pessoas
(e várias pessoas), por sua vez falando a partir de uma voz que não é a sua, mas a de alguém

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criado por uma mulher quase um século depois. Antecipando, como em jogo de espelhos, o labi-
rinto das imagens, havia já entrado em cena essa outra pessoa/personagem, tangente a Pessoa
em vida e em poética, que, embora de uma diversa tonalidade performativa, conhecia bem a
arte da encenação: Mário de Sá-Carneiro. E é ainda apresentado outro elemento do grupo de
Orfeu: Almada-Negreiros, e o seu conhecido desenho cubista de Pessoa.
Iniciei este ensaio com este poema, porque entendo que o travestimento em poesia sempre
aconteceu, enquanto processo que passa pela criação de um eu/eus descoincidentes (embora
tangentes) daquela ou daquele que os criou – basta pensar na poesia trovadoresca e na apro-
priação (roubo) da voz feminina pelo trovador. Encontramos o travestimento apresentado
como “impessoalidade” esse que o simbolista Mallarmé defendia como condição para a escrita:
“(…) eu sou agora impessoal”, escrevia Malarmé a Henri Cazalis, em 1867, “e já não o Stéphane
que conheceste, – mas uma aptidão do Universo Espiritual para se ver e se desenvolver, através
do que foi eu” (Mallarmé 1945: 366)2; ou o travestimento apresentado como despsicologização
do sujeito lírico, fulcral para um modernista como T. S. Eliot, quer na multiplicidade de vozes
de um poema como “The Waste Land”, de 1922, quer num poema anterior, de 1917, onde dera
voz a um tal J. Alfred Prufrock, no seu poema “The Love Song of J. Alfred Prufrofk”, ou fulcral
para um proto-modernista como Walt Whitman, que integrava a contradição de ser e não ser
“Contradigo-me? / Pois bem, então contradigo-me / (Sou imenso, contenho multidões)”,
escrevia Whitman em Leaves of Grass (Whitman 2002: 77). De que multidões falava Whitman,
senão de um conceito abrangente e abstracto, aparentemente diverso da afirmação de
Emily Dickinson, mas na verdade a ela semelhante: “Quando me declaro como Representante
do Verso – isso não quer dizer eu – mas uma pessoa suposta –” (Dickinson 1958: C. 268); ou o
travestimento aproximável do fingimento de Pessoa na sua famosa “Autopsicografia”.
Talvez seja isso a escrita de um poema: uma viagem feita de marcas tipográficas e de meia
dúzia de topografias. Uma zona selvagem mas convocada também, a partir da vida. “Escre-
ver em meio / do que não está ao pé”, como diz Fernando Pessoa no seu não menos famoso
“Isto”, dialoga (revendo-a) com uma tradição que vê a poesia como “as emoções relembra-
das na tranquilidade”, dialogando também, em devir, com o que dirá Jean-Luc Nancy sobre a
poesia. “Poesia”, diz Nancy, grafando a palavra, não tem exactamente um sentido, mas antes
o sentido do acesso a um sentido a cada momento ausente, e transferido para longe. O sentido
de «poesia» é um sentido sempre por fazer” (Nancy 2004: 10). Talvez a língua em que fala a
poesia seja essa zona, que, tal como a metáfora, só parcialmente coincide com a da língua que
falamos: no território da sempre-descoincidência.
A poesia existe assim numa camada descolada da pele, mas não solta dela. Mesmo que
ela seja dita longe da emoção – gesto que hoje sabemos ser estratégia elocutória, sobretudo.
Talvez mais nenhum verso se constituísse tão aforístico do famoso ‘fingimento’ do poeta do
que aquele “O poeta é um fingidor” – central para explicar a distância entre o Modernismo e a
insistência na subjectividade e no centramento do eu romântico. Mas se há afastamento, julgo
que ele existe no próprio acto de reflectir sobre o processo, mais do que sobre o próprio pro-
cesso. Porque a esse verso seguem-se outros, não menos famosos: “finge tão completamente

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“A outra que eu não sei, por não ter voz, ficou na escuridão por inventar”. Travestir o mundo

