Trabalho de Conclusão de Curso

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Trabalho de Conclusão de Curso

Tema 3 – Responsabilidade do Estado

Curso: Especialização em Direito Administrativo

Disciplina: Trabalho de Conclusão de Curso

Professor: Marinella Machado Araújo

PARECER N.1/2019/Prefeitura do Município Aqui-Nada-Funciona-


Bem/Procuradoria Geral do Município Aqui-Nada-Funciona-Bem

Nome: Juliene Alves Moreira

Título: Responsabilidade Civil no aspecto de dano ambiental

Ementa: Direito Constitucional. Direito


Administrativo. Direito Ambiental. Responsabilidade
do Estado. Responsabilidade do parecerista. Erro
Grosseiro. Entendimento do TCU. Negligência do
Fiscal. Ineficiência Pública. Improbidade
Administrativa. POSSIBILIDADE EM PARTE.

1. Relatório

1 Trata-se de consulta encaminhada a esta Procuradoria em face de pretensão


manifestada pelo prefeito do munícipio Aqui-Nada-Funciona-Bem que, ciente de
denúncia anônima encaminhada à Controladoria Geral do Munícipio sobre possíveis
ilegalidades nas obras emergenciais de infraestrutura nas vias públicas locais (em áreas
inundáveis) para instalação de sistema pluvial de drenagem das águas da chuva, realiza
consulta com o fim de apurar potencial responsabilidade administrativa e/ou criminal além
de proposição de ações indenizatórias.
2 A denúncia apontava para várias incongruências: existência de erro grosseiro em
laudo elaborado pelo engenheiro técnico responsável da obra e negligência do fiscal
responsável pelo licenciamento ambiental que havia autorizado as obras de
terraplanagem sem considerar nascente localizada às margens da via e que, em virtude
da movimentação de terras, teria ficado totalmente soterrada. Ademais, continha
acusação de que a obra seria realizada por funcionários sem capacitação técnica e com
material de baixa qualidade.
3 Eis, em breve síntese, o relatório. Passo a opinar, tendo em vista a conduta do
Poder Público, o procedimento a ser adotado pela Administração no caso.

