Antropofagia Queer Imagem Trans Genero e PDF
Antropofagia Queer Imagem Trans Genero e PDF
Antropofagia Queer Imagem Trans Genero e PDF
ANTROPOFAGIA QUEER:
IMAGEM, (TRANS) GNERO E PODER
Rio de Janeiro
2016
MARIAH RAFAELA CORDEIRO GONZAGA DA SILVA
ANTROPOFAGIA QUEER:
IMAGEM, (TRANS) GNERO E PODER
Rio de Janeiro
2016
FOLHA DE APROVAO
BANCA EXAMINADORA
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
Examinada a monografia.
Conceito:
Ao meu esposo, amigo e eterno incentivador, Rodrigo Carvalho. Nada disso seria
possvel se aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo, poucas semanas aps o incio de
nosso namoro, voc no me telefonasse sugerindo fazer a inscrio no vestibular da UFRJ e
completando a ligao dizendo; eu te ajudo a estudar, minha princesa! E me ajudou. E eu
passei no ltimo vestibular tradicional da UFRJ. E hoje estou aqui, mais forte do que nunca!
Nunca terei palavras ou sentimentos para agradecer tudo o que voc fez por mim, literalmente
salvou a minha vida e me mostrou todo um mundo novo, cheio de coisas lindas, novas
perspectivas e horizontes infinitos! Te amo de maneira sobrenatural!
Ao meu querido amigo, Rodrigo Borba por ter sido um anjo no momento mais crtico
da minha passagem por uma das mais importantes instituies de ensino superior da Amrica
Latina. O nosso evento Por uma UFRJ para todxs: identidades LGBT no ensino superior
ecoar eternamente na minha memria!
As minhas sobrinhas amadas que sempre tem uma palavra querida e insuportavelmente
fofa para me alegrar. Amo vocs incondicionalmente! As minhas irms mais velhas Daniele e
Michele e aos meus pais; aprendemos a nos reconstruir apesar de toda dor e sofrimento e no
final construmos uma famlia.
Ao meu amigo e coorientador Pedro Paulo Bicalho; sempre querido e sempre
acreditando num potencial que eu nunca imaginei que pudesse existir em mim. A psicologia
me trouxe coisas boas tambm, trouxe voc!
Ao meu orientador, Cezar Bartholomeu, que acreditou no meu tema de pesquisa e me
ensinou coisas alm do paradigma acadmico da arte. Arte tambm vida, vida em eterno
processo! Muito obrigada!
Aos meus amigos, da faculdade e fora dela, que me acompanharam nesta jornada que
ainda no est nem pela metade, vocs so incrveis! Amo vocs todos! A faculdade e a vida
no seria a mesma sem vocs!
A Patrcia Magno e toda sua equipe na Defensoria Pblica do Rio de Janeiro que me
acolheram, ouviram e deram entrada no meu processo de retificao civil. Vocs no fazem
ideia do quanto sou grata! Anjos guerreiros em prol da democracia e da dignidade humana, toda
minha reverncia!
E, por fim, todo meu agradecimento a equipe mdica, liderada por Eloso Alexandro da
Silva, que no dia 23 de novembro de 2012, aps uma longa e profunda depresso, me permitiu,
atravs de uma cirurgia de transgenitalizao, que durou o dia inteiro, sentir vontade de viver
eternamente! Obrigada!
A imagem d carne, isto , carnao e visibilidade, a
uma ausncia, mediante uma diferena intransponvel
quilo que designado.
Queer Anthropophagy is the study which explores the aesthetics able to question the
norms of gender and sexuality. It also makes visible the oppressions imposed culturally and
that somehow pushes to the border transgender, transvestites, gays, lesbians and cis
heterosexuals whose bodies do not meet the standard inside social norms. Accordingly, queer
aesthetic functions as a mechanism able to list visibilities previously invisible. In addition, it
brings to light repertoires and art objects produced by trans people but which cistem has
historically deemed invalid.
Image, gender and power are the "pragmatic axis" seeking to bring to the spotlight the
understanding, through art, methods in subjectivity production and subjects. These
"geopolitical forces" where the queer subject is the "subaltern" which seeks to place the
institutional spaces of power, get resistance from the production of cisgender artists who see
the trans body questioning powers of pictorial tradition. The queer multitude now has a voice
and they want to scream, shake their hair, to exist!
1. Introduo
Quando a historiadora da arte Linda Nochlin escreveu em 1971 um dos textos que
fundam o pensamento crtico feminista no campo das artes, intitulado Por que no h grandes
mulheres artistas? 1 , ela mostrava que, de certo modo, mulheres cisgnero 2 estavam
condicionadas num sistema maior que se chamava cultura e esta respondia aos anseios ento
hegemnicos/patriarcais. Durante muito tempo, demonstra a autora, as mulheres no gozaram
das condies de produo nem dos modos de representao e promoo necessrios para
chegar posio de artista (Elles, 2014). Pouco mais de uma dcada depois outra pergunta,
desta vez realizada pelo coletivo Guerrilla Girls, dava ainda mais fora ao questionamento de
Nochlin: As mulheres precisam estar peladas para entrarem no MET?3. Deste modo, a crtica
da representao de corpos femininos e a ausncia das mulheres na histria da arte ganham
1
Ttulo original em ingls Why Have There Been No Great Women Artists?
2
O termo cis, uma contrao da palavra cisgnero ou cisgender em ingls. um conceito que surge no mbito
da teoria transfeminista e tem como origem o latim que significa deste lado. utilizado por pensadoras/res
transfeministas para designar aqueles cuja anatomia sexual (dada as premissas de nascimento) consoante a uma
identidade gnero inteligvel. Por exemplo, uma pessoa que nasceu com pnis e se identifica enquanto homem ou
uma pessoa que nasceu com vagina e se identifica enquanto mulher. Opto por utilizar o termo cis justamente para,
discursivamente, anular possveis diferenas sexo-anatmicas que, ao meu ver, irrelevante para a construo
de sujeitos de direito. Portanto, um mtodo de pensar minimamente em igualdade, no deslocando sujeito A ou
B, em categorias que pressupem maior legitimidade para alguns em detrimento de outros.
3
Traduo de Do women have to be naked to get into Met. Museum? Texto na figura 1.
14
Do ponto de vista das imagens que trazem luz as transgeneridades, Duchamp e uma
das mais clebres de suas obras, Rrose Slavy, colocam em cena um problema esttico que um
sculo depois viramos chamar de esttica queer7. Alm de Duchamp, Warhol e Nan Goldin
4
Neste trabalho o termo trans funciona como termo guarda-chuva e corresponde transexualidade, transgnero,
travestis, transexuais, intersexuais, andrginos, homens trans, homens com vagina, cross-dresses, drag queens, etc.
5
No escopo da filosofia deleuziana, no agenciar, mltiplos agentes entram em ao. Eles podem ser de natureza
humana ou inumana, corprea ou incorprea. Tanto o grito de uma criana quanto o canto de um pssaro ou o
explodir de uma bomba podem ser agentes da produo de uma realidade. Isso vale tanto para o documentarista
cinematogrfico ao cobrir uma Guerra quanto para o antroplogo ou historiador. (Souza, 2012, p. 29)
6
Embora o termo soe redundante, o hiato espao-tempo seria no apenas o espao entre a obra, que se faz ver, e o
espectador, mas toda bagagem que ambos carregam e, certamente, todo contexto histrico que condiciona essa
inflexo dicotmica imagem-sujeito e que, de certa forma, produzem discursos, enunciados e linguagens
especficas exterior imagem, mas sobretudo na imagem. A cultura nos captura em uma bolha, ela se faz presente
no modo de ver e, por vezes, no modo de produzir imagens. As imagens no so fruto direto de um processo de
aculturao. Elas so, priori, filhas da subjetividade do artista. Portanto, esto sujeitas ao olhar e ao esprito
de quem as produz. Mas, eles so tambm potncia. Para Panofsky (2009) todo conceito histrico baseia-se,
obviamente, nas categorias do espao e tempo. Os registros e tudo que implicam, tm que ser localizados e datados.
Mas acontece que esses dois atos so, na realidade de uma e mesma coisa (pg. 26). Segundo o famoso historiador
adepto do mtodo iconolgico, o mundo das humanidades determinado por uma teoria cultural da relatividade
(pg. 27). Entretanto, o hiato-espao tempo tambm responde s idiossincrasias histricas, mas no apenas a elas
porque ele tambm busca dar conta do sujeito enquanto sujeito. Da obra enquanto potncia e no somente um
ndice esttico e histrico, por fim, ele opera como rizoma entre sujeito e objeto artstico numa espcie de relao
infinita que constituiria o que Deleuze (1991) chamaria de dobra.
7
No Duchamp quem funda o que estou tratando como esttica queer, enquanto termo/conceito que opera no
interior de uma significao, contudo sua imagem traz questes pertinentes para esse trabalho. Ao longo da histria
da arte, diversos artistas trouxeram a luz imagens queer. Para ver imagens da esttica queer de modo mais amplo,
tomando como ponto de partida as homossexualidades, ver os livros Gay by the Bay de Susan Stryker e Jim Van
Buskirk (1996) e Gay art de James Small (2008). O termo utilizado fundamentalmente por Judith Halberstam
(2001) em The queer art of failure. Embora o autor, gender queer, no afirme que se trata de uma esttica onde o
corpo o objeto central no sentido de construir todo um mecanismo de reapropriao no s do prprio corpo, no
sentido discursivo, mas do prprio sexo e das prticas sexuais com proposito de torna-las visveis, no mais
escamoteada pelas prticas heterossexuais amplamente difundida nas novelas, filmes, desenhos, revistas, etc. Em
15
so exemplos de artistas cis que afastaram em suas obras o fantasma do exotismo e fizeram,
cada um a seu modo, uma arte, e consequentemente uma esttica da arte, cuja as
transgeneridades e as sexualidades, para alm de uma questo scio-poltica, se configurariam
manifestaes de singularidade, uma manifestao humana rica, trazendo luz a possibilidade
dos sujeitos serem sujeitos a partir de suas prprias performatividades e no mais da norma de
gnero imperativa. Mais que isso, protagonistas dos seus prprios modos de vida. A esttica
aqui funciona de modo a questionar normas sociais, uma forma de crtica que rompe com
modelos hegemnicos de representao.
