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Manual Elementar de Direito Romano

Verso: maro/2007

Introduo Histrica
Texto original em francs, de domnio pblico, do
Manuel Elementaire de Droit Romain de Ren Foignet,
editado em Paris em 1947, traduzido, adaptado e
atualizado por Hlcio Maciel Frana Madeira, para uso
escolar.
Foignet foi um clebre autor de manuais de
vulgarizao nos diversos ramos do direito, com
considervel sucesso entre os estudantes franceses do
meado do sculo XX, especialmente pela capacidade
didtica de sistematizao do conhecimento. Esta
verso, renovada e adaptada, destinada especialmente
aos estudantes brasileiros do sculo XXI, resguardados
os direitos de traduo e adaptao.
Os textos de adaptao so apresentados em cor azul.

Objeto. - O estudo da evoluo histrica do direito de um povo


compreende dois objetos diferentes: a histria das fontes do direito e a
histria das instituies. Consagraremos esta introduo histria das
fontes do direito romano.

HISTRIA DAS FONTES DO DIREITO ROMANO

Definio - Entendemos por fontes do direito os diversos modos de


formao do direito 1 . Quais so estes modos e quais as transformaes
ocorridas no curso da histria o objeto da histria das fontes do direito.
Esta histria intimamente ligada histria da organizao poltica, porque
as fontes do direito dependem naturalmente do sistema constitucional de
cada pas.
Assim, a diviso mais simples e mais racional da histria das fontes
aquela que segue a diviso que inspira a prpria histria de Roma: Realeza,
Repblica, Alto Imprio e Baixo Imprio.

1 Perodo. A Realeza. - Limites: desde a fundao de Roma (754


a.C.) at o estabelecimento da Repblica (509 a.C., 245 da fundao de
Roma).

2 Perodo. A Repblica. - Limites: desde a Repblica (509 a.C.) at o


Imprio (27 a.C., 727 de da Fundao de Roma)

3 Perodo. O Alto Imprio ou Principado. - Limites: desde o


principado de Augusto (27 a.C.), at a ascenso de Diocleciano como
imperador (284 d.C.)

1
O termo fonte tambm tem outro sentido: significa toda espcie de documento que d conhecimento do
direito.
4 Perodo. O Baixo Imprio ou Dominato. - Limites: de Diocleciano
(284 d.C.) at a morte do Imperador Justiniano (565 d.C.).

1 PERODO A REALEZA

Origens de Roma. - Uma grande obscuridade reina sobre as origens de


Roma. Admite-se em geral que a cidade romana foi constituda da reunio
de trs tribos tnicas distintas, os Ramnenses, os Titienses e os Luceres,
estabelecidos, sob a autoridade de um rei, sobre as colinas que ladeavam a
margem esquerda do rio Tibre.
A pretensa fundao de Roma seria assim a federao de vilas pr-
existentes, unidas sob a influncia e a fora dos etruscos.

Organizao social. - Os Patrcios. Cada uma das trs tribos era


dividida em dez crias; cada cria em gentes. A gens era um conjunto de
pessoas que descendiam em linha masculina de um ancestral comum: cada
gens compreendia certo nmero de famlias (domus). Cada famlia era
subordinada autoridade de um chefe, o pater familias. Os patres e seus
descendentes formavam a classe dos patrcios que compunham
exclusivamente, na origem, o populus Romanus.
Os clientes. Ao lado de cada famlia patrcia vivia certo nmero de
pessoas, os clientes, de diversas origens: escravos alforriados pelo pater,
estrangeiros refugiados em Roma e que permaneciam voluntariamente sob
a proteo e influncia de um patrcio etc.
Os plebeus. Enfim, pouco a pouco, uma outra classe de origem incerta
e controvertida forma-se na cidade romana, a plebe (plebs), livre de
qualquer subordinao aos patrcios, mas formando uma camada social
inferior na cidade. Sem ser clientes de algum particular, os plebeus esto
sob a proteo do rei.

Organizao poltica. Os poderes pblicos compreendem trs


elementos: o rei, o senado e os comcios.
1. O rei (rex), designado pelo seu predecessor ou por um senador
(interrex), um soberano vitalcio cujos poderes so limitados pelos do
Senado e do povo. um chefe militar, religioso e judicirio. Possui, em
relao a estas trs esferas, um poder absoluto, o imperium.
2. O Senado um corpo composto de cem, depois trezentos patrcios
nomeados pelo rei. O rei o consulta nos casos mais graves. O Senado
ratifica, ao conceder a sua auctoritas, a lei votada pelo povo por proposta
do rei.
3. O povo (populus Romanus) compe-se de patrcios com capacidade
de portar armas. Ele rene-se em assemblias, os comcios por crias
(comitia curiata), em uma parte do frum denominada comitium.
O povo vota as leis por proposta do rei. A unidade do voto a cria.
Suas decises so chamadas leges curiatae.
No incio, somente os patrcios tiveram vez no governo da cidade, bem
como somente eles pagavam impostos e subordinavam-se ao servio
militar.
A introduo da plebe na vida poltica atribuda ao rei Srvio Tlio
(578-535 a.C.), que instituiu uma nova diviso do povo, fundada no mais
sobre o nascimento, mas sobre a fortuna. Os plebeus passaram a ser
chamados no s para o servio militar e para o pagamento de impostos,
mas tambm para a confeco de leis, nas novas assemblias, reunidas no
Campo de Marte sob a denominao de comitia centuriata (comcios por
centrias), nas quais a unidade de voto era a centria 2 .
A reunio do povo romano, agora formado por patrcios e plebeus, em
comcios por centrias, no fez extinguir os comcios por crias, que passou
a desempenhar papel poltico secundrio.

Fontes do Direito. As fontes do Direito na Realeza so duas: 1 - o


costume; 2 - a lei.

1. O costume. A nica fonte do direito, nas origens de Roma, o


costume, mos maiorum, que podemos definir como um conjunto de regras
aceitas por todos como obrigatrias, sem qualquer proclamao ou
reconhecimento de um poder legislativo estabelecido. O costume retira sua
autoridade do consenso geral e tcito dos cidados. Transmite-se de
gerao a gerao por uso repetido. freqentemente conhecido como ius
non scriptum (direito no escrito).

2. A lei. Por oposio ao costume, a lei uma disposio obrigatria


que retira a sua autoridade do consenso formal dos cidados.
O rei prope a lei ao povo reunido em comcio por crias ou por
centrias: o povo aceita ou rejeita a proposta. Se a aceita, a lei se torna
obrigatria a todos, aps ratificao do Senado.
A publicidade com que a votao feita permite a cada um o
conhecimento fcil e preciso da lei. Esta uma das vantagens da lei sobre o
costume, como fonte do direito.