1 Fundamentação

4 A presente manifestação toma por base, exclusivamente, os elementos vertidos


até esta data. Ademais, por força do que prevê a vigente Carta Política no que se refere
à Advocacia Pública, quando explicita algumas regras para essa carreira no âmbito
federal (art. 131), estadual e distrital (art. 132) ao passo que na esfera municipal, a
matéria fica a cargo das constituições estaduais e das leis orgânicas municipais bem
como demais legislações de regência, incumbe a este órgão da Procuradoria Geral
Municipal prestar consultoria sob o prisma estritamente jurídico, não lhe competindo
adentrar à conveniência e à oportunidade dos atos praticados no âmbito do ente político,
tampouco analisar aspectos de natureza eminentemente técnico-administrativa.
5 Atente-se, neste primeiro momento, ao arrazoamento desenvolvido pelo
interessado no que diz respeito à possibilidade de o Município responder objetivamente
pelos danos, inclusive aqueles causados a terceiros não usuários das vias, advindos da
obra mesmo que estes tenham sido provocados por imperícia da empresa privada
contratada para a realização da obra.
6 Antes de adentrar ao mérito, é preciso explanar que existem três searas diferentes
de responsabilização: a administrativa, a cível e a penal. Cada um desses “tipos” de
responsabilidade restará delimitado a partir da natureza da norma jurídica violada.
Explico: se a norma é de direito administrativa, teremos a responsabilidade
administrativa, se a norma é de direito civil, existirá a responsabilidade civil e assim por
diante. Isso ocorre porque as normas jurídicas supracitadas são autônomas entre si.
7 Como a consulta foi solicitada para perquirir eventual responsabilidade
administrativa e penal, é preciso destacar que para ocorrer responsabilidade criminal é
necessário compreender que esta não existe na modalidade objetiva, ou seja, sem
investigar o elemento subjetivo do agente. No direito penal, é necessário o preenchimento
dos elementos de fato típico, antijurídico e culpável (grifo nosso), de acordo com a teoria
tripartite vigente.
8 No que diz respeito a responsabilidade objetiva civil do Munícipio deve-se atentar
para as seguintes possibilidades: a) o dano decorrente tão somente pela obra pública; b)
dano causado pelo particular e a não fiscalização do poder público e c) o dano ambiental.
Quanto a última responsabilização citada, o art. 225, § 3º, da CF/88 prevê a tríplice
responsabilização ambiental, estando, portanto, o causador de danos ambientais, sujeito
à responsabilização administrativa, cível e penal, de modo independente e simultâneo.
9 Quanto a questão de responsabilidade do Munícipio por obra pública, apesar de
discussão doutrinária no assunto, ocorre quando o dano é provocado unicamente pela
obra, por razão natural ou imprevisível e sem que tenha existido culpa por parte de
qualquer pessoa. Nesse caso, culminará em responsabilidade objetiva do Munícipio,
independentemente de quem esteja executando a obra. Contudo, não é o que aparenta
ter existido no caso concreto, já que diante dos elementos trazidos tais como erro
grosseiro do engenheiro responsável, funcionários sem qualificação técnica e material de
baixa qualidade, é demonstrado que não existe quaisquer razões naturais ou
imprevisíveis.
10 No caso em questão, também poderia ser ventilado que, em razão da omissão do
Poder Público do dever de fiscalizar, existiria uma responsabilidade objetiva, mesmo que
a obra tenha sido realizada por empresa pública. Na realidade, embora se trate de pessoa
jurídica de direito privado, a empresa está prestando serviço público, o que remeteria a
aplicação do art. 37, §6 da Carta Magna, consoante a teoria do risco administrativo.
Inclusive, o Supremo Tribunal Federal (STF), entende que a responsabilidade civil que
decorre de danos causados pela prestação do serviço público, é aplicável tanto para os
usuários, quanto para aquelas vítimas que não são usuárias, tendo em vista que não
há qualquer limitação na Constituição Federal.
11 Nesse ínterim, percebe-se preceito constitucional estabelece duas relações de
responsabilidade: a) a do Poder Público e seus delegados na prestação de serviços
públicos perante a vítima do dano, de caráter objetivo, baseada no nexo causal; b) a do
agente causador do dano, perante a Administração, de caráter subjetivo, calcada no
dolo ou culpa, por meio de ação de regresso. Sem embargos, é preciso lembrar que, na
aplicação da teoria do risco administrativo, cabe a discussão das excludentes, as quais
limitam a responsabilidade civil do ente público.
12 A teoria de responsabilidade objetiva baseia-se na ideia de solidariedade social,
distribuindo por toda a sociedade os encargos decorrentes de prejuízos especiais que
oneram determinados particulares, em legítima noção de justiça distributiva. Não
obstante, percebeu-se que o Estado passaria a arcar com o risco natural de várias
atividades. Ocorre que, excepcionalmente, também é possível a adoção da teoria do risco
integral do Estado que acontece quando a responsabilidade sequer depende do nexo
causal e até mesmo quando a culpa é da vítima, sendo fundamento para hipóteses legais
em que o risco ensejado pela atividade econômica também é extremado, como ocorre
com o dano nuclear (art. 21, XXIII, “c”, da CF e Lei 6.453/1977). O mesmo ocorre com o
dano ambiental (art. 225, caput e § 3º, da CF e art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981), em face
da crescente preocupação com o meio ambiente.
13 Assim, a responsabilidade civil por danos ambientais, como a que ocorreu no
presente caso, seja por lesão ao meio ambiente propriamente dito (dano ambiental
público), seja por ofensa a direitos individuais (dano ambiental privado), é objetiva e
consagra o princípio do poluidor-pagador, conforme disposto na legislação supracitada.
14 O Superior Tribunal de Justiça (STJ) sintetiza essa posição da seguinte forma:
"Para o fim de apuração do nexo de causalidade no dano ambiental, equiparam-se quem
faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que
façam, quem financia para que façam, e quem se beneficia quando outros fazem." (REsp
650.728/SC). Por fim, são coobrigados solidários todos que concorreram para a
degradação ambiental.
15 Em uma segunda análise, sobre a indagação de possibilidade de ação civil de
improbidade administrativa por ineficiência administrativa e/ou por lesão ao erário, urge
tecer algumas breves considerações sobre a Lei nº 8.429/1992.
16 Existe a discussão de que a referida lei civil não se aplicaria para determinados
agentes políticos que cometem atos de improbidades caracterizados como crime de
responsabilidade, que são verdadeiramente infrações político-administrativas. Segundo
Amorim e Carvalho (2018), isso ocorre porque a Constituição Federal estabeleceu
distinção e regime normativo diferente para improbidade administrativa (art. 37, §4) e
crime de responsabilidade (arts. 52, I, 85, V, e 102, I, c, regulamentados pelas Leis
7.106/1983 e 1.079/1950 e pelo Decreto-lei 201/1967). No que tange a disciplina
acometida para o prefeito, o Decreto-lei 201/1967 apregoa crimes propriamente (art. 4º)
e impropriamente (art. 1º) de responsabilidade.