Das representaes das figuras andrginas, s mulheres barbadas dos circos, a imagem
trans estava impregnada de uma aura inumana a qual a sociedade ansiosa por espetculo
costumou produzir. Romper com processos tradicionais de produo artstica pe em questo
o prprio ato artstico, alm de nos possibilitar pensar fora dos padres. Nos permite enxergar
outras configuraes estticas e reposicionar a forma como lidamos com os objetos de arte. O
trabalho de Duchamp um dos pioneiros a romper com padres estticos que subvertiam
lgicas de gnero - embora no tenha sido o primeiro. Dcadas mais tarde, Nan Goldin cria
toda uma atmosfera que valoriza o corpo e a imagem trans. A artista traz superfcie de suas
fotografias um ser humano possvel e desejante. Mais tarde, artistas queer passam a reivindicar
sntese, atravs da arte, uma forma de resistncia ao mecanismo da heteronormatividade. Para os propsitos deste
trabalho, buscamos evidenciar o corpo trans, a configurao do cistema (que explicaremos adiante) e os meios
pelos quais esses corpos passam adquirir uma centralidade atravs da esttica queer produzida por alguns artistas.
Ento, percebam que na realidade uma esttica contempornea ampla que necessita de mais investigao.
16
a autoria de suas imagens e a construo de uma arte atravessada por questes polticas onde o
corpo o tema central. Mas, sobretudo, atravs de um processo antropofgico onde as
subjetividades trans se apropriaro dos signos comuns afim de reelabora-los, question-los,
degluti-los! Em linhas gerais, antropofagia um conceito de Oswald de Andrade apresentado
no seu Manifesto Antropfago em 1928 e que consiste em se reapropriar dos processos culturais
dos pases colonizadores afim de reelabora-los a partir da cultura brasileira e, de certa forma,
marca o modernismo brasileiro.
Ao visitar esses guetos da norma de gnero os artistas presentes neste trabalho, atravs
de suas obras, nos trazem imagens que tencionam a noo de gnero e estruturas sociais de
poder, atravs de uma esttica capaz de chocar espectadores viciados nas normas de gnero
porque esto propondo tipos variados de reflexo que no podem ser compreendidos se
estiverem condicionados ou atrelados s normas de gnero e sexualidade. Os corpos queer so
os corpos de uma multido, conceito elencado por Paul Beatriz Preciado (2011) e que no
documentrio Paris is Burning fica claro. Uma multido de corpos e subjetividades dispostos
margem do corpo social que, atravs da norma de gnero, diz quem normal ou no. Unir o
conceito de multido queer com o conceito de antropofagia de Oswald de Andrade, atravs
daquilo que Suely Rolnik (1998) chamou de Subjetividade Antropofgica, resultar no conceito
de antropofagia queer, que discutiremos mais detalhadamente no terceiro captulo.
Nesse sentido nos perguntamos; o que esto produzindo as/os artistas trans? Neste
estudo, veremos algumas obras produzidas por artistas trans porque tambm buscamos
evidenciar no s a produo desses artistas, mas tambm mapear aquilo que iremos tratar
como esttica queer. Um desses artistas Del LaGrace Volcano, um artista gnero fludo, que
atravs de suas imagens potencializa corpos e subjetividades, tambm veremos outros nomes e
trabalhos e um conjunto de imagens est disponvel no anexo. Deste modo, acreditamos
dialogar com as multides queer atravs da perspectiva da antropofagia. Em suma, o objetivo
principal deste trabalho construir uma historiografia da arte queer, traduzida em corpos trans
atravs de obras cujo incio localizamos em Marcel Duchamp. Uma histria da arte que pense
a subverso como potncia utilizando o mtodo cartogrfico do desejo (Guattari & Rolnik,
2013) e o transfeminismo; um jogo de foras onde uma prtica sulbaterna constituir uma
espcie de motor de questionamento. A implicao para este trabalho surge da necessidade
poltica de construo de uma historiografia da arte que aborde questes transgnero no a partir
de ideias essencializantes ou saberes localizados nos manuais mdicos-patologizantes, mas a
partir da prpria ideia poltica de emancipao das minorias, e tambm por perceber que, de
17
8
Em El trfico de mujeres: notas sobre la economia poltica del sexo, Gayle Rubin (1986) sistematiza todo um
conceito que ir contribuir de forma fundamental para desnaturalizar as opresses contra as mulheres cisgnero.
Entretanto, a antroploga no problematiza a suposta natureza do conceito de sexo, to questionado na teoria queer
e fundamentalmente no transfeminismo, fazendo com que se mantivesse intacta a ideia de fmea como matria
prima.
18
fruto a ao antropofgica, produz resistncia? Com efeito, a cartografia nos permite mapear,
metaforicamente, essa geopoltica das foras.
Essas foras, essas relaes de poder se sustentam em processos que demandam anlises
que, no campo das artes, tambm esto postos atravs das imagens. Pensar a relao entre
imagem, gnero e poder e os processos que produzem no s resistncia (uma outra forma de
fora) mas questionamentos a partir de imagens que evoquem um pensamento exterior s
normatividades sociais, partindo de uma esttica fundamentalmente provocativa, uma
forma de produzir uma outra narrativa para momentos da histria da arte. Trazer indivduos,
subjetividades e singularidades subalternas ao holofote, a partir de um mecanismo em si
subalterno, o transfeminismo ps-colonial, no s fazer ecoar saberes localizados, mas
tambm provocar abalos ssmicos na prpria norma!
Com efeito, o transfeminismo uma dessas foras. No atual cenrio brasileiro dos
movimentos sociais e acadmicos, o transfeminismo vem ganhando cada vez mais destaque e
as vozes de pensadoras transfeministas como Hailey Kaas, Jaqueline Gomes de Jesus, Viviane
V, Bia Bagagli, Daniela Andrade, Mariah Rafaela Silva, Maria Clara Arajo e outras tantas,
tem servido como norte para diversas pessoas em diferentes campos do saber. Fazer essas vozes
ecoarem no campo da crtica de arte, de alguma forma reposicionar, remexer as foras nessa
cartografia; uma forma de luta igualmente poltica atravs das imagens.
O pensamento transfeminista pe em cheque a noo mdico-patologizante das
identidades trans, a ideia de um essencialismo biolgico dado priori e, a luta em prol da
emancipao e autonomia das pessoas trans (Kaas, 2015). Em sntese, o transfeminismo a
ideia radical de que mulheres trans* so mulheres (Kaas, 2014). Ele refuta a ideia na qual
mulheres trans no so biolgicas e traz luz termos especficos, os quais veremos ao longo
deste trabalho, para denunciar opresses vivenciadas por pessoas trans. Assim, o
transfeminismo que nasce no escopo da teoria queer a fora subalterna que funciona como
elo entre a ao antropofgica queer e seu resultado; a esttica queer nas imagens trans9.
Embora alguns pensadores julguem que o termo queer no faz sentido dentro de um
contexto latino, de brasilidade, penso que o prprio ato antropofgico capaz de dar conta
dessas (in) diferenas geopolticas. Alm disso, as subjetividades da multido queer enfrentam
processos semelhantes de subjetivao e de controle oriundos de um patriarcado, ao meu ver,
obsoleto! E isso no depende da regio do globo, mas sobretudo de processos culturais que
tentaram condicionar e aprisionar essas subjetividades. Das violncias simblicas, aos
9
Para ler mais sobre o pensamento transfeminista visitar a pgina http://www.transfeminismo.com
19
10
Para entender mais sobre cis-heteronormatividade - ou apenas heteronormatividade como tratam alguns autores
- ver A heteronormatividade e o cotidiano escolar: desconfortos e reflexes em oficinas com profissionais de
educao de Analu Freitas, Mariah Rafaela Silva e Luan Cassal disponvel em
http://abeh.org.br/arquivos_anais/A/aa001.pdf
11
Sobre violncias especficas; transfobia e violncias de gnero sob a tica transexual ver Gnero e
Criminalizao na experincia transexual de Mariah Rafaela Silva disponvel em
http://www.parlamidia.com/site1/images/edicao-jic2013/silva-mariah.pdf e ver o livro Homofobia de Jaqueline
Gomes de Jesus, 2015.
20
O feminismo no um humanismo
Paul B. Preciado12
Para a filsofa, tanto homens e mulheres (cis ou trans) performatizam gnero no sentido
de que performance13 cpia, portanto mimese. De acordo com o pensamento de Butler, falar
que gnero uma performance, implica dizer que o gnero uma instituio mantida pela
reiterao de normas de gnero, ou aquilo que Preciado chama de tecnologia de gnero ou
12
Disponvel em
http://www.opovo.com.br/app/colunas/filosofiapop/2014/11/24/noticiasfilosofiapop,3352134/o-feminismo-nao-
e-um-humanismo.shtml. Acesso em 14 Nov. 2015
13
No confundir performance com performatividade. A ideia de que a identidade um construto performativo
se constitui numa teoria complexa []. Se o esprito de Hegel um sujeito viajante [], o sujeito de Butler um
ator que simplesmente se pe de p e encena sua identidade num palco metafrico de sua prpria escolha. []
Butler argumenta que a identidade de gnero uma sequencia de atos (uma ideia que assenta em teorias
existencialistas), mas ela tambm argumenta que no existe um ator (um performer) preexistente que pratica esses
atos, que no existe nenhum fazedor por trs do feito. Ela esboa aqui uma distino entre performance (que
pressupe a existncia de um sujeito) e performatividade (que no o faz). Isso no significa dizer que no h
sujeito, mas que o sujeito no est exatamente onde esperaramos encontra-lo isto , atrs ou antes de seus
feitos (Salih, 2012, p. 65 - 66). O pensamento de Butler extremamente denso, de modo que sugiro a leitura de
seus livros, especialmente Problemas de Gnero (2008). Tambm recomendo a leitura de Sarah Salih (2012) sobre
a Butler.