/ que chega a fingir que é dor / a dor que deveras sente” (Pessoa 1998: 94). É, pois, a colocação
da dor que está em causa. São as palavras que podem camuflar a vida, que nunca deixa de lá
estar. Atravessa-se, assim, um caminho que vai do plano vivido para o plano imaginado, mas
que viaja a partir do vivido. Como se outra indumentária fosse usada, outra aparência fosse
assumida, feita de maquilhagens, cabeleiras diferentes. Outras identidades, afinal.
Shakespeare soube-o melhor que ninguém, num tempo em que o palco era vedado às mu-
lheres e tinham os homens que assumir os papéis femininos – no caso, os jovens homens, ou
efebos. No que toca às comédias, por exemplo, podemos encontrar esses extraordinários jogos
de identidade, ou travestimentos, quando uma rapariga (de facto, um jovem actor) se disfarça
de rapaz, tornando-se o objecto de desejo de outra rapariga, que o julga do sexo masculino.
Claro que, como acontece na dramaturgia shakespeariana, tudo acaba por se reconcertar, o
disfarce termina e a ordem é reposta no final. Houve, porém, espaço para esse momento de
desordem, pujante, carnavalesco, que abre à (moderna) questão: mas afinal, o que é a identi-
dade?
Armando Côrtes-Rodrigues, poeticamente travestido, por sugestão de Pessoa, de Violante
de Cysneiros, que é, à maneira de um heterónimo pessoano, a incarnação da imagem femi-
nina tradicional, seguindo o gosto modernista – usando máscaras emprestadas de si mesma
(ela mesma, uma invenção), de Pessoa, de Sá-Carneiro, de Álvaro de Campos, “o Mestre”, do
próprio Cortes-Rodrigues. Cortes-Rodrigues que tinha, como o próprio Pessoa diria, “coisas
género Outro”. No poema dedicado a si mesma de há dois anos (o próprio tempo encenado),
Violante/Cortes Rodrigues assim se descreve, no segundo número de Orpheu (segundo trimes-
tre de 1915):

A MIM PRÓPRIA
DE HÁ DOIS ANOS

As minhas mãos são esguias,


São fusos branco d'arminho,
Onde fiaste e não fias
O Sonho do teu carinho.

As minhas mãos são esguias,


Côr de rosa são as unhas.
(…)

(Orpheu 2, 1979: 64-5)

Já no primeiro número de Orfeu, do primeiro trimestre de 1915, Cortes-Rodrigues havia


ensaiado a enunciação da alteridade num poema intitulado “Outro”, de que cito uma só es-
trofe:

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OUTRO

(…)
Fui Outro e, Outro sendo, Outro serei,
Outro vivendo a mística beleza
Por esta humana forma que encarnei,
Por lágrimas de sangue que chorei
Na terra da tristeza.

(Orpheu, 1984: 90)

Agora, porém, no segundo número da revista, o travestimento agudiza-se e expande-se,


através mesmo das informações, também fictícias, oferecidas pela Redacção, muito provavel-
mente por Fernando Pessoa:

Apareceram-nos na Redacção estes belos poemas, que um anónimo engenho doente realizou.
Publicamo-los, porque disso são dignos, importando-nos pouco a personalidade vital de que
possam emanar. Toda a obra de arte é a justificação de si própria. (Orpheu 2, 1979: 58)

Mas Violante de Cysneiros é, como sabemos, um estereótipo, que glosa não só uma ima-
gem do feminino, mas ainda um tipo de registo poético praticado por algumas poetisas do
início do século e a elas associado (recordo Florbela Espanca e o seu soneto “As minhas mãos”,
que, sendo embora posterior, é bem elucidativo do que acabo de dizer “As minhas mãos ma-
gritas, afiladas, / Tão brancas como a água da nascente, / Lembram pálidas rosas entornadas /
Dum regaço de Infanta do Oriente” (Espanca 2003: 11), na perpetuação de um cliché associado
às mãos de uma mulher do final do século.
Em “A Sogra de Rute ou Intersexualidades”, Maria Irene Ramalho escreve: “A identidade
está longe de ser uma entidade fixa”; ela será antes uma rede fluida de relações que se oferece
como um espectáculo em que da mesma forma participam os espectadores” (Santos 2000: 527).
Retorno à questão do feminino, e penso em dois poemas. O primeiro é de Sá-Carneiro, justa-
mente intitulado “Feminina”, de 1916:

FEMININA

(...)
Eu queria ser mulher pra não ter que pensar na vida
E conhecer muitos velhos a quem pedisse dinheiro -
Eu queria ser mulher para passar o dia inteiro
A falar de modas e a fazer «potins» - muito entretida.

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“A outra que eu não sei, por não ter voz, ficou na escuridão por inventar”. Travestir o mundo

Eu queria ser mulher para mexer nos meus seios


E aguçá-los ao espelho, antes de me deitar -
Eu queria ser mulher pra que me fossem bem estes enleios,
Que num homem, francamente, não se podem desculpar.