17 Diante de tal celeuma, o STF julgou em maio de 2018, o agravo de regimento na


Petição 3240, firmando o posicionamento de que os agentes políticos, com exceção do
presidente da República, encontram-se sujeitos a um duplo regime sancionatório e se
submetem tanto à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa
quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de responsabilidade.
18 Nesse ínterim, o prefeito possui diversas atribuições, proferindo atos relacionados
a sua função como Chefe do Executivo bem como aqueles de natureza administrativa,
tal como a obra pública em comento. Assim, uma vez que agiu dentro das suas
prerrogativas administrativas, sujeita-se, sem restrição, aos ditames da Lei nº
8.429/1992, a usualmente denominada “LIA”, Lei de Improbidade Administrativa.

19 Levando em consideração tudo o que foi narrado, é necessário averiguar alguns


pontos antes de adentrar propriamente na possibilidade de responsabilidade civil por
improbidade administrativa do prefeito no caso em comento. A LIA traz quatro
“modalidades” diferentes de cometimento de ato improbo, quais sejam: atos de
improbidade que causam enriquecimento ilícito (art. 9º), atos que causam prejuízo ao
erário (art. 10º), atos de Improbidade Administrativa decorrentes de concessão ou
aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário (art. 10-A) e atos de improbidade
que atentam contra os princípios da Administração Pública (art. 11). Percebe-se o quanto
a Lei trouxe comandos “abertos” em cada modalidade e até mesmo a dificuldade advinda
da amplitude do termo de “improbidade”.
20 Tendo em vista o caso analisado e com as informações trazidas, não se
depreende, sumariamente, a possibilidade de aplicação das sanções decorrentes da Lei
8.429/1994 em virtude dos artigos 9º e 10-A. No que tange aos outros artigos, é preciso
uma melhor reflexão.
21 Observamos que no contexto descrito pela consulta, o prefeito teria utilizado
funcionários sem capacidade técnica e material de baixa qualidade. Diante disso, é
questionado a possibilidade de existência de ineficiência e lesão ao erário. Mas o que
viria a ser eficiência nas tratativas da Administração Pública?
22 Apesar da textura aberta do termo, é de entendimento uníssono de que esse
conceito estaria intimamente relacionado a outros como o princípio da produtividade,
economicidade, qualidade, celeridade, presteza e desburocratização. Dessa forma,
pode-se pensar que existiu violação ao artigo 11 da Lei de Improbidade.
23 No entanto, conforme já decidiu o STJ, é imprescindível a configuração da má-fé
do sujeito ativo para incidência desse artigo, não sendo suficiente a mera prática de
irregularidade administrativa.
24 Essa exigência de dolo ou de má-fé é de suma importância para evitar a aplicação
desproporcional e generalizada das sanções de improbidade que são bastante graves
como por exemplo a perda de função pública e suspensão de direitos políticos, podendo
configurar violação ao princípio da legalidade bem como gerar insegurança jurídica, uma
vez que qualquer deslize do agente poderia acarretar tais sanções.
25 Outrossim, destaca-se que para a configuração da improbidade prevista no art. 11
da LIA pressupõe: a) violação aos princípios da Administração Pública; b) conduta
dolosa, sendo de dolo genérico, consoante ao entendimento do STJ; e c) nexo de
causalidade entre a ação/omissão e a respectiva violação ao princípio aplicável à
Administração. Além disso, esse artigo possui caráter residual, ou seja, desde que não
ocorrida as demais modalidades de improbidade, é que há seu enquadramento (REsp
1075882/MG).
26 Sobre o primeiro requisito citado, insta discorrer sobre a importância dos princípios
jurídicos no ordenamento jurídico, após a ocorrência da fase pós-modernista. É de
conhecimento cristalino, a força normativa e vinculante dos princípios jurídicos no âmbito
das relações públicas e privadas.
27 Por conseguinte, a violação de qualquer princípio, seja expresso ou não, aplicável