21
sexopoltica, que cristalizam e se mostram uma essncia de um sujeito. Uma verdade inerente
ao sujeito, portanto incontestvel. Butler (2008) explica que
No campo da arte, o
feminismo a partir da perspectiva da
iconologia vaginal (Marques, 2014)
continuava reiterando esses
essencialismos que no davam conta
de uma multido cujos corpos
proclamavam uma radicalizao que
escapava o molde biologizante.
Assim, o transfeminismo ocupa lugar
de destaque nas anlises das imagens
Figura 2 - Judy Bamber. My little fly, my littler butterfly, 1992
trans que deem conta de uma perspectiva no biolgica da subjetividade e do sexo. Para
Jaqueline Gomes de Jesus, o transfeminismo;
14
Judith Butler chama de matriz de inteligibilidade de gnero o dispositivo que constitui uma gramtica prescritiva
que restringe quais so as possveis combinaes entre corpo, sexo, gnero e desejo. Desse modo que, afirma
Butler, as pessoas s se tornam inteligveis ao adquirir seu gnero em conformidade com padres reconhecveis
de inteligibilidade de gnero [...] gneros inteligveis so aqueles que, em certo sentido, instituem e mantm
relaes de coerncia e continuidade entre sexo, gnero, prtica sexual e desejo. Butler afirma que essas noes
de coerncia e continuidade so efeitos de normas socialmente institudas e mantidas, enfatizando, assim, que
gnero no decorre natural e incontestavelmente de nosso aparato genital, mas sim de regras histrica e
23
discursivamente produzidas que instituem como o corpo-sexuado deve generificar-se com base em uma
heterossexualidade compulsria. Dessa forma, a viabilidade de nossa identidade depende dessas normas sociais
(Butler apud Borba, 2013)
15
Sobre esse tema ler O modelo de John Money: entre o cromossmico e o esttico de Lucas Passos (2011)
disponvel em https://ensaiosdegenero.wordpress.com/2011/11/18/o-metodo-de-money-entre-o-cromossomico-e-
o-estetico/
24
16
Segundo Preciado (2014), os protocolos de gesto de crianas intersexuais repousam a teoria desenvolvida em
1955 por John Money (professor de psicopediatria do hospital universitrio John Hopkins de Nova Iorque) e pelo
casal Hampson, e posta em prtica pouco depois pelo prprio Money e por Anke Ehrhardt , ele continua dizendo
que a concluso qual chegava Money em 1955 no podia ser, aparentemente, mais revolucionria: o gnero e a
identidade sexual so modificveis at a idade de 18 meses, e conclui dizendo que a teoria da atribuio de sexo,
produzida quase completamente por Money no suscitou nenhuma reao crtica no seio da comunidade cientfica
(p.132-133). Nesse sentido, o monesmo configura-se como uma prtica extremamente violenta que busca regular
a prxis mdica no sentido de construir uma normalidade de sexo e de gnero em pessoas intersexuais que so
submetidas s cirurgias ainda bebs e tais procedimentos se estendem at a adolescncia. Para o filsofo, essas
tecnologias do gnero servem para camuflar a heterossexualizao das identidades sexuais desviantes, inclusive
em pessoas transexuais. O que concordo em partes, uma vez que muitas mulheres trans que se submetem cirurgia
de mudana de sexo se assumem como lsbicas ou bissexuais, nem todas se reconhecem enquanto
heterossexuais. Nesse sentido, tendo a discordar do autor quando ele afirma que o processo de mudana de sexo
deveria se chamar mitologia heterossexual da diferena sexual (p.126). Acredito que as mulheres trans no
possam ser responsabilizadas, discursivamente, em funo interesse hegemnico do cistema e pelo insucesso das
cirurgias dos homens trans, que possui diversos complicadores conforme cita o autor. Alm disso, a normalidade
construda nesses corpos ser, como j disse, uma normalidade sempre em processo e estar a todo tempo
desafiando a matriz de inteligibilidade de gnero que por si s um eixo pragmtico/terico biologicista.
25
Seis dcadas aps Duchamp, Andy Warhol faz o questionamento identitrio ecoar.
Precisamos efetivamente de uma identidade que generifique nossas existncias? O limite das
26
17
De acordo com Michel Foucault (2013) o controle da sociedade sobre os indivduos no se opera simplesmente
pela conscincia ou pela ideologia, mas comea no corpo, com o corpo. Foi no biolgico, no somtico, no corporal
que, antes de tudo, investiu a sociedade capitalista. O corpo uma realidade biopoltica. A medicina uma
estratgia biopoltica (p.144). Quando se diz quem normal, tudo que foge s regras dessa normalidade,
corresponde ao que anormal, portanto passvel de correo. As populaes LGBT, sobretudo mulheres trans e
travestis so consideradas anormais pelo vis cristo contemporneo, respondendo uma lgica binria. A
transexualidade considerada doena mental classificada no Cdigo Internacional de Doenas (DSM- V). Logo,
a prpria existncias dessas pessoas torna-se em uma potncia poltica pois as tcnicas de docilizao de corpos
no capaz de dar conta dessas subjetividades. A homossexualidade foi considerada doena at o incio da dcada
de 1990. No entanto, a transexualidade ainda se mantem tipificada, embora sejam coisas distintas, preciso que
as bandeiras do movimento LGBT enfrentem essa demanda com mais ateno e seriedade.
27
18
A vontade de poder um enunciado nietzschiano. Para o filsofo Os homens construram a histria como se
existissem fenmenos morais. Nietzsche nos adverte de que o que existe so as interpretaes morais dos
fenmenos. Ao interpretar, o homem necessariamente estabelece um valor, que dado pela sua perspectiva. O
perspectivismo subjetivo, e, nesse caso, falta ao conceito de realidade, uma vez que no h nada que justifique o
imaginrio (Ignacio) Ele nos mostra que por trs dos valores construdos pelo homem, tais como a justia,
liberdade, igualdade, esconde-se a Vontade de Poder pervertida. (ibid.).
28
norma. Uma bicha heterossexual produz tanta potncia quanto a bicha gay efeminada ou a
mulher cis-htero masculinizada, etc. Essa tambm a antropofagia das multides queer.
Preciado (2011) afirma que os corpos da multido queer so tambm as reapropriaes e os
desvios dos discursos da medicina anatmica e da pornografia, entre outros, que construram o
corpo straight e o corpo desviante moderno (p. 16), dando-nos, assim, pistas da antropofagia
e da potncia das multides queer em reapropriar-se do discurso sobre seus corpos, de modelos
de comportamento, nas artes e das imagens e reconfigura-se infinitamente por que o que est
em jogo, conforme diz o filsofo, como resistir ou como desviar das formas de subjetivao
sexopolticas (p.16).
ater, fez saltar para fora do quadro todo um imaginrio mistificado capaz de provocar
estranheza. No seria uma mulher, mas tambm no seria um homem! Ou uma mulher que
virou homem! Ou os dois! Essa confuso e ambivalncia de corpos na composio
espacial da imagem causa estranhamento e uma certa abjeo. evidente que as obras nunca
so percebidas da mesma maneira ao longo da histria, as mesmas imagens mudam no
decorrer do tempo, ou seja, so percebidas de acordo na sua inflexo no tempo-espao. Nesse
sentido, so trans-histricas. Atravessam a histria ressignificando-se. Contudo, a imagem nos
d pistas bem objetivas sobre como devemos ler e entender a imagem de Magdalena Ventura,
figura retratado por Ribera. Na parte, direita do quadro uma grande inscrio em latim diz o
seguinte:
Vejam, um grande milagre da natureza. Magdalena
Ventura da cidade de Accumulus Insomnium, na
19
Apresentamos na figura 7 apenas uma metade do quadro, de modo a enfocar os pontos discutidos. A imagem
inteira facilmente encontrada na internet.
31
20
texto traduzido do ingls, disponvel em http://wtfarthistory.com/post/10240417642/a-bearded-woman-
breastfeeding. Acesso. 04 Jan. 2016
32
Para os historiadores da arte Maria Louro Berbara e Raphael Fonseca (2011) na histria
ocidental moderna, a androginia quase sempre considerada repulsiva e monstruosa (p.2241).
Segundo os historiadores da arte
Contudo, notamos que h tambm admirao mesmo quando se imputa ao corpo uma
ordem de sagrado, que mais tarde, epistemologicamente, vira para a ideia de monstruosidade
(Foucault, 2010). Para os homens e mulheres da Renascena isso, a ideia de sagrado, no estava
atrelado a algo negativo. Pelo contrrio, ao longo da histria h registro de cultuao aos ditos
eunucos que exerciam uma funo social simblica no seio das sociedades antigas. Nesse
sentido, o andrgino pode ser terrvel, belo e perfeito. Alis, o prprio conceito de beleza/ belo
relativo na histria da arte, segundo Argan, dizer que uma coisa no bela um juzo; a
coisa no bela em si, mas no juzo que a define como tal (ARGAN, 1992, p. 17). Assim,
devemos considerar sempre o carter histrico e cultural sobre a crtica aos modelos de
representao que mistifiquem os corpos andrginos. De modo que, mesmo que atualmente tais
imagens possam ser lidar como imagens exotificadas, durante sculos significou algo
21
Apesar a androginia evidente na figura 8 e da espessa barba, a mulher apresentada neste folder sofreu uma
masculinizao muito menos intensa que a de Ribera. A maior parte das imagens de mulheres dos circos dos
horrores as quais encontrei durante a pesquisa, apresentavam clara androginia e sinais aparente de
masculinizao, mas nenhuma to intensa quanto a representada por Ribeira. O que me leva a supor que h um
certo exagero em sua representao que somado seu texto intui uma certa euforia diante da androginia de
Magdalena Ventura.