Eu queria ser mulher para ter muitos amantes


E enganá-los a todos - mesmo ao predilecto -
Como eu gostava de enganar o meu amante loiro, o mais esbelto,
Com um rapaz gordo e feio, de modos extravagantes...

Eu queria ser mulher para excitar quem me olhasse,


Eu queria ser mulher pra me poder recusar...

(Sá-Carneiro 2005: 144; itálicos meus)

A mulher que aí surge (e que oscila entre o fútil e o fatal) “passa o dia inteiro / A falar
de modas e a fazer «potins» — muito entretida”, “excita quem a olha” e “pode recusar-se”,
“mexe “nos seios” e “aguça-os ao espelho antes de [s]e deitar”, tem “muitos amantes” e
“engana-os a todos – mesmo ao predilecto”, com um “rapaz gordo e feio”. Recordemos bre-
vemente o final do poema “Aquele outro” de Sá Carneiro, que termina “O balofo arrotando
Império astral / O mago sem condão, o Esfinge Gorda”:

(…)
O raimoso, o corrido, o desleal —
O balofo arrotando Império astral:
O mago sem condão — o Esfinge gorda…

(idem: 131)

O “rapaz gordo e feio” do poema “Feminina” é Sá-Carneiro ele mesmo, mas feito Outro,
sujeito lírico desdobrado, não se dirigindo à mulher, antes ansiando ser ela, ensaiando ser ela,
e, ao parodiá-la, parodiar-se, desejando assumir o que é a representação do seu papel, papel
este que, por seu lado, integra, também ele próprio, um guião social. A grande questão em
Mário de Sá-Carneiro é que o espectador é também o eu, e a sua voz é a do outro que é, afinal, o
próprio. Assim, o relacional não se faz entre o eu e o outro, mas entre o eu e o Mim, numa zona
em que a cisão é impossível, mas em que a simbiose também deixou de o ser.
A epígrafe de que me servia no meu poema inicial “Eu não sou eu nem sou o outro, / Sou
qualquer coisa de intermédio: /” (idem: 73), de Sá-Carneiro, expressa simultaneamente a ca-
pacidade de vislumbre do exercício de tudo e o preço (angustiante) de o habitar. Ambos dentro
do mesmo, ambos nunca dois. Ambos quase. Em contínuo trânsito. A poética de Sá-Carneiro

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não se escora na intensidade da multiplicidade, nesse “multiplicar-se para [se] sentir” de Pessoa,
antes insiste a intensidade de um lugar que nunca chega a ser – mas que, por isso mesmo, e
paradoxalmente, a tudo se abre. “Gostava tanto de mexer na vida, / De ser quem sou – mas de
poder tocar-lhe… /”, lê-se no poema “Crise” (idem: 127-8). Tocar na vida e tocar nos seios,
aguçar seios e aguçar vida – esse o desejo. Desta zona de crise em que se movem os sujeitos
poéticos de Sá Carneiro, faladas a partir do ponto da crise (que, em termos ficcionais, indica o
momento de alta tensão que não é ainda o clímax, ou o desfecho, mas que antecipa esse desfecho,
nunca o atingindo), estas palavras dizem justamente desse instante de equilíbrio instável,
dominado por forças contrárias.
O segundo poema de que quero falar é meu, chama-se “Natércia fala a Catarina” e pertence
a um livro intitulado A génese do amor, cuja parte central é constituída por diálogos entre as
grandes figuras da história da literatura que cantaram o amor (Camões, Dante ou Petrarca) e
que fizeram das mulheres musas, retirando-lhes a voz. No caso de Camões, uma das figuras
femininas da sua lírica é Natércia, e segundo a história, Catarina (ou Caterina) de seu nome
verdadeiro, a dama amada por Camões, mas, casada, e por isso inacessível. Natércia teria sido
o anagrama de Caterina, criado por Camões. Esse anagrama torna-se o corpo textual feminino,
tornado musa. No poema que leio agora, as musas tornam-se actrizes sociais dos seus desti-
nos, desafiando a condição que as reduziu ora a um corpo sem nomeação, ora a um nome sem
corpo, de papel unicamente, “matéria da palavra”. Ou seja, a mulher representada ora como
nome (mas sem corpo), ora como corpo, mas sem nome:

NATÉRCIA FALA A CATARINA

Nunca eu por inteiro,


embora a meio,
assim me és:

tu, corpo, de verdade,


eu, na verdade:

nada

Musa, se o for sequer,


ou coisa amada
que se deseja em verso,
mas não morre

Desejo a morte
que tu podes ter,
porque podes ser carne
e sangue, e pele

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“A outra que eu não sei, por não ter voz, ficou na escuridão por inventar”. Travestir o mundo