à Administração, caberia na configuração do art. 11 da LIA. Não existe qualquer lógica
se o agente pudesse escolher quais princípios iria respeitar ou se existiria qualquer tipo
de hierarquia entre os princípios jurídicos. Portanto, muito embora, não existir previsão
expressa do princípio da eficiência no caput do referido artigo (até porque a lei é anterior
a Emenda Constitucional nº 19), este poderia ser perfeitamente aplicável tendo em vista
a ideia de juridicidade, ou seja, a observância de que toda atuação de qualquer agente
deve ser conforme não apenas à lei (legalidade) mas também ao próprio Direito.
28 Diante dessa análise do elemento subjetivo, para o enquadramento do art. 11 da
LIA seria necessário verificar se o prefeito agiu com má-fé (dolo) e, consequente,
desonestidade, quando se utilizou de funcionários sem capacidade técnica e material de
baixa qualidade. Outrossim, ressalte-se que tem prevalecido o caráter residual deste
artigo e de suas sanções enumeradas no art. 12, III, uma vez que tais normais somente
serão aplicadas nas hipóteses em que não for constatado a violação dos art. 9º ou 10 da
mesma lei.
29 Já no que diz respeito ao ato improbo que causa prejuízo ao erário, o cenário pode
mudar, haja vista que este possui como elemento subjetivo tanto o dolo quanto a culpa.
Observa-se que a prática de improbidade administrativa tipificada no art. 10 da Lei
8.429/1992 pressupõe: a) lesão ao erário; b) conduta dolosa ou culposa; e c) nexo de
causalidade entre sua ação/omissão e o respectivo dano ao erário.
30 Não obstante, há entendimento que a exigência de ocorrência de lesão ao erário
para a devida configuração do art. 10 da Lei de Improbidade não se confunde com a
expressão “patrimônio público”. A expressão “erário”, seria considerada restritivamente,
apenas os recursos financeiros provenientes dos cofres públicos da Administração
Pública direta e indireta, bem como aqueles destinados pelo Estado às demais entidades
mencionadas no art. 1.º da LIA, ou seja, em um viés mais “econômico”, conforme
entendimento de Daniel Amorim Assumpção e Rafael Carvalho Rezende.
31 Em contrapartida, o vocábulo “patrimônio público” possui sentido semântico mais
amplo e compreende não apenas os bens e interesses econômicos, mas também
aqueles com conteúdo não econômico tal como ocorre no presente caso de dano
ambiental. Assim, também há quem defenda a ocorrência de ato improbo quando houver
dano ao patrimônio público, em seu sentido amplo, como José dos Santos de Carvalho
Filho. Outrossim, é necessário entender que o referido artigo se trata de rol
exemplificativo, tendo em vista que várias condutas podem ser incutidas na descrição do
caput (Carvalho Filho, 2019).
32 Ademais, urge dizer que é entendimento majoritário que a discussão sobre a
responsabilidade civil do Estado apenas com o elemento subjetivo de culpa encontra-se
superada, até porque o próprio artigo 37, §4 da Carta Política não estipulou o dolo como
requisito essencial. Além disso, não é qualquer culpa que denotará em responsabilidade:
deverá ser culpa grave.
33 Em contramão, existe oscilação no STJ sobre a culpa citada no artigo: se é a
denominada “culpa consciente”, não sendo suficiente a “culpa inconsciente” para a
configuração de improbidade administrativa. Enquanto que a culpa inconsciente é aquela
que deriva puramente da negligência, imprudência e imperícia, a culpa consciente é
aquela em que o agente prevê o resultado, mas achou que ele não iria acontecer. No
entanto, também há pensamento de que, em alguns casos, a culpa é presumida (Di
Pietro, 2019). Assim, a situação em análise pode ser encarada como culpa presumida ao
utilizar funcionários sem capacidade técnica e equipamentos/materiais de baixa
qualidade, demonstra um descaso com a res publica.
34 Quanto ao questionamento de que se houver comprovada falha técnica no
licenciamento urbanístico-ambiental da obra, o engenheiro responsável responde por