Caractersticas da lei na poca da realeza. As normas aprovadas pelo


povo em comcio no eram, como nas leis modernas, disposies de ordem
geral: eram leis particulares e circunstanciais. Tratavam, por exemplo, de
modificar a composio de uma gens, transferindo um pater de uma famlia
para outra (adrogatio); ou de modificar a atribuio da fortuna de um pater
a outras pessoas que no fossem os herdeiros regulares (testamentum). A
lei apresentava-se como uma espcie de contrato concludo entre os patres
da cidade, por proposta do rei e que todos deveriam observar.
Mas no houve leis de aplicao geral. 3

2
A reunio do povo romano por centrias funcionou ao lado dos comcios por crias, sem extingui-los. O
povo romano, nele compreendidos os plebeus, foi dividido em cinco classes segundo a fortuna, mais a
classe dos cavaleiros. As classes se subdividiam em centrias, no total de 193 (segundo Dionsio de
Halicarnasso). Aos cavaleiros foram atribudas 18 centrias, 1 classe 80 centrias, s 2, 3 e 4 classes
20 centrias, 5 classe 30 e, finalmente, a classe dos artesos e msicos comportava 8 centrias. O voto
nas centrias era uma espcie de revista militar; procedia-se como na guerra. Os cavaleiros (os que
combatiam a cavalo) votavam primeiro, como na guerra eram os primeiros a combater. Depois vinha a
primeira classe, e assim por diante. Quando a maioria era obtida em favor de uma proposta, encerrava-se
a votao. Ou seja, a maioria era obtida com o voto de 97 centrias. Por conseqncia, se os cavaleiros e
a primeira classe votassem em um mesmo sentido, no se consultavam as demais classes. Os comcios
por centria valorizavam, portanto, a fortuna e no o nascimento.
3
As leges regiae. uma questo controvertida se existiram leis gerais na realeza. Pompnio informa que
as leis rgias foram votadas em comcios curiatos e que, sob Tarqunio o Soberbo, um certo Papirius as
2 PERODO A REPBLICA

Limites. As origens da Repblica tambm so de um perodo lendrio da


histria de romana. Admite-se que em 509 a.C. (245 de Roma), depois da
expulso do rei Tarqunio, sucedeu uma Repblica que durar at 27 a.C.

Organizao social. A organizao da cidade romana no foi


modificada pela queda da realeza. Mas Roma no tardou a sofrer, sob a
influncia de diversos fatores (extenso da dominao romana,
desenvolvimento do comrcio e das relaes externas), uma transformao
lenta e contnua que acabou por completamente fundir, no final no III
sculo a.C., as duas ordens outrora distintas, de patrcios e plebeus.
Pode-se at dizer que a histria interna de Roma acompanha as fases
progressos realizados pela plebe.

Os tribunos da plebe. A plebe foi fortemente ajudada, na sua conquista


pela igualdade civil e poltica, pela instituio do tribunato. Os tribunos
(tribuni plebis) que foram institudos em 494 a.C., em resposta a uma
secesso da plebe que se retirou para o monte Aventino, foram magistrados
essencialmente plebeus, em nmero de dois, na origem. Posteriormente
foram elevados a cinco, e depois 10.

O papel dos tribunos da plebe. Eles so inviolveis (sacrosancti) e


possuem um direito de veto contra uma deciso que ir ser tomada. Podem
at impedir, pela intercessio, que uma deciso tomada seja executada. Eles
podem oferecer oposio, em Roma ou nos arredores, s decises de todos
os demais magistrados da cidade, sejam dos cnsules ou do prprio
Senado.
Os tribunos no se limitavam a estes poderes negativos. Foi sob a
iniciativa do tribuno Tarentilius Arsa que foi decidido, em 453 a.C., a
redao da lei das XII Tbuas. Esta lei estava longe de consagrar a
igualdade entre patrcios e plebeus (plebeus continuavam impedidos de
casar-se com patrcios e de serem eleitos para as principais magistraturas
pblicas), mas a redao de uma lei conhecida por todos, aplicada a todos,
era j um verdadeiro progresso. O direito deixou de ser segredo e
patrimnio apenas de patrcios.
Os tribunos obtiveram a votao de leis importantes que conduziram
realizao da igualdade civil entre patrcios e plebeus, como a lei Canulia
(lex Canuleia) de 445 a.C., que permitiu o casamento legtimo entre
patrcios e plebeus.

Organizao poltica. Os Cnsules. O rei substitudo por dois


magistrados patrcios, os cnsules (consules), eleitos por um ano, ambos

publicou em um livro chamado ius papirianum. A existncia desta compilao no duvidosa, mas ela
no nos chegou. Suas disposies referiam-se principalmente ao direito sagrado; outras ao direito privado.
Mas o ponto controvertido saber se realmente so do perodo rgio. Segundo um critrio moderno, esta
compilao seria uma publicao apcrifa do final da Repblica. O direito sagrado, que objeto das
maior parte das pretendidas leis reais, era reservado aos pontfices, pois no se admitia que o povo fosse
consultado em questes desta natureza. As leges regiae so, para alguns, disposies de direito
costumeiro, relativas aos sacra, que foram redigidas pelos pontfices a uma poca posterior ao perodo
rgio e atribudas aos reis para dot-las de mais autoridade.
com iguais poderes. Eles herdaram os direitos que antes pertenciam ao rei.
Todavia, os poderes religiosos do rei foram atribudos ao rex sacrorum cuja
sede permaneceu no antigo palcio real.

O Senado. O Senado, composto por 300 patres nomeados pelos


cnsules, depois pelos censores, permanece como corpo consultivo, embora
sua importncia tenha aumentado: os cnsules, magistrados anuais,
responsveis pessoalmente pelos cargos que ocupam, costumam ter o
cuidado de obter a opinio favorvel do Senado sobre todas as questes
importantes. O Senado deve, alm disso, sempre ratificar as leis votadas,
para que ela tenha eficcia. Mas este costume de confirm-las torna-se,
com o tempo, mera formalidade e a auctoritas senatorial, depois da lei
Publilia (de 379 a.C.) passou a ser oferecida antes mesmo da votao da
lei.

O Povo. O povo, reunio de patrcios e plebeus, rene-se em


comcios: comcios por crias, por centrias e, como novidade, em comcios
por tribos. A plebe rene-se nas assemblias reservadas aos plebeus, os
concilia plebis.
Os comcios por centrias so os mais importantes e os comcios por
crias, enfraquecidos, reduzem-se deliberao sobre certas matrias
religiosas, at serem extintos no II sculo a.C., quando trinta lictores
passaram a represent-la nos atos meramente formais do direito sacro que
ainda remanesciam.

Comcios por tribos. - Os magistrados passaram a convocar o povo por


bairros, ou tribos: so os comitia tributa. Com o recrutamento do povo por
um critrio territorial as decises dos comcios passaram a ser mais
democrticas.

Concilia plebis. Finalmente, os tribunos tomaram o costume de


convocar a plebe para reunies, os concilia plebis, aos quais os patrcios no
compareciam e nos quais eram tomadas as resolues com o nome de
plebiscitos (plebiscita), originalmente apenas obrigatrios para a plebe.
Um lex Hortensia (287 a.C.) torna as decises dos plebiscita obrigatrias
tambm aos patrcios.

Em todos esses comcios, o povo exerce os poderes legislativo, judicirio


e eleitoral.

O poder legislativo. As leis so votadas pelo povo, por proposio


(rogatio) de um magistrado, como outrora eram por rogatio do rei.
A lei leva o nome gentlico, colocado no feminino, do magistrado que a
props. Exemplo: lex Hortensia.
Se a lei foi proposta pelos cnsules, leva o nome duplo, composto dos
nomes de ambos os cnsules, ainda que tenha sido proposta por um s,
caso em que o nome do autor do projeto colocado em primeiro. Exemplo:
lex Valeria Horatia.

O poder judicirio. Os delitos contra o povo Romano e certos delitos


graves contra os particulares deram lugar provocatio ad populum. Esta
assemblia judiciria era reunida por crias, quando o crime era punido
com a pena capital, ou por tribos, no caso de delitos menos graves. A
provocatio ad populum, que parece ter sido usada na realeza por iniciativa
do rei, tornou-se obrigatria na Repblica com a lex Valeria de provocatione
de 300 a.C.

