Neto Et All 2006
Neto Et All 2006
Neto Et All 2006
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Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil –
PGECIV- [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected].
ENGEVISTA, v. 8, n. 1, p. 37-48, junho 2006 37
1 INTRODUÇÃO (qc) do cone, definida pelo parâmetro Rf
A elaboração de projetos (razão de atrito). A Tabela 1 apresenta a
geotécnicos exige um conhecimento classificação dos solos proposta por
BEGEMANN (1965), em função do
adequado das características e das
propriedades geotécnicas dos solos. O parâmetro Rf.
reconhecimento do subsolo e a Tabela 1-Classificação do solo em função da
determinação das propriedades geotécnicas razão de atrito, segundo BEGEMANN (1965)
podem ser feitos através de investigações CLASSIFICAÇÃO RAZÃO DE
geotécnicas de campo. Na maioria dos DO SOLO ATRITO (%)
casos, são necessárias a utilização de
correlações empíricas e calibrações para Areia Grossa com 1,2 a 1,6
Cascalhos à Areia Fina
converter os resultados de ensaios de
campo em propriedades adequadas para o Areia Siltosa 1,6 a 2,2
projeto. Dentre os principais métodos de Areia Silto-Argilosa 2,2 a 3,2
investigação geotécnica, destaca-se o
Misturas de Argila 3,2 a 4,1
ensaio de penetração do cone – CPT. Os
resultados destes ensaios permitem a Argila 4,1 a 7,0
identificação estratigráfica de perfis de Turfa > 7,0
solos, a determinação de suas propriedades
mecânicas, estimadas com base em
correlações empíricas e semi-empíricas, Algumas modificações realizadas
visando aplicações em diversas áreas da posteriormente conduziram à introdução de
geotecnia, em particular na previsão da sensores, objetivando a medição dos
capacidade de carga e de recalques de parâmetros de interesse, sendo este
fundações BUDHU (2006), BARNES dispositivo denominado de medidor
(2000) e CHEN (2002). elétrico de penetração do cone. Outros
Os primeiros estudos relativos ao autores como SANGLERAT (1974) e
ensaio de penetração estática, chamado de SEARLE (1979), tomando por base o cone
“diepsondering”, “deepsounding”, ensaio mecânico, ampliaram e modificaram a
de cone holandês ou simplesmente ensaio proposta original de BEGEMANN (1953,
de cone, foram realizados por TERZAGHI 1963 e 1965). As mudanças introduzidas
(1930), segundo VELLOSO (1959). Logo foram no sentido de controlar a velocidade
em seguida, estudos se seguiram através de penetração do cone, variar as dimensões
dos especialistas do Laboratório de da haste e do cone e aumentar a
Mecânica dos Solos de Delft, na Holanda, profundidade das sondagens. Algumas
VELLOSO (1959). Na década de 30, foi variáveis adicionais também foram
desenvolvido um medidor mecânico de posteriormente introduzidas, como a
penetração de cone, que posteriormente medida da pressão intersticial da água,
sofreu modificações importantes poropressão, dando origem ao piezocone
introduzidas por BEGEMANN (1953, (CPTu), sucessor do cone holandês. Os
1963), um dos pioneiros no estudo do principais trabalhos que relatam essa
ensaio de penetração estática. evolução podem ser encontrados em
SANGLERAT (1974) e DANZIGER
Em seus estudos, BEGEMANN (1990).
(1965) mostrou ser possível classificar o
solo em função da razão entre a resistência No Brasil, este tipo de ensaio,
de atrito lateral (fs) e a resistência de ponta regido pela ABNT (1991), é aplicado desde
a década 1950, como ensaio de penetração
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estática mecânico, ganhando impulso a parte do treinamento DAYHOFF (1990) e
partir de 1980, com a intensificação de HAYKIN (1994). Essa capacidade é
pesquisas relacionadas ao tema, ROCHA chamada de generalização e pode ser
(1982), DANZIGER (1986) e DANZIGER explorada no sentido de obtermos a
(1998). classificação correta do solo, mesmo que
Uma das aplicações do cone parte dos dados sejam perdidos ZURADA
(1992), por qualquer tipo de falha de
consiste na identificação do perfil
geotécnico a partir do emprego de ábacos transmissão.