33
No primeiro volume de Histria do Corpo (Corbin, et al., 2012) podemos notar que ao
longo dos sculos que compreenderam da Renascena s Luzes, ocorreu uma grande mudana
na forma como o corpo era entendido nvel epistemolgico. Ao aprofundarmos a leitura nos
volumes 2 e 3, da srie de Corbin e Cia., perceberemos que a forma como corpo narrado e, de
certo modo, estudado continua em processo. Nesse sentido, a contemporaneidade,
especialmente os movimentos sociais que lutam por igualdade de gnero, descolonizao dos
corpos trans (V, 2012), o transfeminismo, etc., buscam re-contextualizar a insero do corpo
tido, atualmente, como anormal, no seio social a partir de uma viso biologicista, atravs de
discursos que empoderem corpos e subjetividades.
contemporaneidade. As instituies de
controle, teorizadas por Foucault, no campo de gnero posta em prtica por Money e sua
tentativa de normalizar os corpos anormais, no eram um problema at, digamos, meados do
sculo XVIII, no campo religioso o sentido era mstico. Para Elmeri Zolla (1997)
Zolla faz uma extensa e interessante anlise sobre a androginia ao longo da histria com
anlises contundentes. A figura 9, foi retirada de seu livro, trata-se de uma gravura de Michel
Maier chamada Symbola Aureae Mensae de 1617 e mostra Alberto, o Grande, mestre de Toms
de Aquino, apontando para uma figura andrgina com um Y na mo na altura de suas duas
cabeas. O falo e a vagina em contraposio s cabeas feminina e masculina, bem como o
ventre e o trax, indicam a androginia da figura. De acordo com Zolla (1997) o Y o smbolo
que divide a essncia dos seres, representava a natureza masculina e feminina e, como tal,
eterna (p.42). Essa aura mstica implcita simbolicamente nos corpos trans diluda,
ressignificada e subvertida a partir da antropofagia queer e a sua esttica. Na esttica queer no
h espao para a ideia de sagrado, s h espaos para micro revolues dos corpos, das
subjetividades e das singularidades.
Essa viso metafsica, que atravessava os corpos andrginos, comea a ser transformada
a partir da Era Clssica. neste momento que a sacralidade do mundo comea a se transformar.
Essa cronologia da mudana ou essa arqueologia da transformao do saber sobre o corpo
tem no iluminismo a desnaturalizao de tudo aquilo que no faz parte da norma. Esse percurso
discutido por Thomas Laqueur (2001) em Inventando o sexo: corpo e gnero dos gregos a
Freud. O autor sustenta que no
Em linhas gerais, Laqueur demostra que o modelo da carne nica (sexo nico), onde
o corpo da mulher cis tido como inferior uma viso essencialmente crist que bebe na fonte
do mito de Ado e Eva, versando sobre Eva ter sido criada a partir de uma costela de Ado
no desapareceu mesmo durante a implementao, durante o iluminismo, do modelo de duas
carnes (dois sexos). Isso no quer dizer, entretanto, que no tenha havido uma mudana de
paradigma. O prprio autor deixa claro que
Michel Foucault em Os anormais (2010) argumenta que durante a Idade Clssica que
35
surge o que podemos chamar de uma arte de governar (p.42). justamente durante este
perodo de nossa histria em que se institu o governo das subjetividades atravs daquilo que
Foucault chamou de instituies de controle. Para o filsofo, nesse perodo que se estabelece
o governo das crianas, dos loucos, dos pobres e, depois dos operrios. tambm nesse perodo
em que o corpo passa a ser governado, especialmente o sexo e o gnero que aparentemente,
segundo Laqueur (2001), so conceitos que se auto reivindicam historicamente. Est dada
assim a criao do monstro humano, posteriormente do indivduo a ser corrigido e da criana
masturbadora (FOUCAULT, 2010), elementos que culminaro, no sculo XIX, conforme diz
Foucault, nos dispositivos que buscaram dominar as anomalias. Para Foucault (2010)
Essa utopia da verdade permear discursos epistmicos que, de certo modo, produziro
36
efeitos muito concretos para determinadas subjetividades, como vimos acima, por exemplo, na
medicina e no direito. Nesse sentido, surgiro, como veremos nos prximos captulos, os
feminismos, a teoria queer e o transfeminismo para trazer um pensamento crtico essas noes
de verdade que invariavelmente condicionaro determinadas subjetividades.
Ser que sexo e gnero at trs sculos atrs foram a mesma coisa? Aparentemente, a
resposta sim! Se ao longo dos sculos anteriores, especialmente a partir do iluminismo, houve
a diferenciao sexual, a nvel pragmtico o corpo no era mais uma instituio sagrada, mas
sim fruto de um processo biolgico racional a contemporaneidade vem se aprofundando na
crtica e propondo uma nova diviso: desta vez a diviso entre sexo (anatomia sexual) e gnero
(conjunto de prticas culturais) afirmando a radicalidade da diferena entre sexo e gnero afim
de desconstruir discursos que aprisionem uma multido: do micro da subjetividade multido
queer e antropofgica.
37
3. Antropofagia Queer
As duas epgrafes nos do pistas desses jogos de foras que buscam reconfigurar
paradigmas sociais, estticos, representacionais, polticos, ticos, etc. Quando Oswald de
Andrade lana o manifesto antropfago, na primeira metade do sculo XX, seu objetivo no
era exatamente negar culturas exteriores brasileira, mas tambm no apenas copi-las. No
essencializar uma demanda cultural exterior nossa, mas sim deglut-la! O manifesto
antropfago, o qual chamarei de antropofgico, um marco no modernismo brasileiro, uma
estratgia politico-cultural que criticava a elite brasileira, no sentido de sua submisso aos
pases tidos como desenvolvidos. Tratava-se de um aprofundamento da crtica iniciada na
Poesia Pau Brasil. Em linhas gerais, Oswald de Andrade propunha devorar culturalmente as
tcnicas artsticas importadas de modo a reelabora-las, repens-las e, assim, transform-las em
produto de exportao. A imagem que inspira Oswald o Abaporu de Tarsila do Amaral, sua
amada. Abaporu, deriva da lngua tupi-guarani e significa homem que come (Santos, et al.,
2015).
O manifesto uma espcie de resposta algumas questes trazidas pela Semana de Arte
de moderna de 1922 que aconteceu em So Paulo. Oswald de Andrade defendia uma liberao
do instinto primitivo atravs da retomada de certos valores como, por exemplo, o indgena e
a inocncia, os quais ele acreditava estar de algum modo presentes na cultura brasileira.
Portanto, significava uma atitude brasileira de devorao ritual22 dos valores europeus, a fim
de superar a civilizao patriarcal e capitalista, com suas normas rgidas no plano social e os
seus recalques impostos, no plano psicolgico (Candido, 1985 p. 43).
22
Para os ndios tratava-se de um ritual sagrado dado atravs da devorao ritual, uma prtica que, em linhas
gerais, consistia em se alimentar com a carne dos seus rivais de modo a incorporar sua virtude.
38
da teoria queer, ou da multido queer, teorizadas por Butler, Preciado e depois pelo
transfeminismo. Em subjetividade antropofgica, de Suely Rolnik (1998), essa aproximao
fica mais evidente, embora a autora no pense propriamente o queer. Sua narrativa sobre as
subjetividades nos permite estabelecer aproximaes sobre a relao entre multido de
subjetividades, ou a multido queer, e os processos culturais da antropofagia elencados por
Oswald de Andrade. Veremos isso com mais detalhes adiante. Com efeito, o queer um termo
carregado de ressignificaes e de reapropriaes. Segundo Helena Vieira (2015)
O queer desde sempre esteve margem, mas chegou o tempo em que essas minorias
passam a se organizar e pleitear um status quo de existncia, conforme diz uma das epgrafes
citas por Felix Guattari. O queer passa a questionar todo o cistema, o queer escancara as
violncias, desestabiliza hierarquias e prope novos significados de potncia subjetivas. Em
outras palavras, o queer uma aposta nas subjetividades de forma ilimitada. Nas palavras do
socilogo Richard Miskolci (2012);
23
Disponvel em http://www.revistaforum.com.br/osentendidos/2015/02/22/vamos-falar-de-transfeminismo/
39
Para Miskolci, surgiram trs novos movimentos sociais que de certa forma se
destacaram em seu ativismo social e poltico e eram formados pelos movimentos feministas
considerados de segunda onda, o movimento da populao negra responsvel pela
reivindicao dos direitos civis no sul dos Estados Unidos e o movimento homossexual.
Miskolci (2012) alega que;
Para o socilogo, a ideia pela qual esses movimentos eram percebidos como novos,
em certo sentido, incute uma espcie de eurocentrismo porque;
Miskolci (2012) conclui afirmando que, de modo geral, tais movimentos sustentavam
que o privado era poltico e que a desigualdade ia alm do econmico (ibid.). Na verdade,
comearam a perceber que existiam estratgias ou relaes de poder que incidiam nos modos
de vida e de existncia dos indivduos. Portanto, passam a reclamar no apenas o corpo, mas
40
tambm o desejo e a sexualidade. Diramos que, em certo sentido, comeam a perceber uma
dimenso, a nvel poltico e social, mais ampla sobre identidade que mais tarde enfrentar novas
criticas, como veremos durante os prximos captulos. Miskolci (2012) diz que;
Com efeito, ao discorrer sobre a antropofagia, Rolnik (1998) elenca, como termo
42
consiste em apenas produzir um contedo imagtico que traga cena pessoas trans ou pessoas
de orientaes sexuais diversas. Ela s possvel se esses trabalhos puderem funcionar como
questo de ordem simblica, social e poltica e que iro produzir sentidos singulares onde o
Norte a demanda que constitura um abalo nas normas visuais do cistema. Um sentido poltico,
social e esttico que emanam da imagem e atravessam discursos pr-concebidos sobre gnero
e sexualidade a partir de epistemologias, agencias essencialistas e normativas. Uma viso
apenas das obras como agenciamentos transparentes de questes no-estticas apenas uma
polarizao que redunda ao mesmo problema que a viso acadmica e ultrapassada da histria
da arte.