Eu sou só essa
que sonhou aquele
que entre sonhos
e versos
me sonhou

Reúne-te comigo,
minha amiga,
minha metade
que desejo inteira

E ao teres o dom da fala,


diz-lhe a ele
que eu anseio por ser
o que tu és

Sem desejar ser tu:


inominada

(Amaral 2022: 628-9)

Natércia (a que é somente linguagem) desdobra-se na outra que teve corpo mas a quem
o nome foi retirado, falando-lhe da tragicidade da condição de ausência nas mulheres de uma
coincidência poética e social, ou seja, política.
Continuo com a minha poesia. “Dizem haver amores para lá dos sentires contidos pelo
tempo. Momentos perfeitos de toques de riso, pequenos sabores, ou, também muito pequenas,
nuvens. Ainda, infinita, a tortura. Como poeira cósmica, as etimologias são coincidentes. E
assim, é tão possível ter nas mãos o pesadelo como o paraíso. Tal é o peso da metamorfose.”
(idem: 549). Este texto é do meu livro A arte de ser tigre (2003), onde surge sob a forma de epí-
grafe e é assinado por Aldo Mathias e datado de 1939. Em 2005, numa entrevista, pergunta-
ram-me: “Aldo Mathias, que, aliás, convoca para a sua escrita, diz que «é tão possível ter nas
mãos o pesadelo como o paraíso». Serão esses os «avessos» que a sua poesia procura «descon-
juntar»?” (Silva 2004: 36).
Tratando-se de uma epígrafe, o contrato de leitura implicava que quem fez a entrevista
pensasse em Aldo Mathias como uma figura autónoma. Da minha parte, esse contrato con-
templava, embora não obrigatoriamente, a possibilidade de assunção do jogo. Por isso, à per-
gunta da, neste caso, entrevistadora, eu respondi: “(...) Eu não tento desconjuntar esse para-
doxo de Aldo Mathias, só dar-lhe alguma forma, acreditando que, apesar de tudo, a palavra
poética ainda vale a pena.” (ibidem). Ora Aldo Mathias (já o disse mais do que uma vez) não
passou de uma invenção, embora tenha tido até honras de biografia:

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Aldo Mathias nasceu em Bucareste, a 12 de Fevereiro de 1909, no seio de uma família abasta-
da. O talento musical da mãe, filha de aristocratas da Transilvânia, e o gosto do pai, judeu e de
ascendência italiana, pela literatura e pela pintura marcaram os seus primeiros anos de vida e
seriam mais tarde evocados no romance que deixaria incompleto. Passou a maior parte da sua
infância e adolescência entre Bucareste e Constança, onde a família possuía uma casa de férias.
Os meses de Verão junto ao Mar Negro parecem ter sido decisivos para a sua produção literária.
Estudou Ética e Filosofia na Universidade de Bucareste, onde conheceu Eugene Ionesco e Mircea
Eliade, de quem se tornaria amigo e com quem partilharia, até à partida de Eliade para a Índia,
as suas primeiras experiências de escrita, onde era patente o pendor filosófico e reflexivo. Após
o retorno de Eliade à Roménia, a ascendência judaica de Aldo Mathias e divergências políticas
entre ambos afastá-los-iam irremediavelmente. Quando, em 1940, a Roménia se tornou aliada
da Alemanha nazi, Aldo Mathias foi proibido de ensinar na Universidade de Bucareste, sendo-lhe
posteriormente retirada a cidadania romena.
Em 1941, e na eminência de ser enviado para Treblinka, conseguiu fugir para a zona francesa
livre, fixando-se em Roussillon, onde conhece Samuel Beckett, que aí vivia desde a sua fuga de
Paris. Colaborou com a Resistência francesa, como Beckett, e com ele aprendeu técnicas estilís-
ticas fundamentais, integradas depois na sua escrita, especialmente nos contos. Com a queda do
governo de Vichy, em 1942, fugiu para Londres, onde morreu, a 3 de Abril de 1945, pouco antes
da rendição da Alemanha. A acreditar em depoimentos de amigos que lhe sobreviveram (como
Jean Pascal-Perry), Aldo Mathias escreveu A ilha emoldurada e Discrepâncias a duas vozes, duas
colecções de contos (escritas e dadas como preparadas para publicação em 1942) e um romance,
inacabado, Não sem antes pedir que a luz baixasse, também conhecido pelo estranho nome de Ara
(iniciado em 1941, exibindo algumas influências beckettianas). Infelizmente, os manuscritos
dessas obras perderam-se. Restam só alguns ensaios e fragmentos dispersos, em estado diverso
de revisão. (Amaral 2017: 256-7)