de classificação. As várias propostas de Finalmente, a RNA apresenta como
classificação dos solos, a partir dos resultado a classificação do solo para cada
resultados dos ensaios de cone, baseiam-se, incremento de profundidade.
em geral, em ábacos que relacionam a
resistência de ponta qc e a razão de atrito
Rf, ESLAMI (1995, 1996 e 1997) 2- FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Atualmente, a determinação do tipo 2.1 - O ensaio CPT
de solo através de ábacos vem sendo O equipamento consiste num
substituída por programas computacionais, conjunto de hastes tendo na extremidade
envolvendo métodos estatísticos de inferior um cone com ângulo de vértice de
classificação. No entanto, as classes de 60 º e uma base de 10 cm2 (Figura 1). A
solos são linearmente não separáveis resistência de ponta é medida através de
podendo, em certas situações, dificultar o uma célula de carga. Um conjunto de
trabalho estatístico de classificação. Além hastes metálicas transmite a força de
disso, por se tratar de um processo de cravação da máquina ao cone
aquisição e transmissão de dados emitidos WOODWARD (2004), SCHOFIELD
de sensores para um sistema elétrico, (2005), DAVID (2004) e HEAD (2006).
podem ocorrer perdas desses dados no
ensaio, sendo muito difícil a recomposição Interiormente às hastes passa o cabo
e a classificação correta do solo na de alimentação do cone, RUITER (1991).
profundidade para qual ocorreu a falha. A resistência de ponta é obtida
continuamente e os valores
Neste sentido, as Redes Neurais correspondentes podem ser registrados em
Artificiais (RNAs), que são estruturas gráficos, simultaneamente à realização do
paralelas compostas de neurônios ensaio. Aquele autor descreve também a
artificiais, distribuídos em camadas, medição da resistência de atrito lateral,
densamente conectados, podem ser muito através de uma célula de carga fixada à
úteis. As RNAs apresentam duas fases luva de atrito, situada logo acima da base.
distintas de operação: a aprendizagem ou
treinamento, e a execução. Na fase de O ensaio CPT é normalizado no
treinamento ou aprendizagem são Brasil ABNT (1991), sendo utilizado de
apresentados estímulos à entrada, forma crescente em inúmeros projetos
denominados padrões de treinamento geotécnicos. Segundo CAMPANELLA
representados, por exemplo, pelas (1982, 1988 e 1989), apenas no início dos
características qc e Rf dos ensaios e pelos anos 80 os elementos de poro-pressão
alvos, no caso investigado, os 12 tipos de foram incorporados aos cones elétricos,
solos definidos nas classificações pelo resultando no equipamento designado
método CPT. Na fase de execução, as como piezocone, WALTHAM (2001),
RNAs, devidamente treinadas, recebem VOS (1982) e PRAKASH (1990).
como estímulo de entrada um conjunto de
padrões de testes, também representados
pelos padrões qc e Rf , e que não fizeram
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Durante a penetração, as forças
medidas pela ponta e pelo atrito lateral
variam em função das propriedades dos
materiais atravessados. Os registros de qc e
fs são monitorados continuamente e
digitalizados em intervalos típicos de 10,
25 e 50mm. Com base nas medidas de
resistência de ponta (qc) e atrito lateral (fs),
Vedação-Água calcula-se a razão de atrito Rf = fs/qc. O
Vedação-Solo conhecimento da resistência à penetração
Sensor-Atrito
de ponta do cone qc e da relação de atrito
Amplificador Rf permite a determinação do tipo de solo,
Sensor-cone através do ábaco proposto por
Luva de Atrito
ROBERTSON (1983 e 1986). A Figura 2
Inclinômetro
Sensor-Pressão apresenta o ábaco, que permite a
Vedação-Água
Filtro
identificação de 12 diferentes tipos de solo.