O poder eleitoral. A eleio dos magistrados. O povo elege seus


magistrados. Ao lado dos cnsules (criados em 509 a.C.), surgem outros
magistrados. O crescimento da populao e a intensidade da vida social
necessitam, a partir do incio da Repblica, da criao de novos
magistrados, com funes especializadas, com diminuio da sobrecarga
dos cnsules. So eles:

1. Os questores (quaestores), criados em 449 a.C., foram encarregados


da guarda do tesouro e da administrao financeira.

2. Os censores (censores), criados entre em 443 a.C, ocupavam-se do


censo (recenseamento), do recrutamento do Senado e da vigilncia dos
costumes.

3. Os edis curuis (aediles curules), criados pelas leis Licinianas em 367


a.C., receberam as atribuies de polcia da cidade, de vigilncia dos
mercados e das provises alimentares etc.

4. Os pretores (praetores), criados no mesmo ano, foram encarregados


da justia. A partir de 242 a.C. so dois pretores: o pretor urbano, para os
processos em que as duas partes forem romanas, e o pretor peregrino, para
os processos entre romanos e peregrinos ou somente entre peregrinos.

O ditador (dictator). Para remediar o perigo que poderia representar, em


tempo de crise, a diviso de poderes entre magistrados, foi possvel eleger,
a partir de 501 a.C. um ditador (dictator), que por seis meses recebia o
encargo de resolver, sozinho (portanto mais facilmente), uma crise
intestina, uma sedio ou uma guerra. Ele reunia excepcionalmente em
suas mos os poderes de todos os magistrados ordinrios.

5. Dentre outros magistrados, para a Itlia surgem os praefecti iure


dicundo, que so delegados dos pretores encarregados de dizer o direito.

6. Nas provncias os governadores (propretores ou procnsules) so


magistrados judiciais como o pretor, ao mesmo tempo em que so
magistrados polticos como o cnsul. Ao lado deles, os questores tm as
mesmas funes que os edis curuis em Roma.

Acesso da plebe s magistraturas. O surgimento da Repblica no


modificou imediatamente a situao poltica da plebe. Ela no abriu o
acesso da plebe s magistraturas, nem ao Senado. Mas pouco a pouco,
tanto na esfera poltica como na do direito privado, a plebe obtm o seu
reconhecimento. 4

4
O ltimo degrau foi atingido, em 254 a.C., no dia em que um plebeu, Tibrio Coruncnio, foi elevado
dignidade de grande pontfice.
Graas a sua mobilizao poltica organizada, a plebe acaba por obter o
direito de eleger plebeus nas diversas magistraturas, antes reservadas ao
patriciado. Edis plebeus e tribunos da plebe so eleitos desde 494 a.C. A
partir de 367 a.C. elegem seus primeiros cnsules; em 364 a.C., os edis
curuis; em 356 atingem a ditadura e, em 351 a censura. Os primeiros
pretores plebeus, em definitiva conquista poltica, sero eleitos a partir de
337 a.C.
Em 254 a.C. Tibrio Coruncnio, em evoluo semelhante ocorrida no
direito sacro, foi elevado dignidade de Pontfice Mximo.

Cursus honorum. Com esta expresso os romanos designavam o


percurso das honras, uma espcie de escala de sucesso eleitoral a que os
candidatos se submetiam para atingirem a suma magistratura, o consulado.
A lex Cornelia de magistratibus, do I sculo a.C., fixou, alm disso,
idades mnimas: 30 para questor, 32 para edil, trinta e oito para pretor,
quarenta para cnsul e quarenta e cinco para censor.

Fontes do Direito So elas:

1. O costume;
2. A lei;
3. O plebiscito;
4. A interpretatio prudentium;
5. O edito dos magistrados.

1. O costume. Ele conserva ainda um papel importante na formao


do direito.

2. A lei. A Lei das XII Tbuas Sua redao Durante os trs


primeiros sculos de Roma, o direito privado s teve o costume como fonte;
sua incerteza favorecia a arbitrariedade dos magistrados patrcios, os nicos
encarregados de administrar a justia. A plebe exigia a redao de uma lei
conhecida por todos, aplicvel a todos os cidados.
Em 462 a.C. o tribuno Tarentlio Arsa props que fosse nomeada uma
comisso encarregada de redigir uma grande lei. Os patrcios e o Senado,
composto exclusivamente de patrcios, no desejo de conservarem seus
privilgios, resistiram por oito anos. Os plebeus, em resposta, mantiveram
os mesmos tribunos no poder. Em 454 a.C. os patrcios cederam e se
prontificaram a redigir uma lei que se aplicasse a patrcios e plebeus. Uma
delegao de trs patrcios foi enviada para a Magna Grcia (Itlia
meridional), com a misso de reportar cpia das leis gregas em vigor, como
inspirao. Ao retornarem, em 452 a.C., as magistraturas ordinrias foram
suspensas e o poder foi confiado a uma comisso de dez membros, os
decemviri legibus scribendis, eleitos em 453 a.C. por comcios centuriatos e
encarregados de redigir as leis. Dez tbuas de leis foram redigidas, votadas
pelos comcios centuriatos e gravadas em dez tbuas de bronze que ficaram
expostas no comitium, a parte do frum na qual se desenrolava a justia.
No ano seguinte, em 450 a.C., outros decnviros, nomeados para redigir
novas leis, propuseram duas novas tbuas. A tradio relata que estes
decnviros desejaram permanecer ilegalmente no poder e foram
derrubados. Suas tbuas foram aprovadas pelos comcios centuriatos e
expostas no frum com as demais. As XII Tbuas, destrudas pelo incndio
de Roma infligido pelos gauleses em 390 a.C., foram depois reconstitudas.
Mas no chegaram at ns. possvel parcialmente reconstitu-las por meio
de seus fragmentos, graas s citaes e aos numerosos comentrios de
juristas, como Gaio, e de literatos, como Ccero e Aulo Glio.

Seu contedo A Lei das XII Tbuas considerada pelos romanos como
a prpria fonte do direito pblico e privado, fons omnis publici privatique
iuris. Ela regulamentou matrias de direito pblico, direito privado e direito
sacro. Os decnviros procuraram no modificar o direito existente, mas
apenas codificar os costumes no escritos anteriores. Este fato que
explica o sucesso das XII Tbuas, talvez mais do que a prpria certeza que
produziu. um grande erro supor que as XII Tbuas fossem uma cpia de
leis gregas. A prpria viagem de uma delegao Itlia meridional para
conhecer as leis gregas provavelmente lendria. A influncia grega no se
manifesta, salvo em alguns preceitos de direito sacro. O esprito da Lei das
XII Tbuas, ao contrrio, fundamentalmente romano. Revelam uma
legislao rude, primitiva, pouco diferente das demais civilizaes pr-
Romanas.
Afora algumas disposies relativas ao direito pblico (por exemplo, o
direito de o povo julgar os delitos pblicos) e ao direito sacro (como as
normas referentes aos funerais), a Lei das XII Tbuas ocupou-se, sobretudo
do processo civil, assunto no qual revelou seu carter violento e
excessivamente formalista. Poucas eram as normas concernentes famlia.
Quanto ao patrimnio, algumas regras visavam transmisso causa mortis
e, mais minuciosamente, transferncia de bens entre vivos, por
procedimentos formais como o da mancipatio.

Outras leis. Leges rogatae. A partir da lei das XII Tbuas, at o


final da Repblica, as novas leis so numerosas. A lei votada pelo povo
por proposta (rogatio) de um magistrado. Da o nome leges rogatae (leis
rogadas) em oposio s leges datae (leis dadas).
Uma lei compreende trs partes: a praescriptio (data e nome do
magistrado que a props), a rogatio (ou dispositivo) e a sanctio (sano,
isto , o enunciado das medidas que sero tomadas contra os
transgressores).

