4298 16538 1 PB
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Teólogo pela PUC-Rio. Master’s candidate no Union Theological Seminary. Universidade de Columbia, Nova Iorque.
E-mail: [email protected]
É neste contexto que o dossiê desta edição é “Teologia Negra: encarnação e diáspora” e
busca não apenas refletir sobre o status e atualização da Teologia Negra, mas também contribuir para
que novas vozes se ergam e sejam descobertas. É um bom momento para pensar que contribuições a
Teologia Negra tem dado e pode continuar a dar na disputa por um mundo igualitário e antirracista.
Encarnação e Diáspora é, portanto, a provocação para uma reflexão profunda e práxis dos
desdobramentos, alcance e papel da Teologia Negra no mundo hoje.
E, de igual modo, esta fuga, esta resistência e reinvenção libertária também dizem respeito
aos saberes, espiritualidades e culturas que foi empreendida inteligentemente na diáspora. Isto
também foi a encarnação. A Teologia Negra encarnou-se no corpo negro, nos jogos de corpos, nas
comunidades construídas para lutar, sobreviver e viver. As muitas dimensões da vida concreta dizem
respeito à Teologia Negra, e a Teologia Negra diz respeito à complexidade da vida concreta que é
atravessada pela fé e pelo poder de ser livre.
Como não poderia deixar de ser, nós iniciamos esta edição com um artigo que nos apresenta
um pouco da vida e da obra, a contribuição, do querido professor Peter Nash. Evidentemente, a busca
e construção de uma Teologia Negra no Brasil ainda persiste, e está para muito além de Nash. No
entanto, não dá para traçar esta trajetória da Teologia Negra no Brasil sem considerar o que foi feito
por Nash.
Seu compromisso com a Academia, com a Bíblia, com a Igreja, e, sobretudo com o Povo
Negro, foi determinante para lançar as bases de um caminho de produção e reflexão sobre como, no
Brasil, o povo negro poderia ter a teologia ao seu lado e ao lado de sua luta. Em “Identidade, negritude
e hermenêutica”, Ricardo Willy Rieth nos dá uma introdução à potente história do professor Nash.
E isto é extremamente poderoso para a realidade brasileira. Aqui, mesmo sem notar ou citar,
Barros encontra diálogo com a “Améfrica” e a “amefricanidade” de Lélia González, ao enfrentar o
desafio de nos fazer pensar algo que surge de nós, amefricanos ou afrolatíndios, e não dos saberes
importado por nós.
O teólogo Emiliano Jamba João nos apresenta o artigo “Porque, na esperança fomos salvos”,
em que ele propõe “uma Teologia Negra diaspórica e encarnacional”. Africano angolano que estudou
e reside no Brasil, Emiliano afirma o caráter diaspórico da Teologia Negra, e isto é fundamental para
entender que, embora o locus marque o lugar da Teologia Negra, como qualquer outra teologia, este
locus não está desprovido do papel exercido pela diáspora. Sim, a Teologia Negra também atravessou
o Atlântico Negro, atravessou as plantations do caribe e habitou os quilombos brasileiros.
A panamenha Jocabed Solano nos oferece uma reflexão sobre “Teologia Negra: encarnação
e diáspora” que subverte a lógica da reflexão academicista e se permite compartilhar a “reflexão
encarnada”, ou como diria a grande escritora brasileira Conceição Evaristo, sua “escrevivência”. O
artigo de Jocabed nos mostra sua história conectada com a história de seu povo, a nação Guandule.
No relato de seu povo, a Teologia Negra tem corpo, liturgia, força e subversão.
Os encontros foram promovidos em Pretoria, África do Sul, Acra, Gana e Nairóbi, Quênia e
incluíram participação de quatorze países africanos. Impossível pensar encarnação sem refletir sobre
o papel e a influência da economia e, hoje mais do que nunca, o impacto das ações humanas e
interesses humanos para o meio ambiente. É fundamental saber que a Teologia Negra não trataria da
libertação dos oprimidos, principalmente o povo negro, sem considerar como a opressão se
materializa economicamente.
Em parte, fecharemos como abrimos. O artigo de Gunter Bayerl Padilha, “A Gênesis das
reflexões sobre negritude na Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil”, parte da chegada
do professor Peter Nash como primeiro professor negro da Escola Superior de Teologia, e suas
provocações de uma leitura negra da bíblia, para pensar a trajetória de autocrítica e mudança de
perspectiva dentro da própria IECLB.
A geração formada por Nash, os primeiros alunos negros a formarem o Grupo de Negros e
Negras da EST significou uma abertura de caminhos que marcaria não apenas a instituição, mas a
produção acadêmica de negros e negros no Brasil sobre teologia e diálogo inter-religioso, as novas
aproximações e abordagens e olhares “teológicos” para as religiões de matriz africana e a história
negra brasileira.
Assim, o leitor tem em mãos um dossiê que se mostra também como um documento. Um
registro que amplia discussões e perspectivas da Teologia Negra encarnada no Brasil, ao mesmo
tempo em que está conectada com o mundo.