24
As fotografias de Diane Arbus foram bastante criticadas por Halberstam (2011). Segundo o autor, o trabalho de
Arbus tem uma forte tendncia em apresentar horrores (freaks). Ele afirma que Arbus`s photographs of
transvestites, midgets, and dwarfs do present the world as a freak show and the parade queer and ambiguous bodies
in front of the camera to illustrate de range and depth of freakish alterity (p.103). De fato, algumas imagens de
Arbus esto permeadas por esse olhar que em alguns momentos nos remete aos circos dos horrores do incio do
sculo XX, entretanto h de ser considerar que ao mesmo tempo que mostra esse mundo bizarro de
corporalidades distantes da ideia de normalidade, traz luz essas alteridades. Nesse sentido h um duplo
mecanismo de visualidade, logo, como afirma Barthes (2011), a fotografia uma evidncia intensificada,
carregada, como se caricaturizasse, no a figura do que ela representa ( exatamente o contrrio), mas sua prpria
existncia. A imagem, diz a fenomenologia, um nada de objeto. (p.123)
43
fotografado numa dinmica globalizada (porque agrega elementos mltiplos) que atravessada
por experincias diversas onde o gnero no necessariamente precisa estar de acordo com sua
inscrio sexo-anatmica. Essa contradio estabelece movimentos que convergem
infinitamente entre o identitrio e o no-identitrio. Uma fluidez que na construo pictrica
no slida, mas singular e depender de subjetividades anacrnicas. Que no respeitem
qualquer ordem temporal mimetizada em corpos traduzidos na norma. Isso fica evidente
tambm nos trabalhos de Cindy Sherman (figura 12) ao travestir-se de homem. A artista
interpreta um arqutipo de pinturas famosas na histria da arte, criando uma atmosfera de
esteretipos onde o olhar transforma-se em algo idealizado. Rolnik (1998) continua;
novelas que retratem o amor entre dois homens e/ou duas mulheres ou ainda programas de TV
que tematizem questes LGBT, mas que, de acordo com sua potncia, chegam nas casas das
famlias tradicionais. Citamos como exemplo, RuPauls Drag Race e Glitter: em busca de um
sonho (um programa exibido pela TV dirio na regio norte do Brasil). evidente que podemos
levantar uma srie de criticas ao modus operandi e ao escrnio das subjetividades trans e drags,
sobretudo em Glitter. Ainda h um longo caminho a percorrer para levar informao com
qualidade. No estamos afirmando que tais programas, por vezes, no operem na lgica dos
freaks shows. Contudo, h de se reconhecer que muitas das travestis ou transexuais ainda no
esto inseridas no mercado formal de trabalho (o que no propriamente o caso do primeiro
programa citado) e, portanto, a participao delas est condicionada a possibilidade de
receberem alguma renda. H, portanto, uma micropoltica dos corpos. O movimento inicia-se
pelas margens e infinito.
O manifesto antropfago, embora fosse uma resposta s representaes de modelos
superados de raa e etnia, nasce a partir de um imperativo intelectualizado. A teoria queer
embora busque romper com estruturas hegemnicas do sistema sexo-gnero nasce tambm a
partir do mesmo paradigma intelectualizante. Na antropofagia queer o sistema binrio cis e
trans responde mesma lgica na qual brasileiros so to deseuropeus, como desndios e
desafros (Ribeiro apud Rolnik, 1998, p.133) porque o critrio de seleo para o ritual
antropofgico na cultura no o contedo de um sistema de valor tomado em si, mas o quanto
funciona, com o que funciona, o quanto permite passar intensidades e produzir sentido (ibid.).
Segundo Rolnik (1998);
A poltica queer
estadunidense, a partir da dcada
1990, est intrinsecamente vinculada
no s aos movimentos feministas,
como tambm s polticas
reivindicadas pelo movimento negro
que surgiram dcadas antes e que aos
poucos foram sendo queerificadas.
Um exemplo dessa queerificao
o que foi documentado em Paris is
Figura 15 - Peppe LaBeija - Em uma das cenas de Paris is Burning
Burning, como citamos brevemente
no incio desse captulo. Uma multido queer criativa dos subrbios nova iorquino, da dcada
de 1980, que atravs dos acontecimentos dos bailes buscam estabelecer uma interessante
49
poltica de emancipao e valorizao daquilo que at ento era considerado uma subcultura.
No entanto, o processo de formao desses grupos polticos funciona um pouco diferente do
que acorreu na Europa, por exemplo. Paul Beatriz Preciado (2011) diz que;
sentidos entre os movimentos queer que passam a se espalhar pelo mundo. Logo, a ideia de
multido e antropofagia salta aos olhos atravs de corpos
negros, corpos trans, corpos tambm sexuados, corpos
obesos, corpos que no respeitam padres socialmente
definidos. Enfim, corpos como potncia. Aqui a
experincia emprica de transexuais, travestis,
homossexuais, pessoas no binrias, etc., fonte
inesgotvel de pistas sobre modos de vida empurrados
para escurido do seio social. do gueto onde muitas
vezes surgem modos e performances to criativos que
invariavelmente sero cooptados pelo mainstream. Paris
Figura 17 - Del LaGrace Volcano, Mo B Dick,
1998
50
Figura 18 - Aiyyana Maracle, Death in the shadow of the umbrela, performance realizada no Queer Arts Festival em
Vancouver, 2015, disponvel em https://vimeo.com/137714829
Tais bailes surgem pautados no desejo produzido a partir das imagens da revista Vogue
que estampava mulheres (cis), loiras, brancas e magras reforando um certo tipo de esteretipo
que diz quem e o que belo (No estou questionando a possvel objetificao de mulheres
nesse trabalho), alm de ditar comportamento e vestirio a partir dos grandes nomes da moda.
De qualquer forma, esses bailes questionavam atravs de parodias das faces e dos
movimentos automatizados das modelos nas capas de revista, nas propagandas a tradicional
famlia de classe mdia e alta da sociedade branca nova-iorquina, apresentando performances
caricatas vistas sob a tica dessa subcultura. Esses bailes produziram um abalo to
avassalador que extrapolou os muros do subrbio e foram acoplados ao mainstream da moda e
da msica atravs de Madonna e sua Vogue e outros. Esse documentrio considerado um
marco na visibilidade LGBT nos Estados Unidos, sendo um dos primeiros a apresentar uma
realidade crua misturando a potncia da performance com as experincias de vidas
completamente marginalizadas, ofuscadas at ento pela estrutura patriarcal e socioeconmica.
Assim, podemos vislumbrar a queerificao do corpo como critica poltica prpria ideia de
51
identidade e escancara a fico, ou melhor, o fracasso das tcnicas do governo dos corpos.
Preciado (2011) afirma que;
Esse imperativo trazido cena em Paris is Burning convoca toda e qualquer minoria a
juntar-se e tornar suas vozes audveis. Na esttica queer, a cena a prpria visibilidade elencada
a partir de dispositivos de subverso s normas, tradies e ao corpo. a multido que emana
a partir das mais de 300 fotografias de Andy Warhol. So os atores e a dana das visibilidades
em Nan Goldin, etc.
25
Termo elencado pelo artista gender fluid pois prefere no se definir a partir de nomenclaturas medicalizantes,
que segundo o ele, limitam e no correspondem sua experincia emprica, sua vivncia. Para mais informaes
sobre Del LaGrace Volcano visitar sua pgina na internet http://www.dellagracevolcano.com/index.html.
26
Para o filsofo Paul Beatriz Preciado as tecnologias do corpo sexual no sculo XX consistem na medicalizao
e tratamento das crianas intersexos, na gesto cirrgica da transexualidade e na reconstruo e aumento da
masculinidade e da feminilidade normativas, tambm na regulao do trabalho sexual pelo Estado. Tais
tecnologias emanam do mdico John Money que, segundo Preciado, comea a utilizar a noo de gnero para
dar conta da possibilidade de modificar cirrgica e hormonalmente a morfologia sexual das crianas intersexos e
das pessoas transexuais. Money o Hegel da histria do sexo. Essa noo de gnero constitui um primeiro
momento da reflexividade (e, portanto, uma mutao irreversvel em relao ao sculo XIX). Com as novas
tecnologias mdicas e jurdicas de Money, as crianas intersexuais, operadas no nascimento ou tratadas durante
a puberdade, tornam-se as minorias construdas como anormais em benefcio da regulao normativa do corpo
da massa straight. Essa multiplicidade de anormais a potncia que o Imprio Sexual se esfora em regular,
controlar, normalizar (Preciado, 2011, p.13). Sua argumentao continua dizendo que O ps-monesmo para
o sexo o que o ps-fordismo para o capital. O Imprio dos Normais, desde os anos 1950, depende da produo
e da circulao em grande velocidade do fluxo de silicone, fluxo de hormnio, fluxo textual, fluxo das
representaes, fluxo de tcnicas cirrgicas, definitivamente, fluxo dos gneros. Com certeza, nem tudo circula de
maneira constante e, sobretudo, os corpos no retiram os mesmos benefcios dessa circulao: nessa circulao
diferencial de fluxos de sexualizao que se desempenha a normalizao contempornea do corpo. Isso nos traz
um lembrete oportuno de que o conceito de gnero , antes de tudo, uma noo sexopoltica, mesmo antes de se
tornar uma ferramenta terica do feminismo americano. No por acaso que, nos anos 1980, no debate entre
feministas construtivistas e feministas essencialistas, a noo de gnero tornar-se-ia o instrumento terico
fundamental para conceitualizar a construo social, a fabricao histrica e cultural da diferena sexual, diante
53
da reivindicao da feminilidade como substrato natural, como forma de uma verdade ontolgica. (Preciado,
2011, p. 13)
54
Um outro trabalho instigante o de Nan Goldin em The other side, uma srie de
fotografias onde a artista estadunidense, apresenta um pouco do universo transgnero. As
fotografias de Goldin, parecem estar sempre imersas numa atmosfera de liberdade sensitiva e
corporal jamais imaginadas. O corpo trans, no trabalho de Goldin, pode ser o corpo de qualquer
pessoa desde que mesma esteja questionando normas que aprisionem potncias do corpo
desviante. interessante notar uma espcie de familiaridade da artista com seus
personagens. Nan Goldin fotografava seus amigos, seja em poses erticas, seja nos bares ou
55
multido queer como uma multido de patticos, de corpos desprezveis, Goldin inverte a
ordem deste discurso. Ela mostra a beleza e o triunfo desses corpos e as imagens destacam no
uma disforia de gnero, mas sim uma euforia de gnero. Para ns, as imagens trazem uma
questo central; o que pode um corpo? Alm disso, elas apresentam uma questo paralela a qual
confronta diretamente o espectador com um simples enunciado; so apenas os corpos cis,
heterossexuais, brancos e ocidentais que podem trepar, drogar-se, etc.? Ou seja, so os nicos
legitimados aos prazeres diversos? Goldin nos mostra mundos paralelos em constante atrito. A
fotografia de Goldin, onde Misty a personagem (fig. 23), por exemplo, mostra ao fundo os
56
esses dois extremos coexistindo. O sorriso do policial poderia representar toda uma instituio
normativa que controle de corpos priori e a presena da drag em espaos pblicos luz do
dia a resistncia. Embora o sorriso do policial no seja propriamente um deboche, mas sim,
talvez, um gesto de complacncia, a prpria instituio que ele representa, o Estado, tem sido
alvo constante das crticas queer, no que diz respeito construo de polticas pblicas, de
acesso ao mercado de trabalho formal, de possibilidade de insero no sistema educacional, etc.