Disse acima que a poesia existe numa camada descolada da pele, mas não solta dela. Não
estará a poesia e quem a escreve sempre desfocada de pátrias, ou pertenças, ainda que es-
sas pátrias possam coincidir parcialmente com as línguas? Será disso que se trata, pergunto:
convocar uma língua estrangeira, desfamiliarizada, desconhecida mas tragicamente sempre
reconhecível? No meu livro Ágora, tenho um poema chamado “A voz do outro: a doação”, onde
é dada voz a um cavalo, ele também um excluído dos afectos e da voz:

A VOZ DO OUTRO: A DOAÇÃO

Eles falam de símbolos e cenas,


da distância pintada
entre as coisas do céu
(mais à direita, como deve ser)
e, à esquerda, as casas, pequenas
e humanas

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Da dádiva oferecida,
do manto assim trocado
entre o chegado e aquele que tratava
o sol e a formiga, a luz, a água, a águia
por irmãos

Falam ainda da sela cor de sangue


que me protege o flanco
e se distingue, bela,
do tom quente
do manto

E eu sem saber, nem querer saber,


daquilo que eles falam,
curvo a cabeça
e fico-me submisso,

esperando que ele esboce


curtíssimo sorriso,
me diga em saudação:
bom dia, irmão cavalo

(Amaral 2022: 1199)

Nesse meu livro é dada voz também à Virgem, a Verónica, ao próprio Cristo – ou à serpente do
Génesis, que surge erotizada, ou, melhor homoerotizada. Leio esse poema, que fala da questão
do género e das sexualidades a partir da narrativa bíblica. Assim fala a serpente a Eva:

A TENTAÇÃO: FALA A SERPENTE

Olha como é macia


a minha pele, mais macia
que a dele

como dispenso pernas,


braços, mãos, e me confundo
a verde e a castanho,

e o tronco atrás de nós


se compraz no meu corpo

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e toda a árvore estremece


de prazer

Vem comigo e partilha


o segredo de ser sob
as estrelas: um lume
original

Não tenhas medo,


não te assustem as cores
da minha pele
nem o meu olho em fenda,
porta de entrada para tantas delícias
perdidas no jardim

nem esta coisa bífida


que fala,
mas que eles dizem fundir-se
com o mal

A lisura macia que te ofereço


não custa o sal da terra:

tem o preço
do sol

(idem: 1223-4)

Talvez a poesia, porque trabalha com a linguagem e a linguagem passa pelo conhecimento
do mundo e pela consciência de si, o tenha sabido desde sempre, desta diferença de colocação
e intensidade, avançando ainda para um terceiro estádio no processo criativo, o da imagina-
ção. Sentir com a imaginação – sabia-o, antes de Fernando Pessoa, outro imenso, o romântico
que foi Samuel Taylor Coleridge, ao distinguir as funções da imaginação em duas categorias:
a primária e a secundária, sendo que a diferença entre elas se operava não na espécie, mas
no grau. Ligada à fantasia, a imaginação secundária ordena e classifica a experiência passada
armazenada na memória; a imaginação primária, por seu turno, tem o poder de criar. Aí, diria
Virginia Woolf, atenta leitora de Coleridge, se “começa a ver o que [se] tinha na mente” (Woolf
1993: 91).
Na poesia, o que existe é, assim, não a mentira, mas uma espécie de verdade, sonhada e
deflectida, transposta para uma língua diferente, mas nunca corrompida, e servida por uma