Cone
1 Solo fino sensível
2 Matéria orgânica
3 Argila
Vedação-Solo 4 Argila siltosa a argila
5 Silte argiloso a argila siltosa
Figura 1 – Cone de penetração para 6 Silte arenoso a silte argiloso
ensaios CPT, adaptado de FUGRO (2000) 7 Areia siltosa a silte arenoso
8 Areia a areia siltosa
O cone é cravado no solo a uma 9 Areia
velocidade constante, por um sistema 10 Areia com pedregulho a areia
hidráulico instalado em perfuratriz ou em 11 Solo fino muito rijo
12 Areia a areia argilosa
veículos preparados para esta finalidade
KAMESWARA (2002), GREGG (1998),
SCHMERTMANN (1978) e HSAI-YANG
(2006). O equipamento de cravação é uma
estrutura de reação na qual é montado o
sistema de aplicação de cargas, realizado
por mecanismos hidráulicos SOARES
(1986). A penetração das hastes de 1m de
comprimento é feita continuamente e
seguida da retração do pistão hidráulico
para colocação de nova haste
QUARESMA (1996) e DANZIGER
(1990).
O conjunto pode ser montado sobre Figura 2 - Classificação do Solo proposta
um reboque ou caminhão previamente por ROBERTSON (1986 e 1990)
preparado para esta finalidade, de
capacidade entre 100 e 200 kN. A reação
aos esforços de cravação é obtida pelo peso 2.2 - As RNAs e o método Resiliente
próprio do equipamento e pela ancoragem O algoritmo de treinamento mais
manual DANZIGER (1990), DAVIES utilizado no perceptron de múltiplas
(1995) e DOUGLAS (1981). camadas (MLP), é o de retro propagação de
erro (BP), baseado no método do gradiente
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descendente, que computa as derivadas adaptativo de atualização do parâmetro
parciais de uma função de erro, com interno, peso da rede ZURADA (1992).
relação ao vetor peso W de certo vetor de Análise semelhante poderia ser feita
entrada DAYHOFF (1990) e HAYKIN
em relação ao limiar (b), outro parâmetro
(1994). interno da RNA.
A regra de Widrow-Hoff é a base
fundamental de diversos métodos de ∂e(n)
= −η
(n)
∆Wij
treinamento das RNAs, inclusive MLPs ∂Wij
ZURADA (1992). Esta regra avalia o erro
(e) a cada iteração através da derivada (n+1)
= Wij + ∆Wij = Wij +η Pj
(n) (n) (n) (n)
parcial desse erro em relação ao peso W e Wij (2)
ao limiar (b), mostrados, de forma simples
no perceptron da Figura 3.
A técnica de retro propagação de
erro, baseada no método do gradiente
decrescente, tratado em sua essência nas
p1 Σ F a1
W ij equações (1) e (2) é normalmente usada no
b1 treinamento de redes de múltiplas camadas
1 (MLP) HAYKIN (1994).
p2 Σ F a2
Dependendo do mapeamento
b2
2 desejado, o método do gradiente
p3 Σ F aS decrescente, que depende da magnitude do
.. gradiente, isto é da magnitude das
.. bS derivadas parciais do erro (e) sobre o peso
pR S
pode se tornar lento, especialmente no final
do treinamento, inviabilizando aplicações
Figura 3 - Rede Neural Artificial que exigem soluções rápidas DAYHOFF
(1990) e HAYKIN (1994).
Sabendo-se que (T) representa o Por outro lado, o método Resiliente
vetor alvo a ser atingido no treinamento, de retro propagação de erro, usado nessa
(S) o número de elementos do vetor de investigação, faz parte de uma classe de
saída (A=[a2 a2 ... aS]t), R o número de estratégias rápidas de adaptação local para
elementos do vetor (P=[p2 p2 ... pR]t), treinamento de RNAs e seu algoritmo foi
apresentado à entrada da rede e (F) a desenvolvido por Riedmiller e Braun,
função de ativação e, finalmente, RIEDMILLER (1993).
analisando-se um neurônio genérico, para
n-ésima iteração, (j = 1, ..., R), tem-se (1): É um método independente da
magnitude do gradiente do erro sobre o
peso, no qual a atualização dos pesos
∂e ( n ) ∂[T ( n ) − A ( n ) ] ∂ R depende, simplesmente, do sinal dos
[T ( n ) − ∑ Wij P j ]
(n)
= = termos do gradiente e o aprendizado é feito
∂Wij ∂Wij ∂Wij j =1
por épocas. O ajuste dos pesos é realizado
depois da apresentação completa de todo o
∂e ( n ) (n) padrão de treinamento à RNA.