Nesse sentido, as paradas LGBT tem sido fundamentais para reivindicao por polticas LGBT.
H, portanto, um simbolismo nessa imagem. Essa coexistncia antropofgica, as minorias
agora tambm querem e iro ocupar os mesmos espaos.
Esse olhar para o chamado terceiro mundo e suas questes polticas e sociais,
resultantes de sistemas coloniais perpetrados por pases europeus, uma ferramenta que
atrelada aos saberes subalternos podem nos confrontar no que diz respeito s nossas
perspectivas acadmicas e nossos modos de ver e fazer. Nesse sentido a antropofagia queer,
58
tema central deste trabalho, atrelada ao pensamento transfeminista nos proporciona novos
paradigmas a partir de outras construes imagticas tendo como origem aquilo que foi
iniciado por artistas cis e continua em processo, desta vez por artistas trans, afim de construir
no s um novo saber sobre esses corpos subalternos, mas uma esttica que fale sobre esses
corpos. Sendo assim;
27
Colonizar pessoas no necessariamente est relacionada ao processo de colonizao que pases do dito terceiro
mundo sofreram. O eixo central aqui a perspectiva da colonizao de identidades e subjetividades muito bem
explorada por Viviane V em seu artigo Pela descolonizao das identidades trans (2012).
59
Com efeito, os estudos ps-coloniais surgem como uma recusa hegemonizao, frutos
tambm de processos de globalizao, de pases no ocidentais 28 . O mito da superioridade
europeia serviu para inferiorizar e estabelecer hierarquias sociais, raciais e identitrias (Bahri,
2013). Portanto, penso ser importante pensar o ps-colonialismo em estudos de histrias da arte
em toda e qualquer universidade fora e na Europa.
28
Aqui estou considerando no-ocidental pases que no compe os pases europeus-colonizadores. De modo
que no levo em considerao o sistema geopoltico em si, mas sistemas econmicos e intelectuais que
historicamente produziram assujeitamentos de forma verticalizada.
29
Em linhas gerais o feminismo capaz de dialogar com setores minoritrios da sociedade, os quais so excludos,
afim de traz-los para cerne da discusso sobre desigualdades, processos de criminalizao e normatizao. Ser
feminista interseccional significa perceber, por exemplo, que nem todos os homens podem ser tratados da mesma
maneira. Homem negro sofre racismo e pode sim ser discriminado por uma mulher branca nesta questo. Da
mesma forma que um homem negro pode ser machista com uma mulher branca. Mulheres no so sempre vtimas
e podem sim oprimir quando esto em uma posio de privilgio.
Ter isso em mente significa que no existe machismo? No, significa que todas as mulheres sofrem machismo,
mas, dependendo de sua posio social, podem oprimir outros grupos. Essa perspectiva de que todas as mulheres
sofrem igualmente desumana, porque essa universalizao da categoria mulheres foi feita tendo como base uma
mulher branca, heterossexual e de classe mdia. O racismo cria uma hierarquia de gneros e ao dizer que todas
sofremos iguais, quando sabemos que no, perpetuamos essa representao que deixa de fora muitas mulheres e
cria uma hierarquia de vidas; escolhe quais vidas devem ser representadas e consequentemente salvas.
Da mesma forma preciso perceber que nem todos os homens sofrem de maneira igual. A realidade de um homem
branco e de classe mdia no a mesma da de um homem negro de periferia. Vivemos num Estado genocida que
assassina homens negros, em que milhares so vtimas da violncia policial. Essa viso simplista de que mulheres
e homens sofrem de modo igual precisa ser superada. Falta um olhar interseccional (Ribeiro, 2015).
60
parece superada. Em funo das obras que foram/esto sendo produzidas com o propsito de
rasgar, romper com algo institucionalizado que produz, entre outras coisas, assujeitamentos.
Ela, a identidade, funciona como enunciao ou uma prtica discursiva que produz efeitos
muito concretos em corpos e subjetividades. A ideia de identidade em si uma ideia de
diferena que precisa ser enfrentada do ponto de vista hermenutico, pondo em operao
contextos culturais e geopolticos, tal qual fez os artistas e pensadores do primeiro momento
antropofgico na arte moderna brasileira. Corremos o risco de, ao tratar de temas identitrios,
discorrer sobre diferenas e sistemas hierrquicos que condicionam alteridades e reforam
paradigmas e esteretipos. Por exemplo, ser mulher (cis) no Brasil diferente do que ser mulher
na Europa e, por conseguinte, na China, ou Angola, e se for negra e pobre h outras tantas
questes que se misturam. Do mesmo modo que ser mulher trans no Brasil diferente do que
ser mulher trans em outros pases dado contextos especficos de violncia30, acesso aos servios
bsicos, ao mercado formal de trabalho, etc. No entanto, o que devemos considerar, no campo
da diferena a representao que essas mulheres tm em contextos culturais.
Nesse sentido, ao tomarmos a arte como exemplo, mulheres cis e trans cumpriro papis
especficos; as primeiras tero os corpos objetificados (mas no perdero o status de mulher
embora isso no signifique que no h violncia) e as segundas figuraro nas representaes
exotificadas (portanto no mulheres ou homens, logo no humanas da ordem do algo/ coisa;
como mticas, apotropaicas, demonacas, exticas ou abjetas). Por exemplo, como algumas
imagens das hijras na ndia, como a mulher barbada, e as prprias representaes andrginas
ao longo da histria da arte, etc.
Esse carter ficcional, essa mimese performativa a qual fala Butler , esses postulados
que do forma ao gnero e as representaes de gnero sero exterminados na esttica queer,
30
De acordo com o Projeto de Monitoramento do Assassinato de Pessoas Trans (TMMP Trans Murder
Monitoring Project), o Brasil o pas onde mais mulheres trans so mortas no mundo. Disponvel em
http://tgeu.org/tmm/
61
Lili Elbe foi uma pintora/artista - mulher trans - cuja vida virou filme recentemente e
ser protagonizado por um homem cisgnero (Eddie Redmayne) e se chamar A garota
dinamarquesa. Infelizmente no consegui localizar muitas de suas prprias obras, a maioria
das que esto disponveis so de Lili com/ ou pintada por sua esposa Gerda Wegener. O
movimento trans questionou o motivo pelo qual escolheram um homem cis como protagonista
e no uma mulher trans dado que diversas mulheres trans so atrizes, inclusive ocupando papis
importantes em sries na TV. A resposta do diretor foi que;
31
Tokenizar quando uma pessoa, acusada de alguma opresso, j vem com a resposta pronta, mas eu at tenho
amigos que so, como uma tentativa de invalidar a crtica que est recebendo. (Beira, 2015)
63
Salman Rushdie (1995), Deepika Bahri (2013) tratam do essencialismo como dispositivo que
acompanha a guetizao ou marginalizao de certas subjetividades. Para Bahri (2013)
chamadas questionveis de gosto duvido do tipo fulana de tal vai mudar de sexo, e as figuras
mistificadas das hijras32.
esteretipos essencialistas podem ser e tm sido usados para inferiorizar e privar de direitos,
criar hierarquias raciais e explorar (Bahri, 2013 p. 670). Diversos foram os mecanismos
utilizados para manuteno de uma poltica essencialista do cistema, seja atravs das pinturas
que tratem e naturalizem a questo do olhar sobre a mulher cisgnero, seja atravs de outros
meios para exerccio social que ecoem o patriarcado. Contudo, a questo do essencialismo
to patente no modus operandi artstico e social que mesmo artes ditas feministas
operacionalizam tal dispositivo quando, por exemplo, no contemplava questes relativas
mulher negra ou representaes que no exprimiam uma noo mais ampla de gnero.
Estratgias de resistncia ao regime visual dominante baseado na postura do olhar ativo
feminino (Marques, 2014 p. 68) tm sido colocadas em prtica desde fins do sculo XIX.
Entretanto, dadas as circunstncias temporais, tais estratgias continuaram respondendo a um
binrio de gnero eloquente; o corpo sexuado cis! Porm, as prticas de resistncia
perpetradas por mulheres cisgnero foram fundamentais para construo no s de um novo
olhar mas, tambm, para um novo saber a respeito dos corpos, sexualidades e gneros.
32
Para alm das questes histricas sobre castas indianas, na contemporaneidade um movimento poltico das
prprias hijras tem buscado descontruir a lgica segregativa e mistificada das mesmas, para saber mais ver o
documentrio Mistrios da Sexualidade disponvel em https://www.youtube.com/watch?v=HbHsMQYNkaU.