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estrutura musical e rítmica. O poético seria, pois, o lugar privilegiado para exercitar a liber-
dade, sem nunca se deixar de pertencer ao mundo que nos gera e que nos alimenta. Porque a
poesia, tenho vindo a defender com enfoques diversos, não podendo nunca ser o espaço da to-
talidade, porque é humana, é o espaço por excelência do exercício da possibilidade. E se pensar
é sentir com a imaginação, a mais imaterial matéria surgida do material, que é o corpo, então
“não há nada que possa predizer o pensamento: pensar é permitir que o acaso se faça. E o acaso
é a configuração do inesperado na criação da obra, na invenção de mundos”, tal como “permitir
o imprevisto é abrir-se às intensidades” e ao sonho.
Uma proposta: a poesia como qualquer coisa de intermédio, uma terra de ninguém com
gente dentro. Ou uma terra de ninguém com vozes dentro. Porque no processo de feitura do poema
está já o outro, implícito e implicado. O outro que antecede e o outro que procede, “sentindo,
ao ler”. Nesse vaivém entre escrita e leitura, a poesia, mesmo se lírica (ou mesmo que, porque
lírica, lhe pode assistir a mais eloquente forma de expressão, que é o silêncio) cumpre sempre
uma funda obrigação ética, ao permitir-se ser uma espécie de “obrigação moral para com os
emudecidos”, os excluídos (Primo Levi 2008: 84). A poesia que me interessa talvez seja isto:
resistente e dúctil, como um junco, ou uma folha de erva, contrariando o poder e os “impoten-
tes do poder”, uma terra com gente entre espaços de vazio que comova e mova – até mesmo
no sentido dos movimentos políticos e sociais. Assim, no meu livro Escuro, a minha Europa não
pode nunca ser a Europa de Pessoa, essa Europa que fitava o mundo com o rosto de Portugal. A
minha é a Europa dos imigrantes, dos sem cidadania, dos sem terra, dos refugiados, a Europa
aprisionada a um modelo económico feroz e neo-liberal, dominado pelas chamadas “indús-
trias financeiras”, em que o capital se sobrepôs ao trabalho, a Europa espoliada e necessitada
de se rever e à sua História. “A Europa jaz, posta nos cotovelos: / De Oriente a Ocidente jaz,
fitando”, assim começava, recordo, e de forma imperial, o poema de Mensagem, que terminava
com o verso “O rosto com que fita é Portugal” (Pessoa 1992: 23). O meu poema termina assim:

EUROPA (POEMA 2)

Pouco fita a Europa, a não ser mortos


por múltiplos disfarces: química luz,
os lumes tão reais, os nomes amputados
pelos números, mesas de número fartas

Alguma vez fitou? De que roubos e fúrias


lhe foram as paisagens? E ao assomar
defronte à maior arte sua (sinfonias abertas
como nuvens, as cores mais deslumbrantes,

rochas pintadas em soberbas linhas,


os comoventes traços e palavras),

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mesmo defronte a si, distante e bela,


que ventos lhe assomaram os cabelos?

Mesmo nesse arrepio novo de um século,


que prenúncios viu ela? Guerras a destruir-lhe
solo e gentes, o brilho azul da lua nas
trincheiras, a mais pura impiedade reluzindo

Não tem olhos agora de fitar, se alguma vez


os teve: perdeu-os noutras guerras.
Resta-lhe debater-se, como golfinho em dor
preso nas redes. Não tem olhos, nem mãos,

nem fita nada, a Europa. Nem cotovelos tem


que possam suportar justiças e bondade.
E mesmo aqui, se para aqui olhasse, nada veria,
a não ser outros gritos. Sem voz. Sem sul.

Sem esfinge que deslumbre.

(Amaral 2022: 953; itálicos meus)

A terra de ninguém com gente e vozes dentro é quem escreve e quem lê, mas é também a
terra daqueles e daquelas que antes a foram habitando, ainda que muitas vezes não pudessem
chamar-lhe pátria. A minha terra de ninguém com gente dentro é, porque de gente feita, uma
terra de corpos e de vozes de quem não tem voz ou cuja voz quase não é escutada. Por isso é tão
fundamental insistir na tentativa de nos colocarmos num lugar de outridade, mesmo sabendo
que tal nunca é totalmente possível:

GRAMÁTICAS DO OLHAR

Cruzar olhares será tarefa fácil,


mas não trocar de olhar:

Em foco: um outro ponto, do avesso,


em avesso: outra luz,
outra paisagem

Como de um outro azul,


um brilho outro,

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“A outra que eu não sei, por não ter voz, ficou na escuridão por inventar”. Travestir o mundo

um céu rasgado a nuvens


de outra cor

Cruzar olhares será tarefa breve,


trocar de olhar: uma forma de pôr
em palco de deserto, antes miragem:
agora uma viagem
sem regresso

– que a troca:
irreversível:

Uma forma de excesso devolvido


ao espaço inabitado
por igual

Cruzar olhares: uma tarefa curta.