Leges datae. No final da Repblica, algumas leis so designadas como


leges datae (leis concedidas). So medidas unilaterais tomadas em nome do
povo, sem votao, por um magistrado, que impunham verdadeiros
regulamentos para certos municpios, colnias ou provncias.

3. O plebiscito. Definio Os plebiscitos eram as decises tomadas


pela plebe nos concilia plebis, por proposta de um tribuno,.

Fora obrigatria. Os plebiscitos aplicavam-se, no incio, plebe; mas


a partir da lex Hortensia (286 a.C.), adquiriram a mesma eficcia que a lei.
Os prprios textos passaram a design-los com o termo lex (pl. leges).

4. A iurisprudentia ou interpretatio prudentium. Definio.


Depois que os costumes nacionais foram codificados e conhecidos de todos,
foi preciso de um lado preencher as lacunas da lei das XII Tbuas e, de
outro lado, adaptar a lei s necessidades em permanente modificao pela
prtica. Este trabalho de acomodao a interpretatio, obra de
jurisconsultos, iurisprudentes ou, simplesmente, prudentes.

O termo jurisprudncia (iurisprudentia) designava, em Roma, a cincia


do direito. Modernamente o termo jurisprudncia tem um significado muito
diferente: designa um conjunto de decises continuadas dos tribunais
superiores. O conceito romano corresponde, ento, mais ao moderno
conceito de doutrina.

Histria da interpretatio prudentium. Podemos dividir a histria da


jurisprudncia romana em trs fases.

1. A cincia dos pontfices. Fase esotrica. At o sculo IV a.C. a


cincia do direito monoplio do colgio dos pontfices, que a guardam em
segredo, isto , esotrica. Sem dvida, o direito terico era conhecido de
todos desde a publicao das XII Tbuas. Mas o que continuava
desconhecido do vulgo era a prtica do direito. Para praticar os atos
jurdicos ou demandar em juzo era preciso conhecer o calendrio e saber
quais os dias fastos, dies fasti (dias permitidos pelos deuses). As aes
exigiam o pronunciamento de frmulas, conhecidas somente pelos
pontfices. Cabia a eles a interpretao das leis, bem como a conduo dos
ritos da prtica jurdica negocial e processual. Neste mister, os pontfices
mantiveram-se conservadores, sem acompanhar as necessidades da nova
economia, que se tornava cada vez mais baseada no mercado internacional
e na expanso territorial.

2 - A divulgao da cincia dos pontfices. Fase de vulgarizao. Um


certo Cneus Flavius, escriba do patrcio Appius Claudius Caecus, em
aproximadamente 300 a.C., divulgou, em uma coleo chamada ius
Flavianum, as frmulas das aes da lei, at ento guardadas em segredo
pelos pontfices, assim como o calendrio que estabelecia os dias fasti para
pleitear em juzo. Os plebeus puderam assim se dedicar, como os patrcios,
ao estudo do direito, bem como dar consultas em pblico. Tibrio
Coruncnio foi o primeiro a dar consultas pblicas, cinqenta anos aps a
publicao do ius Flavianum.

A funo dos jurisconsultos. Segundo Ccero, o jurisconsulto deve ser


ad respondendum et ad agendum et ad cavendum peritus; isto , ele deve
estar apto a:

1 Respondere: dar consultas orais ou escritas; as consultas dos juristas


se chamam responsa prudentium.

2 Agere: assistir o cliente nos processos.

3 Cavere: assistir o cliente na redao dos atos jurdicos.

3 - Fase de sistematizao da cincia do direito. Com Quintus Mucius


Scaevola, cnsul em 95 a.C., comea o perodo de sistematizao do
direito. Este jurista, o mais clebre da poca, deixou um ius civile, em 18
volumes, a primeira exposio metdica do direito civil, o qual foi
freqentemente comentado pelos juristas imperiais.

Outros juristas famosos do final da Repblica foram Sextus Aelius Peto


Catus (o mais antigo, cnsul em 198 a.C., autor de um ius Aelianum e de
uma coleo em trs partes, tripertita, sobre as XII Tbuas, a interpretatio
prudentium e as legis actiones), M. Manilius (cnsul em 149 a.C.), P. Mucius
Scaevola (cnsul em 133 a.C.) e M. Iunius Brutus, os quais so
apresentados como os trs fundadores do direito civil, autores de obras
puramente prticas, sem finalidade de sistematizao. Depois, Quintus
Mucius Scaevola, cnsul em 95 a.C., com o qual se inicia o perodo de
sistematizao do direito. Seu discpulo Aquilius Gallus (pretor em 66 a.C.)
e Servius Sulpicius Rufus, cnsul em 51 a.C. e autor do primeiro livro de
comentrios ao Edito, foram contemporneos e amigos de Ccero. Estes
juristas foram chamados, pelos de poca posterior, de veteres, i.e., os
antigos.

A interpretatio prudentium era realmente fonte do direito na


Repblica? A interpretatio prudentium no tinha ainda, na Repblica,
fora obrigatria; no vinculava o julgador. Mas as decises dos
jurisconsultos adquiriram uma autoridade privada, moral, em razo
especialmente do eminente prestgio de que gozavam no Estado romano. O
conjunto de solues, que os prudentes ofereciam, constitua um direito
costumeiro novo, que servia de inspirao aos prprios magistrados, na
redao dos seus editos, bem como aos jurados, nas solues dos
processos que eram a eles remetidos.

5. Os editos dos magistrados. Definio Os altos magistrados


romanos, cnsules, censores, pretores, governadores de provncia, tinham o
costume de publicar, no momento de sua eleio, as declaraes (edicta),
nas quais apresentavam os seus projetos. Eram geralmente escritos em
letras negras sobre tbuas pintadas de branco (alba). Os ttulos eram
escritos em letras vermelhas (rubrae), da a palavra rubrica.
Dentre os edicta, os nicos que interessam s fontes do direito so os
dos magistrados judicirios, investidos da funo de dizer o direito
(iurisdictio). Eram, em Roma, os editos dos pretores e dos edis curuis; nas
provncias, os dos governadores e questores. O edito que teve o papel mais
importante na formao do direito o do pretor urbano, edictum urbanum.

Influncia do edito do pretor na formao do direito. Para explicar


a influncia do pretor na formao do direito romano, preciso indicar
brevemente quais foram as formas sucessivas de procedimento na
Repblica.

1 At o II sc. a.C.: o sistema das legis actiones. A instncia dividia-


se em duas fases sucessivas: a fase in iure e a fase apud iudicem. A funo
judiciria era dividida entre duas pessoas: o magistrado (pretor, edil curul
etc.) e o juiz (iudex), um simples particular escolhido para uma
determinada causa.

Papel passivo do magistrado. O magistrado dirige e organiza a


instncia, mas no julga a causa. Ele participa apenas da primeira fase da
instncia. Perante ele as partes apresentam, de forma solene, as suas
pretenses contraditrias. O magistrado assegura-se de que foram
rigorosamente observadas as formalidades previstas na lei e que no
podem ser modificadas por ele. Nestas condies compreensvel que o
pretor no podia exercer, naquele perodo, qualquer influncia na soluo
do processo, nem sobre a formao do direito.

2 A partir do II sc. a.C.: o procedimento formulrio. Na metade do II


sc. a.C. (ca. 149 a.C.) a lex Aebutia introduziu um novo sistema de
procedimento, o procedimento por frmula escrita, que permitiu ao
magistrado de assumir um papel considervel na formao do direito.