65
de gnero.
Sendo assim, uma histria da arte transfeminista ps-colonial aquela capaz de produzir
questionamentos e crtica a partir da perspectiva que coloca em xeque modelos cis-hegemnicos
e eurocntricos do fazer artstico que, de certo modo, condicionam modos de ver, de pensar e
produzir conhecimento. Nesse sentido, reforo novamente a afirmao de Preciado quando ele
afirma que o feminismo no um humanismo. Contudo, ele no fala de todo feminismo. H
feminismos humanistas que embora lutem pela igualdade de gnero ainda se mantm atrelados
a certas partes da tradio acadmica e artstica. O feminismo radical e queer por exemplo, no
seriam humanistas exatamente por ter como proposta poltica normas institudas e, nisso, a
tradio no caberia. Ou seja, esses feminismos rejeitam tanto a autoridade quanto a tradio.
Portanto, quando Erwin Panofsky (2009) defende uma histria da arte como uma disciplina
humanstica, dada as circunstncias do momento em ele escreve isso, de alguma forma essa
afirmao no se traduz no esboo de histria da arte que estamos tratando aqui. Uma histria
da arte que no existe mais porque a tradio no mais uma questo, ela foi superada! Torna-
se esgotada diante dos processos antropofgicos queer porque se o humanista opera na rejeio
autoridade, mas consoante tradio, a antropofagia est justamente se contrapondo, ou
melhor, se posicionando diante de uma tradio que normatiza! Assim, a histria da arte
68
transfeminista fundamentalmente indisciplinar, muito prxima dos moldes daquilo que Luiz
Paulo da Moita Lopes (2006) defende para Lingustica Aplicada. Assim, as singularidades se
amplificam atravs de estticas que radicalizam a prpria noo de obra, como o faz a esttica
queer.
Os corpos da multido queer so corpos possveis. Como vimos eles rompem com
qualquer estrutura de opresso, sacralidade ou mistificao para inscreverem-se no desejo, na
poltica e no campo das visualidades. Entendemos que Goldin e Volcano so dois artistas que
recondicionam essas posies de subalternidade e elencam visualidades potentes. Inicialmente
esse captulo foi pensado a partir da perspectiva dialtica, contudo notamos que a
perspectiva dialtica no suficiente para dar conta das imagens, e sobretudo dos corpos, que
estamos discutindo nesse trabalho, justamente porque a dialtica pressupe uma dicotomia;
69
algo dado a priori, no sentido essencializante. Talvez tenha sido por isso que Deleuze (2001)
se posiciona no sentido de forjar um pensamento crtico dialtica. Em linhas gerais, a dialtica
prope uma materializao - no sentido do inteligvel e o que se prope aqui justamente
uma rematerializao crtica no sentido de apropriao da norma para produo, para o
forjamento de ideias-chave que nos permitam pensar a esttica queer no seu sentido mximo
de potncia. Julgamos que Volcano e Goldin lograram xito ao trazer superfcie esses corpos,
essas imagens da imagem.
33
Na realidade, essa relao passa a ser questionada, sobretudo, a partir do modernismo europeu e nas
experimentaes com os modos de pensar tcnicas de ver (Crary, 2012 e Frascina, Blake, Fer, Garb & Harrison,
1998)
70
atravs desse arcabouo terico que podemos pensar no s a arte produzida por
Volcano e Goldin, como a prpria experincia subjetiva contempornea. Aos refletirmos sobre
esses indivduos que compem o que estamos tratando como multido expressam modos
de subjetivao especficos porque traduz uma certa captura de subjetividade dentro de um
determinado sistema de cdigos[...] (ibid). Esse movimento infinito entre dentro e fora, que
pode ser lido se quiser como a oscilao no homognea na estrutura que regimenta as
normas de gnero e sexualidade, entra em coliso o tempo inteiro. O atrito, por sua vez,
produzir fissuras na prpria norma. No entanto, essas fissuras s podero ser compreendidas
71
com o pensamento crtico exterior ideia de essncia. Est dada a relao direta com a epgrafe
deste captulo.
as coloca bem diante dos nossos olhos. Esse o dialogo que ela
prope, a dialtica entre mundos, no ocidente e oriente, mas
os mundos divididos pela norma. Goldin os sobrepe, fora a
ruptura hegemnica e introduz as transgeneridades como
potencias, mais que isso como forma de desejo, exuberantes,
belas! O que a artista est propondo na verdade uma
rematerializao dos corpos atravs da dobra do gnero.
Segundo Judith Butler; Figura 32 - Nan Goldin, Untitled,
1992
Por sua vez Volcano apresenta todo seu universo por uma tica bastante peculiar. Toda
violncia que Preciado chama de tecnologias de gnero que como vimos tem sua gnese no
monesmo. De fato, os processos mdicos so extremamente violentos e Volcano,
aparentemente faz questo de denunciar tais processos em parte de sua obra. O protocolo
mdico, linhas gerais, consiste em classificar o corpo do nascituro em macho ou fmea.
Entretanto, em alguns indivduos tal classificao no to simples em funo da (de) formao
de suas genitlias. O simples ato de riscar num papel feminino ou masculino para que se
tenha, nos moldes da nossa cultura, um documento oficial o qual dar inicio a todo o processo
de registro civil nem sempre to fcil. Preciado em Manifesto Contrassexual (2014) nos
conta que toda prerrogativa residir em torno do quo real o rgo do nascituro. Segundo
ele;
O autor demostra que, na realidade, isso est condicionado um critrio utpico que,
em linhas gerais, consistem em medir o clitris/pnis para se chegar um consenso.
Dependendo de quantos milmetros possua tal conformao anatmica, o beb intersexo ser
considerado menino ou menina. E, a partir desse momento, que uma srie de cirurgias se
iniciaro, bem como os processos de reposio hormonal. Ento percebam que retornamos ao
tema do monesmo. Preciado explica que
34
Disponvel em https://www.youtube.com/watch?v=HbHsMQYNkaU
35
ver Testo Yonqui de Preciado, 2008
76
Por fim, o que entra em cena a partir da esttica queer, alm da multido de corpos que
ela elenca, a prpria noo poltica de construo de sujeitos. Uma construo que no
depender exclusivamente de sujeitos trans, nem cis, mas de um conjunto de prticas cuja
engrenagem est localizada na deglutio da norma, o que tratamos aqui como antropofagia
queer. As visibilidades, as prticas sociais, os movimentos, os manifestos, as performances, as
transformaes corporais, as violncias... tudo entrar em jogo, em cena afim de ressignificar
os meios hegemnicos pelos quais o cistema vem se sustentando discursivamente,
epistemologicamente, etc. A antropofagia queer pode soar utpica, mas ela surge como mais
um meio de questionamento, ou melhor, uma forma de escancarar a fico e a perversidade da
77
4. Concluso
para trazer ao plano da visualidade um determinado tipo de sujeito, um sujeito queer, um sujeito
historicamente afastado de espaos institucionais de saber e de poder. A fora da antropofagia
queer capaz de produzir abalos sistemticos no cistema; instituies hegemnicas e modos
de produo de subjetividade. Produz no s visibilidades, mas reflexes, questionamentos,
deixa o espectador intrigado, ecoa como potncia. Potncia de corpos, multido de corpos! A
multido est marcando sua presena nas artes visuais, no teatro, no cinema, nas passarelas de
moda com Marco Marco e suas modelos fora do padro, na msica com Titica, nas artes com
Volcano, Kama e outros, nas revistas, nos documentrios, nas universidades...
Artistas cis e trans esto produzindo obras cuja funo tambm pode ser lida como
desconstruo de normas. Uma das coisas que notamos foi a dificuldade ao acesso de material
no campo da histria e critica de arte. A maior parte da bibliografia trazida nesse trabalho
exterior a esse campo do saber. Por que ser? preciso desconstruir para construir; construir
novos saberes, novas visualidades; visibilidades! Notamos assim, que ao se apropriarem de
modos ou requisitos de produo institucionalizados, como por exemplo a pintura ou fotografia,
esses artistas operacionalizam uma espcie de antropofagia. Deglutem, mastigam, ingerem os
processos institucionalizados como mtodo, como estratgia, afim de expelir visibilidades no
normativas e se inserirem em espaos hegemnicos ocupados historicamente por foras
patriarcais. Por exemplo, fotografa-se uma critica mimeses atravs de processos tradicionais de
fotografia, mas no se opera na essencializao da mimeses, sabem por que? Porque para o
queer a mimeses est relaciona prpria fico, o que se faz a crtica dessa fico. A diferena
est posta na relao espectral da cultura que, em linhas gerais, produz outras significaes que
extrapolam os campos dos discursos comuns e subjetivados.
operando nessa perspectiva antropofgica que a multido queer e a esttica queer pe
em crise a prpria noo de obra, do que produzir arte e, alm disso, a prpria noo do que
gnero, a prpria noo de que sujeito aquele que reitera determinados padres em suas
performatividades! No se trata apenas em criar conceitos contemporneos afim de dar conta
desse momento ps-identitrio, mas colocar em crise, em promover a destituio da aura de
obra prima e da aura cisheterocntrica de legitimidade de corpos, de subjetividade e de
apropriao de espaos institucionais de poder. Nesse sentido a modernidade e a
contemporaneidade se encadeiam so acontecimentos que no devem ser compreendidos
isoladamente porque propem uma crtica cada vez mais intensa da prpria natureza seja no
sentido de produo visual de obra (na modernidade), seja no sentido essencialista do gnero e
sexualidade cuja a crtica vem sendo aprofundada desde o final do sculo XX e
fundamentalmente nas primeiras dcadas do sculo XXI. No h essncia que anteceda, ou
80
melhor, que oriente um modus operandi. O que h so crises que iro produzir
questionamentos diversos, rizomticos, contnuos!
Portanto, h uma espcie de continuidade (no entenda como evolucionismo) na esttica
antropofgica queer porque o que se inicia no moderno levado s ltimas consequncias no
contemporneo, uma espcie de anarquismo total nas artes, nos movimentos sociais, nos
corpos! A multido queer conclama sua fora atravs de processos que produzem outras
visibilidades!