(A outra:
a mais gramatical
forma de amar)

(idem: 571)

No poema VII da sua bela sequência “Vinte e um poemas de amor (mais um poema flu-
tuante, e não numerado)”, Adrienne Rich debruça-se precisamente, e em belíssimo registo
lírico, sobre esta questão da verdade do eu que fala sobre um tu. Essa sequência pertence a um
livro intitulado O sonho de uma língua comum (1978), um livro com quase 50 anos, mas ainda
tão actual:

VI
Que espécie de monstro faria da sua vida palavras?
Que tipo de expiação é esta? –
porém, ao escrever palavras como estas, eu vivo também.
Será que tudo isto é como os uivos da loba,
a sua cantata modulada e selvagem?
Ou quando, longe de ti, te tento criar em palavras,
será que uso simplesmente tu como um rio, como uma guerra?
Ah, e como eu usei rios, como usei guerras!
Para fugir a escrever sobre o mais duro do mundo –
não os crimes dos outros, nem sequer a nossa própria morte,

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mas a falha de desejar apaixonadamente a nossa liberdade


de forma tal que arruinados elmos, rios doentes, massacres,
parecessem somente meros símbolos da profanação de nós.

(Rich 2002: 146-7; itálicos meus)

Tenho um romance que se chama Ara. Várias vezes me coloquei a seguinte pergunta: Quão
importante é assumir essa dimensão de sexualidade e de amor não heteronormativos, junta-
mente com a dimensão estética? Numa conferência em Salvador da Bahia, citei um passo desse
meu romance, passo que pertencia ao capítulo chamado “Discrepâncias a duas vozes”, onde
uma das vozes diz:

Deixa que venham anjos, deixa que caiam espadas. Mas termina o disfarce e enche de palavras
com sentido o que se fez amor. (…)
(…) Que dilúvios se instalem e relâmpagos encham de temor as letras recriadas. Oferece-
-lhe palavras (as mais belas), rodeia-lhe a cintura de frases mais brilhantes que con-stelações,
e nos seus olhos deposita imagens: as melhores.
Sem es¬quece¬res o decoro da palavra no indecoro do que vais ouvir, cria nova inocência
no antigo saber de corpos que se dão e no prazer da escrita que és capaz. Deixa que venham anjos,
deixa que caiam espadas. Mas termina o disfarce e enche de palavras com sen¬tido o que se fez
(o que se faz) amor.
Que se comece a história em nova voz de gente. (Amaral 2013: 29-30)

A “nova voz de gente” reflecte a necessidade de falar e de amar numa língua nova, mesmo
consciente de que esse movimento terá de surgir de dentro da língua já existente, fazendo-a
explodir, se necessário for, mesmo sabendo que é desta língua, a única que temos, que é pos-
sível falar.

Vergonha: a fome nas crianças, a fome desenhada, omnipresente. Crianças que nem pão,
ou gesto, ou um olhar qualquer. Vergonha de haver fome. De olhar fome. Vergonha: só o ver,
como estas coisas. A violência de ver, sem mãos para mudar. Essa, a vergonha.
(...) Vergonha: destruir e conquistar sobre terreno alheio. Vergonha é o silêncio, a sério de
vazio. A quem pertence o mundo? Vergonha é não amar. Vergonha era fingir que não pertenço.
(idem: 77)

Mas no que aprendi, tu não cabias. Nunca coubemos no que me ensinaram. Nunca me
deram matéria verbal para falar de nós – por isso me confundo e falo do que sei há tantos anos.
Desejando inventar palavras novas, formas novas, ao menos, de as juntar. Do amor que não é no
centro desse círculo, o que posso eu dizer?
(...) Meu amor. Até o termo roubado a outra língua, a única que sei. (...) Uma língua diferente
far-nos-ia – para eles – reais.

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Mas é por esta língua, a única que sei, que te posso falar. Com ela criarei um pôr-do-sol
maior. Catedrais que conversem, não feitas de silêncio, nem de espuma, nem deuses. Catedrais
onde caibas e eu caiba. Hei-de fazer contigo um círculo maior e só de paz. Com as mesmas pala-
vras, então palavras novas. A caber. (idem: 73-4)

As palavras da literatura podem ser tentativas de ordenação de um mundo marcado por


iniquidades, desmandos e violências, de estabelecer entre, por um lado, a ideia de resistência
política (social, cultural, ideológica) e, por outro, a construção (literária, linguística, formal)
de uma “poética de resistência” – ou seja, ao “fazer poesia”, “fazer política”, reconhecendo,
com Toni Morrison, na sua bela intervenção aquando da atribuição do Prémio Nobel em Lite-
ratura, de que “a linguagem opressora faz mais do que representar a violência; ela é violência”
(Morrison 2020: 104). Ou ainda, usando aqueles sugestivos e irónicos versos da poeta polaca
(também Nobel) Wislava Szymborska, “Ser ou não ser, eis a questão / e embora isso perturbe a
digestão, / é uma questão, como sempre, política”.
A minha terra de ninguém com gente dentro é feita dos olhares e das vozes de tudo o que
vive ao meu lado e fora de mim, planetário e cósmico, temporal e espacialmente, e as vozes
também que tantas vezes não têm direito nem ao espaço, nem ao tempo, nem ao mundo.
Relendo “O Mostrengo” “imundo e grosso”, de Fernando Pessoa, que lhe foi mote temático,
termino com o meu “Adamastor”, no reconhecimento de que ele próprio, antes habitando “a
mais funda fundura, / onde a sua escuridão resplandece”, acaba por ser criação alheia. O que é
verdadeiramente seu é a ausência, mas uma ausência cheia – justamente porque resultado do
inesperado, aberta a tudo. E que, para pedir emprestada a formulação de Evando Nascimento,
leva a lugar nenhum, e portanto a um qualquer lugar: “o de uma escuridão por inventar”:

Havia nesse tempo uma espécie de sol,


E era ao cimo da água,
e eu no fundo do mar

E eu via aquele brilho sem saber que era sol,


só uma linha difusa a clarear
lugares do nunca

Eu habitava a mais funda fundura,


nela resplandecia
a minha escuridão

Feito entre limos, pedra e pesadelo,


eu era o pesadelo,
e não sabia ainda poder ser

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o sustento de versos e de sonhos,


de línguas novas
a falar abismos

Inventaram-me ali,
naquele tempo,
nessa espécie de sol

Não chega o toque para dizer corpo,


e o meu era de pedra
a transformar-se

E disseram-me carne,
e eu fiz-me carne,
e disseram-me lama,

e a pedra no meu corpo fez-se lama,


e deram-me cabelos,
boca, olhar

E eu olhei lá do fundo,
da fundura mais funda onde vivia,
e gritei, descoberto,

e nu, e forte,
e ouviu-me
o mar

Mas o que dele rebentou, profundo,


foi a parte de mim
que nada era

A outra, que eu não sei,


por não ter voz,
ficou na escuridão

por inventar –

(Amaral 2022: 948-9)

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NOTAS
* Ana Luísa Amaral (1956-2022) é autora de 17 livros de poesia (coligidos em O Olhar Diagonal das Coisas, 2022), bem como de

livros de teatro (Próspero morreu, 2011), infantis (como Gaspar, o Dedo Diferente, 1998, A História da Aranha Leopoldina, 2011,

A Tempestade, 2012, ou Como Tu, 2013), de ficção (Ara, Sextante, 2013), ou de ensaio (Arder a Palavra e Outros Incêndios, 2017).

Os seus livros estão editados e traduzidos em vários países, como Inglaterra, Espanha, Brasil, França, Suécia, Holanda,

Venezuela, Itália, Colômbia, México, Alemanha, e Estados Unidos. Traduziu diferentes escritores, como William Shakespeare,

Emily Dickinson, John Updike, Louise Glück, Margaret Atwood, Patricia Highsmith e Tennessee Williams. Obteve diversos

prémios e distinções, dos quais se destacam o Prémio PEN narrativa, Prémio de Poesia APE, Prémio Correntes de Escrita-

-Casino da Póvoa, e mais recentemente, Prémio Reina Sofia de Poesia Ibero-Americana. Foi também distinguida com a Me-

dalha de Mérito Científico do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, e condecorada com o grau de Comendador

da Ordem de Sant'Iago da Espada (2022). Foi Professora Associada da Faculdade de Letras do Porto e membro da Direcção do

Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa, no âmbito do qual criou e coordenou o grupo Intersexualidades.

1
Este trabalho foi realizado no âmbito da Linha de Investigação “Intersexualidades”, do ILCML, financiado por Fundos Na-

cionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, no âmbito do Programa Estratégico “UIDB/500/2020”.
2
Excepto quando indicado, todas as traduções são da minha responsabilidade.

Bibliografia

Amaral, Ana Luísa (2013), Ara, Porto, Sextante.


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Theodora Ward, Cambridge, The Belknap Press of Harvard University Press.
Espanca, Florbela (2003), Poesia Completa, recolha e notas Rui Guedes, 4.ª edição, Lisboa, Dom
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Levi, Primo (2008), Os que sucumbem e os que se salvam, trad. José Colaço Barreiros, Lisboa,
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Mallarmé, Stéphane (1945), OEuvres Complètes, Paris, Gallimard, Bibliothèque de la Pléiade.
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Orpheu (1984), vol. 1, intro. Maria Alhiete Galhoz 4.ª reedição, Lisboa, Ática.
Orpheu 2 (1979), ed. e intro. Maria Alhiete Galhoz, 2.ª reedição, Lisboa, Ática.

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