Papel ativo do magistrado. As partes expem ao magistrado, sem


qualquer formalismo, suas pretenses contraditrias. Se entender correto, o
pretor concede a eles uma frmula escrita (formula), no qual se estabelece
uma ordem ao juiz de condenar ou absolver, depois de analisar se os fatos
do fundamento s alegaes do autor. A frmula um programa rgido
que o juiz (iudex) deve seguir ao p da letra.

Importncia do papel do pretor. O pretor poderia recusar-se a entregar


uma frmula, mesmo quando as pretenses do autor estavam em
conformidade ao direito civil. Ele tambm poderia conceder uma frmula
mesmo no caso de o direito civil no reconhecer ao autor qualquer direito.
Enfim, ao confeccionar a frmula, ele poderia at paralisar o efeito de um
direito civil, outorgando uma exceo.
Por isso freqente dizer que os pretores confirmam, complementam e
corrigem o direito civil.

O imperium do pretor. Como o pretor, encarregado de aplicar a lei,


pode ter o poder de alter-la e de fazer nascer um direito novo? O pretor
possua, como todos os magistrados judicirios, a iurisdictio, o poder de
dizer o direito, mas tinha tambm, como todos os magistrados superiores e
outrora os reis, o imperium, o poder de tomar, nos limites de sua
competncia, as medidas que lhe pareciam teis. em virtude de seu
imperium que, desde a introduo do procedimento formulrio, o pretor
podia suprir as lacunas do direito civil, graas a quatro procedimentos: a
imisso na posse, as estipulaes pretorianas, os interditos e as in integro
restitutiones, que sero estudados na parte que trata das aes.

O Edito do Pretor. O Pretor indicava previamente no seu edito,


afixado no frum, os casos nos quais ele usaria de seu imperium. As
diversas frmulas que ele dava s partes litigantes para a proteo de seus
direitos.

Diversos tipos de edito: edictum perpetuum, edictum repentinum. O


edito era obrigatrio enquanto duravam os poderes de seu autor, isto , um
ano. Por isso, era chamado de edictuum perpetuum (perpetuum significa,
aqui, permanente). Ao edito perptuo se opunha o edictum repentinum que
o pretor expedia no decorrer de suas funes, quando se encontrava diante
de um caso especial no previsto pela lei. Esta faculdade, porque gerou
abuso de certos pretores, que acabaram por violar o prprio edito, foi
tolhida pela lex Cornelia, de 67 a.C.
A pars translaticia do edito. O edito era anual e sua autoridade
expirava com os poderes de seu autor. O novo pretor publicava um edito e
no estava mais, em princpio, obrigado a manter aquele de seu
predecessor. Mas, de fato, o edito adquiriu uma firmeza comparvel a da
lei. Ccero o denomina lex annua (lei anual). As clusulas do edito que
pareciam justas e teis eram mantidas pelos pretores sucessivos e
formavam a pars translaticia do edito, qual se opunha a pars nova.
Ao lado dos editos, que eram disposies gerais e permanentes e que
obrigavam os magistrados at o final de seus mandatos, existiam tambm
medidas individuais e circunstanciais, os decretos. Da distino entre editos
e decretos que se extrai uma importante distino entre aes editais e
aes decretais, a ser estudada na parte das aes.

O direito honorrio. - O conjunto de regras contidas nos editos


formava o direito pretoriano, ius praetorium; ou, de genericamente, o
direito honorrio (ius honorarium), porque emanado de magistrados
investidos de funes pblicas, honores (pretores, edis curuis, governadores
etc.). O direito honorrio ope-se ao direito civil, conservador, rigoroso e
formalista.
Ele mais leve e mais progressista. Sua funo tradicional de
confirmar, suplementar e corrigir o direito civil (adiuvandi vel supplendi vel
corrigendi iuris civilis gratia).

Comparao entre o edito e a lei. H as seguintes diferenas entre o


edito e a lei:

1. Quanto sua aplicao no tempo: a eficcia do edito cessa com os


poderes do magistrado que foi o autor dela; o edito anual, enquanto a lei
perptua.

2. Quanto sua aplicao no espao: o edito aplica-se somente na


regio territorial do magistrado que o estabeleceu. A lei estende-se a todo
territrio submisso dominao de Roma.

3. Quanto sua eficcia terica: diferena da lei, o edito no pode


diretamente ab-rogar nem criar uma regra de direito.
preciso notar que esta inferioridade do edito em comparao lei
mais aparente do que real. Isto por pelo menos trs razes: a) como vimos,
a pars translaticia do edito deu a ele uma estabilidade temporal igual da
lei; b) as clusulas do edito do pretor urbano que eram consideradas teis
pelos outros magistrados eram freqentemente reproduzidas nos seus
editos; c) quanto eficcia do edito, se no teoricamente igual da lei,
na prtica tem praticamente a mesma fora.

Direito das Gentes ou ius gentium. O velho ius civile, conservador


e restrito, sofreu a concorrncia no somente do direito honorrio. Ele foi
igualmente rivalizado por um outro direito progressista, o ius gentium.
A oposio entre ius civile e ius gentium de essncia internacional. O
ius civile o direito nacional, autctone da comunidade romana. O ius
gentium , ao contrrio, um direito que comum aos romanos e aos
demais povos da civilizao mediterrnea. , por exemplo, o direito que o
pretor peregrino aplica entre dois estrangeiros de lei nacional diferente ou
entre um Romano e um peregrino.
Naturalmente, na proporo em que Roma conquista o Mediterrneo e
desenvolve suas relaes comerciais e intelectuais, o ius gentium aplicado
com mais freqncia em Roma. No final do perodo republicano, ele torna-
se o que poderamos denominar uma espcie de direito comum do Estado
romano.
Mas sua influncia no pra a. Os Romanos, verificando que as
disposies dele eram muitas vezes mais perfeitas de que as suas,
adotaram-nas at mesmo para as relaes entre eles. assim, por
exemplo, que a tradio substitui progressivamente o antigo modo de
transferncia da propriedade, que a formal mancipatio, que a sponsio
romana foi trocada pela fidepromissio etc.

Direito Natural. Finalmente, neste mesmo perodo final de Repblica,


os filsofos e certos juristas comeam a falar de um direito natural, um
direito superior, ideal, vindo dos deuses ou da natureza. Ccero refere-se a
ele como a vera lex naturae congruens... constans, sempiterna.
Com certa variao, mas com semelhanas, os jurisconsultos clssicos
definiro o ius naturale desde como uma espcie de ius gentium estendido a
toda humanidade at como um direito comum ao seres vivos em geral.
Mas, apesar das divergncias conceituais, o direito natural ter uma grande
influncia sobre o direito positivo, sobretudo quando a doutrina estica
tornar-se uma prestigiada corrente de pensamento no perodo do Alto
Imprio.

3 PERODO O ALTO IMPRIO

Limites. Este perodo comea com o principado de Augusto (27 a.C.)


e termina com a morte de Diocleciano (284 d.C.). O perodo do Alto
Imprio, ou Principado, caracterizado pelo fato de o imperador (princeps)
dividir, teoricamente, o poder com o Senado. uma diarquia, um governo
por dois.