No campo das artes, em princpio, as imagens, de modo geral, retratavam temas bblicos,
sagrados e ou/msticos. Com o advento do modernismo, uma parcela inumana passa a figurar
os quadros, as fotografias. neste momento de democratizao" da arte que comeam a surgir
personagens abjetos. importante frisar que a histria da arte sempre respondeu interesses
polticos, sociais e econmicos. Os sculos XVIII e XIX caracterizam tempos de profundas
transformaes sociais; o primeiro foi classificado como sculo das luzes e o segundo, podemos
dizer, que ecoou e concretizou todas as transformaes iniciadas no anterior: cientficas,
tecnolgicas, sociais, etc. Comeam a surgir personagens abjetos, a burguesia intensifica seus
interesses econmicos e as revolues francesa e industrial transformam dramaticamente a
sociedade. Com isso o gueto passa a receber o holofote dos artistas que j no estavam mais
interessados no rigor classicista da forma e da harmonia. O interesse era trazer um outro olhar
ao palco da arte: a puta, o sexo, o progresso, etc. , portanto, no sculo XX, com Duchamp e
outros pioneiros que intensas transformaes so tomadas como propriedade para esvaziamento
das normas pictricas e j na segunda metade do sculo, o gnero e todas as implicaes que
partem dele tomam o front de batalha. Se no sculo XIX as teorias deterministas de Cesare
Lombroso 36 , por exemplo, eram subterfgios para marcar alteridades, no sculo XX, o
monesmo atravs das tecnologias de gnero fbrica de subjetivao constroem uma (ir)
realidade em corpos anormais. Mas uma efervescncia comear a ser rizomatizar e produzir
resistncia! Essa efervescncia tem incio na dcada de 1960 quando diversas mulheres cis
comeam a se organizar em diferentes frentes e reas do saber; o patriarcado comear a sentir
abalos de maneira cada vez mais intensa. importante que se tenha mulheres cis ocupando
espaos institucionalizados de poder. Contudo mais importante ainda se essas mulheres
puderem operar com perspectivas amplas de gnero. para preencher uma lacuna deixada pelo
feminismo que surge a teoria queer e pouco depois o transfeminismo. Agora uma multido de
36
Lombroso considerado pai da antropologia criminal. Em linhas gerais, sua teoria problematizava a identidade
do criminoso atravs de traos fsicos e raciais. Tratava-se na verdade de uma teoria racista que condicionou o
negro um status de perigoso, portanto passvel de correo e isolamento social.
81
corpos pretos, brancos, alto, baixos, gordos, gays, trans. enfim, uma multido de anormais
gritam juntos contras opresses cotidianas. Produzem manifestos, produzem vdeos-
documentrios, ocupam espaos acadmicos de privilgios, criam fotografias, criam arte... uma
multido que, parafraseando Volcano, nomeia a si mesmo! O bordo meu corpo, minhas
regras se intensifica e agora produzem visibilidades. No h mais seres msticos, no h mais
circos para alteridades! O que h so estruturas sexopolticas que tentam reviver um passado
de condicionamento de subjetividades que esto falidas! O campo artstico incorporou,
aparentemente, em definitivo essa nova demanda. Cada vez mais mulheres cis vo ocupando
espaos na produo pictrica em diversos nveis, cada vez mais homens e mulheres trans vo
se tornando protagonistas de suas prprias histrias e disputando espaos hegemnicos. Ainda
h um longo caminho a ser percorrido; como maior visibilidade, direitos civis, equiparao de
salrios, etc., mas na medida em mulheres cis ou trans se inserem nos espaos de arte, as
visibilidades tornam-se mais potentes! uma forma de visibilidade sempre poltica. A arte
um campo da cultura capaz de tencionar paradigmas, a tenso est dada a partir da esttica
queer e tudo que dela possa surgir. Mas ainda precisamos que essas imagens se tornem mais
acessveis, necessrio desconstruir saberes que ainda bebem do conhecimento que se produziu
no sculo XIX. Precisamos estabelecer, portanto, outros discursos, discursos contra
hegemnicos.
De modo que toda uma estrutura de opresso patriarcal, que comeou a ser questionada
por mulheres revolucionrias e dcada aps dcada foi reverberada, sofra um profundo e
definitivo abalo. O cistema, produtor de processos hegemnicos de subjetivao, aparentemente
comeou a ruir! a fora da antropofagia queer, a fora de uma multido!
82
Bibliografia
Andrade, Oswald de. 1976. O manifesto antropfago. [A. do livro] Gilberto Mendona
Teles. Vanguarda europia e modernismo brasileiro: apresentao e crtica dos principais
manifestos vanguardistas. 3. Petrpolis : Vozes, 1976.
Argan, Giulio Carlo. 1992. A arte moderna: do iluminismo aos movimentos
contemporneos. So Paulo : Companhia das Letras, 1992.
. 1994. Prembulo ao estudo da histria da arte. Lisboa : Estampa, 1994. pp. 13 - 42.
Bahri, Deepika. 2013. Feminismo e/no ps-colonialismo. Estudos Feministas. maio - agosto
de 2013, pp. 659 - 688.
Barthes, Roland. 2011. A cmara clara: nota sobre a fotografia. Rio de Janeiro : Nova
Fronteira, 2011.
Beauvoir, Simone de. 1970. O segundo sexo: fatos e mitos. So Paulo : Difuso Europia do
Livro, 1970.
Beira, Gabriella. 2015. Glossrio de termos do feminismo. Capitolina. [Online] 14 de julho
de 2015. [Citado em: 19 de dezembro de 2015.]
http://www.revistacapitolina.com.br/glossario-de-termos-feminismo/.
Berbara, Maria e Fonseca, Raphael. 2011. De Akhenaton a Duchamp: arte, transexualismo
e androginia . 20 Encontro Nacional da ANPAP. 2011, pp. 2236 - 2252.
Berger, John. 1999. Modos de ver. Rio de Janeiro : Rocco, 1999.
Bhabha, Homi K. 2013. O ps-colonial e o ps-moderno. A questo da agncia. O local da
cultura. Belo Horizonte : UFMG, 2013, pp. 275 - 314.
Bonilha, Caroline Leal. 2011. Memria, silncia e subverso da categoria de gnero atravs
das sries fotogrficas de Nan Goldin. 5 Seminrio Internacional em Memria e Patrimnio.
05 - 07 de 10 de 2011.
Borba, Rodrigo. 2013. A linguagem importa? Sobre performance, performatividade e
peregrinaes conceituais. Rio de Janeiro : UFRJ, 2013.
Brito, Ronaldo. 2005. O moderno e o contemporneo: o novo e o outro novo. Experincia
Crtica. So Paulo : Cosacnaify, 2005, pp. 74 -88.
Butler, Judith. 2010. Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do "sexo". [A. do livro]
Guacira Lopes Louro. O corpo educado: pedagogias da sexualidade. 3. Belo Horizonte :
Autntica, 2010, pp. 151 - 172.
. 2008. Problemas de gnero: feminismo e subverso da identidade. Rio de Janeiro :
Civilizao Brasileira, 2008.
Campos, Luana Brant. 2008. O CINEMA NAS POTNCIAS DO FALSO DEVIR E
HIBRIDIZAES. travessias: pesquisa em educao, cultura, linguagem e arte. Projeto
Saber, 2008, Vol. 2, 1.
Candido, Antnio. 1985. Literatura e sociedade. So Paulo : Nacional, 1985. p. 43.
Candido, Pedro e Reinaldo, Gabriela Frota. 2012. Corpo, beleza e subverso: o olhar do
fotgrafo Joel-Peter Witkin sobre a arte clssica. Intercom Sociedade Brasileira de Estudos
Interdisciplinares da Comunicao: XIV Congresso de Cincias da Comunicao na Regio
Nordeste. 14 - 16 de 06 de 2012, pp. 1 - 13.
Corbin, Alain, Courtine, Jean-Jacques e Vigarello, Georges. 2012. A Histria do Corpo:
da renascena s luzes. Petrpolis : Vozes, 2012. Vol. 1.
. 2011. Histria do corpo: as mutaes do olhar. O sculo XX. Petrpolis : Vozes, 2011.
Vol. 3.
. 2008. Histria do corpo: da revoluo grande guerra. Petrpolis : Vozes, 2008. Vol. 2.
Crary, Jonathan. 2012. Tcnicas do observador: viso e modernidade no sculo XIX. Rio de
Janeiro : Contraponto, 2012.
Debord, Guy. 1997. A sociedade do espetculo. Rio de Janeiro : Contraponto, 1997.
83
Vieira, Helena. 2015. Teoria queer, o que isso? Os entendidos. [Online] 07 de junho de
2015. [Citado em: 17 de janeiro de 2016.]
http://www.revistaforum.com.br/osentendidos/2015/06/07/teoria-queer-o-que-e-isso-tensoes-
entre-vivencias-e-universidade/.
VIEIRA, HELENA. 2015. Vamos falar de transfeminismo? Revista Frum. [Online] 22 de
fevereiro de 2015. [Citado em: 09 de janeiro de 2016.]
http://www.revistaforum.com.br/osentendidos/2015/02/22/vamos-falar-de-transfeminismo/.
Webner, Pina. 1997. Essentializing Essentialisms, Essentializing Silence: Ambivalence and
Multiplicity in the Cosntructions of Racism and Ethnicity. MODOOD, Tariq (Ed.). Debating
Cultural Hybridity, Multi-Cultural Identities and the Politics of Anti-Racism. London : Zed,
1997, pp. 226 - 254.
Zolla, Elmire. 1997. Androginia: a fuso dos sexos. Rio de Janeiro : Edies del Prado,
1997.
86
Anexos
The Inability to be Looked at and the Horror of Nothing to See, performance, 2009.
Disponvel em http://zackarydrucker.com/performance/the-inability-to-be-looked-at-and-the-
horror-of-nothing-to-see/
92