improbidade administrativa decorrente de lesão ao erário, é necessário tecer alguns
comentários importantes como a natureza/classificação do parecer e a consequente
responsabilidade do parecerista.
35 O parecer é um ato enunciativo que possui natureza opinativa de alguma matéria
administrativa. Possui a seguinte classificação: a) facultativa, quando a Administração
não está obrigada a realizá-lo para a prática de determinado ato e b) obrigatória, quando
é indispensável a solicitação de parecer pois este integra o próprio processo de formação
do ato, de maneira que sua ausência ofende a princípio da legalidade. Este, por sua vez,
se subdivide em vinculante e não vinculante. No primeiro caso, a Administração só pode
praticar o ato se for em consonância com o disposto no parecer. Já no segundo, a
Administração poderá agir de maneira destoante do disposto no parecer, desde que
devidamente motivada.
36 Conforme entendimento de Carvalho Filho (2019), quando o parecerista apenas
opina (ou seja, sem qualquer poder decisório), sobre o aspecto formal ou substancial (em
tese), não deve ser atribuído, por pressuposição, uma responsabilidade solidária do
parecerista. Dessa maneira, uma vez que o conteúdo dos ajustes depende de outras
autoridades administrativas, a responsabilidade do parecerista apenas existirá se houver
conduta dolosa ou erro grosseiro injustificável.
37 Assim, a decisão tomada com base em parecer deficiente não afasta, por si só, a
responsabilidade do gestor supervisor por atos considerados irregulares, uma vez que se
tratar de parecer não vinculante, ainda que existisse erro grosseiro, o administrador
poderia atuar de forma diversa desde que devidamente motivada. Da mesma forma, o
Supremo Tribunal Federal, no MS 24631-DF também decidiu que “salvo demonstração
de culpa ou erro grosseiro, submetida às instâncias administrativo-disciplinares ou
jurisdicionais próprias, não cabe a responsabilização do advogado público pelo conteúdo
de seu parecer de natureza meramente opinativa”.
38 No entanto, caso o parecer possua teor decisório (mais precisamente: vinculante
e obrigatório), como ocorre no presente caso, uma vez que se trata de laudo técnico de
licenciamento urbanístico-ambiental, a responsabilidade do parecerista ganha outro viés,
tendo em vista que para o procedimento de licenciamento ambiental se faz necessário o
cumprimento de algumas etapas de acordo com a Resolução nº 237 e dentre elas, se
encontra a emissão de parecer técnico conclusivo e, quando couber, parecer jurídico.
39 De acordo com a Suprema Corte no julgamento do MS 246.31, em virtude da
autoridade decisória do parecer vinculante e a atribuição de papel subserviente do agente
vinculado à conclusão do parecerista, é possível o compartilhamento de responsabilidade
(responsabilidade solidária) do parecerista com a autoridade vinculada.
40 Diante de todo o exposto, é notória a possível responsabilização por improbidade
administrativa, uma vez que foi praticado ato improbo por agente público, seja servidor
ou não (no caso de se tratar de particular e concorrer ao dano ao erário, observando, que
para esta última hipótese não poderá ser responsabilizado sem a presença do agente
público no polo passivo processual, consoante entendimento do STJ) contra o Munícipio,
conforme apregoa o artigo 1º da Lei nº 8.429/1992.
41 Desta feita, levando em consideração tudo o que foi disposto nos parágrafos
anteriores enumerados por 29-33, é possível argumentar que houve violação do inciso
10, na modalidade culposa, uma vez que o engenheiro agiu negligentemente e com
imperícia no deferimento de licenciamento ambiental, tendo em vista o erro grosseiro que
acarretou no soterramento da nascente, impedindo à conservação do patrimônio público
e a própria proteção do meio ambiente. Assim, ocorreria o preenchimento de todos os
requisitos da LIA. Nesse caso, inclusive, poderia ser observado que existiria uma culpa
dita presumida, já defendida em tópico anterior.