Organizao poltica. As magistraturas: o imperador; seus


agentes; os antigos magistrados. O imperador, princeps, primeiro
magistrado, rene todas as atribuies que, na Repblica, eram divididas
entre os diversos magistrados. Sua autoridade repousa: a) no imperium
proconsular que ele recebe do exrcito e do Senado, em virtude dos quais
ele tem o comando do exrcito, o direito fazer a nomeao de todos os
empregos civis e militares, o direito de fazer a guerra ou a paz etc.; b) no
poder tribuncio que ele recebe do povo, no dia sua ascenso, por uma lex
de imprio em virtude da qual ele inviolvel.
Ele tem a administrao das provncias imperiais e o gozo de seu
tesouro privado, o fiscus. O que era uma provncia imperial? Em
conseqncia das guerras, as provncias romanas tornaram-se numerosas.
Distinguiam-se: a) as provncias imperiais, submetidas administrao do
imperador e cujas receitas somavam-se ao tesouro do imperador; b) as
provncias senatoriais ou provncias do povo, administradas pelos
procnsules ou pelos propretores, designados, ao menos em teoria, pelo
Senado e cujas receitas eram revertidas ao tesouro pblico, o aerarium.
Em geral, as provncias imperiais eram as das novas fronteiras ou
aquelas para as quais era necessria a presena de foras armadas.

Os antigos magistrados republicanos. Os magistrados da Repblica no


desapareceram. Cnsules, pretores, edis etc. continuam a ser eleitos pelos
comcios at 14 d.C.; depois pelo Senado, que herda, nesta data, os
poderes eleitorais dos comcios, isto , na verdade, pelo imperador, que
exerce sobre as eleies um influncia cada vez maior. Mas a autoridade
dos antigos magistrados romanos completamente ofuscada pela
autoridade do imperador e de seus delegados. O papel deles ser apenas
honorfico.

Os comcios. Os comcios perdem seus poderes eleitoral, judicirio e


legislativo. O poder judicirio em verdade j havia perdido toda importncia
no final da Repblica, com o aumento progressivo das quaestiones
perpetuae, isto , com os tribunais especiais compostos de certo nmero de
cidados (semelhantes aos jris modernos), presididos por um pretor, para
julgar delitos pblicos especficos. No imprio estes tribunais caem em
desuso com o desenvolvimento de uma jurisdio denominada extra
ordinem.

O Senado. O Senado herdou o poder eleitoral dos comcios e parte de


seu poder legislativo. Ele compartilha, com o imperador, do poder judicirio
e administra as provncias senatoriais cujas receitas revertem ao errio
pblico.
Por outro lado, o Senado perde a sua funo de corpo consultivo. Perde
tambm a sua independncia e se submete ao imperador, no obstante
alguns sobressaltos de independncia. O equilbrio fundado ficticiamente por
Augusto rapidamente quebrado em favor do imperador.

As fontes do direito. So elas:

1. O costume;
2. A lei;
3. Os sentus-consultos;
4. O edito dos magistrados;
5. As constituies imperiais;
6. Os responsa prudentium.

1. O costume. O costume continua sendo importante na formao


do direito, sob o Imprio.

2. A lei. At o final do I sculo d.C. ainda encontramos leges


rogatae, votadas, como outrora, nos comcios. Citem-se, como exemplo,
sob Augusto, as famosas leges Iuliae. Depois disso encontramos apenas
algumas leges datae. As leges datae, surgidas no final da Repblica, so
medidas tomadas em nome do povo, antes por um magistrado e agora pelo
imperador, em favor de certas pessoas, de certas cidades ou provncias.
3. Os sentus-consultos. Os senatusconsulta so medidas
legislativas emanadas do Senado.
Origem. Na Repblica, o Senado no tinha poder legislativo
propriamente dito. Ele se limitava a emitir um voto de aprovao de uma
medida legislativa tomada por um pretor.
O senatusconsultum era geralmente emitido por proposta (oratio) de um
cnsul, de quem recebia o nome: por exemplo, Senatusconsultum
Trebellianum.

No principado, o Senado continua por certo tempo esta prtica de


injuno aos magistrados. Mas com o desaparecimento de fato dos
comcios, o Senado herda o poder legislativo. Logo todo sentus-consulto
passou a ser deliberado por proposta do imperador (oratio principis). O
Senado, com o tempo, por submisso, passa a votar as propostas do
imperador sem mesmo as discutir. Algumas vezes a prpria oratio principis
tomada como senatusconsultum. Como exemplos: a oratio Severi (de 195
d.C.) interditou o tutor de alienar os prdios rsticos ou suburbanos de seu
pupilo; a oratio Severi et Antonini (de 206) relativa doao entre esposos.

4. O edito dos magistrados. Diminuio de sua importncia. O


papel do pretor, to importante na Repblica, diminui no principado. A
partir da metade do sculo I d.C., os pretores contentaram-se, em geral, a
reproduzir os editos dos pretores anteriores.

O Edictum perpetuum de Slvio Juliano. Em uma data


indeterminada, entre 125 e 138, o jurisconsulto Salvius Iulianus, Juliano, foi
encarregado pelo imperador Adriano de codificar os edicta perpetua
publicados pelos pretores. Este cdigo denominou-se Edictum Perpetuum
(agora com um novo sentido para o termo perpetuum).
A publicao do Edito Perptuo foi o golpe decisivo legislao dos
pretores, que tiveram de se conformar s solues nele consagradas, sem
poder fazer qualquer alterao.

Reconstituio do Edito Perptuo. A obra de Juliano no chegou


diretamente at a modernidade. Mas o Digesto de Justiniano reproduz
diversos fragmentos dele. O romanista Otto Lenel, em 1883, a partir desses
elementos, pde reconstituir-lhe o texto original, que hoje se encontra
disposio dos pesquisadores.

5. As constituies imperiais. As constituies imperiais so


medidas legislativas emanadas do imperador.

Origem. No inicio, o Prncipe, como qualquer magistrado, no tinha o


poder legislativo. A partir de Adriano (imperador entre 117 e 138 d.C.), o
poder legislativo dos imperadores comea a desenvolver-se justamente
quando o edito do pretor deixa de ser uma fonte viva do direito. Em breve,
as constituies imperiais tornar-se-o a mais importante fonte do direito.
Diferentes espcies. Podemos distinguir quatro tipos de constituies
imperiais: os edicta, os mandata, os decreta e os rescripta.
a) Os edicta so as disposies anlogas aos editos dos magistrados.
So tambm anunciadas pelo imperados quando assume seu cargo.
b) Os mandata so as instrues dirigidas pelo imperador aos seus
funcionrios e, particularmente, aos governadores de provncia, traando-
lhes uma linha de conduta no exerccio de sua magistratura.
c) Os decreta so as decises judicirias dadas pelo imperador nos
processos em que a ele se apelou ou que ele prprio avocou a si. Os
decreta desempenharam importante papel na formao do direito porque os
magistrados e os governadores de provncia conformavam-se em seus
julgamentos jurisprudncia imperial.
d) Os rescripta so as respostas dadas pelo imperador a um funcionrio
ou a um particular, sobre questes de direito que lhe so formuladas. A
resposta era escrita seja no prprio requerimento do particular (quando
levava o nome de subscriptio), seja em folha separada (a epistula) em
resposta pergunta feita por um funcionrio.

6. Os responsa prudentium. Os responsa prudentium tornaram-se


importante fonte do direito no Alto Imprio, especialmente depois de uma
reforma realizada por Augusto.

O ius publice respondendi. - At Augusto, os prudentes eram simples


jurisconsultos que respondiam s consultas sem carter oficial. Augusto
concedeu, a alguns deles, uma qualidade oficial, ao atribuir-lhes o ius
respondendi, isto , o direito de dar respostas oficiais s consultas que lhes
fossem dirigidas.