= −Pj (1)
∂Wij No método Resiliente, a variação
dos pesos é feita de forma separada. Assim,
Na expressão (2) é mostrada a os pesos Wij possuem uma taxa de variação
variação ∆W do peso e o processo própria ∆ij, com o tempo, obedecendo a
seguinte regra, como mostrado em (3):
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Finalmente, os pesos são
atualizados através de (4):
∂e (t ) ∂e (t −1)
η + ∆ ij (t −1) Se >0
∂Wij ∂Wij
∂e (t ) ∂e (t −1) ( t +1) (t ) (t ) (4)
∆ ij
(t )
= η − ∆ ij (t −1) Se <0 Wij = Wij + ∆Wij
∂Wij ∂Wij
( t −1)
∆ ij Caso contrário
3- MODELAGEM E TREINAMENTO
onde : 0 < η < 1 < η − +
(3) DAS RNAs
O modelo da RNA que apresentou
o melhor desempenho foi a arquitetura
composta de duas camadas escondidas. A
Os valores típicos para η e ∆ij são: η+ = 1.2 primeira camada com 10 neurônios, a
, η- = 0.5 e 10-6 < ∆ij < 50. segunda com 150 neurônios e a saída com
12 neurônios artificiais. A Figura 4
apresenta um diagrama em bloco da RNA,
O fato do gradiente do erro sobre o no qual são ressaltadas as entradas e as
peso não mudar de sinal em duas iterações saídas da RNA.
sucessivas indica que o sistema está se
movendo na mesma direção, sugerindo um A rede foi treinada com um banco
aumento de ∆ij proporcional a η+ , visando de dados validado pelo método CPT
acelerar a convergência. envolvendo uma matriz de 2 linhas (qc e
Rf) e 545 colunas de exemplos
A mudança do sinal do gradiente representativos das 12 classes distintas de
em duas iterações sucessivas indica que a solos a serem tipificados.
última atualização do peso foi excessiva,
levando o sistema a saltar sobre um
1
mínimo e sugerindo uma diminuição de ∆ij 2
proporcional a η-. qc 3
4
∂e(t ) NEURO-CPT 5
for positivo, o
Se o gradiente 6
∂Wij 7
(10 - 150 - 12) 8
erro cresce e a variação do peso deve ser 9
(t )
decrementada na atualização ∆Wij = Rf 10
11
(t )
− ∆ ij com conseqüente diminuição do 12
peso.
Figura 4 - Diagrama do modelo da RNA
∂e(t )
Se o gradiente é negativo, o Os parâmetros de treinamento da RNA
∂Wij
foram os seguintes:
erro decresce e a variação do peso deve ser
(t ) (t ) Número máximo de épocas = 1000
incrementada na atualização ∆Wij = ∆ ij
e conseqüentemente aumentando o peso. Tolerância do erro = 1e-3
Os parâmetros η+ , η- e ∆ij têm seus
∂e( t ) valores especificados pelo método
Se o gradiente = 0 não ocorre
∂Wij resiliente, tratado na seção 2.2.
variação na atualização do peso, isto é, A Figura 5 mostra a curva de
(t )
∆Wij = 0 . treinamento da rede na qual pode ser visto
ENGEVISTA, v. 8, n. 1, p. 37-48, junho 2006 42
que o processo convergiu muito profundidade máxima de 23m de
rapidamente ao atingir cerca de 230 penetração, com uma velocidade de
épocas. penetração controlada de cerca de 20
mm/s.
CURVA DE TREINAMENTO
1
10
visando verificar a coerência dos seus #7 -0.999 -0.989 -1.000 -1.000 -0.999
10
8
O
TI
R 6
T
A
E
D
O 4
Ã
Ç
A
L
E 2
R
0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23
PROFUNDIDADE (m) inc: 0.05 m