42 No que diz respeito apuração de responsabilidade administrativa da empresa
pública responsável pela fiscalização da obra, até a LC 140/11, o STF dividia a
competência para licenciar e para fiscalizar, afirmando que se tratava de atuações
independentes. Com o advento da referida lei complementar esse panorama mudou:
atualmente, quem licencia (ente federativo que tem a competência para licenciar) deve,
prioritariamente, exercer também a competência de fiscalização sobre essa obra ou
atividade licenciada, de acordo com o art. 17.
43 Assim, percebe-se que é possível a abertura de processo administrativo para
apurar responsabilidade da empresa pública fiscalizadora. Inclusive, a jurisprudência do
STF e STJ admite denúncia anônima séria no âmbito da LIA. Na verdade, ainda que não
ocorra por via anônima, também é possível, nos termos do art. 14, que qualquer pessoa
represente à autoridade administrativa competente para que seja instaurada
investigação.
44 Nesse contexto, é preciso destacar que a Lei nº 6.938/81 especifica no caput e no
§1 do art. 14 os dois âmbitos de responsabilização: respectivamente, administrativo e
cível. A responsabilidade administrativa ambiental apresenta caráter subjetivo, exigindo
dolo ou culpa para sua configuração, além da demonstração do nexo causal entre
conduta e dano. Vale dizer que esse tipo de responsabilização alcança apenas os
transgressores que efetivamente praticaram quaisquer infrações, de acordo com
entendimento do STJ.
45 No que diz respeito a responsabilidade cível, o STJ declarou a responsabilidade
objetiva do Estado por danos ambientais, ainda que se trate de omissão na fiscalização
ambiental, quando a omissão de cumprimento adequado do seu dever de fiscalizar for
determinante para a concretização ou o agravamento do dano causado pelo causador
direito (Amado, 2019). Neste sentido, o precedente AgRg no Resp 1001780, de
27/9/2011. Nota-se que no caso de dano ambiental, a responsabilidade será sempre
objetiva, solidária e ilimitada, independente de se tratar de entidade pública ou privada.
Isso ocorre em virtude dos princípios regentes do direito ambiental tais como poluidor-
pagador, reparação integral, dentre outros.
46 Insta dizer que, ordinariamente, a responsabilidade do Estado por omissão possui
responsabilidade subjetiva, conforme entendimento jurisprudencial e doutrinário
majoritário. Ocorre que, na presença de um microssistema especial como acontece no
caso de proteção ao meio ambiente, além da previsão legal, é exigido um dever mais
rigoroso pelo Estado (Resp 1071741, de 24/03/2009).
47 Adentrando ao último questionamento deste parecer, é preciso ponderar que o
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado tal qual preceituado pelo caput do
artigo 225 da Constituição Federal é difuso, ou seja, não é possível determinar os seus
titulares, uma vez que a relação jurídica surgiria por meio de uma circunstância de fato,
não sendo cabível a divisibilidade do referido direito.
48 A jurisprudência do STJ é dominante no sentido de que pretensão reparatória
ambiental imaterial é perpétua, não se sujeitando a qualquer prazo prescricional, uma
vez que o direito ao meio ambiente estaria umbilicalmente relacionado ao direito à vida,
independentemente de existir previsão legal.
49 Nessa toada, em assunto de regime jurídico de prescrição, é preciso diferenciar
qual o bem jurídico resguardado: se privada, obedece-se os prazos dispostos em Lei
quanto à pretensão de ressarcimento; mas se o bem jurídico tutelado for indisponível,
sendo de suma necessidade para o exercício dos demais direitos fundamentais, deve-se
considerar a imprescritibilidade da pretensão reparatória.
50 Já quanto a Corte Suprema (STF), no Recurso Extraordinário 654.833, em julho
de 2018, houve o estabelecimento de julgamento com repercussão geral, de acordo com
o artigo 1035, §1 do Código Processual Civil, sobre essa questão de imprescritibilidade
de dano ambiental que, no entanto, ainda está pendente de julgamento.