A fora dos responsa prudentium. Os responsa (respostas, pareceres)


dos prudentes que gozavam do ius publice respondendi vinculavam, quanto
ao direito, os julgadores aos quais eram os pareceres encaminhados.
Revestidos do selo imperial, suas consultas eram estimadas como tendo
sido dadas em nome do povo (publice). Fundamentados, em tese, na
vontade popular, tinham a mesma autoridade da lei que eles interpretavam.
Neste perodo os responsa prudentium vinculavam somente o rbitro do
processo na ocasio em que eram emitidos. Ao contrrio, segundo um texto
de Gaio (G.1,7) os pareceres tm fora de lei quando eles esto todos de
acordo em um determinado assunto, em virtude de um rescrito do
imperador Adriano. Deixaram de ser, ento, um mero parecer para um caso
particular e passaram a formar uma fonte de direito fundada nas opinies
vinculantes dos jurisconsultos que gozaram do ius respondendi. Esta nova
fonte do direito encontrava-se escrita nas obras deixadas por eles ao longo
de suas vidas e deviam ser seguidas pelos rgos julgadores.

Principais Jurisconsultos do Alto Imprio. O principado perodo


mais criativo da histria da literatura jurdica romana.

Sabinianos e Proculianos. At o imprio de Antonino Pio, os


jurisconsultos so divididos em duas escolas rivais: a) a escola de Sabino
(Sabini schola), fundada por Capito, ao qual sucedeu Massurius Sabinus,
que deu nome escola, e depois por Cassius, Iavolenus e Iulianus, que
codificou o Edito Perptuo, Pomponius e Gaius; b) a escola de Prculo
(Proculi schola), fundada por Antistius Labeo, teve por sucessores Proculus,
Celsus e Neratius.

Diferenas entre as duas escolas. difcil reconhecer uma linha de


demarcao entre as duas escolas. costume apresentar a escola sabiniana
como mais conservadora, representada por autores-juristas (auctores) mais
tradicionais, enquanto que a escola de Prculo como mais inovadora.
No perodo dos imperadores Antonino Pio e Marco Aurlio, o jurista mais
clebre Gaio. Sua obra principal so as Institutiones (ou Commentarii) em
quatro livros, que serviu de modelo para as Institutas de Justiniano.
O manuscrito original das Institutas de Gaio foi descoberto em 1816 na
biblioteca da Catedral de Verona, pelo historiador Barthold Georg Niebuhr.
Era um manuscrito palimpsesto, isto , um pergaminho raspado e
reutilizado. Sobre o manuscrito de Gaio, que foi raspado no sculo VI, foi
copiado um texto das cartas de So Jernimo. Com o auxlio de reagentes
qumicos foi possvel fazer desaparecer a segunda escrita e reconstituir a
primeira, com exceo de alguns fragmentos. A descoberta permitiu uma
grande reviso nos estudos do direito romano do perodo de Gaio. Em 1933,
a descoberta no Cairo de um papiro com textos das Institutas permitiu uma
luz ainda maior no conhecimento da obra de Gaio.
Mas permanecem incertos a origem de Gaio e o local em que viveu.
Provavelmente nasceu sob o imprio de Adriano (117-138), publicou suas
obras no perodo dos imperadores Antonino Pio e Marco Aurlio (138 a
180). Suas obras foram muito populares nos tempos de Teodsio II (sculo
V) e de Justiniano. Supe-se que tenha sido professor em uma provncia
asitica, pois ele se ocupa muito do direito provincial e se denomina da
escola sabiniana, quando em Roma a distino das duas escolas j no
estava mais na moda.

Os jurisconsultos no final do II sculo d.C. Os principais juristas


so Paulo, Ulpiano e Papiniano, este ltimo considerado o maior
jurisconsulto romano.
Papiniano foi prefeito do pretrio no perodo dos imperadores Severo e
Caracala (198 a 211) e acabou assassinado, em 212, por motivos polticos,
por ordem do imperador Caracala. Suas principais obras foram os livros de
responsa e de quaestiones.
Depois de Papiniano, Paulo e Ulpiano foram ambos assessores de
Papiniano no Pretrio. Foram os dois ltimos grandes jurisconsultos.
Deixaram, cada um, diversos livros de comentrios ao Edito do pretor e de
direito civil. Paulo tambm escreveu livros de responsa e de sentenas
(sententiae), e Ulpiano, de regras (regulae).
Com estes dois juristas encerra-se o perodo clssico da jurisprudncia
romana, que no mais revelar grandes juristas, salvo talvez Modestino. A
partir de ento os responsa prudentium deixam de ser uma fonte viva do
direito.

4 PERODO O BAIXO IMPRIO

Limites. Este perodo comea com a morte do imperador Diocleciano


(284 d.C.) e encerra-se com a morte do imperador Justiniano (565 d.C.).
caracterizado, do ponto de vista poltico, pelo fato de o imperador governar
sozinho. diarquia do Alto Imprio, sucede a monarquia.

Organizao Poltica. Diviso do Imprio. No incio do sculo IV, com


Constantino, a sede do governo transferida para Constantinopla. Depois
da morte de Teodsio I, o imprio se divide em duas partes: Imprio do
Oriente e Imprio do Ocidente. Na chefia de cada Imprio encontra-se um
imperador. O Imprio do Ocidente desaparece em 476, invadido pelos
brbaros. O Imprio do Oriente manter-se- at a tomada de
Constantinopla pelos turcos em 1.453. Mas prevaleceu o uso de limitar o
estudo do direito romano at o ano 565, data da morte de Justiniano.

O Imperador. Ele possui um poder absoluto. Sem dvida, seu poder, j


no Alto Imprio, havia de fato se tornado absoluto com a progressiva
submisso do Senado. Mas o imperador era ainda, ao menos em teoria, um
magistrado investido do poder por meio de eleies.
O imperador exerce o poder com um conselho (consistorium), antigo
consilium principis, e com a ajuda de inmeras pessoas, ao mesmo tempo
ministros e domsticos: o quaestor sacri palatii, o magister officiorum etc.,
que esto na chefia de numerosos funcionrios especializados e
hierarquizados.
A insegurana poltica e econmica leva ao nascimento e
desenvolvimento de um verdadeiro socialismo de Estado, que tende a
sobrecarregar uma burocracia j excessiva.

As antigas magistraturas republicanas. As antigas magistraturas


republicanas no desapareceram, mas os magistrados perderam todas as
suas atribuies: o pretor urbano organiza os jogos, os questores cuidam de
questes municipais etc.

O Senado. No Baixo Imprio mero conselho municipal da capital.

Fontes do Direito. Desaparecimento das antigas fontes. As fontes


do direito antigas (leis, sentus-consultos e responsa prudentium
desapareceram).

Lei das citaes. Em 426, Teodsio II e Valentiniano III, renderam


uma Constituio Imperial, conhecida pelo nome de lei das citaes,
confirmando a autoridade dos escritos de Paulo, Ulpiano, Papiniano,
Modestino e Gaio, bem como a de algumas obras de Scaevola, Sabinus e
Juliano citadas por eles, mas desde que fosse possvel apresentar um
manuscrito de suas obras. Em caso de desacordo entre os jurisconsultos,
importa decidir de acordo com a maioria. Em caso de empate entre os
jurisconsultos, importa decidir de acordo com a opinio de Papiniano. Esta
determinao livrou os juizes (freqentemente de fraca cultura) de
discusses inextricveis e de citaes fantasiosas de advogados mal
intencionados. Por outro lado, a lei das citaes revogava a regra da
unanimidade exigida por Adriano.

nica fonte: as constituies imperiais. As constituies imperiais,


agora chamadas de leges, so as nicas fontes do direito do Baixo Imprio.
O poder legislativo do imperador afirmado nas Institutas de Justiniano de
um modo enrgico, atribudo a Ulpiano: quod principi placuit, legis habet
vigorem (o que agrada ao prncipe tem fora de lei). Por conseqncia,
admite-se que o imperador , igualmente, o nico e aceitvel intrprete da
lei.
As diversas variedades de constituio imperial existentes no Alto
Imprio (mandata, decreta, edicta, rescripta) tendem a se confundir, at
que finalmente todas elas levam o nome de edicta. Mas no h qualquer
semelhana entre os antigos edicta dos magistrados com os edicta ou leges
edictales dos imperadores do Baixo Imprio.
Os edicta so as ordens dos imperadores dirigidas a um destinatrio
especfico: o Senado, um funcionrio qualquer (prefeito do pretrio,
governador de provncia etc.).

Os monumentos do direito no Baixo Imprio. Para conhec-los,


preciso distingui-los nos trs perodos:

1 Antes de Justiniano.

2 Obras de Justiniano.

3 Depois de Justiniano.

1 Antes de Justiniano.

a) Compilaes privadas. So as primeiras compilaes, sem


carter oficial.
O Cdigo Gregoriano e o Cdigo Hermogeniano (entre o final do III
sculo o incio do IV sculo) so compilaes de constituies imperiais.
Estes dois cdigos no nos foram transmitidos diretamente. Eles so-nos
conhecidos por meio de fragmentos do Vaticano e de leis romanas dos
brbaros.
Os fragmentos do Vaticano (do final do sculo IV) so uma compilao
de constituies imperiais e de excertos de numerosos jurisconsultos
(descobertos pelo cardeal Mai em 1821).
A collatio mosaicorum et romanorum legum, da mesma poca, uma
comparao entre a legislao romana e as leis mosaicas.
O livro siro-romano, ou leges seculares (leis seculares) uma recolha de
direito romano aplicada na Sria. O texto original latino foi perdido e seu
contedo nos foi transmitido por tradues rabes e siracas.

b) Codificaes oficiais. O Cdigo Teodosiano. A primeira


codificao oficial das leges o Codex Theodosianus, promulgado no
Oriente, em 438, por Teodsio II e tornado obrigatrio no Ocidente sob o
imprio do Valentiniano III. uma compilao de constituies imperiais
publicadas desde Constantino.
Ela nos conhecida graas a lei romana dos Visigodos e dos Burgndios.

Leis romanas dos brbaros. Os reis brbaros que invadiram o Ocidente


respeitaram as leis dos romanos e fizeram redigir, para os vencidos,
compilaes de normas romanas. So exemplos disso: a lei romana dos
Visigodos ou Brevirio de Alarico (506 d.C.), a lei romana dos Burgndios
(promulgada ca. 502), o edito de Teodorico, rei dos Ostrogodos (ca.500).

2 A Obra de Justiniano.

Finalidade. Foi para facilitar o trabalho dos juristas, que tinham de


recorrer a grande quantidade de textos dos antigos jurisconsultos,
freqentemente contraditrios, que Justiniano empreendeu enorme trabalho
de codificao.
Em ordem cronolgica, seus esforos compreenderam as seguintes
obras:
1 O Codex (529);
2 Os Digesta (533);
3 As Institutas (533);
4 O Segundo Codex (534);
5 As Novelas.

1 O Codex (529). O Cdigo de Justiniano uma compilao de


constituies imperiais em vigor no momento de sua redao.
Redao. Para elaborar seu cdigo, Justiniano nomeou uma comisso
de dez membros, sob a presidncia de Triboniano. Ele deveria refundir os
trs Cdigos anteriores (o Codex Gregorianus, o Codex Hermogenianus e o
Codex Theodosianus) e nele ajuntar as novas constituies. Este primeiro
cdigo, publicado em 529, no chegou at ns.

2 Os Digesta. (533) O Digesto uma coleo metdica de


fragmentos extrados das obras dos jurisconsultos romanos, denominada
originalmente de Digesta (de digere, selecionar, ordenar, classificar) ou
Pandectas.
Redao. A redao do Digesto foi confiada a uma comisso de
dezesseis membros, dirigida por Triboniano. Esta comisso dividiu-se
provavelmente (segundo a hiptese proposta por Bluhme, em 1823) em
trs, e depois em quatro subcomisses, correspondentes s diferentes
massas de obras a consultar: a massa Sabiniana (obras de Sabinus), a
massa edital (de comentrios ao Edito), a massa Papiniana (obras de
Papinianus) e a massa das demais obras no abrangidas nas trs
subcomisses precedentes. No total, foram aproveitados trechos de cerca
de 2.000 obras de jurisconsultos clssicos.
As trs primeiras massas, que so essenciais, correspondiam ao
programa dos trs primeiros anos de ensinamento do Direito.
Composio. O Digesto compreende cinqenta libri (livros). Cada livro
dividido em tituli (ttulos). Cada ttulo dividido em leis ou fragmentos,
com o nome do jurisconsulto e da obra de onde foram extrados. Cada lei
ou fragmento dividido em pargrafos. Assim, a citao do Digesto
apresenta-se da seguinte forma: por exemplo, D.14,4,5,7 isto : Digesto,
livro XIV, ttulo 4, fragmento 5, pargrafo 7.
O Digesto um livro de manuseio sutil e merecedor de grande cuidado
na leitura, especialmente porque os textos originais dos juristas so, muitas
vezes, interpolados, isto , sofrendo alteraes, j no refletiam mais o
clssico direito romano. A caa s interpolaes, com o fim de restabelecer
o texto original dos juristas clssicos, ocupou grande parte dos romanistas
do incio do sculo XX.

3 As Institutas. As Institutas so um manual de ensinamento


destinado aos estudantes de Direito de Constantinopla e de outros grandes
centros de estudos superiores (como Beirute).
Redao. Esta obra foi redigida por Triboniano, Doroteu (professor de
Constantinopla) e Tefilo (professor de Berito), segundo o modelo dos
Comentrios de Gaio, dos quais textos inteiros foram copiados.
Composio. As Institutas so divididas em quatro livros; cada livro
em ttulos; cada titulo, em pargrafos.

4 O Segundo Codex. (534) uma segunda edio do Codex de 529,


atualizada com as reformas legislativas de Justiniano. Seu texto chegou-nos
integralmente.
Composio. O Cdigo justinianeu dividido em doze livros; cada livro
em ttulos; cada ttulo em leis (ou constituies) e cada lei em pargrafos.

5 As Novelas. a compilao das novas constituies (novellae


leges) promulgadas por Justiniano depois da confeco do Cdigo. Estas
constituies novas foram objeto de compilaes de natureza privada,
notadamente o eptome de Juliano e o Authenticum.

O Corpus Iuris Civilis. O conjunto da obra de Justiniano forma um


monumento jurdico que ficou conhecido pelo o nome de Corpus Iuris
Civilis, dado no sculo XVI pelo humanista Denys Godefroi (Godofredus).

3 Depois de Justiniano.

As duas principais obras legislativas posteriores a Justiniano so:

a) A Parfrase das Institutas de Justiniano, em grego, publicada


pouco depois das Institutas, de autoria de Tefilo, um dos redatores das
Institutas.
b) As Baslicas, compilao em lngua grega que rene, em 60 livros
e em uma ordem lgica e nova, extratos das Institutas, do Digesto e do
Codex. Esta compilao foi publicada no sculo IX, sob a ordem do
imperador Leo, o Filsofo. Ela acompanhada de comentrios, designados
esclios (da palavra grega scolia, nota), de pocas diversas, algumas
remontando ao VI sculo.

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