51 Conclusão:

52 Fundado nessas razões, concluímos por:


a) Há possibilidade de responsabilidade objetiva pelos danos causados, inclusive
em relação à não usuários das vias, mesmo que os danos sejam provocados
por imperícia de empresa privada contratada para realização da obra, uma vez
que se trata de responsabilidade ambiental e há, ainda, prestação de serviço
público.
b) Quanto à possibilidade de o prefeito ser acionado judicialmente por
improbidade decorrente de ineficiência, há de se averiguar a ocorrência de má-
fé por parte deste, mesmo que para configuração do art. 11, baste o dolo
genérico. Quanto à lesão ao erário, é possível se for verificado culpa grave e
presumida por parte do gestor público ao contratar funcionários sem
capacitação técnica e com material de baixa qualidade.
c) Se comprovada falha técnica no licenciamento urbanístico-ambiental da obra,
o engenheiro poderá ser responsável por improbidade administrativa
decorrente de lesão ao erário, uma vez que se trata de parecer obrigatório e
vinculante bem como erro grosseiro por parte do profissional, além de observar
os demais requisitos previstos na LIA.
d) É possível a abertura de processo administrativo de responsabilização para
apuração de responsabilidade administrativa de empresa pública responsável
pela fiscalização da obra, que se dará sob a forma subjetiva.
e) Quanto à imprescritibilidade de danos ambientais, ainda está em análise por
parte da Suprema Corte. Já para o STJ, é caracterizada a imprescritibilidade
de tais danos, tendo em vista que o bem jurídico tutelado é indisponível.

Município Aqui-Nada-Funciona-Bem, 7 de setembro de 2019

Juliene Alves Moreira


Referências bibliográficas

AMADO, Frederico. Direito Ambiental. 7ª ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Juspodivm,
2019.

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proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à
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24631 DF, Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 09/08/2007, Data
de Publicação: DJe-018 DIVULG 31-01-2008 PUBLIC 01-02-2008 EMENT VOL-02305-
02 PP-00276 RTJ VOL-00204-01 PP-00250.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tribunal Pleno. Recurso Extraordinário. STF – RE
654.833 SP. Relator: Min. GILMAR MENDES.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Segunda Turma. Agravo Regimental em Agravo de
Instrumento 779629 MG Relator: Min. AYRES BRITTO, Data de Julgamento:
17/05/2011, Data de Publicação: DJe-163 DIVULG 24-08-2011 PUBLIC 25-08-2011
EMENT VOL-02573-05 PP-00734.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Segunda Turma. Recurso Especial. (REsp


650.728/SC). Relator: Min. HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 23/10/2007,
Data de Publicação: DJe 02/12/2009.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial. (REsp: 1745188 CE


2018/0132998-0). Relator: Ministra Regina Helena Costa, Data da Publicação: DJ:
28/09/2018.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo em Recurso Especial. (AREsp: 1211165


SE 2017/0303758-5). Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Data da Publicação:
DJ: 12/11/2018.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Segunda Turma. Recurso Especial. (REsp


896044/PA). Relator: Min. Herman Benjamin. Data de Julgamnto: 16/09/2010.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Segunda Turma. Agravo de Instrumento no


Agravo em Recurso Especial. Segunda Turma. (AgInt no AREsp: 838141 MT
2015/0277875-0). Relator: Ministro OG FERNANDES, Data do Julgamento: 27/11/2018,
Data de Publicação: DJE 03/12/2018.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. 1ª Seção. Embargos de Divergência em Recurso


Especial. (EREsp 1318051/RJ). Relator: Min. Mauro Campbell Marques, Data de
Julgamento: 08/05/2019.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Turma. (REsp: 1075882 MG


2008/0161145-3). Relator: Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, Data de Julgamento:
04/11/2010, Data de Publicação: DJe 12/11/2010.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. SEGUNDA TURMA. (REsp 1071741/ SP).


Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 24/03/2009.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Turma. (STJ - AgRg no REsp: 1001780
PR 2007/0247653-4). Relator: Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Data de
Julgamento: 27/09/2011. Data de Publicação: DJe 04/10/2011.

BORGES, Cyonil; SÁ, Adriel. Manual de Direito administrativo facilitado. 2. ed. rev.,
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